A Crianca Descobrindo Interpretando Fundo Do Milenio Unesco

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A Criança Descobrindo, Interpretando e Agindo sobre o Mundo Série Fundo do Milênio para a Primeira Infância Cadernos Pedagógicos volume 2 Brasília, janeiro de 2005

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A CriançaDescobrindo,

Interpretando eAgindo sobre

o Mundo

Série Fundo do Milênio para a Primeira Infância Cadernos Pedagógicos – volume 2

Brasília, janeiro de 2005

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Edições UNESCO

Conselho Editorial da UNESCO no BrasilJorge Werthein

Cecilia BraslavskyJuan Carlos Tedesco

Adama OuaneCélio da Cunha

Comitê para a Área de EducaçãoAlvana Bof

Candido GomesCélio da Cunha

Katherine GrigsbyMarilza Machado Regattieri

Os autores são responsáveis pela escolha e apresentaçãodos fatos contidos neste livro, bem como pelas opiniões nele expressas,

que não são necessariamente as da UNESCO, do Banco Mundiale da Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho, nem comprometem as Organizações.

As indicações de nomes e a apresentação do material ao longo deste livronão implicam a manifestação de qualquer opinião por parte da UNESCOa respeito da condição jurídica de qualquer país, território, cidade, região

ou de suas autoridades, nem tampouco a delimitação de suas fronteiras ou limites.

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A CriançaDescobrindo,

Interpretando eAgindo sobre

o Mundo

Série Fundo do Milênio para a Primeira InfânciaCadernos Pedagógicos – volume 2

Organização: OMEP

F U N D A Ç A OMAURICIO SIROTKY SOBRINHO

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Organização: Organização Mundial para a Educação Pré-Escolar – OMEP, Brasil

Coordenação: Maria Helena Lopes

Elaboração:

Cleonice de Carvalho Silva, Dulce Cornetet dos Santos, Elizabeth Amorin,

Janice Oliveira, Maria Helena Lopes, Marise Campos, Renato Ferreira Machado

Colaboração: Maria da Graça Souza Horn, Vital Didonet

Revisão Técnica:UNESCO (Alessandra Schneider),

Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho (Alceu Terra Nascimento,Jéferson dos Santos, Márcio Mostardeiro)

Revisão: Ana Maria Marschall, Marise Campos

Capa:Edson Fogaça

Fotografia da Capa:Mila Petrillo - Projeto AXÉ

Projeto Gráfico e Edição de Arte:Estúdio ADULTOS e CRIANÇAS CRIATIVAS

© UNESCO, 2005

A Criança Descobrindo, Interpretando e Agindosobre o Mundo. – Brasília: UNESCO, Banco Mundial,Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho, 2005.

136 p. – (Série Fundo do Milênio para a Primeira Infância Cadernos Pedagógicos; 2)

1. Educação Infantil – Ensino de Ciências 2. Ensino de Ciências

3. Educação Pré-escolar – Ensino de Ciências I. UNESCO II. Série

CDD 372

BR/2005/PI/H/3

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Apresentação ........................................................................................................... 7

Introdução ............................................................................................................... 9

Linguagens ............................................................................................................. 10

Corpo e movimento ou como transformar pulgas em bichos-preguiça.................... 11Dulce Cornetet dos Santos

Expressão artística .................................................................................................. 19Elizabeth Amorim

Conta uma história, só mais uma, tá? ..................................................................... 43Ana Maria Marshall

Escreve meu nome?................................................................................................ 57Janice Oliveira

Natureza, cultura e sociedade ................................................................................ 70

Natureza, cultura, sociedade e suas transformações ............................................... 71Cleonice de Carvalho Silva

As florestas, os rios, os mares, eu e os animais ........................................................ 77Maria Helena Lopes

Culturas locais e regionais: valores, mitos, lendas e crenças .................................... 85Marise Campos

Mas o que é ciência mesmo? ................................................................................. 95Maria Helena Lopes

Matemática, aritmética, descobertas..................................................................... 103Janice Oliveira

Religiosidade e espiritualidade na educação infantil ............................................. 109Renato Ferreira Machado

Filosofia e infância ................................................................................................ 124Rosana Fernandes

Sumário

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ApresentaçãoO novo ordenamento legal, inaugurado pela Constituição Federal de 1988, assegura à criança

brasileira o atendimento em creche e pré-escola e, a partir da promulgação da Lei de Diretrizes eBases da Educação Nacional, em 1996, a Educação Infantil passa a ser definida como a primeiraetapa da Educação Básica. Essa importante conquista nacional reitera um dos postulados daDeclaração Mundial de Educação para Todos, firmada em Jomtien, no ano de 1990, de que aaprendizagem ocorre desde o nascimento e requer educação e cuidado na primeira infância.

Nas últimas décadas, várias pesquisas têm demonstrado que os primeiros seis anos de vidade uma criança se constituem em período de intenso aprendizado e desenvolvimento, em quese assentam as bases do “aprender a conhecer”, “aprender a viver junto”, “aprender a fazer” e“aprender a ser”. O atendimento educacional de qualidade, nessa fase da vida, tem umimpacto extremamente positivo no curto, médio e longo prazo, gerando benefícioseducacionais, sociais e econômicos mais expressivos do que qualquer outro investimento naárea social. Melhor desempenho na escolaridade obrigatória, menores taxas de reprovação eabandono escolar, bem como maior probabilidade de completar o ensino médio foramobservados entre os que tiveram acesso à educação infantil de qualidade, quando comparadosaos que não tiveram essa oportunidade. A freqüência a instituições de educação infantil afetapositivamente o itinerário de vida das crianças, contribuindo significativamente para a suarealização pessoal e profissional.

Esse reconhecimento levou as nações a assumirem em Dacar, em 2000, entre os compro-missos pela Educação para Todos, a meta de ampliar a oferta e melhorar a qualidade daeducação e dos cuidados na primeira infância, com especial atenção às crianças em situaçãode vulnerabilidade. Essa é uma das seis metas expressas no Marco de Ação de Dacar, do qual oBrasil é um dos signatários, sendo a UNESCO a instituição das Nações Unidas que tem, entresuas atribuições, a de apoiar os países no cumprimento dessa agenda.

Em 2003, a Representação da UNESCO no Brasil, o Banco Mundial e a Fundação MaurícioSirotsky Sobrinho firmaram parceria para a realização do Programa Fundo do Milênio para aPrimeira Infância em alguns estados do País. Esse desafio foi lançado pelo Banco Mundial eprontamente acolhido pela UNESCO e pela Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho, que com-partilham a firme convicção de que garantir uma educação de qualidade desde os primeirosanos de vida é um dos mais importantes investimentos que uma nação pode fazer.

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Série Fundo do Milênio para a Primeira Infância Cadernos Pedagógicos – volume 2

Vinod ThomasDiretor do Banco Mundial no Brasil

Jorge WertheinRepresentante da UNESCO no Brasil

Nelson Pacheco SirotskyPresidente da Fundação

Maurício Sirotsky Sobrinho

O Programa Fundo do Milênio para a Primeira Infância tem como principal objetivo a qualificaçãodo atendimento em creches e pré-escolas, preferencialmente da rede privada sem fins lucrativos,isto é, de instituições comunitárias, filantrópicas e confessionais que atendem crianças em situação devulnerabilidade social. A principal estratégia do programa é a formação em serviço dos profissionaisde Educação infantil, considerando que a qualificação do educador é reconhecidamente um dosfatores mais relevantes para a promoção de padrões de qualidade adequados na educação, qualquerque seja o nível, a etapa ou a modalidade. No caso da Educação Infantil, em que o profissional tem adupla responsabilidade de cuidar e educar bebês e crianças de até seis anos, sua formação é uma dasvariáveis que maior impacto causa sobre a qualidade do atendimento.

A série Fundo do Milênio para a Primeira Infância – Cadernos Pedagógicos constitui-se emimportante recurso à formação continuada dos educadores. Seus quatro volumes, a saber, Olha-res das Ciências sobre as Crianças; A Criança Descobrindo, Interpretando e Agindo sobre oMundo; Legislação, Políticas e Influências Pedagógicas na Educação Infantil e O Cotidiano noCentro de Educação Infantil, apresentam as principais temáticas relativas à aprendizagem e aodesenvolvimento infantil.

Pretende-se, portanto, que o presente volume e os demais dessa série constituam-se em importanteferramenta de trabalho para os profissionais da área de Educação Infantil, proporcionando o acesso anovos e atualizados conhecimentos, a reflexão crítica e a construção de práticas inovadoras àqueles quetêm em suas mãos a difícil e apaixonante tarefa de educar nossas crianças.

Desejamos, ainda, compartilhar essa realização com a Organização Mundial de EducaçãoPré-escolar (OMEP – Porto Alegre), reconhecendo sua colaboração inestimável, e com os Empre-endedores Associados ao Programa Fundo do Milênio para a Primeira Infância, que comungamconosco a visão de que os primeiros anos de vida valem para sempre e de que a educação dequalidade, desde a mais tenra infância, é fundamental para a construção de um Brasil maisdesenvolvido, mais humano e socialmente mais justo.

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Cadernos Pedagógicos – volume 2 Série Fundo do Milênio para a Primeira Infância

Convidamos todos vocês a percorre-rem conosco um espaço muito importan-te, que chamamos “Educação Infantil”.São caminhos que passam por diversasabordagens dos conteúdos da EducaçãoInfantil, oferecendo aos educadores váriaspossibilidades de despertarem para asensibilidade e a sabedoria das crianças.

É um trajeto interessante, vivo ecomprometido com a reflexão inteligente,com a disposição afetiva e com o desejode tentar vencer os obstáculos.

Nosso veículo será a leitura de algunstextos importantes, que terão como centroa Educação Infantil e as ações e vivênciasque podemos realizar com nossas crian-ças. Muitos desses assuntos já são conhe-cidos, mas uma releitura sempre traznovidades, assim como uma viagem emboa companhia. Na busca do melhor convíviopossível, vamos nos envolver em reflexõessobre algumas teorias importantes, que nosauxiliarão a repensarmos melhor aspráticas com as crianças.

Para que isso se torne realidade, temosque aprender a observá-las e a ouvi-las,pois, quando se expressam, queremsempre nos contar coisas e nos questionar.

Que mundo é este que nos recebe?Como são as pessoas? O que é a

natureza? Quem sou eu? E muito mais.Diante de toda essa curiosidade, dessaavidez pela descoberta, pela surpresa epela alegria, as crianças abrem-se comopequenos “girassóis”, receptivas a tudo ea todos, buscando a riqueza da luz. Aorecebê-las, o que precisamos éredescobrir com elas o ser poético, aespontaneidade, a capacidade de filoso-far sobre as coisas e reconhecer suasdiferenças e peculiaridades.

Assim, elas nos sensibilizarão ao retornoà natureza, à alegria do jogo, do brincar eda poesia. Nós lhes daremos a certezade que trabalharemos pela defesa de seusdireitos.

Por elas, abriremos o livro da história edas tradições. Partilharão conosco domundo, serão também artífices damanifestação cultural e construtoras desua própria história.

Com elas, construiremosum futuro mais feliz, porqueatravés do deslumbramento deseu olhar reencontraremosa pureza de nossa alma ea certeza do profundo etranscendente milagre da vida.

Contamos com a parceria de todosnessa desafiadora aventura pelo espaçomuito especial que envolve a criança quenos é confiada na maior parte de seu dia.

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inguagens

Neste segundo caderno, vamos tratardas linguagens pelas quais as crianças seexpressam diante de nós, de seus colegas edo mundo que as cerca. Vamos conversarsobre materiais, atividades e recursos paratornar a relação afetiva, cognitiva e social.

Brincadeiras, livros, artes visuais, cêni-cas, musicais vão conviver com a reflexãosobre valores, crenças e regras indispensá-veis ao bom convívio. Através dos textos, aconsciência do corpo e do espírito serárenovada a cada leitura.

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Nesse período, desenvolvemos as habili-dades fundamentais à nossa sobrevivência.Aprendemos a ficar de pé, a caminhar, acorrer, a rastejar, a saltar e a falar. Nos anosque seguem, apenas as aperfeiçoamos eadaptamos às necessidades de vida.

Vygotsky afirma que é na presença dooutro que o homem se constitui, que formao seu EU. Desenvolvemos essas capacida-des à medida que nos relacionamos com omundo externo. Wallon também nosexplica que os gestos humanos adquiremsignificados quando percebidos einterpretados por outra pessoa.

As expressões de alegria, tristeza, dor,desconforto ou satisfação feitas por umbebê só adquirem esse significado quan-do interpretadas ou decodificadas por seuinterlocutor. A partir desse diálogo, taismovimentos que inicialmente eram refle-xos começam a adquirir intencionalidade,ou seja, o bebê percebe que cada gestofeito causa uma reação nas pessoas comquem convive e começa a fazer deles ummeio de comunicação.

Portanto, o convívio da criança comoutras pessoas, sejam elas adultas outambém crianças, é de fundamental impor-tância para o seu desenvolvimento. Aorganização desse espaço de convíviotambém passa a ter muita importância,conforme seja estimulante e provocadorde situações de movimento, diálogo egestualidade.

orpo e Movimento ouComo Transformar

Pulgas em Bichos-preguiçaDulce Cornetet dos Santos

A Pulga

A pulga é olímpicaMedalha de ouroSalto em distânciaSaltaríamos 11 quilômetrosTivéssemos da pulgaO auto-impulsoDestreza e petulância

Luiz Coronel - Ave-fauna

O corpo e o movimento ocupam todosos tempos e lugares do Centro deEducação Infantil, pois, se acreditamosque “somos um corpo” e não que “temos umcorpo”, a educação se dará sempre de formaintegral, física e intelectual.

A pergunta é: como possibilitar a aprendi-zagem e o desenvolvimento motor,oportunizando aos nossos alunos vivênciascorporais prazerosas, que se tornem parte desuas vidas, incorporando-se a suas culturasde modo que sintam prazer na atividadefísica, na expressão, no movimento parasempre, e não somente durante a infância?

Tanto os autores que tratam do desenvol-vimento humano como os que se dedicamao estudo do desenvolvimento motor sãounânimes em afirmar que os primeiros anosde vida são importantíssimos para qualqueraprendizagem.

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Gallahue eOzmun (2003) orga-nizam as fases domovimentona educação infantilda seguinte forma:

• Fase dos movimentos fundamentais:manifesta-se em torno de 2 anos, quando acriança já se desloca em seu ambiente edesenvolve outros movimentos naturais, comum nível de organização superior. Podem sercaracterizados em três momentos: inicial,elementar e maduro.

• Fase dos movimentos reflexos: carac-terizada pela necessidade de um estímulopara que o movimento se realize.

• Fase dos movimentos rudimentares:surgimento dos primeiros movimentosvoluntários. Esses movimentos ganham maisconsistência a partir da inibição dos reflexose são classificados nos níveis de equilíbrio,manipulativo e locomotor.

Atividades básicas de deslocamento,equilíbrio, coordenação, esquema corporal,relação espaço-temporal, entre outras, sãoprioritárias e devem ser apresentadas atravésde jogos de imitação e perseguição, porexemplo.

A quantidade de tempo que nossascrianças de berçário e maternal ficampresas dentro do berço, em carrinhos ouem cadeirinhas de refeição ocupa a maiorparte do horário na creche. Sabemos queos motivos são louváveis. Há uma grandepreocupação com a segurança física e coma manutenção da higiene dessas crianças.Mas como desenvolver a corporeidade, omovimento, a gestualidade e a motricidadeem crianças imobilizadas?

O movimento deve fazer parte da rotinado berçário, ou seja, a criança deve ter

A partir dessas teorizações, vamospensar a nossa prática em educaçãoinfantil.

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espaço para rastejar, engatinhar, tocar osobjetos e as pessoas com quem convive.

O bebê precisa ser estimulado a ficarem posições que provoquem posturascorporais diferentes, como ficar debruços para que erga a cabeça. Conformevai desenvolvendo seu tônus, novas pro-vocações devem ser feitas, como aestimulação para que busque algumobjeto colorido ou sonoro, permitindo-seque a própria criança crie recursos paraisso, rastejando, engatinhando,caminhando, correndo, fazendo uso deoutro objeto intermediário para alcançar oque deseja, ficando de pé, estendendo-se,enfim, aumentando gradativamente aspossibilidades do movimentar.

Temos que oportunizar a experimentaçãodos espaços, o subir e descer do berço, odegrau a ser explorado, o objeto a serarrastado ou puxado. Tudo isso constituinossa prática docente, faz parte do nossodia-a-dia e deve ser feito com cuidado,para garantir a segurança do aluno, masprecisa ser vivenciado.

Tocar o corpo da criança de maneiraprazerosa e permitir que ela toque ocorpo do educador também é extrema-mente importante. Isso deve acontecernão somente na hora da troca de fraldas,mas nos diferentes momentos da rotinadiária.

A criança puxa os cabelos, lambe,

aperta e morde a educadora. Ela testa aconsistência e a textura de seus corpos.Essas experiências farão com que ela,além de aumentar sua percepção decorpo, auxiliando, assim, na construçãoda imagem corporal, carregue consigouma idéia positiva de si mesma. O uso doespelho pode auxiliar nesse processoexploratório. Esta é a intervenção doeducador na construção do diálogo dacriança com o mundo, do seu corpo,da percepção do movimento como formade expressão.

Conforme a criança vai crescendo,esses desafios vão sendo superados, e oeducador deve sempre aumentar a com-plexidade das atividades.

Ao dominar os movimentos de equilí-brio, apreensão e manipulação, novosjogos são construídos. O jogo simbólicoacontece independentemente da ação doprofessor. Muitas vezes, estamos propondouma atividade e percebemos que as criançasestão desenvolvendo uma brincadeiraparalela, que acontece de maneiraintrospectiva e que pode passardespercebida a um olhar menos atento.

Essa facilidade de “viajar” na imagina-ção auxilia o educador a desenvolver asatividades motoras. A escada do brinquedopassa a fazer parte do caminhão debombeiros, os pneus se transformam em rioscheios de jacarés, os túneis de concreto sãopassagens secretas a algum lugar misterioso.

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Diferentes possibilidades de movimentointegram o universo infantil.

Nas atividades de circuito, várias estaçõespodem permitir, através do jogo simbólico,que a criança crie situações de saltos,corridas, escaladas, equilíbrio, manipulações,rolamentos, rastejamentos, sem preocupaçãocom movimentos pré-estabelecidos outécnicas com parâmetros de certo ou errado.

Quando as noções de regras começam aser construídas, os jogos adquirem novasconotações. O professor pode explorar ascapacidades físicas e intelectuais, assimcomo as valências motoras das crianças,através de brincadeiras que façam parte dasculturas lúdicas e desportivas nas quais aescola está inserida e que oportunizem àscrianças brincar com as outras, interagindo econstruindo estratégias coletivas para atingirobjetivos comuns, como já é possível fazernesse estágio de desenvolvimento humano.

Novamente, caberá ao educador aumen-tar a complexidade das atividades, tendosempre o cuidado de partir do conhecimentodo aluno para novas situações.

Brincadeiras com diferentes materiaisassociados, como bambolês, cordas, pinos,bolas de forma simultânea, desenvolvemvárias estruturas ao mesmo tempo e tornama brincadeira agradável e desafiadora àcriança.

O que era uma exploração inicial domaterial passa a ter significado cultural. A

bola passa a ser ferramenta para o futebol,o voleibol ou o caçador.

O bambolê, além de ser rodado comopneu, faz parte dos jogos de alvo comocesta ou goleira. Ou ainda pode ser rodadono corpo em atividade de controle corporal.Os dois elementos podem ser usados aomesmo tempo, por exemplo, rodando obambolê na cintura e quicando a bola, ouarremessando-a ao parceiro.

A corda, que antes só era puxada ouamarrada a objetos, serve para brincadeirasde pular que são acrescidas de canções douniverso infantil e suas propostas de inter-pretações.

Brincadeiras com diferentes elementosauxiliam a desenvolver mais capacidades,como pular corda em duplas enquanto semantém um balão no ar.

As problematizações feitas pelo profes-sor devem levar as crianças à resolução dosimpasses e contribuir para que a aprendi-zagem se dê de modo integral.

As atividades corporais exploram no-ções de medida, de tempo e espaço, econstroem conceitos geográficos, mate-máticos, sócio-históricos, entre outros.

Saber quem chegou antes ou depois,quem é o primeiro ou o último, organizar,classificar, questionar os diferentes pontosde relevo percebidos pelas crianças duranteas atividades, constatar as relações necessá-

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rias para a execução de certos roteiros demovimentos, observar distâncias percorri-das, proporcionar momentos de relatos,verbalizações, interpretações e sugestõesde atividades possibilitam que os momen-tos sejam permeados pela interdis-ciplinaridade.

Para a criança, a brincadeira tem impor-

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tância em si mesma e, por isso, deve servalorizada. A nós, educadores, cabe terconhecimento das inúmeras possibilidadesque cada momento propicia e aproveitá-laso máximo possível, fazendo com que todasas atividades sejam pedagógicas eenriquecedoras e percebendo nobrinquedo, no jogo, no movimento e nasatividades corporais momentos de

aprendizagem tão importantes comoaqueles em que o corpo está guar-

dado e apenas o intelecto estátrabalhando.

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Referências Bibliográficas

FALKENBACH, Atos Prinz. A relação professor/criançaem atividades lúdicas: a formação pessoal dosprofessores.Porto Alegre: Editora EST, 1999.FREIRE, João Batista. Educação de corpo inteiro: teoria eprática da educação física. São Paulo: Scipione, 1997.GALLAHUE, David L.; OZMUN, John C.Compreendendo o desenvolvimento motor: bebês,crianças, adolescentes e adultos. São Paulo: PhorteEditora, 2003.GONÇALVES, Maria Augusta Salin. Sentir, pensar, agir:corporeidade e educação. São Paulo: Papirus, 1999.HILDEBRANDT-STRAMANN, Reiner. Textos pedagógicossobre o ensino da educação física. Ijuí: Editora Unijuí,2001.

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NEGRINE, Airton. Aprendizagem e desenvolvimentoInfantil: simbolismo e jogo. Porto Alegre: Prodil Editora,1994.REGO, Teresa Cristina. Vigostky: uma perspectivahistórico-cultural da Educação. Petrópolis: Vozes, 1995.SILVA, Elizabeth Nascimento. Atividades recreativas naprimeira infância. Rio de Janeiro: Sprint, 2002.SOARES, Carmen. Imagens do corpo na educação.Campinas: Autores Associados, 1998.SOLER, Reinaldo. Jogos cooperativos para educaçãoinfantil. Rio de Janeiro: Sprint, 2003.WALLON, Henry. As origens do pensamento da criança.São Paulo: Manole, 1989.

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Atividades de Estudoe Aprofundamento

Maria Helena Lopes

No texto Corpo e Movimento, a autoraafirma que, segundo Wallon, “as expressõesde alegria, tristeza, dor, desconforto ousatisfação feitas por um bebê só adquiremesse significado quando interpretadas oudecodificadas por seu interlocutor”.

• Observe os bebês no berçário e comen-te a afirmativa acima ilustrando o comentáriocom fatos presenciados por você ourelatados por seus colegas.

• Você já brincou com as crianças comlençóis velhos ou quaisquer outros pedaçosde panos grandes?

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Experimente! Arrede todos os móveis dasala e ofereça os panos. Primeiramente,deixe-as explorarem o material livremente;depois sugira, por exemplo, que cada umamostre a brincadeira que criou para as outrasimitarem. Algumas sugestões também devemser feitas, como dobrar, desdobrar, rolar porcima, etc.

Não se esqueça de registrar suasobservações, destacando principalmente aspossibilidades de desenvolvimento motorque a brincadeira oportunizou.

• Atividades de relaxamento corporaltambém são necessárias. Além de trazer ascrianças de volta à calma após brincadeiras

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agitadas, auxiliam na conscientizaçãocorporal. Atividades feitas em forma debrincadeira, como prestar atenção à própriarespiração, escutar uma música lenta comos olhos fechados, oportunizar ummomento de bocejos, espreguiçar-se, usar aimaginação fazendo de conta que o corpoestá leve como uma pluma levada pelo

vento, ou dar um abraço no coleguinha queestá deitado a seu lado. Dê asas a suaimaginação e, juntamente com as crianças,descubra o prazer das atividades “derelaxamento”. Conte como foi a experiên-cia, escrevendo sobre as manifestações dossentimentos das crianças durante e após aatividade.

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xpressão ArtísticaElizabeth Amorim

“Ao lidar com as tradições de sua época, aorevivê-las e observar as influências que lhesdizem respeito, as crianças conseguemreformular essas influências, de tal modoque, em sua obra, a forma expressiva surgecomo algo novo, totalmente novo, como sefora visto por uma primeira vez,estranhamente transformada em visão únicae universal.”

Fayga Ostrower

Sem dúvida, o mais belo e misteriosocampo de conhecimento humano é o daarte. É difícil defini-lo, tamanha a suaamplitude e, por que não dizer,complexidade. Por isso, a arte não podeser definida, e sim contemplada, emqualquer de suas manifestações.

É através da arte que a humanida-de, expressa sem restrições, sentimen-tos e emoções. Por seu intermédio, ohomem deixa aflorar o que está noseu íntimo, sua visão de mundo, seupassado, seu presente e seu futuro, seusdesejos, sonhos e utopias.

Quem não se deixa contagiar pelamúsica? Um corpo dançante necessita depalavras? E o teatro com sua representaçãoe seus mundos imaginários? Aonde nos levauma pintura, um desenho ou umaescultura?

Certamente, a arte é a linguagem da

alma, traduzindo o que, em certasocasiões, as palavras não dão conta designificar. É também universal, poisindepende de raça e nacionalidade paraser entendida (se não de todo, pelo menosuma idéia temos). Não percebemos o queMonet transmite com seus jardins?Precisamos entender as palavras em umaópera? E a escultura “O Pensador”, doartista francês Rodin? Não precisamosfalar francês para perceber suamensagem. Nas apresentações de balé,são os movimentos corporais a linguagemusada. A arte é universal, porque “osartistas celebram o invisível, percebendo edoando ao mundo o que sabem sobre ascoisas, e não o que vêem na realidade”.

A Música e a Dança

O Caramujo

O caramujoé um rádio de pilha.Só toca a canção maravilhadas ondas do mar.

