AMARTYA SEN SUSTENTABILIDADE · AMARTYA SEN E A PERSPECTIVA SOCIOECOLÓGICA DA SUSTENTABILIDADE E...

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129 Kalagatos Kalagatos Kalagatos Kalagatos Kalagatos - REVISTA DE FILOSOFIA. FORTALEZA, CE, V. 10 N. 20, VERÃO 2013 JOSÉ LUIS SEPÚLVEDA FÉRRIZ * Recebido em jun. 2013 Aprovado em out. 2013 AMARTYA SEN E A PERSPECTIVA SOCIOECOLÓGICA DA SUSTENTABILIDADE E DO DESENVOLVIMENTO HUMANO RESUMO O presente artigo debate a noção de sustentabilidade à luz da discussão conduzida por Amartya Sen sobre desenvolvimento humano e qualidade de vida, buscando redimensionar o papel e o valor do humano em meio aos desafios do desenvolvimento. O texto tenta refletir sobre a contribuição para uma socioecologia nas obras de Sen, e do sentido intelectual presumido de ser um antídoto às abordagens economicistas que codificaram a natureza como “reino das mercadorias” ao mesmo tempo em que cercaram o componente humano de profunda aridez de significado e valor explicativo. PALAVRAS-CHAVE Sustentabilidade. Desenvolvimento. Socioecologia. Ética. Qualidade de vida. * Doutorando em Filosofia pela UNIVERSIDADE COMPLUTENSE DE MADRI-UCM (Espanha), Mestre em Filosofia pela UCM e Licenciado em Filosofia e Teologia pela UNIVERSIDADE CATÓLICA DE RECIFE-PE.

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    JOSÉ LUIS SEPÚLVEDA FÉRRIZ *

    Recebido em jun. 2013Aprovado em out. 2013

    AMARTYA SEN E A PERSPECTIVA SOCIOECOLÓGICA DASUSTENTABILIDADE E DO DESENVOLVIMENTO HUMANO

    RESUMOO presente artigo debate a noção de sustentabilidadeà luz da discussão conduzida por Amartya Sen sobredesenvolvimento humano e qualidade de vida,buscando redimensionar o papel e o valor do humanoem meio aos desafios do desenvolvimento. O texto tentarefletir sobre a contribuição para uma socioecologianas obras de Sen, e do sentido intelectual presumidode ser um antídoto às abordagens economicistas quecodificaram a natureza como “reino das mercadorias”ao mesmo tempo em que cercaram o componentehumano de profunda aridez de significado e valorexplicativo.

    PALAVRAS-CHAVESustentabilidade. Desenvolvimento. Socioecologia.Ética. Qualidade de vida.

    * Doutorando em Filosofia pela UNIVERSIDADE COMPLUTENSE DEMADRI-UCM (Espanha), Mestre em Filosofia pela UCM eLicenciado em Filosofia e Teologia pela UNIVERSIDADE CATÓLICADE RECIFE-PE.

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    ABSTRACTThis article discusses the notion of sustentability basedon AmarthyaSen’s discussion about human developmentand quality of life, seeking to reorganize the role andthe value of the human being among the challenges ofdevelopment. The text tries to reflect about thecontribution for a sociecology in Sen’s works, and ofthe presumed intelectual sense of being an antidote tothe economic approaches that codified nature as “thekingdom of goods” and at the same time surroundedthe human component with a profound lack of meaningand explicative value.

    KEYWORDSSustentability. Development. Socioecology. Ethics.Quality of life.

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    0131. INTRODUÇÃO

    O conceito de desenvolvimento sustentável (DS), expressa uma equação complexa da organizaçãoda vida, como categoria que denota um novo modelode inserção dos homens no mundo natural com o fimde sua reprodução material. E é uma medida comgrande impacto no jogo das identidades erepresentações das realidades (natural e humana) edas novas condições que orientam as ações dos agentessociais em relação a essas realidades. Os homensmotivados a pensar as políticas que permitem aconstrução de uma sociedade sustentável, entendemque esperam por um novo mundo e que este projeto éurgente.

    Todavia, os caminhos que levam à sustentabilidadesão penosos, e alguns indicadores mostram os grausde dificuldade para a realização do esforço a serempreendido. Há uma diversidade de tipos humanoscom suas teorias especiais da ordem do mundo, davida e da natureza, muitas vezes incompatíveis,colocados diante da exigência de certo nível decontato entre os atores. O início do esforço dialógicoestá na crítica da lógica da ação econômica que, nofazer e no modo de fazer, denuncia o que se é em umsentido não estritamente econômico, e que permiteuma aproximação do projeto de um mundo novo.Assim, a operação de mecanismos de organizaçãoeconômica que predam os recursos naturaisultrapassam a capacidade e o tempo de funcionamentoda realidade biofísica, no intuito de realizar a funçãoeconômica, que é intrínseca à vida humana.

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    Os homens modernos e suas mentalidadesolharam a natureza e viram-na como algo diferente desi próprios. Isto serviu para tomar viável um curso deação segundo uma estrutura de sentimentos dirigida ànatureza tomada como outra coisa, separada. O campode seus poderes tinha à mostra amplas técnicas deintervenção. Aquela natureza respondeu aochamamento e deu-lhes produtividade. Os sentimentosiniciais que subsidiaram as ações foram, dessa maneira,reforçados. Agora, num tempo presente, a naturezacomo suporte da vida, mostra-se como ente-obstáculoà produção futura da realidade dos sonhos humanos.Há uma paisagem real de uma natureza-objeto quenão pode suportar as práticas que exaurem suasreservas e processos gerativos.

    No caso brasileiro, o difícil mundo dos acordoshumanos se atualizara no formato dos desarranjossociais e econômicos – pobreza, êxodo rural, crescimentodescontrolado das metrópoles, proletarização etc. Esseprojeto de intervenção na natureza logo apresentoutraços declinantes, mesmo na parte do projeto deintervenção que parecia invencível: são conhecidos osfenômenos da deterioração dos solos produtivos,devastação das florestas, desertificação dos solos,contaminação das vertentes hídricas, para mencionaralguns indicadores ligados à agricultura e à qualidadevida das populações urbanas.

    Os desafios são enormes quanto ao esforço deharmonização dos princípios da ação econômica, dadiversidade cultural, das formações políticas e dodelicado tema dos limites do mundo biofísico. No

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    013entendimento de alguns, uma teoria do desenvolvimento

    sustentável encontra-se ainda num estágio precário,permeado por grandes pretensões, mas com pouca forçaanalítica. O conceito de desenvolvimento sustentávelapresenta um grau de convergência e consenso, menospela força analítica que reúne e mais pela ausência demarcos teóricos suficientes (BRÜSEKE, 1997, p. 121).Há uma grande lacuna que abriga a todos nummovimento cujas aspirações são simpaticíssimas, masainda incipientes.

    As barreiras que se opõem à instalação depráticas sustentáveis estão em boa medida em umaracionalidade econômica convencional firmada noprincípio de que nos interesses e nas ações individuaisse obtêm ganhos máximos para o conjunto. O modeloneoclássico da economia, baseado no crescimentoinfinito e sem limitações ecológicas, criou nos cidadãoscomuns expectativas impossíveis quanto ao consumo.Na teoria econômica dominante, o produto nacional deuma sociedade é o resultado da combinação trabalho ecapital. A natureza e os serviços naturais sãonegligenciados como fatores essenciais para a produçãoporque, a despeito da certeza de que qualquer produtoadvém da matéria da natureza, no processo do consumo,o valor de uso dos bens é consumido e destruído. Todoo resíduo de matéria não consumido retorna à naturezacomo lixo emissões. Em boa medida, esse tratamentoteórico que toma a natureza como custo zero, pode seratribuído ao modelo da economia pré-industrial, baseadano uso de recursos renováveis, numa escala sem maioresprejuízos para o meio ambiente. O lixo daquele tempo

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    podia ser renovado pelos fluxos circulares da ecologiae convertido em novos recursos produtivos. É dessarealidade que se retirou o dito popular de que anatureza “trabalha de graça”, porque cabe a ela aresponsabilidade pela velocidade e pelos ciclos deregeneração (BISWANGER, 1997, p. 41).

    A escala de produção, o consumo e a motivaçãoda “maximização dos lucros” não dão tempo aosprocessos biofísicos, e o uso de uma racionalidadesustentável pretende redefinir os meios físicos,criticando a máxima de que o valor das coisas danatureza coincida com a realidade dos preços. O que anatureza é não pode caber nesse Pensamento Pluraljogo de correspondências. As exigências cada vezmaiores de capital natural causam desequilíbrios nomeio ambiente, e para este dado os preços de mercadonão apreendem estas perturbações, postas de lado nocálculo econômico.

    Para Cavalcanti (1997), é oportuno que o Estadolidere o mercado em lugar de segui-lo, comoatualmente, propondo ações de gerenciamento racionalda natureza. O Estado parece ser o agente apto paraimpor medidas atenuadoras – através dos instrumentosdisponíveis, do direito e do dinheiro. Por outro lado, adiscussão ecológica parece demonstrar o fato de que oarranjo institucional do Estado nacional/territorial nãoestá à altura das necessidades mundiais. A camada deozônio tem pouco a ver com as fronteiras que existemsomente no imaginário humano. Como diz Brüseke(1997, 122), “os problemas ecológicos são maiores queo Estado territorial”.

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    013Os defensores do desenvolvimento sustentável

    deparam-se com o desafio de um desenvolvimentoatento às metas de eliminação da pobreza e dedesconcentração da renda. E, para complicar estaequação, são conhecidos os fatores globais docrescimento sem empregos, incrementando asdesigualdades e misérias. Esse dado da realidadecontrasta com as noções de desenvolvimento eprogresso que, para além das pretensões de uma visãoobjetiva da realidade, mostram-se como ideologiacapaz de agressões simbólicas e justificadoras de umaordem de realidade excludente, em um formato do agirhistórico preconizado, entre os “virtuosos” e “nãovirtuosos”, independente da estrutura de oportunidadesdisponibilizada ao conjunto.

    Para além dos pieguismos que se vão espalhandoem torno do tema do desenvolvimento sustentável, osdebates na esfera pública atualizam a complexidade dafunção primária da reprodução material. Os valoresecológicos dão à função econômica um simbolismorenovado. E, do ponto de vista da realidade conhecida,os obstáculos são incomensuráveis, pois se reportam àpsicologia dos agentes, de seus hábitos de consumo eestilos de vida, porque os fluxos de contentamento seconectam aos excessos consumistas e às dissipaçõesimprudentes. É nesse contexto de questões e impassesteóricos que emerge o pensamento de Amartya Sen que,apesar de estar no campo disciplinar da economia, realizao tempo inteiro a viagem inversa – buscar nas dinâmicassocietárias e políticas a chave operatória para o projetode sustentabilidade da vida no sentido mais amplo.

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    2. DEMARCANDO O PROBLEMA SOB A PERSPECTIVA DEAMARTYA SEN

    Com a publicação do “Relatório Brundtland” em1987, Sen identifica um novo marco na discussão sobredesenvolvimento, sintetizado na máxima de que se deveatender “às necessidades do presente sem comprometera capacidade das gerações futuras para atender às suasnecessidades” (CMMAD, 1991, p. 59). O debate quese seguiu foi profícuo, no sentido de agregar e expandirmais aspectos e dimensões da realidade eparticularidades disciplinares, e tomou a componentehumana e suas questões derivadas como problemasecundário em face das abordagens conservacionistasdominantes no debate ambientalista, porquedefensoras de um ente natureza distinto do homem e,por isso, indiferentes à complexidade das dinâmicassocietárias.

    Simultaneamente vigorava um modeloeconômico sedimentado na noção de crescimento, doqual Sen proporá um afastamento. Como a economialida com questões relativas aos desafios adaptativos eàs dinâmicas próprias das associações e cooperaçãodos homens entre si para promover o intercâmbio ànatureza com o fim da satisfação de necessidades,então é preciso enriquecê-la até o limite de, em saindoda realidade básica material, se poder alcançar umnovo parâmetro de apreciação da vida.

    Sen reconhece a riqueza e oportunidade que oconceito de desenvolvimento sustentável originariamentegerou, e não almeja ignorar os ganhos intelectuais epolíticos globais que o movimento em torno da noção

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    013de desenvolvimento sustentável trouxe. Contudo,

    indaga “se a idéia de ser humano que o conceito abarcaé suficientemente abrangente” (SEN, 2004, p.14). Adimensão real das “necessidades” e seus processos emecanismos intrínsecos estão dados. Todavia, asdimensões que Sen valoriza e buscará incorporar sãoexatamente aquelas que estão para além dos limitesdisciplinares das abordagens materialistas. Ganharelevo um estatuto de humanidade baseado naspremissas do homem como tendo crenças e valores, eda capacidade para a discussão e avaliação públicas.

    O autor recupera a noção de “agente” parapensar a natureza e as possibilidades de ação humanacomo entidade que tem liberdade para agirreflexivamente, atribuindo valor às coisas em umaordem da realidade que ultrapassa a esfera doatendimento das necessidades prementes. Dessamaneira, a pergunta fundamental deve ser com respeitoà natureza das prioridades ambientais e de sua conexãocom o delicado tema do desenvolvimento comoexpansão das liberdades mais amplas dos indivíduos.A indagação original posta no “Relatório Brundtland”sofre sutil mais significativo acréscimo: “será que nãodeveríamos nos preocupar em preservar – e talvez atéexpandir – as liberdades substantivas de que as pessoashoje desfrutam ‘sem comprometer a capacidade dasfuturas gerações’ para desfrutar de liberdadesemelhante, ou maior?” (SEN, 2004, p. 15). Emerge,assim, a noção de “liberdades sustentáveis” comopossibilidade a ser incrementada na teoria do“desenvolvimento como liberdade” do autor.

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    A aproximação possível entre as noções dedesenvolvimento sustentável e desenvolvimento comoliberdade está em que elas lidam com a temática damudança dos modos de vida (na formulação da crítica ena proposição de novos estilos), da reinvenção dasinstituições (de novos objetivos e novas políticas públicas),e que invariavelmente tragam à arena pública asdiscussões sobre justiça social, pobreza etc. Dessa maneira,medidas típicas de regulamentação econômica – como oestabelecimento de uma política de juros e multas paraempreendimentos que não respeitem os limites objetivosdos processos naturais e quaisquer outras iniciativasestritamente coercitivas de caráter econômico – têmalcance limitado comparativamente à noção de umprojeto baseado em normas e responsabilidades cívicas.

    Uma distinção fundamental separa o cerne doargumento de Sen da elaboração da ideia dedesenvolvimento que tem como substrato apenas o agiregoísta: é a compreensão da ação humana e de suacapacidade para agir reflexiva e ativamente, instigado esensibilizado pelos dilemas do mundo circundante. Asustentabilidade possível do meio biofísico e dos projetoshumanos, tem mais a ver com um sentido de cidadaniaambiental em que o agente é capaz de agir levando emconsideração os interesses e bem-estar dos outros doque simplesmente movido pelo autointeresse, como étípico e está pressuposto em programas e políticasbaseados em incentivos financeiros – paliativoneoclássico conhecido.

    Mas, a relação entre sustentabilidade e ativismocívico ou, mais precisamente, de uma cidadania

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    013ecológica, precisa ser mais elaborada, para que a

    cidadania não tenha um papel estritamenteinstrumental, apenas como meio para conservar oambiente, mas como um fundamento constitutivo deum estado final de um modo de vida sustentável. Oenfoque de Sen promove um deslocamento conceitualmarcante: a fórmula do desenvolvimento sustentávelnão pode servir simplesmente como garantia àscondições para o atendimento de necessidadeseconômicas no futuro, mas de um novo padrãocomportamental que denota comprometimentos coma preservação ambiental, porque está estruturado noplano da motivação que envolve outros aspectos davida, inclusive o econômico, redimensionado. E é nessenível onde são discutidas e formuladas às normas parao agir comprometido e com implicações mais amplasque a satisfação de necessidades materiais. Para o autorde Desenvolvimento como liberdade, que conexão desentido há entre a causa “abstrata” da conservação deuma espécie ameaçada de extinção e a esfera primáriado atendimento às necessidades materiais? Entretanto,sob o ângulo de um modo de vida e de um senso deresponsabilidade intrínseco à natureza da ação humana– reflexiva e mutuamente relacionadas aos destinos dacomunidade – trata-se de um ato profundo vinculadoaos valores partilhados, inclusive o de justiça social.

    O ponto de vista de Sen é desconfortável aosolhares unilaterais que margeiam a noção dedesenvolvimento sustentável; seja em seu viés pordemais biologizante que recai nos projetos práticos queconcebem uma natureza intocável ou dos olhares

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    economicistas redutores – ambas as perspectivasincapazes de problematizar a contento determinadosaspectos humanos, como a pobreza. Entre os doismodelos definidores da sustentabilidade, Sendemonstra que há muitas realidades e ordenaçõeslegítimas. Assim, faz referência à área protegida ehábitat do tigre de Bengala na Índia (o Sunderban),para problematizar o fim anunciado dos mais de 50homens desesperadamente pobres que morrem todosos anos comidos pelos tigres, em razão da busca emque se lançam aos milhares à captura do precioso meldo lugar. Uma ordem de prioridades é instituída:“enquanto os tigres são protegidos, nada protege osmiseráveis seres humanos que tentam ganhar a vidatrabalhando naquela floresta” (SEN, 2000, p. 173). Amiséria humana aqui não harmoniza com os objetivospreservacionistas e a pobreza é tornada variávelsecundária. Dessa maneira, torna-se imperioso areflexão acerca do lugar do homem no estatutopresumido do desenvolvimento sustentável. Em outroextremo, estão aqueles para quem se deve darprioridade à satisfação de necessidades econômicas,fazendo da liberdade política e liberdades substantivasum luxo dispensável. São posições políticas de exclusãotípicas do Terceiro Mundo, férteis na difusão de regimesde opressão. Neste caso, uma dimensão imprescindívele característica intrínseca da vida humana (a açãopolítica) e constitutiva do desenvolvimento individuale do corpo social é amputada, fazendo com que projetosde desenvolvimento humano e sustentável expressempráticas unilaterais e simplificadoras incapazes de

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    013articular todos os elementos envolvidos em suas

    complexidades.Na visão de Sen, o arcabouço intelectual e ético

    que dá contornos à noção de desenvolvimentosustentável precisa coadunar-se com a máxima dodesenvolvimento como expansão das capacidadeshumanas. E não é o caso de inverter-se à condição dostigres em benefício dos homens miseráveis de formadireta. Uma medida metodológica inicial é evitar osunilateralismos e reducionismos de todo tipo, seja ode natureza política, científica ou de outro viés.

    3. A DEMOCRACIA COMO BASE PARA O DESENVOLVIMENTO

    Sen postula que o desenvolvimento pode servisto como “um processo de expansão das liberdadesreais que as pessoas desfrutam” (SEN, 1999, p. 37) – enão mais pelo enfoque do crescimento do PNB,industrialização, avanço tecnológico etc. – peloreconhecimento de que há uma dissonância entre rendaper capita e certas liberdades como vida longa etranquila, explicitados em casos de países ricos em PNBper capita (Gabão e Brasil) mas com baixa expectativade vida da população comparativamente a outros paísesbem mais pobres. Tomar a instituição da liberdadecomo o núcleo duro do conceito de desenvolvimentofaz que elementos não econômicos ganhem umaimportância antes ignorada ou tratados como fatoresexplicativos externos ao desenvolvimento. Assim, ademocracia, os direitos civis (a liberdade de participarde discussões e deliberações públicas), e disposiçõessociais como educação e sistema de saúde sãoelementos constitutivos e intrínsecos ao processo de

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    desenvolvimento 1. O sistema econômico passa a seravaliado segundo o progresso e aumento das liberdadesdas pessoas, o que pressupõe um indivíduodevidamente educado e saudável, ou seja, em melhorescondições de livremente assumir o papel de agente.Efetivamente a avaliação do sistema exige a análisedas instituições que empiricamente servem aosobjetivos da expansão das liberdades e para se aferiraté que ponto é proporcionado ao indivíduo, no finaldo processo, os recursos requeridos à geração doindivíduo livre e competente.

    O agente livre e competente retorna às esferas desociabilidade e com sua ação competente pode aperfeiçoaras instituições que, por sua vez, se colocarão novamentecomo meio para sustentar a vida dos indivíduos.

    O que as pessoas conseguem positivamente realizaré influenciado por oportunidades econômicas,liberdades políticas, poderes sociais e por condiçõeshabilitadoras como boa saúde, educação básica, etc.As disposições institucionais que proporcionamessas oportunidades são ainda influenciadas peloexercício das liberdades das pessoas, mediante aliberdade para participar da escolha social e datomada de decisões públicas que impelem oprogresso dessas oportunidades (SEN, 2000, p. 19).

    Sen postula sobre a responsabilidade do agirhumano no mundo, pela condição de que o viver junto

    1 Na economia correlaciona-se crescimento econômico àcapacitação das pessoas, circunscrita somente ao campo doagir econômico e não no sentido substantivo e amplo quepreconiza Sen.

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    013denota a condição de que os acontecimentos ao redor

    se constituem em problemas de todos. E, por issomesmo, a realidade invoca a competência humana parajulgar e projetar o agir. A despeito dos excessos egoístasalimentadores da ação, é fato o envolvimento docomportamento individual em um contexto maior,independente se o indivíduo reconhece ou não estasua condição.

    De um ponto de vista ético, vingou o preceitode que uma pessoa é responsável pelo que lhe acontece(esforço pessoal), de que não deve depender dainfluência da ação de outros, “porque isto enfraqueceriaa iniciativa e os esforços individuais, e até mesmo orespeito próprio” (SEN, 1999, 72). Para Sen, colocar ointeresse de uma pessoa sobre os ombros de outra podeafetar a motivação, envolvimento e autoconhecimentoda pessoa. Qualquer afirmação de responsabilidadesocial que substitua a responsabilidade individual écontraproducente. Não existe substituto para aresponsabilidade individual.

    Contudo, as liberdades substantivas quedesfrutamos para exercer nossas responsabilidades sãoextremamente dependentes das circunstânciaspessoais, sociais e ambientais. Uma criança a quem énegada a oportunidade do aprendizado escolar básicoé desfavorecida por toda a vida. O adulto sem osrecursos para receber tratamento médico para curaruma doença é vítima de morbidez evitável e da mortepossivelmente escapável. Os indivíduos (a criança e oadulto) são privados não só do bem-estar, mas dopotencial para levar uma vida responsável, pois esta

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    depende do gozo de certas liberdades básicas.Responsabilidade requer liberdade.

    Assim, o argumento do apoio social para expandira liberdade das pessoas é um argumento em favor daliberdade individual e não contra ela. O caminho entreliberdade e responsabilidade é de mão dupla. Sem aliberdade substantiva e a capacidade para realizaralguma coisa, a pessoa não pode ser responsável porfazê-la. Mas ter efetivamente a liberdade e a capacidadepara fazer alguma coisa impõe à pessoa o dever derefletir sobre fazê-la ou não, e isso envolveresponsabilidade individual. Nesse sentido, a liberdadeé necessária e suficiente para a responsabilidade.

    O comprometimento social com a liberdadeindividual não precisa atuar apenas por meio doEstado; deve envolver outras instituições: organizaçõespolíticas e sociais, disposições de bases comunitárias,instituições governamentais, a mídia e outros meiosde comunicação e entendimento público, bem comoas instituições que permitem o funcionamento demercados e relações contratuais.

    4. SOBRE DEMOCRACIA

    A importância do sistema democrático comosuporte de todo o processo não é algo para Senlocalizado romanticamente na esfera da idealizaçãocoletiva em um formato ingênuo. Há um fundohistórico e motivação pragmática para demonstrar osinteresses dos grupos mais fracos, e quantitativamentemais representativos, para priorizar, avaliar e decidirpor soluções e instituições democráticas, no intuito daconsecução de seus objetivos. As evoluções conhecidas

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    013nas democracias contemporâneas reforçam a hipótese

    de que o público dará maior apoio aos programas eprojetos de governo que proponham a articulação devárias disposições sociais em um arranjo universalista.Porém, esses projetos não têm apenas o combustível doautointeresse, senão que o sistema também está abertoàs motivações segundo os interesses conectados ao bem-estar dos outros.

    As liberdades políticas são constitutivas dosprojetos e relações econômicas, e influenciam nacompreensão e satisfação de necessidades econômicas:“nossa conceituação de necessidades econômicasdepende crucialmente de discussões e debates públicosabertos [...]. A intensidade das necessidades econômicasaumenta – e não diminui – a urgência das liberdadespolíticas” (SEN, 2000, p. 175).

    A democracia e as liberdades políticas impactamsobre a vida e as capacidades dos cidadãos, porque osdireitos políticos dão às pessoas a oportunidade dechamar a atenção para necessidades gerais e exigir aação pública apropriada. A resposta do governo aosofrimento do povo depende frequentemente dapressão exercida sobre esse governo e é nisso que oexercício dos direitos políticos (votar, criticar, protestaretc.) pode realmente fazer diferença, tornando possívela prevenção de catástrofes, como as fomes coletivas,por exemplo. A liberdade política é um instrumentoútil sobre os que detêm o poder e que se submetem aseleições regulares, bem como aos partidos de oposiçãoe a imprensa livre, quando questionam a “sabedoriadas políticas governamentais”.

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    A formação de valores requer comunicação ediálogo abertos, as liberdades políticas e os direitoscivis são instituições centrais para esse processo.Ademais, para expressar publicamente o que se valorizae exigir que se dê a devida atenção a isso, precisa-sede liberdade de expressão e escolha democrática. Naformação de valores e prioridades, não se podem tomaras preferências como dadas independentemente dediscussão pública. Sen preocupa-se com o risco deenaltecer excessivamente a eficácia da democraciacomo se ela fosse um remédio eficaz para todos osmales sociais. Mesmo nas democracias maduras sãoconstatadas práticas deficientes no exercício dosdireitos políticos.

    5. DA IMPORTÂNCIA DO MERCADO

    Sen reforça o significado da ação econômica comoum meio para a obtenção de um fim mais amplo, isto é,da riqueza como não sendo o bem último das pessoas.Lembra Marx quando ressaltou a importância de“substituir o domínio das circunstâncias e do acaso sobreos indivíduos pelo domínio dos indivíduos sobre o acasoe as circunstâncias” (SEN, 2000, p. 328). E tambémHayek, citado por Sen: “as considerações econômicas sãomeramente aquelas pelas quais conciliamos e ajustamosnossos diferentes propósitos, nenhum dos quais, emúltima instância, é econômico (exceto os do avarento oudo homem para quem ganhar dinheiro se tornou um fimem si mesmo)” (SEN, 2000, p. 291).

    O autor está entre aqueles que não reforçamvisões unilaterais sobre a natureza e dinâmicas própriasao mercado – como plena positividade ou como a

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    013materialização dos pecados e das malvadezas humanas.

    De um lado vê base empírica para reconhecer a relaçãoentre mercado e elevado crescimento e progressoeconômicos, ao mesmo tempo em que se alinha aosdiagnósticos que externam a necessidade da regulaçãopor parte do Estado e da efetividade de políticascompensatórias e protetoras. Firmando-se em AdamSmith, Sen propõe “que a liberdade de troca e transaçãoé ela própria uma parte essencial das liberdades básicasque as pessoas têm razão para valorizar” (SEN, 2000,p. 21). A liberdade de troca – semelhantemente a outrascomo a de trocar palavras, bens ou presentes – é “partedo modo como os seres humanos vivem e interagemna sociedade” (SEN, 2000, p. 21). A reflexão sobre aimportância direta da liberdade de troca deve precederas discussões sobre o mecanismo de mercado.

    O desenvolvimento econômico tem a ver comabertura à concorrência, uso de mercados internacionais,alto nível de alfabetização e educação escolar, reformasagrárias bem-sucedidas e provisão pública de incentivosao investimento, exportação e industrialização. E todasessas são políticas congruentes com a democracia. Assim,o processo de desenvolvimento requer a integração dediversas instituições propiciadoras de expansão deliberdades substantivas para além do mercado, comopartidos políticos, instituições cívicas, sistemaeducacional e oportunidades para o diálogo e debatesabertos, ressaltando o papel da mídia.

    A problemática ambiental é situada, na reflexãode Sen, no intervalo que comporta sua discussão sobreas variáveis constitutivas ao desenvolvimento e a esfera

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    básica onde se desenrolam os esforços adaptativoshumanos que é o mercado. Na sua reflexão sobre oselementos constitutivos do desenvolvimento, que estávoltado à capacitação dos indivíduos para reflexiva ecriativamente participarem da construção de seumundo, situa-se o campo das evoluções quanto àsescolhas coletivas de acordo com a sustentabilidade,porque firmada em uma cidadania ambiental. Arealidade de melhores resultados do mercado é, em si,uma resposta mais restrita quanto aos grandes dilemaséticos da humanidade, incluindo uma atitude prudenteem relação ao meio ambiente. As soluções efetivas têma ver com as interações sociais fora do mercado, masfazendo convergir para o mercado regras e normas comrespeito à justiça, confiança e solidariedade. Não hánada de inflexível no modelo; se discussões éticasacontecerão ou não, isso tem a ver com o jogo dasidentidades e do poder vivido na contemporaneidade,e de que as instituições são um reflexo.

    6. LIBERDADE, PARÂMETROS DE JUSTIÇA E O AGIRCOOPERATIVO

    6.1 SOBRE JUSTIÇA

    Para Amartya Sen, o exercício de recomposiçãode um núcleo ético sobre a base instrumental requerque se discutam noções como justiça e liberdade. Cadaabordagem da justiça ampara-se em suas basesinformacionais necessárias – princípios conectados àsinformações específicas e cuja decisão a ser tomadaestá na dependência sobre quais informações se darámaior importância – para a formação de juízos. Os

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    013princípios utilitaristas têm como única base para a

    avaliação de ações e regras as informações sobreutilidade, definidas como prazer e felicidade, sempreno nível dessas realizações mentais. A baseinformacional do utilitarismo é o somatório dasutilidades das pessoas sempre representadas por algumamedida que não se presta a comparações interpessoais.As utilidades de diferentes pessoas são somadasconjuntamente para se obter seu mérito agregado, sematentar para a distribuição desse total pelos indivíduos.As escolhas devem ser julgadas por suas consequências,isto é, pelos resultados que geram, sem o apego aprincípios independentemente de seus resultados.Contrariamente, a corrente do Libertarismo, que nãotem interesse direto na felicidade ou na satisfação dedesejos, e sua base informacional consiste em liberdadesformais e direitos de vários tipos; exige-se a obediênciaa certas regras de liberdade formal e conduta correlata.

    A crítica de Sen ao parâmetro de justiçautilitarista é em razão de que não têm peso em suaestrutura normativa questões importantes como aliberdade substantiva individual e a violação de direitosreconhecidos e aspectos da qualidade de vida nãorefletidos de forma adequada nas estatísticas sobreprazer. Também que se concentra na escolha de cadaindivíduo considerada separadamente, e aqui cabelevantar a questão do condicionamento mental e ocálculo utilitarista – a ênfase em estados mentais podeser restritivo quando são feitas comparaçõesinterpessoais de bem-estar e privação. Os desejos eprazeres ajustam-se às circunstâncias. Além disso, o

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    cálculo utilitarista tende a não levar em consideraçãodesigualdades na distribuição da felicidade, e sobre oreforço que deve ser dado aos direitos e liberdades emrelação à felicidade, Sen dirá que “é sensato levar emconsideração a felicidade, mas não necessariamentedesejamos escravos felizes” (SEN, 2000, p. 81). Oparâmetro de justiça utilitarista não serve para conduziro julgamento de questões centrais à viabilização de umprojeto sustentável de vida, a saber, o meio ambienteenquanto bem público e os fenômenos humanos (dapobreza, da tirania, dos regimes marcados pelopreconceito contra diversos tipos humanos, etc.) quelhe circundam. A reflexão sobre a sustentabilidadeinvariavelmente leva ao tema da distribuição eresponsabilidade de todos quanto ao acesso aos bens,desfrute e tratamento de outros resultados. Asustentabilidade exige essencialmente parâmetros dejustiça distributiva que a normativa utilitarista minimiza.

    6.2 AS POSSIBILIDADES DE CONSTRUÇÃO DO CONSENSO

    Intrinsecamente relacionados com as questõesda justiça, articulam-se os argumentos em torno dapossibilidade da construção de um consenso com vistasaos temas diversos da vida econômica e social. Nopensamento de Sen, esta questão pode ser visualizadano tempo em que discute a componente cooperativada ação humana, seja no campo econômico seja nocampo mais amplo da sociabilidade. E, para isso,recupera os elementos da racionalidade humanaenvoltos na constituição de sociedades melhores eestruturantes de uma base avaliatória apropriada e paraa consecução de instituições necessárias para a

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    013promoção dos objetivos e comprometimentos

    valorativos e normas de comportamento. O interessedo autor é examinar a relevância dos valores e doraciocínio para o aumento das liberdades e para arealização do desenvolvimento. Antes, porém, Sen secontrapõe à argumentação que ressalta aimpossibilidade do progresso baseado na razão, emtrês direções principais.

    1º) Dada à heterogeneidade de preferências evalores encontrada em diferentes pessoas, mesmo emuma determinada sociedade, não é possível contar comuma estrutura coerente para a avaliação social baseada

    na razão. Mesmo o popular e sedutor princípio damaioria leva às inconsistências e todos os mecanismosde tomada de decisão que dependem da mesma baseinformacional acarretarão alguma inadequação, amenos que simplesmente se adote a solução ditatorialde fazer preponderar o ranking de preferências de umapessoa. É assim que promover a divisão de renda,dando aos interessados a oportunidade de através dovoto maximizar sua parte, pode fazer com que, ao final,o mais pobre seja prejudicado. A contra-argumentaçãode Sen é que há mecanismos de decisão que usam maisbases informacionais (ampliação de critérios), e quelevam em consideração quem é mais pobre, quemganha (e quem perde) com as mudanças de renda,qual é o valor desse ganho (ou perda) ou para qualqueroutra informação (como, por exemplo, as respectivaspessoas ganharam as fatias específicas que possuem),para que se produzam julgamentos bem informadossobre problemas econômicos de bem-estar.

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    A política do consenso social requer não apenasa ação com base em preferências individuais dadas, mastambém a sensibilidade das decisões sociais para odesenvolvimento de preferências e normas individuais.Nesse ponto, é preciso atribuir particular importânciaao papel da discussão e das interações públicas naemergência de valores e comprometimentos comuns.As ideias sobre o que é justo e o que não é podem serinfluenciadas pelos argumentos apresentados paradiscussão pública, e as reações variam das opiniões quedenotam comprometimento e até posturas inflexíveis.

    É importante reconhecer que as disposiçõessociais surgidas do consenso e as políticas públicasadequadas não requerem que haja uma “ordenaçãosocial” única que contenha um ranking completo detodas as possibilidades sociais alternativas.Concordâncias parciais ainda distinguem opçõesaceitáveis (e eliminam as inaceitáveis), e uma soluçãoviável pode basear-se na aceitação contingente demedidas específicas, sem exigir a unanimidade socialperfeita.

    2º) Outra crítica com teor metodológico questionaa ideia de que podemos ter o que tencionamos ter,afirmando que consequências impremeditadas dominama história real. Se a maioria das consequências queacontecem são impremeditadas (e não ocasionadas pormeio de ação intencional), as tentativas baseadas na razãode buscar o que se deseja podem parecer inúteis.

    Segundo Sen, o mais importante é que a análisepode tornar os efeitos impremeditados razoavelmenteprevisíveis. Há muitos exemplos de êxito em reformar

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    013sociais e econômicas guiadas por programas motivados 2.

    De fato, o açougueiro pode prever que trocar carnepor dinheiro beneficia não só a ele próprio, comotambém ao consumidor (que compra a carne),podendo-se, assim, esperar que a relação funcione deambos os lados e, portanto, seja sustentável. Umaconsequência impremeditada não precisa serimprevisível, e a confiança de cada parte nacontinuidade dessas relações de mercado dependeespecificamente de que tais previsões estejam sendofeitas ou implicitamente presumidas. A abordagemracionalista de Sen aceita os efeitos impremeditados,mas que as discussões e reflexões públicas levam àsmudanças sociais efetivamente premeditadas, demaneira à obtenção de resultados melhores desejadospelo público.

    3º) Duvida-se do alcance dos valores humanos e dasnormas de comportamento moralmente comprometido,uma vez que os modos de comportamento não podemir além do autointeresse. Entretanto, isso seria osuficiente para o funcionamento do mecanismo demercado,que supostamente apelaria somente para oegoísmo humano.

    Para Sem, o autointeresse é uma motivaçãoimportante e, no entanto, podem ser vistas ações querefletem valores com componentes sociais claros, eesses valores levam muito além dos limites estreitos

    2 As tentativas de alfabetizar e tratar epidemias de toda apopulação foram bem-sucedidas na Europa, América do Norte,Japão etc. É possível tirar lições do que deu errado a fim defazer melhor da próxima vez.

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    do comportamento puramente egoísta. A emergênciade normas sociais pode ser facilitada pelo raciocíniocomunicativo e pela seleção evolutiva de modos decomportamento, e a esfera da ação individual comportao “uso do raciocínio socialmente responsável e de idéiasde justiça” (SEN, 2000, p. 297).3.

    Mas um senso de justiça está entre as considerações quepodem motivar as pessoas [...]. Os valores sociais podemdesempenhar – e têm desempenhado – um papelimportante no êxito de várias formas de organizaçãosocial, incluindo o mecanismo de mercado, a políticademocrática, os direitos civis e políticos elementares, aprovisão de bens públicos e instituições para a ação e oprotesto públicos (SEN, 2000, p. 297).

    Devem-se considerar as diversas formas deinterpretação de ideias éticas não necessariamentesistematizadas e priorizando o tema da justiça social.Entretanto, ideias básicas de justiça não são estranhasa seres sociais, que agem egoisticamente, mas tambémtêm capacidade de pensar altruisticamente – naspessoas da família, vizinhos, e outros tipos do mundo.Não é necessário criar artificialmente um espaço namente humana para a ideia de justiça ou equidade,mas de “uso sistemático, convincente e eficaz daspreocupações gerais que as pessoas efetivamente têm”(SEN, 2000, p. 297-298). Esse nível operatório da razãohumana não fica circunscrito às esferas da vidadistanciadas do mundo econômico. O funcionamentoeficiente da economia capitalista depende de poderosos

    3 Discussões públicas produzem os acordos mínimos sobrequestões básicas de injustiça ou desigualdade.

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    013sistemas de valores e normas. Com efeito, conceber o

    capitalismo como nada mais do que um sistemabaseado em um conglomerado de comportamentoganancioso é subestimar imensamente a ética docapitalismo, que contribuiu enormemente para suasformidáveis realizações.

    O uso de modelos econômicos formais paracompreender os mecanismos de mercado pode ocultaralgumas suposições sobre as relações regulares nas quaiso modelo se fundamenta, para além do fato de as trocasserem “permitidas”, como a importância de instituições(como as estruturas legais eficazes que defendem osdireitos resultantes de contratos) e da ética decomportamento (que viabiliza os contatos negociadossem a necessidade de litígios constantes para obter ocumprimento do que foi contratado). O desenvolvimentoe o uso da confiança na palavra e na promessa das partesenvolvidas podem ser um ingrediente importantíssimopara o êxito de um mercado.

    Ademais, para o autor de Sobre ética e economia,ao contrário do que está suposto no modelo clássicodo pensamento econômico, os homens reais não sãototalmente indiferentes às questões de natureza ética.Os projetos motivados dos indivíduos trazem um clarosubstrato ético, ainda que acompanhados de todas asincoerências que marcam o comportamento real.Assim, a própria ciência econômica restringiu-sequando se importou unicamente com questõeslogísticas, na simplificação dos fins, supostamentedados diretamente, e com o empenho na busca dosmeios apropriados para a consecução dos fins. Foi o

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    tempo em que ganhou espaço uma metodologiaeconômica que se desviava da dimensão normativapreocupada com as exigências quanto à cientificidade,ignorando uma diversidade de considerações éticas queafetam o comportamento real e que “são primordialmentefatos e não juízos normativos” (SEN, 1999, p. 27). Agora,Sen está na defesa da recuperação dos elementos éticos(visões sobre o “bem”), na composição de um parâmetrode avaliação da realização social, que complemente oobjetivo de se “satisfazer a eficiência”.

    Sen, porém, não pretende incorrer no erro dasvisões unilaterais, no caso, das interpretações otimistasimprudentes em relação ao mercado. Por isso, admiteque a ética capitalista é muito limitada em algunsaspectos, ligados particularmente a questões dedesigualdade econômica, proteção ambiental enecessidade de diferentes tipos de cooperação queatuem externamente ao mercado. Assim, o autorreconhece a necessidade de desenvolvimentosinstitucionais conectados ao papel dos códigos decomportamento, baseados em ajustes interpessoais ecompreensões compartilhadas de maneira a operar combase em padrões de comportamento comuns, confiançamútua e segurança com relação à ética. O alicerce emregras de comportamento pode comumente estarimplícito em vez de explícito 4.

    4 O êxito da economia do Japão suscita que a explicação não sedá puramente pela maximização de lucros baseado na buscado autointeresse – mas como resultado de particularidadeshistóricas e da influência da “ética confuciana”; da influênciada cultura samurai.

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    013Os grandes desafios que o capitalismo enfrenta no

    mundo contemporâneo incluem problemas dedesigualdade (especialmente de pobrezaesmagadora em um mundo de prosperidade semprecedentes) e de “bens públicos” (ou seja, os bensque as pessoas compartilham, como o meioambiente). A solução desses problemas quasecertamente requererá instituições que nos levemalém da economia de mercado capitalista. Mas opróprio alcance da economia capitalista de mercadopode, de muitos modos, ser ampliado por umdesenvolvimento apropriado de uma ética sensívela esses problemas. A compatibilidade do mecanismode mercado com um vasto conjunto de valores éuma questão importante e precisa ser consideradajuntamente com a exploração da extensão dedisposições institucionais além dos limites domecanismo de mercado puro (SEN, 2000, p. 303).

    7. SOBRE SIMPATIA E COMPROMETIMENTO

    Sen se insurge contra um reducionismointelectual que entende o sentido de “escolha racional”como baseada exclusivamente na vantagem pessoal eimpede que a percepção de modelos racionais firmadosem considerações sobre ética, justiça ou interesse dasgerações futuras tenha um papel relevante nas escolhase ações humanas.

    O comportamento racional inclui a influênciada “simpatia” 5 e do “comprometimento”. A concepçãode autointeresse pode considerar as outras pessoas, e

    5 Um tipo de afecção que permite a alguém sentir junto com osoutros, por exemplo, quando se ajuda alguém com cujosofrimento se sofre.

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    assim a simpatia pode ser incorporada à noção do bem-estar do próprio indivíduo. Também, pode-se estardisposto a fazer sacrifícios para promover outros valores,como justiça social, nacionalismo ou bem-estar dacomunidade – mesmo a certo custo pessoal. Esse tipode afastamento, envolvendo comprometimento, invocaoutros valores que não o autointeresse (incluindo apromoção de interesses daqueles com quemsimpatizamos).

    Se você ajuda uma pessoa miserável porque essamiséria faz com que você se sinta infeliz, essa terásido uma ação baseada na simpatia. Mas se a presençada pessoa miserável não o deixa particularmenteinfeliz, porém faz com que você se sintaabsolutamente decidido a mudar um sistema queconsidera injusto (ou, de um modo mais geral, sesua resolução não é totalmente explicável pelainfelicidade criada pela presença daquela pessoamiserável), então essa seria uma ação baseada nocomprometimento (SEN, 2000, p. 307).

    Não há sacrifício do autointeresse ou do bem-estar quando se é responsivo às simpatias. Ajudar ummiserável pode fazer com que alguém se sinta melhorse se sofre com o sofrimento dele. Comportamentocom comprometimento, no entanto, envolve sacrifíciopessoal, já que a razão por que você tenta ajudar éseu senso de injustiça e não seu desejo de aliviar seupróprio sofrimento decorrente de simpatia. Nãoobstante, ainda existe um elemento do “eu” envolvidono empenho de uma pessoa por seu comprometimento,uma vez que o comprometimento é dela mesma. Maisimportante é que, embora o comportamento baseado

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    013no comprometimento possa ser ou não conducente à

    promoção do bem-estar do próprio indivíduo, esseempenho não necessariamente envolve algumanegação da vontade racional da pessoa.

    Torna-se relevante uma dinâmica interativaentre as afeições do indivíduo e sociedade à qual elapertence. As avaliações e as ações dessa pessoainvocam a presença de outras e o indivíduo não édissociado do “público”. Sen apóia-se em John Rawlse em sua elaboração sobre os “poderes morais” quecompartilhamos, isto é, a capacidade para um sensode justiça e para a concepção do bem. Rawls vê essespoderes comuns como essencial para a “tradição dopensamento democrático”, juntamente com os“poderes da razão – ou juízo, pensamento e inferêncialigados a esses poderes”. O papel dos valores é vastono comportamento humano e negar esse fatoequivaleria não só a um afastamento da tradição dopensamento democrático, como também à limitaçãode nossa racionalidade. É o poder da razão que nospermite levar em consideração nossas obrigações enossos ideais tanto quanto nossos interesses e nossasvantagens.

    Por fim, sempre se supôs que os seres humanosagem racionalmente e, por conseguinte, analisar “ocomportamento racional não difere de descrever ocomportamento real” (SEN, 2000, p. 323). Sen contestaque o comportamento real seja apenas racional e queo erro é um componente da experiência humana. Nãodefende alguma variante irracionalista, mas querdemonstrar que entre os projetos racionalizados de

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    ação e o mundo real não acontece umacorrespondência perfeita: “os tipos friamente racionaispodem povoar nossos livros didáticos, mas o mundo émais rico” (SEN, 1999, p. 30).

    Sen critica os excessos de uma teoria queentende o comportamento racional tão somente como“maximização do autointeresse”, excluindo tudo omais: “pode não ser absurdo afirmar que amaximização do auto-interesse não é irracional, masasseverar que tudo o que não for maximização doauto-interesse tem que ser irracional parece insólito”(SEN, 1999, p. 31). A compreensão da racionalidadecomo autointeresse cria dificuldades para umaabordagem da motivação “relacionada à ética”. Agircom vistas a obter o que se quer é parte daracionalidade, e não somente isso, mas se podemincluir também objetivos desvinculados doautointeresse: “o egoísmo universal como umarealidade pode muito bem ser falso, mas o egoísmouniversal como um requisito da racionalidade épatentemente um absurdo”.

    No desenrolar do mundo real, o que se verificaé a vigência de uma pluralidade de motivações em quenão agir exclusivamente segundo o autointeresse nãosignifica agir sempre com altruísmo. Finalmente, aanálise só pode ser completada quando, entre oindivíduo e o todo, compreende-se o papel dos grupos– classes, comunidades – na mediação dos interessesdos indivíduos nos contextos mais abrangentes de ação,segundo um turbilhão de motivos – sacrifício altruísta,concessões egoístas, interesses conflitantes etc.

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    0138. MEIO AMBIENTE, DEBATE PÚBLICO E CONSTRUÇÃO DE

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    No pensamento de Sen, a solução dos problemasde desigualdade e pobreza e do tratamento ético aosbens públicos, como o meio ambiente, exige instituiçõesque atuem ultrapassando o mercado capitalista. Aregulamentação e provisão dos governos, através deimpostos e subsídios, não pode equacionar algo queestá centrado no plano ético da vida e do agir prático,em que o meio ambiente é o núcleo de onde deveemergir normas públicas eficazes.

    Os “perdulários e empresários imprudentes” daatualidade andam poluindo o ar e a água, sendoimportante discutir os papéis respectivos daregulamentação e das restrições ao comportamento.O desafio ambiental faz parte de um problema maisgeral associado à alocação de recursos envolvendo“bens públicos”, nos quais o bem é desfrutado emcomum em vez de separadamente por um sóconsumidor. Para o fornecimento eficiente de benspúblicos, precisamos não só levar em consideraçãoa possibilidade da ação do Estado e da provisãosocial, mas também examinar o papel que podedesempenhar o desenvolvimento de valores sociaise de um senso de responsabilidade que viessem areduzir a necessidade da ação impositiva do Estado.Por exemplo, o desenvolvimento da ética ambientalpode fazer parte do trabalho que a regulamentaçãoimpositiva se propõe a fazer (SEN, 2000, p. 305).

    As discussões em torno da pertinência ou nãodo comportamento racional devem ultrapassar amedida imediatista de objetivos isolados, alcançando

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    a emergência de objetivos de eficácia mais ampliada.Ainda que ao nível individual possa não havermotivações conectadas aos ideais de justiça e ética,nos termos complexos exigidos para a formação de umasociedade sustentável, a ponderação acerca dessaquestão pode ter importância instrumental para o êxitoeconômico e social. Se, em um primeiro plano, ressalta-se a relevância da escolha de regras de comportamentodo indivíduo pela reflexão ética de como se “deve” agirpara a obtenção de padrões sustentáveis da vidasocietária, em um segundo momento, faz-se referênciaa uma ética “prática” de comportamento que incorpora– além de considerações essencialmente morais –influências sociais e psicológicas, acomodando normase princípios, capazes de sobreviver por suasconsequências objetivas. Dessa maneira, uma equaçãosócioeconômica da sustentabilidade não pode serreduzida às volições individuais – e, por conseguinte,ao raio de ação e pensamento de cada indivíduo.

    9. ALGUMAS QUESTÕES PARA CONCLUSÃO

    Muito da argumentação de Sen pode ser tomadacomo de um otimismo exagerado. Afinal, outras visõesde realidade explicitam um conjunto de grande tensãoque destaca a simultaneidade das lutas nacionais em meioàs crises do Estado nacional, em um contexto mais amplode conflitos globais, temperados com elementos deimperialismo que subsistem, paralelamente às lutas éticas,e tentativas de estabelecimento dos direitos sociais, semignorar os direitos individuais – seriam as novas nuancesda luta de classes dispostas em relação aos desafios davivência democrática (CASANOVA, 2002). Enfim, todo

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    013esse turbilhão de realidades seria formatado pelos

    efeitos perversos de um neoliberalismo no TerceiroMundo, ágil na geração da pobreza para a maioria dapopulação e bem adaptado às fórmulas nacionalistasunilaterais e ditaduras de todo tipo, tendo comosubstrato o fenômeno da corrupção a germinar poressas paragens. O equacionamento de projetos epráticas sustentáveis nesse diagnóstico parece umdesafio com grandes dificuldades de êxito. Ainda mais,se se considera que de um ponto de vista da distribuiçãoecológica, marcada por assimetrias sociais e espaciaisquanto ao uso desigual de recursos e serviços ambientaispelos tipos humanos do Terceiro Mundo, o que se vêsão os resultados de uma distribuição desigual da terrae do consumo per capita de energia, das assimetriasterritoriais entre emissões de CO2, da distribuiçãoespacial da chuva ácida, e da pobreza como ponto deintersecção dessas manifestações, fomentando conflitose movimentos sociais de extensão e profundidade locaise globais (MARTINEZ ALIER, 2002).

    Sobre os pobres bem encarnados na diversidadedas comunidades humanas que sempre habitaram asáreas naturais (e agora a serem preservadas), se jáeram desprezados pelos competitivos agenteseconômicos e seus grupos políticos afinados com essesparâmetros de eficiência econômica, melhor sorte nãotiveram por parte do que Guha (2000) chama deditadura biológica, imposta pelos especialistas queidentificam os camponeses, pastores e caçadores comoos grandes inimigos do meio ambiente. De seu pontode observação fulminam os tipos humanos que

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    constituem as comunidades humanas ressaltando lhesa ignorância e incapacidade de “enxergar o própriobem” e os dos outros. Assim, o Terceiro Mundo viuganhar contornos projetos de conservação com estafilosofia redutora incapaz de entender os interesseslegítimos da diversidade humana e a desdenhar deoutras formas de conhecimento capazes de fazê-lo. Issotudo feito em um tom alarmista. Lançada a sorte paraos vários grupos humanos no Terceiro Mundo, sãopoucos os pontos de apoio e de atenção para acompreensão das demandas reais do tipo pobre doHemisfério Sul.

    Em uma inversão de humores, Ribeiro discorresobre a força que a noção de desenvolvimentosustentável apresenta em um campo que acomoda,desde o senso comum até os especialistas, e que é capazde reorganizar não somente as idéias sobre as relaçõessociais, políticas e econômicas, mas a própria realidadedesses fenômenos.

    Passa a ser uma noção a subsidiar conceitos comoos de justiça social, bem-estar, o destino humano, entretantas. A noção de desenvolvimento sustentável teria aforça reabilitadora para os projetos utópicos – após adecadência relativa dos grandes sistemas ideológicoscomo o marxismo e o industrialismo – pela visível“penetração nos sistemas de decisão contemporânea”(RIBEIRO, 2000, p. 26). Enquanto uma utopia, a noçãode desenvolvimento sustentável torna-se um sistemaideacional com “funções integrativo-simbólicas,orientadoras das interações dos agentes sociais entre si,nos contextos de reprodução da vida social” (RIBEIRO,

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    0132000, p. 28). A noção de desenvolvimento sustentável

    operaria com “manipulações do futuro no presente, tantopara fins interpretativos na busca de congruência em ummundo incongruente, quanto para efeitos pragmáticosde estabelecimento e legitimação de níveis diferenciadosde acesso a poder” (RIBEIRO, 2000, p. 29). Nessa mesmalinha de argumentação, Leis (1995) reforça ainterpretação de que “a ecologia, o ambientalismo e oethos ecológico expressam a necessidade de umaprofunda transformação da humanidade em direção auma maior solidariedade e cooperação entre culturas,nações, indivíduos e espécies”. O autor entende queestá colocado para a humanidade a busca de valoresconvergentes que ultrapassem os interesses particularese que tenham alcance global.

    Todas essas questões são filtradas no pensamentode Sen através de um novo tratamento dado à noção deprogresso; não redutível à renda disponível, mas se aspessoas “são capazes de conduzir suas vidas”: dadisponibilidade ou não de uma infraestruturahabilitadora da vida, de relações de trabalho e relaçõesfamiliares construtivas e não degradantes, da garantiade direitos políticos mediando às relações sociais epessoais, e, “sobretudo se requer saber se se permiteàs pessoas imaginar, maravilhar-se, sentir emoçõescomo o amor e a gratidão, que pressupõe [...] que oser humano é um ‘mistério insondável’ [...]. [É]necessária rica uma descrição rica e completa daquiloque as pessoas podem fazer e ser” (NUSSBAUM, e SEN,1996, p. 16). Sem que se reflita sobre esta esfera daexperiência e imaginação humanas, não será possível

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    avaliar com equilíbrio as questões outras relacionadasà sustentabilidade.

    As possibilidades teóricas e práticas, formuladasem todos os níveis discursivos – desde aqueles maisespontâneos e exteriores à esfera econômica atéaquelas mais afeitas às esferas de planejamentogovernamental e das empresas – com respeito àsustentabilidade são factíveis pelo uso da razão e combase em valores. Consensos são possíveis, porque asregras que sustentam a vida nas democracias não têma ver com o poder tirânico de indivíduos. De um pontode vista pragmático, o consenso é a demonstração doslimites individuais frente às complexas dinâmicas dasociabilidade e sua discursividade. Agora se tornapossível, racional e moralmente, o debate público e ainstauração de parâmetros de justiça social capazesde dar conta de fenômenos que requerem soluçõesessencialmente distributivas.

    A esfera do mercado não é um campo neutro einóspito para que não receba discussões éticas inclinadasa comprometimentos ambientais. Imperfeito, o mercadotem funcionado segundo uma conjugação de motivaçõesegoístas e evidentes recursos da ação cooperativa. Asinstituições e seus estatutos não podem ficar intocáveisdiante das novas exigências funcionais do sistema.Contudo, o mercado é uma possibilidade instrumentale não a solução última para as estratégias de regulaçãoda vida social com vistas à sustentabilidade. Sen, otempo inteiro dá ao mercado um caráter indeterminadoenquanto fator causal, porque é na esfera política e dasociabilidade o lugar da gestação de novos projetos

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    013baseados em valores sociais e um senso de

    responsabilidade abrangente. As liberdades políticasinfluenciam a compreensão e formatação de estratégiassustentáveis, e são imprescindíveis para a delimitaçãoe concepção de projetos econômicos e de sociabilidadesustentáveis.

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