Parecer Da PGR Na Adin 4270

download Parecer Da PGR Na Adin 4270

of 11

Transcript of Parecer Da PGR Na Adin 4270

  • 5/11/2018 Parecer Da PGR Na Adin 4270

    1/11

    S up remo T rib un al F ed era l07/10 /2011 16:22 0080073

    1 1 1 1 1 1 1 1 i 1 1 1 1 1 1 ~I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I ~ 1 1 1 1 1 1 1 1

    MINISTERIO P1JBLICO FEDERAL

    A

  • 5/11/2018 Parecer Da PGR Na Adin 4270

    2/11

    MINISTERIO PlJBLlCO FEDERALADJ 4.270 22. o dispositivo da Constituicao de Santa Catarina, oraimpugn ado, e do seguinte teor:

    "Art. 104 - A Defensoria Publica sera exercida peJaDefensoria Dativa e Assistencia Judiciaria Gratuita,nos termos de lei complernentar."

    3. A requerente justifica a sua legitimacao ativa, nos termosdo art. 103, IX , da CR e do art. 2, IX , da Lei n 9.868/99, e a vista dasatisfacao do requisito da pertinencia ternatica, alegando que osdispositivos impugnados dizem respeito a funcoes institucionais daDefensoria Publica, cujos membros sao por ela representados.4 . No merito, sustenta a inconstitucionalidade formal do art.104 da Constituicao estadual, pois 0 ente federativo excedeu os limites dasua competencia concorrente para dispor sobre a Defensoria Publica (art.24, XIII, e 2 e 3, da CR1), uma vez que ja existem normas geraisconstantes de lei federal sobre 0 tema (Lei Complementar n? 80/1994).5. Tarnbem considera formalmente inconstitucional a LeiComplementar estadual n? 155/97, pois elaborada em processo Iegislativoiniciado por deputado estadual. AfinaI, "a organizaciio da DefensoriaPublica e dos services de assistencia judiciaria sdo materias de iniciativaprivativa do Chefe do Poder Executivo, conforme disposto no art. 61, ~11, letra d, da Constituicdo Federal e art. 50, 2~ V da ConstituicdoEs tadual", ~

    "Art. 24. Compete 11Uniao, aos Estados e ao Distritc Federallegislar concorrentemente sobre:(. . .)XIII - assistencia jurfdica e Defensoria publica;(. . .) 2 - A cornpetencia da Uniao para legislar sobre normas gerais nao exclui a cornpetenciasuplementar dos Estados, 3 - Inexistindo lei federal sobre normas gerais. os Estados exercerao a cornpetencia legislativaplena, para atender a suas peculiaridades."

  • 5/11/2018 Parecer Da PGR Na Adin 4270

    3/11

    MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

    3DI4.2706 . No plano das inconstitucionalidades materiais, aponta aviolacao aos artigos 5, LXXIV2, e 134, caput', 1 e 2, da CR, uma vezque a organizacao da Defensoria Publica deve se dar em cargos de carreira,providos por concurso publico, como reconheceu 0 Supremo TribunalFederal na ADI n" 3.0434 Em suma, entende que nao seria permitida apromocao da assistencia juridica integral e gratuita, ordinariamente, poradvogados dativos.

    7. De resto, prossegue, as normas impugnadas contrariam aorientacao do governo federal que, atraves da Resolucao n? 31, de 30 dejulho de 2003, da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, recomendouaos Estados de Goias, Santa Catarina e Sao Paulo a criacao, em regime deurgencia, das suas respectivas Defensorias Publicas,8. Por fim, pediu a declaracao da inconstitucionalidade dosdispositivos impugnados, sem prornincia de nulidade e com efeitosprospectivos, mantendo-se a sua eficacia pelo periodo de ate urn ano.Desse modo, busca garantir que 0 Estado de Santa Catarina possa e1aborarnovas nonnas para regular a materia em conformidade com a ConstituicaoFederal.9 . Em suas inforrnacoes, fls. 271/283, 0 governador do Estadode Santa Catarina manifestou-se pelo nao conhecimento da a~ao direta,afirmando a ilegitimidade ativa da ANADEP, por falta de pertinenciatematica, No merito, sustenta a constitucionalidade dos dispositivosimpugnados.

    2 "Art. 5 (...) LXXIV - Estado prcstara assistencia juridica integral e gratuita aos que comprovareminsuficiencia de recursos;"3 "Art. 134. A Defensoria Publica e instituicao essencial a Iuncao jurisdicional do Estado, incumbindo-

    Ihe a orientacao jurldica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5, LXXIV."4 ADI 3.043/MG, Rei. Min. Eros Grau, OJ 27/1012006.

