Advocacia e Meios Consensuais-Fernanda Tartuce

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    Advocacia e meios consensuais: novas vises, novos ganhos.

    Fernanda Tartuce1

    1. Contextualizao e relevncia do tema.

    Nos ltimos tempos muito se tem propugnado o uso de meios diferenciados de abordar

    conflitos. Como fundamentos principais para tal iniciativa, merecem destaque a maior

    adequao desses mecanismos para atender os indivduos em seus interesses e o

    reconhecimento das limitaes do Poder Judicirio para distribuir a prestao jurisdicional em

    tempo e condies razoveis.Tais afirmaes consideram vantagens para a pessoa envolvida no conflito, que pode

    encontrar uma sada mais apropriada para seus dilemas, assim como vislumbram aspectos

    positivos para o Poder Judicirio, que pode ver nos meios consensuais uma forma de aliviar

    seu imenso acervo de demandas2.

    Para otimizar a eficincia dos mecanismos autocompositivos a participao do

    advogado pode ser valiosa; o fomento adoo do meio consensual pelo cliente e a presena

    na sesso propiciar aos envolvidos contar com o profissional habilitado a orientar, sanarduvidas, conferir a viabilidade dos pactos e alertar quanto elementos de sua exequibilidade.

    H vantagens para o advogado quando de sua atuao na autocomposio? Ele pode

    ser beneficiado com a adoo de meios consensuais de abordagem de controvrsias?

    H quem responda negativamente. A formao das faculdades de Direito ainda

    prioriza o tratamento contencioso dos conflitos e no mercado de trabalho prevalecem critrios

    de cobrana a partir de referncias litigiosas. Alm disso, na tradio brasileira de

    conciliaes (sobretudo em juzo) comum que se defina que cada parte arcar com oshonorrios de seu advogado, o que pode reduzir o quantum esperado pelo advogado em

    termos de ganho com a demanda.

    A premissa deste artigo, contudo, diversa: possvel superar os bices apontados e

    1Mestre e Doutora em Direito Processual pela USP. Professora dos cursos de Mestrado e Doutorado da FADISP(SP). Professora e sub-coordenadora em cursos de especializao em Direito Civil e Processual Civil. Advogadaorientadora do Departamento Jurdico do Centro Acadmico XI de Agosto (USP). Membro do IBDFAM(Instituto Brasileiro de Direito de Famlia) e do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Processual). Mediadora.2O tema foi desenvolvido com mais detalhamento em TARTUCE, Fernanda. Conciliao e Poder Judicirio.

    Disponvel em http://fernandatartuce.com.br/artigos/cat_view/38-artigos/43-artigos-da-professora.html?start=10.Acesso 22 out. 2012.

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    constatar que o advogado tem muito a ganhar atuando ao lado de seu cliente quando das

    tentativas de alcance da autocomposio.

    2. Crise, desgastes na prtica advocatcia e pluralidade de entendimentos.

    A prtica advocatcia nas Cortes de Justia tem se revelado rdua nos ltimos tempos

    por diversos fatores3, destacando-se nesse cenrio a intensa crise vivenciada pelo Poder

    Judicirio.

    Segundo Jos Eduardo Faria, a ineficincia da Justia brasileira verifica-se no

    exerccio de suas trs bsicas funes: instrumental (o Poder Judicirio o principal locus de

    soluo de conflitos), poltica (meio de controle social para cumprir direitos e obrigaes,reforando estruturas de poder e assegurando integrao social) e simblica (disseminao de

    sentido de equidade e justia, socializao das expectativas dos atores na interpretao da

    ordem jurdica e calibragem dos padres vigentes de legitimidade na vida poltica)4.

    Para o autor, a ineficincia decorre, em grande parte, da incompatibilidade estrutural

    entre sua arquitetura e a realidade socioeconmica a partir da qual e sobre a qual tem de

    atuar5.

    fcil perceber que o aparato judicirio no vem sendo aumentado de formaproporcional ao geomtrico incremento do nmero de demandas; como bem pontuou Ovdio

    Baptista da Silva, os problemas que afligem nossa prtica judicial so estruturais e vm

    conduzindo a jurisdio brasileira a um estado lamentvel e terminal6.

    O jurista lembra que o exerccio da advocacia forense participa da "sociedade do

    risco" que vem sendo, de forma extraordinariamente rpida, transformada pela grande

    produo de decises pelo Poder Judicirio. Como milhares de sentenas so produzidas

    mensalmente por todas as instncias, no ser difcil encontrar uma dezena de julgados tidoscomo idnticos ao caso investigado, porm, muito provavelmente, contendo divergncias

    entre si, quando no se oponham frontalmente uma s outras, nesse mesmo grupo de aes

    3No h como negar que todas as ocorrncias da vida tm origens multifatoriais... o sistema jurdico vive

    momentos de ruptura de paradigmas e experimenta constantes tenses por fora das exigncias da acelerada vidasocial.4 FARIA, Jos Eduardo. Direito e Justia no sculo XXI:a crise da Justia no Brasil. Disponvel emhttp://www.ces.uc.pt/direitoXXI/comunic/JoseEduarFaria.pdf.Acesso 18 out. 2012.5FARIA, Jos Eduardo. Direito e Justia no sculo XXI:a crise da Justia no Brasil, cit.6

    BAPTISTA DA SILVA, Ovdio. Advocacia em tempos de crise. Disponvel emhttp://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235067095174218181901.pdf.Acesso 18 out. 2012.

    http://www.ces.uc.pt/direitoXXI/comunic/JoseEduarFaria.pdfhttp://www.ces.uc.pt/direitoXXI/comunic/JoseEduarFaria.pdfhttp://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235067095174218181901.pdfhttp://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235067095174218181901.pdfhttp://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235067095174218181901.pdfhttp://www.ces.uc.pt/direitoXXI/comunic/JoseEduarFaria.pdf
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    idnticas7".

