Protagonismo Sustentabilidade

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    PROTAGONISMOE SUSTENTABILIDADE

    ORGANIZAES DA SOCIEDADE CIVIL:

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    PROTAGONISMO

    E SUSTENTABILIDADE

    ORGANIZAES DA SOCIEDADE CIVIL:

    Organizao: Domingos Armani

    Ilustraes: Cris Eich

    Realizao: Instituto C&A

    Recife, 2013

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    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Organizaes da sociedade civil: protagonismo e sustentabilidade /textos de Domingos Armani... [et al.]; organizao deDomingos Armani; ilustraes de Cris Eich.

    1. ed. Barueri, SP: Instituto C&A, 2013.

    Vrios autores.Bibliografia.ISBN 978-85-64356-22-1

    1. Ao social 2. Avaliao 3. Desenvolvimento institucional4. Organizaes da sociedade civil Brasil5. Sustentabilidade I. Armani, Domingos.

    II. Eich, Cris.

    13-10707 CDD-060

    ndices para catlogo sistemtico:1. Organizaes da sociedade civil 060

    Instituto C&A

    Diretor-executivo:Paulo Castro

    Gerente da rea Desenvolvimento Institucionale Comunitrio: Janaina Jatob

    Coordenadora do programa DesenvolvimentoInstitucional: Cristiane Felix

    Assistente de projetos: Daniela Paiva

    Consultor do programa: Domingos Armani

    Assesoria tcnica: Dalva Correia

    Sistematizao da srie de encontros DilogoAmpliado: Daza Amador

    Organizaes da Sociedade Civil:

    protagonismo e sustentabilidade

    Coordenao editorial: Cristiane Felix

    Organizador: Domingos Armani

    Sistematizao dos Dilogos Ampliados:Daza Amador

    Comit editorial: Alais vila, Cristiane Felix,Domingos Armani, Janaina Jatob,Sandra Mara Costa

    Reviso: Beatriz Vasconcelose Mauro de Barros

    Ilustraes: Cris Eich

    Projeto grfico e editorao: Studio 113

    CTP e impresso: Gset Grfica

    Tiragem: 1.000 exemplares

    Recife, 2013

    Organizaes da Sociedade Civil: protagonismo e sustentabilidade um compndio de artigos que trata daexperincia do programa Desenvolvimento Institucional do Instituto C&A.

    Este trabalho est licenciado sob uma Licena CreativeCommons Atribuio-Uso No Comercial-Compartilhamento pelamesma Licena 3.0 Unported. Para ver uma cpia desta licena, visite http://creativecommons.org/licenses/

    by-nc-sa/3.0/ ou envie uma carta para CreativeCommons, 171 Second Street, Suite 300, San Francisco, California 94105, USA

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    Alas vila

    Ana Cristina Queiroz (AEC-PE)

    Anderson Giovani da Silva (ICom)

    Antnio Ribeiro (Move)

    Brigitte Louchez (Barraca da Amizade)

    Cristiane Felix

    Dalva Correia

    Daniel Ferreira (Cecor)

    Daniel Brando (Move)

    Dbora Aparecida Arajo Galli (Adeis)

    Deborah Baesse (ICE-Maranho)

    Domingos Armani

    Elionalva Sousa Silva (Observatrio de Favelas)

    Erick Persson Souza (ICom)

    Franklin Roosevelt de Castro (Barraca da Amizade)

    Janaina Jatob

    Janice Matos de Oliveira (Adeis)

    Jorge Luiz Barbosa (Observatrio de Favelas)

    Juliana da Paz (AEC-PE)

    Luiz Alfredo Lima (ICE - Maranho)

    Maria Helena Spinelli P. Escovedo (Aces)

    Mariana de Arajo e Silva (Observatrio de Favelas)

    Meri Pauli Fiates (Alfa Gente)

    Meyrieli de Carvalho Silva (Aces)

    Renata Machado Pereira (ICom)

    Roberto de Almeida (AIC)

    Saritta Falco Brito (AEC-PE)

    Tnia Crespo (Move)

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    SUMRIO

    7 ApresentaoPaulo Castro

    Captulo 1 | Protagonismo e sustentabilidade das OSCs

    13 OSCs no Brasil: a relevncia dos atoresDomingos Armani

    Captulo 2 | Formas do fazer

    37 Uma metodologia para o aprendizadoAlais vila (sistematizao: Daza Amador)

    Captulo 3 | Referenciais

    61 O desenvolvimento institucional como chave de leitura das organizaesDomingos Armani

    85 Comunicao e desenvolvimento institucional: construindo sentidospara uma prtica em favor da causaCristiane Felix

    105 Monitoramento: a arte de mergulhar para descobrir o invisvelDalva Correia

    Captulo 4 | Prtica

    126 Observatrio de Favelas: a construo de si com o outroJorge Luiz Barbosa, Elionalva Sousa Silva e Mariana de Arajo e Silva

