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LEAN HEALTHCARE: PRÁTICAS ENXUTAS APLICADAS EM UM AMBIENTE HOSPITALAR Wagner de Barros Neto (UFG ) [email protected] ANTONIELLI SILVA ALENCAR (UFG ) [email protected] Diene Maria Oliveira (UFG ) [email protected] Patricia Goncalves Carneiro (UFG ) [email protected] Naiara Faiad Sebba Calife (UFG ) [email protected] Dada à importância do setor hospitalar e tendo em vista que os custos com a saúde vêm crescendo cada vez mais no Brasil, diversas metodologias para melhoria de processos estão sendo propostas para solucionar ineficiências nos serviços de saaúde, como é o caso das ferramentas do lean healthcare. Neste sentido, o objetivo desse estudo é avaliar e propor o uso de ferramentas do lean healthcare no pronto atendimento de um hospital no interior do estado de Goiás, fazendo uma análise do cenário atual e propondo um cenário futuro, a fim de melhorar o atendimento dos pacientes ao reduzir os desperdícios encontrados nos processos do setor estudado. Para alcançar o objetivo do estudo, utilizou-se do método de pesquisa exploratória, além dos procedimentos de pesquisa bibliográfica e estudo de caso, na busca de informações sobre o tema tratado e na avaliação de fato do hospital em estudo. Os principais resultados obtidos estão ligados ao uso de ferramentas como o Mapeamento de Fluxo de Valor e da análise do layout no pronto atendimento, de forma que se identificou a presença de vários desperdícios e então foi possível propor uma mudança de layout como forma de melhorar o atendimento aos pacientes e eliminar os desperdícios identificados. Palavras-chave: lean healthcare, produção enxuta, lean service XXXVI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCÃO Contribuições da Engenharia de Produção para Melhores Práticas de Gestão e Modernização do Brasil João Pessoa/PB, Brasil, de 03 a 06 de outubro de 2016.

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LEAN HEALTHCARE: PRÁTICAS

ENXUTAS APLICADAS EM UM

AMBIENTE HOSPITALAR

Wagner de Barros Neto (UFG )

[email protected]

ANTONIELLI SILVA ALENCAR (UFG )

[email protected]

Diene Maria Oliveira (UFG )

[email protected]

Patricia Goncalves Carneiro (UFG )

[email protected]

Naiara Faiad Sebba Calife (UFG )

[email protected]

Dada à importância do setor hospitalar e tendo em vista que os custos

com a saúde vêm crescendo cada vez mais no Brasil, diversas

metodologias para melhoria de processos estão sendo propostas para

solucionar ineficiências nos serviços de saaúde, como é o caso das

ferramentas do lean healthcare. Neste sentido, o objetivo desse estudo

é avaliar e propor o uso de ferramentas do lean healthcare no pronto

atendimento de um hospital no interior do estado de Goiás, fazendo

uma análise do cenário atual e propondo um cenário futuro, a fim de

melhorar o atendimento dos pacientes ao reduzir os desperdícios

encontrados nos processos do setor estudado. Para alcançar o objetivo

do estudo, utilizou-se do método de pesquisa exploratória, além dos

procedimentos de pesquisa bibliográfica e estudo de caso, na busca de

informações sobre o tema tratado e na avaliação de fato do hospital

em estudo. Os principais resultados obtidos estão ligados ao uso de

ferramentas como o Mapeamento de Fluxo de Valor e da análise do

layout no pronto atendimento, de forma que se identificou a presença

de vários desperdícios e então foi possível propor uma mudança de

layout como forma de melhorar o atendimento aos pacientes e eliminar

os desperdícios identificados.

Palavras-chave: lean healthcare, produção enxuta, lean service

XXXVI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCÃO Contribuições da Engenharia de Produção para Melhores Práticas de Gestão e Modernização do Brasil

João Pessoa/PB, Brasil, de 03 a 06 de outubro de 2016.

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1. Introdução

Tendo em vista que os custos com a saúde vêm crescendo continuamente, uma variedade de

metodologias para melhoria de processos foram propostas para solucionar ineficiências nos

serviços de saúde, sendo a produção enxuta um desses métodos (KIM et al, 2006). Já muito

reconhecida na indústria como uma componente chave para avançar nos negócios, a melhoria

de processos, aos poucos, é introduzida em ambientes hospitalares, mas ainda enfrenta

resistência nesse setor, principalmente, pelos líderes da indústria hospitalar que sempre

consideraram o cuidado com um paciente mais como uma arte do que como ciência

(GUO;HARIHARAN, 2012).

