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Problemata: R. Intern. Fil. Vol. 04. No. 01. (2013), p. 79-109 ISSN 1516-9219. DOI: 10.7443/problemata.v4i1.12534 Hans Jonas: o problema do dualismo nihislista no pensamento filosófico-científico e a nova memória acerca da natureza em sua alteridade Márcio Adriano dos Santos Dias * Resumo: Busca-se, neste artigo, realizar uma análise de caráter crítico, apoiada na apresentação de alguns aspectos centrais do pensamento jonasiano, acerca do problema do dualismo niilista incorporado em parte do pensamento filosófico-científico. Tal dualismo tem incidido na formação da memória ocidental da natureza, tanto moderna como contemporânea, concorrendo para uma visão de separação entre homem e natureza, sobretudo de base epistêmica e ética, constituindo um problema. Procura-se uma superação do dualismo, tanto idealista-racionalista quanto materialista- naturalista e também existencial, por antever a base nihilista nessas formas de pensar a relação homem-natureza, tendo suas origens na gnose primitiva: alma x corpo; espírito x matéria; homem x natureza. A saída dessa dicotomia consiste numa consideração dos valores éticos teleologicamente mantidos na própria natureza humana e extra-humana, aqui vista pelo viés da dignidade de sua Alteridade, onde desde a pluralidade das formas mais primitivas de vida orgânica em procriação pré-figura o espiritual, culminando a responsividade humana pelo Outro para uma nova memória acerca da natureza. Palavras-chaves: Dualismo niilista, memória da natureza, valores, alteridade, responsabilidade. Abstract: This article has the aim at making a critical analysis, supported by some central aspects of Jonasian thought about the nihilist dualism problem, partially incorporated from the philosophical-scientific thought. Such dualism has influenced the formation of western memory of nature, both modern and contemporary, contributing to a Hans Jonas: the nihilist dualism problem in the philosophical-scientific thought and the new memory on nature in its ethical otherness Doutor em Filosofia pela UFPE/UFPB/UFRN. Professor efetivo da Universidade Estadual da Paraíba - UEPB, Campus V, João Pessoa-PB. em@il: [email protected]. Colaboradora: Priscila Limeira Malheiros, aluna do Curso de Arquivologia da UEPB, Campus V. recebido: 09/2012 aprovado: 02/2013

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Hans Jonas: o problema do dualismo nihislista no pensamentofilosófico-científico e a nova memória acerca da natureza em sua

alteridade

Márcio Adriano dos Santos Dias *

Resumo: Busca­se, neste artigo, realizar uma análise decaráter crítico, apoiada na apresentação de alguns aspectoscentrais do pensamento jonasiano, acerca do problema dodualismo niilista incorporado em parte do pensamentofilosófico­científico. Tal dualismo tem incidido na formação damemória ocidental da natureza, tanto moderna comocontemporânea, concorrendo para uma visão de separaçãoentre homem e natureza, sobretudo de base epistêmica e ética,constituindo um problema. Procura­se uma superação dodualismo, tanto idealista­racionalista quanto materialista­naturalista e também existencial, por antever a base nihilistanessas formas de pensar a relação homem­natureza, tendosuas origens na gnose primitiva: alma x corpo; espírito xmatéria; homem x natureza. A saída dessa dicotomia consistenuma consideração dos valores éticos teleologicamentemantidos na própria natureza humana e extra­humana, aquivista pelo viés da dignidade de sua Alteridade, onde desde apluralidade das formas mais primitivas de vida orgânica emprocriação já pré­figura o espiritual, culminando aí aresponsividade humana pelo Outro para uma nova memóriaacerca da natureza.Palavras­chaves: Dualismo niilista, memória da natureza,valores, alteridade, responsabilidade.

Abstract: This article has the aim at making a criticalanalysis, supported by some central aspects of Jonasianthought about the nihilist dualism problem, partiallyincorporated from the philosophical­scientific thought. Suchdualism has influenced the formation of western memory ofnature, both modern and contemporary, contributing to a

Hans Jonas: the nihilist dualism problem in the philosophical­scientific thought and the newmemory on nature in its ethical otherness

Doutor em Filosofia pela UFPE/UFPB/UFRN. Professor efetivo da UniversidadeEstadual da Paraíba ­ UEPB, Campus V, João Pessoa­PB. em@il:[email protected]. Colaboradora: Priscila Limeira Malheiros, aluna doCurso de Arquivologia da UEPB, Campus V.

recebido: 09/2012aprovado: 02/2013

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dissociating view between man and nature, mainly onepistemic and ethical bases, generating a problem. It seeks toovercome the dualism, both idealist­rationalist andmaterialistic­naturalistic and also existential, due to theanticipation of a nihilist basis of these forms of thinking onman­nature relation, having its origins in primitive gnosis:soul x body, spirit x matter; man x nature. The output of thisdichotomy consists of a consideration of the ethical valuesteleologically held in human and extra­human very nature,here seen in the perspective of the dignity of his Otherness, inwhich from the plurality of the most primitive forms of organiclife in procreation already pre­figures the spiritual,culminating in the human responsivity for the Other in favor ofa new memory about nature.Key­words: Nihilist dualism, memory of nature, values,otherness, responsibility.

Introdução

Uma das maiores barreiras enfrentadas com vistas a umapassagem paradigmática da memória moderna para umamemória atual acerca da natureza e dos próprios homens nelainseridos, se dá com o problema psicofísico e seu dualismo, ouseja, de sua interação (do psiquismo) compatível ou não com acausalidade natural. É dominante na memória filosóficamoderna, e do padrão de mundo ocidental, o naturalismomecanicista que se assomará na ciência moderna. O dualismocartesiano é significativo para representar um movimento depositivação gradativa das ciências que se estende namodernidade até um coroamento na teoria da mecânica celestede Isaac Newton. Supomos que aí jaz um dualismo configuradona clássica relação entre espírito ­ entendido como essência dohumano separado do mundo natural – e matéria, esta desde jáentendida como natureza em seu sentido de coisa extensaaplicável a tudo o que se movimenta enquanto fenômeno ao‘alcance do olhar e das mãos’, em suma, uma redução ao âmbitodo senciente. Dois pólos se encontram então contrapostos e

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desdobrando contradições irreconciliáveis: espírito x matéria;humano x natural; alma x corpo. Uma dicotomia na realidadedifícil de ser ultrapassada, mas necessário de ser superada, comvistas a outras visões, que integrem verdadeiramente os sereshumanos na natureza de um modo complementar­orgânico edessa maneira não repousando na contraposição mecânicaacerca do dinâmico fenômeno da vida.

O intento de Hans Jonas (1903­1993) é de superar oparadigma moderno neste tocante, cujo núcleo é a interaçãopsicofísica, no fito de resguardar o poder da subjetividade nãode um modo antropocêntrico, mas podemos dizer, biocêntrico:subjetividade que se estende na natureza sob o modo de umpsiquismo latente e/ou manifesto em cada ente, daí ocorrendotambém no homem como coroamento de uma responsabilidademaior. Tal subjetividade colocada sob novo olhar na natureza sedestina a uma fundamentação da ética da responsabilidade (Cf.JONAS, 2004 a, p.115). Logo, é de suma importância essadiscussão filosófica, uma vez que aqui se engendra um novoparadigma de memória da natureza, na contemporaneidade, quefaz convergir a subjetividade responsável pela natureza para asfuturas gerações, endereçada a uma nova visão de ciência danatureza, lastreada também pela teoria quântica, que supera amecânica celeste para fornecer­nos outro olhar/fazer aoshumanos, tendo em vista a sobrevivência das futuras geraçõesde humanos e extra­humanos.