    140 Desenvolvimento institucional para desenvolvimento comunitrio:o caso do Instituto Comunitrio Grande Florianpolis (ICom)Anderson Giovani da Silva, Erick Persson Souza e Renata Machado Pereira

    160 Instituto de Cidadania Empresarial do Maranho: desenvolvimentoinstitucional em uma dcada de trajetriaDeborah Baesse e Luiz Alfredo Lima

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    176 Comunicao, identidade e dilogo com a imprensa:a experincia da Associao Imagem Comunitria (AIC)Roberto de Almeida

    188 A relevncia dos processos de gesto e comunicao nodesenvolvimento institucional: o caso da AdeisDbora Aparecida Arajo Galli e Janice Matos de Oliveira

    206 Identidade e governana no desenvolvimento institucional daBarraca da AmizadeBrigitte Louchez e Franklin Roosevelt de Castro

    222 O desenvolvimento institucional como produtor de sentido das prticas:o Projeto FacesMaria Helena Spinelli P. Escovedo e Meyrieli de Carvalho Silva

    232 A o empresrio falou: Isso me interessa!. A influncia do Lidera noempoderamento da governana institucional e na identidade do

    Instituto Ao Empresarial pela CidadaniaAna Cristina Queiroz, Juliana da Paz e Saritta Falco Brito

    256 Sociedade Alfa Gente: desafios da identidade e da gestoMeri Pauli Fiates

    266 Protagonismo juvenil rural nos processos de comunicao doCentro de Educao Comunitria RuralDaniel Ferreira

    Captulo 5 | Uma agenda

    281 O programa Desenvolvimento Institucional na perspectiva da avaliaoDaniel Brando, Antnio Ribeiro e Tnia Crespo

    293 PosfcioJanaina Jatob

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    NO ALICERCE DA DEMOCRACIA

    APRESENTAO

    Foi ainda em 2010, quando entrvamos no segundo ano, dentro deum ciclo trienal de apoio ao desenvolvimento institucional de organizaessociais, que a gestao deste livro comeou. A proximidade com as 11 ins-tituies com as quais atuvamos por meio do programa DesenvolvimentoInstitucional desde 2009, os dilogos animados com seus gestores e tcnicos

    e as descobertas do monitoramento de cada projeto nos impeliam a isso,dizendo-nos, a todo momento, que estvamos num caminho bom e talvezpioneiro.

    Bom porque pela primeira vez acompanhvamos, de modo sistem-tico, os resultados do emprego de uma metodologia de apoio ao desenvol-vimento institucional de organizaes sociais criada a partir de quase duasdcadas de experincia acumulada pelo Instituto C&A.

    Bom tambm porque a metodologia desenhada se mostrava adequa-da s organizaes que a experimentavam, concorrendo para o cumprimen-to do objetivo do programa: apoiar processos e iniciativas que promovam

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    o desenvolvimento institucional de organizaes da sociedade civil comoestratgia para o desenvolvimento social.

    justamente na opo poltica do Instituto C&A de promover o de-senvolvimento institucional de organizaes da sociedade civil como estra-tgia para o desenvolvimento social que mora o argumento do pioneirismo.

    Desde muito cedo, na lida com instituies sem fins lucrativos dedi-cadas educao de crianas e adolescentes de todo o Brasil, o InstitutoC&A percebeu a relao direta do fortalecimento das organizaes sociaiscom a capacidade de elas gerarem transformao social e prosperarem emsuas misses.

    Em resposta a esta leitura da realidade, superamos a barreira contra

    o apoio s chamadas aes-meio nas instituies aquelas que no estona ala de frente do seu trabalho, porm existem para viabilizar que a aode campo acontea e passamos a fazer aportes consistentes em projetosde planejamento estratgico e de planejamento de comunicao, de mobili-zao de recursos e das atividades de gesto.

    A amarrao das pontas veio em meados dos anos 2000, na forma-tao do programa Desenvolvimento Institucional, cujos princpios preco-nizam que as organizaes sociais sejam consideradas de forma integral (e

    no fragmentada), que preciso respeitar sua singularidade e que elas sodetentoras de capacidade de transformao. Assim consolidamos nossa po-sio entre os primeiros e at hoje poucos investidores sociais privadosa assumir no Brasil o desenvolvimento institucional como linha de ao.