A filosofia de gestão e ferramentas da produção enxuta (lean) vem da indústria manufatureira,

com a Toyota Motor Corporation sendo a pioneira, vista como a líder do uso desses métodos

de melhoria de desempenho (KIM et al, 2006). Tal sistema de produção, que foca na geração

de valor para o cliente e na eliminação de desperdícios, já mostra resultados em diversos

hospitais, aplicando a filosofia lean para alcançar maior qualidade e segurança para os

pacientes, menores custos e tempos de espera e maior satisfação dos funcionários (COSTA et

al, 2015).

Devido a ineficiências na gestão da saúde, a importância desse serviço na sociedade, a

crescente insatisfação dos usuários, o estresse do ambiente de trabalho, resultando em um

desgaste maior dos funcionários, os custos elevados com este tipo de serviço, justifica-se

então o estudo em um hospital no interior do estado de Goiás para propor melhorias nos

setores mais críticos por meio das práticas de lean healthcare. Logo, este estudo tem como

objetivo avaliar e propor o uso de ferramentas do lean healthcare no pronto atendimento de

tal hospital, fazendo uma análise do cenário atual e propondo um cenário futuro, a fim de

melhorar o atendimento dos pacientes ao reduzir os desperdícios encontrados nos processos

do setor estudado.

2. Referencial Teórico

O mercado reduzido e a necessidade de se produzir uma variedade de carros em uma mesma

linha de montagem incentivaram a busca por melhorias no processo de manufatura, buscando

flexibilidade e baixos custos para satisfazer as necessidades dos clientes (OHNO, 1988). Foi

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neste contexto que surgiu na Toyota o paradigma da Produção Enxuta (lean manufacturing),

que se destaca pela alta produtividade, confiança dos clientes nos produtos, velocidade de

produção e flexibilidade, contemplando vantagens da Produção Artesanal e da Produção em

Massa (LIKER, 2005; WOMACK, 1992). Segundo Bertaini (2012), a filosofia lean, aos

poucos, foi ganhando espaço fora da indústria automotiva, sendo utilizada para a gestão de

operações, gestão de serviços e gestão hospitalar, como ilustra a Figura 1.

Figura 1 – Evolução da filosofia lean

Fonte: Bertani, 2012

Segundo Kim et al (2006), a filosofia do pensamento enxuto (lean thinking) tem ganhado

seguidores entre líderes do sistema de saúde, com vários grupos de hospitais ao redor do

mundo aderindo a versão da produção enxuta em suas abordagens sistemáticas para melhorar

qualidade e eficiência. Os autores acreditam que nos próximos anos, a aplicação de princípios

e métodos enxutos pode ter um efeito transformacional no modo como os serviços de saúde

são entregues, com potencial dramático de ganhos em qualidade, segurança e eficiência.

Apesar do uso do lean em ambientes hospitalares ter certas similaridades com a indústria

manufatureira, a maioria das abordagens e análises são um pouco diferentes, uma vez que

hospitais têm características de operações mais singulares (GUO; HARIHARAN, 2012). Na

Tabela 1tem-se um comparativo das diferenças entre a manufatura e hospitais que

influenciam nos estudos e implantação da filosofia lean.

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Tabela 1 – Comparação de operações manufatureiras e hospitalares

Categoria Manufatura Hospitais Produção

Quantidade produtiva

Limite de produtividade

Previsão

Estabelecido

Demanda

Não existe

Produto

Tipo

Defeito

Bens

Devolvido pelo consumidor

Serviço

Não há devolução

Reembolso Consumidor é quem paga Seguradora/Convênio é quem paga

Competição

Geográfica

Seguro

Regulamentação

Global

Nenhum

Competição livre

Doméstica

Escolhas limitadas

Competição regulamentada

Pessoas envolvidas

Operação

Gerência

Trabalhador

Supervisor

Funcionários

Médicos e outros

Contato com consumidor Não Sim

Indicadores de desempenho Fáceis de desenvolver Difíceis de desenvolver

Variabilidade

Input

Processo

Output

Padronização

Material consistente

Ritmo consistente

Saída consistente

Fácil

Paciente inconsistente

Ritmo inconsistente

Saída inconsistente

Difícil

Cultura organizacional Cultura de melhoria Cultura de culpa

Fonte: Adaptado de Guo e Hariharan (2012)

A produção enxuta difere da produção em massa devido a sua busca por eliminação de

desperdícios por meio do combate a atividades que não agregam valor (BERTONI, 2012).

Segundo Ohno (1988), desperdícios da manufatura podem ser classificados em sete

categorias. Elas são: superprodução, defeitos, inventário, processamento inapropriado,

transporte, movimentação e esperas. A Tabela 2 ilustra os tipos de desperdícios e seus

exemplos em ambientes hospitalares.

Tabela 2 – Tipos de desperdícios e aplicações ao Lean Healthcare

Desperdício Aplicação em hospitais

Transporte

excessivo

Provocado por layout não otimizado: movimentação de pacientes,

funcionários, medicamentos desnecessários

Estoque

excessivo

Excesso de estoque como, por exemplo, pacientes esperando, testes a

serem realizados

Movimentação

excessiva

Movimentação não necessária para completar um serviço: funcionários

procurando por equipamentos ou documentação

Esperas Tempo ocioso de operações: esperas por resultados, funcionários ou

médicos; esperas causadas por programações erradas

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Superprodução Diagnósticos desnecessários, monitoramento excessivo de paciente, fazer

medicamentos para antecipar demanda

Processamento

inapropriado

Testes desnecessários, utilização de antibióticos fortes para tratamento de

inflamações leves, perguntar aos pacientes diversos detalhes várias vezes.

Defeitos Repetir testes por causa de erros, readmissão por falha na alta do

paciente, administração de medicamentos errado

Fonte: Adaptado de van Leijen-Zeelenbergetal (2015)

Para a eliminação dos desperdícios existem diversas técnicas e conhecimentos que podem ser

aplicados de modo a otimizar os sistemas produtivos, seja através de um melhor arranjo

físico, reorganização do espaço de trabalho ou redesenho de processo. Para identificação

desses desperdícios pode-se utilizar a ferramenta Mapeamento de Fluxo de Valor (MFV).O

MFVé um método para mapear processos do lean manufacturing que busca estudar o fluxo de

material e informação no processo de transformação de produto ou serviço. No ramo

hospitalar,em casos mais simples, como diagnóstico ou exame laboratorial,e que tem filas de

pacientes,podem ser resolvidos mais facilmente se os gestores conseguirem enxergar o fluxo

de valor como um todo e reconhecer os problemas existentes (MORILHASet al., 2013).

Segundo Silveira (2013), como o mapeamento de fluxo de valor é utilizado para identificar

gargalos e atrasos nos processos, através dele é possível identificar as etapas que não agregam

valor no produto ou serviço para então criar um estado presente, de como a organização é hoje

e, um estado futuro do processo, ou seja, onde se pretende chegar. Os processos no

mapeamento do fluxo de valor são divididos de três formas:

1. Os que realmente geram valor;

2. Os que não geram valor, porém são importantes para manter a qualidade;

3. Os que não geram valor e,portanto, devem ser evitados ou eliminados.

Venâncio et al (2015 apud SLACK et al, 2009) dizem que o estudo do arranjo físico

proporciona o dimensionamento do centro de trabalho quando coletada as informações a

respeito do local de trabalho bem como a distribuição dos fluxos entre cada núcleo de

trabalho.Com isso, é possível planejar o arranjo físico de forma esquemática. Ainda, de

acordo com os autores supracitados, quando seguidos os passos destacados inicialmente,

pretende-se acertar o arranjo físico observando as condições do local e planejando de forma

que o mesmo ocorra dentro da área do projeto, considerando as distâncias entre cada núcleo

de trabalho e os movimentos necessários para realização das tarefas, fazendo com que as

movimentações, custos e distâncias percorridas sejam minimizados.

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Seguindo a bibliografia de Slack et al (2006), a organização e destinação dos recursos

utilizados para transformação corresponde ao arranjo físico de uma intervenção produtiva. O

arranjo físico trabalha na alocação adequada das máquinas, pessoas e centros de trabalho,

sendo uma forma de distribuir os recursos de maneira organizada em uma determinada área.

Além de determinar a forma e aparência de um ambiente, também auxilia na decisão de onde

os recursos devem ser instalados de modo que os materiais, informações e pessoas escoam

através dos recursos existentes. O fluxo de materiais, pessoas e recursos em qualquer processo

necessita de um estudo para um trabalho eficiente, havendo poucas mudanças em um layout

que podem afetar significativamente a eficiência do processo, acarretando nos custos e nas

operações.