    A necessidade de ser orientado juridicamente constante. Na maior parte das

    sociedades modernas essencial seno indispensvel que os indivduos contem com

    advogados para decifrar as leis (cada vez maiores em numero e complexidade) e para obter

    informaes sobre os elementos necessrios para atuar8.

    Segundo Ovdio Baptista da Silva, a sociedade em que nos encontramos

    essencialmente hermenutica, com incontveis vises de mundo, o que naturalmente nos

    obriga a lidar com uma linguagem dotada de plurivocidade a exigir permanente

    interpretao9.Como destacou o grande autor, a situao atual demanda que o advogado, ao

    receber o cliente, mantenha atitude de prudncia e evite

    emitir opinio sobre o caso antes de conhec-lo o suficiente; mas, alm disso, haverde solicitar-lhe o prazo de alguns dias, indispensveis para que ele se informe da mais

    recente vontade da lei, registrada nos ltimos dois meses, cuja busca indispensvel

    fazer nossites dos tribunais, especialmente dos tribunais superiores10.

    Como se percebe, a prtica contenciosa nos Tribunais estatais pode desgastar

    intensamente o advogado. Por essa razo, a adoo de meios consensuais pode oxigenar seu

    dia-a-dia propiciando uma diversificada e interessante forma de atuao.Alm da perspectiva do advogado, imperioso lembrar que a principal funo do

    operador do Direito ajudar a solucionar problemas; este desiderato demanda a ampliao da

    concepo sobre as formas de melhor atender o cliente em seus anseios jurdicos e

    existenciais.

    3. O atendimento do cliente ante a narrao do conflito.

    corrente a assertiva de que o advogado o primeiro juiz da causa; afinal, ele o

    primeiro a ouvir o cliente tecnicamente de sorte a poder perceber as possibilidades e os limites

    do ordenamento e das instituies jurdicas no tocante ao atendimento do interesse do

    7 BAPTISTA DA SILVA, Ovdio. Advocacia em tempos de crise. Disponvel emhttp://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235067095174218181901.pdf.Acesso 18 out. 2012.8CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Brian. Acesso justia, p. 32. Quanto s informaes para litigar, referem-se os autores aos procedimentos misteriosos necessrios para ajuizar uma causa.9

    BAPTISTA DA SILVA, Ovdio. Advocacia em tempos de crise, cit.10BAPTISTA DA SILVA, Ovdio. Advocacia em tempos de crise, cit.

    http://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235067095174218181901.pdfhttp://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235067095174218181901.pdfhttp://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235067095174218181901.pdf
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    individuo.

    Efetivamente o profissional do Direito o receptor das inquietudes dos clientes, a

    quem compete orientar e assessorar sobre os modos de lidar com um impasse atual ou

    potencial11.

    Alm do enfrentamento contencioso de controvrsias, interessante que o advogado

    conte com variadas ferramentas para abordar os diversificados conflitos com que se depara da

    forma mais eficiente.

    Pode-se afirmar que na sociedade moderna o profissional do Direito tem como uma de

    suas principais funes no s representar e patrocinar o cliente (como advogado, defensor e

    conselheiro), mas tambm conceber o design de um novo enquadre que d lugar a esforos

    colaborativos12.Exige-se atualmente que o advogado desempenhe as funes de negociador, de

    gerenciador de conflitos, no mais se afeioando profisso um perfil excessivamente

    beligerante13.

    Em certas hipteses, percebendo as limitaes decorrentes das parcas razes de seu

    cliente, importante que o advogado com ele cogite sobre as vantagens de assumir

    responsabilidades e evitar derrotas pblicas em juzo; para tanto, ser importante promover

    reflexo sobre a adoo mais apropriada de mecanismos consensuais.Nesse cenrio, o advogado pode e deve funcionar como um eficiente agente da

    realidade. Como bem explana Candido Rangel Dinamarco, a experincia ensina que a

    intransigncia muitas vezes fruto de uma desmesurada confiana nas prprias razes, sem

    perceber que o adversrio tambm pode ter as suas nem sentir que h o risco de, afinal,

    amargar uma derrota inesperada14.

    A diretriz de buscar ampliar ferramentas tem sido adotada em diversos pases; como

    exemplo, relata Neil Andrews, ao abordar o panorama ingls, que a Law Society daInglaterra e Pas de Gales lanou, em 2005, uma 'orientao de prticas' recomendando que os

    solicitorsconsiderassem, de forma rotineira, se os conflitos de seus clientes seriam adequados

    11 HIGHTON DE NOLASCO, Elena I. ALVAREZ, Gladys S. Mediacin para resolver conflictos. 2 Ed.Buenos Aires: Ad Hoc, 2008, p. 404.12HIGHTON DE NOLASCO, Elena I. ALVAREZ, Gladys S.Mediacin para resolver conflictos, p. 402.13A assertiva de Selma Lemes, para quem devemos efetuar uma introspeco a permitir que estejamos abertose possamos adaptar-nos s novas mudanas, e procurar superar o adgio de que o cachimbo faz a boca torta.(LEMES, Selma Ferreira. Oito anos da lei de arbitragem. Disponvel emhttp://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/29753-29769-1-PB.pdf.Acesso 23 out. 2012).14

    DINAMARCO, Candido Rangel. Instituies de Direito Processual Civil, vol, III. So Paulo: MalheirosEditores, 2009, p. 828.

    http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/29753-29769-1-PB.pdfhttp://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/29753-29769-1-PB.pdfhttp://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/29753-29769-1-PB.pdf
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    para as ADR15".

    Na esteira do que nos Estados Unidos se deu o nome de Multidoor Courthouse,

    comea-se a falar no Brasil em tribunais multiportas com base no pluriprocessualismo,

    vertente em que as caractersticas intrnsecas de cada processo so utilizadas para reduzirem -

    se as ineficincias inerentes aos mecanismos de soluo de disputas, na medida em que se

    escolhe um processo que permita enderear de melhor maneira possvel a soluo da disputa

    no caso concreto16.

    A concretizao dessa tendncia desponta na Resoluo 125 do CNJ, em que se passa

    a compor a pauta publica a poltica de tratamento adequado de conflitos com maior ateno

    aos instrumentos da conciliao e da mediao.

    Infelizmente, porm, grande parte dos advogados no aborda os meios consensuais. Asrazoes de sua resistncia quanto a tais mtodos so vrias, destacando-se: (i) a sensao de

    ameaa por estarem fora da zona de conforto habitual; (ii) a crena sobre a falta de programas

    de treinamento de alta qualidade; (iii) a percepo de que, embora a ideia da autocomposio

    parea boa, pelas pautas ticas do advogado sua adoo nunca se torna uma prioridade17.

    A percepo sobre a zona de conforto passa pela falta conhecimento; a maior parte dos

    bacharis brasileiros apenas tem informaes na graduao sobre o processo civil em sua

    vertente contenciosa, concebendo sua prtica apenas a partir de tal diretriz.Para Kazuo Watanabe, a formao acadmica dos operadores de Direito constitui o

    grande bice ao uso mais intenso dos meios alternativos de resoluo de conflitos; o modelo

    ensinado em todas as Faculdades de Direito do pas enfatiza "a soluo contenciosa e

    adjudicada dos conflitos de interesses" por meio do processo judicial18.

    A situao no se verifica apenas em terras brasileiras; ao abordar a realidade

    americana, Leonard Riskin e James Westbrook destacam que a falta de familiaridade dos

    advogados com mtodos diferenciados de abordagem de conflitos, por falta de educao ou

    15ANDREWS, Neil, O Moderno Processo civil: formas judiciais e alternativas de resoluo de conflitos naInglaterra. SP: RT, 2010, p. 242. Segundo esclarece o glossrio de tal obra, solicitor o advogado cuja funo a de, fundamentalmente, representar a parte para mover a ao e contestar (p. 19).16 AZEVEDO, Andr Gomma de; SILVA, Cyntia Cristina de Carvalho e. Autocomposio, processosconstrutivos e a advocacia: breves comentrios sobre a atuao de advogados em processos autocompositivos.Revista do Advogado, ano 26, n. 87, p. 115-124, set./2006, p. 117.17BORDONE, Robert C. MOFFITT, Michael L. e SANDER, Frank E. A. The next thirty years: directions and

    challenges in dispute resolution. In MOFFITT, Michael L. e BORDONE, Robert C. The handbook of disputeresolution. San Francisco: Jossey-Bass, 2005, p. 511.18

    WATANABE, Kazuo. A mentalidade e os meios alternativos de soluo de conflitos no Brasil. In Mediao egerenciamento do processo. SP, Atlas, 2007, p. 6.

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    de interesse, um obstculo considervel; no obstante as escolas de direito e os tribunais se

    esforcem em promover esses meios, h muitos advogados que nem sequer conhecem a

    diferena entre mediao e arbitragem19.

    Alm da j mencionada falta de treinamento no mtodo, Leonard Riskin explica que a

    falta de envolvimento e de maior interesse dos advogados com mediao decorre de mais dois

    motivos: a maneira pela qual os advogados veem o mundo e a economia da prtica

    advocatcia contempornea20.

    4. Pensamento tradicional dos advogados e adoo de meios consensuais.

    Uma significativa diferena de viso constitui um grande obstculo na adoo dosmeios consensuais pelos advogados.

    Leonard Riskin expe o Lawyers Standard Philosophical Map, pensamento

    dominante entre os prticos e tericos do Direito que se assenta em duas principais premissas:

    1. as partes so adversrias e, se um ganhar, o outro deve perder; 2. as disputas devem ser

    resolvidas pela aplicao de alguma lei abstrata e geral por um terceiro21.

    Como se pode facilmente constatar, esses pressupostos so absolutamente contrrios

    s premissas da mediao, segundo as quais: a) todos os envolvidos podem ganhar com acriao de uma soluo alternativa; b) a disputa nica, no sendo necessariamente

    governada por uma soluo pr-definida22.

    Alm disso, no mapa filosfico do advogado o cliente costuma ser visto

    atomisticamente e diversas de suas questes no so vistas23. Se isto ocorre com o prprio

    cliente, imagine a situao dos outros envolvidos... Estes no costuma ser considerados.

    Para Leonard Riskin, o dever de atender o cliente de forma zelosa desencoraja a

    preocupao com a situao de todos os envolvidos, gerando ainda pouca ateno em relao repercusso social do resultado24.

    19RISKIN, Leonard L.; WESTBROOK, James E. Dispute Resolution and Lawyers. St. Paul: West Group, 1997,p. 52.20 RISKIN, Leonard L. Mediation and Lawyers (1982). In RISKIN, Leonard L.; WESTBROOK, James E.Dispute Resolution and Lawyers, p. 55.21 RISKIN, Leonard L. Mediation and Lawyers (1982). In RISKIN, Leonard L.; WESTBROOK, James E.Dispute Resolution and Lawyers, p. 56-57.22 RISKIN, Leonard L. Mediation and Lawyers (1982). In RISKIN, Leonard L.; WESTBROOK, James E.Dispute Resolution and Lawyers, p. 56-57.23 RISKIN, Leonard L. Mediation and Lawyers (1982). In RISKIN, Leonard L.; WESTBROOK, James E.Dispute Resolution and Lawyers, p. 56-57.