    Mas esta uma histria que este livro vai contar aos detalhes, ora emcaptulos de abordagem conceitual e reflexiva, ora em captulos que eviden-ciam, por meio de estudos de caso, as dimenses que consideramos funda-mentais ao desenvolvimento das organizaes sociais: a identidade institu-cional, a ao social, a gesto e a mobilizao de recursos. A propsito, os

    relatos de experincia contidos neste livro foram preparados pelas prpriasorganizaes sociais que viveram at 2011 o primeiro ciclo do programa.

    Com esta publicao, esperamos consumar uma dupla inteno: di-fundir os conhecimentos tericos e prticos do programa DesenvolvimentoInstitucional em seu ciclo inicial e fomentar outros investidores sociais pri-vados a direcionar recursos para a rea.

    Como pano de fundo de tudo isso, est nossa crena no desenvolvi-mento da sociedade civil e de suas institucionalidades, sobretudo daquelasque atuam na garantia e defesa de direitos, como condio-chave para ofortalecimento da democracia.

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    A valorizao da democracia um discurso evocado por todos aque-les que comungam conosco de ideais de igualdade, liberdade e justia so-

    cial. A aposta no desenvolvimento institucional tambm uma forma decriar condies para que a democracia possa de fato florescer.

    Paulo CastroDiretor-executivo do Instituto C&A

    ASPIRAO

    Garantia do direito educao de crianas

    e adolescentes, para uma sociedadeparticipativa, justa e sustentvel.

    MISSO DO INSTITUTO C&A

    Promover a educao de crianas eadolescentes das comunidades onde a C&Aatua, por meio de alianas e do fortalecimentode organizaes sociais.

    NO ALICERCE DA DEMOCRACIA

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    PROTAGONISMO E

    SUSTENTABILIDADE DAS OSCs

    CAPTULO I

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    OSCs NO BRASIL:A RELEVNCIA DOS ATORES

    Domingos Armani

    O campo das Organizaes da Sociedade Civil (OSCs) no Brasil tempassado por significativas mudanas desde os anos 1970/80, tanto do pon-to de vista da quantidade, diversidade, terminologia e perfil organizativo,como em termos da sustentabilidade do setor e de sua relevncia no proces-so social do pas.

    Organizao da Sociedade Civil tornou-se a nova denominao gen-rica para o conjunto amplo e diversificado de organizaes sem fins lucrati-vos presentes na rea social. importante refletir sobre os sentidos disso eas implicaes para o futuro do setor como um todo.

    Estas organizaes ganham relevncia e vivem oportunidades e desa-fios relativos a cada ciclo histrico, ainda que cada subsetor ONGs, mo-vimentos sociais, organizaes comunitrias, institutos, etc. e organizaoem particular o faam a seu modo.

    Com as mudanas de ambiente cultural em nvel internacional vi-gentes desde meados dos anos 1990 em relao ao social , o foco de

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    ateno das relaes de cooperao ao desenvolvimento passou do apoio sorganizaes para o financiamento de aes. Vale lembrar que este ambien-

    te est impregnado por princpios de agilidade, pragmatismo, funcionalida-de e resultados de curto prazo.Com isso, muitas vezes perdeu-se de vista a relevncia social e poltica

    dos atores, como sustentculos de um tecido social fundamental para umasociabilidade cidad, para defender e promover direitos, para aprofundar ademocracia e para favorecer e inspirar novos paradigmas de desenvolvimento.

    O nome das coisas e a coisa dos nomesOs termos para designar campos de identidade no setor social, sejam

    eles mais especficos ou mais genricos, tm variado bastante nas ltimasdcadas no Brasil.

    Tais mudanas indicam novos contextos, mas tambm revelam deslo-camentos de sentido e de posicionamento dos sujeitos.

    Centros de Educao Popular, ONGs, Terceiro Setor, OrganizaesSem Fins de Lucro e Organizaes da Sociedade Civil so todos termos so-cialmente construdos, cujas identidades individuais e coletivas so forjadasno campo social brasileiro.

    No contexto do regime militar, entre os anos 1970 e 1980, por exem-plo, os novos grupos e organizaes envolvidos no trabalho social deno-minavam-se Centros de Educao Popular ou Centros de Assessoria. Erauma designao possvel para indicar o sentido um ponto de referncia ede aglutinao (centro) de aes de cunho popular e educativo em umcontexto em que a semiclandestinidade era um fator de segurana.