Dentro do contexto da obra mais conhecida de HansJonas, qual seja, “O princípio responsabilidade” (1979), aquestão do poder da subjetividade se situaria entre o terceiro e oquarto capítulos; ou seja, onde se coloca a discussão em tornodos fins e sua posição no ser, que segue a relação desses com ateoria da responsabilidade (Cf. JONAS, 2004 a, p.18).Procuraremos dispor aqui da apresentação de alguns aportesprévios para uma leitura da tese de Jonas, segundo a qual eleprocura demonstrar que existe uma interação psicofísica e que

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esta se encontra compatível com a causalidade natural. O êxitomaior para sustentar tal tese tem como base um pensamentopessoal que se torna capaz de superar o dualismo próprio departe da filosofia e ciência ocidental e com isto, grande partedas ciências naturais que tomam maior impulso na modernidadee sua positivação. Jonas faz frente ao pensamento dodeterminismo fisicalista, bem como ao idealismo, para defenderuma nova proposta ética, com novas dimensões para o agir dasubjetividade e a proposta de uma nova memória acerca danatureza.

Com efeito, reter conhecimentos passados em nossacultura constitui o que chamamos de memória, sendo a filosofiaum domínio fértil desta possibilidade humana, sendo aquidestacado o âmbito da memória acerca da natureza, a fim de queos conhecimentos do passado tenham formações novas.

Assim, por memória acerca da natureza, queremos nosater em contextualizar primeiramente a ideia de naturezacultivada pela tradição filosófica, e que comporta diversasconceituações, tendo Abbagnano (1998 a, pp. 698 ­ 701) sereferido a quatro formas distintas: 1 ­ Natureza é o princípio devida e de movimento da totalidade dos fenômenos existentes. 2– Natureza é a ordem e necessidade. 3 – “Natureza é amanifestação do espírito, ou um espírito diminuído ouimperfeito, que se tornou “exterior”, ou “acidental”, ou“mecânico”, ou seja, foi degradado de seus verdadeiroscaracteres.” 4 – Natureza entendida de uma maneirapreviamente implícita, vinculada ao fazer científico em termosde pesquisa e metodologia desta na contemporaneidade.

Pensamos que Jonas busca principalmente uma superaçãoda terceira concepção fundamental elencada por Abbagnano noâmbito da memória cultivada pela filosofia e ciência noocidente. Jonas encontra um problema patente em muitosmovimentos filosóficos europeus, que pôde ser determinado porele como “princípio gnóstico”1 (2000 b, pp. 61­62), consistindo

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numa maneira naturalizada de dualismo e niilismo, cujosregistros encontram­se cultivados na memória ocidentalconcernente à natureza. Também em Collingwood o problemadetectado por Jonas aparece sob a roupagem da “visãorenascentista de natureza” (1986, pp. 103 ­ 125), masacentuando apenas o dualismo encontrado neste registro damemória ocidental.

O nosso intuito é explorar criticamente essa terceiraconcepção de natureza, retida desde o passado até o presente denossa memória ocidental, através de uma exposição de pontosde partida do empreendimento jonasiano. Inicia­se com seusestudos sobre a filosofia e ciência ocidental e as ligaçõessubjacentes com a gnose primitiva, passando depois pela suavisão de superação do dualismo e do niilismo, apontando parauma filosofia da biologia, para então situar o humano nanatureza como maior agente a que se deve a responsividade2 aoOutro: humanos e suas futuras gerações e extra­humanos naescala da vida/natureza entendida em sua Alteridade. O percursodeste empreendimento culmina na insinuação de uma novaconceituação de memória acerca da natureza enquanto Outro ouainda Alteridade: Humana e extra­humana. Isto permite­nosentrever uma aproximação do pensamento jonasiano com opensamento de filósofos judeus do diálogo, em que o Outro (aAlteridade) assume primazia para o dever ético do eu, como emFranz Rosenzweig, e destacadamente em Emmanuel Levinas3

entre outros.

1. Uma vida e um projeto: o problema do dualismo niilista

Através de um longo caminho percorrido em sua vida seconsumou a obra de Hans Jonas intitulada “O princípio

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responsabilidade”. O início desta jornada se deu com um estudodoutoral de uma tese sobre o gnosticismo, em 1934.Aparentemente nada faz ligar seus primeiros estudos com a suafase de esforço crescente para elaborar uma nova ontologia, aomodo de uma Filosofia da Natureza clássica, para enfim secristalizar na proposta de uma ética para a civilizaçãotecnológica. O seu estudo histórico, teológico e filosófico dagnose no ocidente o fez indagar mais tarde sobre questõesperenes da filosofia: sobre a natureza do ser e também sobre oser da natureza. Um problema era candente: a dimensão danatureza jamais havia comparecido na dimensão do ser. Ou seja,o espírito se encontrava nitidamente separado do corpo, e comisto, a filosofia de sua época, que questionava as bases maisradicais da realidade em seu tempo, tanto a ontologia existencialde Heidegger como a Fenomenologia cunhada por Husserl,tomavam como obviedade a reflexão sobre o fenômeno da vida.Tal indagação surge em Jonas diante do fato existencial daguerra, entre 1940 e 1945, quando foi soldado da armadabritânica numa brigada judaica, experimentando a proximidadecom a morte, que o fará resistir em separar isso da dimensãoespiritual:

Talvez estar fisicamente exposto, com o que o destino docorpo se impõe com força, sua mutilação se converte no temorfundamental, contribuiu à nova reflexão. Em todo caso, aparcialidade idealista da tradição filosófica se fezcompletamente evidente. Seu secreto dualismo, um legadomilenar, me pareceu contradito ao organismo, cujas formas deser compartilhamos com todos os seres vivos (JONAS, 2001,p. 145).

Foi nesta situação­limite que Jonas especuloufilosoficamente sobre o orgânico, cuja obra fundamental destemomento é a coletânea de estudos realizados desde 1950 “Oprincípio vida. Fundamentos para uma filosofia da biologia.”(1972), daí se concretizando ainda posteriormente em um

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programa ético. Como se pode depreender, a obra de HansJonas condensa uma unidade, sendo presidida pela tentativaconstante de superar esse secreto dualismo que anima opensamento ocidental.

O estudo da gnose realizado por Jonas se dá com omanuseio do método fenomenológico, que consiste basicamentena descrição e análise daquilo (o objeto) que se nos mostraimediatamente nos fenômenos. Neste tocante diz ele:

Quando há muitos anos, me interessei pela primeira vez peloestudo do gnosticismo, descobri que os pontos de vista, a óticapor assim dizer, que havia adquirido na escola de Heidegger,me permitia ver aspectos do pensamento gnóstico que haviampassado antes despercebido (2000 b, p. 337).

Assim, o problema do dualismo da gnose está velado noestudo filosófico de um dos mestres de Jonas, MartinHeidegger, ao empregar o método fenomenológico em suaanálise do ser­aí (Da­sein; o humano) e suas determinações, osexistenciários. A tensão básica se dá entre o inautêntico e oestado autêntico do ser­aí, entre existência e mundo, iluminaçãoe queda no mundo.O ser do ser­aí consiste em seu cuidado desi; o cuidado é a determinação essencial da existência humana.Trata­se do cuidado do próprio ser em um mundo que lhe épropriamente estranho na medida em que o habita, pois se vêimpelido a habitá­lo, posto que encontra­se lançado(Geworfenheit) à existência, nessa realidade insondável quedesperta­lhe angústia e medo, um verdadeiro sentimento devertigem e aversão, estranheza (Unheimlichkeit) que lhe tira ochão, as bases; um remeter a uma queda (Verfallen), in­sistindoem remeter­se o ser­aí (Da­sein) por fim no nadaindeterminado. Vejamos algumas passagens (estão no originalem itálico):

A a­versão da decadência não é uma fuga fundada no receio de

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um ente intramundano. Tal forma de fuga constitui tantomenos esta a­versão, quanto nesta, o Da­sein se voltaprecisamente para o ente intramundano e nele se absorve. A a­versão constitutiva da queda funda­se, pelo contrário, naangústia que, por seu lado, torna possível o medo (...) O queangustia a agústia é completamente indeterminado (...) o queangustia a angústia é o mundo enquanto tal (...) aquilo peranteo qual a angústia se angustia, é o próprio ser­no­mundo (...) Aangústia isola e revela o Da­sein como solus ipse (...) O Da­sein está isolado em si mesmo, mas enquanto ser­no­mundo. Oser em... estabelece­se no “modo” Existencial de não estar emsua casa. Não se visa outra coisa, quando se fala de estranheza(...) O ser­no­mundo segundo a tranquilidade e a familiaridadeé um modo de desenraizamento do Da­sein e não o inverso. Éa estranheza que, no plano Existencial e ontológico, deve serentendida como fenômeno mais original (HEIDEGGER, 2000c, pp. 206­210).