De acordo com Chiavenato (2004), o 5S é uma ferramenta de apoio para os processos

produtivos que constitui de 5 sensos: seiri - simplificar, é necessário separar e eliminar o que

é não é importante; seiton - endireitar, organizar as coisas essenciais nos seus lugares de

maneira que possam ser facilmente acessadas; seiso - limpar, ou seja, manter as máquinas

limpas e tornar agradável o local de trabalho; seiketsu - estabilizar e padronizar, fazer da

limpeza e da verificação uma prática rotineira; shitsuke - apoiar e disciplinar, isto é, retomar

os primeiros sensos de maneira que o processo seja contínuo e interminável.

Segundo Periard (2010), o Kaizen é uma palavra japonesa constituída de dois ideogramas: o

Kai representa mudança e o Zen, bondade ou virtude. A premissa da metodologia Kaizen é

“Hoje melhor do que ontem, amanhã melhor do que hoje!”. Segundo Araujo e Rentes (2006)

Kaizen visa a melhoria contínua de um fluxo completo de valor ou de um processo individual,

com intuito de agregar mais valor com menos desperdício. Os esforços devem ser contínuos,

executados por todos, sendo que o seu foco central é a busca pela eliminação dos

desperdícios.

3. Metodologia

Neste trabalho,foi utilizada a pesquisa qualitativa, uma vez que não foram utilizados métodos

ou técnicas estatísticas. Para atingir o objetivo, a pesquisa utilizada foi a pesquisa

exploratória, pois o estudo tem como objetivo apresentar oportunidades de melhoria no pronto

atendimento de um hospital do interior de Goiás através da aplicação das ferramentas do lean

healthcare. Em relação aos procedimentos técnicos, este trabalho se enquadra tanto na

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pesquisa bibliográfica quanto no estudo de caso. Na bibliográfica porque inicialmente foi

pesquisado sobre o tema em livros, dissertações, revistas, congressos, simpósios etc. É um

estudo de caso uma vez que o trabalho tem o intuito de avaliar e propor ferramentas do lean

healthcare no pronto atendimento do hospital estudado.

Os materiais analisados foram obtidos diretamente com os funcionários do hospital, com uma

coleta de dados através de entrevistas e observações dos processos. Através das informações

obtidas, desenvolveu-se o mapa de fluxo de valor e pôde-se propor a solução para os

desperdícios detectados.

4. Desenvolvimento

O presente estudo focou seus esforços na área do Pronto Atendimento (P.A.) de um hospital

do interior de Goiás, sendo uma das áreas que recebe maior volume de pessoas e onde

melhorias e eliminação de desperdícios normalmente são as mais significativas, como

mostrado em diversos estudos já realizados (BERTAINI, 2012).

Para entender como funciona o processo como um todo do P.A., utiliza-se a ferramenta

Mapeamento de Fluxo de Valor, como mostrado na Figura 2, em que mostra o fluxo dos

pacientes dentro do sistema estudado, com as etapas, tempos e pessoas envolvidas. O mapa de

fluxo de valor (MFV) oferece uma visão geral dos processos e facilita a visualização dos

gargalos do processo e onde estão os desperdícios que a filosofia lean sugere atacar,

eliminando as atividades e processos que não agregam valor na ótica do cliente (no caso

hospitalar, o paciente).Com o MPV, podem ser usadas ferramentas e metodologias em

conjunto, abrangendo melhorias pontuais e melhorias contínuas (Kaizen).

Foram analisadas as etapas do processo de atendimento aos pacientes, entendendo e

observando os fluxos de informações, materiais e pessoas do Pronto Atendimento,o layout do

hospital, as atividades e rotinas dos funcionários e como se dão as relações com outras áreas

do hospital (farmácia, lavanderia e limpeza).

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Figura 2 – Mapeamento de Fluxo de Valor do Pronto

Atendimento

Fonte: Autores

Tendo em vista os sete desperdícios que a filosofia Lean visa eliminar, os maiores deles são

os referentes ao processamento inapropriado, transporte e movimentação excessiva, e o

desperdício referente às esperas.

O Pronto Atendimento possui um mini estoque (armário) de materiais e medicamentos

utilizados para tratamento dos pacientes, localizado na Sala de Medicação, além de possuir

um estoque separado para casos de emergência, localizado na Sala de Emergência (Figura 3).