    Apesar da relativa generalidade, estes termos tinham a qualidade deafirmar de forma positiva o que eram essas organizaes e a que vinham:ao se referir ao educativo (Educao Popular), revelavam sua atitude e

    compromisso com a educao emancipatria inspirada por Paulo Freire;pelo recorte social (Popular), demonstravam seu lugar, seu pblico, seucompromisso e, acima de tudo, o ponto a partir do qual liam a realidade.

    Os Centros, pelo prprio nome e tambm pela cultura poltica quematerializavam, carregavam uma ideia implcita de provisoriedade, de le-veza e de informalidade, onde o carter institucional no era uma questo(LANDIM, 1998, p.29).

    Com o advento da democratizao entre os anos 1980 e 1990 ea complexificao da sociedade civil e da sociedade como um todo, estestermos foram cedendo lugar adoo da referncia ONG. Esta mudana

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    tinha muitos sentidos: Organizao No Governamental era um termo in-ternacional para identificar organizaes autnomas e sem fins de lucro na

    sociedade civil comprometidas com a defesa de causas sociais relevantes.Era assim que os centros brasileiros eram definidos internacionalmente.Esta conexo internacional exerceu enorme peso nesta mudana, j

    que boa parte dos Centros mantinha relaes densas com as ONGs euro-peias, algumas delas j desde o incio dos anos 1970. Este dilogo intenso poca entre os Centros e as ONGs europeias evidenciou que se tratava domesmo tipo de ator social, favorecendo o autorreconhecimento das organi-zaes brasileiras. Ento: ONGs l, ONGs c.

    Alm desse alinhamento com a emergncia internacional das ONGs nos

    anos 1980, a adoo e a disseminao do termo ONG no Brasil tinham tam-bm um sentido poltico. Se antes, no contexto do regime militar, era inviveluma ao aberta de organizao e mobilizao social da o acento educativodos Centros , agora se tornara no s necessrio, mas tambm possvel, umativismo social mais pblico associado a novas formas de insero profissional.

    Assumir-se como ONG, naquele contexto, significava posicionar-seno campo do ativismo poltico vinculado ao aprofundamento da democra-cia, da justia e da equidade social. Era posicionar-se como ator poltico no

    espao pblico.As ONGs, em contraste com os Centros, vinham para ficar, represen-tando um processo de institucionalizao e uma identidade comum: Empouco mais de uma dcada, construram uma profisso sem nome e fizeramum nome coletivo atravs do qual passaram a se reconhecer: ONG (LAN-DIM, 1998, pp. 29).

    Alguns dos pontos de referncia simblicos da expresso pblica des-ta mudana foram a criao da Associao Brasileira de Organizaes NoGovernamentais (Abong), em 10 de agosto de 1991, precedida do 1 En-

    contro Internacional de ONGs e Agncias do Sistema das Naes Unidas(no Rio de Janeiro) e a realizao da chamada ECO 92 a Conferncia dasNaes Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento , entre 3 e 14de junho de 1992, tambm no Rio de Janeiro.

    Os anos 1990 trouxeram grandes mudanas ao cenrio social brasi-leiro. Uma delas, a emergncia do termo Terceiro Setor, este tambm umadenominao oriunda do contexto internacional, especialmente norte-ame-ricano (Third Sector): Surge no mundo um terceiro personagem. Alm doEstado e do mercado, h um terceiro setor (FERNANDES, 1994, pp. 19).

    O termo Terceiro Setor entrou em voga a partir do Programa Co-

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    munidade Solidria, j no incio do governo Fernando Henrique Cardoso(1995). Pode-se arguir que o programa era, de certa forma, tributrio de

    algumas ideias-fora oriundas da Ao da Cidadania Contra a Fome, aMisria e Pela Vida (mais conhecida como a Campanha contra a Fome,iniciada em 1993 pelo socilogo Herbert Jos de Souza, o Betinho), comoparticipao cidad, voluntariado, parceria, solidariedade e responsabilida-de social (LANDIM, 1998; ALMEIDA, 2006).

    Terceiro Setor, formalmente, abrange todas as organizaes que nopertencem ao Primeiro Setor e ao Segundo Setor, i. e., ao Estado e ao Mer-cado. (...) Porm a discusso do fim pblico aqui apenas comea. Em prin-cpio pode-se dizer que tm fins pblicos aquelas organizaes do Terceiro

    Setor que produzem bens ou prestam servios de carter pblico ou deinteresse geral da sociedade (FRANCO, 1998).

    A designao Terceiro Setor, a partir do apoio governamental e daadeso crescente de setores importantes da sociedade civil, ganhou legitimi-dade e disseminou-se amplamente.