  • 5/11/2018 Parecer Da PGR Na Adin 4270

    4/11

    MINISTERIO PUBLICO FEDERAL4DI4.270

    10. A Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarinaprestou informacoes defendendo a constitucionalidade das normasquestionadas. Seu fundamento e 0 da legitimidade da opcao do constituinteestadual por uma estrutura funcional simplificada na prestacao daassistencia juridica gratuita, que seria mais eficiente e produtiva que aoferecida pelos integrantes da carreira da Defensoria Publica (fls,286/293).11. A AGU manifestou-se pela procedencia do pedido, para queseja dec1arada a inconstitucionalidade dos dispositivos impugnados, dianteda sua incompatibilidade com os artigos 61, 1, II, "d"\ e 134, caput, daCR.12. E 0 relatorio,

    13. A requerente possui legitimidade ativa para a proposituradesta acao, nos termos do art. 103, IX, da CR, e da jurisprudencia do STF(ADI nO2.9036). A ANADEP e uma entidade de c1asse ambito nacional eha pertinencia tematica entre as suas atividades institucionais e osinteresses discutidos nessa demanda, que envolvem a organizacaoestrutural da Defensoria Publica e 0 exercicio das suas atribuicoes pordefensores publicos de carreira.5 "ArL 61. A iniciativa das leis cornplememares e ordinarias cabe a qualquer membro ou Comissao da

    Camara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da Republica, aoSupremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da Republica e aoscidadaos, na forma enos casos previstos nesta Constituicao. 10 - Sao de iniciativa privativa do Presidente da Republica as leis que:II - disponham sobre:d) organizacao do Ministerio Publico e da Defensoria Publica da Uniiio, bern como normas gerais paraa organizacao do Ministerio Publico e da Defcnsoria Publica dos Estados, do Distrito Federal e dosTerrit6rios;"6 Veja-se excerto da ementa da decisao: "A Associacdo Nacional dos Defensores Publicos (ANADEP)dispiie de legitimidade ativa 'ad causam' para fazer instaurar processo de can/role normativoabstrato em face de alas estatais. como a legislaciio pertinente a Defensoria Publica, cujo conteudoguarde relacdo de pertinencia tematica com asfinalidades institucionais dessa entidade de classe deambito nacional" (ADI 2.903/PB, ReI. Min. Celso de Mello, DJE 19/09/2008).

  • 5/11/2018 Parecer Da PGR Na Adin 4270

    5/11

    MINISTERIO PlJBLlCO FEDERAL

    5DI4.27014. No merito, 0 pedido e procedente.15. No plano formal, a Constituicao estadual exorbitou 0 limitesuplementar da competencia concorrente do Estado-membro para disporsobre regras gerais da Defensoria Publica (art. 24, XIII, da CR).16. Nesse sentido e a posicao da Corte firmada na ADI n?2.903, euja ementa e do seguinte teor:

    "ACAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE(...) LEGISLA

  • 5/11/2018 Parecer Da PGR Na Adin 4270

    6/11

    MINISTERIO P(JBLICO FEDERAL

    6DI4.270

    hipoteses referidas no art. 24 da Constituicao, a UniaoFederal nao dispoe de poderes ilimitados que Ihepermitam transpor 0 ambito das normas gerais, para,assim, invadir, de modo inconstitucional, a esfera decompetencia normativa dos Estados-membros, nao emenos exato, de outro, que 0 Estado-membro, emexistindo normas gerais veiculadas em leis nacionais(como a Lei Organica Nacional da DefensoriaPublica, eonsubstanciada na Lei Complementar nO80/94), nao pode ultrapassar os limites da competenciameramente suplementar, pois. se tal oeorrer. 0diploma legislativo estadual incidini. diretamente, novicio da inconstitucionalidade. A edicao, pordeterminado Estado-mernbro, de lei que contrarie,frontalrnente, criterios rrurnmos legitimamenteveiculados, em sede de normas gerais, pela UniaoFederal ofende, de modo direto, 0 texto da CartaPoHtica. Precedentes. ORGANIZACAo DADEFENSORIA PUBLICA NOS ESTADOS-MEMBROS - (...) - NORM AS GERAIS, QUE,EDITADAS PELA UNIAo FEDERAL. NOEXERCicIO DE COMPETENCIACONCORRENTE. NAo PODEM SERDESRESPEITADAS PELO ESTADO-MEMBRO -LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL QUE FIXACRITERIOS DIVERSOSINCONSTITUCIONALIDADE. (...) Einconstitueional lei complementar estadual. que, (...),nao observa as normas de caniter geral, institutivas dalegislaao fundamental ou de princfpios. previa evalidamente estipuladas em lei complementar nacionalque a Uniao Federal fez editar com apoio no legitimoexercicio de sua competeneia eoncorrente. (...)". (ADI2.903, ReI. Min. Celso de Mello, DJ-e 177, PUBLIC19/09 /2008) (grifou-se).

