A Totalidade e a Ordem Implicada

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  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

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    DAVID BOHM

    A Totalidade e a Ordem Implicada

    Traduo MAURO DE CAMPOS SILVA

    Reviso Tcnica NEWTON ROBERVAL EICHENBERG

    EDITORA CULTRIX

    So Paulo

    Ttulo do original: Wholeness and the Implicate Order

    Copyright David Bohm 1980 Publicado originalmente por Routledge & Kegan Paul Ltd.

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    Sumrio

    entos 8

    Fragmentao e totalidade 19

    formas ocidentais e orientais de percepo da

    O reomodo - uma experincia com a linguagem e o pensamento 51

    o em nossa linguagem 52

    odo 69

    ossa viso global de mundo 75

    ssos 77

    a inteligncia 79

    amento 87

    omo processo 94

    ia quntica 100

    ico-quntico enquanto estado

    oxo de Einstein, Rosen e Podolsky - a indivisibilidade de todos

    teoria quntica em termos de variveis ocultas 111

    riveis ocultas

    Agradecim

    Introduo 9

    CAPTULO 1 -

    Apndice: Resumo da discusso sobre as

    totalidade 42

    CAPTULO 2 -

    1. Introduo 51

    2. Uma investiga

    3. A forma do reomodo 58

    4. A verdade e o fato no reom

    5. O reomodo e suas implicaes na n

    CAPTULO 3 - A realidade e o conhecimento considerados como proce

    1. Introduo 77

    2. O pensamento e

    3. A coisa e o pensamento 834. O pensamento e o no-pens

    5. O campo do conhecimento, considerado c

    CAPTULO 4 - Variveis ocultas na teoria quntica 98

    1. Os principais aspectos da teoria quntica 98

    2. Limitaes impostas ao determinismo pela teor

    3. Sobre a interpretao do indeterminismo na teoria quntica 101

    4. Argumentos a favor da interpretao do indeterminismo mecn

    irredutvel de ausncia de lei 103

    5. A soluo de Bohr para o parad

    os processos materiais 108

    6. Interpretao preliminar da

    7. Crticas de nossa interpretao preliminar da teoria quntica em termos de va

    116

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    8. Avanos em direo a uma teoria mais detalhada das variveis ocultas 121

    isenberg 126

    r o nvel subquntico 147

    ia quntica como indicao de uma nova ordem na fsica 154

    159

    mo um desenvolvimento a partir da ordem e da medida 164

    ntica como indicao de uma nova ordem na fsica 189

    a - a lente e o holograma 193

    a ordem explicada na lei fsica 210

    o e o desdobramento 228

    ando a ordem mecanicista na fsica com a ordem implicada 228

    da multidimensional 246

    9. Tratamento das flutuaes qunticas 124 W. O princpio da incerteza de He

    11. A indivisibilidade dos processos qunticos 130

    12. Explieao da quantizao da ao 135

    13. Discusso sobre experimentos para sonda

    14. Concluso 152

    CAPTULO 5 - A teor

    Parte A: O desenvolvimento de novas ordens, conforme o revela a histria da fsica 154

    1. Introduo 154

    2. O que ordem?

    3. Medida 162

    4. A estrutura co

    5. Ordem, medida e estrutura na fsica clssica 166

    6. A teoria da relatividade 167

    7. A teoria quntica 175

    CAPTULO 6 - A teoria quParte B:A ordem implicada e a ordem explicada na lei fsica 189

    1. Introduo 189

    2. Totalidade indivis

    3. Ordem implicada e ordem explicada 197

    4. O holomovimento e seus aspectos 201

    5. A lei no holomovimento 208

    Apndice: A ordem implicada e

    CAPTULO 7-O proceder do universo e da conscincia: o dobrament

    1. Introduo 228

    2. Resumo, contrast

    3. A ordem implicada e a estrutura geral da matria 236

    4. A teoria quntica como indicao de uma ordem implica

    5. A cosmologia e a ordem implicada 250

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    6. A ordem implicada, a vida e a fora da necessidade global 255

    o comum 271

    sivo 285

    Agradecimentos

    permisso em reproduzir material

    Introduo

    entos") que representam a evoluo

    ocupao tem sido

    7. A conscincia e a ordem implicada 258

    8. A matria, a conscincia e seu fundament

    Notas 280

    ndice remis

    O autor e o editor gostariam de agradecer, pela

    protegido por direitos autorais, a The Van Leer Jerusalm Foundation (Captulos 1 e 2 de

    Fragmentation and Wholeness, 1976), aos editores de The Academy (Captulo 3 de The

    Academy, vol. 19, na 1, fevereiro de 1975), Academic Press Ltd(Captulo 4 de Quantum Theory

    Radiation and High Energy Physics, parte 3, editado por D. R. Bates, 1962), e Plenum

    Publishing Corporation(Captulos 5 e 6 de Foundations of Physics, vol. 1, ns 4, 1971, pp. 359-81

    e vol. 3, na 2, 1973, pp.139-68).

    Este livro uma coleo de ensaios (ver "Agradecim

    do meu pensamento nos ltimos vinte anos. Talvez seja til uma breve introduo para indicarquais as principais questes que sero discutidas e como esto relacionadas.

    Eu diria que, em meu trabalho cientfico e filosfico, minha principal pre

    a de entender a natureza da realidade, em geral, e a da conscincia, em particular, como um todo

    coerente, o qual nunca esttico ou completo, mas um processo infindvel de movimento e

    desdobramento. Assim, quando olho para trs, vejo que mesmo quando criana, fascinava-me o

    enigma, na verdade o mistrio, da natureza do movimento. Toda vez que se pensa em alguma

    coisa, essa coisa parece ser apreendida como algo esttico, ou ento como uma srie de imagens

    estticas. No entanto, na experincia efetiva do movimento, sente-se um processo de fluxo

    ininterrupto e indiviso, ao qual se relaciona a srie de imagens estticas no pensamento, como

    uma seqncia de fotografias ("paradas") poderiam estar relacionadas realidade de um carro em

    movimento. Esta questo, claro, j foi, em sua essncia, levantada filosoficamente h mais de

    dois mil anos nos paradoxos de Zeno; mas, at agora, no se pode dizer que teve uma soluo

    satisfatria. Alm disso, h a questo do que a relao entre pensamento e realidade. Como

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    mostra uma cuidadosa observao, o prprio pensamento encontra-se num processo efetivo de

    movimento. Isto quer dizer que se pode sentir, no "fluxo da conscincia", uma sensao de

    fluncia diferente daquela que se reconhece no movimento da matria em geral. Desse modo,

    ser que o prprio pensamento no faz parte da realidade como um todo? Mas, ento, o que

    poderia significar uma parte da realidade "conhecer" outra, e at que ponto isto seria possvel? O

    contedo do pensamento nada mais nos d que "instantneos" abstratos e simplificados da

    realidade, ou pode ir alm, apreendendo de algum modo a prpria essncia do movimento vivo

    que sentimos na experincia efetiva?

    Est claro que, ao refletir e ponderar sobre a natureza do movimento, tanto no pensamento

    clui nossas

    quanto no objeto do pensamento, chega-se inevitavelmente questo da totalidade. A noo de

    que aquele que pensa (o Ego) est, pelo menos em princpio, completamente separado, e

    independente, da realidade sobre a qual ele pensa, acha-se obviamente assentada com muita

    firmeza em toda a nossa tradio. ( evidente que esta noo quase universalmente aceita no

    Ocidente, mas no Oriente h uma tendncia geral para neg-la verbal e filosoficamente, ao

    mesmo tempo em que tal abordagem permeia a maior parte da vida e da prtica diria, assim

    como acontece no Ocidente.) Experincias gerais do tipo acima descrito, juntamente com umagrande dose de conhecimento cientfico moderno sobre a natureza e a funo do crebro como o

    local em que ocorre o pensamento, sugerem com muita fora que uma tal diviso no pode ser

    mantida de modo consistente. Mas isto nos coloca frente a um desafio muito difcil: Como pensar

    coerentemente uma nica, ininterrupta e fluente existncia de fato como um todo, contendo tanto

    o pensamento (a conscincia) como a realidade externa conforme a experimentamos?

    Evidentemente, isso nos leva a considerar a nossa viso de mundo total, que in

    noes gerais acerca da natureza da realidade, juntamente com aquelas que dizem respeito

    ordem global do universo, isto , a cosmologia. Para enfrentar esse desafio, nossas noes de

    cosmologia e da natureza geral da realidade devem ter espao em si para permitir uma avaliao

    consistente da conscincia. Vice-versa, nossas noes de conscincia devem ter espao em si

    para entender o que significa ser o seu contedo a "realidade como um todo". Os dois conjuntos

    de noes, juntos, devem ser de tal forma a permitir uma compreenso de como a realidade e a

    conscincia se relacionam.

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    Essas questes, claro, so muito amplas e, de qualquer maneira, talvez nunca sejam

    etanto, sempre me pareceu importante haver uma contnua investigao de propostas que

    mentais e

    ender as

    resolvidas por completo e definitivamente.

    10

    Entr

    visem a enfrentar o desafio aqui assinalado. Obviamente, a tendncia que prevalece na cincia

    moderna contra um tal empreendimento. Em vez disso, ela dirigida principalmente para

    previses tericas relativamente detalhadas e concretas que apresentam pelo menos alguma

    promessa de eventuais aplicaes pragmticas. Parece que necessria agora uma explicao

    do por que de eu querer ir com tanta veemncia contra a corrente geral predominante.

    Ao lado do que sinto ser a importncia intrnseca de questes to funda

    profundas, eu chamaria a ateno para o problema geral da fragmentao da conscincia

    humana, que discutido no Captulo 1. A proposto que as distines largamente difundidas e

    infiltradas entre as pessoas (raa, nao, famlia, profisso, etc., etc.) e que agora impedem a

    humanidade de trabalhar em conjunto pelo bem comum, e mesmo pela sobrevivncia, tm como

    um dos fatores-chave de sua origem um tipo de pensamento que trata as coisas como sendo

    inerentemente divididas, desconectadas e "fracionadas" em partes constituintes ainda menores.Cada parte considerada como essencialmente independente e existente por si mesma.

    Quando o homem pensa em si prprio dessa maneira, inevitvel que tenda a def

    necessidades de seu prprio "Ego" contra as dos outros; ou, se ele se identificar com um grupo de

    pessoas do mesmo tipo, defender esse grupo de um modo semelhante. Ele no consegue

    pensar seriamente na humanidade como a realidade bsica, cujas reivindicaes vm em primeiro

    lugar. Mesmo que tente levar em considerao as necessidades da humanidade, sua tendncia

    v-la como algo separado da natureza, e assim por diante. O que estou propondo aqui que o

    modo geral como o homem pensa a totalidade, isto , a sua viso geral do mundo, crucial para a

    ordem global da prpria mente humana. Se ele pensar a totalidade como constituda de

    fragmentos independentes, ento assim que sua mente tender a operar. Mas, se ele consegue

    incluir tudo, coerente e harmoniosamente, num todo global indiviso, ininterrupto e ilimitado (pois

    todo limite uma diviso ou ruptura), ento sua mente tender a mover-se de modo semelhante,

    e disto incluir uma ao ordenada dentro do todo.

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    11

    Evidentemente, como j indiquei, nossa viso geral de mundo no o nico fator importante

    o de mundo nova e no-

    Captulo 2, tratamos do papel da linguagem em efetuar a fragmentao do

    um novo

    nesse contexto. De fato, deve-se dar ateno a muitos outros fatores, tais como emoes,

    atividades fsicas, relaes humanas, organizaes sociais, etc. Mas, talvez, por no termos no

    presente nenhuma viso de mundo coerente, h uma tendncia geral a ignorar quase que por

    completo a importncia psicolgica e social de tais questes. Minha sugesto que uma viso de

    mundo apropriada, adequada para o seu tempo, geralmente aquela dos fatores bsicos

    essenciais para a harmonia no indivduo e na sociedade como um todo.

    O Captulo 1 mostra que a prpria cincia est exigindo uma vis

    fragmentria, no sentido de que a atual abordagem que analisa o mundo em partes

    independentemente existentes no funciona muito bem na fsica moderna. Mostra tambm que

    tanto na teoria da relatividade como na teoria quntica, noes que impliquem a totalidade indivisa

    do universo proporcionariam um modo muito mais ordenado de considerar a natureza geral da

    realidade.

    No

    pensamento. Mostramos que a estrutura sujeito-verbo-objeto das lnguas modernas implica quetoda a ao surge num sujeito separado, atuando ou sobre um objeto separado, ou ento

    reflexivamente em si prprio. Esta estrutura difundida conduz, no todo da vida, a uma funo que

    divide a totalidade da existncia em entidades separadas, que so consideradas essencialmente

    fixas e estticas em sua natureza. Indagamos ento se possvel experimentar com novas formas

    de linguagem, onde o papel fundamental ser dado ao verbo, antes que ao substantivo. Tais

    formas tero como contedo uma srie de aes que fluem e se fundem umas nas outras, sem

    separaes ou rupturas bem definidas. Assim, tanto na forma como no contedo, a linguagem

    estar em harmonia com o movimento fluente e ininterrupto da existncia como um todo.

    O que se prope aqui no uma nova linguagem como tal, mas, de preferncia,

    modo de utilizar a linguagem existente - o reomodo (modo fluente). Desenvolvemos um tal modo

    como uma forma de experimentao com a linguagens que pretende principalmente esclarecer a

    funo fragmentria da linguagem comum, em vez de fornecer um novo modo de falar que possa

    ser utilizado na comunicao prtica.

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    No captulo 3, as mesmas questes so consideradas num contexto diferente. Ele comea

    s prximos captulos so um tanto mais tcnicos e matemticos. No entanto, grande

    is ocultas na teoria quntica. No momento, a teoria

    em tambm manifestar-se como ondas, movimentar-se descontinuamente, que no h lei

    com uma anlise sobre como a realidade pode ser considerada, em essncia, um conjunto de

    formas num movimento ou processo universal subjacente, e ento pergunta como o nosso

    conhecimento pode ser apreciado da mesma maneira. Assim, o caminho pode estar aberto para

    uma viso de mundo em que a conscincia e a realidade no estariam separadas uma da outra.

    Esta questo discutida extensamente e chegamos noo de que nossa viso geral de mundo

    , ela prpria, um movimento global de pensamento, que tem de ser vivel no sentido de que a

    totalidade das atividades que dela fluem estejam geralmente em harmonia, tanto em si mesmas

    quanto em relao ao todo da existncia. Uma tal harmonia considerada possvel somente se a

    viso de mundo fizer parte de um processo infindvel de desenvolvimento, evoluo e

    desdobramento, que se ajusta como parte do processo universal que o fundamento de toda a

    existncia.

    Os tr

    parte deles deve ser compreensvel para o leitor leigo, uma vez que as partes tcnicas no so

    inteiramente necessrias para o entendimento, embora acrescentem um contedo significativo

    para aqueles que podem acompanh-las.O Captulo 4 lida com as varive

    quntica o meio mais bsico disponvel na fsica para entender as leis fundamentais e universais

    relacionadas matria e seu movimento. Como tal, evidente que deve ser seriamente

    considerada em qualquer tentativa de desenvolver uma viso de mundo global. A teoria quntica,

    conforme atualmente constituda, apresenta-nos um grande desafio, se que estamos de fato

    interessados numa tal aventura, pois no h nela qualquer noo consistente do que possa ser a

    realidade subjacente constituio e a estrutura universal da matria. Logo, se tentarmos utilizar

    viso de mundo predominante, baseada na noo de partculas descobrimos que as "partculas"

    (tais como os eltrons)

    12

    13

    pod

    nenhuma que se aplique detalhadamente aos movimentos efetivos das partculas individuais, e

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    que somente previses estatsticas podem ser feitas sobre grandes agregados dessas partculas.

    Se, por outro lado, aplicarmos a viso de mundo em que o universo considerado como um

    campo contnuo, descobrimos que este campo tambm deve ser descontnuo, bem como

    semelhante a partculas, e que est to solapado em seu comportamento efetivo quanto exigido

    na viso, em termos de partculas, da relao como um todo.

    Parece claro, ento, que nos defrontamos com uma profunda e radical fragmentao, e

    sa espcie de pressuposio de fato est de acordo com o esprito geral de nossa

    essidade forte e profunda de algum tipo de noo da realidade em nosso pensamento, mesmo

    ada estgio, a ordem apropriada de operao da mente requer

    tambm com uma confuso consumada, se tentamos pensar o que poderia ser a realidade tratada

    por nossas leis fsicas. Atualmente, os fsicos tendem a evitar essa questo adotando a atitude

    segundo a qual as nossas vises globais concernentes natureza da realidade so de pouca ou

    nenhuma importncia. Supe-se que tudo o que conta na teoria fsica seja o desenvolvimento de

    equaes matemticas que nos permitam prever e controlar o comportamento de grandes

    agregados estatsticos de partculas. Essa meta no considerada meramente por sua utilidade

    pragmtica e tcnica; mais do que isso, na maioria dos trabalhos em fsica moderna h uma

    pressuposio de que esse tipo de previso e de controle tudo do que trata o conhecimento

    humano.

    Espoca. Mas a minha principal proposta neste livro que no podemos simplesmente prescindir de

    uma viso de mundo global. Se tentarmos fazer isso, veremos que acabamos ficando com

    quaisquer vises de mundo (geralmente inadequadas) que calhem de estar mais mo. De fato,

    descobre-se que os fsicos no so realmente capazes apenas de ocupar-se de clculos com o

    objetivo de previso e controle: eles julgam necessrio usar imagens baseadas em algum tipo de

    noes gerais sobre a natureza da realidade, tais como "as partculas que so os blocos de

    construo do universo"; mas essas imagens agora so altamente confusas (p. ex., essas

    partculas movem-se descontinuamente e tambm so ondas). Em resumo, estamos aqui frente a

    um exemplo que demonstra a

    14

    nec

    que seja fragmentria e confusa.

    Minha sugesto que, a c

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    uma apreenso global do que geralmente conhecido, no apenas em termos formais, lgicos,

    matemticos, mas tambm como intuio, em imagens, sentimentos, uso potico da linguagem,

    etc. (Talvez possamos dizer que isso envolve a harmonia entre o "crebro esquerdo" e o "crebro

    direito".) Este modo de pensar global no somente uma fonte frtil de novas idias tericas:

    necessrio para que a mente humana funcione de forma harmoniosa, o que, por sua vez, pode

    ajudar a tornar possvel uma sociedade ordenada e estvel. Conforme indicado nos captulos

    iniciais, porm, isto requer um fluxo e um desenvolvimento contnuos de nossas noes gerais de

    realidade.

    No Captulo 4, a preocupao dar um incio ao processo de desenvolvimento de uma

    uma

    o que somos e fazemos (linguagem, pensamento, sentimento, sensao, ao fsica, as

    viso coerente do tipo de realidade que poderia ser a base das previses matemticas corretas

    efetuadas na teoria quntica. Tais tentativas tm sido geralmente recebidas na comunidade dos

    fsicos de um modo um tanto confuso, pois h um sentimento generalizado de que, se deve haver

    alguma viso geral de mundo, ela tem de ser entendida como a noo "aceita" e "final" sobre a

    natureza da realidade. Mas, desde o comeo, minha atitude tem sido a de que nossas noes

    referentes cosmologia e natureza geral da realidade esto em contnuo processo de

    desenvolvimento, e que talvez se tenha de iniciar com idias que sejam meramente algo como umaperfeioamento daquilo que at agora se encontra disponvel, e da avanar para idias

    melhores. O Captulo 4 apresenta os reais e graves problemas que confrontam qualquer tentativa

    de prover uma noo consistente da "realidade quntica mecnica", e indica uma certa

    abordagem preliminar para uma soluo desses problemas em termos de variveis ocultas.

    No Captulo 5, explora-se uma diferente abordagem dos mesmos problemas. Faz-se

    investigao das nossas noes bsicas de ordem. A ordem em sua totalidade , em ltima

    anlise, evidentemente indefinvel, no sentido de que permeia

    15

    tudo

    artes, atividade prtica, etc.). Porm, durante sculos, na fsica, a ordem bsica tem sido aquela

    da grade retilnea cartesiana (ligeiramente ampliada, na teoria da relatividade, para a grade

    curvilnea). Durante esse tempo, a fsica passou por um enorme desenvolvimento, com o

    aparecimento de muitos aspectos radicalmente novos, mas a ordem bsica permaneceu

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    essencialmente inalterada.

    A ordem cartesiana adequada para anlises do mundo em partes existentes

    desenvolvimento mais concreto de uma

    nrias de espao e tempo, juntamente com aquelas de partculas materiais existentes

    discutida

    separadamente (por exemplo, partculas ou elementos de campo). Neste captulo, contudo,

    examinamos a natureza da ordem com maior generalidade e profundidade, e descobrimos que

    tanto na relatividade como na teoria quntica a ordem cartesiana leva srias contradies e

    confuses. Isto porque ambas as teorias sugerem que o efetivo estado de coisas a totalidade

    ininterrupta do universo, antes que a anlise em partes independentes. No obstante, as duas

    teorias diferem radicalmente em suas noes detalhadas de ordem. Assim, na relatividade, o

    movimento contnuo, causalmente determinado e bem definido, enquanto que na mecnica

    quntica descontnuo, no-causalmente determinado e no bem definido. Cada teoria est

    comprometida com suas prprias noes de modos de existncia essencialmente estticos e

    fragmentrios (a relatividade com a de eventos separados, conectveis por meio de sinais, e a

    mecnica quntica com um estado quntico bem definido). V-se assim a necessidade de um

    novo tipo de teoria que abandone esses compromissos bsicos e, no mximo, recupere alguns

    aspectos essenciais das antigas teorias enquanto formas abstratas derivadas de uma realidade

    mais profunda, onde prevalea a totalidade ininterrupta.No Captulo 6 vamos mais alm para encetar um

    nova noo de ordem, que possa adequar-se a um universo de totalidade ininterrupta. Esta a

    ordem implicada ou dobrada. Na ordem dobrada, espao e tempo no so mais os fatores

    dominantes que determinam as relaes de dependncia ou independncia de diferentes

    elementos. Em vez disso, possvel uma espcie completamente diferente de conexo bsica de

    elementos, de onde nossas noes

    16

    ordi

    separadamente, so abstradas como formas derivadas da ordem mais profunda. Essas noes

    ordinrias de fato aparecem naquilo que chamado de ordem explicada ou desdobrada, que

    uma forma especial e distinta contida na totalidade geral de todas as ordens implicadas.

    No Captulo 6, a ordem implicada apresentada de um modo geral, e

    matematicamente num apndice. O stimo e ltimo captulo, porm, uma apresentao mais

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    detalhada (embora no-tcnica) da ordem implicada, incluindo sua relao com a conscincia.

    Isso leva a uma indicao de algumas linhas ao longo das quais talvez seja possvel enfrentar o

    desafio urgente de se desenvolver uma cosmologia, bem como um conjunto de noes gerais

    referentes natureza da realidade que sejam adequadas ao nosso tempo.

    Finalmente, espera-se que a apresentao do material destes ensaios possa ajudar a

    CAPTULO 1 - Fragmentao e totalidade

    cial importncia considerar

    em geral so divididos em

    viram principalmente para acrescentar

    transmitir ao leitor como o prprio assunto efetivamente se desdobrou, de maneira que a forma do

    livro seja, por assim dizer, um exemplo do que pode se entender como o seu contedo.

    17 e 18

    O ttulo deste captulo "Fragmentao e totalidade". de espe

    esta questo nos dias de hoje, pois agora a fragmentao ser muito difundida, no apenas por

    toda a sociedade, mas tambm em cada indivduo; e isto leva a uma espcie de confuso geral na

    mente, criando uma srie interminvel de problemas e interferindo to seriamente com a clareza

    da nossa percepo que nos impede de resolver a maior parte deles.

    Assim, a arte, a cincia, a tecnologia e o trabalho humano

    especialidades, sendo cada uma delas considerada como essencialmente separada das outras.No satisfeitos com esse estado de coisas, os homens propuseram assuntos interdisciplinares

    adicionais, com a inteno de unir essas especialidades.

    Mas esses novos temas, em ltima anlise, ser

    outros fragmentos separados. Portanto, a sociedade como um todo tem-se desenvolvido de forma

    tal que se encontra fracionada em naes e em diferentes grupos religiosos, polticos,

    econmicos, raciais, etc. Em correspondncia, o ambiente natural do homem tem sido visto como

    um agregado de partes existentes separadamente, a serem exploradas por diferentes grupos de

    pessoas. Da mesma forma, cada ser humano individual foi fragmentado num grande nmero de

    compartimentos separados e conflitantes, conforme seus diferentes desejos, metas, ambies,

    lealdades, caractersticas psicolgicas, etc., a tal ponto que em geral se admite que certo grau de

    neurose inevitvel, enquanto que muitos indivduos, que vo alm dos limites "normais" da

    fragmentao, so classificados como paranides, esquizides, psicticos, etc.

    19

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    evidente que ilusria a noo de que todos esses fragmentos existem separadamente, e essa

    rio e adequado para o homem, em seu

    o entanto, essa habilidade do homem em separar a si prprio do ambiente, bem como

    avia, quando este modo de pensamento aplicado de uma forma mais ampla noo do

    iluso no faz outra coisa seno levar a um conflito e a uma confuso infindveis. De fato, a

    tentativa de viver de acordo com a noo de que os fragmentos esto realmente separados , em

    essncia, o que tem levado srie crescente de crises extremamente urgentes, com as quais,

    hoje, nos defrontamos. Assim, como bem se sabe agora, esse modo de vida o que vem

    ocasionando a poluio, a destruio do equilbrio da natureza, a superpopulao, a desordem

    poltica e econmica em escala mundial, e a criao de um ambiente global que no saudvel,

    seja fsica ou mentalmente, para a maioria das pessoas que nele tm de viver. Individualmente,

    desenvolveu-se um sentimento muito difundido de impotncia e desespero em face do que parece

    ser uma massa avassaladora de foras sociais desiguais, que est alm do controle, e mesmo da

    compreenso, dos seres humanos por ela envolvidos.

    De fato, at certo ponto, sempre foi necess

    pensamento, dividir e separar as coisas, de modo a reduzir os problemas a propores

    controlveis; pois, evidentemente, se em nosso trabalho tcnico prtico tentssemos lidar com o

    todo da realidade de uma s vez, ficaramos atolados. Logo, de certa forma, a criao de matrias

    especiais de estudo e a diviso do trabalho foram avanos importantes. Mesmo antigamente, aprimeira compreenso que o homem teve de que no era idntico natureza foi um passo crucial,

    pois tornou possvel uma espcie de autonomia em seu pensamento, que lhe permitiu ir alm dos

    limites imediatos da natureza, a princpio em sua imaginao e, finalmente, em seu trabalho

    prtico.

    N

    em dividir e distribuir as coisas, levou em ltima instncia a um largo espectro de resultados

    negativos e destrutivos, pois ele perdeu a conscincia do que estava fazendo e, deste modo,

    estendeu o processo de diviso alm dos limites dentro dos quais este opera adequadamente. Em

    essncia, o processo de diviso uma maneira conveniente e til de pensar sobre as coisas,

    principalmente no domnio das atividades prticas, tcnicas e funcionais (p. ex., dividir um terreno

    em diferentes campos onde vrias safras sero cultivadas).

    20

    Tod

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

    14/244

    homem a respeito de si mesmo e a respeito do mundo todo em que vive (isto , sua viso de

    mundo pessoal), ento ele deixa de considerar as divises resultantes como meramente teis ou

    convenientes e comea a ver e a experimentar a si prprio, e ao seu mundo, como efetivamente

    constitudos de fragmentos separadamente existentes. Guiado por uma viso pessoal de mundo

    fragmentria, o homem ento age no sentido de fracionar a si mesmo e ao mundo, de tal sorte

    que tudo parece corresponder ao seu modo de pensar. Ele assim obtm uma prova aparente de

    que correta a sua viso de mundo fragmentria, embora, claro, negligencie o fato de que ele

    prprio, agindo de acordo com o seu modo de pensar, a causa da fragmentao que agora parece

    ter uma existncia autnoma, independente da sua vontade e do seu desejo.

    Desde tempos imemoriais, os homens tm conscincia desse estado de fragmentao

    axnic

    ossas formas

    quisas cientficas correntes, que um campo relativamente familiar para mim (embora, claro,

    depois num contexto

    aparentemente autnomo e projetam mitos de uma "idade de ouro" ainda mais antiga, antes que a

    ruptura entre o homem e a natureza e entre o homem e o seu semelhante tivesse ocorrido. De

    fato, o ser humano sempre buscou a totalidade - mental, fsica, social, individual.

    instrutivo considerar que a palavra health(sade) em ingls baseia-se na palavra anglo-

    s a hale, que significa "inteiro" [whole, em ingls: isto , estar com sade estar inteiro, o

    que mais ou menos o equivalente, penso, da palavra hebraica "shalem". Igualmente, o inglsholy[sagrado, santo baseia-se na mesma raiz que whole. Tudo isso indica que o homem sempre

    sentiu que a integridade ou totalidade absolutamente necessria para que a vida valha a pena

    ser vivida. No entanto, durante eras, ele geralmente viveu em fragmentao. Certamente, a

    questo de por que isso tudo ocorre exige ateno cuidadosa e sria considerao.

    Neste captulo, a ateno ser focalizada no papel sutil, mas crucial, de n

    gerais de pensamento em sustentar a fragmentao e frustrar os nossos mais profundos anseios

    com vstas totalidade ou integridade; com o fim de dar discusso um contedo concreto,

    falaremos at certo ponto, em termos de

    21

    pes

    tambm se tenha em mente a importncia global das questes em exame).

    O que ser enfatizado, em primeiro lugar, na pesquisa cientfica e

    mais geral, que a fragmentao est sendo continuamente produzida pelo hbito quase

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

    15/244

    universal de tomar o contedo do nosso pensamento por "uma descrio do mundo como ele ".

    Ou ento, poderamos dizer que, nesse hbito, considera-se o pensamento como estando em

    correspondncia direta com a realidade objetiva. Uma vez que o nosso pensamento permeado

    por diferenas e distines, segue-se da que um tal hbito nos leva a enxerg-las como divises

    reais, de modo que o mundo ento visto e experimentado como algo efetivamente dividido em

    fragmentos.

    A relao entre o pensamento e a realidade qual ele se refere , de fato, muito mais

    r exemplo, os homens tinham a teoria de que a matria celeste era

    x., a Terra, o Sol, os planetas, etc.). Isto constituiu um novo modo de olhar para o cu, modo

    complexa do que a de uma mera correspondncia. Assim, na pesquisa cientfica, boa parte do

    nosso pensamento est assentada em termos de teorias. A palavra "teoria" deriva do grego

    theoria, que tem, assim como a palavra "teatro" a mesma raiz numa palavra que significa

    "observar" ou "fazer um espetculo". Assim, poder-se-ia dizer que uma teoria , basicamente,

    uma forma de insightou introviso, ou seja, um modo de olhar para o mundo, e no uma forma de

    conhecimento de como ele .

    Nos tempos antigos, po

    fundamentalmente diferente da matria terrena, e que era natural os objetos desta ltima carem,

    assim como era natural que os objetos celestes, como a Lua, permanecessem l em cima no cu.Com o advento da era moderna, porm, os cientistas comearam a amadurecer o ponto de vista

    segundo o qual no havia qualquer diferena essencial entre a matria terrena e a matria

    celeste. Isto, claro, implicava que os objetos do cu, como a Lua, deveriam cair, mas por muito

    tempo no notaram esta implicao. Num sbito insight, Newton ento viu que, assim como a

    ma cai, o mesmo acontece com a Lua, e de fato com todos os objetos. Assim, ele foi levado

    teoria da gravitao universal, em que todos os objetos eram vistos como caindo em direo a

    vrios centros

    22

    (p- e

    este em que os movimentos dos planetas no eram mais vistos mediante a antiga noo de uma

    diferena essencial entre matria celeste e matria terrena. Em vez disso, considerava-se esses

    movimentos em termos de velocidade de queda de toda a matria, celeste e terrena, em direo a

    vrios centros, e quando se via que alguma coisa no era explicada desse modo, procuravam-se,

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

    16/244

    e freqentemente descobriam-se, planetas novos e at ento invisveis em direo aos quais

    caam os objetos celestes (assim demonstrando a relevncia dessa maneira de olhar).

    A forma newtoniana de insight funcionou muito bem por vrios sculos, mas finalmente

    ntica), que as teorias mais antigas tornam-se cada vez mais obscuras quando se tenta utiliz-

    eorias mais antigas tornam-se falsas num determinado

    (como os antigos insights gregos que vieram antes) levou a resultados obscuros quando

    estendida a novos domnios. Desenvolveram-se, nesses novos domnios, novas formas de insight

    (a teoria da relatividade e a teoria quntica). Estas proporcionaram um quadro do mundo

    radicalmente diferente daquele de Newton (embora se tenha percebido que este ltimo ainda

    vlido num domnio limitado). Se supusssemos que as teorias propiciassem o verdadeiro

    conhecimento, correspondendo "realidade como ela ", ento teramos de concluir que a teoria

    newtoniana era verdadeira at por volta de 1900, aps o que, subitamente, tornou-se falsa,

    enquanto a relatividade e a teoria quntica tornaram-se a verdade. Uma concluso assim to

    absurda no se apresentar, contudo, se dissermos que todas as teorias so insights, que no

    so nem verdadeiros nem falsos, mas, antes, claros em certos domnios e obscuros quando

    estendidos alm destes. Isto significa, porm, que no igualamos teorias com hipteses. Como

    indica a raiz grega da palavra, uma hiptese uma suposio, isto , uma teia"colocada sob" o

    nosso raciocnio, como uma base provisria que deve ser testada experimentalmente quanto asua verdade ou falsidade. No entanto, como se sabe muito bem, no pode haver nenhuma prova

    experimental conclusiva sobre a verdade ou falsidade de uma hiptese geral que vise a beneficiar

    o todo da realidade. Em vez disso, percebe-se (p. ex., no s dos epiciclos ptolomaicos ou do

    fracasso dos conceitos newtonianos pouco antes do advento da relatividade e da teoria

    23

    qu

    las para obter insightem novos domnios. Uma cuidadosa observao sobre como isso acontece

    , geralmente, o principal indcio na direo de novas teorias, que viro a constituir

    posteriormente, novas formas de insight.

    Assim, em vez de supor que as t

    momento, dizemos apenas que o homem est desenvolvendo continuamente novas formas de

    insight, que so claras at um determinado ponto e depois tendem a ficar obscuras. No h,

    evidentemente, nesta atividade nenhuma razo para supor que existe ou existir uma forma de

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

    17/244

    insightfinal (correspondente verdade absoluta), ou mesmo uma srie uniforme de aproximaes

    dessa forma final. Em vez disso, na natureza do caso, pode-se esperar o desenvolvimento

    interminvel de novas formas de insight (que, no entanto, assimilaro certos aspectos

    fundamentais das formas mais antigas como simplificaes, maneira como a teoria da

    relatividade faz com a teoria newtoniana). Porm, conforme assinalamos antes, isto significa que

    nossas teorias devem ser consideradas basicamente como modos de olhar para o mundo como

    um todo (isto , como vises de mundo), e no como o "conhecimento absolutamente verdadeiro

    de como as coisas so" (ou como uma aproximao progressiva e uniforme desse conhecimento).

    Quando olhamos para o mundo por intermdio de nossos insights tericos, o

    conhecimento factual que obtemos ser, evidentemente, moldado e formado pelas nossas teorias.

    Nos tempos antigos, por exemplo, o fato sobre os movimentos dos planetas era descrito em

    termos da idia ptolomaica de epiciclos (crculos sobrepostos a crculos). No tempo de Newton,

    este fato foi descrito em termos de rbitas planetrias determinadas com preciso, analisadas

    mediante velocidades de queda em direo a vrios centros. Mais tarde, apresentou-se o fato do

    ponto de vista da relatividade, de acordo com os conceitos de espao/ tempo de Einstein. Ainda

    mais tarde houve uma especificao muito diferente do fato em termos da teoria quntica (que emgeral fornece apenas um fato estatstico). Na biologia, o fato agora descrito em termos da teoria

    da evoluo, mas antigamente era expresso em termos de espcies fixas de seres vivos.

    24

    Portanto, de um modo mais geral, uma vez dadas a percepo e a ao, nossos insightstericos

    omo Kant parece ter

    ensamento requer que geralmente

    prevem a principal fonte de organizao do nosso conhecimento factual.

    De fato, nossa experincia global moldada desta maneira. C

    mostrado pela primeira vez, toda experincia organizada segundo as categorias do nosso

    pensamento, isto , nossos modos de pensar sobre espao, tempo, matria, substncia,

    causalidade, contingncia, necessidade, universalidade, particularidade, etc. Pode-se dizer que

    essas categorias so formas gerais de insight ou modos de olhar para todas as coisas, de

    maneira que, num certo sentido, so uma espcie de teoria (mas, claro, esse nvel de teoria

    deve ter-se desenvolvido muito cedo na evoluo humana).

    Evidentemente, a clareza de percepo e de p

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

    18/244

    estejamos conscientes de como a nossa experincia moldada pelo insight(ntido ou confuso)

    proporcionado pelas teorias implcitas ou explcitas em nossos modos gerais de pensar. Com esta

    finalidade, til enfatizar que a experincia e o conhecimento so um s processo, em vez de

    pensar que o nosso conhecimento sobre algum tipo de experincia separada. Podemos nos

    referir a esse processo nico como experincia-conhecimento (o hfen indicando que so dois

    aspectos inseparveis de um movimento total).

    Ora, se no estivermos conscientes de que nossas teorias so formas de insightsempre

    em tal que elimina os modos de vida insalubres, responsveis pela disseminao das

    alm das limitaes existentes,

    em transformao, proporcionando molde e forma experincia em geral, teremos uma viso

    limitada. Isso pode ser expresso assim: a experincia com a natureza assemelha-se muito

    experincia com seres humanos. Se algum se aproxima de um outro homem com uma "teoria"

    fixa a respeito dele, como um "inimigo" contra o qual preciso se defender, esse homem

    responder da mesma maneira e, portanto, a "teoria" ser, aparentemente, confirmada pela

    experincia; de maneira semelhante, a natureza responder de acordo com a teoria com a qual

    for abordada. Assim, antigamente os homens pensavam que as epidemias eram inevitveis, e

    este pensamento ajudou-os a se comportarem de modo tal a reproduzir as condies

    responsveis pela sua disseminao. Com as mesmas formas cientficas de insights, ocomportamento do

    25

    hom

    epidemias, fazendo com que elas deixem de ser inevitveis.

    O que impede os insights tericos de avanar

    transformando-se para ir ao encontro de novos fatos, justamente a crena de que as teorias

    proporcionam um verdadeiro conhecimento da realidade (o que implica, claro, que elas nunca

    precisam mudar). Embora o nosso moderno modo de pensar tenha, evidentemente, mudado

    muito em relao ao antigo, os dois tm um aspecto fundamental em comum: ambos esto

    geralmente limitados, como que por "antoIhos", pela noo de que as teorias fornecem o

    verdadeiro conhecimento sobre a "realidade como ela ". Assim, ambos so levados a confundir

    as formas e moldes induzidos em nossas percepes pelo insight terico com uma realidade

    independente do nosso pensamento e do nosso modo de olhar. Essa confuso de crucial

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

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    importncia, uma vez que nos leva a abordar a natureza, a sociedade e o indivduo em termos de

    formas de pensamento mais ou menos fixas e limitadas, continuando assim, aparentemente, a

    confirmar as limitaes dessas formas de pensamento na experincia.

    Esse tipo de confirmao interminvel das limitaes em nossos modos de pensar

    considerarmos nossas teorias como "descries diretas da realidade

    o j foi indicado, isto far com que atuemos de maneira tal que, de fato, produziremos a

    uns poderiam dizer: "A

    particularmente significativo no que diz respeito fragmentao, pois, como foi mostrado

    anteriormente, toda forma de insight terico introduz as suas prprias diferenas e distines

    essenciais (p. ex., na antigidade, uma distino essencial era entre a matria terrena e a celeste,

    ao passo que na teoria newtoniana era essencial distinguir os centros em direo aos quais toda a

    matria estava caindo). Se considerarmos essas diferenas e distines como modos de olhar,

    como guias para a percepo, isto no implica que denotem substncias ou entidades que

    existam separadamente.

    Por outro lado, se

    como ela ", ento inevitavelmente trataremos essas diferenas e distines como divises, o

    que implica existncia separada dos vrios termos elementares que aparecem na teoria.

    Seremos, assim, levados iluso de que o mundo efetivamente constitudo de fragmentos

    separados e,26

    com

    prpria fragmentao subentendida em nossa atitude em relao teoria.

    importante dar uma certa nfase a este ponto. Por exemplo, alg

    fragmentao de cidades, religies, sistemas polticos, conflitos na forma de guerras, violncia

    geral, fratricdio, etc., so a realidade. A totalidade apenas um ideal, em direo ao qual talvez

    devamos nos empenhar." Mas no isto o que est sendo dito aqui. Antes, o que deve ser dito

    que a totalidade aquilo que real, e que a fragmentao a resposta desse todo ao do

    homem, guiado pela percepo ilusria, que moldada pelo pensamento fragmentrio. Em outras

    palavras, justamente porque a realidade um todo, o homem, com a sua abordagem

    fragmentria, inevitavelmente ser atendido com uma resposta correspondentemente

    fragmentria. Portanto, necessrio que o ser humano d ateno ao seu hbito de pensamento

    fragmentrio, que tenha conscincia dele, podendo assim elimin-lo. Ento, a abordagem da

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    20/244

    realidade pelo homem poder ser total, e a resposta tambm o ser. Entretanto, para que isso

    acontea, crucial que o ser humano esteja consciente da atividade de seu pensamento como tal;

    isto , como uma forma de insight, um modo de ver, e no como uma "cpia verdadeira da

    realidade como ela ".

    Est claro que podemos ter inmeros tipos diferentes de insights. O que se requer no

    hbito de ver a realidade e de atuar na direo dela como se ela fosse constituda de

    a teoria atmica, proposta pela (primeira vez por Demcrito

    uma integrao do pensamento, ou uma espcie de unidade imposta, pois qualquer ponto de vista

    imposto seria apenas um outro fragmento. Em vez disso, todos os nossos diferentes modos de

    pensar devem ser considerados como diferentes modos de olhar para a realidade una, cada um

    acompanhado de um certo domnio onde ele ntido e adequado. Pode-se de fato comparar uma

    teoria com uma determinada viso de algum objeto. Cada viso d apenas uma aparncia do

    objeto em algum aspecto. O objeto todo no percebido em nenhuma viso mas, em vez disso,

    apreendido s unicamente como aquela realidade nica que mostrada em todas essas vises.

    Quando entendermos plenamente que as nossas teorias tambm funcionam desse modo, ento

    no cairemos

    27

    nofragmentos separadamente existentes, o que corresponde ao modo como ela se apresenta ao

    nosso pensamento e nossa imaginao no momento em que tomamos nossas teorias por

    "descries diretas da realidade como ela ". Alm de uma conscincia geral do papel das teorias

    conforme acima indicado, necessrio dar especial ateno quelas teorias que contribuem para

    a expresso de nossas vises de mundo pessoais. Isto porque, em grande parte, nessas vises

    de mundo que nossas noes gerais sobre a natureza da realidade e sobre a relao entre o

    pensamento e a realidade so implcita ou explicitamente formadas. Quanto a isto, as teorias

    gerais da fsica desempenham um importante papel, pois considera-se que tratam da natureza

    universal da matria da qual tudo constitudo, e do espao e do tempo em termos dos quais

    todo movimento material descrito.

    Consideremos, por exemplo,

    h mais de 2.000 anos. Em essncia, (1) essa teoria nos leva a ver o mundo como constitudo por

    tomos que se movem no vazio. As formas e caractersticas sempre cambiantes dos objetos de

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    grande escala so vistos agora como resultados de arranjos cambiantes dos tomos em

    movimento. Evidentemente, essa viso foi, de certa forma, um importante modo de percepo da

    totalidade, pois possibilitou aos homens entender a enorme variedade de todo o mundo em

    termos dos movimentos de um nico conjunto de componentes bsicos, atravs de um nico

    vazio que permeia toda a existncia. No entanto, medida que a teoria atmica se desenvolveu, e

    acabou por se tornar um grande apoio para uma abordagem fragmentria da realidade. Pois

    deixou de ser considerada um insight, uma maneira de olhar, e os homens passaram a ver como

    uma verdade absoluta a noo de que o todo da realidade no , efetivamente, constitudo de

    outra coisa a no ser "blocos de construo atmicos", todos trabalhando juntos mais ou menos

    mecanicamente. Evidentemente, tomar qualquer teoria fsica como uma verdade absoluta algo

    que deve tender a fixar as formas gerais do pensamento em fsica e, assim, contribuir para a

    fragmentao.

    28

    Afora isso, porm, o contedo especfico da teoria atmica era tal que se mostrou especialmente

    ce nesses casos) a

    capaz de conduzir fragmentao, pois estava implcito nesse contedo que todo o mundo da

    natureza, juntamente com o ser humano, inclusive o seu crebro, o seu sistema nervoso, a suamente, etc., em princpio poderia ser entendido completamente em termos de estruturas e funes

    de agregados de tomos existentes separadamente. A confirmao dessa viso atmica por

    experimentos feitos pelo homem e por sua experincia em geral foi, claro, tomada como prova

    da exatido e, sem dvida, da verdade universal dessa noo. Assim, quase que todo o peso da

    cincia, foi colocado em apoio a uma abordagem fragmentria da realidade.

    importante assinalar, no entanto, que (como geralmente aconte

    confirmao experimental do ponto de lista atmico limitada. De fato, nos domnios abarcados

    pela teoria quntica e pela relatividade, a noo de atomismo leva a questes confusas, que

    indicam a necessidade de novas formas de insight, to diferentes do atomismo como este o de

    teorias que o precederam. Assim, a teoria quntica mostra que a tentativa de descrever e

    acompanhar uma partcula atmica com preciso minuciosa tem pouco significado. (Mais detalhes

    sobre este ponto so dados no Captulo 5.) A noo de uma trajetria atmica tem apenas um

    limitado campo de aplicabilidade. Numa descrio mais detalhada v-se que o tomo, sob muitos

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    aspectos, comporta-se tanto como uma onda quanto como uma partcula, talvez possa ser melhor

    considerado uma nuvem mal definida, dependendo, em sua forma particular, de todo o ambiente,

    e inclusive do instrumento de observao. Logo, no se pode mais manter a diviso entre o

    observador e o observado (que est implcita na viso atomstica que v cada um deles como

    agregados separados de tomos). Em vez disso, tanto o observador como o observado so

    aspectos que se fundem e se interpenetram, de uma realidade total, que indivisvel e no-

    analisvel. A relatividade nos leva a um modo de olhar para o mundo semelhante ao acima

    descrito em certos aspectos fundamentais (ver Captulo 5 para mais detalhes sobre este ponto). A

    partir

    29

    do fato de que, do ponto de vista de Einstein, no passvel nenhum sinal mais rpido que a luz,

    segue-se o colapso do conceito de corpo rgido. Mas este conceito crucial na teoria atmica

    clssica, pois nela os constituintes fundamentais do universo tm de ser pequenos objetos

    indivisveis, e isto s possvel se cada parte de um tal objeto estiver rigidamente ligada a todas as

    outras partes. Numa teoria relativstica, necessrio abandonar por completo a noo de que o

    mundo constitudo de objetos ou "blocos de construo" fundamentais. Em vez disso, precisover o mundo em termos de fluxo universal de eventos e processos. Assim, como indicado por A

    e B na Figura 1.1, em vez de pensar numa partcula, deve-se pensar num "tubo de universo".

    Figura 1.1

    Esse tubo de universo representa um processo infinitamente complexo de uma estrutura

    mo

    sa que se entende por isso obtida considerando-

    traes, elaboradas para se destacarem em nossa percepo por meio do pensamento. Na

    em vimento e em desenvolvimento centrada numa regio indicada pelos limites do tubo.

    Todavia, mesmo fora dele, cada "partcula" possui um campo que se estende atravs do espao e

    se funde com os campos de outras partculas.

    Uma imagem mais vvida do tipo de coi

    se as formas de onda como estruturas em vrtice num curso fluente. Conforme mostrado na

    Figura 1.2, dois vrtices correspondem a padres estveis de fluxo do fluido, centrados

    aproximadamente em A e em B. Evidentemente, esses vrtices devem ser considerados como

    30

    abs

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    23/244

    verdade, claro, os dois padres de fluxo abstrados se fundem e se unem, num nico movimento

    total do curso fluente. No h nenhuma diviso bem-definida entre eles, nem devem ser

    considerados como entidades existentes separadamente ou independentemente.

    Figura 1.2

    A teoria da relatividade requer esse tipo de modo de olhar para as partculas atmicas, as

    dade Indivisa em

    ovim

    ntece com tais padres de movimento numa torrente, alguns pensamentos reaparecem e

    natureza;

    quais constituem toda a matria, incluindo, claro, os seres humanos com seus crebros,

    sistemas nervosos e instrumentos de observao que construram e que utilizam nos laboratrios.

    Assim, abordando a questo por diferentes caminhos, a relatividade e a teoria quntica

    concordam no fato de que ambas implicam a necessidade de olhar para o mundo como um todo

    indiviso, no qual todas as partes do universo, incluindo o observador e seus instrumentos, se

    fundem e se unem numa totalidade. Nesta totalidade, a forma atomstica de insight uma

    simplificao e uma abstrao, vlidas somente em alguns contextos limitados.

    A nova forma de insight talvez possa ser melhor chamada de Totali

    M ento Fluente. Esta viso implica que esse fluxo, em certo sentido, anterior ao das "coisas"

    que podem ser vistas formando-se e dissolvendo-se nesse fluxo. Pode-se talvez ilustrar o que se

    quer dizer com isso considerando-se o "fluxo da conscincia". Esta fluidez da conscincia no definvel de maneira precisa, sendo, porm, evidentemente anterior s formas definveis dos

    pensamentos e das idias que podem ser vistos formando-se e dissolvendo-se no fluxo, como

    pequenos encrespamentos ou ondulaes, ondas e vrtices num curso fluente. Como

    31

    aco

    persistem de um modo mais ou menos estvel, enquanto que outros so evanescentes.

    A proposta para uma nova forma geral de insight que toda matria seja dessa

    isto , h um fluxo universal que no pode ser definido explicitamente, mas que s pode ser

    conhecido implicitamente, conforme indicado pelas formas e configuraes explicitamente

    definveis, algumas estveis e outras instveis, que podem ser abstradas do fluxo universal.

    Neste, mente e matria no so substncias separadas e sim aspectos diferentes de um

    movimento total e ininterrupto. Deste modo estamos aptos a olhar para todos os aspectos da

    existncia como no separados uns dos outros e, desse modo, podemos pr um fim na

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

    24/244

    fragmentao implcita na atitude usual em relao ao ponto de vista atmico, que nos leva a

    separar tudo de maneira consumada. No entanto, podemos incluir aquele aspecto do atomismo

    que ainda proporciona uma forma vlida de insight. Apesar da totalidade indivisa no movimento

    fluente, os vrios padres que dele podem ser abstrados possuem uma certa autonomia e

    estabilidade relativas que, de fato, so fornecidas pela lei universal do movimento fluente. Agora,

    porm, temos em mente, de forma ntida, os limites dessa autonomia e estabilidade.

    Assim, podemos, em contextos especficos, adotar vrias outras formas de insightque nos

    ma similar, em certos aspectos fundamentais, quele

    erial

    Um bom exemplo em termos do qual se pode entender essa distino obtido quando se

    ontexto, entender qual o significado de causa formal.

    possibilitem simplificar certas coisas, tratando-as momentaneamente, e para certos propsitos

    limitados, como se fossem autnomas e estveis, bem como, talvez, existentes separadamente.

    Porm, no precisamos cair na armadilha de olharmos para ns mesmos e para o mundo dessa

    maneira. Portanto, nosso pensamento no precisa mais levar iluso de que, efetivamente, a

    realidade de natureza fragmentria, e s aes fragmentrias correspondentes que surgem da

    percepo nublada por uma tal iluso.

    O ponto de vista discutido aci

    sustentado por alguns dos gregos antigos. Esta similaridade pode ser ressaltada ao se considerar

    a noo de causalidade em Aristteles. O filsofo distinguia quatro tipos de causas:32

    Mat

    Eficiente

    Formal

    Final

    considera algo vivo, como uma rvore ou um animal. A causa material ento apenas a matria,

    em que operam todas as outras causas, e a partir da qual a coisa constituda. Assim, no caso de

    uma planta, a causa material o solo, o ar, a gua e a luz solar, que constituem a substncia da

    planta. A causa eficiente alguma ao, externa coisa analisada, que permite o

    encaminhamento de todo o processo. No caso de uma rvore, por exemplo, o plantio da semente

    pode ser tomado como a causa eficiente.

    de crucial importncia, neste c

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

    25/244

    Infelizmente, em sua conotao moderna, a palavra "formal" tende a se referir a uma forma

    exterior no muito significativa (p. ex., como em "roupa formal" ou "uma mera formalidade").

    Todavia, na antiga filosofia grega, a palavra forma significava, em primeiro lugar, uma atividade

    formadora interna que a causa do crescimento das coisas, bem como do desenvolvimento e da

    diferenciao das suas vrias formas essenciais. Por exemplo, no caso de um carvalho, o que se

    indica pelo termo "causa formal" o movimento interno total da seiva, do crescimento das clulas,

    da articulao dos ramos, folhas, etc., que caracterstico desse tipo de rvore e diferente do que

    ocorre nos outros tipos. Numa linguagem mais moderna, isto seria melhor descrito como causa

    formativa, para enfatizar que o que est envolvido no uma mera forma imposta de fora, mas,

    antes, um movimento interno ordenado e estruturado, essencial para aquilo que as coisas so.

    Evidentemente, qualquer causa formativa deve ter um fim ou produto que ao menos esteja

    implcito. Assim, no possvel referir-se ao movimento interno da bolota dando origem a um

    carvalho, sem se referir simultaneamente ao carvalho que vai resultar deste movimento. Portanto,

    a causa formativa sempre implica causa final. E claro que tambm conhecemos a causa final

    como desgnio,

    33mantido em mente por meio do pensamento (noo esta estendida a Deus, que era considerado

    omo tendo, essencialmente, a

    como tendo criado o universo segundo um grande desgnio). Entretanto, o desgnio apenas um

    caso especial de causa final. Por exemplo, os homens geralmente almejam determinados fins em

    seus pensamentos mas o que efetivamente costuma emergir de suas aes , em geral, algo

    diferente daquilo que estava em seus desgnios, algo que estava, porm, implcito no que faziam,

    embora no conscientemente percebido pelos que tomaram parte.

    Na viso antiga, considerava-se a noo de causa formal c

    mesma natureza tanto para a mente como para a vida e para o cosmo como um todo. De fato,

    Aristteles via o universo como um organismo nico onde cada parte cresce e se desenvolve em

    sua relao com o todo e onde ela ocupa seu prprio lugar e sua prpria funo. Com respeito

    mente, podemos entender esse tipo de noo em termos mais modernos voltando nossa ateno

    para o movimento fluente da conscincia. Conforme indicado anteriormente, pode-se, em primeiro

    lugar, discernir vrios padres de pensamento nesse fluxo. Estes seguem-se um ao outro de

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

    26/244

    modo relativamente mecnico, mediante associaes determinadas por hbito e condicionamento.

    Evidentemente, tais mudanas associativas so externas estrutura interna dos pensamentos em

    questo, de modo que essas mudanas atuam como uma srie de causas eficientes. Contudo, ver

    a razo de algo no uma atividade mecnica dessa natureza: em vez disso, tem-se a

    conscincia de cada aspecto conforme assimilado num nico todo, cujas partes esto todas

    interiormente relacionadas (assim como, por exemplo, os rgos do corpo). Aqui preciso

    enfatizar que o ato da razo essencialmente um tipo de percepo intermediado pela mente, em

    certos aspectos semelhante percepo artstica, e no apenas a repetio associativa de razes

    j conhecidas. Assim pode-se ficar perplexo com um amplo espectro de fatores, coisas que no

    se ajustam, at que de repente h um lampejo da compreenso e, ento, v-se como todos esses

    fatores se rela cionam como aspectos de uma totalidade (considere, p. ex., o insightde Newton

    sobre a gravitao universal). No se pode de maneira adequada, fazer uma anlise ou descrio

    detalhada

    34

    de tais atos de percepo. Em vez disso, eles devem ser considerados como aspectos da

    o da totalidade indivisa

    atividade formadora da mente. Uma determinada estrutura de conceitos ento o produto dessaatividade, e esses produtos esto ligados pela srie de causas eficientes que operam no

    pensamento associativo comum - e, como foi assinalado anteriormente, nesta viso a atividade

    formadora considerada to fundamental na natureza como o na mente, de modo que as

    formas-produtos na natureza tambm esto ligadas por causas eficientes.

    Evidentemente, a noo de causa formativa relevante para a vis

    no movimento fluente, o que se constatou estar implicado nos modernos desenvolvimentos da

    fsica, notavelmente na teoria da relatividade e na teoria quntica. Logo, como tem sido

    assinalado, cada estrutura relativamente autnoma e estvel (p. ex., uma partcula atmica) deve

    ser entendida no como algo que existe de modo independente e permanente, mas, antes, como

    um produto formado no movimento fluente total e que finalmente voltar a dissolver-se nesse

    movimento. Como ele se forma e mantm a si prprio depende, ento, do seu lugar e da sua

    funo no todo. Portanto, vemos que certos desenvolvimentos na fsica moderna implicam um tipo

    de insight da natureza que est relacionado s noes de causa formativa e de causa final,

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

    27/244

    essencialmente semelhante quelas maneiras de olhar comuns na antigidade.

    No entanto, na maior parte dos trabalhos que hoje esto sendo feitos em fsica, as noes

    ia predominante na fsica moderna contrasta fortemente com qualquer espcie

    ativa na totalidade indivisa do movimento fluente. De fato, aqueles aspectos da teoria da

    de causa formativa e de causa final no so consideradas de importncia fundamental. Em vez

    disso, geralmente ainda se concebe a lei como um sistema autodeterminado de causas eficientes,

    operando num conjunto final de constituintes materiais do universo (p. ex., as partculas

    elementares sujeitas s foras de interao entre elas). No se considera que estes constituintes

    sejam formados num processo global, e sendo assim eles no so considerados como rgos

    adaptados ao seu lugar e sua funo no todo (isto , aos fins a que serviriam nesse mundo).

    Antes, tendem a ser concebidos como elementos mecnicos de natureza fixa, existentes

    separadamente.

    A tendnc

    de viso que d primazia atividade

    35

    form

    relatividade e da teoria quntica que sugerem a necessidade de uma tal viso tendem a ser

    desenfatizados e, na verdade, pouco notados pela maioria dos fsicos, pois so vistos em grandeparte como aspectos dos clculos matemticos, e no como indicaes da natureza real das

    coisas. Quando, na fsica, se usa a linguagem e o modo de pensar informais, que inspiram a

    imaginao e provocam o sentimento do que real e substancial, a maioria dos fsicos ainda fala

    e pensa, com uma total convico da verdade, em termos da noo atomstica tradicional de que

    o universo constitudo de partculas elementares que so "os blocos de construo bsicos", dos

    quais tudo feito. Em outras cincias, tais como a biologia, a fora dessa convico ainda

    maior, pois entre os que trabalham nessas reas h pouca conscincia do carter revolucionrio

    do progresso na fsica moderna. Por exemplo, os modernos bilogos moleculares geralmente

    acreditam que a totalidade da vida e da mente pode, em ltima instncia, ser entendida em termos

    mais ou menos mecnicos, por meio de algum tipo de extenso do trabalho que tem sido feito

    sobre a estrutura e a funo das molculas de ADN. Uma tendncia semelhante j comeou a

    dominar na psicologia. Chegamos, desse modo, ao muito estranho resultado de que, no estudo da

    vida e da mente, que so justamente os campos onde a causa formativa, atuando em movimento

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

    28/244

    fluente indiviso e ininterrupto, mais evidente experincia e observao, existe agora a mais

    forte das crenas na abordagem atomstica fragmentria da realidade.

    claro que a tendncia, predominante na cincia, para pensar e perceber em termos de

    erimentais de onde se tira a concluso de que esta viso necessria e inevitvel. Desse

    o surgem tais evidncias, a exemplo da

    i indicado, os homens que so guiados por uma tal viso de mundo

    uma viso pessoal de mundo fragmentria faz parte de um movimento maior que se tem

    desenvolvido ao longo das eras e que hoje permeia quase toda a nossa sociedade; mas, por sua

    vez, um tal modo de pensar e observar, presente na pesquisa cientfica, tende, muito

    acentuadamente, a reforar a abordagem geral fragmentria, pois d aos homens um quadro do

    mundo todo como no sendo constitudo de outra coisa seno um agregado de "blocos de

    construo atmicos" existentes separadamente, e fornece evidncias

    36

    exp

    modo, as pessoas so levadas a sentir que a fragmentao nada mais que uma expresso da

    "maneira como tudo realmente ", e que qualquer outra coisa impossvel. Portanto, h muito

    pouca disposio para buscar evidncias em contrrio.

    Na verdade, como j se indicou, mesmo quand

    fsica moderna, a tendncia geral no sentido de minimizar sua importncia ou mesmo ignor-lapor completo. Poder-se-ia at dizer que, de fato, no atual estado em que se acha a sociedade, e

    no modo atual de ensinar cincia, que uma manifestao desse estado da sociedade, uma

    espcie de preconceito a favor de uma viso pessoal de mundo fragmentria fomentado e

    transmitido (at certo ponto explcita e conscientemente, mas principalmente de uma maneira

    implcita e inconsciente).