    Sua vocao abrangente tambm favoreceu a adeso de um amploespectro de organizaes. Isso foi reforado pelo fato de que o termo ONG,o designativo mais genrico ento, perdia seu apelo de termo guarda-chuva,

    uma vez que era crescentemente usado e percebido como vinculado a umgrupo determinado de organizaes militantes no social.No final dos anos 1990, um renovado tipo de protagonismo em-

    presarial passou a ocupar um lugar de destaque no interior do TerceiroSetor (ALMEIDA, 2006, pp. 120). Tratava-se do ascendente movimento daresponsabilidade social que vinha se mobilizando e se institucionalizandono pas. Momentos importantes neste sentido foram a criao, em 1995,do Grupo de Institutos, Fundaes e Empresas (Gife), focado na promoodo conceito de investimento social privado e, em 1998, do Instituto Ethos,

    voltado promoo da responsabilidade social empresarial.Apesar de seu apelo abrangente, em poucos anos Terceiro Setor ga-

    nhou uma significativa ambivalncia: se, por um lado, se mantinha comoreferncia genrica para largas parcelas do setor social (utilizada principal-mente pelo campo das organizaes prestadoras de servios, pelo governo,pelo setor empresarial e pelas universidades), por outro, passou a ser asso-ciado de forma direta ao subcampo dos institutos e fundaes empresariaise entidades correlatas.

    Uma limitao indicada por vrios autores no debate sobre o TerceiroSetor que o termo, por um lado, traria a ideia de um setor altrusta, vol-

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    tado a fazer o bem e livre de diferenas e conflitos, implicando certa despo-litizao, e, por outro, poderia favorecer o risco de se perder o perfil crtico

    e poltico inerente condio de ser parte da sociedade civil (DAGNINO,2006; EDWARDS, 2009; GOHN, 2000).Finalmente, nos tempos atuais, ganha cada vez mais fora e uso dis-

    seminado esta nova terminologia de alcance genrico: Organizaes da So-ciedade Civil (OSCs).

    O governo brasileiro usa o termo OSC, assim como crescentementea ONU, o Banco Mundial e a Unio Europeia, entre outros organismosinternacionais1.

    O termo retoma a referncia sociedade civil, to em voga nos anos

    1980, tanto na rea social como nos debates acadmicos. Ele apresentaconotao geral, baseia-se em conceito reconhecido, ainda que polissmico(sociedade civil), evita denominaes negativas (no governamentais, nolucrativas) e tem granjeado ampla adeso nos mais diferentes subcampos deorganizaes atuantes no setor social.

    A ancoragem na sociedade civil, especialmente, d uma densidade ticae poltica ao termo OSC, uma vez que indica no somente um lugar, umponto de referncia na sociedade, mas tambm seu carter de ente autnomo

    na sociedade, com fins pblicos, com voz prpria e capacidade de ao inde-pendente, com um sentido nitidamente poltico (TEODSIO, 2008)2.Falar em sociedade civil referir a:

    Uma grande heterogeneidade de atores civis (incluindo atores con-servadores), com formatos institucionais diversos (...), e uma grande

    pluralidade de prticas e projetos polticos (...). um conjunto he-terogneo de mltiplos atores sociais, com frequncia opostos entresi, que atuam em diferentes espaos pblicos e que, via de regra, tm

    seus prprios canais de articulao com os sistemas poltico e econ-mico(DAGNINO, 2006, pp. 23).

    Organizaes da Sociedade Civil remetem, assim, ao lugar, aos ato-res, s vises e s agendas presentes no processo social no pas.

    justamente esta relao entre OSCs, direitos e democracia queabordaremos a seguir.

    1 O termo OSC como utilizado em nvel internacional (CSO em ingls) pela ONU, Unio Europeia e Banco Mundial inclui sindicatos e igrejas.

    2 Este propsito das OSCs de contribuir para fins pblicos j havia sido reconhecido e incorporado formalmente pela Lei das Oscips em 1999.

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    OSC: fator de vitalidade e qualidade da democraciaAlgum poderia imaginar a democracia que temos e os direitos j

    assegurados no Brasil sem o protagonismo das OSCs? Dificilmente...Todo o nosso cotidiano regido por uma trama de leis, cdigos deconduta e valores assentada nos direitos recprocos que nos unem em umanica comunidade tico-poltica, a qual torna possvel nossa condio decidados, apesar da potencial conflituosidade da vida em sociedade.

    A democracia moderna tem justamente como especificidade o reco-nhecimento e legitimao do conflito e a negao de suprimi-lo de formaautoritria (MOUFFE, 2007, pp. 36-37).

    na relao com a perspectiva dos direitos e com a qualidade da

    democracia que a existncia e protagonismo das OSCs ganham sentido erelevncia.