    17. No que tange ao aspecto materia], 0 art. 104 da Constituicaodo Estado de Santa Catarina contraria frontalmente 0 disposto no art. 134,caput e 1, da Constituicao Federal.18. Na ja mencionada ADI 2.903, 0 Supremo Tribunal Federalressaltou 0 carater institucional da Defensoria Publica:

  • 5/11/2018 Parecer Da PGR Na Adin 4270

    7/11

    MINISTERIO PUBLICO FEDERAL7DI4.270

    "( ...) DEFENSORIA PUBLICA - RELEV A.NCIA -INSTITUIC;Ao PERMANENTE ESSENCIAL AFUNC;Ao JURISDICIONAL DO ESTADO - 0DEFENSOR PUBLICO COMO AGENTE DECONCRETIZAC;Ao DO ACES SO DOSNECESSIT ADOS A ORDEM JURIDICA. - ADefensoria Publica, enquanto instituicao permanente,essencial a funcao jurisdicional do Estado, qualifica-se como instrumento de concretizacao dos direitos edas liberdades de que sao titulares as pessoas carentese necessitadas. E por essa razao que a DefensoriaPublica nao pode (e nao deve) ser tratada de modoinconseqiiente pelo Poder Publico, pois a protecaojurisdicional de rnilhoes de pessoas - carentes edesassistidas -, que sofrem inaceitavel processo deexclusao juridica e social, depende da adequadaorganizacao e da efetiva institucionalizacao desseorgao do Estado. - De nada valerao os direitos e denenhum significado revestir-se-ao as liberdades, se osfundamentos em que eles se ap6iam - alern dedesrespeitados pelo Poder Publico ou transgredidospor particulares - tambern deixarem de con tar com 0suporte e 0 apoio de urn aparato institucional, comoaqueJe proporcionado peJa Defensoria Publica, cujafuncao precfpua, por efeito de sua pr6pria vocacaoconstitucional (CF, art. 134), consiste em darefetividade e expressao concreta, inclusive medianteacesso do lesado a jurisdicao do Estado, a essesmesmos direitos, quando titularizados por pessoasnecessitadas, que sao as reais destinatarias tanto danorma inscrita no art. 5, inciso LXXIV, quanta dopreceito consubstanciado no art. 134, ambos daConstituicao da Republica. ( ... )".

    19. o direito de acesso a prestacao jurisdicional e elementoessencial ao Estado Dernocratico de Direito. Sem a garantia efetiva deacesso a Justica, a proclamacao de todos os demais direitos tornar-se-iamera peca retorica, pois 0 cidadao nao teria como protege-los diante da suaviolacao, sobretudo quando esta fosse perpetrada pelo proprio Estado.

  • 5/11/2018 Parecer Da PGR Na Adin 4270

    8/11

    MINISTERIO PlJBLlCO FEDERAL

    20. E nesse sentido que Canotilho afirma que 0 direito deacesso a Justica configura urn dos subprincipios em que se desdobra 0principio do Estado de Direito:

    "Terce ira dimensao do estado de direito', 'pilarfundamental do estado de direito', 'coroamento doestado de direito', sao algumas das express6esutilizadas para salientar a importancia no estado dedireito, da existencia de uma protecao juridico-judiciaria individual sem lacunas."?

    21. Karl Larenz, na mesma linha, ressalta que a possibilidadede 0 acesso pelo cidadao a orgaos independentes, para tutela de direitoscontra 0 Estado, constitui urn dos pilares basicos do Estado de Direito:

    "Urn dos principios fundamentais da construcao doEstado de Direito e a concessao de uma ampla tutelajuridica. Com isso, nao se quer indicar apenas aconcessao de protecao aos cidadaos em suas relacoesentre si, que e algo que desde ha seculos fazem osEstados, os senhores feudais, ou os municipios, mas,antes de tudo, a tutela juridica dos cidadaos e dascorporacoes diante dos atos de soberania estatal. Se noEstado de Direito todos os orgaos do Estado estaovinculados a lei e ao Direito, tern de existir umaultima instancia que decida com carater definitivosobre 0 que nesse Estado e Direito e 0 que nao e . Sehouvessem que decidi-Io as mesmas instancias estataisque realizaram os atos de soberania, seriam jufzes deseus proprios assuntos, 0 que manifestamente trariaconsigo 0 perigo de sua predisposicao a favor de suapr6pria decisao e deixaria sem defesa 0 cidadao, Purisso, para que 0 Estado de Direito no "vire papel' e severifique na pratica cotidiana, e necessario 0 controlede todos os atos do Estado, que constituam onus paraos cidadaos, por tribunais que sejam independentes dainstancia cujo ato se deva revisar, que nao possamreceber nenhum tipo de instrucoes sobre 0 juizo que