    Porm, como j fo

    fragmentria no podem, a longo prazo, fazer outra coisa a no ser tentar, em suas aes,

    quebrar a si prprios e ao mundo em pedaos, em correspondncia com o seu modo geral de

    pensar. Uma vez que, em primeiro lugar, a fragmentao uma tentativa de estender a anlise do

    mundo em partes separadas alm do domnio onde faz-lo adequado, trata-se, na verdade, de

    uma tentativa de dividir aquilo que na realidade indivisvel. Na prxima etapa, uma tal tentativa

    tambm nos levar a tentar unir o que na realidade no pode ser unido. Isto pode ser reconhecido

    de maneira particularmente clara em termos de agrupamentos de pessoas na sociedade (grupos

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

    29/244

    polticos, econmicos, religiosos, etc.). O prprio ato de formar um tal grupo tende a criar um

    sentido de diviso e de separao dos membros em relao ao resto do mundo, mas, uma vez

    que eles esto, na realidade, ligados com o todo, isto no pode funcionar. Cada membro tem, de

    fato, uma conexo algo diferente, e mais cedo ou mais tarde esta diferena se revela como uma

    diferena entre ele e os outros membros do grupo. Toda vez que os homens separam-se do todo

    da sociedade e tentam unir-se por identificao dentro de um grupo, e claro que este acaba por

    manifestar disputas internas, o que leva ao colapso de sua unidade. Da mesma maneira, quando

    37

    os homens, na prtica de seu trabalho tcnico, tentam separar algum aspecto da natureza, poder-

    agir tem, evidentemente, implicaes em

    ssncia, uma confuso em torno da questo da diferena

    sfazer essa confuso

    se- desenvolver um estado semelhante de contradio e desunio. O mesmo tipo de coisa

    acontecer ao indivduo se ele tentar separar-se da sociedade. A verdadeira unidade no indivduo

    e entre o homem e a natureza, bem como entre o homem e o homem, s pode surgir numa, forma

    de ao que no tente fragmentar o todo da realidade.

    Nosso modo fragmentrio de pensar, olhar e

    cada aspecto da vida humana, isto , por uma curiosa ironia, a fragmentao parece ser a nica

    coisa universal na nossa vida, que funciona atravs do todo sem fronteiras ou limites. Isto ocorreporque as razes da fragmentao so muito profundas e esto muito difundidas. Como j foi

    assinalado, tentamos dividir o que uno e indivisvel, a isto implica que na prxima etapa

    tentaremos identificar o que diferente.

    Portanto, a fragmentao , em e

    e da semelhana (ou estado da unidade, one-ness), mas a clara percepo dessas categorias

    necessria em cada fase da vida. Estar confuso sobre o que diferente e o que no , estar

    confuso sobre tudo. Logo, no acidental o fato de que nossa forma fragmentria de pensamento

    esteja levando a um espectro to amplo de crises sociais, polticas, econmicas, ecolgicas,

    psicolgicas, etc., no indivduo e na sociedade como um todo. Um tal modo de pensar implica um

    interminvel desenvolvimento de conflitos caticos e sem sentido, onde as energias de todos

    tendem a se perder em movimentos antagnicos ou em desentendimentos.

    Evidentemente, importante e, sem dvida, de mxima urgncia de

    profunda e difundida que penetra toda nossa vida. De que adiantam tentativas de ao social,

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

    30/244

    poltica, econmica ou de qualquer outro tipo, se a mente est presa num movimento confuso em

    que diferencia o que no diferente e identifica o que no idntico? Uma tal ao ser na

    melhor das hipteses, ineficaz e, na pior, destrutiva.

    Nem tampouco ser til tentar impor algum tipo fixo de princpio "holstico" integrador ou

    viso pessoal de mundo fixa implica que no estamos mais tratando nossas teorias como

    ar alertas para considerar seriamente e atentar com cuidado para o fato

    fragmentao?

    do em termos gerais, se algum pergunta como resolver um problema tcnico, por

    unificador sobre a nossa viso pessoal de mundo, pois, como indicamos antes, qualquer tipo

    38

    de

    insightsou maneiras de olhar, mas, antes, como "conhecimento absolutamente verdadeiro das

    coisas como elas realmente so". Assim, quer gostemos, quer no, as distines, que se acham

    inevitavelmente presentes em qualquer teoria, mesmo "holstica", sero falsamente tratadas como

    divises, acarretando a existncia separada dos termos que so assim distinguidos (de modo que,

    correspondentemente, o que no for distinguido desta maneira ser falsamente tratado como

    absolutamente idntico).

    Temos, pois, de fic

    de que nossas teorias no so "descries da realidade como ela ", mas, sim, formas de insight

    sempre em transformao, que podem indicar ou apontar uma realidade implcita e no descritvelou especificvel em sua totalidade. Esta necessidade em estar assim atento vale at para o que

    est sendo dito aqui neste captulo, no sentido de que no deve ser visto como "conhecimento

    absolutamente verdadeiro da natureza das fragmentaes e da totalidade". Em vez disso,

    tambm uma teoria que proporciona um insight sobre essa questo. Cabe ao leitor ver por si

    mesmo se o insight claro ou obscuro, e quais so os limites de sua validade.

    Ento, o que pode ser feito para pr fim ao estado predominante de

    primeira vista, esta pode parecer uma questo razovel, mas um exame mais cuidadoso nos leva

    a perguntar se de fato o , pois pode-se verificar que essa questo tem pressuposies que no

    so claras.

    Falan

    exemplo, pressupe-se que, embora comecemos por no saber a resposta, nossas mentes, no

    entanto, esto suficientemente lcidas para descobrir uma resposta, ou pelo menos para

    reconhecer a descoberta de uma resposta por parte de outrem. Mas, se todo o nosso modo de

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    31/244

    pensar estiver impregnado pela fragmentao, isto implica que no somos capazes de faz-lo,

    pois a percepo fragmentria , em essncia, um hbito de confuso, em grande medida

    inconsciente, em torno da questo do que diferente e do que no .

    Portanto, no prprio ato em que tentamos descobrir o que fazer a

    9

    eito da fragmentao, continuaremos este hbito e, assim tenderemos a introduzir ainda

    mais difceis e sutis sobre essa questo justamente o de esclarecer o que

    3

    resp

    outras formas de fragmentao. Isto no significa necessariamente, claro, que no h nenhuma

    sada, mas sim que temos de dar uma pausa, de modo a no agirmos de acordo com os nossos

    habituais modos de pensar fragmentrios, enquanto procuramos solues que estejam ao nosso

    alcance. A questo da fragmentao e da totalidade sutil e difcil, mais ainda do que aquelas

    que levam a descobertas fundamentalmente novas na cincia. Perguntar como acabar com a

    fragmentao e esperar uma resposta em alguns minutos faz ainda menos sentido do que indagar

    como desenvolver uma teoria to nova quanto foi a de Einstein na poca em que a elaborava e

    esperar que sejamos informados quanto ao que fazer em termos de algum programa expresso em

    frmulas ou receitas.

    Um dos pontosse entende pela relao entre o contedo do pensamento e o processo do pensar que produziu

    esse contedo. Uma das principais fontes de fragmentao , sem dvida, a pressuposio

    geralmente aceita de que o processo do pensamento suficientemente separado e independente

    de seu contedo para nos permitir, em geral, a execuo de um pensar claro, ordenado e racional,

    que pode julgar adequadamente este contedo como correto ou incorreto, racional ou irracional,

    fragmentrio ou total, etc. Com efeito, como se tem visto, a fragmentao envolvida numa viso

    pessoal de mundo no esta apenas no contedo do pensamento, mas na atividade geral da

    pessoa que "faz o pensamento", encontrando-se, assim, tanto no processo do ato de pensar como

    no contedo. De fato, contedo e processo no so duas coisas que existem separadamente,

    mas, antes, constituem dois aspectos da viso de um movimento total. Logo, contedo

    fragmentrio e processo fragmentrio tm de desaparecer juntos. Precisamos tratar aqui da

    unidade [One-ness, no original. (N. do T.)] do processo do pensamento e do seu contedo,

    semelhante, em aspectos fundamentais, unidade do observador e do observado: este fato tem

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

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    sido discutido em relao teoria da relatividade e teoria

    40

    quntica. Questes desta natureza no podem ser convenientemente respondidas enquanto

    a cuidadosa ateno e um

    ectro de domnios: cientfico, econmico, social, poltico, etc. At agora, porm, poucos ou

    estivermos presos, consciente ou inconscientemente a um modo de pensar que tenta analisar a si

    prprio em termos de uma suposta separao entre o processo do pensamento e o contedo

    deste, que seu produto. Ao aceitarmos uma tal presuno, somos levados, na prxima etapa, a

    buscar alguma fantasia de ao por intermdio de causas eficientes que poriam fim

    fragmentao no contedo, enquanto que no processo efetivo do pensamento ela permaneceria

    intacta. necessrio, porm, apreender de alguma maneira a causa formativa global da

    fragmentao, onde contedo e processo efetivo so vistos juntos, em sua totalidade. Poder-se-ia

    considerar aqui a imagem de uma multido turbulenta de vrtices numa torrente. A estrutura e

    distribuio dos vrtices, que constituem uma espcie de contedo da descrio do movimento,

    no esto separadas da atividade formativa do fluxo da torrente, que cria, mantm e finalmente

    dissolve a totalidade das estruturas em vrtice. Portanto, tentar eliminar os vrtices sem mudar a

    atividade formativa da torrente seria, evidentemente, um absurdo. Assim que a nossa percepo

    guiada, pelo insightadequado, para a significao do movimento total, claro que no estaremosdispostos a tentar uma abordagem to ftil. Em vez disso, observaremos a situao como um todo

    e ficaremos atentos e alertas para nos instruirmos sobre ela, e portanto para descobrirmos qual

    seria realmente um tipo de ao adequado, aplicvel a esse todo, pondo, dessa maneira, fim

    turbulenta estrutura de vrtices. Analogamente, quando de fato apreendermos a verdade da

    unidade (one-ness) do processo de pensamento que estivermos efetivamente realizando e do

    contedo desse pensamento que o produto desse processo, ento um tal insight nos

    possibilitar observar, olhar e aprender a respeito do movimento total do pensamento e, assim,

    descobrir uma ao que seja relevante em face desse todo, que por fim "turbulncia" do

    movimento que a essncia da fragmentao em cada fase da vida.

    claro que esse aprendizado e essa descoberta exigiro um

    rduo trabalho. Estamos preparados para dedicar uma tal ateno e um tal trabalho num amplo

    41

    esp

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    33/244

    nenhum deles tm-se dedicado criao de insightsno processo do pensamento, de cuja clareza

    depende o valor de tudo o mais. Fundamentalmente, necessrio uma compreenso cada vez

    maior do extremo perigo de se continuar com um processo fragmentrio de pensamento. Tal

    compreenso nos daria a possibilidade de averiguar como o pensamento de fato opera aquele

    sentido de urgncia e de energia exigido para se ir ao encontro da verdadeira magnitude das

    dificuldades com as quais a fragmentao nos pe hoje em confronto.