    A democracia, este arranjo imperfeito e sempre inconcluso que nospossibilita viver em sociedade e buscar incessantemente seu aperfeioamen-to, baseia-se num pilar fundamental os direitos humanos universais cons-titucionalmente reconhecidos, os quais estabelecem a dignidade humanacomo parmetro tico da vida em sociedade.

    No possvel pensar em direitos humanos sem democracia, tampou-

    co a democracia seria possvel sem o referencial tico dos direitos.

    (...) sem o reconhecimento e a proteo efetiva dos direitoshumanos, no h democracia; sem esta, no existem as condi-es mnimas para solucionar pacificamente os conflitos entreindivduos, entre grupos e entre essas grandes comunidades tra-dicionalmente rebeldes e tendencialmente autocrticas que soos Estados, mesmo quando so democrticos em relao aosseus prprios cidados (BOBBIO, 2003, p.197).

    A Declarao de Viena (1993)3estabeleceu a interdependncia entreos valores dos direitos humanos, da democracia e do desenvolvimento, sen-do a legitimada a noo da indivisibilidade dos direitos humanos, cujospreceitos devem se aplicar tanto aos direitos civis e polticos quanto aosdireitos econmicos, sociais e culturais.

    Segundo a feliz sntese da relao entre direitos e democracia de Bo-

    3 A Declarao de Viena o documento final da II Conferncia Mundial sobre Direitos Humanos, realizada entre 14 e 25 de junho de 1993,em Viena, ustria. Ver a Declarao de Viena, na ntegra, na pgina web: www.dhnet.org.br.

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    aventura de Souza Santos: Temos o direito a sermos iguais quando a dife-rena nos inferioriza. Temos o direito a sermos diferentes quando a igual-

    dade nos descaracteriza (SANTOS, 2003, p.13).Mas o que hoje so direitos formais inquestionveis um dia foramapenas condies concretas vividas como vulnerabilidades, privaes enegaes da dignidade humana. E, como bem sabemos, o reconhecimentoformal de um direito no garantia de sua plena efetivao.

    Entre uma coisa e outra a privao, o direito e sua efetivao htodo um complexo processo social e poltico, o qual transforma necessida-des e carncias de determinados grupos e comunidades em demandas so-ciais na agenda pblica, possibilitando que a mobilizao social e o debate

    levem, finalmente, ao reconhecimento de um novo direito e, eventualmente,a novas polticas pblicas que lhe conferem materialidade e efetividade.

    Assim foi com o Sistema nico de Sade (SUS), promovido desde osanos 1970 pelo Movimento da Reforma Sanitria, nascido no meio acad-mico, mas que conseguiu mobilizar amplos setores da sociedade civil e degrupos polticos de oposio ao regime militar, os quais tiveram importan-tes vitrias na 8 Conferncia Nacional de Sade, em 1986, findando porser reconhecido constitucionalmente como um sistema de acesso pblico,

    gratuito e universal sade, em 1988 (BRASIL, 2006).O mesmo pode ser dito do Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA),oriundo da mudana gradual de viso da sociedade sobre a criana e o ado-lescente nos anos 1980, fruto de uma forte mobilizao social de base amplae diversificada, a qual d origem ao Frum Nacional Permanente de Entida-des No Governamentais de Defesa dos Direitos da Criana e do Adolescente(Frum DCA). No processo constituinte, este movimento colheu mais de seismilhes de assinaturas em prol da criao de um artigo constitucional queassegurasse os direitos humanos de crianas e adolescentes. Em 1990, foi por

    fim promulgada a Lei n 8.069 o ECA , assegurando o atendimento dosdireitos de crianas e adolescentes no Brasil (CENDHEC, 1999).

    Estas legislaes SUS e ECA so hoje parmetros formais e insti-tucionais inovadores na sua abordagem, assegurando direitos de cidadania.Ambas tiveram na sua origem um importante pilar nas movimentaes dasociedade civil e contam hoje com esta mesma sociedade civil para sua de-fesa e aperfeioamento.

    Neste processo de construo social do que poder vir a ser um di-reito reconhecido, as Organizaes da Sociedade Civil tm uma funo im-portante.

    OSCs NO BRASIL: A RELEVNCIA DOS ATORES

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    Elas exercem um papel social de destaque na agregao de interessesde grupos e populaes que experimentam privaes e carncias, transfor-

    mando necessidades e vulnerabilidades em demandas canalizadas ao siste-ma social e poltico. Isto acontece normalmente por via do associativismode grupos comunitrios, associaes, movimentos populares, sindicatos,ONGs e organizaes de assistncia, graas sua presena, representati-vidade e capilaridade no campo social. Esse associativismo contribui paraque novos atores ganhem voz e visibilidade na esfera pblica, enriquecendoa arena de debates e tornando-a mais permevel a novos atores, temas eabordagens.