Após a consulta dos pacientes com o médico plantonista e a prescrição de medicação, as

técnicas em enfermagem pegam os materiais e medicamentos no armário da Sala de

Medicação e fazem o preparo do soro/injeção para cada paciente.

Cada material e medicamento possuem um código de barras para identificação do produto

fracionado e controle do estoque do hospital, feito na farmácia central. Tais etiquetas são

retiradas da embalagem de cada item e são coladas em uma folha com separações por

paciente, que informa seu nome e número de atendimento. Quando a folha é completada, as

técnicas em enfermagem se deslocam até a farmácia, deixando-a para que a farmácia monte

uma caixa de reposição do estoque consumido. Ao retornarem à farmácia com uma próxima

folha de pacientes e consumo, as técnicas buscam a caixa com a reposição dos itens

juntamente com a folha original, para checagem e garantia da reposição de todos os itens do

estoque do Pronto Atendimento (Figura 4).

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Figura 3 – Área do Pronto Atendimento do

Hospital

Fonte: Autores

Figura 4-Ficha com adesivos de materiais utilizadosna caixa com as reposições de estoque

Fonte: Autores

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Tal processo de remoção de etiquetas, colagem em uma folha e transporte até a farmácia para

realização do pedido de reabastecimento apresenta-se como um desperdício em questão de

processamento inadequado, transporte e movimentação excessiva que provoca o aumento do

tempo de espera dos pacientes a serem atendidos.

No aspecto de processamento inadequado, a rotina de tirar etiquetas de cada item a ser usado

no paciente mostra-se ineficiente, bem como estressante e trabalhoso para as técnicas de

enfermagem, dado o tempo e esforço para retirar cada etiqueta e então colar na folha dos

consumos do Pronto Atendimento. A necessidade de o hospital controlar e monitorar em qual

paciente foi utilizado um determinado item, para fins de cobrança, faturamento e controle de

estoque, faz com que as técnicas em enfermagem gastem muito mais tempo com o cuidado

com etiquetas ao invés de atendimento e cuidado de fato ao paciente. Em momentos de

emergência, o controle de etiquetas torna-se crítico, sendo em tais ocorrências, o atendimento

ágil ao paciente em estado crítico a prioridade, o que faz com que haja perda e menor controle

e acuracidade dos itens utilizados nos pacientes.

Em relação ao transporte e movimentação excessivos, o layout do Hospital não é otimizado, o

que provoca deslocamentos e altos tempos para funcionários chegarem até os locais desejados

e realizarem sua tarefa. As causas maiores para transporte e movimentação excessiva são

devido ao acesso à farmácia e à falta de sinalização interna, o que obriga que funcionários

tenham que acompanhar pacientes para os locais onde se fazem exames (por exemplo,Raio X

ou Tomografia).

Em relação ao acesso à farmácia, como visto na planta do Pronto Atendimento (Figura 3), as

técnicas em enfermagem têm que percorrer um longo caminho da Sala de Medicação até a

entrada da farmácia, fazendo este percurso várias vezes ao dia para levar as documentações

dos consumos do P.A., fazer a requisição e depois buscar os kits de reposição.

Analisando a disposição do layout, chega-se a uma proposta de mudança que eliminaria

vários dos desperdícios citados. A Sala de Repouso, local onde os pacientes ficam repousando

enquanto tomam sua medicação (soro) divide uma parede com a farmácia comercial, isto é,

aquela que contém o estoque dos produtos não fracionados. Caso a Sala de Medicação fosse

levada para o local da Sala de Repouso e fosse criada uma janela para comunicação e troca de

materiais com a farmácia, via a parede em comum, eliminar-se-ia então o desperdício de

transporte e deslocamento relacionado à farmácia. No local da atual Sala de Medicação,

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juntamente com dois dos consultórios, seria na proposta as novas salas de repouso, ganhando

maior espaço (aumento em 150% a quantidade de leitos disponíveis), e levando a sala de

Internação e Tesouraria para a parte norte do hospital, na atual Mamografia, que não está em

uso, mantendo-se três consultórios em funcionamento. Com este novo layout, poderia haver

separação por sexo dos pacientes, dando maior conforto e privacidade para os mesmos. A

Figura 5 abaixo ilustra a proposta de novo layout.

Figura 5– Proposta de novo layout

Fonte: Autores

A mudança do arranjo físico da sala de medicação para próximo à farmácia afetaria o layout

desta última também, devendo modificar a organização dos estoques fracionados e não

fracionados (comerciais), tendo uma disposição física que possibilite abrir uma janela para

contato direto entre farmácia e sala de medicação e ainda garanta a separação dos

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medicamentos prontos para distribuição no hospital (fracionados) com aqueles ainda nas

caixas (não fracionados; comerciais).