Luiz Coronel -Ave-Fauna

A música é vista por muitos como aprimeira das artes, tanto no que se refere àhistória humana quanto à sua importânciana vida de todos nós. Para as civilizaçõesprimitivas, os sons tinham significado, oqual também estava presente em seusprimitivos instrumentos. Já para nós, ela éreconfortante e, muitas vezes, auxilia onosso equilíbrio emocional (musicoterapia).

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Talvez isso aconteça porque a música nosremete ao primeiro e mais importante somda vida: as batidas do coração de nossamãe. O som uterino está gravado no in-consciente e simboliza proteção, aconchego etranqüilidade.

A música está presente em diversassituações e com diferentes objetivos, poishá composições usadas para ninar, paradançar, para ritos fúnebres. Os países têmseus hinos, assim como as escolas e ostimes de futebol. Existem músicas típicas

regionais, etc. Inclusive, vemos hoje, emdiversas maternidades, som ambiental nassalas de parto.

Boa noite, meu bemDorme um sono tranqüilo,Boa noite, meu amorMeu filhinho encantador

Os diferentes aspectos que a envolvem(afetivos, estéticos, cognitivos), além depromoverem comunicação social eintegração, tornam a linguagem musical

uma importante forma deexpressão humana e, porisso, deve ser parte docontexto educacional,principalmente na educa-ção infantil.

A música –compreendida comolinguagem e meio deconhecimento – estáintensamente presenteem nosso cotidianoatravés do rádio, da TV,de gravações epropagandas. Por isso,desde bem pequenas, ascrianças têm contatocom várias músicas econseguem identificá-las.

Elas chegam até nósdemonstrando o queaprenderam até então: sejá falam, cantam; do

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contrário, mostram suas preferênciasatravés de manifestações como sorrir,bater palmas, movimentar o corpo oudar gritinhos.

Portanto, as atividades com músicasão um meio de expressão e de conheci-mento acessível aos bebês e às crianças,inclusive àquelas que apresentam neces-sidades especiais, que por sinal sãoextremamente sensíveis. A linguagemmusical é um dos canais que desenvolve aexpressão, o autoconhecimento e o equilíbrio,sendo poderoso meio de interação social.

Quando oferecemos música e umambiente sonoro em diferentes situações,permitimos que bebês e crianças iniciem,intuitivamente, seu processo demusicalização. Escutando os diferentessons de brinquedos, dos objetos, do ambi-ente e do próprio corpo, há observação,descoberta e reações, mesmo nos bebês:observe como o tipo de música no berçárioresulta em tranqüilidade ou agitação.

Ciranda, cirandinhaVamos todos cirandarVamos dar a meia voltaVolta e meia vamos dar

Dulce Maria Lino afirma que “Músicaé... cantar, dançar... e brincar! Ah! tocartambém!” e que a característica funda-mental da música é “o movimento simul-tâneo e sucessivo de seus elementos:duração, altura, intensidade e timbre”.Assim, a noção do conhecimento

musical vem da ação da criança (comotodo conhecimento), o que incluiperceber que o silêncio complementa osom, pois fazer música implica organizare relacionar sons e silêncios. A partir dos4 anos, por exemplo, já podemos criarsituações e contextos musicais dereconhecimento e utilização das diferentescaracterísticas provenientes do silêncio edos sons, que, como vimos, são: altura(grave/agudo), duração (curto/longo),intensidade (forte/fraco) e timbre, que é oque distingue cada som.

Por isso, existe a necessidade de nosdarmos conta de que vivemos em umambiente sonoro e rodeados de objetostambém sonoros, inclusive nós mesmos!Tudo o que ouvimos é um objeto sonoro;é ótimo brincar com as crianças sobre oque elas estão ouvindo. Observe como

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basta a solicitação de que elas silenciempara escutar ruídos, pássaros cantando,carros buzinando, passos no corredor etoda sonoridade em volta. É escutando ocontexto sonoro que nos envolve queeducamos nosso ouvir.

Como vimos até aqui, a música nainstituição infantil não é só cantar musiqui-nhas para guardar brinquedos, lanchar, naPáscoa, no dia dos pais, etc. É, principal-mente, produzir e pensar música com ascrianças. Cuidado também com o quevocê canta, como uma música do lancheque diz “a mamãe fez”, e a criança nalógica dos seus 3 anos retruca: “não foi amamãe, ela comprou no super!”.

Produzir e pensar músicas significaescutar e identificar sons vocais e não-vocais, improvisar, ouvir diferentes esti-los musicais, realizar experiências sono-ras, movimentar-se, tocar, explorar ossons corporais, compor músicas, mani-pular objetos, movimentar-se e deslocar-se de acordo com a música.

Nos berçários, brincadeiras que envolvemmúsica, canto e movimento possibilitam apercepção rítmica, mesmo porque osbebês produzem ruídos e balbucios desderecém-nascidos. Cante para seus bebêscom ternura e expressão. Repita com elesos sons que emitem, invente cançõescurtas, imite para o bebê os sons do ambi-ente, cante movimentando o corpo dobebê, dance com ele, eleja uma música e

cante-a diariamente, ofereça diferentesobjetos sonoros; enfim, proporcione diversassituações e experiências de explorações edescobertas tanto sonoras quanto musicais.

Lembre-se que inicialmente, até porvolta de um ano e meio, a criança maisnos ouve do que canta; no entanto, jádemonstra suas preferências e as acom-panha de alguma forma. Em um segundomomento, canta os finais das frases ou aspartes preferidas e, muitas vezes, umpouco depois de nós. Ela podeigualmente apenas realizar a coreografiade músicas como estas:

As árvores balançam, balançamBalançam sem pararA cobra vai subindo, vai, vai,Vai se enrolando, vai, vai, vai.

A partir dos 3 anos, a criança jáentoa todo o repertório de seu meio,cantando integralmente muitas dasmúsicas conhecidas.

A imitação é a base do trabalho deinterpretação, mas CUIDADO: não éimitação dos gestos e movimentos doadulto. Não devemos confundir expres-são corporal com imitação de gestosque diminui (ou anula) a possibilidadede expressão individual. Estamos nosreferindo à expressão individual dasimpressões sobre alguma coisa, isto é,imitar sons vocais, instrumentos e objetossonoros de forma pessoal, com sentido e

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não mecanica-mente.

Podemoster na nossasala um canti-nho do som,onde ficamobjetos sono-ros, livrossobre músicase composito-res, letras compartituras eCDs. Se vocênão tiveraparelho de som na sua sala, provavel-mente a escola tem; então, combine osdias em que pode estar disponível paravocê. No entanto, lembre-se de que elenão é fundamental para que você e suascrianças tenham muitos bons momentosmusicais!

A música está bastante ligada aolúdico e ao brincar. Em todos os povos,as crianças brincam com a música.Jogos e brinquedos musicais, como asrodas cantadas, são encontrados noslugares aonde houver crianças. Elastambém gostam de fazer rimas,musicadas ou não. As rimas sem músi-ca – os versos para brincar – chamam-se parlendas ou trava-línguas e sãoespecialmente apreciadas pelas criançasa partir de 4 anos. Algunsexemplos dessesjogos da cultura infantil são:

Quem vai ao arPerdeu o lugarQuem vai ao vento,Perdeu o assento!

Batalhão, lhão, lhão Quem não entra é bobalhão Abacaxi, xi, xi Quem não sai é um saci

Uni, duni, tê Salamê, mingüê Um sorvete coloreti O escolhido foi você!

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Ai, eu entrei na rodaPara ver como se dança.Eu entrei na contradança,Eu não sei dançar.

O que é dançar para você? Lembremosque dançar é acompanhar determinadoritmo com movimento corporal. O ritmoé vibração e define o movimento natural;por isso, estimulemos o gesto e o ritmopeculiar de cada criança, que o capta deacordo com a sua percepção pessoal.

Assim como no desenvolvimentomusical, quanto mais as crianças tiveremoportunidade de vivenciar situações emque possam se expressar pela dança, maisnaturalmente usarão essa linguagem.

Não é dança o balanço de umbebê de 8 ou 10 meses ao ouvir suamúsica preferida? Crianças até 3 anosdançam aos mais variados estímulosrítmicos, desde palmas até o som deeletrodomésticos! É maravilhoso obser-varmos o quanto a dança é natural nascrianças, motivo pelo qual repetimosque devemos oferecer as mais variadassituações para que elas utilizem essaforma de expressão.

Vamos dançar?

O Teatro

...a beleza, como a verdade, só vale quandorecriada pelo sujeito que a conquista.

Jean Piaget

Já o trava-línguas, como o nomeindica, tem pronúncia mais difícil e deveser repetido o mais facilmente possívelcomo:

Pinga a pipaDentro do prato.Pia o pintoE mia o gato.

O rato roeu a roupado rei de Roma.A rainha raivosa rasgou o resto.

As brincadeiras de roda integrampoesia, música e dança, sendo tambémmuito apreciadas pelas crianças, princi-palmente por causa do movimento (paraelas, dificilmente existe música semmovimento).

A música e a dança são atividadesexistentes desde os tempos primitivos;suas histórias habitualmente aparecemassociadas de tal forma, que podemosdizer: a dança é irmã da música.

Devemos lembrar que o gesto e o movimentocorporal estão conectados à música, porque osom é também gesto e movimento vibratório, e ocorpo traduz os diferentes sons que percebeatravés dos movimentos de balanço, flexão,andar, saltar, etc. Quando ouve um impulsosonoro e realiza um movimento corporal intenci-onal, a criança está transpondo o som percebidopara outra linguagem, muitas vezes a da dança.

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A criança toca, cheira, olha, move-se,pensa, sente o seu corpo; é a ação e opensamento, porque canta com o corpo,desenha com o corpo, sorri ou choracom todo o corpo. Vive intensamente,arrisca-se, pois está atenta e aberta àsexperiências e ao mundo, sem medo.

Toda arte é expressão, seja qual for alinguagem: música, dança, pintura,escultura, cinema e teatro. Ao propor-mos situações de expressões artísticas,devemos ter em mente que não preten-demos formar um artista, mas auxiliar,através de expressões e jogos, naconstrução de seres capazes de utilizaras diferentes formas de linguagem,seres espontâneos, vivos, dinâmicos e

também capazes de expressar sensações,sentimentos e pensamentos.

O meio natural das crianças é o jogo,porque através dos jogos de criação eimitação vão descobrindo-se, descobrin-do o outro e o mundo a sua volta.

Pelo que temos discutido até aqui,parece claro que, quando a criança écapaz de imaginar, ela pode desenvolversua expressividade por meio de diferen-tes formas. Então, ficamos nos pergun-tado sobre os “teatrinhos” e “pecinhas”apresentados em diversas situações nocontexto educacional infantil. Muitasvezes, essas montagens cênicas que mar-cam datas comemorativas não têm,

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realmente, significado para as crianças,pois não atendem às característicasparticulares do grupo, tampouco seusníveis de desenvolvimento. É uma“apresentação” que tem como objetivoela mesma.

O teatro na educação infantil deve,então, ser encarado como umas dasatividades de expressão em que o jogosimbólico é a marca, e não enredos efalas organizadas pela educadora ecumpridas pelas crianças.

As diferentes formas de expressão dosbebês, como os sons e ruídos emitidos,assim como os gestos, representam aprimeira forma da comunicação com omundo, que gradativamente vão setransformando em dança, canto,mímica, desenho e modelagem.

Os jogos simbólicos (faz-de-conta),como os demais jogos, são carregados daenergia, expressividade e inventividade dacriança. Basta observarmos crianças de 3anos nas suas brincadeiras: a diversidadee a quantidade de imitações querealizam espontaneamente e o faz-de-conta estão presentes nos seus afazeres.

Através do brincar, a criança vaiconstruindo consciência da realidade e,ao mesmo tempo, já vive uma possibili-dade de modificá-la. Igualmente procuracompreender o mundo e as açõeshumanas do seu cotidiano; por isso,

assume diversas “personalidades” erepresenta diferentes papéis, ora sendoadulto, ora sendo mãe, pai ou filho, orasendo animalzinho e mesmo avião. Umator finge ser determinado personagem,enquanto a criança é o personagem queimita ou inventa. Quando a criançaimagina, ela é capaz de expressar-se dediversas maneiras e, assim, de relacionar-secom o mundo de modo qualitativamentediferente.

Quando falamos sobre música,vimos que a imitação é uma das fontesde representação, é um processo deaprendizagem, tanto que o bebê imitaos sons emitidos de si mesmo e seuspróprios movimentos.

A partir de um ano, como já possuimemória de evocação, a criança passa aimitar objetos e acontecimentos ausentes,isto é, já vividos anteriormente. As imita-ções passam a ter crescente diferencia-ção, mesmo porque há expansão de suasinterações com o meio e, portanto, novosmodelos a serem imitados.

O desenvolvimento do jogo é paraleloao da imitação; assim, inicialmente, ele érealizado pela criança por puro prazerfuncional. A partir dos seis meses, aparecemos jogos de manipulação e construção, pormeio dos quais a criança desenvolve a simesma e as possibilidades que tem deagir sobre os objetos e sobre o mundoque a cerca. A origem da inteligência

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prática encontra-se nesses jogos, quepossibilitam importantes aquisiçõespara o desenvolvimento intelectual. Ocontato com diversos materiais dediferentes cores, tamanhos, formas etexturas, aliado a experiências de atirar,morder, extrair sons, encher/esvaziar,misturar, empilhar, montar/desmontar,proporcionam as noções de cores,formas, texturas, tamanho, peso,classificação, seriação e quantificação.

Voltando ao jogo simbólico, ele iniciacom a criança fazendo de conta suasações habituais (comer, dormir, lavar-se,etc.),

depois utilizando bichinhos debrinquedo e bonecas para representá-los(comer, dormir, lavar-se, etc.), para final-mente utilizar outros meios que não osreais para representar os objetos domundo adulto.

Em torno dos 3 anos, é comum einteressante observar as crianças realiza-rem as transformações: um toco demadeira pode ser um carro e uma almofa-da seu “nenê”. O poder de manipulaçãodo mundo real transformado pela imagi-nação faz dessas atividades fontes deprazer e magia para as crianças, quedramatizam cenas inteiras e solicitam a

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participação do adulto para dramatizarjunto ou como observador.

Em algumas situações, a dramatizaçãoserve como canal de compensação ou desuperação de alguma situação desagradá-vel, como medo ou tensão. Assim, vemosaquela criança alérgica a chocolate co-mendo muitos “negrinhos” ou, ainda, aoutra que, antes de ser vacinada, “dáinjeção” em todas as bonecas da sala!

Nós precisamos preservar o espaçopara que as manifestações possamexteriorizar-se e, ao mesmo tempo, sercuidadosos ao interpretar os comporta-mentos, devendo considerar sempre amaneira de ser de cada criança.

Muitas cenas são repetidas até esgotaro interesse por elas. Um dos interessesmais constantes é o brincar de casinha,com os papéis familiares representados edramatizados. É interessante observar queas figuras familiares também são transpos-tas para outras situações; imitam-seanimais, a “família” lá está, pois se é agirafa a eleita, há a girafa mãe, a girafapai, a girafinha pequena e, muitas vezes,o “nenê” também!

A partir dos 4 anos, o jogo simbólicovai aproximando-se do real, mostra-semais coerente nas ações e falas. Surge apreocupação com o material para com-plementar a brincadeira, havendo

também atenção com detalhes para queo jogo esteja o mais próximo possível da“verdade”. As crianças passam tempoorganizando o material, às vezes solici-tam o nosso auxílio para a confecção deroupas e cenário. Devemos colaborarauxiliando-as, jamais fornecendosoluções prontas.

Brincam então de loja, de super-herói,de ir à praia, ao shopping, encenandohistórias cada vez mais longas; e, na

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busca de um realismo cada vez maior,mudam inclusive a entonação da voz.Nesse momento, devemos ter o cuidadode não impor padrões, lembrando tam-bém que antes dos 6 anos as criançasnão têm condições de improvisar.

Embora o mundo da fantasia sejaainda forte aos 4 ou 5 anos, a realidadecomeça a ser mais evidente, pois acriança vai gradativamente compreen-dendo alguns processos e fazendo rela-

ções. Surgem conflitos, e ela precisa deespaço para expressar seus sentimentos;então, a alegria, o medo, a raiva, atristeza, a ansiedade e o carinho mani-festam-se através dos personagens.

Nessa fase, a platéia torna-se impor-tante e é composta, na maioria das ve-zes, por nós, educadores, e pelaspróprias crianças. Podem ser convidadostambém outras turmas e os pais, tendosempre o cuidado de não dar a essaexperiência o enfoque de umarepresentação teatral.

As crianças, até por volta dos 6 anos,não constituem ainda, efetivamente, umgrupo de jogo, pois a cooperação estásendo construída e qualquer insistênciatransforma-se em imposição e cópia.Assim, onde o que é dito e realizadonada mais é do que um movimentomecânico, não compreendido realmente.

Cabe a nós respeitarmos as inclina-ções naturais das crianças para jogardramaticamente, bem como garantirmossegurança e liberdade para que o jogopossa acontecer naturalmente.

“As pessoas grandes não compreendem nada sozinhas, e é cansativo, para as crianças, estarem a toda hora explicando.”

Saint-Exupéry -- O Pequeno Príncipe

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Artes Visuais

“Minha tarefa pode ser comparada à obra de arte de um explorador que penetra numa terra desconhecida.

Descobrindo um povo, aprendo sua língua,decifro sua escrita e compreendo cada vezmelhor sua civilização.Acontece com todo adulto que estudaa arte infantil.”

Arno Stern

“Que linda a bola que desenhaste!”“Não é uma bola, é eu e meu paipescando!” Esta situação ilustra o quemuitas vezes acontece no cotidiano comcrianças pequenas. O nosso olhar adultotenta interpretar a produção da criança,que, por sua vez, mostra-se “ofendida”ou frustrada com nossas interferências.

A criação artística é um ato exclusivoda criança, um percurso de criação econstrução individual elaborado a partirde suas experiências e relações comproduções de artes, com o mundo que acerca e com seu próprio fazer.

Como a criança desde pequena sofreinfluência da cultura de seu meio, mes-mo havendo autonomia na exploração eno fazer artístico, suas produções reve-lam a época (histórica), o local em quevive e as oportunidades de aprendi-zagem pelas interpretações que realiza.

Contudo, não basta somente ofere-cermos materiais diversos para que as

crianças se apropriem dessa linguagem.É claro que devemos permitir que elaspercorram seus próprios caminhos;porém, como nas demais áreas,precisamos oferecer-lhes, além da expe-rimentação de materiais, as diferentesformas de arte na pintura e na escultura.

Então, é importante a criança conhe-cer as várias artes que os homensfizeram e produziram ao longo dahistória. Como? Através do contato comlivros sobre artistas e suas obras, sobremúsica, sobre pinturas e esculturas,através de visitas a exposições, passeios amuseus e a feiras de artesanato locais. Émuito interessante as crianças teremperto um “artista”; então, convide umartesão de sua cidade para ir até seugrupo. E nas famílias ou nos vizinhos,alguém produz artisticamente? Além deexplorar suas habilidades, essas pessoaspodem elaborar junto com as criançasalguma proposta.

Como toda aprendizagem, o desen-volvimento gráfico não acontece comonum passe de mágica; ao contrário, elevai sendo construído gradativamente.Viktor Lowenfeld (1977) chama de gara-tuja os rabiscos apresentados pela criança.As garatujas mostram-se tão diferentesquanto as crianças também o são e igual-mente apresentam evolução. Inicialmen-te, há apenas o prazer do movimento,por isso é comum observarmos criançasaté 2 anos “desenharem” olhando para

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os lados. Nessa idade, o movimentocorporal tem grande significado para acriança, já que até pouco tempo era umadas únicas formas de expressão que elapossuía.

Traçar riscos no papel de maneiradesordenada dá à criança agradáveissensações: é o riscar pelo prazer de riscar.Porém, esses movimentos contribuempara o domínio da coordenação dos movi-mentos.

Com a garatuja ordenada, os movi-mentos tornam-se repetitivos, pois há oinício da coordenação viso-motora, comtraços vigorosos no sentido horizontal evertical. A criança descobre que existeligação entre seus movimentos e o traçoque faz no papel. Posteriormente, apare-cem os traços circulares e a utilização dediferentes cores, embora ainda sem inten-ção consciente.

Finalmente, com a garatuja nomeada,a criança começa a relacionar seusrabiscos com o mundo que a rodeia,identificando-os. Desenha com intenção evai descrevendo o que está acontecendo:“estou desenhando a bola”, ou “o gatinhoestá dormindo”. Em um segundo momento,anuncia antecipadamente o que vaiproduzir, embora não anteceda o aspectofinal, tanto que muitas vezes, ao dar porterminada sua produção, verbaliza outracoisa completamente diferente. As garatujas

ainda são irreconhecíveis e a cor é utilizadapara diferenciá-las.

Inicia-se outra fase por volta dos 4anos, com a descoberta da relação entredesenho/pensamentos/realidade. Osmovimentos evoluem até se tornaremidentificáveis e surge uma nova forma dedesenhar na qual, inicialmente, há umaconstante repetição de símbolos eformas. A intenção da criança érepresentar os elementos do mundo quea rodeia, embora na utilização de coresnão haja relação com a realidade.

Inicia-se nessa fase a representaçãoda figura humana, que surge como um“sol” ou como um círculo representandoa cabeça (fala) e duas linhas verticais querepresentam as pernas (mobilidade).Mais adiante, surgem os braços, quepodem estar de cada lado do círculo oudas pernas.

A figura humana e as demais repre-sentações vão se tornando gradativamentemais detalhadas: surge a linha de base(chão) e as peças dos desenhos vão agru-pando-se na parte inferior do papel. A cora ter relação com o objeto e, quando dese-nha “pessoas”, ainda podem aparecerexageros de partes que para a criança sãoimportantes naquele momento.

E assim, a partir de suas vivênciascotidianas, manipulando objetos, experi-mentando materiais diversificados e

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estabelecendo interações com o meio, ascrianças vão registrando de forma cada vezmais elaborada as impressões sobre omundo. Esclarecemos que, ao indicaridade, falamos em “torno de”, ou seja,não as estamos fixando, é apenas para seter uma certa base, já que o desenvolvi-mento e a aprendizagem estão ligados –como exaustivamente temos explicitado

ao longo deste trabalho – às experiênciase interações realizadas pela criança.Também as representações não evoluemrigidamente, pois, mesmo já mostrandouma produção mais elaborada, a criançapode retornar à garatuja para explorarnovas formas, cores, ou mesmo peloprazer do movimento.

A expressão gráfico-plástica é para acriança uma linguagem, como o gesto ou afala. É a sua primeira escrita, visto que

antes de aprender a escrever ela utiliza odesenho para deixar sua marca. Através daarte, fala de seus medos, de suas descober-tas, alegrias e tristezas, de suas preferênciase desagrados, combinando dois fatoresmuito importantes: seu conhecimento dascoisas e sua relação individual com elas.

Podemos dizer que no berçário as

crianças iniciam seus primeiros registros,suas primeiras marcas: as mãozinhaslambuzadas de sucos, papas e sopas.Nesse aspecto, as mãos precedem osinstrumentos que serão utilizadosposteriormente. Por volta de um ano,poderemos começar a oferecer osprimeiros materiais específicos, pois omeio que a cerca representa para acriança o campo de suas artes. Assim, suasexperiências motoras marcam paredes,mesas e tudo o mais ao seu alcance,

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inclusive o próprio corpo significa umgrande campo de possibilidades pararabiscar e manchar. Podemos, então,forrar superfícies (mesas, paredes) compapel pardo para essas experiências quetambém podem e devem ser realizadas nochão. A folha de ofício é ainda um espaçomuito pequeno, por isso não éaconselhável.

Os grudesde maisenacozida colori-dos comgelatinas, ospós de sucos ea anilinacomestível sãouma grande“festa”. Osgrudestambém nosdão a alter-nativa demodificarmossua consistên-cia, o quemodifica a sensação tátil da criança.Nessa fase, é a exploração dos materiais anecessidade da criança; portanto, nada desolicitações e sugestões quanto ao seufazer para que não se perca aespontaneidade desse processo.

Ao perceber que sua ação produzmarcas específicas, a criança passa a

orientar a mão e, como já vimos, come-çam a aparecer linhas e pontos espalha-dos pela superfície. As cores, que anteseram totalmente misturadas, passam a serseparadas. A partir de agora, a diversida-de de tamanhos, materiais, superfícies einstrumentos tornam-se fatores extrema-mente importantes e necessários.

As crianças passam a utilizar papéisde diferentestamanhos e formas,lixas, tecidos,partes de caixas,isopor e plástico.Os papéisofereceminúmeras possibili-dades: rasgados,picados,amassados, recor-tados, amarrados,colados,desenhados.

Como não hálimites para aimaginação de

uma criança quando lhe são oferecidasexperiências diferenciadas, entram emcena também sucatas diversificadas,embalagens, rolos de papel, tampinhas,cones de linha, botões, fitas, barbantes,areia, serragem, massa comestível,canos, palitos de picolé. As ferramentasigualmente são variadas: além das maisusuais, como lápis de cera, canetões, giz e

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tesouras, podemos também utilizaresponja, penas, pauzinhos, carvão, algo-dão, escovas de dente e, é claro, mãos ededos!

Quanto ao uso da tesoura, ela podeser manipulada de várias formas – comas duas mãos e mesmo sem a intençãode cortar – porque é somente após os 3anos que as crianças conseguemmanuseá-la com uma só mão.Obviamente, as tesouras devem serpequenas e ter pontas arredondadas.

As tintas exercem grande fascínio nacriança, tanto pela cor quanto pela sensa-

ção agradável que produzem ao seremmanuseadas. Oferecemos uma cor de cadavez, antes de utilizarmos todas, bastandoas primárias (amarelo, azul e vermelho), jáque através das misturas naturalmente vãosendo criadas novas cores e tonalidades.

Devemos inicialmente evitar o preto,pois nas misturas ele predomina “apa-gando” as demais cores.

Água e terra são igualmente substânciasque utilizamos, inclusive devemos pro-porcionar – quando a temperatura permi-te – momentos para que as criançasrealizem experiências ao ar livre.

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com seus martelos de madeira, pregos eparafusos grandes, chaves-de-fenda,pedaços de madeira, fórmica, aglomera-do, arames, pequenas serras, etc.

As diferentes modalidades de artesvisuais podem ser combinadas entre si.Por isso, devemos incentivar a relaçãocausa e efeito, propondo conjuntamentedesenho e colagem, colagem e pintura,modelagem e pintura e tantas outrascombinações de materiais.

Devemos considerar que cada crian-ça é única, com sua história, suasvivências, suas habilidades e seu ritmode desenvolvimento. Logo, nãoesperemos que, de uma hora para outra,ela domine técnicas e materiais. Essedomínio é gradativo e experimental, ca-bendo a nós auxiliar nas dificuldades,propor desafios e jamais agir pela criança.

As produções das crianças devem serexpostas e apreciadas por elas, bemcomo discutidas e analisadas (nãoavaliadas). Podemos convidar outrosgrupos ou os pais para pequenasexposições ou para expor determinadaatividade ou construção.

A arte, ao apresentar realidades ima-ginadas, pode ser compartilhada porpessoas de diferentes níveis e culturasatravés do encantamento, da imaginaçãoe da emoção que desperta. Portanto,cabe a nós, como educadoras, respeitaras formas de expressão da criança.

Respeito significa estímulo; orientação epropostas diversificadas também sãoimportantes. Dessa forma, estaremospropiciando um “mergulho imaginário”cada vez mais profundo e criativo.

Crianças de 5 e 6 anos

A professora pergunta:– O que é arte?As crianças:– É bagunçar. Espalhar os brinquedose não juntar. Riscar as paredes.

– É fazer coisa bonita ou coisa ruim.– É fazer quadro.– É subir nos telhados da casa dovizinho.– Jogar areia no olho das pessoas,morder as pessoas.A professora questiona:– Quem faz essas coisas ruins a gentechama de artista?As crianças:– Não. Chama de sapeca ou de arteiro.– São quadros muito bonitosque a gente vê nas exposições.– Eu até faço aula disso! Uso cola,tesoura, tinta também. Desenho com giz.A professora:– Então, quem é artista?As crianças:– É aquele que faz coisas legais ebonitas. Pode ser teatro, música,circo, cinema, quadros, exposições,fotos, estátuas.

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Cadernos Pedagógicos – volume 2 Série Fundo do Milênio para a Primeira Infância

Referências Bibliográficas

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RABITTI, Giordana. À procura da dimensão perdida: umaescola de infância de Reggio Emilia. Porto Alegre:Artmed, 1999.REVERBEL, Olga. Um caminho do teatro na escola. SãoPaulo: Scipione, 1997.ROCHA, Mª Sílvia P. M. L. da. Não brinco mais: a(des)construção do brincar no cotidiano educacional. Ijuí:Editora UNIJUI, 2000.SANTOS, Vera Lúcia Bertoni dos. Atenção! Criançasbrincando! In: CUNHA, Susana Rangel Viera da. (org.)Cor, som e movimento. Cadernos de Educação Infantil.V.8. Porto Alegre: Mediação,1999.- . Brincadeira e conhecimento: do faz-de-conta àrepresentação teatral. Porto Alegre: Mediação, 2002.TELLES, Maria Terezinha. Didática do ensino da arte – alíngua do mundo: poetizar, fruir e conhecer. São Paulo:FTD, 1998.WAJSKOP, Gisela. Brincar na pré-escola. ColeçãoQuestões da Nossa Época. São Paulo: Cortez,1997.

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Atividades de Estudo eAprofundamento

Maria Helena Lopes

Relato de uma professora:“Com a utilização de um radinho, na falta

de um CD, todos dançam e desfrutam aseleção musical da rádio sintonizada.”

É uma ilusão pensar que a falta derecursos tecnológicos (como gravadores,CD players) ou instrumentos musicais emclasse impossibilite um bom trabalhocom música.

• Realize e descreva um LABORATÓ-RIO MUSICAL, onde seja criado umambiente sonoro que proporcione àcriança a exploração e a construção deconhecimentos sobre música e o de-senvolvimento da escuta musicalatravés da coleta de sucatas: folhassecas, ossos, pedaços de madeira,molho de chaves, fios de nylon,atilhos, arames, recipientes com água,latas, entre outras que irá descobrir.Adultos e crianças poderão participarda atividade. Você também podefotografar para melhor ilustrar seu relato.

Certa vez, quando tinha seis anos, vi numlivro sobre a Floresta Virgem, “HistóriasVividas”, uma imponente gravura.Representava ela uma jibóia que engolia umafera. Eis a cópia do desenho.

Dizia o livro: “As jibóias engolem, semmastigar, a presa inteira. Em seguida, não podemmover-se e dormem os seis meses da digestão”.

Refleti muito então sobre as aventuras daselva e fiz, com lápis de cor, o meu primeirodesenho. Meu desenho número 1 era assim.

Mostrei minha obra-prima às pessoasgrandes e perguntei se o meu desenho lhesfazia medo.

Responderam-me: “Por que é que umchapéu faria medo?”

Meu desenho não representava umchapéu. Representava uma jibóia digerindoum elefante. Desenhei, então, o interior dajibóia a fim de que as pessoas grandespudessem compreender. Elas têm semprenecessidade de explicações. Meu desenhonúmero 2 era assim.

Antoine de Saint-Exupéry – O Pequeno Príncipe

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• Comente a passagem do livro “O • O gosto pela arte, o prazer da con-templação de obras teatrais, da música oude uma escultura iniciam-se através daexperiência artística, da proximidade comas obras e da observação orientada pormeio de informações sobre as mesmas.

Faça uma pesquisa em sua comunidadee em seu município.

Quais são os artistas locais, pintores,escultores, compositores? Há museus emsua cidade para serem visitados? Os artistaslocais, como artesãos, poderão vir aoCentro Infantil para falar sobre suas obras ede sua inspiração artística.

• O circo também está impregnado deexpressão artística. Há muita música eexpressão cênica (principalmente a dospalhaços que fascinam e divertem ascrianças): o cenário cheio de cores e luzes,as fantasias dos trapezistas, cujos corposdançam em sincronia com outros corpos,os malabaristas que com sua destreza ehabilidade fazem os pratinhos dançaremsobre varinhas... A magia do circo écontagiante!

Se não houver circo em seu muni-cípio, crie com seus colegas educa-dores, com a comunidade e com ascrianças um grande circo. Certamente,adultos e crianças poderão transformar-se em artistas circenses. Com a ajuda dacomunidade, tudo poderá ser preparado:o palco, as fantasias, as músicas, etc.

Pequeno Príncipe”, citada acima, rela-cionando com as idéias do texto sobreartes visuais. Individualmente ou emgrupo, reescrevam o conteúdo com aspróprias palavras.

• A partir do estudo sobre artes visu-ais, organize um quadro sintetizando asprincipais características das fases dografismo infantil, de acordo com ViktorLowenfeld.

• Oportunize a utilização de materi-ais diversificados e de técnicas enrique-ce a expressão artística e criadora dascrianças, bem como a descoberta desubstâncias de diferentes consistências etexturas. Faça uma mistura com 4 porçõesde farinha de trigo, 2 de água, 1 de sal eanilina. Leve ao fogo como se fosse ummingau. Se possível, permita que ascrianças presenciem a mistura dosingredientes para que observem a trans-formação da farinha em mingau. Ofere-ça folhas de papel grossas ou caixaspara que as crianças cubram com amistura. O prazer e o resultado satisfatóriotransformarão o momento em muitaalegria. Se você conhecer outras“melecas” interessantes, escreva a receitaem seu caderno.

Registre os comentários e questiona-mentos das crianças.

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Faça um grande painel com desenhosdas crianças sobre as vivências e brinca-deiras no circo.

Sugestões de CDs de músicas infantis

• Músicas daqui – Ritmos do mundo (Livrode história com CD de músicas) / ZezinhoMutarelli e Gilles Eduar

• Cantigas de roda / Paulo Tatit e SandraPaes / Selo Palavra Cantada / Gravadora MCD

• Primeiro Em Canto / Paulo Tatit e SandraPaes / Selo Palavra Cantada / Gravadora MCD

• Meu neném / Paulo Tatit e Sandra Paes /Selo Palavra Cantada / Gravadora MCD

• Canções de brincar / Paulo Tatit e SandraPaes / Selo Palavra Cantada / Gravadora MCD

• Oficininha / Beto Herrmann• O bê-á-bá encantado / Beto Herrmann

Sugestão de leitura

• KOHL, Maryann F. O livro dos arteiros:arte grande e suja. Porto Alegre: Artmed, 2002.

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onta uma história, só mais uma, tá?

Ana Maria Marshall

“Vindas do espaço sideral, do outro mundo,como diziam os celtas, do tempo dos sonhos,como acreditavam os aborígines, doinconsciente coletivo, como afirma a teoriajunguiana, as histórias nos cercam,formando um tecido diáfano, transparente,imperceptível ao olhar desatento, masextremamente poderoso, um fio condutor nolabirinto das nossas vidas.”

Novaes Coelho – Literatura Infantil, teoria, anális, didática

Era uma vez um sultão, nos longínquospaíses árabes, que vivia rico em poder eem ouro, mas pobre de amor; era muito,muito infeliz, porque o ódio morava emseu coração, pois a traição de sua esposao levava a odiar todas as mulheres.

O sultão Shariar, este era seu nome,diariamente festejava um novo casamen-to, que só durava uma noite: na manhãseguinte, seu fiel assessor, o grão-vizirdo reino, era obrigado a matar a novasultana, até o dia em que sua própriafilha Sheherazade resolveu enfrentar operigo desse casamento, dizendo a seupai:

– Deixe-me casar com o sultão, egaranto que não morrerei, pois sei comome salvar do terrível destino que matoutodas as outras mulheres…

Desesperado, o grão-vizir concordou,e sua bela filha casou com Shariar, entrefestas e banquetes, até que, à noite,chegou a hora de recolher-se com seuamo e senhor, o todo-poderoso sultão…

– Nobre senhor, implorou ela a seuesposo, deixe-me levar para nossosaposentos minha irmã mais nova,pois ela não consegue dormir semouvir uma história…

Embasbacado com tão absurdo pedi-do, mas curioso, também, por ouvir suanova mulher, o sultão concordou, e ostrês se recolheram aos aposentos reais.

E Sheherazade, que todos conhece-mos como a heroína das mil e umanoites, começou a contar a primeira desuas histórias, “O mercador e o gênio”,que se prolongou até a madrugada,quando ela viu que sua irmã estavaadormecida e exclamou, assustada:

– Veja, nobre senhor, Dinazardaadormeceu, e não poderei terminar ahistória. Deixe-me viver até a noite, eu vosimploro, para então terminar minha narra-tiva…

Cruel, mas curioso, o nobre sultãoconcordou em atender a essa súplica e,assim, matar sua curiosidade, antes dematar sua esposa. O grão-vizir,tresnoitado, vibrava de alegria e de espe-rança, pois sua filha lhe dissera queusaria o que aprendera com ele para salvar

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Perguntando Se Aprende

Será mesmo tão importante ouvir, lere contar essas histórias antigas?

Podemos dizer que, além de toda ariqueza artística e cultural que elastrazem consigo, as histórias tradicionaisrevelam para o mundo consciente osconflitos, as dúvidas e os medos quetodos sofremos, encorajando as crianças eos adultos a enfrentarem o perigo, mesmosabendo dos riscos que correm. Esse é umenfoque psicológico extremamente impor-tante, e é em Bruno Bettelheim, psicana-lista do século XX, que se desenvolvemteorias muito interessantes a esse respeito.O autor nos mostra, ao longo de seutexto, que a criança necessita interagircom aspectos da vida, como os seguintes:

• O BEM E O MAL EXISTEM, epodemos encontrar a felicidade peloenfrentamento dos obstáculos que pertur-bam a ordem das coisas, ou pela ajudade nossas próprias forças e de outras, asforças mágicas. Nessa luta, encontramosnossa própria identidade, e a criança écapaz de compreender isso, aceitando osfatos às vezes tão violentos nas histórias.

• HÁ GRANDES DIFERENÇAS ENTREAS PESSOAS, e devemos fazer opçõessobre como queremos ser. Nos contostradicionais, como, por exemplo, aslendas, as fábulas e os contos de fadas,essas características aparecem divididas

a própria vida: todas as noites esseamoroso pai contava uma história a suasfilhas, que sabiam milhares de histórias…

Ao final de mil e uma noites, em que osultão ouviu algumas das mais belas lendase fábulas do Oriente, aconteceu que Shariarestava profundamente apaixonado por suabela esposa; ela também se apaixonara e,assim, viveram felizes para sempre…

Não se conhece o autor de “As mil euma noites”, mas as mil e uma históriasaí contadas trazem em si toda a riquezacultural do Oriente, que é artisticamentetransmitida oralmente e pela dança,através de séculos e de gerações, atraves-sando mares e desertos, até que um belodia um escriba e artista fixou, em tábuas,todas as 1001 histórias, muitas delasnossas velhas conhecidas, como, porexemplo, “Aladim e a lâmpadamaravilhosa”, “Ali Babá e os quarentaladrões”, e tantas outras.

No mundo ocidental, também houveesse resgate de contos tradicionais parao universo da escrita, mas quem lhesdeu vida própria e interpretaçãoindividual sempre foram seus narradores,que felizmente até hoje sãorepresentados por todos nós, queconvivemos com crianças e que nuncaabandonamos nossa própria infância, naqual estão escondidas as histórias queouvimos ou lemos pela vida afora…

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entre os personagens, separando bondade/maldade, beleza/feiúra, fraqueza/força, etc.

A existência da madrasta malvada, emoposição à mãe, ou da sua representanteextremamente bondosa, permite que seaceite melhor que em nossa mãe real, eem nós mesmos, convive essa dualidadeemocional; todas as crianças precisamdividir a imagem dos pais entre os aspectosbenevolentes e ameaçadores dos adultos,para que se sintam protegidas da violênciapela benevolência.

A presença, a função e a esperteza deseres pequenos e (ou) deformados tam-bém ajudam na compreensão de queseres menores podem vencer os maiores.A extrema feiúra da Fera, os seres metadebicho metade gente são exemplo disso.Os sete anões são protetores e amigos deBranca de Neve, como também são cui-dados por ela.

• O HERÓI FICA SOZINHO, sente-seabandonado e ameaçado, mas consegue,com ajuda externa, superar os obstáculos. Agrande mensagem aí contida é que o heróidos contos de fadas entra nas maiores bata-lhas para conseguir seu ideal, sem saber sesairá vitorioso ou não. Mas é essencial queele entre nas lutas, que enfrente os perigos,por maiores que sejam.

Outro aspecto muito importante, quea criança ainda não pode compreender,mas que os contos de fadas nos indicam,

é que os grandes conflitos humanos sãoorganizados na fantasia.

Vamos continuar aprendendo?E a literatura infantil contemporânea,por onde anda e qual é o seu papel?

Anda muito bem, por caminhos degrande qualidade artística e textual, poishoje contamos com excelentes escritorese ilustradores. Porém, não podemos deixarde celebrar nosso primeiro autor genuina-mente nacional, Monteiro Lobato, o criadordo “Sítio do Pica-pau Amarelo”.

É nesse espaço mágico que desfilam evivem suas aventuras alguns dos heróis dopassado, os personagens de contos defadas, e também figuras de nosso folclore,todos convocados pela menina Narizinho,seu primo Pedrinho e a incomparávelboneca Emília, uma das raras personagens-brinquedo que adquire magicamente afala, conseguindo revelar esperteza, inteli-gência e total autonomia, tanto nas atitudese invenções quanto na linguagem. Esse

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universo especial, situado entre o real e oimaginário, conta sempre com a parceriada maravilhosa Dona Benta e da fiel com-panheira tia Anastácia, que lidam muitobem com assuntos polêmicos, como acriação do mundo, as ideologias do séculopassado e as aventuras humanas do futuro.

Na literatura infantil das últimas déca-das expõem-se, com vigor e audácia,temáticas fortemente relacionadas a rea-lidades sociais atuais, como sugerem ostextos de autores consagrados, como, porexemplo, Ziraldo, que em “Menina Nina”nos encanta com sua abordagem sentidada morte de sua esposa, companheira de50 anos. Nesse livro, o autor aborda,além do amor em seu sentido plenamen-te vivido no cotidiano dessa avó com suaneta, suas próprias interpretações em re-lação à vida após a morte, dividindo coma neta essa difícil situação.

Mas, afinal, como vamos lidar com tudo isso?

Sabendo escolher, contar, e ler histó-rias – e também sabendo utilizar outrosrecursos artísticos e lúdicos, em uma in-teração prazerosa e afetiva, que relacio-ne narrador/texto/ouvinte sempreocupações didático-pedagógicas. Ashistórias são sempre fonte de prazer e dereflexão para todos nós.

Inicialmente, é bom selecionarmos ashistórias que mais nos encantam, apren-dendo a interpretá-las diante de nossascrianças; depois, em outra visita ao pas-sado, podemos retirar do baú encantadode nossa memória aquelas brincadeirassonoras, como as canções de ninar e deroda, as parlendas (ou alguém já seesqueceu do “rei, capitão, soldado,ladrão, moça bonita do meu coração”) edos trava-línguas, como o do “Rato roeua roupa do rei da Rússia…?”). A coletâ-nea “Quem canta seus males espanta” jáeditou dois volumes, com uma enormevariedade dessas preciosidades de nossofolclore, incluindo também antigas can-ções de roda, tudo maravilhosamenteilustrado e cantado por crianças peque-nas (acompanha CD com mais de 70composições).

Conforme Maria da Glória Bordini(1986):

“Das inúmeras possibilidades que se abrema quem está interessado no discurso poéticopara crianças, a mais animadora é a de queexiste um manancial inesgotável de textos emcirculação nas camadas sociais maisdiversas, referendado pela passagem dotempo e portador de uma sabedoria ingênua,reveladora das preocupações básicas dohomem. Trata-se da poesia infantil de origempopular, cuja autoria desapareceu damemória coletiva e que se transmite (ou seproduz) nas classes sociais dominadas, eespelhando seus interesses postergados.”

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Ao citar “interesses postergados”, aautora enfoca a importância do mundoimaginário como forma de escape ou deesperança em realização aos nossossonhos aparentemente impossíveis, oque é também defendido por BrunoBettelheim (1980). E, ainda com maisênfase, Maria da Glória nos fala da im-portância da tradição oral na formaçãodo processo narrativo.

De acordo com Maria José Palo eMaria Rosa D. Oliveira (1986), “o ato defalar é algo visceral ao ser humano”.Anterior à escrita, guarda muito do“mimetismo”: aquele que fala tentamostrar de forma imediata aointerlocutor o objeto de sua fala, atravésde vários canais simultâneos: palavra,entoação (ritmo), expressão corporal.Essa imagem inclusiva criada pela men-sagem oral atua instantaneamente, demodo a proporcionar a troca direta deexperiências entre os interlocutores.

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Os livros infantis multiplicam-setodos os dias, e é importante prestarmosatenção às reações das crianças, poisalguns deles mais parecem escritos paraadultos, prolongando-se em textos nemsempre atraentes.

Para escolhermos uma boa história, éimportante considerar que toda históriadeve ter personagens (reais, imaginários,“do bem”, “do mal”), cenário (um espa-ço, que pode ser cotidiano, como a ruaonde moramos, ou muito especial, como

De fato, quando contamos uma histó-ria, nosso entusiasmo aparece não só nanossa voz e em nosso rosto, mas o corpofala junto, pois nos movimentamos e faze-mos gestos que dizem tanto quanto as pala-vras…

Ao utilizarmos com as nossas criançasos recursos audiovisuais que apóiam anarração de histórias (gravuras, fanto-ches, CDs, fitas de vídeo e tantos outros),é importante lembrar que esses recursosvieram acrescentar-se à antiga arte decontar histórias, e nunca parasubstituí-la.

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o fundo do mar, ou um planeta des-conhecido), um tempo qualquer, mesmoque não esteja definido, como o eterno“Era uma vez…”, ações encadeadas (ascrianças precisam de um bom enredo,com muita ação) e um bom desfecho oufinal, que pode ser modificado conformeos narradores ou os ouvintes quiserem.Recordemos aquela menina que cantava:

Pela estrada afora eu vou bemsozinha levar estes docespara a vovozinha

Essa história, quando contada naIdade Média, não perdoava a desobedi-ência da Chapeuzinho, que era engolidapelo Lobo Mau e nenhum caçadoraparecia para salvá-la!

Mas isso é outra história, e quem podecontá-la é a teoria da literatura infantil.

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inclui, além de livros variados,almofadinhas ou tapetinhos, ou aindaoutros lugares confortáveis para as crian-ças se acomodarem. Deve ser o quecostumo chamar de “cestas básicas”:uma cesta, ou baú com fantasias tradi-cionalmente conhecidas, como de fada,de pirata, e um milhão de outras, umacesta com roupas e calçados de adultos,e outra (minha preferida), com panos,calçados, bijuterias e outros enfeites queestimulem as crianças a se representarcomo quiserem, transformando-se empersonagens diferentes e vivos, nos quaisfacilmente se encontram aventuras pron-tas a percorrer o mundo divertido dacriança e dos adultos que se deixarem

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Então, chegou a vez de os avóstambém entrarem em cena?

Certamente, vamos chamá-los paranossa rodinha, porque eles têm muito anos contar… E não estão sempreocupados como os papais e as mamães,que precisam trabalhar tanto!

Não custa nada, também, procurarem algum porão ou sótão os velhos livrosde gravuras, ou as fotos que contam ashistórias de nossos antepassados, nasquais estamos incluídos…

Todas essas atitudes entrelaçam nossomundo passado com o presente, tecendoa rede que embalará nossa históriafutura. Os atuais livros de imagens,com as notáveis contribuições deJuarez Machado, Eva Furnari e tantosoutros, também devem ficar por pertodas crianças.

Lembro uma noite em que,cansada de ler histórias para meuneto Érico, lanço mão, bocejando,de um desses livros sem texto,dizendo: “Olha só que lindo,agora quem sabe contar estahistória é a imaginaçãoda gente!”, e ouço, emresposta: “Tá, vó, masconta como é a tuaimaginação!”

Uma sala com bomambiente de literatura

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dos livremente, dobrados, ou até mordi-dos, sem prejuízo algum para a criança.São muito necessários para que ela come-ce a se relacionar com eles de formalúdica e prazerosa; há livros com ilustra-ções atraentes e coloridas, em páginascom relevo, com propostas que variam dogirar ao dobrar, ou abrir uma parte dagravura. Seguem-se os livros com frasescurtas e escritas em letras graúdas e varia-das, sempre tendo em vista o futuro leitor,que muito cedo vai descobrindo que,além das figuras, há outros elementos quenos contam as histórias.

atrair para o mundo fantástico das histó-rias, pois é só aí que seremos felizes parasempre…

Sugestões para uma bibliotecabem equipada

É importante compreendermos quenão há literatura fechada em faixas etá-rias distintas, embora alguns princípiosbásicos possam nos ajudar a escolher.

• Para bebês e crianças muito peque-nas, vamos oferecer os “livros para brin-car”: são os livrinhos de pano, plástico eoutros materiais que possam ser manusea-

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• Nesta e em outras fases, é importanteque o adulto mostre seu próprio encanta-mento pelas histórias, envolvendo a si e aseus pequenos ouvintes em narrativasinteressantes e atraentes.

Lembrem-se, literatura infantil não é feitapara ensinar valores, embora a maioria dashistórias tragam maiores ou menoresmensagens, escondidas ou escancaradas.Literatura, convém repetir, é obra de arte, deprazer, de fruição do mundo imaginário emque todos já moramos.

A listagem que se segue é apenas umaparte reduzida do que se pode considerarcomo literatura de boa qualidade, pois,como já afirmamos, a produção do livroinfantil se multiplica em quantidades queinviabilizam uma orientação efetiva.

É muito importante que adultos ecrianças visitem bibliotecas, não só asescolares, mas também as de outrasinstituições de suas comunidades.

As livrarias procuram não só ofereceros “livros da moda”, mas tambémacrescentar textos de boa qualidade,incluindo textos de autores consideradoscomo “clássicos da literatura”.

Selecionamos a seguir uma pequenalistagem do que está hoje no mercadoeditorial brasileiro, além dos autores já

citados no corpo do presente trabalho.

Antes da mais nada, voltamos a referira riqueza dos contos de fada, publicadosem diversas edições. A coleção “Era umavez…Grimm”, da Editora Kuarup, temmais de dez títulos publicados, comexplicações muito claras sobre os IrmãosGrimm e sua contribuição à literaturainfantil, com bibliografia de apoio ecomentários sobre as histórias, ilustraçõesbelíssimas e textos muito bem traduzidosdaquelas histórias que todos ouvimos enunca mais esqueceremos.

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Título / autor / editora

• Agulha ou linha, quem é a rainha? / Ma-chado de Assis / Projeto (recontado por P.Bentancur)

• O amigo da bruxinha / Eva Furnari /Moderna

• A arca de Noé / Vinícius de Morais / JoséOlympio

• As aves / Jean François Martin / ScipioneMarie Aubinais

• A bagunça da macaca / Paula Browne/Callis Editora

• Banho sem chuva / Ana Maria Machado /Melhoramentos

• Bom remédio / Tatiana Belinky / Ediouro• Bonequinha doce / Alaíde L. Oliveira / Lê• Bonequinha preta / Alaíde L. Oliveira / Lê• A bruxa Salomé / Audrey Wood / Ática• O cachorro e a pulga / Liliana e Michele

Iacocca / Ática• Feliz Aniversário, Lua / Frank Asch /

A&A&A / Coleção Crianças Criativas• Cadê o Júlio? / John Burningham / Moderna• Cai, cai, balão / Luís Duarte / Kuarup• Canção da tarde no campo / Cecília

Meireles / Global• Casa pequena / Ângela Lago / RHJ• João e o pé de feijão / Gian Calvi /

Global / Coleção Crianças Criativas• O ovo mais fantástico do mundo / Helme

Heine / Global / Coleção Crianças Criativas• A casinha pequenina / Ziraldo /

Melhoramentos• Chá de sumiço / Pedro Bandeira / Moderna

• Chapeuzinho amarelo / Chico Buarque /José Olympio

• Chega de beijos / Emma C. Clark /Salamandra

• A Cinderela das bonecas / Ruth Rocha / FTD• As cores e os dias / Ziraldo / Melhora-

mentos• O dia em que a Terra escureceu / Cláudio

Martins / Dimensão• Elefante? / Ruth Rocha / Melhoramentos• Escondida / Tudor Humhries / Ática• Eu era um dragão / Ana Maria

Machado / Global• Fada Fofa em Paris / Sylvia Orthof / Ediouro• A fada que tinha idéias / Fernanda Lopes

de Almeida / Ática• Dr. de Soto, o Rato Dentista / William Steig /

A&A&A / Coleção Crianças Criativas• Haroldo vira gigante / Crockett Johnson /

A&A&A / Coleção Crianças Criativas• Filó e Marieta / Eva Furnari / Paulinas• Flicts / Ziraldo / Melhoramentos• Folclore mágico / Ciranda Cultural• Fumacinha / Maria do Carmo Brandão / FTD• Galo, galo, não me calo / Sílvia Orthof /

Formato• O gato com frio / Mary e Eliardo França /

Ática• A girafa sem sono / Liliana e Michele

Iacoca / Ática• O grande rabanete / Tatiana Belinky /

Moderna• O Passeio de Rosinha / Pat Hutchins /

A&A&A / Coleção Crianças Criativas• Histórias de Trancoso / Joel Rufino dos

Santos / Ática

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• João e Maria / M. Company /R. Capdevila / Scipione

• O macaco medroso / Sônia Junqueira / Ática• Macaquices / Liliane e Michele Iacoca / Ática• A magia do brincadeiro / Mario Pirata e

Helena Schneiders da Silva / Mercado Aberto• A mentira da barata / May Shuravel / Paulinas• Monteiro Lobato / Nereide S. Santa Rosa

e Mica Ribeiro / Callis Editora• Nicolau tinha uma idéia / Ruth Rocha /

Quinteto Editorial

• No tempo dos meus bisavós / Nye Ribei-ro / Editora do Brasil

• Onde está o fantasma? / Hallie Wein /Editora Caramelo

• Um palhaço diferente / Sônia Junqueira /Ática

• O palhacinho Pim-Pom / Carlos Bauer /Paulinas

• O pato poliglota / Ronaldo SimõesCoelho / Ática

• Por quê? / Nicolai Popov / Ática• A porta / Cristina Von / Callis Editora• Quebra-língua / Ciça / Nova Fron-teira• Quem embaralha se atrapalha / Eva

Furnari / FTD• Quem espia se arrepia / Eva Furnari /

FTD• Quer brincar? / Eva Furnari / FTD• O rato da cidade e o rato do campo /

Girassol• O sapateiro feliz / Maria Clara Macha-

do / Ediouro• Se faísca, ofusca / Sylvia Orthof et al. /

Ediouro• O sonho da vaca / Sônia Junqueira /

Ática• Surpresas / Mary e Eliardo França /

Ática• Travadinhas / Eva Furnari / Moderna• O vento / Mary e Eliardo França / Ática• Você troca? / Eva Furnari / Moderna

Renoir: Ao piano, 1892

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Além de livros, o mercado contatambém com excelentes sugestões emCD, CD-Rom, fitas de vídeo e DVD.

Na internet, há sites adequados acrianças. A título de sugestão, procure em:

www.w3haus.com.br/chico/fabula

ou em www. ciberpoesia.com.br

ou em www.criancascriativas.com.br

Referências Bibliográficas

AGUIAR, Vera Teixeira de. Era uma vez…na escola – formandoeducadores para formar leitores. Belo Horizonte: FormatoEditorial, 2001.AMARILHA, Marly. Estão mortas as fadas? Petrópolis: Vozes,1997.BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. Rio deJaneiro: Paz e Terra, 1980.BORDINI, Maria da Glória. Poesia infantil. Série Princípios. SãoPaulo: Ática,1986.CADERMATORI, Lígia. O que é literatura infantil. ColeçãoPrimeiros Passos. São Paulo: Brasiliense, 1987.COELHO, Betty. Contar histórias: uma arte sem idade. SãoPaulo: Ática, 1986.LAJOLO, Marisa; ZILBERMANN, Regina. Literatura infantilbrasileira: histórias & histórias. São Paulo: Ática, 1985.MARTÍNEZ, Lucila; CALVI, Gian. Escola, sala de leitura ebibliotecas criativas: o espaço da comunidade. Coleção CriançasCriativas. São Paulo: Global, 2004.PALO, Maria José; OLIVEIRA, Maria Rosa D. Literatura infantil:voz de criança. São Paulo: Ática, 1986.RESENDE, Vânia Maria. Literatura infantil e juvenil: vivências deleitura e expressão criadora. São Paulo: Saraiva, 1993.

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Atividades de Estudo eAprofundamento

Maria Helena Lopes

• Você se lembra de alguma experi-ência marcante relacionada ao ato decontar ou ouvir histórias? Registre suasmemórias.

• Escolha um conto de fadas eidentifique suas características: o beme o mal, as grandes diferenças entre aspessoas e o herói solitário. Registre essaatividade com um ou mais colegas.

• Tente, invente, faça uma históriacujos personagens sejam você e seusalunos. Escreva e peça para as criançasque ilustrem.

• Continue criando com suas crian-ças. O desafio agora é fazer poesia.Lembre-se da citação de Drummondde Andrade no texto Brincar e Criar:“todas as crianças são poetas, e como tempo deixam de sê-lo”.

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screve meu nome?Janice Oliveira

“Bah! Pra escrever GIGANTE precisa de um infinito de letras.”

(ITL, 5 anos)

A criança começa a demonstrar inte-resse por ler e escrever desde muito cedo.E esse interesse não acontece pura esimplesmente para realizar “tarefas” deadulto, mas sim para que ela comece ainserir-se em nossa cultura como ser quepensa e interage com o seu meio. É claroque o interesse da criança será maior oumenor de acordo com a sua interaçãocom a escrita.

Atualmente, a maioria das criançasestá em contato com a escrita nos maisdiversos momentos. Seja qual for suaclasse social, a escrita se faz presente nasnecessidades de sua família: procurar umtelefone na lista, fazer umbilhete, ler um livro outomar um ônibus.

Considerando que anecessidade do serhumano em secomunicar,tanto

oralmente quanto por escrito, vem desdeo seu nascimento e que nossa culturaletrada lhe impõe a necessidade do usoda escrita, a escola deve estar preparadapara responder a tal necessidade, procu-rando conhecer como esse processocomeça a acontecer e o que fazer paraproporcionar espaços para a descoberta,a troca de informações, a elaboração dehipóteses e a evolução desse processo.

Para começarmos a pensar a respeitodo processo de construção da leitura eda escrita pelas crianças, precisamosconsiderar todas as suas manifestaçõessobre esse assunto como fundamental-mente valiosas para entendermos comoele acontece. Nos questionamentos dascrianças, nas suas hipóteses a respeitodo mundo da escrita e nas suas manifes-tações espontâneas, estão todas as indi-cações de que precisamos para elaboraruma proposta de trabalho que leve emconta a ludicidade natural – que muitasvezes é negada pela escola – presente naconstrução da língua escrita pela criança.Se a escola não estiver preparada parapropor situações que respondam aosquestionamentos e às necessidades dacriança, continuaremos tendo um aluno/ouvinte que “recebe” informações edificilmente sabe o que fazer com elas.Um aluno que aprende a negar o que jásabe e que, por toda a sua vida, espera-rá que alguém lhe mostre o quê ecomo fazer.

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Portanto, o desafio para a escola epara os professores, principalmente dospequenos, é inovar o espaço dedicado àalfabetização, começando peloconhecimento de como a criança apren-de a ler e escrever, para depois pensarem currículos e atividades querespondam a essa necessidade.

Qual o momento certo para a introduçãodas letras na aprendizagem infantil?

Para ilustrarmos esta questão de umamaneira bem simples, façamos um para-lelo entre o desenvolvimento daoralidade em um bebê e a “aprendiza-gem” da forma escrita de nossa língua.

Para que um bebê comece a falar, nãoé costume definir um momento certopara isso. Naturalmente, a criança vaiamadurecendo suas estruturas, fazendobalbucios e estabelecendo relações entreos sons do ambiente em que vive e osque é capaz de reproduzir. Mesmo queos adultos que rodeiam essa criança nãotenham a intenção de ensiná-la a falar,passam a estimular tais manifestações,com o intuito de que a sua fala evoluacada vez mais. Portanto, não se estabele-ce previamente o momento “certo” paraesse acontecimento. Os sons estão noambiente de convívio da criança, que ospercebe e utiliza para suas crescentesconstruções na aquisição da línguamaterna.

Se considerarmos a aquisição da falacomo a construção de um conhecimentoque acontece da mesma maneira que to-dos os outros que virão na vida de umacriança, chegaremos à conclusão de queo processo de construção da língua escri-ta poderá acontecer assim como osdemais. A língua escrita está colocadano ambiente da criança desde a maistenra idade.

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ser alfabetizada na educação infantil ouna primeira série. Fique claro aqui queestamos considerando não apenas ascondições de maturação biológica, mastambém a observação, a curiosidade e oquestionamento infantil acerca da utili-zação da escrita.

“No caso da aprendizagem da língua oral, osadultos que rodeiam a criança manifestamentusiasmo quando ela faz suas primeirastentativas para comunicar-se oralmente(...)Todos tentam compreender o que a criançadisse supondo que quis dizer algo(...) Quandoa criança faz suas primeiras tentativas paraescrever, é desqualificada de imediato porquefaz ‘garatujas’. (...) Ninguém tentacompreender o que a criança quis escrever,porque se supõe que não possa escrever nadaaté ter recebido a instrução formal pertinente.”

Emília Ferreiro

Letramento – Função Social da Escrita

Aprender a ler e escrever não signi-fica apenas estar a par de um códigocomum de comunicação. O fato deaprender a decodificação de um textoescrito por outros não implica inter-pretação ativa e crítica do conteúdoescrito. Paulo Freire já escrevia, prin-cipalmente sobre alfabetização de a-dultos, que na leitura da palavra deveestar inserida também a leitura domundo.

Utilizamos a escrita para nos comuni-carmos das mais diversas formas, sendotodas elas bem explícitas para a criança,ou seja, nosso ambiente é naturalmente“letrado”. Temos jornais, revistas,televisão, livros, rótulos de produtos ebilhetes sempre rodeando o cotidiano dacriança. Isso não significa dizer que elaestá o tempo todo observando e estabele-cendo relação entre o que sabe e o quevê, mas sim que não conseguimos perce-ber o momento exato em que tais obser-vações passam a fazer sentido para ela.Assim, é impossível estabelecer comprecisão se a criança estará pronta para

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“Há que se alfabetizar para ler o que osoutros produzem ou produziram, mastambém para que a capacidade para ‘dizerpor escrito’ esteja mais democraticamentedistribuída. Alguém que pode colocar nopapel suas próprias palavras é alguém quenão tem medo de falar em voz alta.”

Emília Ferreiro

A partir do momento em que a criançapercebe que leitura e escrita cumprem umpapel importante no seu ambiente, suacuriosidade a respeito do assunto pareceaguçada. Passa, então, a “precisar” escre-

ver para fazer sua marca. Começam aser mais freqüentes as perguntas emtorno do assunto e têm início asprimeiras manifestações de hipóteses.Desde a postura do adulto, queposiciona a cabeça, movimenta osolhos e/ou o pescoço, segura o lápis e olivro, até a reprodução de pequenostraços que já trazem o movimento daescrita como característica começam aser imitados.

Para pensar!!!

Quando estiver escrevendo algumbilhete ou fazendo anotações em seucaderno de registros, perceba como algunsde seus alunos observam. Sem dar-se conta,você está mostrando a seus alunos que aescrita tem uma função muito importante ecabe à escola, através do seu trabalho,mostrar que função é esta e propor o encami-nhamento dos questionamentos dos alunos aesse respeito.

“Refiro-me a que a leitura do mundo precede sempre a leitura da palavra e

a leitura desta implica a continuidadeda leitura daquele.(...)Este movimento dinâmico é um dos aspectoscentrais, para mim, no processo dealfabetização.”

Paulo Freire

As ações de entender, interpretar, julgar,atribuir valor e fundamento ao que é lido etambém escrever, registrar, deixar a suamarca, é que realmente trazem o significa-do de leitura e escrita.

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Além do despreparo da escola paraenfrentar os novos tempos, em que acriança está exposta a diversas fontes deconhecimento, principalmente através datelevisão, temos a questão de que ascrianças cujas famílias não têm umarelação estreita com o uso da escritaapresentam menos desenvoltura para autilização dessa linguagem. Crianças quevêm de famílias que utilizam a comuni-cação escrita com freqüência e

exemplo, utilizar qualquer objeto parapentear o cabelo, simulando uma esco-va, ou desenhar um elefante sem que,para isso, o animal precise estar na suafrente.

A utilização do grafismo não se res-tringe apenas ao entendimento de queele comunica algo, mas também de queele está ligado a um processo interno derepresentação mental e a um simbolismoque já existe na criança antes mesmo deela pensar em escrever.

Utilizando a psicogênese da línguaescrita como embasamento, passamosaqui a apresentar as etapas de constru-ção de hipóteses de escrita que a criançautiliza até que esteja completamentealfabetizada. De acordo com essa teoria,os níveis denominados não têm a

qualidade evoluem mais rapidamentetambém em outros aspectos. Esse fatoaponta para a importância do trabalhocom leitura e escrita já na EducaçãoInfantil, sobretudo nas escolas queatendem crianças vindas de famíliasmenos favorecidas.

Como Acontece o Processo deConstrução da Escrita

A partir da construção da representa-ção mental do mundo que a rodeia é quea criança passa a ter condições de utili-zar símbolos que lembrem o que querrepresentar. Começam a surgir as brinca-deiras de faz-de-conta, que são oexemplo maior de que tal noção estátotalmente instaurada. Especificandomelhor essa questão, salientamos que,para que a criança seja capaz de entendero uso da escrita como representação dalinguagem (hipótese falsa, masnecessária), é importante que ela já sejacapaz de utilizar outros símbolos parademonstrar o que pensa, como, por

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intenção de categorizar as criançasevolutivamente, mas sim de auxiliar oeducador a perceber as manifestações dacriança, para que ele possa então propordesafios e desequilíbrios construtivos àscrianças.

Níveis de Evolução da Escrita

Segundo Emília Ferreiro (1995), osníveis de evolução da escrita são osseguintes:

Pré-silábico: a escrita é representação darealidade. O que se escreve é o objeto, não apalavra. A criança não busca qualquer corres-pondência entre grafias e sons.

Estes seriam os primeiros pensamen-tos da criança nessa grande descoberta

Silábico: a criança descobre que o que seescreve é a palavra, e não o objeto. Nãoestabelece ainda a correspondência precisaentre os sons e o número de letras para compora sílaba. É possível estipular que qualquer letrapode servir para qualquer som, mas considera aexistência da sílaba.

Silábico-alfabético: é uma fase de transi-ção. A criança começa a perceber que a umasílaba não corresponde exatamente apenasuma grafia.

Alfabético: a criança compreende o siste-ma estabelecido e pode-se dizer que adquiriua conceitualização da alfabetização.

Ortográfico: é o momento deconhecimento das regras de ortografia.

que é a escrita. Primeiro, ela precisadiferenciar o desenho da escrita. Quandolemos livros para nossos pequenos,repetimos uma linguagem que não tem amesma freqüência e entonação que afalada. Tal fato começa a dar para acriança a possibilidade de pensar que aprofessora está lendo, e não falando.

Para pensar!!!

Quantas vezes seus alunos pedem: “Profe,agora conta esta história!?” E, quando vocêcomeça, eles dizem: ”Mas não é assim! Contacomo está aí?” Se perguntar a eles onde estádesenhado e onde está escrito, como será queresponderão? E livro sem figura? Dá para ler?

Por volta dos 18 meses, é muitoimportante para a criança começar aouvir contar, criar, sozinha ou coletiva-mente, histórias infantis que possibilitema sistematização da representação mentale também o princípio do entendimentode que a linguagem escrita, assim comoo desenho, também representa algumacoisa que não está ali, que já aconteceuanteriormente àquele momento.

Após esses primeiros contatos, a criançapassa a perceber que texto e figura sãocoisas diferentes. E, se pedirmos para ascrianças escreverem o nome do quedesenharam, teremos algo como ailustração ao lado.

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Se as crianças já conseguem realizaralguns signos, chamando-os de letras,percebemos que elas utilizam uma quan-tidade de no mínimo três letras e umavariação entre as que ela já conhece. Ouseja, se escrevermos AR e perguntarmospara elas se dá para ler, responderão quefaltam letras para que seja possível estarescrito ali alguma coisa.

Uma outra característica importantenesse primeiro nível de desenvolvi-mento é que as criançasacreditam que o que seescreve é o próprioobjeto, e nãoapenas o

seu nome;assim, carro deve ser umnome muito grande ecamiseta um nome bempequeno.

Os exemplos que citamos até aquiestão inseridos no nível pré-silábicodo processo de construção da escrita.

Posteriormente, a criança começa aperceber os sons que pronuncia numapalavra e utiliza uma letra para marcarcada sílaba da palavra. Podem ser ou nãoas letras contidas na palavra, o que irá

variar de acordo com a evolução dacriança no mesmo nível e também doconhecimento que ela já possui sobre oalfabeto. Esse próximo nível é chamadode silábico.

Aqui é importante salientar que ahipótese silábica, embora falsa (poisnossa escrita não se dá dessa maneira), énecessária, porque é a partir dela que acriança começará a perceber que existe

algo mais na palavra que nãoapenas as letras mais sonoras.Para que a criança evolua dafase anterior, pré-silábica,em que usa muitas letras

pararepresentar umapalavra, para asilábica, temos queproporcionarsituações em queela consigaescutar o quefala. Abrincadeira de

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bater palmas para palavras escolhidaspelo grupo, salientando a quantidadede sílabas, é uma atividade bastanteprazerosa e contribui para a evoluçãode um nível para o outro.

Quando a criança já consegue reco-nhecer muitas letras do alfabeto e utilizá-las da maneira adequada na palavra,embora ainda esteja no nível silábico,dizemos que ela está utilizando as letrascom valor sonoro, ou seja, quandoaparece o som do A, ela utiliza essa letrae assim por diante.

No próximo momento do processo, acriança poderá encontrar-se em doisníveis ao mesmo tempo. Ela ainda utilizauma letra para representar cada sílaba,mas já consegue perceber que existemoutras letras na palavra que pronuncia.Esta é a passagem do nível silábico parao silábico-alfabético.

Posteriormente, a criança vai para onível alfabético, no qual ela já consegueidentificar a maioria das letras necessáriaspara escrever uma palavra, faltandoapenas as letras que estão relacionadascom a ortografia de nossa língua, como ouso de X e CH, RR, LH, Ç, e também acorreta acentuação gráfica.

Por último, apresenta-se o nívelortográfico, no qual as crianças já têmcondições de se colocar a par de todo ofuncionamento da língua portuguesa

com todas as suas regras. Estas já sãocrianças maiores (por volta dos 7 anos).

Cabe ao educador, após entendercomo esse processo acontece, proporcio-nar à criança atividades que desafiem

suas hipóteses e seus conhecimentosacerca da escrita.

Papel da Escola e do Professor

Trabalhando com crianças em tornode 18 a 24 meses, comecei a introduzir o

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momento de hora do conto já no iníciodo ano, desencadeando um processo deintensa curiosidade a respeito dos livrose da literatura infantil. Passamos, então, areproduzir as hitórias que mais agrada-vam, pois eram solicitadas repetidamente

como a “Branca de Neve e os SeteAnões” e “Os Três Porquinhos”, dediversas formas: por meio do livro, dedramatização com teatro de sombras,fantoches, etc. O desenvolvimento dalinguagem nesse grupo evoluiu a olhosvistos e os personagens começaram a

“aparecer” em todas as garatujas dascrianças. Organizei com o grupo livrosinterativos que recontavam a história deuma maneira bem simples. Os persona-gens, feitos de papel e colados em umpalito, passeavam pelas folhas dos livros,contando a história que já estava escritapreviamente por mim. Cada vez quecontávamos a história, as crianças pode-riam perceber que havia uma “linguagemde texto” que não é a mesma quandofalamos. Dessa forma, já estamos propor-cionando espaços de “leitura” paranossos pequenos alunos.

Inserindo a leitura e a escrita emnossa sala de atividades de maneiraintencional, estaremos criando ochamado “ambiente alfabetizador”. Esseambiente não é aquele que está cheio deletras penduradas nas paredes, as quaisnão fazem o menor sentido para ascrianças, porque não recorrem a essasletras para nada. Ambiente alfabetizadoré aquele em que a leitura e a escritaestão presentes em toda a sua essência.Quando lemos diariamente para nossosalunos, sejam histórias, cartas, revistasou jornais, estamos proporcionando esseespaço. A curiosidade sobre o que aprofessora lê é aguçada e todos come-çam a tentar “descobrir” o que estáescrito aqui e ali.

O momento da roda, em que todos sereúnem para conversar, é o mais propíciopara essa exploração. Podemos ler

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recados, matérias importantes do jornalou a “história do dia”, sem precisarnecessariamente realizar algum“trabalhinho” após a leitura.

Quando entramos em uma sala deeducação infantil, percebemos que todosos objetos da criança estão identificadoscom seu nome. Essa iniciativa propõe umexcelente início de trabalho, pois, alémde abordar a identidade da criança,possibilita o conhecimento das letras,tanto do seu próprio nome como os doscolegas, além de outras formulações dehipóteses a respeito da escrita. Um avan-ço que podemos propor às crianças éque elas percebam, num primeiro mo-mento, que crianças menores podem ternomes grandes e vice-versa, possibilitan-do a evolução da criança, que, comovimos anteriormente, está num nível emque acredita que o nome do objeto deveser do tamanho do objeto.

Em outro nível, dependendo da evolu-ção das crianças, podemos deixar folhas elápis a seu alcance para que possam optar,no momento do brinquedo livre, por exem-plo, por brincar também de escrever.Assim, a criança passa a utilizar o dese-nho e suas hipóteses de escrita de modomais freqüente e espontâneo.

A criação de livros de história, tantoindividual como em grupo ou acompa-nhada pelo professor, é outra atividadeque sempre produz excelentes resulta-

dos. O fato de existir um “escriba”, quepode ser o educador ou alguma criança quejá consiga escreve melhor que as outras,começa a mostrar ao grupo que o que seescrever pode ser transmitido a outraspessoas.

Particularmente, sempre gostei deinventar histórias com minhas crianças.A partir de um tema de casa que pediafiguras de revistas em que o nome come-çasse com determinadas letras, criamosum livro de histórias que foramelaboradas em grupo, sendo que cadaum escolhia uma figura para dar conti-nuidade a nossa história. Combinamosanteriormente os critérios para essahistória: ela deveria fazer sentido namudança de uma “cena” para outra edeveria conter coisas engraçadas. Dadosesses critérios, criamos várias históriasque passaram a circular por toda a escola,e os outros grupos já ficavam esperandoqual seria a próxima aventura queinventaríamos.

Depois disso, as próprias crianças jácomeçam a tentar escrever de sua ma-neira, pois se sentem respeitadas nassuas tentativas de evoluir. Passam, então,a fazer suas próprias criações.

O quadro a seguir mostra um resumodo que Emília Ferreiro propõe como enri-quecimento do espaço pedagógico, quepossibilita o desenvolvimento do processode construção da escrita na criança.

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Experiências alternativas de alfabe-tização de crianças:

a) Restituir à língua escrita seucaráter de objeto social.

b) Desde o início (inclusive nacreche), aceita-se que todos na escolapodem produzir e interpretar escritas,cada qual em seu nível.

c) Permite-se e estimula-se que ascrianças tenham interação com alíngua escrita nos mais variadoscontextos.

d) Permite-se o acesso, o quantoantes possível, à escrita do próprionome.

e) Não se supervaloriza acriança, supondo que de imediatocompreenderá a relação entre aescrita e a linguagem. Tampouco sesubvaloriza a criança, supondo quenada sabe até que o professor lheensine.

f) Não se pede de imediatocorreção gráfica nem correção.

Referências Bibliográficas

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto.Secretaria de Educação Fundamental. ReferencialCurricular Nacional de Educação Infantil. Brasília:MEC/SEF, 1998.CASTORINA, José Antônio; FERREIRO, Emília;LERNER, Delia; OLIVEIRA, Marta Kohl. Piaget –Vygotsky: novas contribuições para o debate. SãoPaulo: Ática, 1997.CRAIDY, Carmen; KAERCHER, Gládis. (Org.)Educação Infantil – Pra que te quero? Porto Alegre:Artmed, 2001.FERREIRO, Emília. Com todas as letras. São Paulo:Cortez, 1993.FERREIRO, Emília; TEBEROSKY, Ana. Psicogênese dalíngua escrita. Porto Alegre: Artmed, 1985.FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. São Paulo:Autores Associados, Cortez, 1987.

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Portanto, a função da escola, econseqüentemente do professor, deve sera de criar espaços para que as criançastenham liberdade de manifestação etambém buscar instrumentos suficientespara entender essas manifestações eproporcionar a continuidade desseprocesso de evolução.

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Atividades de Estudoe Aprofundamento

Maria Helena Lopes

• Ilustre o quadro dos níveis de evolu-ção da escrita, segundo Emília Ferreiro,com representações gráficas de crianças.Faça um painel ou cole no seu caderno.

• Faça o relato de um dia de ativida-des com as crianças no Centro de Educa-ção Infantil, desde a chegada até a horada saída. Identifique momentos em que

as crianças estão sendo estimuladas adesenvolver o gosto pela leitura e pelaescrita.

• Proponha a um grupo de crianças, apartir de 3 anos, que faça um desenho.Depois de pronto, peça que elas“escrevam” o nome de cada objeto dodesenho (do seu próprio jeito). Observese há diferença do traçado das criançasquando desenham e quando escrevem.Relate a experiência, registrando o seuentendimento sobre o que observou.

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atureza, Cultura e Sociedade

Será que existe ou já existiu vida emMarte? O que significam os achados daciência e da tecnologia no chamado “pla-neta vermelho”?

Nosso planeta, a Terra, é cheio deVIDA. Aqui temos espaço, todos ostamanhos e formas de seres vivos, o quedesperta nossa curiosidade sobre asformas de adaptação e sobrevivência decada uma delas.

Este planeta é nosso! Vamos dar asmãos e, juntos, cuidar dele!

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atureza, Cultura,Sociedade e suas

TransformaçõesCleonice de Carvalho Silva

Nenhuma ciência é maiordo que a de estar vivo. Carlos Nejar

Os últimos séculos foram marcados pormuitas transformações e, entre elas, seencontra a busca de novas maneiras de ohomem viver em sociedade e estabelecerrelações com o meio ambiente. Junto comessas transformações, surgiram mudançasnas formas de percepção e classificaçãodo mundo natural. O ser humano deixou

de perceber a natureza como um sersagrado com vida própria, como erapercebida anteriormente, e passa a do-miná-la e explorá-la, com a ajuda datecnologia. Essas transformações podemser situadas principalmente no campocientífico-tecnológico, mas também noscampos cultural e político das relaçõesda sociedade moderna. A partir desseprocesso de transformações e do cresci-mento acelerado da sociedade industrial,com o desenvolvimento tecnológico,houve um aumento dos riscos provoca-dos pelas conseqüências de uma socie-dade moderna demasiadamenteconsumidora. Contudo, foi nos últimos200 a 300 anos que ocorreram as princi-

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pais transformações e as principaisseparações entre o homem e o meioambiente. O homem transforma o meioambiente em que vive desde o início dostempos, como qualquer outro ser vivo. Apartir do século XVI, porém, essas trans-formações passaram a ocorrer de umamaneira muito rápida, impedindo que anatureza pudesse criar mecanismos deauto-sustentação ou reorganização. Omeio ambiente era considerado umalmoxarifado de recursos sem fim.

No século XV, já podíamos ter umanoção das mudanças sociais, políticas,econômicas e culturais que se avizinha-vam. Chegaram também as novas ciên-cias com suas tecnologias, o dinheiro deuma burguesia em ascensão, a possibili-dade das grandes navegações com a

criação de novos mercados, masprincipalmente, a ligação do globo comoum todo, num processo de globalizaçãosem precedentes. Essa primeiraglobalização modifica de maneirairreversível o planeta Terra e funda, comodiz Edgar Morin, a era planetária. Noexato momento em que se inaugura a eraplanetária, apagamos a nossa origemterrena. Uma visão de desenvolvimentoacelerado ganha corpo, causando umrompimento entre o homem e a nature-za. Diante dessas perspectivas,constatamos que não existia a menorpreocupação com a preservação domeio ambiente, visto que elerepresentava apenas uma fonte derenda. Desse modo, o homem passa aconsiderar que a natureza deve ser domi-nada. E, com essa intenção, ela é dividi-da e fragmentada. A dominação doambiente, necessidade do homem mo-derno, o retira do próprio ambiente: amesma revolução que globaliza ohomem o faz um ser estranho à Terra.A riqueza aumenta na ordem direta dadestruição da natureza dominada. Aespécie humana se expande e tomatodos os lugares do planeta. Tomamosposse de uma Terra que nos deu a vida enem nos sentimos umbilicalmente liga-dos a ela. Podemos dizer, portanto, que ocordão umbilical foi cortado e escraviza-mos a própria mãe.

O século XX traz em si fontes dedualidades. A esperança de paz traz aguerra mundial. A tecnologia deixa a vida

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O senhor mire e veja o mais importanteO bonito do mundo é isto:que as pessoas não estão sempre iguais,não foram terminadas – mas que elas vãosempre mudando.Isto me alegra.

Guimarães Rosa – Montão

Referências Bibliográficas

GONÇALVES, F. S. Interdisciplinaridade e construção coletiva doconhecimento: concepção pedagógica desafiadora. Educação esociedade, v. 49, p. 468-484, 1994.MORIN, Edgar. Ecologia e revolução. In: Ecologia: caso de vida ou demorte. Lisboa: Moraes, 1979.UNESCO, Brasília. Os sete saberes necessários à educação do futuro. SãoPaulo: Cortez, 2000.

mais fácil e traz a morte, retratada nopoder atômico de uma bomba. Aeconomia traz a prosperidade e a pobrezaplanetária. O consumo traz o “acesso e aexclusão”. E a origem dessa dualidadepode ser percebida no racionalismo. Afome inesgotável de poder e o consumoencontram-se estritamente relacionados àprofunda falta de sentido de nossas vidas.Nossa exclusão do mundo natural gerouum mundo desconexo, fragmentado, fora decontextos históricos e evolutivos, que a-meaçam nossa vida no planeta. A educa-ção ambiental integrada traz a proposta daunião do homem à natureza, mas não comodominador ou dominado, e sim como parteintegrante do planeta onde é importante co-nhecer, participar e agir para construir umfuturo melhor.

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Atividades de Estudo eAprofundamento

Maria Helena Lopes

O resgate do passado é necessário atodo processo de construção de identidadepessoal ou cultural. Saber a origem dascoisas, as transformações ocorridas atravésdos anos e dos séculos; enfim, a históriarecente ou distante é importante para aconstrução do presente e para a preserva-ção de valores culturais de uma civilizaçãoou cultura.

A valorização do que foi vivido porgerações e as histórias de “outrora” que osidosos têm a contar são relevantes a todoesse processo de resgate de identidade.

Vamos Fazer Entrevistas?

• Que tal organizar com as criançasalgumas perguntas para fazer aos idososde sua comunidade? Eles podem vir aoCentro Infantil ou serem visitados emseus lares. Os vovôs e vovós gostam derelembrar o passado e têm muita sabedo-ria a nos ensinar. Sentem-se também

valorizados e úteis quandotransmitem suas experiênci-as às pessoas e,principalmente, aospequeninos, que ouvemseus “casos” com muitacuriosidade.

As perguntas podem sersobre as relações sociais, astransformações tecnológicas, aproximidade com a natureza,etc.

Alguns exemplos: Comoas pessoas viviam quandonão havia a televisão paratrazer informações? Equando não existia ageladeira nem o telefone?Como viviam as famílias?De onde vinham osalimentos que as pessoasFo

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consumiam? Estas são apenas algumasperguntas. Ponha a sua imaginação e adas crianças a trabalhar elaborandomuitas perguntas aos mais velhos.

• Faça um livro ilustrado comdesenhos das crianças contando todas ashistórias relatadas pelas vovós e pelosvovôs.

A imaginação faz parte do jogo sim-bólico infantil. Ao brincar, as criançascriam situações fictícias, transformandoo significado das coisas a sua volta ouimitando as ações dos adultos. Quantomaiores forem as experiências de jogo eexploração, tanto mais produtivas ecriativas serão as idéias dascrianças.Também ao criar atividades paraque as crianças expressem idéias novas,você estará auxiliando o desenvolvimen-to da imaginação criadora.

• Vamos agora criar jogos de imagi-nação. Peça às crianças que fechem osolhos e pensem: como eram as cidadesquando não existiam automóveis eônibus? Como as pessoas se vestiamquando não existiam tecidos para fazerroupas? Como eram os brinquedosquando não existia o plástico?

A brincadeira do túnel do tempotambém estimula a imaginação. Viajandoatravés dele, podemos chegar ao tempoem que os índios viviam nas florestasou em lugares onde a terra é cobertade gelo...

• O túnel do tempo pode ser dramati-zado pelas crianças, ao mesmo tempoem que expressam as idéias que tiveramdurante a “viagem”.

• Não se esqueça de escrever sobreas idéias mirabolantes apresentadaspelas crianças.

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Maria Helena Lopes

“Compreendemos que a educação ambientaldeva ter como ponto de partida asensibilização com relação à natureza, à vida.Mas qual o significado desta ‘sensibilização’?Trata-se de um modo de conhecer:1) que relaciona uma determinada emoçãocom os sentidos corporais, no contato com anatureza: esta emoção é o amor;2) que confere um valor intrínseco ao estarvivo, ao estar participando de uma Vida quenos transcende;

Sérgio Sardi – As Linhas Inspiradoras para a Educação Ambiental Infantil

No “começo de tudo”, quandohomem e universo iniciaram sua trajetó-ria, conviviam em plena harmonia. Anatureza era o lar, que abrigava, dava decomer, ensinava... Com o passar do

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3) que, indo além das palavras, suscita aadmiração;4) que funda uma ética do respeito e não-dominação, propiciando uma convicção queconduz a mudanças de comportamento emtermos de uma educação ambiental. Masdecerto é necessário passarmos pela vivênciade um contato com a natureza, capaz desuscitar em cada um o sentido de umasensibilização, enquanto conhecimentofundado no amor.”

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tempo, essa ordem foi alterada pelohomem, involuntariamente é claro.Deixando a sabedoria de lado e ignoran-do a dualidade homem/natureza, nossosancestrais iniciaram um processo dedestruição em todo o planeta Terra.Passaram-se muitos anos até que acivilização recuperasse o respeito pelasárvores, pelos mares, pelo ar que respira-mos. Na realidade, hoje sabemos quenecessitamos do equilíbrio ambientalpara continuar vivendo.

A Educação Ambiental procura des-pertar a consciência das relações entretodos os seres do universo, concebendoo homem como um elemento entretantos outros.

Hoje, após duas ou três décadas demovimentos que defendem a preservaçãoda natureza, felizmente podemos afirmarque alguns avanços já são realidade eque podemos ter esperanças.

O diálogo com as crianças poderáacelerar o processo de reconquista dasrelações harmoniosas entre os humanose o mundo mineral, vegetal e animal.

Para isso, alguns valores devem serintrojetados, como o amor, a necessi-dade de contemplação à beleza dospássaros e das flores. Devemos simextrair da Terra o que ela tem para nosoferecer, porém sem ganância e com acerteza de que nossa solidariedade éimprescindível.

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O resgate dos valores humanistas e areconstituição do que foi devastado noplaneta são os pilares da EducaçãoAmbiental, cujos princípios básicos,definidos pelo Conselho Nacional doMeio Ambiente (CONAMA)1, são:

– o enfoque humanista, holístico,democrático e participativo;

– a concepção do meio ambiente emsua totalidade, considerando ainterdependência entre o meio natural,sócio-econômico e cultural, sob oenfoque da sustentabilidade;

– o pluralismo de idéias e concepções

pedagógicas, na perspectiva da inter,multi e transdisciplinaridade;

– a abordagem articulada das ques-tões ambientais locais, regionais,nacionais e globais.

Por trás da importância atribuída àeducação ambiental, está o conceitoaparentemente óbvio, mas central nabusca do desenvolvimento sustentávelda natureza: só se preserva o que seconhece, ou melhor, ninguém ama oque não conhece.

A idéia de envolver a comunidadea partir da escola representa uma dasevoluções mais importantes nostrabalhos da Educação Ambiental. E osresultados são animadores. Levar aoconhecimento da comunidade escolarassuntos como a importância dos rios, adespoluição ou a não-poluição dosmesmos, a coleta seletiva de lixo, osproblemas da pesca e da caça predató-ria, o desperdício da água e da luz elétri-ca, denunciar o tráfico de animaisselvagens, como diziam os ecologistasprecursores dos anos 70, é “pensar glo-balmente e agir localmente”, é realizarações individuais e coletivas.

Existe a possibilidade de administrar omeio ambiente. O problema é sabercomo e quem irá fazer isso. Todos gos-tam de uma rua limpa, de um jardim

1Política Nacional de Educação Ambiental, Lei nº 9.795, de 24/04/1995.

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bonito. Todos percebem quando o desen-volvimento econômico desenfreadoestraga a natureza. Não devemos apelarpara exageros, não adianta dizer “não”toque a natureza; ela precisa sim é serpreservada, para que a dualidadehomem/natureza se restabeleça.

Alguns relatos de conversas comcrianças podem nos ajudar na compre-ensão de como tornar realidade a Educa-ção Ambiental.

A educadora:– O que devemos fazer para não

maltratar a natureza?

As crianças:– Não arrancar árvores.– Não botar fogo, porque mata os

animais, as plantas e não nasce maisnada ali.

– Não jogar lixo na água, porque nãopodemos viver sem água e os peixesmorrem.

– Não matar e prender os pássaros,pois eles comem frutas e suas sementessaem no cocô do pássaro, e faz nasceroutras plantas.

– Então o cocô da galinha faz nascermilho? comenta Egon.

A educadora: – O que temos que fazer para

cuidar da natureza?

As crianças:– Fazer passeatas.– Plantar outras árvores.– Pedir para as pessoas não

destruírem a natureza.– Lixo é no lixo.– Garrafa, lata, plástico, roupa não é

alimento para a terra.

No início deste texto, afirmamos queainda há uma centelha de luz, iluminan-do as mentes e os sentimentos dos ho-mens, e que nem tudo está perdido. Aindagação da educadora às crianças de-monstra que os pequeninos já estão sen-sibilizados para os problemas ambientaise, mais, já detêm informações preciosassobre os cuidados e a necessidade depreservar a mãe natureza.

Os meios de comunicação têm contri-buído determinantemente na difusão dasidéias em favor do respeito ao meio ambi-ente. Os movimentos sociais organizadosno mundo inteiro foram precursores nodespertar da consciência ecológica. Osresultados são evidentes no pensamentodas crianças. Sua sensibilidade ao belo,ao poético, ao pueril, faz com quesejam catalisadoras de toda mensageme apelo ecológico.

Outro referencial para a educação sãoos Temas Transversais, que integram os

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Parâmetros Curriculares Nacionais2.Incluem a temática do Meio Ambiente,juntamente com Ética, Saúde, Orienta-ção Sexual e Pluralidade Cultural, comotemas que perpassam todas as atividadesescolares, devendo seus princípios seremde domínio de todos os educadores paratransitarem no dia-a-dia da escola.

Os conteúdos da educação para omeio ambiente confundem-se na Educa-ção Infantil com os das Ciências: osfenômenos da natureza, as águas, asmontanhas, o modo de viver dos grupossociais. Esses assuntos podem serenfocados também do ponto de vista dasua importância para a preservação do

ecossistema ou para a compreensão dadiversidade cultural.

Nossa orientação aos educadores dainfância dá ênfase à convivência fraternaentre as pessoas e a natureza. Convivên-cia essa que certamente contribuirá paraa solidariedade e a compreensão douniverso humano em toda a sua comple-xidade, dando sentido a todas asexperiências do cotidiano das crianças.

A observação, a exploração e apossibilidade de desfrutar do meionatural se constituem em experiênciasimprescindíveis para o desenvolvimentoda consciência ambiental.

2Parâmetros Curriculares da Educação Nacional. Ministério da Educação, Brasília, 1999.

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O contato com pequenos animais,como formigas, tartarugas, passarinhos,peixes, coelhos, pintinhos, e as tarefas decuidado e criação, sempre com o acompa-nhamento da educadora, além de sensibili-zar as crianças, porque desenvolvemsentimentos de afeto com os animai-zinhos, também são oportunidades deelevar o nível de conscientização sobre omeio ambiente.

Criar canteiros com folhagem e flores,plantar pequenas hortas, acompanhar seucrescimento e suas transformações, cui-dar, regar, observar a ação dos insetosnos vegetais, também são atividadesestimuladoras e enriquecedoras paraas crianças. Assim, elas podemgradativamente desvendar uma percep-ção integrada delas próprias com anatureza, sentindo-se parte e agindosobre ela.

A natureza mostra que as grandesárvores nascem de pequenas sementes.Talvez esteja depositada em nossascrianças, assim como nas sementes, aesperança de resolução dos problemasambientais.

Referências Bibliográficas

ALVES, Rubem. Quando eu era menino. São Paulo: Papirus,2003.AMORIM, Elizabeth. A dimensão do cuidado essencial no fazerpedagógico infantil como exigência primeira na construção dacidadania planetária. São Leopoldo: UNISINOS, 2002.Dissertação de Mestrado, Centro de Ciências Humanas.DIAS, Genebaldo Freire. Educação ambiental: princípios epráticas. São Paulo: Editora Gaia, 1992.DÍAS, Alberto Pardo. Educação Ambiental como projeto. PortoAlegre: Artmed, 2002.SARDI, Sérgio A. Linhas inspiradoras para a educação ambientalinfantil. In: PELIZZOLI, M. A emergência do paradigmaecológico. Petrópolis: Vozes, 1999.

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Atividades de Estudo eAprofundamento

Maria Helena Lopes

Não me esqueci não. Prometi a vocês, faztempo, que iria contar como era o mundo emque eu vivi, quando menino. Falei sobre o“lixão” (mil vezes mais terrível que o“apagão”) só para dizer a vocês que lá na roçaonde eu vivi não havia lixo não.

Porque não havia essas coisas que oprogresso produziu e que vão se acumulando,acumulando...

Havia coisas que a gente jogava fora sim.Mas elas eram biodegradáveis.

Imagino que vocês nunca ouviram essapalavra. “Bio” vem do grego bios, que querdizer “vida”.

Biodegradável é aquilo que pode ser“comido” pela vida, aquilo que é alimento paraa vida.

Por exemplo: as folhas mortas, numafloresta, são comida para o solo.

O solo come as folhas mortas e elas, asfolhas mortas, transformam-se em fertilidadepara o solo. Do solo assim fertilizado nascemoutras árvores. A natureza tem esse podermaravilhoso de transformar a morte em vida.

Rubem Alves – Quando eu era menino

• A citação acima nos sugere duasimportantes atividades para realizarmoscom as crianças. A coleta e a seleção dolixo em materiais reaproveitáveis(plásticos, vidros, latas, papéis, caixas) ebiodegradáveis (cascas de alimentos,folhas de árvores, sementes não-comestíveis de alimentos, etc). Faça essa

classificação com seus alunos, depositan-do o lixo em diferentes recipientes quepodem ser caixas ou mesmo sacos plásticos.

• Com o lixo biodegradável, experi-mente, juntamente com seus alunos,transformá-lo em adubo para as plantas.Informe-se na comunidade sobre a técni-ca adequada para misturar o lixo com aterra e quanto tempo levará até a decom-posição e transformação. Se possível,coloque uma ou mais minhocas na terra.Informe-se também sobre a forma ade-quada de fazer o minhocário. As criançasvão gostar e se divertir. Relate comoforam as experiências através de umregistro bem detalhado.

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• Faça um passeio pelo bairro com ascrianças observando os elementos danatureza. Na volta, muitas atividadesinteressantes poderão ser vivenciadas:

– Imitar os pássaros e outros animais,sons e movimentos, as árvores, as nuvens,o calor do sol ou a chuva caindo, jardinsou vasos floridos. Será o momento daexpressão corporal e da dramatização.

– Relate como foi a experiência, sóque desta vez peça às crianças quefaçam desenhos e montem um álbum.

– Durante o passeio, tambémpodem ser coletados materiais comogalhos e folhas secas, pedras, insetos.Eles poderão dar início a uma coleçãode objetos da natureza. Crie temporari-amente o espaço da natureza e peça às

crianças que contribuam trazendooutros elementos para enriquecer o“museu” de sua sala.

– Registre a atividade com fotografiasou com relato escrito.

– Com seus colegas, identifiquequais das atividades propostas forampossíveis de ser realizadas com ascrianças de 2 e 3 anos.

• Assista ao vídeo “Trabalhando como Meio Ambiente”. Certamente, vocêencontrará mais fundamentação para osestudos sobre a Educação Ambiental etambém mais sugestões de atividadespara realizar com as crianças.

Sugestão de Leitura

ARAÚJO, Regina. Gaia. Porto Alegre:Editora Símile, 1996.

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ulturas Locais eRegionais: Valores,

Mitos, Lendas e CrençasMarise Campos

“Na fronteira do nosso conhecimento,permanece o reino obscuro do mito e da lenda.Narrativas de deuses e de homens do passadoremoto, de heróis terrenos cujas proezascativaram a imaginação popular, e de palavrasmágicas e histórias transmitidas como folclorede geração a geração. É o mundo daimaginação humana, inventando contosfantásticos e criando, como que por encanto,símbolos para representar as verdadesfundamentais e os mistérios da vida.”

Readers Digest, Enciclopédia do Conhecimento Essencial

Nenhuma sociedade constrói o pre-sente e alicerça o futuro sem compreen-der sua cultura e sem conhecer osignificado de sua história.

E o que é cultura?

Cultura é toda manifestação eexpressão do fazer humano. É o mundoconstruído e recriado pela ação humana,espaço onde estão contidos significadosimpressos nos mitos, nas lendas, nascrenças e nos valores.

Desse modo, cada povo, cada região,cria sua identidade cultural e faz história.

Assim é o mundo que recebe a crian-ça. Um mundo que ela precisa desbravare entender seus mistérios, manifestarsuas emoções, sentimentos e pensamen-tos, interagir e participar da construçãoda cultura e, a partir da expressão da suaidentidade, fazer sua história.

Descobrimos na beleza do poema“Para você me educar”, de Vital Didonet,inspiração para discorrer sobre o tema:Cultura, Mitos, Lendas, Crenças e Valo-res.

O autor revela fundamentos de edu-cação, de vida e de valores culturais comuma profunda capacidade de síntese. Osversos aqui selecionados desvelam a es-sência de cada um dos temas abordados.

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Para Você Me Educar

Você precisa me conhecer,Precisa saber de minha vida,Meu modo de viver e sobreviver,Conhecer a fundo as coisas nasquais eu creioE às quais me agarro nosmomentos de solidão,Desespero, sofrimento.Precisa saber e entenderAs verdades, pessoas e fatosAos quais eu atribuo forçassuperiores às minhasE às quais me entregoQuando preciso ir além de mim mesmo.

Cada sociedade constrói sua identi-dade a partir da criação de um sistemade idéias e imagens, em que aespiritualidade e a materialidade semostram através de um imagináriosocial. Nele se expressam símbolos,valores, hábitos, costumes dos povos,de toda e qualquer região do mundo.

Para Você Me Educar

Precisa me encontrar lá ondeeu existo,Quer dizer, no coração das coisas,Nos mitos e nas lendas,Nas cores e movimentos,Nas formas originais e fantásticas,Na terra, nas estrelas,Nas forças dos astros, do sol

e da chuva.

Para Você Me Educar

Precisa estar comigo onde estou,Mesmo que você venha de longeE que esteja muito adiante.Só há uma forma de construí-lo:A partir de mim mesmo e do meio

em que vivo.

Uma coletividade é identificada pordeterminadas características, traços ouatributos que a individualizam e, ao mes-mo tempo, a distinguem. Nesse processopessoal e coletivo, os indivíduos definem-se em relação ao outro e a muitos outros.

Do ponto de vista da Antropologia,somente me percebo como identidadequando existe o outro diferente de mim.

Desse modo, posso ter certeza deque existo como indivíduo e comocoletividade. Essa coletividade é formadapelas semelhanças e diferenças entre nóse os outros indivíduos. A partir de umolhar mais amplo é que se tem o entendi-mento do que é nação e do quecorresponde a concepção de sociedadecom sua história e com sua identidade.

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de suas origens, de sua forma de serdentro da condição regionalista.

Regionalismo e folclore ocupam umlugar da maior importância na formaçãoda cidadania e na construção da identi-dade cultural, “pois estudam o conjuntodas tradições, lendas e mitos, crenças,hábitos e costumes”.

O educador e a escola devem dar-seconta de que a criança tem que serrepresentada em sua cultura e de queessa cultura é impregnada de mitos,crenças, costumes e valores de umaregião ou de um país.

A cultura universal é o produtode todos os homens.Mas como posso contribuircom essa fraternidadeSe não constituí o meu eu,Que desperta, do mistério do meu ser,As potencialidades adormecidas.É uma educação que promoveMinha identidade pessoal.Eu me educo fazendo cultura,E, nesse ato de geração cultural,Eu construo minha educaçãoConquisto o meu ser,na relação dialógicaHomem/Natureza.

Despertar as crianças para toda essamescla, para toda essa magia que se fazpresente nas lendas e mitos, no folclore ena cultura, certamente possibilitará a cada

Precisa compreender a cultura do contexto

Em que se dá meu crescimento,Pois suas linhas de forçaSão as minhas energias.Suas crenças e expectativasSão as que passam a construirO meu credo e as minhas esperanças.Mas eu também estou aberta para

outras culturas.Identidade cultural não significaPrisão ao espaço que ocupoMas abertura ao que éautenticamente nossoE ao que, vindo de fora,Nos pode fazer mais de nós mesmos.

Todo esse processo envolve o resgatedo passado e da memória cultural. Pode-mos afirmar que há uma representaçãosíntese das diferentes regiões com as suasespecificidades étnico-culturais e os seusagentes sociais. Precisamos saber quemsomos, para onde vamos, despertar o queestá adormecido em cada um de nós.

Dorotéo Fagundes, estudioso dessatemática, afirma em entrevista anexa aesse texto que “ter uma identidadecultural significa compreender o mundo,sua formação social e sua história”,porque a humanidade é um conglomera-do de diferentes culturas, de religiões, deconhecimentos, de etnias, de mitos elendas, de crenças, costumes e valores.O mundo contemporâneo esqueceu-se

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uma delas que se torne um ser que seidentifique com “seu nome, que é suamarca pessoal, um sobrenome, que é amarca da família, e com sua identidadecultural, representada pela marca daaldeia, da nação”.

A criança, ao perceber-se com umaidentidade, terá consciência dos valoreslegítimos de uma sociedade e de umacivilização, independentemente de raçaou classe social. Ao situar-se no tempo eno espaço, ela se perceberá como agenteque constrói sua cultura.

A sociedade é resultante das açõeshumanas. É no grande emaranhado demitos, lendas, crenças e tradições que aspessoas influenciam e são influenciadas.

A maneira como elas se identificamcom todos esses fundamentos é que lhesconfere o sentimento de pertencimento,é sua cultura.

Os mitos, as lendas e crenças sãorepresentações coletivas, são histórias,concepções elaboradas geralmente porum grupo cultural, com o fim de proporuma explicação mágica do mundo. Seuponto de partida e sua função básicaconsistem em adaptar o homem aomundo exterior, dominando a realidade.

A adaptação ao meio é inerente a todoser vivo. Ser permeável ao meio é o queassegura a sobrevivência. A capacidade daconsciência é ética, na medida em que

transita no binômio liberdade e responsa-bilidade. E a ética é a ciência que trata dosvalores e pressupõe reconhecimento dobem comum, que é coletivo, busca promo-ver o melhor de nós e determina o repertó-rio de valores de uma sociedade.

A cultura tem grande importância parao desenvolvimento humano, e as transfor-mações da sociedade estão intimamenteligadas aos direitos culturais, pelosurgimento de novos valores e pelo resgatedas raízes culturais que embasam acidadania. Por isso, é preciso resgatarraízes, ter herança cultural, ou seja,conhecer e vivenciar todo o legado querecebemos de nossos antepassados.

A interculturalidade também é algo quetorna mais viva a herança cultural, masque deve ocorrer numa relação horizontalentre as culturas originais.

A partir dessa interculturalidade hori-zontal, é sempre necessária a ética, paraque possa garantir a convivência entre ospovos, no diálogo entre culturas, religiões,tradições espirituais e etnias.

Nesse enfoque sociocultural, ressalta-seque o processo de educação de cada serhumano não ocorre de forma isolada, massim no seio de um grupo humano, no qualcada pessoa vive e aprende. E esse aprendi-zado não se dá somente pela necessidadeintelectual dos indivíduos. Significa que,como seres humanos, nós aprendemostambém porque temos necessidade de amar,

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de sermos aceitos e respeitados e aindaporque precisamos buscar um propósito.

Segundo Howard Gardner, “AEducação deve ser vista como umempreendimento muito mais amplo,envolvendo motivação, emoções, práticas evalores sociais e morais”.

Fica claro que toda a sociedade e seuscostumes devem estar imbuídos dessesvalores espirituais em suas diversas formasde manifestação. Estes são padrões quedevem permear a cultura e a educação das

crianças, como verdadeiros paradigmasculturais que envolvem a visão do homeme a visão da vida ideal.

Estudos apontam que o ser humanopossui estruturas interiores, como uma pré-consciência moral e um instinto ético, asquais, para serem ativadas, precisam serestimuladas logo na primeira infância.Todos os estímulos são válidos: cantigas deroda, fábulas na hora de dormir, históriasreais e imaginadas, contadas em váriosmomentos e seguidas de reflexão ou in-teração com a criança. E, o que é mais im-portante, muitos abraços, beijos e carinhos.

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Desse modo, a educação humanaprecisa despertar na criança todos ospotenciais, o que será alcançado através dacriatividade e da auto-expressão dessaspotencialidades. Portanto, uma educaçãoque busca resgatar os valores da sociedadee da cultura pode garantir não apenas asobrevivência de uma coletividade, masuma verdadeira qualidade de vida e felici-dade, caracterizando-a como um referencialde humanidade e de civilização.

“Um homem do povoado de Négua, na costada Colômbia, pôde subir ao alto céu.

Na volta, contou.Disse que havia contemplado, lá de cima, a

vida humana.E disse que somos um mar de foguinhos.– O mundo é isso, revelou. Um montão de

gente, um mar de foguinhos.Cada pessoa brilha com luz própria entre as

demais.Não há dois fogos iguais. Há fogos grandes, fogos pequenos e fogos

de todas as cores. Há pessoas de fogo sereno, que nem

percebem o vento, e pessoas de fogo louco, queenchem o ar de faíscas.

Alguns fogos bobos não iluminam e nemqueimam,

mas outros ardem na vida com tanta vontadeque não se pode vê-los sem pestanejar,e quem se aproxima se acende.”

Eduardo Galeano – O livro dos abraços

Conceitos

• Mitos – Narrativa dos temposfabulosos ou heróicos. Representação defatos ou de personagens reais,exageradas pela imaginação popular epela tradição. Narrativa de significaçãosimbólica referente a deuses ou aspectosda condição humana.

• Lendas – Narrativas simples esintéticas que respondem às indagaçõesdo homem frente ao que desconhece eadmira, ligando-se à dimensão total decultura.

• Crenças – Convicções íntimasbaseadas em normas que a comunidadeaceita como indiscutíveis ou, ainda,narrações escritas nas quais os fatoshistóricos são deformados pela ima-ginação popular ou pela imaginaçãopoética.

• Valores – Normas, princípios oupadrões sociais, aceitos ou mantidos, porindivíduos, classes, sociedade, etc.

• Folclore – Conhecimento dastradições de um povo, expressas em suaslendas, crenças, canções e costumes.

• Cultura – Complexo dos padrõesde comportamento, das crenças, dasinstituições e de outros valores espirituaise materiais, transmitidos coletivamente ecaracterísticos de uma sociedade.

(Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa)

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Referências Bibliográficas

BETANUR, Paulo. Platão: os homens na caverna. Porto Alegre: Artes eOfícios, 2001.Ciências Humanas e suas Tecnologias – módulo 2 – ASI Magistério – SMESão Paulo, dezembro 2002.DAHLBERG, Evanilda; MOSS, Peter; PENCE, Alan. Primeira infância.Porto Alegre: Artmed, 1999.Enciclopédia Ilustrada do Conhecimento Essencial. Readers Digest, 1998.FAGUNDES, Dorotéo. Palestra sobre Tradicionalismo e Regionalismo naEducação Infantil. Curso OMEP/2003.NETO, Simões Lopes. O Curupira, o Saci e outras lendas. Porto Alegre:Artes e Ofícios, 2001.

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Atividades de Estudo eAprofundamento

Maria Helena Lopes

O Curupira

O Curupira é um indiozinho selvagemque é muito peludo, tem os cabelosvermelhos e os pés virados para trás.

Montado no lombo de bichos comoo veado, o Curupira anda pela floresta,vigiando os animais, principalmenteaqueles que o bicho-homem gosta decaçar, como a anta, a capivara, o tatue um montão de outros.O Curupira só admite queos caçadores cacem paracomer. Quando encontraum caçador que nãorespeita os bichos, quemata só por matar, demalvadeza, desses quematam até as fêmeas comfilhotes que ainda nãovivem por si mesmos, aío Curupira fica muito bravoe apronta em cima dele.Querem saber o que ele faz?

Ele se disfarça numbicho de caça e ilude ocaçador, que vai atrás deleaté se perder no meio domato. Se esse caçador formesmo ruim, o Curupira éaté capaz de deixar que ele

morra, perdido no coração da mata.Outra coisa que o Curupira faz é trans-formar em bichos de caça os amigos, osfilhos ou a mulher do caçador e, assim,eles acabam sendo mortos pelo própriocaçador. Que coisa, né?

O Curupira anda sempre com um ca-chorro fiel, que tem o nome de Papamel.

Além disso, é ele que ensina os papa-gaios de nossas florestas a cantar, sempreque vem alguém, o seguinte: Curupaco,paco, papaco!

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No folclore brasileiro há muitas lendas,entre elas, Saci Pererê, Salamanca do Jarau,Negrinho do Pastoreio, Curupira, etc.

• Escolha uma delas, pesquise o seuconteúdo, conte para as crianças e relatecomo foi a atividade.

• Peça às crianças que ilustrem alenda que você irá reescrever, após aexperiência com os alunos.

Entrevista com Dorotéo Fagundes(especialista em Folclore)

Publicada no Boletim Informativo daOMEP/BR/RS/Porto Alegre Novembro/Dezembro – 1999

P – Qual seria, na sua opinião, aimportância de abordar temas do folcloregaúcho na Educação Infantil?

R – Acho extremamente positivo, creionão exagerar em afirmar que é necessário,porque sabemos que toda e qualquerinformação que alguém possa ter sobre suafisionomia cultural, ajuda-o a compreen-der melhor o mundo, sua formação sociale sua própria história. Quanto mais cedochegarem essas informações, melhor parao indivíduo, melhor para o mundo.

P – Quais os conceitos que a Educa-ção Infantil pode abstrair do folclore eque influenciarão na formação dosvalores das crianças?R – Partindo do pressuposto de que ofolclore para nós é a ciência que estudao conjunto das tradições, lendas oucrenças populares de um país ou região,

expressa em provérbios, contos e canções,passamos a compreender imediatamenteo sentido do regionalismo. Como con-cordamos com a célebre afirmação deque não há nada mais universal do que oregional, defendemos que, se as criançasforem instruídas através dos conceitos detradição e das manifestações regionais,formadora de cultura, aprenderão queseu nome é a marca pessoal, o sobreno-me é a marca da família e a sua identida-de cultural é a marca da aldeia, danação. Assim, reconhecendo seu nome,seu sobrenome e sua identidade cultural,estarão localizadas no tempo e no espa-ço, porque cultuarão o sentido de família,aldeia e nação, aprendendo que todo serhumano é importante para o mundo, in-clusive ele, independentemente de raçaou classe social.

• Além das lendas, o folclore brasileiroé rico em músicas e danças regionais. DoOiapoque ao Chuí, passando pelo Bumbameu Boi, Frevo, Capoeira, Samba, Chulae Dança do Balaio. Nosso País extravasaalegria, criatividade e orgulho por suasmúsicas e danças típicas.

Faça uma pesquisa sobre a dança, aculinária e os trajes típicos da sua regiãoe incentive as crianças a cultivá-los. Hágrupos de dança organizados que têminteresse em visitar escolas para difundiras culturas locais. Com certeza, irão a-judar nesse resgate da cultura local.

Planeje essa atividade: será uma festapara os educadores e para as crianças.

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as o queé ciência mesmo?

Maria Helena Lopes

É escavar para achar coisas,é limpar os ossos com pincel e montar oesqueleto como o dinossauro.

(Nicolas, 6 a)

É descobrir o que não existe. (Antônia, 4a11m)

É especialidade, é saber muitosobre alguma coisa.

(Daniel, 6a4m)

É ver como as coisas existem,até se tem lobisomem.

( Lucas, 5a9m)

É pedir para o Papai do Céuque as coisas aconteçam.

(Helena ,5a10m)

É que nem a luz, que tem o trovão e o raio.(Maria,5a)

Ah, dá uma pista né! É da natureza?É pedra? É máquina?

( Marcelo, 4a8m)

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Diante desse difícil questionamentopara as crianças, respondemos que aciência é a tentativa humana de buscar averdade sobre o mundo. Primitivamente,o homem explicava os fenômenos davida através de mitos e lendas.Paulatinamente, a Filosofia e depois aCiência foram explicando a origem e ofuncionamento das coisas.

Conversando com as crianças, consta-tamos também suas buscas incessantesde compreender os mistérios do mundo,que ainda não sabem explicar. Ashipóteses apresentadas na abertura destecapítulo são algumas maneiras espontâ-neas de explicar os fenômenos que asinquietam.

Embora espontâneas, essas hipótesessão, de certa forma, influenciadas peloconhecimento já sistematizado pelohomem, habitam o imaginário infantil e,com as interferências do meio social,podem transformar-se em aprendizagens.As concepções que os pequenos têmsobre os fatos com os quais convivemsão o produto de inter-relações entre ouniverso que vislumbram e seu modo deobservar e pensar, influenciadas pelasinformações que recebem prontas domeio social.

Os cientistas e as crianças têm algoem comum – inquietam-se com ascoisas que não sabem explicar, gostamde descobrir e, por isso, buscam res-postas incessantemente.

Eles têm a percepção do “cientistainvestigador”, perguntam muito e sãomuito curiosos porque querem enten-der tudo.

A idade dos “porquês”, geralmentepor volta dos 3 anos, é sempre um bommomento para aproveitar a curiosidadee o interesse natural da criança paralhe proporcionar atividades de investi-gação e descobertas. Por trás dasperguntas, encontram-se conceitoscientíficos importantes que propiciamespaços de investigação para muitasaprendizagens.

Quando uma criança é levada a seenvolver com situações instigantes,como, por exemplo, a luz e a sombra,o trabalho das formigas, a chuva quecai do céu, o funcionamento dasmáquinas, entre tantas outras, sendoorientada por um adulto, ou mesmopor crianças quando conversam, vaiidentificar lógicas, sistemas etecnologias, além de construirexplicações inteligentes, sempremovida por sua curiosidadedesafiadora e provocante.

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Relato de Experiência

Professora Janice Oliveira

Crianças entre 5 e 6 anos. Todossentados em roda, fazendo a chamada,quando a porta se abre sozinha.

Uma menina corre e fecha a portadizendo que era um fantasma quehavia feito aquilo.

Diante das caras de espanto (medo)de alguns colegas, ela emenda:– Ai! Brincadeirinha, pessoal!

Um menino diz:– Foi Deus quem abriu a porta!

A professora questiona: – Deus?Vários colegas, em coro: – Ah! Foi o vento!

E o menino completa: – Tá, mesmo assim,foi uma coisa transparente.

E outro concerta: – Transparente não, invisível.

– Mas, afinal, o que é transparente e oque é invisível? pergunta a professora.

Nesse momento, tudo o mais foideixado de lado e iniciou-se umadiscussão sobre a diferença entre transpa-

rente e invisível esobre exemplos decada um. Vidro: étransparente.Vento: é invisível.Lente de óculos: étransparente. Som: éinvisível. Raio de sol:dúvida e contro-vérsias...

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ças têm de perguntar e também de ouvirrespostas, sem afastar-se da orientaçãode que saber pensar é essencialmentesaber perguntar. Independentementede encontrar respostas, é importanteoferecer experimentos que oportunizemas descobertas.

O novo , o que não é criado ousistematizado, poderá encontrar-seno simples diálogo, entre uma respostae outra pergunta...

Outro aspecto importante é a autono-mia de pensamento que se desenvolveface ao exercício de perguntar e desco-brir, acompanhado de argumentação.Argumentando, as crianças e os adultosdemonstram sua lógica, desenvolvemum raciocínio completo e aprendem adefender idéias.

As atividades devem facilitar para queas crianças criem idéias, contrariando atônica da informação pronta (tão abun-dante na televisão). Há respostas diferen-tes para um mesmo fenômeno, por isso éimportante incentivar as idéias que ascrianças têm, instigando-as a estabelecerrelações, comparações e analogias entreas coisas que as rodeiam.

“ Nada em rigor tem começo e coisaalguma tem fim,

já que tudo se passa em ponto numa bola;e o espaço é o avesso de um silêncio onde omundo dá mais voltas.”

Guimarães Rosa – Estas Estórias

Poderíamos afirmar que o exercíciode reflexão vivenciado pela educadoraJanice e pelos alunos da classe de pré-escola de 5 a 6 anos é ciência autêntica?

Penso que sim, porque nascem de umproblema real das crianças e concentramtoda a sua atenção. Também porque sãoa expressão da busca de uma resposta dodesconhecido, ou pelo menos sem expli-cação para aquelas crianças.

Sem a presença da educadora, talvez areflexão não tivesse evoluído. Ela quasenão interveio na discussão, porém contri-buiu para que a investigação continuasseatravés da conversação das crianças.

Para Janice, não era importante oconhecimento que as crianças poderiamdescobrir, ou qual finalmente seria aconclusão correta, mas sim a disposiçãode ver que no mundo que cerca ascrianças tudo pode ser investigado,desde que haja coragem de enfrentá-lode forma interrogativa.

O que deve motivar os educadores é,por um lado, o desejo de não impor umaidéia determinada e, por outro, adisposição em apoiar as iniciativas e osdiálogos que espontaneamente seformam entre as crianças.

Nesse processo, o desafio para oseducadores é o estabelecimento dolimiar entre a necessidade que as crian-

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Todas essas características se relacio-nam com o comportamento de quem seinicia na investigação cientifica. NaEducação Infantil, nosso propósito élograr que as crianças vivenciem experi-ências significativas para sua vida, a fimde aumentar a sua curiosidade, conhecere descobrir espaços diferentes eenriquecer sua visão do mundo.

“O fundamento principal da experiênciabaseada na prática e na pesquisa é a imagemde uma criança rica, forte, poderosa… É umaafirmação que se contrapõe à tendência derealçar as necessidades, as fraquezas, os temoresdas crianças e a calar, lamentavelmente, suaspotencialidades e direitos.”

Giordana Rabitt – À procura da dimensão perdida

Para organizar as atividades e osexperimentos, é importante conhecermosalgumas atitudes das crianças que carac-terizam seu comportamento exploratórioe que corroboram as idéias apresentadasaté aqui.

• demonstram curiosidade e interessefrente a coisas novas;

• iniciam-se no método científicoproblematizando (onde começa o céu?),hipotetizando, explorando, etc.;

• concentram-se em determinadastarefas ou experiências que realizam;

• criam com objetos div ersificados,organizam materiais dando aos mesmosdiversos usos, significados e classifica-ções.

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Referências Bibliográficas

CAVALCANTE, Zélia. Trabalhando com história eciências na pré-escola. Porto Alegre: Artmed, 2001.MINISTÉRIO DE EDUCACIÓN, Chile. Propuestapedagógica para la iniciación de la ciencia etecnología. Santiago: 2002.RABITTI, Giordana. À procura da dimensão perdida:uma escola de infância de Reggio Emilia. PortoAlegre: Artmed, 1999.RISCHBIETER, Luca. Guia prático de pedagogiaelementar: uma proposta educativa com crianças de 0a 6 anos. Curitiba: Nova Didática, 2000.ROSA, Russel T. Dutra. Ensino de ciências e educaçãoinfantil. In: CRAIDY, Carmen M. (Org.). EducaçãoInfantil – Pra que te quero? Porto Alegre: Artmed,2001.

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Atividades de Estudo eAprofundamento

Maria Helena Lopes

• Procure lembrar-se de perguntasfeitas freqüentemente pelas criançassobre os fenômenos da natureza, sobreos animais, sobre a origem dos bebês, deonde vem a chuva, etc. Faça umalistagem sobre as mesmas e comparecom seus colegas. Juntos, vocês deverãocriar atividades e/ou experimentos quedespertem a curiosidade das crianças eas auxiliem a encontrar respostas oufazer mais perguntas.

Sugestão de Leitura

A curiosidade premiada, de FernandaLopes de Almeida e Alcy Linhares – EditoraÁtica

Nesse livro infantil, as autorasexploram a idéia de que o educador nãosabe tudo e de que o processo deconstrução e descoberta também éválido, porque crianças e educadoraprendem juntos.

No mundo de hoje, a rua, a casa, atelevisão, oferecem milhares de temasque despertam a curiosidade dascrianças e sobre os quais elas podemquerer saber mais. Conceitos de Histó-ria, Geografia, Matemática, estão pre-sentes no dia-a-dia das crianças emforma de questionamentos ecuriosidades.

Relato de Experiência

Janice Oliveira

Trabalhando com turmas de pré-escola(crianças entre 4 e 6anos), sempre observavaos questionamentos dascrianças a respeito dadivisão territorial donosso país e do mundo.

– Né que Floripa é outra cidade?

Em outras situações comemorativas,como Indenpendência do Brasil e Sema-na Farroupilha, também era difícil mos-trar às crianças a relação de inclusãoentre município, estado, país e continen-te. Ocorreu-me utilizar, além de mapas eIlu

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do globo terrestre, um brinquedo quenormalmente vemos em turmas de ber-çário: os copinhos que se encaixam.Dessa forma, ficava mais fácil demons-trar e também mais acessível ao entendi-mento das crianças a idéia de que nossobairro corresponde ao menor dospotinhos e de que nosso mundo ouplaneta corresponde ao maior. Entre umespaço que nos é bem próximo (bairro) eo outro que foge ao alcance de nossosolhos (planeta), existe uma seqüência deinserções que ocorre assim: bairro, muni-cípio, estado, país, continente e planeta.Claro que apenas essa atividade nãoproporcionou às crianças a instrução danoção espacial necessária para o enten-dimento de nossa divisão territorial;porém, contribuiu para que pudéssemoscomparar opiniões e colocações anterio-res a esta observação:

– Ah! Florianópolis é uma cidadediferente da nossa em um estado diferentedo nosso. Barros Cassal é perto de PortoAlegre porque também é Rio Grande doSul.

Esse relato nos sugere inúmeras ativi-dades com as crianças, além das queforam apresentadas. Por exemplo, pode-mos conversar com as crianças sobre obairro e as cidades, as paisagens, osedifícios, as ruas, os trabalhadores, etc.

O objetivo é que, através da observaçãoe dos questionamentos suscitados, esteja-mos ajudando as crianças em sua

integração à sociedade, na compreensãodo meio ambiente e na conceituação demundo.

As efemérides (datas comemorativas)também são propícias para a reflexão sobreo conhecimento da sociedade, pois os fatoshistóricos e religiosos que se tornam feriadossão sempre de interesse das crianças. Asdatas de aniversário, a história pessoal ou aautobiografia de cada uma das criançastambém são excelentes temas de pesquisa.

Pense que pesquisar e investigar, paraas crianças, também são atividadeslúdicas.

• Averigúe a história do bairro e doseu Centro Infantil, conversando com aspessoas que ali convivem há muitotempo.

• Faça uma maquete ou painel compintura ou recorte retratando as paisagens,as ruas, as casas, etc.

• Construa com cada uma dascrianças sua autobiografia. E conte paraelas também a sua história pessoal.

• Assista ao vídeo “Ciências na Pré-Escola”, do Programa Professor da Pré-Escola – Módulo 2. Você enriquecerá seusconhecimentos sobre ciência e tecnologiae sobre as formas de pensar das crianças.

• Se conseguir, leve para a sala apare-lhos eletrodomésticos velhos e deixe queas crianças os explorem.

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• Os nossos antepassados – os índios,os homens da roça – aprenderam quemuitas plantas têm poder curativo. Hoje,muitos cientistas estão fazendo pesquisaspara aprender os remédios que os anti-gos sabiam e que foram esquecidos. Hálivros sobre isso. Acho que você gostariade aprender sobre as plantas que curam.Faça uma pesquisa sobre plantas quecuram para que você possa se valer delasquando não houver nem médicos nemfarmácias por perto.

atemática,Aritmética,

Descobertas...Janice Oliveira

Quando era pequena, achava a casade minha avó uma imensidão. Era muitoagradável passar as férias lá. A sala eraenorme, com um piso de tábuas, ondegostávamos, eu e meus irmãos, deescorregar sobre um pano de lã. Haviatambém, no canto dessa sala, umburaco causado pela ausência de um“nó” da madeira, onde gostávamos deinserir objetos que caíam no porão dacasa. Ali tentávamos inserir bolinhas degude, colheres, brinquedos e os maisdiversos objetos. Anos depois, quandojá era adulta, a casa não me parecia tão

grande. E acho que, se atualmenteainda existisse, ela me

pareceria um tantopequena.

É assim que a criançase coloca no mundo, apartir de seu própriocorpo. Ela constrói anoção do que é grande,pequeno, mais, menos,maior, menor, etc., apartir da relação do seupróprio corpo com oobjeto. E assim tambémse dá a construção de

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todas as noções matemáticas utilizadaspelo homem. É a partir da observação eda experimentação que passamos aquantificar, classificar, seriar e entender omundo que nos cerca. A matemática nãose ensina, se vivencia.

É impossível pensarmos o nossocotidiano sem o uso da matemática.Basta observarmos as pessoas que nãotiveram acesso ao ensino escolar. Podeser até que elas não saibam ler, massabem calcular. Toda a nossa vida estáorganizada com base na matemática.Nossa casa é dividida em ambientes,nossos alimentos são guardados nacozinha seguindo uma certa lógica, nãoguardamos, por exemplo, objetos dobanheiro na cozinha. Classificamos aspessoas entre as que mais gostamos e asque menos gostamos, seriamos e ordena-mos nossos compromissos de acordo como grau de importância de cada um.Depois dessa constatação, como pode serpossível ouvirmos tantas pessoas dizerem:“Não entendo nada de matemática?”

As relações da criança com a mate-mática não são aprendidas a partir domomento em que ela entra na escola.Pelo contrário, já começaram quando elaconsegue demonstrar preferências etestar possibilidades do ambiente ondevive. Portanto, quanto mais rico empossibilidades for esse ambiente, maioresserão as construções da criança acerca

dos números. Certa vez, em uma ativida-de de culinária com crianças entre 5 e 6anos, estávamos fazendo duas receitas deum pudim de chocolate (daqueles decaixinha). Li a receita no verso da caixa,em que dizia: coloque meio litro de leiteem um recipiente. Questionei as criançassobre quanto precisaríamos de leite paraexecutar duas receitas. Um menino logorespondeu: um litro de leite. Todos osoutros protestaram, achando que um litroseria muito leite. Ele rapidamente mos-trou aos colegas (colocando o dedinhona caixa de leite) : “Claro, se vamos usaraté aqui (dedo no meio da caixa) para fazeruma receita, vamos usar até aqui (dedo nofinal da caixa) para fazer a outra”. Paraalguns colegas, essa explicação foivaliosíssima, mas para outros não fez omenor sentido. Analisando o exemplo,podemos chegar a algumas conclusões.

Primeiro, esse menino não chegouàquela conclusão naquele momento.Certamente, sua colocação estavaembasada em muitas outras experiênciasde observação e conclusão. Segundo,cada uma das crianças do grupo estavaem um momento diferente com relação àconstrução do número e das quantida-des. Terceiro, não caberia a mim fazê-losentender naquele momento o que ooutro colega já havia construído emoutras tantas situações diferentes.

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Qual então é a função do educadorna Educação Infantil ao trabalhar amatemática? Ensinar os números?Ensinar as quantidades? Mostraratravés de exemplos o que é maior,menor, mais grosso, mais fino, etc.?Será que isso tudo se ensina?

Em uma outra situação, com criançasbem menores (por volta de 2 anos),vemos um menino tentando insistente-mente cortar uma almôndega ao meiocom uma colher. Será que essa situaçãonão está ensinando nada a ele? Emoutra, na mesma turma, percebemosuma menina brincando de “medir” oscolegas, colocando-os contra a paredee marcando sobre suas cabeças comum brinquedo, isso depois de toda a

turma terpassado portal procedi-mento comuma nutricio-nista queacompanha-va seu gráfi-co decrescimento.Que noções,que não asmatemáticas,essas crian-ças estão

reproduzindo ou tentando entender?

Se nos detivermos algum tempoobsevando nossas turmas, perceberemosque elas fazem muitas operações mentaissem que “ensinemos” a elas. Quandoum grupo de crianças briga sobre umconjunto de peças de montar, nadamelhor a fazer do que aproveitar essaoportunidade para propor uma divisãoigualitária das peças. Não há propostaque descentralize mais nossos pequenosdo que esta. E, a partir do momento emque eles conseguirem entender quedentro do todo existem partes e que estaspodem ser iguais, certamente eles passa-rão a “contar” ou “dividir” as peças detodos os outros jogos que forem utilizar.

O que estou querendo ilustrar comtodas essas situações é que, se o espaçoda sala de aula estiver preparadoadequadamente, se o educador se manti-ver atento às manifestações das criançase souber encaminhar os questionamentosde modo que não ofereça respostasprontas, mas que leve a criança a pensarsobre o que perguntou, estaremos dandoum enorme incentivo para o desenvolvi-mento de sua inteligência.

Em todo o início de ano é comumpercebermos na escola a utilização dossignos numéricos colados nas paredesdas turmas de jardim. Nessa fase dodesenvolvimento, dependendo do nível

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sociocultural do grupo que atendemos,as crianças sequer diferenciam letras denúmeros e menos ainda percebem aquantidade que aquele número querdemonstrar. E seguimos observando queos números são “ensinados” na escolasem que a criança tenha a possibilidadede vivenciar quantidade. Quando faloem vivenciar o número, quero dizer queo espaço da sala de aula deve estarorganizado de uma forma lógica, depreferência com a participação dascrianças, onde os lápis, as canetas, ospincéis, os brinquedos, os jogos, asbonecas, etc., têm um lugar próprio edefinido. Isto é classificar. Que as pro-postas do educador na hora do brinque-do livre possam ser: “Que talorganizarmos estas peças, separando asiguais?”, ou “ Esta é a caixa das folhasmaiores e esta é a caixa das folhas meno-res” ou, ainda, “Preciso que o ajudantesepare um prato para cada colega nahora do lanche”. Se o grupo utiliza filapara se locomover, poderemos ser menosarbitrários propondo diferentes maneirasde organizá-las: os de tênis e os de san-dálias; os de cabelos curtos e os decabelos compridos; os de calças e os debermudas, etc.

Essas tarefas do cotidiano escolarpropõem uma infinidade de possibili-dades para que a criança pense erealize operações mentais. É a partirde uma necessidade concreta e do

universo do todo, e não da unidade,que ela construirá o conceito de nú-mero. Portanto, aqueles números naparede no início do ano não fazemo menor sentido para ela, pois nãopossibilitam que ela os organize eos reorganize como bem entendere necessitar.

A questão do prazer dessas atividadestambém deve ser considerada. Em deter-minada situação de brinquedo livre, duasmeninas (entre 6 e 7 anos) estavamfolheando uma revistinha de jornal queuma delas havia levado para a escola.Uma delas já estava alfabetizada e leuum problema matemático para a outra.Ambas ficaram curiosas sobre a resposta,mas não conseguiram resolvê-lo e pedi-ram minha ajuda. O problema falava deum menino que queria dar aulas defutebol para os colegas para conseguiralgum dinheiro. E ele pensou que, comotinha quatro amigos, poderia dar duasaulas por semana para cada um e cobrarum real por cada aula. A pergunta doproblema era quanto o menino ganhariapor semana. Sugeri que as meninasdesenhassem os quatro amigos. Pergunteia elas quanto cada amigo pagaria pelasaulas da semana. Rapidamente chegaramà conclusão de que cada amigo pagariadois reais. Então, pedi que elas desenhas-sem duas moedas perto de cada amigo.E, antes que eu fizesse a sugestão de quecontassem todas as moedas, elas mesmas

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já tinham entendido o que deveriamfazer. Com essa simples intervenção, asmeninas perceberam que conseguiriamfazer muitas outras operações e pareciamsatisfeitíssimas em realizar tal tarefa.

Dessa forma, todas as atividades quesurgirem de manifestações espontâneasdas crianças poderão tornar-se de grandevalia no processo de construção de seusconhecimentos, pois elas vêm carregadasde desejo e curiosidade.

Constance Kamii (1990) sugere queexistem alguns princípios para aaprendizagem do número pela criança,embora este não seja diretamenteensinável.

1. A criação de todos os tipos derelações

a) Encorajar a criança a estar alerta ecolocar todos os tipos de objetos, eventose ações em todas as espécies de relações.

2. A quantificação de objetos

a) Encorajar as crianças a pensaremsobre número e quantidades de objetosquando estes forem significativos para elas.

b) Encorajar a criança a quantificarobjetos logicamente e a comparar con-juntos (em vez de encorajá-la a contar).

c) Encorajar a criança a fazer conjun-tos com objetos móveis.

3. Interação social com os colegas eos professores

a) Encorajar a criança a trocar idéiascom seus colegas. b) Imaginar como a criança está pensandoe intervir de acordo com aquilo que pareceestar sucedendo em seu raciocínio.

Referências Bibliográficas

SMOLE, Kátia Cristina Stocco. A matemática na educaçãoinfantil: a teoria das inteligências múltiplas na prática escolar.Porto Alegre: Artmed, 2000.KAMII, Constance. A criança e o número. Campinas: Papirus,1990.

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Atividades de Estudo eAprofundamento

Maria Helena Lopes

É hora da diversão! Vamos organizarum espaço no Centro Infantil com caixasde papelão de diversos tamanhos (detelevisão, por exemplo, e outras menoresque encontramos nos estabelecimentoscomerciais). Crianças de idades diferen-tes podem conviver nesse espaço, gran-de/pequeno, dentro/fora. É também horade imaginação. As caixas poderãotransformar-se em elefantes, ônibus, etc.

• Observe e comente aexploração das caixas pelascrianças.

• Assista ao vídeo A Educa-ção Matemática e a Interdisci-plinaridade. Estabeleça relaçõescom o texto registrando asidéias que mais lhe chamaram aatenção, justificando sua escolha.

• Vamos descobrir asmatemáticas do nosso corpo?

– Podemos começarsentindo as batidas do nossocoração, já que elas têm ritmoque se alteram conforme aintensidade dos nossosmovimentos.

– Temos uma cabeça e quantos fios decabelo? O que temos em pares iguais emnosso corpo? E em unidades, só ocoração? E por dentro do nosso corpo?

– Podemos também inventar um jogocom noções topológicas, cujos pontosentre as linhas serão as partes que sedobram (articulações) em nosso corpo.Procure desenhar com as crianças a figurahumana representando todos os pontos dasarticulações.

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Eu pensei ter ouvido você rindoEu pensei ter ouvido você cantandoEu acho que pensei ver você tentarTodo sussurroDe todas as horas que passameu estouEscolhendo minhas confissõesTentando pegar um olhar em vocêComo uma mágoa perdidae um tolo cegoOh não! Eu falei demaisEu provoqueiA influência do séculoConsidereO erro que me trouxePara meus joelhos fraquejaremE se todas essas fantasiasFossem caindoAgora eu falei demaisEu pensei ter ouvido você rindoEu pensei ter ouvido você cantandoEu acho que pensei ver você tentarMas era só um sonhoEra só um sonho

Losing My Religion – Perdendo minha religião (REM)

Nesta canção, a banda norte-america-na R.E.M. descreve uma relação amorosaque foi rompida, o sentimento de perda ea busca da renovação desse relaciona-mento, situação pela qual todos, certa-mente, já passaram ou vão passar. Diantedisso, podemos nos perguntar, por que,afinal, uma música que fala disso tempor título “Perdendo minha Religião”?

eligiosidade eEspiritualidade na

Educação InfantilRenato Ferreira Machado

A vida é assim...Refletindo sobre a vida e o quenós fazemos com ela.Fé, crença, religião...A dimensão religiosa do ser humano.A fé na infânciaCaracterísticas psicopedagógicasda religiosidade infantil.Como fazer? possibilidadesmetodológicas.

A vida é assim...

Você conhece esta música?

A vida é grandeMaior que vocêE você não sou euO longe que eu ireiA distância em seus olhosOh não! Eu falei demaisEu provoqueiSou eu naquele cantoSou eu nos holofotesPerdendo minha religiãoTentando manter vocêE eu não sei se consigo fazer issoOh não! Eu falei demais Eu

não tenho dito o suficiente

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Do tamanho da vida!

A música começa falando que “a vidaé grande / maior que você / e você nãosou eu”. Não é preciso pensar muitopara perceber que isto é verdade: a vidaé um mistério que ninguém que já tenhavivido conseguiu desvendar. Diantedisso, começamos a fazer perguntascomo estas:

De onde viemos?Por que vivemos?O que acontece após a morte?

Se é verdade que não conseguimoster respostas exatas para tais questões,também é verdade que nós não desisti-mos de perguntar! Não nos perguntamos,porém, por simples curiosidade. Naverdade, essas perguntas surgem porque,intuitivamente, buscamos um sentidopara a vida.

Eu provoquei

Voltemos à música do R.E.M.:

Oh não! Eu falei demais /Eu provoquei / Sou eu naquele canto /Sou eu nos holofotes / Perdendo minhaReligião / Tentando manter você /E eu não sei se consigo fazer isso.

Se é verdade que a vida é um misté-rio, também é verdade que esse mistérionão é passivo, ou seja, a vida não écomo um tesouro de pirata, enterrado em

algum lugar, esperando para ser desco-berto. A vida nos provoca! Passamos porsituações – algumas positivas, outras nemtanto – em que somos “desinstalados” elevados a pensar sobre nosso existir e agir.Principalmente, a irmos atrás daquilo querealmente é importante e que nos trarámais sentido para o viver.

Nesse processo, começamos a agir,buscando e dando respostas, procurandoenxergar além daquilo que é simples-mente aparente. Em outras palavras,vamos além daquilo que, em princípio,seria esperado de nós, nos superamos!

Pílula vermelha

No filme Matrix (Warner, E.U.A.,1999), o personagem John Anderson, emum encontro com o personagemMorpheus, descobre que a realidade, talcomo a conhece, é apenas umasimulação feita para iludir os sereshumanos. Para conhecer a verdade,Anderson precisa ingerir a “pílulavermelha”, oferecida por Morpheus.Senão, terá de ingerir outra pílula, etudo permanecerá como está. O queacontece a seguir todo mundo já sabe:Anderson engole a pílula vermelha e sedescobre dentro da Matrix, uma gigan-tesca rede de realidade virtual, mantidapor um poderoso computador parailudir as pessoas e sugar as energiasdelas. A descoberta de Anderson nãopára por aí: além de tomar consciência

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tem um nome: espiritualidade, e ocaminho a ser feito na jornada recebeo nome de religião.

Fé, crença, religião...

Desde os primeiros tempos dahumanidade, o ser humano empreende ajornada da religião, movido por suaespiritualidade. Com isso, além de seconstruir, ao longo do tempo, um inesti-mável patrimônio cultural para a raçahumana, descobriram-se os mais impor-tantes valores para as relações em socie-dade. O mais importante, porém, é quetodas essas experiências representam agrande busca do ser humano pelo senti-do mais profundo da vida. Mas o que émesmo religião?

Saber do que se fala...

Antes de sabermos o significado dereligião, precisamos começar com algumasquestões anteriores: a religiosidade e a fé.

• Religiosidade – Assim como édotada de físico, consciência eraciocínio, a pessoa possui, naturalmen-te, religiosidade. Esta é a dimensãohumana que permite lançar um olharpara além do aparente e projetar-se,além do tempo e do espaço conhecidos,para o infinito. É através da religiosidadeque se cultivam a paz, a solidariedade,a esperança e tantos outros valores quenunca poderiam encontrar espaço nasociedade humana tal como ela está.

de suasituação,elecomeça adescobrirseu poten-cial e seupapel.Assumindoo nome deNeo, passaa empre-ender umaluta contrao sistemada Matrix,junto a

Morpheus e o grupo de rebeldes, ten-tando libertar mentes e fazer com quecada vez mais pessoas acordem edescubram sua real situação, para podermudá-la.

Assim é a vida: por muito tempo,podemos viver imersos em uma Matrix,achando que tudo é exatamente o queparece ser e que algumas coisas são dedeterminada maneira porque têm deser assim mesmo. Acontece que, maiscedo ou mais tarde, alguém ou algumasituação lhe oferecerá a pílula vermelha(é claro que sempre haverá a opção denão ingeri-la) e, se sua escolha forexperimentá-la, terá início uma jornadasem volta, na qual ninguém termina dojeito que começou. A pílula vermelha

Filme Matrix

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• Fé – Ao dar-se conta de sua religio-sidade, a pessoa a expressará,direcionando-a e dando-lhe uma “cara”.Quando a religiosidade assume umaforma própria, pode-se dizer que a pes-soa está vivenciando determinada fé.

Ó Deus, ajudai-me a obter umavitória sobre mim mesmo, pois édifícil conquistar a si próprio –embora, quando esta vitória se dá,tudo esteja conquistado.

Escrituras Jainistas

• Religião – É uma dimensão pessoal,enquanto a fé é uma expressão dessadimensão que parte do pessoal, vai aoencontro do social. Nesse processo,pessoas que expressem sua fé de modosemelhante podem vir a compartilharsuas experiências de maneira constante esistemática, criando rituais em comum edesenvolvendo sentimentos de união,fidelidade e solidariedade. Quando issoacontece, forma-se uma religião: umgrupo que crê nas mesmas coisas, rezajunto, tem rituais e orações em comum eé fiel, unido e solidário entre si.

Algumas diferenças,muitas semelhanças

A experiência religiosa da humanidadeaconteceu e acontece em todos cantos doplaneta, das mais variadas formas possíveis.Aqui citaremos as grandes religiõesdo mundo.

• Hinduísmo• Budismo• Judaísmo• Catolicismo• Islamismo• Pentecostalismo• Taoísmo• Confucionismo• Umbanda• Candomblé• Espiritismo

É claro que, além dessas, existemmuitas outras religiões, grandes e peque-nas,

com suas crenças e símbolos. Paramuitas pessoas, a questão ainda é: qualdelas está certa? Afinal, cada uma fazafirmações muito firmes e bem diferentessobre questões importantes (a existênciade um ou mais deuses e o destino dapessoa após a morte, por exemplo).Hoje, porém, diante de um mundo plu-

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ral, onde a convivência com o diferenteé uma realidade, a questão que se afirmaé: todas as opções religiosas são legíti-mas e precisam ser respeitadas. Afinal, asverdades que cada religião afirma nãosão fatos, mas afirmações de fé, feitas pe-lo que se acredita e não pelo que se viu.O que mais interessa, portanto, não é oque há do outro lado, mas a maneira

como se leva a vida, a partir do quese acredita.

Diante disso, fica claro que não épossível dizer que alguém recebeu umaeducação completa e de qualidade, semse tratar da questão da religião (ou, utili-zando um termo mais abrangente, fenô-meno religioso). Mas por onde começar?

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A fé na infância

Desde o momento em que somosconcebidos, assim como temos corpo,temos religiosidade e a manifestamosem atos de fé. Ao contrário do corpo,porém, essa dimensão não nasce pron-ta: ela vai se desenvolvendo aos poucose precisa ser acompanhada de maneiraséria e sistemática.

Vamos conhecer, agora, algumascaracterísticas da religiosidade humanaao longo da vida, segundo Fowler, nolivro Estágios da fé.

Lactância (0 a 2 anos):fé indiferenciada

Pode-se dizer que a fé éindiferenciada porque nós mesmossomos indiferenciados, ou seja, atécerta altura não conseguimosperceber se estamos ou nãoseparados do ambiente que nos cercae das pessoas que convivem conosco.Assim, o desenvolvimento da religiosi-dade dependerá exclusivamente daambientação e das atitudes dos adultosque estiverem por perto.

Primeira infância (2 a 6 anos):fé intuitivo-projetiva

A religiosidade se desenvolvecomo reflexo da fé dos adultos, queserão o modelo para a imagem que a

criança fará de Deus. Ao mesmo tempo,Deus será mágico e imaginário,podendo realizar coisas que as pessoasnormais não conseguiriam.

Infância (7 a 12 anos):fé mítico-literal

É o momento de confrontar a imagemde Deus que se tinha com as que vaiconhecer em seu meio. Também sesentirá parte de um grupo que professa amesma fé (se tiver oportunidade), masa criança ainda dará um rosto humanopara Deus.

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Adolescência (13 a 20 anos):fé sintético-convencional

Nesta fase, ocorre a busca do verdadei-ro significado de tudo o que foi aprendidoaté então. No entanto, falará mais alto arelação de fé exercida pelo grupo aoqual pertence, o que trará muitos conflitosinteriores.

Início da idade adulta (21 a 30 anos):fé individuativo-reflexiva

Inicia-se uma crise, em que os mode-los até então seguidos são confrontadoscom as expectativas pessoais e asnecessidades dessa fase da vida. É omomento de uma reflexão maisprofunda para se optar por uma comuni-dade de fé.

Idade adulta (31 a 60 anos):fé conjuntiva

Quando se chega aqui, começa-se aincorporar tudo aquilo que se aprendeue viveu até então, sem constrangimentoou radicalismo. É possível iniciar umdiálogo com concepções de fé diferentesda sua própria, sem perder a própriaidentidade.

Após os 60 anos: fé universalisante

A pessoa deixa de ser o centro de suaprópria vida, assume, com humildade,suas fraquezas e limitações e doa-se por

inteiro ao projeto de sociedade inspiradopor sua fé. Faz isso por conseguir estarmais sintonizada com sua dimensãoreligiosa, que passa a ser sua realidademais importante (lembram a Matrix?).

É claro que tudo isso descreve umasituação ideal de crescimento, em que,com certeza, há um trabalho pedagógicosério, preocupado também com a ques-tão da religiosidade.

Infelizmente, quando nos referimos àquestão da fé, o que vemos são duassituações: a negligência em se estudar talassunto no meio escolar (por não sesaber o que fazer), ou a distorção daquiloque realmente deveria ser estudado(também por não se saber o que fazer).

Como fazer?

A disciplina que trata da Educação daDimensão Religiosa na pessoa se chamaEnsino Religioso. Na LDB, ela constacomo parte da formação integral docidadão (mas, contraditoriamente, constatambém como matrícula facultativa). Oassunto do Ensino Religioso é exatamenteo que tratamos até aqui: compreender ossignificados da vida e seus simbolismos,através do fenômeno religioso (que éexatamente o elemento agregadordessas questões).

Assim, vamos tentar responder àpergunta do título sem dar nenhum

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“conceito pronto”. O certo é que existemboas experiências na área que podem serpartilhadas e que, com coragem e boavontade, cada um encontrará o seupróprio jeito de fazer. O que não se podeperder de vista é a criança que estásendo educada.

Ambientes: um canto para a meditaçãoe criação de espaços sagrados

Para a criança, a ambientação é muitoimportante. Pode-se dizer até que só épossível desencadear um processo signi-ficativo de aprendizagem ao mergulhá-laem um ambiente rico em referenciais doque se quer refletir. Isto tem lógica: a

criança vive em um mundo “mágico”,montado a partir de seu brincar.

A educação da religiosidade nãopoderia passar por caminhos diferentes,ainda mais que, em si, o mundo dareligião é o mundo dos símbolos esignificados ocultos, do mistério, dacrença e da magia.

Pode-se, assim, pensar, como pontode partida, na organização de um espaçopara o contato com o sagrado, um lugaronde o educando utilize seus cincosentidos para experimentar o transcen-dente que lhe é natural.

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Para compor esse “canto”, pode-secomeçar recolhendo símbolos religiososrelevantes para a comunidade na qual seestá inserido (isso pode ser feito atravésde contato com as lideranças religiosaslocais e com as próprias famílias), forman-do um verdadeiro painel das crençaspresentes no ambiente onde aquela crian-ça está crescendo. O resultado trará umapluralidade que não deve ser evitada,mas, pelo contrário, incentivada. Seráuma oportunidade de começar a viver aalteridade, aceitando o que o outro crêcom respeito e reverência, sem precon-ceitos. Precisa-se ter o cuidado de umadistribuição igualitária desse espaço, nãoprivilegiando nenhuma crença.

Junto à própria criança, ao longo doano, é importante construir novos símbo-los, que expressem as coisas mais signifi-cativas de suas vidas. Nesse espaço,então, a turminha poderá fazer momentosde oração (vamos falar disso daqui apouco), meditação e relaxamento, semfalar de pequenas celebrações para osmomentos significativos do ano.

Jogos e Atividades

Não vamos chover no molhado! Já vailonge o tempo em que a escola faziaadestramento com os alunos, colocando-os um atrás do outro para ouvir umapessoa falando e escrevendo em umquadro verde. Todos os que pisam emuma sala de aula, de qualquer nível,

precisam estar conscientes de que paraeducar é preciso envolver-se e envolver,principalmente através do lúdico,quando se trata de crianças. No EnsinoReligioso não é diferente.

A música e a gesticulação são formassimples de despertar a criança para otranscendente. Valem desde músicasreligiosas mais tradicionais e de conhe-cimento popular até outras, comtemática específica para alguns assuntosdo Ensino Religioso (fraternidade, res-peito, união, fé, etc.). Nessa linha, cabebem o uso de música para momentos derelaxamento e meditação, afinal o Ensi-no Religioso visa também despertar atranscendência, levando o educando aencontrar-se com ele mesmo.

Momentos de oração

Qual seria o motivo de se fazer ummomento de oração regularmente com aturma? Agradecer? Pedir? É claro que nãohá uma resposta certa e exata para isso,mas é importante saber aonde se querchegar.

No espaço da sala de aula, que éplural e povoado por diferentes, não sepode fazer nada que vá direcionar opensamento para um só lugar, que nãosejam os grandes valores dos quais ahumanidade comunga. A oração,portanto, deve ser realizada pelaimportância que possui em si, e não para“converter” alguém a alguma crença. Por

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outro lado, mesmo que o educando esua família não professem nenhuma fé, aexperiência da oração não lhe pode sersonegada, pois é através dela que o serhumano faz uma “reflexão” para buscarsignificados e contemplar a vida.

Para começar, é muito importantecoletar das crianças e de suas famíliasas orações que habitualmente fazem,acolhendo a todas, sem distinção. Depois,pode-se, a cada dia, criar orações apartir das experiências da vida da pró-pria criança. Para se sistematizar essaexperiência, é possível criar algo comoum “diário de orações”: a cada dia, umacriança pode representar graficamentesua oração e apresentá-la a turma. Cadaatividade produzida pelas crianças écoletada e, no final de determinadoperíodo, o resultado será um livro deorações composto pelos educandos. Sepossível, a criança que irá fazer a oraçãodo próximo dia poderá levar o livro paracasa e dar sua contribuição com a ajudada família. Se a sala tiver um “recanto religi-oso” organizado, pode-se fazer as orações lá.Assim, a criança incorporará esse mo-mento a sua rotina e identificará a postu-ra e o ambiente adequados para vivê-lo.

Hora do Conto: explorando históriasde textos sagrados

Se há algo que povoa abundantementeo universo religioso são histórias. Dasparábolas contadas por Jesus às antigas

lendas africanas, o imaginário da huma-nidade tem sido, por milênios, alimenta-do por lendas e mitos que ensinam o serhumano a ser quem ele é, ou quemdeveria ser.

Para a criança, o que menos interessaé se a história contada é verdadeira ounão: para ela, o mais importante é pene-trar na trama, entrar na história e imaginar-se como um dos personagens. Assim, aose trazer uma história proveniente dastradições religiosas para ser estudada emuma Hora do Conto, a preocupaçãomaior precisa ser transmitir a mensagemdela, e não comprovar que ela aconteceude fato. Tomemos, por exemplo, a histó-ria de Adão e Eva: ao contá-la, o essenci-al é que a criança perceba que suamensagem central é a de que a humani-dade poderia existir em completa harmo-nia e felicidade, mas que, por causa daambição, acabou se afastando dessa“vocação inicial”. Se Adão e Eva existiramou não? Sei lá!

No fim...

O Ensino Religioso está em plenaconstrução em nosso país. Como conse-qüência de uma colonização feita pelaIgreja Católica, a disciplina de cunhopedagógico com lugar reservado nocurrículo ainda deixa muitas dúvidas epoucas certezas. Já se sabe que EnsinoReligioso não é espaço para converterninguém e que também não pode ser

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uma “aula sobre qualquer coisa”. OEnsino Religioso trata do fenômenoreligioso e da busca de todos nós peloalém para encontrarmos a nós mesmos.Não esqueça que você também estáfazendo essa busca e que as respostasque procura só poderão serdecodificadas por você. Não esqueçatambém que essa busca, apesar de indi-vidual, não precisa ser solitária: o quevocê busca todos buscam. Você pode terrespostas para os outros e os outrospodem ter respostas para você. Nãoesqueça, também, que entre tantas outrastarefas você escolheu educar e que apalavra educar pode significar revelar oque está oculto (educére). Ajude suascrianças a revelarem o que está ocultonas vidas delas e deixe-as revelar o queestá oculto em você.

FORÇA SEMPRE!

Sugestões de Leitura

A VIAGEM DE TÉO – Romance dasReligiões (Catherine Clément – Companhiadas Letras) – Menino com doença aparen-temente incurável é levado pela tia, meiomaluca, para uma viagem ao redor domundo, onde ele vai conhecendo asgrandes (e pequenas) religiões da humani-dade.

O LIVRO DAS RELIGIÕES (JosteinGaarder – Companhia das Letras) – Oautor de “O Mundo de Sofia” dá umavisão geral das religiões, utilizando umalinguagem acessível e gostosa de ler. No

final, há uma parte escrita por AntônioFlávio Pieruchi sobre as religiões dematriz africana no Brasil. É ler e entender.

COLEÇÃO REDESCOBRINDO OUNIVERSO RELIGIOSO (Vozes) – Coleçãode livros didáticos que aborda, desde aEducação Infantil, o fenômeno religiosode maneira ampla e igualitária entre astradições religiosas.

POESIA FORA DA ESTANTE (Ed.Projeto) – Coletânea de poesias grafica-mente dispostas de maneira muito inte-ressante. Poesia e arte sempre levam àtranscendência. Dá para usar sem medo.

A BÍBLIA DA TURMA DA MÔNICA(Maurício de Souza Editora / Ed. NovaFronteira) – A Turma da Mônica vive assituações e os ensinamentos do livrosagrado dos cristãos. As idéias são geniais,como quando o livro mostra o Cascãocorrendo da chuva, em direção a umalagoa, para falar da crucificação de Cristo.

RECREIO ESPECIAL: CRIANÇAS DOMUNDO (Abril) – Edição especial daRecreio que dá uma idéia geral dasbrincadeiras, dos hábitos e das músicasdas crianças ao redor do mundo. Nomeio disso tudo, é claro, aparecem ascrenças e os hábitos provenientes dasreligiões. E ainda dá para cantar “LaBella Polenta” com as crianças.

MENINA NINA: DUAS RAZÕES PARANÃO CHORAR (Ziraldo) – O eternoMenino Maluquinho conta a história damorte de sua esposa através dos olhos da

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Série Fundo do Milênio para a Primeira Infância Cadernos Pedagógicos – volume 2

neta, Nina. Excelente para trabalhar umadas questões mais recorrentes no EnsinoReligioso: a morte e o que cremos queacontece depois dela (apesar do título, éimpossível não chorar ao ler).