    As OSCs do especial contribuio ao processo de educao cvica

    e cidad da populao, informando e conscientizando sobre direitos e asformas de sua promoo, transformando consumidores em cidados ativos.Muitas vezes por sua participao em associaes e organizaes sociaisque as pessoas ganham a condio de cidados conscientes e ativos na bus-ca de seus direitos.

    Um papel estratgico das OSCs sua contribuio formao deuma cultura democrtica, especialmente porque introduz as pessoas emprocessos e espaos de vivncia social e poltica que valorizam e tornam

    compreensveis os valores e princpios de uma vida social democrtica.As OSCs tambm so reconhecidas porque so elas que, junto cominstituies como as universidades, as igrejas e a mdia, podem exercer vozcrtica autnoma na sociedade civil, representando um contraponto essencial lgica do Estado e dando destaque ao interesse pblico no debate de ideias.

    Papel relevante das OSCs tambm sua contribuio criao, expe-rimentao e desenvolvimento de novas metodologias e tecnologias sociais,muitas das quais sero depois incorporadas s polticas pblicas.

    As OSCs so ainda importantes para a democracia e para o processo

    de desenvolvimento social pelo papel exercido na revitalizao constantedo tecido social e na gerao de novas lideranas para a sociedade.

    O protagonismo das OSCs tem enorme valor na constituio de re-des, movimentos, plataformas e fruns capazes de promover ao articula-da, proposio e dilogo com foco em iniciativas de incidncia, nacional einternacional.

    As OSCs tm especial relevo no modelo de democracia desenhado naConstituio de 1988, com seu acento na participao da sociedade civil.As OSCs participam ativamente do ciclo das polticas pblicas, via confe-rncias, conselhos, etc. A elas so protagonistas relevantes na elaborao,

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    aperfeioamento e controle social das polticas pblicas, constituindo umaespcie de esfera pblica ampliada, papel este que reconhecido internacio-

    nalmente (ONU, Bando Mundial, Unio Europeia, Mercosul, etc.).As OSCs so importantes tambm por sua contribuio a novas ins-titucionalidades, sejam redes sociais e arranjos similares, sejam fenmenoscomo os conselhos, as conferncias, o oramento participativo, etc.

    Por isso tudo, reconhece-se que a existncia de um amplo, diverso, ar-ticulado e autnomo campo de organizaes da sociedade civil condiointrnseca promoo e efetivao de direitos e ampliao e ao aprofun-damento da democracia, a qual, por sua vez, condio tica e poltica danossa existncia como sociedade.

    Sustentabilidade: relevncia e fragilidade das OSCsApesar da importncia do ativismo das OSCs para a afirmao de

    direitos e, por conseguinte, para o avano da democracia e do padro dedesenvolvimento, seu reconhecimento social e sua sustentabilidade comosetor variam segundo os ciclos poltico-culturais da histria do pas.

    O primeiro ciclo das OSCs na histria recente pode ser consideradoaquele em que elas surgiram com fora como atores de mudana social,

    entre os anos 1980 e meados da dcada de 1990. Nesse perodo, as organi-zaes da sociedade civil na forma especialmente de associaes, centrosde assessoria, movimentos populares e ONGs deram-se a conhecer e sefortaleceram como sujeitos polticos autnomos.

    Mergulhadas em um imaginrio de mudana social e apoiadas princi-palmente por parceiros no governamentais nacionais e internacionais, es-tas organizaes cresceram em nmero e escala, ampliaram sua articulaosocial e capacidade de incidncia poltica, gozavam de relativa sustentabili-dade poltica e financeira, mas careciam de legitimidade mais ampla junto

    populao, que pouco as conhecia.Nesse perodo, o pas viu proliferar todo tipo de organizao comu-

    nitria, de movimento social, movimento sindical, ONGs e redes, os quaisexerceram papel importante na construo da nova institucionalidade e napromoo dos novos direitos institudos pela Constituio de 1988.

    Este foi o perodo de auge das OSCs do ponto de vista de seu reco-nhecimento como atores sociais e polticos autnomos da sociedade civil.Isso foi possibilitado, entre outros fatores, pelo apoio poltico e financeirodas organizaes internacionais de cooperao, o qual propiciou boa parteda capacidade de ao autnoma das OSCs no perodo.