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    Outra questo que figura normalmente no mapa filosfico do advogado a falta de

    valorizao de elementos no materiais; h uma tendncia a reduzir os interesses a quantias

    monetrias25, o que nem sempre se configura realista.

    A situao passa pela seguinte reflexo: qual resultado apto a atender uma pessoa em

    crise em dada situao jurdica?

    Sob a vertente jurdica, pode-se imaginar que a observncia das diretrizes do

    ordenamento que favoream o cliente seja suficiente para sua satisfao. Assim, se o

    individuo, por exemplo, faz jus a receber certo montante pecunirio, o pagamento do valor

    dever atend-lo plenamente.

    Ocorre, contudo, que muitas vezes a pessoa movida no s por questes econmicas,

    mas por desejos e preocupaes que retratam outros interesses poderosos; ao lado do bemestar econmico, muitas vezes busca-se reconhecimento, poder e segurana.

    So necessidades bsicas os interesses mais fortes enquadrados em diversas categorias

    (econmicos, emocionais, psicolgicos, fsicos e sociais), sendo os demais interesses os

    desejos e as preocupaes que formam as posies negociadoras das partes26.

    Assim, se houve um erro medico em certo hospital, a posio dos familiares pode ser

    expressa na inteno de receber uma vultosa quantia indenizatria; contudo, apenas tal

    percepo pode no satisfazer plenamente os familiares da vitima, que querem tambm oreconhecimento do hospital quanto falha e o compromisso de mudana das condies que

    ensejaram o evento danoso.

    Como se perceber, pagar uma soma vultosa pode no ser suficiente. Da mesma forma,

    ainda que em certa polmica o valor monetrio envolvido seja diminuto, outros interesses

    podem mobilizar a busca de uma reparao; como pontua Candido Rangel Dinamarco, a

    experincia mostra

    que em pequenos conflitos o fator emocional muitas vezes a causa maior dasexigncias exageradas ou resistncias opostas com irracional obstinao pelas pessoas

    e isso constitui mais uma demonstrao de que na vida delas um interesse

    patrimonialmente pouco expressivo acaba por adquirir significado humano de grandes

    24 RISKIN, Leonard L. Mediation and Lawyers (1982). In RISKIN, Leonard L.; WESTBROOK, James E.Dispute Resolution and Lawyers, p. 56-57.25 RISKIN, Leonard L. Mediation and Lawyers (1982). In RISKIN, Leonard L.; WESTBROOK, James E.

    Dispute Resolution and Lawyers, p. 56-57.

    26COOLEY, John W.A advocacia na mediao(Trad. Ren Loncan). Braslia: UnB, 2001, p. 85.

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    propores27.

    Esse tipo de situao pode ser abordado em um mecanismo consensual de forma mais

    clara e eficiente porque na mediao, alem de se dar ateno aos vnculos entre as pessoas e

    qualidade desses liames, o mediador deve ser sensvel s necessidades emocionais dos

    mediandos, reconhecendo a importncia do respeito mtuo e de outros interesses imateriais

    que podem estar presentes28.

    Como bem explana Jean Franois Six, o mediador um terceiro que age de tal

    maneira que os dois termos no somente preservam sua identidade, mas saem da mediao

    com a identidade reforada, porque puderam, graas a presena do mediador, se confrontar

    com o outro e evitar, nessa confrontao, ser absorvidos pelo outro, em uma fuso ou umaderrota29.

    fcil perceber que a preparao para a mediao no deve ser to intensa quanto para

    o litgio: deve ser ainda mais intensa30. De todo modo, antes de atuar para tanto, ser preciso

    que o advogado mostre ao cliente que o mecanismo consensual aplicvel e vale a pena.

    5. Atuao do advogado para apresentar as vantagens dos meios consensuais ao

    cliente.

    Convencido sobre ser a via consensual a mais apropriada para o enfrentamento de

    certas controvrsias, o advogado precisa obter a adeso do cliente ao mtodo

    autocompositivo, o que nem sempre fcil... Michal Keating Junior explica que persuadir o

    cliente a participar de uma mediao em questes comerciais requer tanta criatividade e

    flexibilidade quanto o prprio processo de mediao; por essa razo, de grande relevncia

    que o advogado destaque os benefcios desse mtodo para o cliente

    31

    .Eis o argumento mais poderoso em prol da mediao, especialmente no mundo dos

    negcios: a possibilidade de produzir solues melhores para os problemas complexos. Ao

    27DINAMARCO, Candido Rangel. Instituies de Direito Processual Civil, vol, III, p. 828.28 RISKIN, Leonard L. Mediation and Lawyers (1982). In RISKIN, Leonard L.; WESTBROOK, James E.Dispute Resolution and Lawyers.St. Paul: West Group, 1997, p. 56.29SIX, Jean Franois.Dinmica da Mediao. Trad. Giselle Groeninga, Aguida Arruda Barbosa e Eliana Riberti

    Nazareth. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 235.30COOLEY, John W.A advocacia na mediao(Trad. Ren Loncan). Braslia: UnB, 2001, p. 85.31

    KEATING JR., J. Michael. Getting Reluctant Parties to Mediate: A Guide for Advocates. In RISKIN, LeonardL.; WESTBROOK, James E. Dispute Resolution and Lawyers, p. 421.