QUALQUER COISA QUE O RUBEMALVES TENHA ESCRITO – O gênio mineiroé o típico sábio: às vezes, ele parece darpalavras exatamente àquilo que nãosabemos expressar. A última que ouvi delefoi esta: “Não pergunte quantos anostenho, pois isso eu não sei dizer. O quesei é quantos não tenho mais!”

TODOS DO MICHEL QUOIST – Aquivale o mesmo dito para o Rubem Alves.Hábil nas palavras, o padre francês tam-bém tem as palavras certas para o queparece impossível ser descrito.

TODOS DO MICHEL SERRES – Membroda Academia Francesa, este filósofo dosnossos tempos levanta, de maneira bela epoética, questões relevantes, como acomunicação humana e a beleza dasdiferenças.

TERRA (Sebastião Salgado) – Livrofotográfico, feito em parceria com ChicoBuarque de Hollanda, mostrando a rela-ção das pessoas com a terra em nossarealidade. Salgado consegue extrair belezadas mais trágicas situações, inquietandomuito a quem observa suas imagens.

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOSDIREITOS HUMANOS (Ruth Rocha eOtávio Roth – Quinteto Editorial)

PAPITOCO PROCURA UM AMIGO(Martha Maria Rezende Martins, Editorado Brasil)

SE ESSA RUA FOSSE MINHA (EduardoAmos, Moderna)

O SENTIDO DA VIDA (Bradley TrevorGreive, Sextante)

ROSAS INGLESAS (Madonna)ESQUISITA COMO EU (Martha

Medeiros)REVISTA DAS RELIGIÕES (edições

especiais da revista Super Interessante)AS MAIS BELAS ORAÇÕES DE TODOS

OS TEMPOS (Rosemarie Muraro e FreiCintra, Sextante)

COLEÇÃO DE MANUAIS DA TURMADA MÔNICA (Maurício de Souza, Globo)

MEU LIVRO DE FOLCLORE (RicardoAzevedo, Ática)

HISTÓRIAS À BRASILEIRA (Ana MariaMachado, Companhia das Letrinhas)

FÁBULAS E LENDAS DE LEONARDODA VINCI (Salamandra)

COLEÇÃO SE LIGUE EM VOCÊ (TioGaspa, Vida e Consciência)

OS DEUSES E DEUS (Brigitte Labbé,Scipione)

GERAÇÃO DA PAZ (IPJ)CRIANÇAS COMO VOCÊMEU CORAÇÃO PERGUNTOU I E II

(Selma Said, Vozes)O AMOR RENOVANDO O TRABA-

LHO / QUALIDADE É COLOCAR AMOR(José Rafael de Medeiros, Vozes)

Para Ver

MATRIX – É claro que você não verácom as crianças. Essa trilogia é essencialpara entender os simbolismos da vida emnossos tempos. Tome a pílula vermelha e

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Cadernos Pedagógicos – volume 2 Série Fundo do Milênio para a Primeira Infância

acompanhe Neo em sua jornada paralibertar as mentes.

O REI LEÃO – Hakuna Matata! Esseclássico da Dysney traz uma série deidéias para tratar no Ensino Religioso:rituais (o batismo de Simba no início), amorte (você sabe de quem) e o sentido davida. Além de tudo isso, ainda tem oTimão e o Pumba.

MULAN – Mais Dysney, desta vezdando uma olhada na cultura chinesa enas suas crenças. Acompanhe a históriada menina chinesa que se disfarça dehomem para lutar no lugar de seu pai naguerra e descubra que, para os chineses,ancestrais são muito mais do que antepas-sados. Atenção para o dragãozinho (du-blado por Eddie Murphy no desenho eminglês) destacado para proteger Mulan: acena em que ele imita o Batman é clássica.

GASPARZINHO – O fantasminha cama-rada nos leva, de maneira divertida, a umareflexão sobre a morte.

MEU PRIMEIRO AMOR – Não é paraver com as crianças. A história da meninaque é filha do dono de uma funerária e suasdescobertas, rumo à adolescência.

TELETUBBIES – De novo! De novo!Apesar de toda “gozação” em cima dosbichinhos esquisitos, o programa é muitointeligente e feito para crianças em idade pré-escolar. Além de todas as descobertas queeles fazem, eles se amam muito!

XUXA NO MUNDO DA IMAGINAÇÃO –Esqueça o que já falaram da Xuxa! Agoraela acertou a mão e fez um programa inteli-gente para crianças.

ILHA RÁ-TIM-BUM – Cao Hamburgernos oferece mais essa jóia da TV brasileira.Crianças perdidas em uma ilha misteriosaprecisam aprender a conviver entre si edesvendar os enigmas do ambiente.

O SENHOR DOS ANÉIS – “O filme émuito comprido e eu não entendi nada?”Então reveja com muita atenção.

Para Ouvir

CUIDADO QUE MANCHA (EditoraProjeto) – O grupo musical de GustavoFinkler é uma das coisas mais geniais jásurgidas nos pampas. Desde a MulherGigante (com músicas que são historinhas evice-versa), passando pela Família Sujo (queconta a história de uma família que nãotomava banho), até o Natal de Natanael(com a história do menino que queria passara noite de Natal com seu pai, mas nãoconseguia nunca), dá para aproveitar tudo ecurtir de montão com a criançada.

CASA DE BRINQUEDOS (Toquinho) –Toda a magia da infância nas letras deToquinho. “O Caderno”, com ChicoBuarque, serve para lembrar os tempos deescola e chorar.

CANÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA(Toquinho e Elifas Andreato) – Todos osprincípios dos Direitos da Criança nosversos de Toquinho e Elifas Andreato. Mas otodo da obra vale a pena, com ressalvas aocantor.

Referência BibliográficaFOWLER, James W. Estágios da fé. São Leopoldo:

Sinodal, 1992.

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Atividades de Estudo eAprofundamento

Maria Helena Lopes

As tradições religiosas e espirituais sãotransmitidas de uma geração para outraatravés de celebrações, festas, cultos erituais. A participação em momentos de féde um determinado grupo propicia apren-dizagens e vivências sobre os modos deas pessoas manifestarem suas crenças. Ascelebrações costumam fazer parte da vidae da formação de cada pessoa ou gruposocial.

• Registre suas lembranças sobremomentos de fé e celebração em suavida e de sua família. Fotografias, convitesde casamento, registros de batismo, pensa-mentos ou poemas, orações são recorda-ções importantes de nossas vidas. Asefemérides religiosas, como Natal, Diade Iemanjá, etc., também podem comporo seu painel.

• Um teste para os seus talentos dereconciliação. Dê nota de 1 a 10 paracada aspecto e some os resultados, tendocomo critério seus parâmetros pessoais.

Abertura para corrigir seus erros assimque os percebe.

Resistência à tentação de espalhar fofo-cas e falar mal do próximo.

Consideração pelos sentimentos dosoutros.

Cuidado com o que fala para não ofen-der as pessoas.

Superação de ressentimentos.

Capacidade de pedir desculpas quandoerra.

Capacidade de perdoar e dar nova opor-tunidade a quem erra.

Boa vontade para entender quem pensadiferente.

Ausência de preconceitos.Total: .......................

Comente seu escore, destacando:

• os aspectos em que você aindapode melhorar;

• as contribuições que emanam decada um para o fortalecimento de umacultura de paz entre as pessoas.

• Relato de Experiência

Uma professora, preocupada com aomissão do sentido religioso da Páscoa emsua escola e com a excessiva valorização datroca de chocolates, resolveu propor a seusalunos e colegas uma Festa de Páscoa coma participação dos líderes religiosos dacomunidade. Todos ficaram muito empolga-dos com a idéia: crianças, professores efamílias. Havia três religiões representadasna comunidade: a evangélica, a católica e aumbanda.

As crianças prepararam os convites parao padre, o pastor e o pai de santo e, emcomitivas, procederam a entrega.

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Cadernos Pedagógicos – volume 2 Série Fundo do Milênio para a Primeira Infância

No pátio da escola, foi organizadauma grande mesa com toalha brancapara receber aquelas pessoas muitoqueridas, que dedicavam seu tempoevangelizando pessoas e transmitindo paz.

A cada um dos representantes religio-sos foi solicitado que falassem sobre osentido religioso da Páscoa em suasreligiões. Cada um trouxe informaçõessobre as origens e ahistória da efeméride,assim como mensagensde fraternidade e solida-riedade entre as pessoas.

As crianças e seusfamiliares sentiram-sehonrados e orgulhososcom a presença dosreligiosos, que para finali-zar o colóquio convida-ram todos para orar.

Foi um dia muitoemocionante na escolapara todos que participa-ram, alunos, professores,familiares e representan-tes religiosos. Os choco-lates não foramesquecidos, tambémfizeram parte da festa,mas não foram, comcerteza, o maisimportante.

• Tente fazer algo parecido em suacomunidade, registre com desenhos,depoimentos, etc.

Muitos temas podem ser conversadoscom as crianças, como: o que é orar, aimportância de fazer o bem, os símbolosdas religiões, entre outros.

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são as cócegas que ela me fazbrincando nas orelhas.Ela dorme dentro da minha almae às vezes acorda de noitee brinca com os meus sonhos.Vira uns de perna para o arPõe uns em cima dos outrose bate palmas sozinhasorrindo para o meu sono...A Criança Nova que habita onde vivodá-me uma mão a mime a outra a tudo que existee assim vamos os três pelo caminho

que houver,saltando e cantando e rindoe gozando o nosso segredo comumque é o de saber por toda a parteque não há mistério no mundoe que tudo vale a pena.

Alberto Caeiro

ilosofia e InfânciaRosana Fernandes

A mim a criançaensinou-me tudo.Ensinou-me a olharpara as coisas.Aponta-me para todas as coisasque há nas flores.Mostra-me como as pedrassão engraçadasquando a gente as tem na mãoe olha devagar para elas.A Criança Eternaacompanha-me sempre.A direção de meu olhar é oseu dedo apontando.O meu ouvido atentoalegremente a todos os sons

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Cadernos Pedagógicos – volume 2 Série Fundo do Milênio para a Primeira Infância

“Quando eu tiver uma semente de feijão,vou plantar no meu canteiro.

A outra acabou de engolir a suacolherada, passou o guardanapo na bocae replicou:

— Feijão não tem semente. A sementeé ele mesmo.

A pequenina não entendeu e tornou:— Então, como é que ele pode nascer

sem semente?A outra, depois de pensar um pouco,

explicou:— Eu acho que é mesmo a terra que,

um dia, vira feijão.— Mas sem ter havido nenhuma semente

antes?— É, mesmo sem ter havido. Ela vai

se juntando, juntando, juntando, e fica assimnum grão...

E procurou, pelo prato, para ver seencontrava mais algum.

A menorzinha não se conformou muitocom essa transformação abstrata.

Foi tomando a sopa e pensando.Depois de um pedaço de silêncio, reatou

a conversa.— Olha, também pode ser assim: um

homem faz uma bolinha pequenina,pequenininha de massa... Depois, pinta porcima. Fica o primeiro feijão. E depois, osoutros nascem...

A outra menina perguntou imediatamente:— E com que é que ele faz a massa?A pequenina pensou um pouco

e depois resolveu:— Pode ser com batata.— Mas batata não é feijão. — concluiu

a outra.

Aproximei-me com precaução para ouvirmais. As duas, porém, perceberam talvez queestavam sendo surpreendidas no seu pensamentoe com esse horror que as crianças merecidamentevotam aos adultos — e pensando, decerto, que eusou como os outros todos — começaram abeliscar um pedacinho de pão.

Cecília Meireles — Crônicas de Educação

O movimento e a criação, pormeio do pensar presente nessa con-versa, remontam a uma inquietude, auma formulação de questionamentose a uma constituição de problemasque apontam para a característicacentral da filosofia. O que CecíliaMeireles apresentou foi justamenteduas amigas atuando sobre umquestionamento prenhe de sentido,desconfiando e enfrentando uma opensamento da outra, encarnando,assim, uma amizade que se faz“condição para pensar”.

As crianças, freqüentemente, fa-zem perguntas que tiram o chão dequalquer educador. Colocam emquestão o que é evidente para amaioria dos adultos e desconstroemsaberes já consolidados. Será que, aofazerem esses questionamentos, ascrianças estão filosofando? O queserá que um professor pode fazercom essas questões? Respondê-las?Responder parece ser apenas umasdas inúmeras possibilidades de açãomediante tais perguntas.

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A filosofia está intimamente ligadaa questionamentos e à construção deproblemas. Partir das questões colo-cadas pelas crianças faz com que opensamento, tanto delas como o dosprofessores, se exercite e se prolifere.

Eis aí uma boa alternativa de se-guimento a tais questionamentos.Pode-se, ainda, aprofundá-los ecomplexificá-los com outras questõese outros apontamentos, constituindo,pouco a pouco, problemas filosóficosjunto com os alunos. E esse “juntocom” tem bastante relevância, poisindica encontro e construção conjunta.E o com é a qual de bastante relevân-cia, pois indica encontro e construçãoconjunta. A participação e o

envolvimento discente, na composiçãoe compreensão dos problemas,produzem sentido e afastam a apren-dizagem da reprodução e da meraassimilação, aproximando-se da criação.

Certamente, com esse exercício dopensar, várias habilidades cognitivasserão desenvolvidas, como, por exemplo,a argumentação, o raciocínio hipotéticoe a interpretação. Mas esse não é oobjetivo principal da filosofia, isso vemmais como conseqüência. O queaparece de interessante nessa proposta éa capacidade de pensar, diferentementedo que se vinha pensando, é a criaçãode outros pensares. Ao se problematizar,coloca-se em movimento o saber e seproduz o novo.

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Entretanto, o que o educador podefazer para tentar propiciar esse pensar?Em princípio, qualquer atividade oumaterial que possa aguçar e possibilitar opensar pode ser utilizado para instigar osalunos. Livros de literatura infantil, músi-cas, textos de filósofos, fotos e filmes sãoapenas alguns exemplos dos materiaisque estão sendo utilizados com sucessonas aulas de filosofia. Assim como amiza-de, fome, guerra, morte e família sãoexemplos de temas refletidos filosofica-mente, ou seja, problematizados e perma-nentemente repensados.

No caso da história relatada porCecília Meireles, um professor poderia,por exemplo, fazer a experiência dagerminação do feijão em algodões mo-lhados com o intuito de provocar eincitar o pensamento daquelas duascrianças. Observe, ainda, que nesse casoas perguntas que ambas faziam inquieta-vam e exigiam coerência mútua. Nodecorrer do diálogo entre elas, as inter-ferências que uma fazia no pensamen-to da outra foram fundamentais para odesenvolvimento intelectual das mes-mas.

Da mesma forma, algumas perguntasmais gerais podem auxiliar os educado-res a fazerem interferências desse tipo,por exemplo: “Que relação se pode fazerentre o que você e o fulano falou?”. “Dêexemplos do que você acabou de falar”.“Diga de outra maneira o que você

acabou de dizer”. “Argumente”. “Justifi-que”. “O que faz você pensar dessemodo?”. “Alguém pensa diferente defulano?”. “Alguém tem outra hipótesepara essa questão?”, etc.

No entanto, é essencial que a escutadocente esteja dotada de uma atenção ede um cuidado bastante acentuados, demodo a transformar uma simples perguntaem uma problematização mais criteriosa.Assim, num movimento duplo, alunos eeducadores procuram se despojar dasrespostas previamente elaboradas e in-quietam mutuamente seus pensares.

A filosofia, enquanto problemati-zação, leva à produção de novos sentidos,modificando a compreensão que se temde si mesmo e do mundo. Indica,portanto, um não-saber em tensãoconstante com o saber, em trânsito per-manente de um para o outro, impedindo,assim, a cristalização de algum supostosaber. Logo, tratar de filosofia nos centrosinfantis não se refere à transmissão deconteúdos fixos e pré-determinados nemà reprodução de doutrinas filosóficas,mas sim a um exercício contínuo dopróprio pensar, do próprio filosofar.

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“O nascimento do pensamento é igual aonascimento de uma criança: tudo começacom um ato de amor. Uma semente há de serdepositada no ventre vazio. E a semente dopensamento é o sonho. Por isso oseducadores, antes de serem especialistas emferramentas do saber, deveriam serespecialistas em amor: intérpretes desonhos.”

Rubem Alves — A alegria de ensinar

SUGESTÃO DE MATERIAISPEDAGÓGICO-FILOSÓFICOS

Literatura Infantil

DRUCE, Arden. Bruxa, bruxa, venha aminha festa. Editora Brinque-Book. (Obelo, o feio e algo mais.)

FETH, Monika. O Pintor, a Cidade e oMar. Editora Brinque-Book. (Sonhos,projetos pessoais e valores.)

FETH, Monika. O Catador de Pensa-mentos. Editora Brinque-Book. (Umsenhor que catava pensamentosindiscriminadamente e os plantava.)

FURNARI, Eva. Nós. Global Editora eDistribuidora LTDA. (A diferença e o pre-conceito.)

MASUR, Jandira. Porquês. EditoraÁtica. (A história de uma menina quefazia muitas perguntas. Uma história demuita curiosidade.)

MELLO, Roger. A pipa. EditoraPaulinas. (Uma pipa pequena e simplesvoando junto com uma grande pipa.Uma história de poder, competição eoutras saídas.)

ORTHOF, Sylvia. Maria-vai-com-as-outras. Editora Ática. (O que será queacontece com quem é “maria-vai-com-as- outras”? Esse livro retrata a vida dequem não pensa com a própria cabeça esegue os passos de outros sem umaavaliação própria do que seria melhor.)

QUINO. Toda a Mafalda. MartinsFontes Editores. (Mafalda, uma meninapolitizada e questionadora está presenteem várias tirinhas – histórias em quadri-nhos – fazendo perguntas e exercitandoo pensar.)

REGINO, Maria. É duro ser criança.Editora Harbra. Coleção Cogumelo. (Omundo da criança, o mundo adulto esuas controvérsias.)

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SAINT-EXUPÉRY, Antoine. O PequenoPríncipe. Editora Agir. (As aventuras e osensinamentos de um príncipe de outroplaneta que viaja pelo universo.)

SARDI, Sérgio Augusto. Ula. WSEditor. (A história de uma menina, cha-mada Ula, questionadora e observadora,que coloca em questão desde o simplespresente no dia-a-dia ao complexo.)

ZATZ, Sílvia. O Clube dos Contrários.Editora Companhia das Letrinhas. (Históriade uma criança que brinca e reinventa omundo.)

ZIRALDO, Zélio. A Bela Borboleta.Editora Melhoramentos. (A vida presentenos livros. A liberdade que ganham seuspersonagens cada vez que alguém lêalgum livro.)

SORDI, Rose. Mariana do Contra.Editora Moderna. (A história de uma meni-na que estava sempre do lado oposto,desejando e pensando o contrário do quehavia.)

ALMEIDA, Fernanda Lopes de. A fadaque tinha idéias. Editora Ática. (Nesselivro, há diversas histórias de uma fadaque tinha muitas idéias criativas.)

PARA SABER MAIS SOBREFILOSOFIA COM CRIANÇAS

Sugestões de Leitura

KOHAN, Walter Omar; VAKSMAN,Vera (orgs.). Filosofia para crianças – naprática escolar. Série Filosofia e Crianças,volume II. Petrópolis: Vozes, 1999.

GALLO, Silvio; CORNELLI, Gabriele;DANELON, Márcio (orgs.). Filosofia doensino de Filosofia. Série Filosofia eCrianças, volume VII. Petrópolis: Vozes,2003.

DANIEL, Marie-France. A Filosofia eas crianças. São Paulo: Editora NovaAlexandria, 2000.

Referência Bibliográfica

DELEUZE, Gilles. L’ Abécédaire de Gilles Deleuze.Paris: Editions Montparnasse, 1997. Vídeo. Editado noBrasil pelo Ministério de Educação, “TV Escola”,2001.DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs:capitalismo e esquizofrenia. Volume 3. Rio de Janeiro:Editora 34, 1996.-. O que é a filosofia? Rio de Janeiro: Editora 34,1992.DELEUZE, Gilles; DUHME, Jacqueline. L’oiseauphilosophie. França: Seuil, 1997.MEIRELES, Cecília. Crônicas de educação. Volume 1.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, Fundação BibliotecaNacional, 2001.

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Atividades de Estudo eAprofundamento

Maria Helena Lopes

Os Porquês

Os “porquês” das crianças quebuscam apenas informação não têmuma dimensão filosófica. A reflexãopassa a ter esse nível quando oquestionamento é fruto de umestranhamento diante de um eventoconhecido, uma inquietação que brotado interior da criança. Em relação àpergunta “quem sou eu? “, a criançapode estar com a preocupação desaber dados de identidade e é óbvioque não está filosofando. Mas essa

pergunta pode estar impregnada dabusca de um conhecimento que vaimuito além do que é socialmenteconhecido. Quem sou eu? De ondevim? Qual a minha origem? Mas osdados de identificação, ascaracterísticas físicas, a explicação defecundação não serão suficientes paratranqüilizá-la. A questão envolve omistério da vida ou da morte queainda não desvendanos. As questõesfilosóficas não são pontuais, isto é, asrespostas obtidas levam à formulaçãode nova perguntas, formando umcampo amplo de investigação eavanço de hipóteses.

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• Relacione o texto ao lado com aconversa entre duas crianças relatadapor Cecília Meireles.

• Uma das competências maisnecessárias do educador infantil é acapacidade de ver e ouvir as crianças,de observá-las incessantemente.Procure detectar diálogos entre crian-ças que elucidem o filosofar infantil.

• Escolha um dos títulos deliteratura infantil sugeridos no texto.Conte a história a seus alunos e relatecomo foram os comentários eperguntas das crianças, relacionando-as com o filosofar infantil.

• Com os seus colegas e o coordena-dor técnico de sua Mesa Educadora,escolha um dos filmes sugeridos ecombinem a data para assisti-lo. Apósconstruam um texto destacando asidéias/reflexões filosóficas do filme:

O Mágico de Oz.O homem bicentenário.Fernão Capelo gaivota.O Pequeno Príncipe.FormiguinhaZ.Vida de inseto.Em busca do vale encantado.

Sugestão de Leitura

O Pequeno PríncipeAutor: Antoine de Saint-ExupéryEditora Agir

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Nota sobre os Autores1º Texto – Corpo e movimento ou comotransformar pulgas em bichos-preguiçaDULCE CORNETET DOS SANTOSLicenciada em Educação Física pela Universidadedo Vale do Rio dos Sinos / UNISINOS. Mestre emEducação pela Universidade do Vale do Rio dosSinos / UNISINOS. Professora do Centro Univer-sitário FEEVALE, atuando nos cursos de EducaçãoFísica, Pedagogia, Normal Superior e Psicopeda-gogia.

2º Texto – Expressão ArtísticaELIZABETH AMORIMMestre em educação pela Universidade doVale do Rio dos Sinos / UNISINOS.Psicopedagoga clínica, diretora e coordenado-ra pedagógica do Centro Infantil Recreio daCriança desde 1977.

3º Texto – Conta uma história, só mais uma, tá?ANA MARIA DISCHINGER MARSHALEspecialista em Literatura Infanto-Juvenil pelaPUC-RS: Mestre em Educação pela Universida-de Federal do Rio Grande do Sul; Professora deLiteratura Infantil e aposentada pela RedeMunicipal de Ensino, na Secretaria Municipalde Educação de Porto Alegre, após 30 anos deregência de classes de pré-escola.

4º Texto – Escreve meu nome?JANICE IZABEL DE OLIVEIRALicenciada em Pedagogia – Habilitação Magis-tério e Pré-Escola pela Universidade Federal doRio Grande do Sul/UFRGS. Professora da redeMunicipal de Ensino de Porto Alegre.Professora da Organização Mundial paraEducação Pré-Escolar.

5º Texto – Natureza, cultura,sociedade e suas transformaçõesCLEONICE DE CARVALHO SILVAEspecialista em Educação Ambiental peloCentro Universitário La Salle. Coordenadorado Projeto de Educação Ambiental Construin-do Conceitos e Valores a partir do Atlas Ambientalde Hannover-Alemanha em 2000. Vencedora doPrêmio Professor Nota 10, em 2001, da FundaçãoVictor Civita – Revista Nova Escola.

6º Texto – As florestas, os rios, os mares,eu e os animaisMARIA HELENA LOPESMestre em Educação, na área de AconselhamentoPsicopedagógico, pela Pontifícia UniversidadeCatólica do Rio Grande do Sul. Preside a OMEP/BR/RS/Porto Alegre e ocupa a vice-presidência daOMEP/Brasil.

7º Texto – Culturas locais e regionais:valores, mitos, lendas e crençasMARISE CAMPOSEspecialista em Tecnologia Educacional, naárea de Televisão Educativa, pela PontifíciaUniversidade Católica do Rio Grande do Sul. Éassessora técnica da presidência da OMEP/BR/RS/Porto Alegre e da OMEP Brasil.

8ºTexto – Mas o que é ciência mesmo?MARIA HELENA LOPESMestre em Educação, na área de AconselhamentoPsicopedagógico, pela Pontifícia UniversidadeCatólica do Rio Grande do Sul. Preside a OMEP/BR/RS/Porto Alegre e ocupa a vice-presidência daOMEP/Brasil.

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9º Texto – Matemática, aritmética, descobertas...JANICE IZABEL DE OLIVEIRALicenciada em Pedagogia – Habilitação Magistériopara Pré-Escola pela Universidade Federal do RioGrande do Sul/UFRGS. Professora da rede Munici-pal de Ensino de Porto Alegre. Professora daOrganização Mundial para Educação Pré-Escolar.

10º Texto – A religiosidade e a espiritualidadena educação infantilRENATO FERREIRA MACHADOEspecialista em Orientação Educacional. Estudantede Teologia na Pontifícia Universidade Católica doRio Grande do Sul desde 2001. Membro da Equipede Ensino Religioso da Associação de EducaçãoCatólica do Rio Grande do Sul. Assessora várioseventos e estudos sobre o Ensino Religioso, comênfase na Educação Infantil e Séries Iniciais.

11º Texto – Filosofia e InfânciaROSANA APARECIDA FERNANDESEspecialista em Ensino de Filosofia pela Universi-dade de Brasília. Mestranda em Educação naUniversidade Federal do Rio Grande do Sul.Realiza cursos sobre Filosofia com crianças emdiversas instituições da rede pública e particulardo Rio Grande do Sul.

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