Com efeito, a leitura existencialista da gnose que Jonasfaz, se inspira nos aspectos gnósticos do pensamento existencialde Heidegger em sua primeira fase – em Ser e Tempo. Nestesentido, Jonas descobre a articulação originária do ser­aí (Da­sein), lançado (Geworfenheit) a existir em um mundo que lhe éestranho e que, no entanto, o habita e mesmo está em queda eaprisionamento, que o próprio Heidegger descreve­o4 como esse“‘fato de ser’, caráter ontológico do ser­aí (Da­sein), velado emsua proveniência e destino, mas tanto mais aberto a si mesmoquando mais encoberto, chamamos ‘estar­lançado’ (...)enquanto ser no mundo (...)” (HEIDEGGER, 2000 c, p.152).Aliás, diz Jonas que o termo estar­lançado (Geworfenheit):

(...) até onde posso ver, é originalmente gnóstico. “Estarlançado” não é uma mera descrição do passado, senão umatributo que qualifica a situação existencial dada e que vemdeterminada por esse passado. Assim, a experiência gnósticaexpressava esta situação. Na literatura mandeia esta é umafrase comum: a vida tem sido lançada ao mundo, a luz àobscuridade, a alma ao corpo. Esta frase expressa a violênciaoriginal que se me tem feito ao obrigar­me a estar onde estou ea ser o que sou, a passividade de minha forçada aparição emum mundo que não é feito por mim e cuja lei não é minha. Não

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obstante, a imagem de “lançar” assigna também um caráterdinâmico ao todo da existência assim iniciado. Em nossafórmula, esta existência começa com a imagem de umaaceleração até um final. Lançada ao mundo, a vida é umaespécie de trajetória que se projeta a si mesma até o futuro(2000 b, p. 351).

Safranski também mencionou sobre Heidegger, do eco“(...) em seu pensamento sobre o nada, a metafísica cristã­gnóstica, que para ele é com toda naturalidade uma tradiçãoviva” (1999, p. 133). Já Pasquá interpreta também a “queda”(Verfallen) e o “estar­lançado” de Heidegger como umaexpulsão do Ser de si próprio, “uma existência catastrófica, seassim se pode dizer, e que seria o Mal à maneira dos gnósticos”(1997a, p. 93). Um resumo do gnosticismo no que se refere ao“estar­lançado”, é mencionado por Jonas (o itálico é nosso):

Uma célebre fórmula valentiniana resume da seguinte maneirao objeto da gnose: “O que nos liberta é o conhecimento do queéramos e do que viemos a ser; de onde estávamos e do aondefomos jogados; para onde corremos, de que fomos remidos; oque é nascimento e o que é renascimento” (2004, p. 248)

Por inusitado que pareça, este arquétipo germinou namemória ocidental referente à natureza, pelo gnosticismo,supondo o surgimento de uma visão de mundo totalmente nova.Trata­se de uma visão de cosmos (natureza) radicalmenteclivada, quando comparada à visão de mundo dos gregosantigos, excetuando o orfismo. Dos pré­socráticos até osestoicos tínhamos uma visão de cosmos (natureza): harmonia eordenação do universo. Uma ordem perfeita e divina na qual osentes, e com eles os humanos, formavam uma conjunturaintegral – um todo harmônico: Kálos­ágathon (Belo e Bom). Ocontrário se dá na visão gnóstica acerca do mundo (cosmos;natureza). Este é obscuro e hostil ao homem; não é divino,como nas visões antigas panteístas e panenteístas, mas é por

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assim dizer demoníaco, posto que é decaído de uma primeiraordem divina. Tudo passa a ser digno de desconfiança e se tornaincompreensível no mundo; somente há lugar para o medonesse estranho mundo que o homem habita. O homem é umapátrida no mundo, foi aí lançado, herdando uma decadência(queda) originária num lugar satanizado:

Antes de ir mais adiante, detenhamo­nos em pensar no queaqui se sucedeu com a velha ideia do cosmos entendido comototalidade ordenada de forma divina. Sem dúvida, nadaremotamente comparável à ciência física moderna teve que vernesta perda de valor catastrófica ou neste desnudamentoespiritual do universo. Não necessitamos mais que observarcomo este universo sofreu uma profunda demonização noperíodo gnóstico (JONAS, 2000 b, 347).

Assim, perguntando pelo registro de certa memória daNatureza e de sua Alteridade, ele se converte em mundodecaído, todo o universo e sua incompreensibilidade. Sendopois, na passagem de um otimismo cósmico para umpessimismo gnóstico que encontra­se o surgimento do dualismoradical, localizado também na base de conhecimento que seestende até a ciência moderna, além de permear as recentesdoutrinas filosóficas niilistas existenciais, em nossa civilizaçãoocidental. Tal dualismo não tinha lugar na concepçãopanenteísta (en kai pan) ou monista, cuja totalidade se fecha ese abre no divino. Além da elaboração de dois mundos do pontode vista cosmológico, o reino da luz em contraposição ao reinodas sombras, há ainda um dualismo antropológico, ou seja: ohomem experimenta em si uma cisão ferrenha, na qual deveconviver o corpo (soma) e a alma (psyché), de um lado, como oque pertence a este mundo de sombras, em contraposição aoespírito (pneuma), de outro lado, como aquilo no homem quedeve ser do outro mundo, de um reino de luz. O ser­aí (Da­sein:o humano) experimenta um giro até sua base mais íntima, paraenfim desprezar o mundano, o decadente, e se apegar à sua

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contraparte autêntica, o que lhe é mais própria – o espírito(pneuma), sob o modo de iluminação (Erschlossenheit). Esterasgo de dualismo já se encontrara em Platão e alguns estoicos;ao se fazer menção a uma divisão entre mundo das Ideias e estemundo, com o problema da participação (methexis) deste comocópia imperfeita do mundo das puras Formas (eidos) perfeitas,eternas e imutáveis. Contudo, se dá com o advento dognosticismo e investindo no cristianismo um desaparecimentodefinitivo do kosmos divino (kálos­ághaton), embora que tenharesistido uma corrente posterior do cristianismo segundo a quala natureza completa é divina criação, e como tal devendo serrespeitada, cuidada, preservada (Francisco de Assis), mas nãotendo repercutido filosoficamente. Portanto, o advento da visãomecanicista de universo somente reiterou e potencializou essaclivagem abissal entre homem e natureza (cosmo, universo,mundo), na memória ocidental de Natureza.