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    mudar o foco dos aspectos puramente legais para abordar outros interesses em jogo, a

    mediao responde bem aos interesses comerciais das pessoas ao promover a compreenso

    dos interesses negociais e buscar solues melhores que atendem a esses interesses32.

    Outro ponto positivo diz respeito manuteno do controle (tanto substantivo quanto

    procedimental)33.

    Nas questes comerciais, o controle sobre o contedo material da soluo muito

    importante, j que delegar a deciso a outrem nem sempre preserva a empresa; como na

    mediao as partes retm o poder de definir o resultado, elas no tero que terceirizar a

    soluo para algum que no entenda o contexto nem a natureza do conflito34.

    Tambm muito relevante o controle do procedimento: a flexibilidade da mediao

    permite que as partes construam um rito que se amolde melhor s suas necessidades, j queelas podem ditar as caractersticas e a experincia do mediador, identificar os problemas no

    qual querem ajuda dele, limitar a durao do processo e ainda definir detalhes como logstica

    e custos, dentre outros35.

    A situao bem diferente nos meios adjudicatrios; tanto na resoluo judicial como

    na arbitragem a figura do julgador tende a centralizar os trabalhos e a autonomia das partes

    quanto ao procedimento ou inexiste ou se verifica em um campo restrito.

    Outras razes persuasivas para a utilizao da mediao advm da natureza da disputa:a) Aspectos relacionais: se os envolvidos no conflito tm uma relao que vai

    perdurar alm do conflito, a mediao a alternativa mais adequada. Enquanto os meios

    contenciosos baseiam-se exclusivamente na demonstrao de culpa e responsabilidade, a

    mediao no busca o culpado, mas sim solues que atendam aos interesses das partes e

    preservem seu relacionamento36.

    Mais importante do que reconstruir o passado e apurar detalhadamente o que

    aconteceu para apurar quem deve responder por quanto, foca-se, na mediao, na perspectivafutura. Assim, o mediador ir trabalhar o que as pessoas envolvidas querem e/ou precisam

    vivenciar juntas nas prximas ocorrncias.

    Sob o aspecto preventivo, alis, merece destaque o valor prudncia; incumbe ao

    mediador, no desempenho de suas funes, saber prever o melhor possvel, o que vai

    32KEATING JR., J. Michael. Getting Reluctant Parties to Mediate: A Guide for Advocates, p. 423.33KEATING JR., J. Michael. Getting Reluctant Parties to Mediate: A Guide for Advocates, p. 421-422.34KEATING JR., J. Michael. Getting Reluctant Parties to Mediate: A Guide for Advocates, p. 421-422.35

    KEATING JR., J. Michael. Getting Reluctant Parties to Mediate: A Guide for Advocates, p. 422.36KEATING JR., J. Michael. Getting Reluctant Parties to Mediate: A Guide for Advocates, p. 423.

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    engendrar uma nova ao, as consequncias que se seguiro37. A perspectiva de futuro, como

    mencionado, valiosa e ser abordada na mediao.

    b) Imperativo de tempo: conflitos que envolvem dano contnuo aos negcios e

    no tem perspectiva de uma soluo rpida so muito adequados mediao. Os advogados

    normalmente ponderam os males da litigncia com base em um raciocnio de custos

    transacionais; contudo, o dano aos interesses do cliente no tempo deve ser levado em

    considerao por ser esta uma das principais preocupaes dos homens de negcios38.

    O litgio tem custos diretos (pelos gastos que sua manuteno engendra) e indiretos

    (pela perda de negcios que enseja). O fato de a abordagem consensual ser rpida reduz

    danos; afinal, se as sesses (de mediao ou conciliao) durarem algumas semanas, j ser

    possvel perceber se h ou no dialogo restaurado e quais as condies para continuar (sejadialogando, seja pedindo a interveno de um julgador).

    c) conteno de danos imagem da empresa: muitas vezes as empresas querem ir

    mediao para acabar com a m reputao que uma longa ao judicial tem trazido. Apesar de

    a literatura enfatizar a possibilidade de ganha-ganha da mediao, algumas vezes as

    solues perde menos-perde menos minimizam o impacto j causado por conflitos atuais;

    muitos clientes sabem que, proposta a ao judicial, muito j se perdeu e qualquer meio de

    limpar a baguna envolver esforo para simplesmente manter as perdas em um nvelaceitvel39.

    Como se percebe, existe uma mudana de paradigma nos meios consensuais qual o

    advogado e os envolvidos no conflito devem se adaptar. necessrio compreender o modelo

    coexistencial inerente aos meios consensuais; a postura belicosa, to cara soluo

    adjudicatria, pode significar o fim do processo produtivo em que o dilogo cooperativo pode

    resultar em ganhos para todos os participantes40.

    Se as partes se dispuserem, com boa f, a irem mediao, o mediador ir trabalhar aspremissas da mediao e haver chances de evoluir a partir de sua observncia.

    Definida (por vezes conquistada!) a ida mediao, como atuar o advogado? O tema

    merece anlise mais detida.

    37SIX, Jean Franois.Dinmica da Mediao. Trad. Giselle Groeninga, Aguida Arruda Barbosa e Eliana RibertiNazareth. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 247.38KEATING JR., J. Michael. Getting Reluctant Parties to Mediate: A Guide for Advocates, p. 423.39KEATING JR., J. Michael. Getting Reluctant Parties to Mediate: A Guide for Advocates, p. 423.40 AZEVEDO, Andr Gomma de; SILVA, Cyntia Cristina de Carvalho e. Autocomposio, processos

    construtivos e a advocacia: breves comentrios sobre a atuao de advogados em processos autocompositivos.Revista do Advogado, ano 26, n. 87, p. 115-124, set./2006, p. 119.