    Apndice: Resumo da discusso sobre as formas ocidentais e orientais de percepo da

    primeiras fases do desenvolvimento da civilizao, as concepes do homem eram

    dagem ocidental fragmentria e adotamos

    sas n

    considerado um dos elementos essenciais para uma boa vida (as tragdias gregas, por

    totalidade

    Nas

    essencialmente de totalidade em vez de fragmentao. No Oriente (especialmente na ndia) essas

    concepes ainda sobrevivem, no sentido de que a filosofia e a religio enfatizam a totalidade e

    sugerem a futilidade da anlise do mundo em partes.

    Por que, ento, no abandonamos nossa abor

    es oes orientais, que incluem no apenas uma viso pessoal de mundo que nega a diviso

    e a fragmentao, mas tambm tcnicas de meditao que levam no-verbalmente todo o

    processo de operao mental quele estado tranqilo de fluxo sereno e ordenado necessrio parapr um fim fragmentao, tanto no processo efetivo do pensamento quanto em seu contedo?

    Para responder a essa pergunta, til comear familiarizando-nos com a diferena entre as

    noes ocidental e oriental de medida. Ora, no Ocidente, a noo de medida desempenha, desde

    a antigidade, um papel fundamental na determinao da viso geral pessoal de mundo, bem

    como na do modo de vida implcito nessa viso. Assim, entre os gregos antigos, de quem

    derivamos uma grande parte de nossas noes fundamentais (por intermdio dos romanos),

    manter tudo em sua justa medida

    42

    era

    exemplo, geralmente retratavam o sofrimento do homem como conseqncia de ele ir alm da

    medida apropriada das coisas). Com relao a isto, a medida no era considerada em seu sentido

    moderno, como sendo, basicamente, algum tipo de comparao de um objeto com um padro ou

    unidade exterior. Ao contrrio, este ltimo procedimento era visto como uma espcie de exposio

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    ou aparecimento ou manifestao exterior de uma "medida interna" mais profunda, que

    desempenhava um papel essencial em todas as coisas. Quando uma coisa ia alm da medida

    que lhe era prpria, isto no significava meramente uma no-conformidade a um padro exterior

    do que era certo; muito mais do que isto, significava uma desarmonia interior, de tal sorte que

    essa coisa estava fadada a perder sua integridade e partir-se em fragmentos. Pode-se obter

    algum insightnesse modo de pensar se levarmos em considerao os antigos significados de

    certas palavras. Assim, a palavra latina mederi, que significa "curar" (a raiz da moderna palavra

    "medicina") deriva de uma raiz que significa "medir".

    Isto reflete a viso de que a sade fsica deve ser vista como o resultado de um estado de

    reza das coisas (e no s exteriormente como uma forma de comparao com um padro ou

    da ratioainda mais explicitamente, pode-se escrever:

    justa medida interna em todas as partes e processos do corpo. De modo semelhante, a palavra

    "moderao", que descreve uma das primeiras noes antigas de virtude, baseia-se na mesma

    raiz, e isso mostra que tal virtude era considerada como o resultado de uma correta medida

    interna subjacente s aes e comportamentos sociais do homem. Por outro lado, a palavra

    "meditao", derivada da mesma raiz, envolve uma espcie de pesagem, ponderao, ou

    medio de todo o processo do pensamento, que pode levar as atividades internas da mente a

    um estado de medida harmoniosa. Portanto, fsica, social e mentalmente, a conscincia damedida interna das coisas era vista como a chave essencial para uma vida saudvel, feliz e

    harmoniosa. E claro que a medida deve ser expressa mais detalhadamente por meio da

    proporo ou razo. Ratio a palavra latina da qual deriva nossa moderna palavra "razo". Na

    concepo antiga, a razo vista como insight numa totalidade de ratio ou de propores,

    considerada interiormente pertinente prpria

    43

    natu

    unidade). Evidentemente, essa ratio no , necessariamente, uma mera proporo numrica

    (embora, claro, inclua tal proporo). Mais precisamente, em geral um tipo qualitativo de

    proporo ou relao universal. Quando Newton teve o insightda gravitao universal, o que ele

    viu pode ser expresso deste modo: "Assim como a ma cai, o mesmo acontece com a Lua e, de

    fato, com todas as coisas.

    Para mostrar a forma

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

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    A : B :: C : D :: E : F

    onde A e B representam sucessivas posies da ma em sucessivos momentos do tempo, C e

    lguma coisa, estamos exemplificando

    uma forma de insightna essncia de todas as coisas, e

    edida foi alm da noo de comparao com um padro externo, apontando para um tipo

    D, as posies da Lua, e E e F as de qualquer outro objeto.

    Toda vez que encontramos um motivo terico para a

    essa noo de ratio, no sentido de sugerir que, assim como os vrios aspectos esto relacionados

    em nossa idia, tambm o esto na coisa sobre a qual versa a idia. A razo essencial ou ratiode

    uma coisa ento a totalidade das propores internas em sua estrutura e no processo em que

    ela se forma, mantm a si prpria e finalmente se dissolve. Nessa viso, entender tal ratio

    entender o "ser mais ntimo" dessa coisa.

    Infere-se, portanto, que a medida

    que a percepo do homem, seguindo os caminhos indicados por tal insight, ser clara, realizando

    assim, geralmente, uma ao ordenada e uma vida harmoniosa. Com relao a isto, til lembrar

    as noes dos gregos antigos sobre medida na msica e nas artes visuais. Essas noes

    enfatizavam que o conhecimento das medidas era uma chave para o entendimento da harmonia

    na msica (p. ex., a medida como ritmo, como justa proporo na intensidade do som, como justa

    proporo na tonalidade, etc.). Da mesma maneira, nas artes visuais, a justa medida era vistacomo essencial harmonia e beleza totais (p. ex., considere a "Proporo urea", ou seja, a

    mdia e extrema razo). Tudo isso indica o quanto a noo

    44

    de m

    universal de ratio ou proporo interna, percebida tanto pelos sentidos como pela mente.

    Naturalmente, medida que o tempo passava, essa noo de medida aos poucos comeou a

    mudar, a perder sua sutileza e tornar-se relativamente grosseira e mecnica. provvel que isso

    tenha ocorrido porque a noo humana tornou-se cada vez mais rotineira e habitual, tanto com

    relao sua exibio externa e medidas tomadas por comparao com uma unidade externa

    como com relao ao seu significado interno, enquanto ratiouniversal aplicvel sade fsica,

    ordem social e harmonia mental. Os homens comearam a aprender essas noes de medida

    de maneira mecnica, conformando-se aos ensinamentos de seus antepassados ou de seus

    mestres, e no de modo criativo, por meio de um sentimento e uma compreenso ntimos do

  • 7/29/2019 A Totalidade e a Ordem Implicada

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    significado mais profundo da ratio ou proporo sobre a qual estavam aprendendo. Dessa

    maneira, gradualmente, a medida passou a ser ensinada como uma espcie de regra que devia

    ser imposta a partir de fora sobre o ser humano, que, por sua vez, impunha a medida

    correspondente, nos nveis fsico, social e mental, em cada contexto em que estivesse

    trabalhando. Como resultado, as noes predominantes de medida no foram mais vistas como

    formas de insight. Em vez disso, afiguravam-se como "verdades absolutas sobre a realidade como

    ela ", que parecia aos homens uma coisa que eles sempre conheceram, e cuja origem era, com

    freqncia, mitologicamente explicada como injunes obrigatrias dos Deuses. Haveria perigo e

    haveria maldade em question-las.

    O pensamento sobre a medida tendia assim a cair principalmente no domnio do hbito

    am o hbito de olhar para tudo externamente tambm aplicaram esse modo de observao

    tivao gerais da noo de medida continuaram a desenvolver-se

    inconsciente e, como resultado, as formas induzidas na percepo por esse pensamento

    passaram ento a ser vistas como realidades objetivas diretamente observadas, que eram

    essencialmente independentes de como foram pensadas. Mesmo na poca dos gregos antigos,

    este processo tinha percorrido um longo caminho e, conforme iam percebendo isso, os homens

    comearam a questionar a noo de medida. Assim, Protgoras disse: "O homem a medida de

    todas as coisas", enfatizando desse modo que a medida no uma realidade exterior aoshomens, existindo independentemente dele. Porm, muitos dos que

    45

    tinh

    quilo que Protgoras dissera. Logo, concluram que a medida era uma coisa arbitrria, e sujeita

    escolha ou ao gosto caprichoso de cada indivduo. claro que desse modo passaram por cima do

    fato de que a medida uma forma de insightque tem de se ajustar realidade global em que o

    homem vive, como demonstrado pela clareza de percepo e harmonia de ao s quais ele

    leva. Um tal insight pode surgir adequadamente apenas quando um homem trabalha com

    seriedade e honestidade, colocando em primeiro lugar a verdade e a factualidade, em vez de seus

    prprios caprichos e desejos.

    A rigidificao e a obje

    at que, nos tempos modernos, a prpria palavra "medida" veio a denotar principalmente um

    processo de comparao de algo com um padro externo. Embora o significado original ainda

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    sobreviva em alguns contextos (p. ex., na arte e na matemtica), ele geralmente considerado

    como tendo apenas uma espcie de importncia secundria. Ora, no Oriente a noo de medida

    no desempenhou um papel to fundamental. Em vez disso, na filosofia a predominante, o

    imensurvel (isto , aquilo que no pode ser nomeado, descrito ou entendido por meio de

    qualquer forma de razo) considerado como a realidade fundamental. Assim, no snscrito (que

    tem uma origem comum ao grupo lingstico indo-europeu) h uma palavra, matra, que significa

    "medida", no sentido musical, e que, evidentemente, est prxima do grego "metron". Mas h uma

    outra palavra, maya, obtida da mesma raiz, que quer dizer "iluso". Este um ponto

    extraordinariamente significativo. Enquanto que para a sociedade ocidental, que deriva dos

    gregos, a medida, com tudo o que esta palavra implica, a prpria essncia da realidade, ou pelo

    menos a chave para esta essncia, no Oriente ela veio a ser usualmente considerada como

    sendo, num certo sentido, falsa e enganosa. Nesta viso, toda a estrutura e a ordem das formas,

    propores e ratiosque se apresentam percepo e razo [A palavra razo, em portugus,

    pode significar, entre outras coisas, tanto "a capacidade de raciocinar, julgar, compreender," como

    "a relao entre duas grandezas da mesma espcie'. No ingls, h duas palavras distintas para

    esses dois significados. A primeira reasone a segu