Como se vê, a descoberta de Jonas nos remete ao fato dediferenças ocorridas com a ideia de cosmos e com isto asmudanças de registro acerca da memória da natureza. Nestesentido, o existencialismo pode ser entendido como uma gnoseencoberta, de tal modo que por uma leitura existencialista dagnose se pode passar para uma leitura gnóstica doexistencialismo, e com este, do espírito moderno (Cf. JONAS,2004 b, p. 233 ss.). Isto sugere a estratégia de um girocopernicano realizado por Jonas, até alcançar os inícios damodernidade, identificando no pensamento de Blaise Pascal,René Descartes e mais tarde Friedrich Nietzsche a presença do“princípio gnóstico” aplicado ao cosmos, e por extensão ànatureza (Cf. JONAS, 2004 b. pp. 233­252).

Em essência, o universo se descreve como um imensovazio, caracterizado pela infinitude, a indiferença e o silêncio;trata­se de um universo alheio às vicissitudes dos humanos, queforma um todo inapreensível, em uma palavra, um universo emque se sustenta um niilismo cósmico. Como certa vez Pascal se

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expressara: “Tragado pela amplidão infinita dos espaços, que eunada sei e que nada sabe de mim, eu estremeço” (apud JONAS,2004 b, p.235); ou ainda Nietzsche, que considera o niilismo “omais inquietante de todos os hóspedes”, pois o ser humano seencontra sozinho consigo mesmo: “O mundo – uma porta. A milmudos e frios desertos! Quem perdeu. O que perdeste, não páraem lugar algum. Ai daquele que não tem pátria!” (apud JONAS,2004 b, p. 237). Para este último pensador, o sentido do niilismoconsiste em “que os supremos valores se desvalorizem” (apudJONAS, 2004 b, p. 244). De fato, o que se observa namodernidade é que o mundo, a Natureza, o universo deixam deser objeto de estudo, pois perdem valor para a filosofia. Taldesvalorização se verifica também com a radicalização dodualismo que ocorreu no pensamento cartesiano, com relação àrés extensa e rés cogitans, o corpo separado mecanicamente daalma. A separação cartesiana inaugura na modernidade oniilismo cósmico, desenvolvendo­se daí o idealismo, bem comoparte da fenomenologia e do existencialismo. Assim como nagnose, o humano se sente separado de um possível além etambém deste mundo. Se trata então de um marco metafísicoque subsiste no transfundo do existencialismo e do niilismomodernos, por mais anti­metafísicos que se suponham, legadopelo gnosticismo no pensamento ocidental.

Mas é preciso ressalvar uma distância entre a concepçãode homem gnóstico e o homem moderno. Ao passo que aqueleacreditava estar lançado numa natureza antidivina, já este crêlidar com uma natureza indiferente. Neste último sentido dehomem em relação com a natureza, a existência desta assumeuma direção rumo ao “vácuo absoluto, o abismoverdadeiramente sem fundo” (JONAS, 2004 b, p.251).

O isolamento do ser humano com relação ao mundonatural que o rodeia bem como de todo o universo é decorrênciado dualismo filosófico projetado em última instância ao nadaabsoluto. Contudo, há ainda mais um aporte arquetípico na

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os, que euJONAS,iilismo “oumano serta. A mil, não páraJONAS,o niilismom” (apudserva naeixam desofia. Talzação dorelação àmente danidade oem comocomo nal além eetafísiconiilismo

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memória importante: as ciências da natureza terminam pormonopolizar a nossa aproximação com a natureza, incutindouma ideia de universo infinito, que demanda suas próprias leissem uma finalidade que seja reconhecível para o humano; umuniverso sem hierarquias nem valores, bem como semmotivações. Aqui a natureza em nada se preocupa, pois é o“verdadeiro abismo” representado pela memória do homem, eeste “não tendo diante de si, em sua finitude, outra coisa a nãoser a morte (...)” (JONAS, 2004 b, p. 252).

O mecanicismo e o determinismo dominam a pesquisacientífica, a fim de haver uma manipulação da coisaquantificada e estranha: a matéria. O corpo (soma; “matéria”) étumba (sémata), ou seja, coisa destituída de valor: sem Vida.Essa compreensão mecanicista da Natureza tem gerado umaimagem de absoluta indiferença e um abismo incontornávelentre o humano e a própria Natureza, entre consciência viva ematéria morta: Natureza fechada em seu mutismo. O paradoxomoderno é ainda pior que o antigo, da gnose, pois neste ohomem se cria de um outro mundo, mas o moderno se crê serdeste mundo, mas não se explica nele mesmo, pois escapole dasrelações causais e leis naturais que o esclareceriam. Com efeito,o “discurso do ser­lançado ao mundo é um resquício de umametafísica dualista” (JONAS, 2004 b, p. 252), mas sem alguémque lance e sem um ponto de onde seja lançado, apenas vigoraum caniço solitário lançado ao Nada no lugar da Natureza.

É preciso ressignificar a cosmovisão antiga e medieval deum cosmos (ou ordem) íntegro em si, perfeito, ordenado edivino. Em ressignificando, substituir a ideia de um universoinfinito, que desperta o estranhamento abissal e o horror dovazio, do Nada. Se faz necessário superar esse dualismo radicalentre corpo e alma, Natureza e homem, mundo e interioridade,instaurados pela filosofia e ciência modernas. É preciso assimuma revisão ressignificativa do paradigma mecanicista­causaldas ciências naturais, bem como a recuperação de um espaço

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para a Filosofia da Natureza. Além do mais, é preciso elaboraruma ética que se encontre à altura dos problemas que acivilização tecnológica coloca com sua proposta tão particularde progresso. Este, baseado numa exploração desenfreada daNatureza se anuncia como uma catástrofe irresponsável no tratocom o mundo. Por tudo isso O princípio responsabilidade, deJonas, faz­se necessário para um exercício de reflexão da ação eda prática de uma civilização tecnológica e tecnificada, paracontribuir com uma nova forma de memória da Natureza.

Na realidade, acompanhando o conteúdo crítico dopensamento jonasiano com relação ao princípio gnóstico quepermeia parte da memória concernente à Natureza nopensamento ocidental, se vê que a indiferença para com aNatureza neste dualismo e niilismo radicais, semeou e deufrutos que se encontram no poder de potencialização da técnicamoderna, a tecnociência, e no entanto, concorrendo para umaperda de sentido da humanidade junto à natureza. Há aqui umpotencial destrutivo contido e manifesto no niilismotecnológico, que tende a destruir a realidade à qual o própriohomem pertence, mas como vimos acima lhe soa comoestranheza. No cotejo desse esboço específico da memória daNatureza, vemos que em “O princípio vida” Jonas critica o idealde progresso desmesurado ao qual a sociedade moderna seentrega, baseado na exploração sem limites da Natureza, eincentivando o avanço contínuo desmedido com o novo poderda tecnociência. Isto envolve uma responsabilidade individual ecoletiva que a humanidade não pode se eximir para com aAlteridade humana e extra­humana, no cultivo de uma novamemória valorativa da Natureza. Portanto, ressignificar amemória do conhecimento do passado não consiste em voltar àmera recordação da visão pré­gnóstica da Natureza, maspropiciar uma formação nova da relação Natureza­homem,reconfigurando no presente os elementos necessários àsuperação do princípio gnóstico, ainda contido na memória

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presente relativa à Natureza e por fim liberando esta da reduçãoa um Nada absoluto perante o ser humano, em sua memóriamoderna. Acreditamos que uma leitura acerca do ser humano eda natureza enquanto totalmente Outro – Alteridade, poderáfornecer­nos um outro ângulo de inteligibilidade desseproblema até aqui exposto.

2. Da responsabilidade à responsividade: AAlteridade em jogo

Com o pensamento ético jonasiano, estamos diante deuma nova significação da noção de responsabilidade. Estatratava­se, até o tempo de Jonas, como uma medida de ação eprática voltada apenas ao aqui e agora (hic et nunc), posicionadade um modo abstrato para o agir humano e tendo como objetoda ação ou prática um semelhante ­ indivíduo, mas desde umaordem imutável e eterna, uma vez definida a ordem do bemabstrato a ser aplicado imediatamente: à sociedade humana, apolis. A partir do questionamento jonasiano, a responsabilidadeadquire novos contornos, pois trata­se mais de algo (dever) queprocure responder ao Outro que ainda não é (futuras gerações)tanto na humanidade como na natureza extra­humana, porextensão.

Sabe­se que Jonas não se referiu expressamente àhumanidade futura e a natureza extra­humana enquanto Outroque se anuncia desde si (kath'autó) e assim exprime­se. Um talexprimir­se desde si indica a Alteridade radical do mundo queenvolve a humanidade e natureza. Mas, aonde estaria ahumanidade futura a exprimir­se? Respondemos com aexpressão da humanidade presente em sua diversidade e seudevir dinâmico de pro­criação da pluralidade de entes. Todanatureza extra­humana futura segue ímpeto análogo ao da

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humanidade plural. O futuro, de certo modo, radica na condiçãopresente e já aí exprime­se. Daí o que denomino aqui deresponsividade ­ que além de aludir a Natureza na pólis e a pólisna Natureza, bem como tendo uma perspectiva que responda aum futuro tanto próximo como distante da humanidade e daNatureza como um todo: as futuras gerações (sendo este termoum núcleo metafísico inclusivo da Natureza na propostajonasiana), enfatiza sobretudo a Alteridade radical a exprimir­sekath’autó. Trata­se assim de uma nova ética; voltada para umacivilização tecnológica desde a dimensão da Alteridade. Oprincípio responsabilidade traz consigo esta possibilidade demetamorfose da responsabilidade como responsividade daindividualidade e coletividade humanas ante a Natureza e suasfuturas gerações: aponta para o futuro, e não apenas para oimediato presente, na condição radical de Alteridade a serrespeitados em sua dignidade própria. Não estaríamos dando umpasso em direção a uma ética da alteridade, implícita talvez nopensamento ético jonasiano?

Trata­se de enfatizar a racionalidade de um pluralismo deorigem em toda natureza, esta que desde sempre se autoproduzenquanto alteridades em sua diversidade aberta à vida. Ao invésdo nada da morte como termo do ser­aí na natureza expresso noprincípio gnóstico, abre­se a vida em sua pluralidade de origemno ser. Tal pluralidade traz em sua base a Alteridade, que podeinvestir o agente moral a responder, e assim ser responsivo, peladignidade e valor humano e extra­humano: responsividade.Com efeito, ao movimento em direção ao nada da morte, sereconduz o ente humano em direção ao amor à vida, conferindoum novo sentido à existência e com isto à moral. O amor à vidanão é apenas o amor­de­si a si, mas o amor o valor da vida doOutro – Natureza e Humanidade:

Forte como a morte é o amor. Forte como a morte? Contraquem mostra a morte sua força? Contra aquele de quem se

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condiçãoaqui des e a pólisesponda aade e daste termopropostaprimir­separa umaidade. Olidade deidade daza e suasas para ode a serdando umtalvez no

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apodera. E o amor, sem dúvida se apodera dos dois: do amantee da amada (...) Thánatos se lhe pode aproximar sob o docenome de Eros (...) A mulher, uma vez que tenha sido tocadapor Eros, está preparada para o último encontro, enquanto queo homem somente está quando cumpre os cem anos de Fausto.A mulher é então forte como a morte (ROSENZWEIG, 1997 b,p. 201).

Na memória que cultivamos, a mulher significa omomento mais sublime da procriação na humanidade – amaternidade. Para além da morte e do nada, estamos diante davida em seu fazer brotar (phýsis). Com efeito, para além deThánatos é bom lembrar que há também Eros, e com este hápossibilidade de vida além da morte, do nada. Taispossibilidades encontram­se na Natureza! O Outro da naturezatambém são o feminino e o masculino: a progenitura. Esta éDesejo do Outro em consumação. Aqui se marca uma passagemdo Ego ao Alter que é própria em toda natureza – salientada aquino humano, mas também no extra­humano. E Eros é Desejo nabase da vida ­ que jorra para além de Thánatos ­ e colima oOutro. Portanto, a natureza é no seu ser­Outro, pluralidade deorigem na vida, com relação à cessação que se dá na morte, épró­criação e não apenas um nada absoluto.

Essa base de pensamento em direção à Alteridade,encontra­se já presente nas filosofias de Franz Rosenzweig,Martin Buber e Emmanuel Levinas. Acreditamos que opensamento de Jonas tem afinidades arquetípicas com estemodo de pensar, de base dialógica e sempre estar aberto aoacolhimento do Outro, constituindo­se do fato de ser (outro) àpassagem de um dever remetido à Alteridade enquanto ummandamento de ordem moral:

(...) regressemos uma vez mais ao arquétipo de todaresponsabilidade: a dos pais pelo filho (...) é preciso umparadigma ôntico em que o “é” pura e simplesmente fáticocoincida com um “deves”, de tal modo que não permita para sio conceito de um mero “é” (...) Ante o convite de mostrar um

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único caso (,,,) em que essa coincidência tenha lugar, podeassinalar­se o caso que nos é mais familiar, o do recémnascido, cujo mero respirar dirige um irreplicável “deves” aomundo que o rodeia: que o acolha em seu seio (...) E prossegue(...) uma vida que começa e que impõe a causalidade que lhetem originado, e que acaba de começar, uma obrigação paracom essa continuidade precisamente, que é o conteúdo daresponsabilidade (...) (JONAS, 2004 a, pp. 215­217) .

Em Jonas, o conteúdo da responsabilidade é o Outro – aAlteridade5. O “é” do Outro transforma­se em “deves”. Arecepção, o acolhimento da passividade mais passiva que todapassividade do Outro é um mandamento irreplicável. Avulnerabilidade marca a condição da Alteridade, que ao mesmotempo se impõe enquanto “dever” expresso em um mandamentomaior, de uma certa tradição implicada na memória ocidental:“não matarás”. Façamos então aqui um recorte pressupondosempre a Alteridade na démarche realizada por Jonas.Primeiramente num acordo ético com as condições que osavanços da ciência moderna passam a dotar os seres humanos,ou seja, de um poder de transformação, e porque não dizertambém de destruição da Natureza – do meio ambiente – quejamais se viu historicamente. Esse novo poder, tecno­científico,se converte em exercício de reflexão da ética e da filosofiapolítica, enfim da filosofia prática, não prescindindo da éticatradicional, mas assomando e formando um novo amálgama: ofuturo racionalmente pensado porque responsivamenteapreciado no âmbito temporal em que vivemos. A Natureza é olugar maior da Alteridade, no qual se dá essa reflexão temporal,porque nela se enraíza a polis em sua pluralidade de origem, e aíos humanos que se destacam entre os outros seres na Naturezapelo seu grau de liberdade responsiva, ou seja, respondereticamente aos Outros humanos e extra­humanos.

Se no modelo ético tradicional temos a responsabilidadevoltada imediata e exclusivamente para o humano comosemelhante e objeto da ação e da prática, Jonas alarga o campo

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gar, podedo recémdeves” aoprosseguee que lheação parateúdo da

Outro – aeves”. Aque todaicável. Ao mesmondamentoocidental:ssupondor Jonas.s que oshumanos,não dizernte – quecientífico,filosofiada éticaálgama: osivamentetureza é otemporal,igem, e aíNaturezaresponder

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da responsabilidade com a introdução de uma responsividadepelo objeto que ainda não é, mas tem o direito de serbeneficiário futuro das ações e práticas realizadas no presente,bem como toda a Natureza, que passa a ser objeto deresponsabilidade enquanto responsividade, ou seja, o totalmenteOutro. São assim dois elementos que se somam àresponsabilidade tradicional que lha modificamsubstancialmente para um sentido mais largo: de responsividadeao Outro humano presente e o ainda não existente e à Naturezaextra­humana como um todo: a Alteridade da Natureza. Aquiocorre também um alargamento da noção de subjetividade, quepassa a se aplicar em sua potência à toda Natureza, incluindohumanos e extra­humanos, como veremos mais à frente.

A noção de responsividade requer assim uma investidurada proteção ou cuidado do sujeito ante o objeto da ação(individual) ou prática (coletiva) em sua vulnerabilidade. Trata­se de uma vulnerabilidade que exprime uma desigualdade entresujeito e objeto, empregando um termo levinasiano, umaassimetria. A assimetria indica a diferença ou dessemelhançaintersubjetiva entre o Mesmo (eu, Ego) e o Outro (Alter), e queno entanto este último investe em sua altura (daí um espaço­tempo assimétrico) à responsabilidade assignada ao “eu”.Enquanto na noção tradicional de responsabilidade temos aigualdade entre sujeito e objeto da ação, pois se dá comodeveres entre humanos semelhantes ou iguais, segue­se emJonas que temos outra situação: No caso da responsividade paracom o(s) outro(s) humanos e os ainda não existente(s) (futurasgerações) e ainda o(s) outro(s) de toda a Natureza extra­humana. Como disse, há aqui uma desigualdade, uma diferençaassimétrica marcada pela vulnerabilidade do Outro, que implicaem sua Altura, pela precariedade da vida, mas por isto mesmomandamento da Alteridade, remetido à im­potência dasubjetividade em ser ainda mais responsável por parte dospróprios agentes. É fundamental dizer que a subjetividade ética

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não é chamada a ser responsável pelo próprio autós – do “eu” –,pois, desde sempre, já é chamada à responsividade pelaalteridade do Outro: o Outro precede o Mesmo.

Como já vimos acima, Jonas escolheu um modelo práticoarquetípico: a relação entre pais e filhos. Trata­se de umasituação em que os filhos já são sujeitos de direitos e, contudo,ainda não podem exercer plenamente tais direitos sem a ajudade seus progenitores. Neste caso aproximativo, os pais seresponsabilizam pelos seus filhos, ou seja, respondem pelaAlteridade – e daí uma responsividade; a fim de que possam osvulneráveis em circunstâncias normais desenvolver a vida erealizar­se. Embora que não se trate literalmente da mesmacoisa, entre os deveres para com os filhos por parte dos pais e osdeveres para com as futuras gerações e da Natureza extra­humana, o cuidado fundamental por parte da subjetividade paracom aquele que precisa seguir sendo, constitui parte integrantedo dever ontológico do homem de velar por ele, englobando asfuturas gerações e por extensão toda a Natureza. Aqui o euresponsável é o mesmo que “se acha impedido de coincidirconsigo mesmo” (LEVINAS, 1999 b, p. 161) e nessa des­nucleação de si em direção ao Outro é investido por “umaabnegação de si mesmo enquanto plenamente responsável doOutro” (LEVINAS, 1999 b, p. 161). Em Jonas trata­se de umdever ou responsividade ao Outro orientada para o futuro,aplicada a toda Alteridade, mas desde o aqui das presentesgerações. Portanto:

[...] para nós, contemporâneos, em decorrência do direitodaqueles que virão e cuja existência podemos desde jáantecipar, existe um dever como agentes causais, graças aoqual nós assumimos para com eles a responsabilidade pornossos atos cujas dimensões impliquem repercussões de longoprazo (JONAS, 2004 a, p. 85).

Ao falarmos de uma responsividade que engloba toda

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Natureza, se dá aí o alargamento da ética, pois “a biosferainteira do planeta acresceu­se àquilo pelo qual temos que serresponsáveis, pois sobre ela detemos poder” (JONAS, 2004 a, p.33). A Natureza em sua globalidade se converte emresponsividade humana; trata­se assim de uma verdadeiranovidade em termos de ética, dado que Jonas conseguiuentrever com grande clarividência o novo poder de alteração edestruição do ciclo de reprodução da Alteridade da Natureza,que tem vulnerabilidade pelos seus recursos limitados, diante dasede infinita, incessante e voraz da humanidade, sobremodocom o advento da modernidade. Além disso, no interior dessavulnerabilidade da Natureza encontra­se a ameaça do próprioser humano à sua espécie, pois sua imagem originária está emperigo e precisa ser preservada e será pelo próprio podercomedido que se chegará a um dever exercido: ‘se podes, entãodeves’.

Jonas inclui em sua ética a dimensão antropológica daresponsividade, pautada numa imagem de homem como um serde carências, e por isso imperfeito, precário, masessencialmente livre, e nesta medida um sujeito moral, dotadode uma subjetividade responsável a fim de ser livre. De talmodo que o eu dessa subjetividade sempre se destaca comosendo a mais responsável pelo Outro humano e extra­humanona Natureza. Podemos inclusive notar aqui a aproximação como que diz Emmanuel Levinas em sua ética: “sou responsável deuma responsabilidade total, que responde por todos os outros,mesmo pela sua responsabilidade. O eu tem sempre umaresponsabilidade a mais do que todos os outros” (LEVINAS,1988, p. 91). Tal liberdade não colima o advento de um homemnovo, pautado na esperança futura de ser perfeito ou aindaliberto de duas necessidades, como é o caso da esperançablochiana, que Jonas criticará em “O princípioresponsabilidade” juntamente com as grandes utopias do séculoXX, nos capítulos V e VI. Trata­se na verdade de uma

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antropologia e uma ética que se dá desde o reverso desseotimismo utópico cego, posto que pede, aposta e deposita umaassignação ao homem do presente, ou seja, na medida de sualiberdade se incumbe a responsividade ante o Outro ­ o humanoe toda Natureza, de uma maneira modesta com vistas àpreservação de suas possibilidades autênticas na Natureza e nelaa humanidade. Podemos então admitir que e responsabilidadepelo Alter precede a liberdade no autos. Ser responsável “comrelação a qualquer liberdade do outro, é anterior a qualquerliberdade em mim” (LEVINAS, 1999 b, p. 212), de tal modoque a interioridade do eu se desnuda como responsividade aoOutro, constituindo­se como ser­pelo­Outro e ser­para­o­Outro,e não meramente ser­para­morte em sua liberdade.

A autenticidade do humano reside no reconhecimento desua ambiguidade, que lhe põe em ameaça. Levando em contaesta ambiguidade, no “Princípio Vida” Jonas define a naturezahumana como aquela capaz de produzir imagens, uma vez que acapacidade de simbolizar envolve um ser que fala, pensa einventa, o “homo pictor” (cf. JONAS, 2004b, pp. 181­210), masintegrando a técnica como um rasgo especificamente humano.Contudo, já em “O Princípio Responsabilidade” Jonas adotauma leitura do humano de modo menos romântico, pois ohomem é visto como aquele que produz artefatos e osmonopoliza para si, passando a dar maior valor àquilo que faz, éo homo faber, que se vincula a uma finalidade utilitária até oque pode chegar a fazer (cf. JONAS, 2004a, pp. 36­37).

É na medida de sua imperfeição ou ambiguidade que ohomem se torna sujeito moral, pois ele mesmo e a natureza porextensão se tornam objetos de seu poder tecnológico,ameaçando a sua imagem pelo seu fazer:

[...] a simples verdade, nem sublime nem humilhante, mas quenecessita ser respeitada em toda sua inteireza é a de que o“homem autêntico” esteve sempre aí, com sua nobreza e suabaixeza, com sua grandeza e sua miséria, com sua felicidade e

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rso desseosita umada de suao humanovistas àeza e nelasabilidadevel “comqualquertal modovidade ao­o­Outro,

imento deem contanaturezavez que a, pensa e210), mashumano.nas adotao, pois otos e osque faz, éária até o.de que otureza pornológico,

, mas quede que oeza e sualicidade e

seu tormento, em sua justificativa e suas culpas, em definitivo,com a ambiguidade que lhe é indissociável [...] (JONAS,2004a, p. 348).

Podemos tirar um exemplo dessa ambiguidade no campoda medicina, que tem feito avanços em melhorar a sobrevidahumana e o estado de saúde como um todo; contudo, no que dizrespeito ao paciente temos a renúncia voluntária ao tratamento,a eutanásia, a ortotanásia chegando ao extremo de se pleitear odireito de preferir morrer dignamente – e isto tem colocadoproblemas complexos de ordem ética. Já no campo da genéticaa imagem de homem se encontra seriamente ameaçada com abusca de experimentação de embriões humanos para fins deeugenia que suscita dúvidas sobre os reais benefícios a seremtrazidos à humanidade como um todo. Enfim, a ficção tem dadolugar à realidade ante os possíveis do Homo faber, dizendotambém respeito ao âmbito precedente da responsividadehumana ao Outro, pois aqui o temor maior é pelo Outro e nestemodo de temer não há retorno sobre o si mesmo, mas entrega­separa o Outro humano e toda a Natureza.

Tal temor pelo Outro, traz à tona a criação de novosprincípios éticos diante daquilo que se precisa evitar, pois assimcomo não saberíamos o valor da vida se não existisse o matar,enfim, nenhuma transgressão se não pudesse já manifestar­se nopresente sua real possibilidade, somente uma desfiguração dohomem já em curso pode­nos ajudar a forjar a ideia de homem aser preservada de sua desfiguração (Cf. JONAS, 2004a, p. 65).Trata­se aqui de uma heurística do temor colocada a serviço dadoutrina dos princípios éticos, cuja essência se encontra em umaprática de prudência constante bem como da adoção de umamodéstia dos fins a que se destina o homem e o uso da naturezaem geral. Há que se dar maior relevância aos prognósticosnegativos que propriamente aos positivos ao se pesar na balançada prudência. Não se trata de se colocar em franca oposição ao

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progresso científico ou o tecnológico, mas de sopesar as ações epráticas com responsividade, pois os destinatários dos errosserão os próprios humanos em situação posterior, daí o respeitopelas futuras gerações, que devem ter as instituições públicas ouprivadas que se produzem com a expectativa de algum benefícioprudente posterior em forma de aplicação tecnológica. Uma vezdesaparecida a fronteira entre teoria e prática no campocientífico, a investigação deve ser submetida ao exame éticopartindo dos princípios norteadores de uma ação e práticaprudentes – primum non nocere (primeiro não causar o dano).Passamos a ver assim, que é no seio da investigação científicaque a consciência da responsividade deveria fazer­se umaprática usual, pois há uma fragilidade/vulnerabilidade origináriana natureza/homem que se encontra em jogo aqui e agora e nofuturo das gerações. Trata­se assim de uma “extrema fragilidadedo Outro, ameaçado pela violência e pela morte” (CHALIER,2002 a, p. 72) que habita a interioridade de cada autós, chamadoa ser responsável desde sempre pelo Outro por anterioridade aoexercício de uma mera liberdade própria.

A formulação do imperativo ético em Jonas se deve a essedado ou factum comentado: da vulnerabilidade do Outro, danatureza e em específico do humano, ante a técnica do Homofaber, que tem posto em perigo a imagem originária da vidanatural/humana. Neste sentido, Jonas passa a buscar umafundamentação, partindo desse factum, de um imperativo deresponsividade sobre a existência do homem enquanto homem etoda natureza, na medida em que o mesmo é objeto de suaspróprias ações e práticas. Toda natureza é incluída pelo simplesfato de que uma vida dignamente humana somente é possívelem um habitat natural, que encontra­se seriamente ameaçado.Por isso, Jonas vê que é necessário também demonstrar que aNatureza é um bem em si mesmo e que não é neutra em termosde valores, pois todos os valores humanos se encontram naprópria produção da Natureza. Espírito e matéria se encontram

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assim, imbricados e co­implicados de tal maneira que os valoresespirituais são latentes no orgânico, ou como Jonas diz, “mesmoem suas estruturas mais primitivas o orgânico já prefigura oespiritual” (JONAS, 2004 b, p. 11). Desta maneira assumida anatureza como registro de memória na prática humana, sesupera o dualismo moderno, com um tratamento amável doentorno incluído no mandamento moral, que tem novo raio dealcance, colimando a totalidade da biosfera do planeta em quevivemos, e porque não dizer de alcance cósmico, estendido aum bom infinito como memória da Natureza, sendo objeto daresponsividade humana. Neste sentido, em uma tal sabedoria dafilosofia, podemos chegar aqui a uma sabedoria do amor, a qualconfere uma realidade das mais concretas a vigorar, na obra dejustiça ao Outro – humano e extra­humano, uma responsividadefeita em “medida conduzida ao infinito do ser­pelo­outro daproximidade e como sabedoria do amor” (LEVINAS, 1999 b, p.241).

Este ponto de vista paradigmático muda substancialmentea visão acrítica e antropocêntrica das éticas tradicionais, aomesmo tempo em que não cai em um biocentrismo ingênuo,pois se trata de um biocentrismo responsável quanto ao modusoperandi humano no seio da Natureza, onde todo outro nasce etem ser. O biocentrismo defendido por Jonas na fundamentaçãodo princípio responsabilidade preconiza que o biológico devedotar­se de novo estatuto, com características de um discursosobre a dignidade do organismo, enquanto dignidade da vida emsi ­ e porque não dizermos ­ dignidade do Outro. Trata­se de umantropocentrismo de estirpe nova, pois aqui se supera odualismo já mencionado em algumas linhas acima. Para Jonas,“as ciências naturais não dizem toda a verdade acerca daNatureza”, pois se encontram sem superar esse secreto dualismoinstalado na modernidade. Não obstante, este filósofo postulauma ética desde um biocentrismo que mostamos radicar norespeito ao Outro – humano e extra­humano, que culmina em

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um antropocentrismo cósmico, não como mera estratégia, masenquanto “uma exigência moral, não somente em razão de nósmesmos (humanos), senão também em razão dela [da biosferaem seu conjunto e em suas partes] e por seu direitopróprio”(JONAS, 2004a, p. 35), pois a Alteridade da Naturezaalberga valores e fins que devem se traduzir também em valoreshumanos, e daí o cuidado que “escutamos” desde o seu seio,suas entranhas, que chega até nós.

Trata­se de uma ética ontológica, pois encontra­secentrada no ser desde o Outro da Natureza, o inverso e mais queuma ética deontológica, pois não se trata de um dever por dever– como puro fim de uma lei meramente formal: ‘podes, postoque deves’ (Cf. KANT, 2002 b, p. 251), mas antes aos homens édito: “deves, posto que podes”, uma vez que o poder datecnociência dilatou a potência da humanidade diante de todanatureza e, por isto, o dever segue­se como conteúdo de talpotência, condição válida para uma manutenção de vidaautêntica em toda biosfera em sua Alteridade, incluindo aí apreservação da autenticidade da imagem de homem tal como aNatureza o faz. A liberação dos efeitos que a humanidadeproduz no mundo passa a depender deste dever que se seguiu aopoder sobre toda a Natureza.