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    6. Atuao do advogado nos meios consensuais.

    A vantagem de contar com um advogado sentida no s no inicio de abordagem da

    controvrsia mas durante todo o desenvolvimento do meio de composio de conflitos, esteja

    a discusso sendo travada segundo a ndole antagnica ou sendo abordada em um perfil

    consensual.

    6.1. Atuao antes da sesso consensual.

    Um passo importantssimo para o advogado preparar o caso para mediao; estapreparao difere da lgica da preparao da ao judicial porque no se jogar o jogo do

    julgamento, mas sim o jogo da mediao41. Neste, no se busca sustentar as posies

    jurdicas por meio de alegaes baseadas em teorias do Direito; pelo contrrio, as posies

    jurdicas ficam em segundo plano e, ao serem evocadas, ficam restritas ao plano especulativo,

    pois a inteno na mediao no ter as posies jurdicas declaradas como vlidas ou

    invlidas por um terceiro42.

    Como se percebe, a preparao adequada do advogado para uma negociao exige queele saiba quais so os fatos relevantes, qual o direito aplicvel e quais so os interesses do

    cliente43.

    Para uma boa atuao, relevante conversar abertamente com o cliente de maneira a

    identificar seus reais interesses e traduzi-los em propostas de eventuais solues com vistas a

    explorar as possibilidades de ganhos mtuos44.

    Para tanto, o advogado dever analisar junto ao cliente quais so a melhor e a pior

    alternativa para uma soluo negociada

    45

    . Ter em mente os pisos mximo e mnimo semduvida ir colaborar para que as tratativas sejam produtivas.

    Ser tambm til buscar prever quais opes tendero a ser consideradas pela outra

    41COOLEY, John W.A advocacia na mediao(Trad. Ren Loncan), p. 80.42COOLEY, John W.A advocacia na mediao(Trad. Ren Loncan), p. 80.43 HIGHTON DE NOLASCO, Elena I. ALVAREZ, Gladys S. Mediacin para resolver conflictos. 2 Ed.Buenos Aires: Ad Hoc, 2008, p. 405.44 AZEVEDO, Andr Gomma de; SILVA, Cyntia Cristina de Carvalho e. Autocomposio, processosconstrutivos e a advocacia: breves comentrios sobre a atuao de advogados em processos autocompositivos.

    Revista do Advogado, p. 120.45ARNOLD, Tom. 20 Common Errors in Mediation Advocacy, p. 438.

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    parte; para tanto, sugere-se um brainstormsobre as motivaes e percepes dela46porque a

    anlise mais produtiva passa pela identificao das necessidades e interesses bsicos de todos

    os envolvidos47.

    A anlise previa e apurada tem significativa relevncia porque a compreenso

    equivocada das alternativas dos envolvidos poder obstruir solues ou originar maus

    acordos48.

    Com a mudana de paradigma e a incorporao dos meios consensuais no dia a dia do

    advogado, uma preocupao diz respeito ao empoderamento do cliente: ele deve ter sido

    educado por seu advogado nas tcnicas de negociao e mediao a fim de poder, assessorado

    pelo advogado mas tambm dispondo de autonomia, atuar da melhor forma possvel na

    abordagem consensual do conflito49.Trabalhados os aspectos relativos ao mrito, ser importante, antes da sesso

    consensual, que o advogado instrua seu cliente sobre o procedimento, buscando antecipar

    perguntas que podero ser feitas e explicar que o foco ser a outra pessoa e no o mediador50.

    ainda recomendvel que o advogado prepare o cliente para ser abordado pelo

    mediador e pela outra parte; importante repassar com ele perguntas essenciais de modo a

    que ele saiba dizer o que sente e porque sente, se ou no responsvel, se os danos que

    causou so ou no grandes51

    ...Na literatura americana consta ainda a advertncia de que o advogado deve estimular

    que seu cliente seja emptico com a outra parte52. No h duvidas de que tentar colocar-se no

    lugar do outro conduta muito produtiva e valiosa para que a animosidade ceda espao a

    posturas colaborativas.

    6.2. Atuao durante a sesso consensual.

    Definida a realizao de reunies para a promoo da comunicao pelo conciliador

    46ARNOLD, Tom. 20 Common Errors in Mediation Advocacy, p. 440.47COOLEY, John W.A advocacia na mediao(Trad. Ren Loncan), p. 80.48ARNOLD, Tom. 20 Common Errors in Mediation Advocacy, p. 438.49 AZEVEDO, Andr Gomma de; SILVA, Cyntia Cristina de Carvalho e. Autocomposio, processosconstrutivos e a advocacia: breves comentrios sobre a atuao de advogados em processos autocompositivos, p.121.50ARNOLD, Tom. 20 Common Errors in Mediation Advocacy, p. 437.51

    ARNOLD, Tom. 20 Common Errors in Mediation Advocacy, p. 439.

    52ARNOLD, Tom. 20 Common Errors in Mediation Advocacy, p. 439.

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    ou mediador, os participantes, se desejarem, podero53a elas comparecer acompanhados por

    seus advogados a fim de que estes venham a esclarecer duvidas ou indicar encaminhamentos

    legais para preocupaes e questionamentos que por ventura ocorram na mediao54".

    Em uma negociao (entabulada diretamente entre os envolvidos ou facilitada por um

    terceiro imparcial) o advogado, ao fornecer informaes especiais e disponibilizar meios

    eficientes, pode colaborar para que o cliente tome decises esclarecidas e aja com eficincia55.

    Juliana Demarchi ressalta o essencial papel dos advogados na sesso de conciliao:

    eles tm a misso de orientar juridicamente as partes e auxilia-las na adequada compreenso

    dos interesses em debate e nas consequencias de eventual acordo56".