Ao fazer tal alteração de layout, é possível que o mini estoque do Pronto Atendimento seja

eliminado, mantendo somente o estoque para emergências, ainda localizado na Sala de

Emergências. Desta maneira, a farmácia terá controle total sobre o estoque, certificando da

qualidade do manuseio, acuracidade do estoque e baixa no sistema, uma vez que a farmácia é

a única do hospital que possui um sistema eletrônico que bipa os medicamentos e materiais

utilizados. Isto garantiria que todos os problemas mencionados de processamento

inapropriado com etiquetas e tempo gasto fossem eliminados, uma vez que a própria farmácia

entregaria já os materiais para as técnicas em enfermagem de acordo com as prescrições de

cada médico, já tendo bipado cada item e dado baixa no sistema diretamente na conta de cada

paciente.

Em aspectos de organização do espaço físico, tanto atual como o proposto, a metodologia 5S

auxilia em uma melhor disposição e aproveitamento dos espaços, bem como criando e

mantendo uma cultura e rotina baseado nos princípios dos cinco sensos japoneses. A

metodologia pode ser aplicada na organização de papeladas, medicações e exames tanto na

recepção do Pronto Atendimento como na sala de medicação, criando uma melhor disposição

e padronizando locais para armazenagem de documentos, exames, lixo e equipamentos

médicos.

5. Considerações finais

O objetivo do estudo foi alcançado, pois foi possível identificar possíveis aplicações de

ferramentas de lean healthcare em um hospital do interior do estado de Goiás, no cenário

atual, e então propor melhorias em um cenário futuro, o que poderá acarretar na eliminação de

vários desperdícios e na melhoria do atendimento aos pacientes no ambiente hospitalar

estudado.

Observou-se que o uso de ferramentas como o Mapeamento de Fluxo de Valor e o estudo do

layout no ambiente hospital permitiram analisar o fluxo dos pacientes dentro do sistema, tal

como etapas, tempos e pessoas envolvidas, além da visualização dos gargalos do processo e

onde estavam os desperdícios.

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Dessa forma, foram identificados no ambiente em estudo, principalmente, dentre os sete

desperdícios que aborda a filosofia lean, o processamento inapropriado, transporte e

movimentação excessiva e esperas. Tais desperdícios estão ligados aos longos trajetos que

fazem as técnicas de enfermagem para realizar as operações de atendimento ao paciente, além

do controle de estoque dos medicamentos. Assim, propôs-se uma mudança de layout para o

hospital como forma de melhorar o atendimento aos pacientes e eliminar os desperdícios

identificados.

Com relação aos cinco sensos japoneses (5S), pôde-se observar que seria muito útil a sua

aplicação na organização de papeladas, medicações e exames tanto no Pronto Atendimento

quanto na sala de medicação.

Este estudo contribui tanto para a área acadêmica quanto para a área empresarial, na primeira,

acrescenta mais uma forma de aplicação das ferramentas lean em um ambiente em que se têm

poucos casos avaliados. Para a segunda, a pesquisa pode servir como estímulo para que outros

hospitais busquem através do uso de ferramentas do lean healthcare melhorar seus processos

e eliminar desperdícios.

Como trabalhos futuros, sugere-se que seja feita a aplicação de fato das ferramentas lean

citadas no ambiente hospitalar e das mudanças sugeridas, tal como a apresentação dos

resultados obtidos.

REFERÊNCIAS

ARAUJO, Cesar Augusto Campos; RENTES, Antonio Freitas. A metodologia Kaizen na

condução de processos de mudança em sistemas de produção enxuta. São Paulo: Revista

Gestão Industrial, 2006 Disponível em:

<https://www.yumpu.com/pt/document/view/28127904/a-metodologia-kaizen-na-conduaao-

de-processos-de-utfpr >. Acesso em:14 mar. 2016.

BERTANI, T.M. Lean Healthcare: recomendações para implantações dos conceitos de

Produção Enxuta em ambientes hospitalares. São Carlos, 166p. Dissertação de Mestrado

(Mestrado) – Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos,

2012.

COSTA, L.B.M. et al. Lean healthcare in developing countries: evidence from Brazilian

hospitals. The International Journal of Health Planning and Management, 2015.DOI:

10.1002/hpm.2331

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