Considerações finais

Com Jonas vemos uma radical mudança de orientação emdireção ao bem supremo incorporado na Alteridade da natureza.Pelo viés da tradição temos uma aspiração ao bem supremo comalgo superposto à realidade natural, caracterizado pela perfeiçãoe imutabilidade, e ao qual “devemos” orientar as nossas ações.No entanto, tal fim supremo não é objeto de nossaresponsividade, visto que o bem assim atendido não carece de

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Notamos assim, que no momento pelo qual atravessamos,a Natureza, e nela a civilização humana e sua essência para ofuturo, se encontram seriamente desafiadas. Nosso sentimentode responsividade nasce no seio dessa fragilidade quemostramos advir da Alteridade. A busca pelo bem absoluto deoutrora na ética é substituída pela dimensão de futuro que sedesenha desde a temporalidade presente da Natureza e nesta ahumanidade, a fim de que os entes humanos e extra­humanospossam habitar a terra dignamente, trata­se do mais radicalrespeito do eu (autos) pelo Outro (alter). Há aqui umainterdependência entre o sujeito responsivo e o objeto daresponsividade, posto que é numa imanência do ser em seu ser­outro (da Natureza­humanidade) que se exige o dever daresponsividade, mais claramente nos expressando, o dever daresposta ao ser temporal da Natureza­humanidade e seu futuro.Logo, Jonas admite que “somente uma exigência imanente aoser pode fundar o dever”(2004a, p. 205), de maneira que taldever é ontológico, um dever para com o ser­outro, que comovemos se encontra seriamente ameaçado.

Esta responsividade se traduz como cuidado pelo ser doOutro, cuidado como bem ao próximo em sua proximidademaior: o Outro em mim; pois o Outro ressoa em minhasubjetividade. Por baixo do ser responsivo ao Outro por parte decada eu, “o psiquismo da alma é o Outro em mim” (LEVINAS,1999 b, p. 126). Mas colocado nos termos da temporalidadenatural­humana em sua fragilidade, ameaçada pelo efeito daprópria ação potencializada da tecnociência produzida, e não aum ser que não tem sequer fome, dada a dimensão de abstraçãodo ser da tradição. Portanto, vemos que o imperativo éticojonasiano almeja velar pelo ser­outro (insito na natureza), visto

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que este é o único que, em sua infinita fragilidade, pode nosmover a uma resposta a ele: a Natureza e a humanidade,projetados desde aqui e agora até o futuro. Eis o núcleo destaética ontológica que podemos dizer ser metafísico: os aindanão­existentes, mas que carecem de vida – o totalmente Outro.Uma metafísica da Natureza? Uma metafísica do Desejo peloOutro e para o Outro? Entrevemos aqui uma aproximação entreo pensamento de Emmanuel Levinas e o de Hans Jonas, pois“colocar uma metafísica como Desejo é interpretar a produçãodo ser ­ desejo de engendrar o Desejo – como bondade e comomais além da felicidade; é interpretar a produção do ser comoser para o Outro” (LEVINAS, 1965, p. 281). Eis também atranscendência prenunciada pela imanência, a dimensãoespiritual de todo organismo que viceja na vida, é Eros que liçacom Thánatos. De tal sorte que o Eros enquanto desejo peloOutro faz uma mudança em apenas ser para si a fim de ser parao Outro. Define­se aqui um movimento ético em direção aoOutro, ou melhor dizendo: Altruísmo. Uma forma de amar tãoforte como a morte. Pois, como alude Sober sobre a força doaltruísmo:

(...) o altruísmo que às vezes experimentam as pessoas éespecialmente forte. Uma pessoa que está disposta a realizarum sacrifício muito pequeno para que outra obtenha umbenefício enorme pode ser altruísta, mas seria menos altruístado que outra que está disposta a fazer um sacrifício maior(2000 d, p. 97).

Não se trataria aqui da superação do dualismo niilistaocidental ­ que acima mostramos culminar em ser para a morte,que tem se perpetuado na filosofia e ciência modernas, e queremontam a cosmologias como a gnóstica – de fundo mítico?Neste sentido, o projeto jonasiano reúne sabiamente na memóriaocidental Natureza e homem, corpo e alma, imanência etranscendência, matéria e espírito, necessidade e liberdade,

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desdobrados em e pelo amor à Vida; pois a liberdade que afloranos homens pode também ser vista como elemento articulador eevolutivo do organismo e do ser na própria Natureza desde quese coloque a precedência de ser responsivo. Portanto, talmetafísica da Natureza elaborada por este filósofo, e queolhamos aqui pelo viés de sua Alteridade, tem o intuito de“superar, por um lado, as barreiras antropocêntricas da filosofiaidealista (ex. Descartes e Newton) e existencialista (ex. niilismoexistencial), e, por outro, as barreiras materialistas da ciêncianatural (ex. materialismo científico e darwinismo materialista)6”(JONAS, 2004b, p. 07), contribuindo para uma nova formaçãoda memória acerca da natureza.

Notas

1 Tradução realizada pelo autor do artigo. Doravante, toda bibliografia emlíngua estrangeira que for citada será traduzida para o português peloautor do artigo.

2 O termo “responsividade” quer indicar a reserva de sua utilização aoâmbito precípuo da responsabilidade à Alteridade humana e em seuporvir (gerações futuras), assim como referida aos extra­humanos em suaradical condição de “ser Outro”, perfazendo o âmbito da Alteridade danatureza e sua dignidade, seu valor. O termo responsabilidade,geralmente utilizado para remeter ao “princípio responsabilidade”jonasiano, ao nosso ver não tem sido interpretado em nível elucidativodo dever à Alteridade e sua primazia, para uma constituição do deverético que vai do eu ao outro; tendendo a permanecer numa dimensão dosujeito da ação – redundando por fim em um egocentrismo e por vezesautoanulando­se em seu sentido maior. Queremos assim enfatizar adimensão da Alteridade, que “se apossa da minha responsabilidade semque se constitua numa apropriação”, e que tem sido esquecida eminterpretações correntes da ética jonasiana. Na responsividade, o que estáem jogo é o sentimento responder em retidão ao Outro, um ato de darretorno ao que foi acolhido, “escutado”, no entender da tradição judaica,remetendo assim o Eu como assignação ao Outro (à Alteridade). Aresponsabilidade tem sido interpretada como obrigação pelos própriosatos, ou dever aos outros com um retorno a si (ao Eu), e daí, serresponsável por si mesmo (o Mesmo) em seus atos. Nesta maneira de serresponsável prevalece o Ego, ao passo que naquela é o Alter. Assim, aresponsividade está reservada a designar esclusivamente o que Jonas

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denomina de “sentimento de responsabilidade” pela Alteridade do outroem sua distancia própria com relação a qualquer “eu”; assim notamosaqui que o famoso “princípio responsabilidade” encontra­se revestidosentimento emanado da Alteridade que não anula sua distância nem namaior proximidade, por isto o distinguimos como responsividade (Cf.JONAS, 2004 a, p. 156).

3 Não é do nosso intuito explanar sobre estes filósofos mas apenas indicaruma relação subjacente, do modo de pensar judaico, com aspectos dopensamento jonasiano, notadamente filosofias do diálogo onde o Outrotem dignidade própria, desde sua Alteridade, face ao Eu – o Ego.Destacamos as obras: Der Stern der Erlösung, de Franz Rosenzweig;Totalité et infini e Autrement qu’être ou au­delà de l’essence, deEmmanuel Levinas.

4 Neste tocante, Jonas faz referências em seu texto La religión gnóstica. Elmensage del Dios extraño y lós comienzos del cristianismo, a Heidegger,mencionando Sein und Zeit (1927) na altura do § 38­40, cujosexistenciários são a “queda” e o “estar­lançado”.

5 A este respeito da alteridade remeto mais uma vez a Jonas (2004a, p. 156).6 As expressões em itálico dentro de parênteses são nossas.

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