    Tambm a criatividade e a experincia profissional so bem-vindas na busca de

    caminhos alternativos para a criao de boas solues; afinal, muitas vezes, o advogado podeenxergar pontos que as partes no conseguem ver57.

    Merece destaque, nessa situao, um ponto interessante a respeito dos meios

    consensuais: dada a sua informalidade (no sentido de no haver procedimento pr-fixado e

    rigoroso na mediao e na conciliao), as habilidades das partes, dos advogados e do

    mediador so intrnsecas ao processo58. Como no h detalhamento legal quanto ao tramite do

    procedimento, o como fazer construdo a partir das habilidades dos envolvidos.

    Nessa seara, a personalidade do cliente deve ser levada em conta. Se os executivos querepresentam as partes so agressivos e arrogantes, sua postura errada pode ser fatal para a

    mediao; afinal, os melhores construtores de consenso mostram criatividade e tolerncia,

    habilidades que ajudam muito a solucionar disputas59.

    Da mesma forma devem os advogados ser sensveis, flexveis e dispostos a uma boa

    53A temtica enseja alguma polemica nas demandas familiares porque muitos temas da intimidade encontramdificuldades para serem expostos diante de variadas pessoas; por isso, em alguns modelos de aplicao demediao os advogados participam no de todas mas de algumas sesses (na primeira e na ultima, por exemplo).54 BRAGA NETO, Adolfo. Alguns aspectos relevantes sobre a mediao de conflitos. In Mediao egerenciamento do processo. SP: Atlas, 2007, p. 68.55MNOOKIN, Roberto. PEPPET, Scott R. TULUMELLO, Andrew. Mais que vencer: negociando para criarvalor em negcios e disputas. Trad.: Mauro Gama. Rio de Janeiro: Best Seller, 2009, p. 21.56DEMARCHI, Juliana. Tcnicas de conciliao e mediao. In Mediao e gerenciamento do processo. SP:Atlas, 2007, p. 56.57 AZEVEDO, Andr Gomma de; SILVA, Cyntia Cristina de Carvalho e. Autocomposio, processosconstrutivos e a advocacia: breves comentrios sobre a atuao de advogados em processos autocompositivos.Revista do Advogado, p. 120.58 AZEVEDO, Andr Gomma de; SILVA, Cyntia Cristina de Carvalho e. Autocomposio, processosconstrutivos e a advocacia: breves comentrios sobre a atuao de advogados em processos autocompositivos, p.119.59

    ARNOLD, Tom. 20 Common Errors in Mediation Advocacy. InRISKIN, Leonard L.; WESTBROOK, JamesE. Dispute Resolution and Lawyers. St. Paul: West Group, 1997, p. 436.

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    preparao; como esta traz melhores solues, o advogado que no se preparou pode ser

    inapropriado para a mediao60.

    Se as pessoas tm perfis complicados mas se dispem a comparecer sesso

    consensual, aps a explanao pelo mediador sobre as pautas de comunicao ser perceptvel

    se haver uma adaptao viabilizadora da comunicao produtiva. possvel que haja

    aderncia aos princpios e regras apresentados a permitir que o mecanismo consensual evolua;

    caso isto no se verifique, faltando disposio e boa f, o meio encontrar um limite e poder

    findar.

    Se alcanado o consenso e entabulado um acordo, a atuao tcnica do advogado ser

    muito importante para a oficializao de seus termos. Como bem pontua Juliana Demarchi, "o

    acordo deve ser redigido em conjunto pelas partes, seus advogados e o mediador/conciliadorpara que reflita da forma mais clara e completa aquilo que foi combinado; assim, para que o

    acordo tenha, de fato, a mesma fora vinculante que a sentena, sua redao deve ser clara

    para evitar divergncias na interpretao de suas clusulas61".

    7. Percepo de honorrios pelos advogados nos meios consensuais.

    Contar com varias possibilidades de atender o cliente algo que revela no s aversatilidade do advogado como tambm propicia a maior chance de satisfao do

    destinatrio de sua atuao, ensejando a fidelizao e a valorizao da atividade advocatcia.

    H, porm, resistncias. Leonard Riskin e James Westbrook apontam haver um medo

    generalizado de que o advogado v ganhar menos dinheiro ou perder o controle ao se

    envolver nos mtodos alternativos, lembrando que muitos entendem que o papel primrio do

    causdico mesmo o de advocate (atuar como advogado litigante)62.

    60ARNOLD, Tom. 20 Common Errors in Mediation Advocacy. InRISKIN, Leonard L.; WESTBROOK, JamesE. Dispute Resolution and Lawyers. St. Paul: West Group, 1997, p. 437.61DEMARCHI, Juliana. Tcnicas de conciliao e mediao. In Mediao e gerenciamento do processo. SP:Atlas, 2007, p. 61.62RISKIN, Leonard L.; WESTBROOK, James E. Dispute Resolution and Lawyers. St. Paul: West Group, 1997,

    p. 52-53. Se buscarmos o vocbulo advocate no dicionrio, encontramos como acepes patrono, defensor(perante a justia), protetor,advogado, advogar, defender (Advocate. Dicionrio Michaelis. Disponvel

    em http://michaelis.uol.com.br/moderno/ingles/index.php?lingua=ingles-portugues&palavra=advocate. Acesso17 set. 2012).

    http://michaelis.uol.com.br/moderno/ingles/index.php?lingua=ingles-portugues&palavra=advocatehttp://michaelis.uol.com.br/moderno/ingles/index.php?lingua=ingles-portugues&palavra=advocatehttp://michaelis.uol.com.br/moderno/ingles/index.php?lingua=ingles-portugues&palavra=advocate
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    O medo, porm, no se justifica; certamente o advogado adaptado s demandas dos

    tempos atuais se posicionar melhor em um ambiente de alta competitividade profissional63.

    Sob o ponto de vista imaterial, portanto, o advogado pode ganhar em reputao e em

    lealdade ao conquistar o cliente mostrando sua eficincia e versatilidade no encaminhamento

    das controvrsias e proporcionando-lhe resultados satisfatrios em diversas searas.

    No que tange ao ganhos econmicos, tambm possvel prosperar. O profissional

    atualizado e focado em meios diferenciados deve, porm, repensar a forma de cobrar os

    honorrios advocatcios.

    Muitos advogados combinam a percepo de valores por atos processuais praticados e

    acabam apenas se referenciando a elementos inerentes a mtodos adjudicatrios. Nos meios

    consensuais, o padro de remunerar o advogado a partir das fases do processo contenciosono ter utilidade.

    A cobrana segundo a lgica contenciosa acaba tornando o advogado focado na

    extenso do litgio, de onde poder extrair ganhos conforme o ampliado desenrolar do tramite

    processual.

    Segundo Neil Andrews, "o mtodo de cobrana de honorrios por hora fornece

    incentivo econmico para advogados aumentarem a intensidade e complexidade dos

    processos64

    ".O advogado que atua nos meios consensuais desempenhar atividades de consulta,

    orientao e acompanhamento; ele se comunicar algumas vezes com o cliente antes das

    sesses consensuais e possvel que aps algumas reunies j seja possvel divisar resultados.

    A percepo imediata e clere dos honorrios por sua remunerao na preparao e no

    assessoramento durante as sesses consensuais por certo atende a interesses econmicos dos

    advogados. Alm disso, a cobrana pode ser diversa quando da atuao tcnica para tornar o

    acordo um titulo executivo (extrajudicial ou mesmo judicial).Em menos tempo e com atividades mais interessantes podero o advogado e seu

    cliente aferir ganhos em todos os sentidos a partir de uma produtiva abordagem consensual

    das controvrsias.

    63 HIGHTON DE NOLASCO, Elena I. ALVAREZ, Gladys S. Mediacin para resolver conflictos. 2 Ed.Buenos Aires: Ad Hoc, 2008, p. 404.64

    ANDREWS, Neil, O Moderno Processo civil: formas judiciais e alternativas de resoluo de conflitos naInglaterra. SP: RT, 2010, p. 245.

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    8. Concluses.

    Vive-se uma poca de forte crise nas instituies e nas formas tradicionais de lidar

    com os conflitos na seara jurdica.

    A Resoluo 125 do CNJ propugna a ampliao do uso dos meios consensuais na

    seara judicial e demanda a preparao dos advogados para bem desempenharem sua misso

    de gestores de conflitos.

    Embora originalmente treinado para o esquema litigioso, o advogado pode

    incrementar produtivamente o leque de sua atuao. Ampliar as possibilidades de

    enfrentamento das controvrsias auxilia o advogado a contar com diferenciadas estratgias

    para atender melhor os interesses de seus clientes.Conhecer e difundir a pratica dos meios consensuais de suma importncia porque a

    conscientizao do advogado sobre os benefcios de tais mecanismos crucial para a

    evoluo da utilizao desses mtodos e para que estes possam produzir resultados benficos

    no tecido social.

    Tambm as pessoas envolvidas nos conflitos merecem ser comunicadas sobre as

    vantagens decorrentes de uma abordagem no beligerante, dentre as quais se destacam a

    valorizao da autonomia, a celeridade, a possvel manuteno do relacionamento em basesmelhores, o controle do procedimento, a economia de recursos e a sustentao de uma boa

    reputao.

    A atuao eficiente nos meios consensuais exige a preparao do advogado e das

    pessoas envolvidas para que a comunicao flua de forma produtiva rumo ao encontro dos

    interesses subjacentes s posies externadas.

    O advogado deve preparar seu cliente para as sesses consensuais, assim como atuar,

    nas sesses de conciliao e mediao, para orienta-lo na presena do terceiro imparcial.Incumbe-lhe ainda preparar o acordo porventura entabulado em termos tcnicos, podendo

    torna-lo um titulo executivo judicial ou extrajudicial.

    A atuao do advogado, essencial assessor tcnico, pode e deve ser ampla, merecendo

    ser valorizada proporcionalmente ao ganho de tempo e de vantagens para o cliente; isso

    repercute no s em valores como a credibilidade e a fidelizao, mas tambm em ganhos

    materiais que podem ser percebidos celeremente pelo advogado.

    A conscientizao promovida pelos meios consensuais favorece a incluso social, a

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    empatia e a razoabilidade no enfrentamento das controvrsias, oxigenando a abordagem das

    controvrsias com novas pautas e ideias em prol de melhores resultados.

    9. Referncias bibliogrficas.

    ANDREWS, Neil. O Moderno Processo civil: formas judiciais e alternativas de

    resoluo de conflitos na Inglaterra. So Paulo: RT, 2010.

    AZEVEDO, Andr Gomma de; SILVA, Cyntia Cristina de Carvalho.

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    Como citar este artigo: TARTUCE, Fernanda. Advocacia e meios consensuais: novas

    vises, novos ganhos. In: Joo Jos Custdio da Silveira; Jos Roberto Neves Amorim.

    (Org.). A nova ordem das solues alternativas de conflitos e o Conselho Nacional de Justia.

    1ed. Braslia: Gazeta Jurdica, 2013, v. 1, p. 125-146. Disponvel em

    www.fernandatartuce.com.br/artigosdaprofessora.Acesso em (data).

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