    7 Grifo no original. Diretto Constitucional e Teoria da Constituiciio, Coimbra: Ed. A.lmeidina, 1998,p.265.

  • 5/11/2018 Parecer Da PGR Na Adin 4270

    9/11

    MINISTERIO PUBLICO FEDERAL9DI4.270

    devem emitir e que decidam somente conforme a lei eao Direito.:"

    22. No Brasil, a tutela do direito de amplo acesso a Justicaremonta a Constituicao de 1946, primeira a preyer explicitamente 0principio da indeclinabilidade de jurisdicao. A Constituicao de 1988,marco na reconstrucao do Estado de Direito no pais, atribuiu excepcionalrelevo ao direito ao acesso a Justica, estabelecendo que "a lei nGO excluirada apreciacdo do Poder Judicidrio lesiio ou ameaca a direito" (art. 5,XXXV, CF).23. Forte tambern no principio de que os direitos fundamentaistern carater universal, a Constituicao estabeleceu, no mesmo art. 5,LXXIV, que "0 Estado pres tara assistencia juridica integral e gratuitaaos que comprovarem insuficiencia de recursos". Essa Corte, na materia,tern 0 seguinte precedente:

    'CONSTITUCIONAL. A

  • 5/11/2018 Parecer Da PGR Na Adin 4270

    10/11

    MINISTERIO PUBLICO FEDERAL10DI4.270

    provas e titulos, opera como garantia daindependencia tecnica da instituicao, a se refletir naboa qualidade da assistencia a que fazem jus osestratos mais economicamente debeis da coletividade.4. Acao direta julgada procedente." (ADI 3.700/RN,ReI. Min. Ayres Britto, DJe-043, DIVULG 05-03-2009) (grifou-se)

    24. Os direitos humanos possuem face dupla na atualidade: deurn lado, preservam sua condicao de defesa do particular em face doEstado; e, de outro, operam em dimensao objetiva, "isto e, comoimperativo de tutela, exigindo uma atuacdo ativa (positiva) do Estado,obrigando os poderes publicos a agirem deforma adequada na realizacdoefetiva (protecdo eficiente) dos direitos fundamentais mediante urnconjunto de prestaciies "9.

    25. No Cornentario Geral 3110, no qual se aborda "A Naturezadas Obrigacoes Legais Gerais Impostas aos Estados- Parte do Pacto", 0Cornite de Direitos Humanos das Nacoes Unidas disse, no paragrafo 15:

    "15. 0 paragrafo 3 do artigo 2 do Pacto requer, aolade da efetiva protecao dos direitos previstos noPacto, que os Estados-parte tambern assegurarem queos individuos tenham remedies acessiveis e efetivospara vindicar tais direitos. Tais rernedios juridicosdeveriam ser apropriadamente adaptados de modo alevar em conta a especial vulnerabilidade de certascategorias de pessoas, incluindo, em particular,criancas."

    26. Portanto, se cabe ao Estado assegurar aos hipossuficientesassistencia judiciaria, e preciso que 0 faca de forma eficiente. E, como jaP ; J9 Luciano Fe1dens. 0 dever estatal de investigar: imposiciio decorren Ie dos direitos humanos e

    fundamentais como imperative de tutela. In LIMITES CONSTITUCIONAIS DA INVESTlGA

  • 5/11/2018 Parecer Da PGR Na Adin 4270

    11/11

    MINISTERIO PlJBLICO FEDERAL11DI4.270

    assentado por esse STF, no precedente acima referido, a medida adequadapara tanto e a estruturacao da Defensoria Publica em cargos de carreira,providos mediante concurso publico.27. Portanto, 0 legislativo catarinense contrariou a Constituicaoda Republica ao dispor sobre a funcao institucional da Defensoria Publica,atribuindo a advogados dativos, permanentemente, a atividade estatal deprestacao de assistencia juridica integral e gratuita aos cidadaoshipossuficientes.

    Ante 0 exposto, 0 parecer e pela procedencia do pedido.Brasilia, 3 .0 de setembro de 2011.

    / JuDEBORAH MACEDO DU~~T DE BRITIO PEREIRAVICE-PROCURADORA-GERAL D PUBLICA

    APROVO: