Capítulo XXIVsara12d
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7/26/2019 Captulo XXIVsara12d
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Captulo XXIV
Tal como fazia regularmente, Baltasar fora visitar a Passarola. Devido a este
facto, Blimunda optou por ir ao seu encontro, percorrendo os caminhos que eram
geralmente utilizados por ele. J no final da vila de Mafra, resolveu esperar por
Baltasar, sentada num valado de onde podia ver as pessoas que se dirigiam para a vila
com o intuto de assistir s comemoraes relacionadas com a inaugurao do
Convento.
Alguns dos homens que por ali passavam aproveitavam-se do facto dela se
encontrar sozinha naquele local para se aproximarem, sendo que, para afastar um
deles, Blimunda, aproveitando o facto de estar em jejum, disse-lhe que tinha um sapo
no corao, que cuspia nele, em si, e em toda a sua gerao.
Quando finalmente anoiteceu, Blimunda resolveu voltar para casa, onde jantou
com os seus cunhados e sobrinho, na esperana de que Baltasar regressasse
entretanto. Nessa noite, Blimunda Sete-Luas no conseguiu dormir com a aflio que
sentia por o seu companheiro ainda no ter regressado.
Na manh seguinte, saiu de casa em busca de Sete-Sis, precisamente no dia da
chegada delrei a Mafra, acompanhado de toda a Casa Real.
Enquanto os cortejos e festejos ocorriam na vila, Blimunda ia perguntando
queles que encontrava pelo caminho se tinham visto um homem maneta, escuro e
grisalho, ficando desanimada com as sucessivas respostas negativas.
Depois de muito caminhar, j envolta na fadiga e no cansao, esforou-se por
acreditar que voltaria a ver Baltazar , comeando a gritar pelo seu nome, mas no
obtendo qualquer resposta.
Quando, por fim, chegou ao local onde estava a Passarola, apanhou uma
enorme desiluso, pois no encontrou nem a Passarola nem Baltasar, apenas o seu
alforge. Assim sendo, olhou para o cu, tentando avistar a mquina voadora, mas sem
sucesso. Desapontada, pegou no alforge e seguiu caminho, procurando Baltasar nas
proximidades do local, mas escolhendo apenas os pontos mais altos que lhe
oferecessem uma melhor viso das redondezas.
Por fim, optou por escalar o Monte Junto. Pelo caminho encontrou um fradedominicano, que lhe ofereceu um local prximo do seu convento para passar a noite,
insistindo repetidas vezes que a serra abrigava perigos durante a noite. Blimunda no
deu uma resposta em concreto sua proposta, resolvendo continuar a sua caminhada,
mas, antes de a recomear, aproveitou para comer uns restos de comida que Baltasar
deixara no alforge . Aps esta breve pausa, Sete-Luas sentiu-se bastante desamparada
e desfez-se em lgrimas. Ainda com a pouca coragem que lhe restava, conseguiu
descer uns cem passos em direco ao vale, mas todas as sombras e outros mais
perigos que imaginava fizeram-na gelar de medo, levando-a a voltar para trs, para o
local que lhe fora anteriormente aconselhado pelo frade.
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7/26/2019 Captulo XXIVsara12d
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Quando chegou ao convento, comeou a ouvir um murmrio entoado de
oraes, provenientes do seu interior. Ao lado deste, conseguiu descobrir as ruinas
que lhe tinham sido indicadas e preparou-se, ento, para passar a noite num recanto.
Durante a noite, Blimunda foi acordada pela presena inquietante do frade
dominicano. Assustada com toda aquela situao, pegou no espigo que se encontravano alforge, o qual acabaria por usar contra o frade, que tentou violla, matando-o.
Aterrorizada, fugiu o mais rapidamente possvel do local, sem que fosse vista
pelos restantes frades do convento, mas no sem antes se apropriar das sandlias do
religioso, visto que os seus sapatos se encontravam j bastante gastos.
Caminhou durante toda a noite, parando apenas, j na manh seguinte, numa
ribeira, na qual se defez das sandlias, no fosse algum associ-la ao crime cometido,
e retirando parte da sua saia que se encontrava manchada com sangue.
Uma nova fora ressurgiu em Blimunda, que ficou de repente confiante de que
poderia ter-se desencontrado de Baltasar, e de que ele, provavelmente, j estaria sua espera em Mafra.
Mergulhada nesta crena, Sete-Luas correu at Mafra, mas em pouco tempo
voltou a sentir-se sozinha e desesperada, pois no o encontrou como esperava. Assim,
fatigada pelo largo percurso que caminhara, adormeceu profundamente.
Mais tarde foi acordada pela sua cunhada, que regressara das comemoraes
feitas ao longo do dia, indo depois jantar.
Na manh seguinte, Blimunda esqueceu-se de comer o po, como fazia
habitualmente mal acordava. Deste modo, ao entrar na cozinha, acabou por ver o
interior dos seus cunhados, situao que a fez sentir bastante desconfortvel,
chegando mesmo a ter vmitos, que foram interpretados por Ins Antnia como
sintomas de uma gravidez.
Nesse dia procedeu-se beno das cruzes, dos quadros das capelas, e outros
objectos de culto, bem como do convento e respectivas instalaes.
No dia seguinte (22 de Outubro de 1930), ocorreu o evento que era por todos
esperado com grande ansiedade, a inaugurao do Convento de Mafra. Este tambm
o dia em que o rei cumpre 41 anos de idade.
Para assistir a toda a cerimnia, Blimunda e os seus cunhados saram de casa s
4 da manh, com o intuto de conseguirem um bom lugar no meio de setenta a oitenta
mil pessoas que l se encontravam. Porm, Blimunda no permaneceu at ao final das
festividades, voltando para casa, onde recolheu alguns mantimentos para a viagem
que pretendia fazer em busca de Baltasar.
Desta vez nada temeria.
Sara Silva, n 25. 12 D.