    OSCs NO BRASIL: A RELEVNCIA DOS ATORES

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    Neste contexto, o Estado brasileiro passou a estimular um novo pro-tagonismo das associaes civis e demais organizaes da sociedade civil,

    dentro do sistema poltico nacional, a saber, o papel de exercer democrati-camente o controle social das polticas pblicas, assim como de influenciara sua elaborao e configurao (CICONELLO, 2009, pp. 612).

    Por outro lado, a sustentabilidade do campo das OSCs tinha signifi-cativa fragilidade, dado seu limitado conhecimento e reconhecimento pelasociedade mais amplamente e dada a ausncia de legislao especfica quereconhecesse seu valor e favorecesse sua sustentabilidade financeira no pas.

    Este ciclo se fecha com a consolidao dos direitos, dos mecanismos departicipao e da institucionalidade institudos em 1988, e com a incorpora-

    o da democracia como valor universal pela maior parte dos atores sociais.A sustentabilidade experimentada no perodo foi suficiente para con-

    ferir lastro a um ativismo democratizante importante, o qual contribuiu de-cisivamente para os avanos polticos e sociais alcanados nos anos 2000,mas se mostrou limitada diante dos desafios colocados s condies de pe-renidade do setor.

    O segundo ciclo pode ser identificado com o perodo no qual as OSCsso valorizadas como braos operacionais do Estado, cobrindo, grosso

    modo, os dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).Nesse perodo, elas se tornam mais conhecidas, diversificadas e valorizadas,e mais apoiadas pelo poder pblico, o que ocorre, entretanto, sob o influxode uma viso neoliberal de reforma do Estado pela qual as OSCs seriamapoiadas porque representariam braos operacionais menos onerosos daspolticas pblicas.

    Como parte do arcabouo institucional da reforma do Estado, que pre-conizava este papel subordinado das OSCs, surgem a Lei das OrganizaesSociais (Lei n 9.637, de 1998) e a Lei das Oscips (Lei n 9.790, de 1999).

    Neste contexto quando surge e se expande a referncia ao TerceiroSetor como o campo das organizaes com papel complementar ao Estado, instituies internacionais de desenvolvimento e muitas instituies na-cionais passam a enfatizar a construo de capacidades e a profissionaliza-o nas OSCs, contribuindo para a reduo relativa de seu perfil poltico epara o fortalecimento de sua percepo como prestadoras de servio.

    A sustentabilidade do campo das OSCs neste perodo se fortalece emtermos de visibilidade e de acesso a recursos pblicos e privados, mas se vdebilitada pela diviso do campo entre organizaes crticas reforma doEstado e a um papel apenas funcional para as OSCs e outras organizaes

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    que avanam com a prestao de servios, muitas vezes com o apoio docampo do investimento social privado.

    Por fim, o ciclo atual, no qual as OSCs passam a se sustentar cadavez mais a partir da prestao de servios, pode ser delineado a partir dos

    Conjuntura histrica de ampliao da militncia social e poltica.

    Emergncia de uma gerao de lideranas sociais oriundas de um caldo de

    cultura marcado pela Educao Popular, pela Teologia da Libertao, pelas lutas

    populares, orientadas por uma perspectiva de mudana social.

    Disponibilidade de recursos da cooperao internacional para o Brasil e a

    Amrica Latina.

    Acesso a apoios institucionais (e no apenas a projetos e programas).

    Ampliao crescente do acesso a recursos pblicos (a partir do governo de

    Fernando Henrique Cardoso).

    Possibilidade de desenhar e implementar um projeto poltico-institucional

    desejado, graas a um significativo grau de autonomia institucional.

    Relao com polticas pblicas centradas na elaborao e no controle social, apartir de viso subjacente do Estado como provedor universal e praticamente

    nico executor das polticas pblicas.

    Viso do papel das OSCs ancorada na sua capacidade de provocar, organizar e

    promover mudanas sociais.

    Percepo pblica sobre as OSCs fundamentalmente positiva, vinculando-as ao

    fazer o bem.

    Pouca ateno para a comunicao extramuros (pblica) e para alm do prprio

    campo poltico.

    ONGs e movimentos sociais como os principais atores na sociedade civil, os

    quais cresciam em articulao e projeo nacional e internacional.

    Foco da ao e da articulao poltica nas relaes dentro de cada subcampo

    identitrio, com limitada viso e capacidade para intersetorialidade.

    Mecanismos de governana frgeis, bem como de transparncia e de

    accountability.

    A Consolidao das Leis do Trabalho (CLT) como regime geral de contratao de

    pessoas.

    OSCs como timos lugares para trabalhar, tanto como espaos de afirmao de

    valores e causas sociais como de aprendizagem profissional.

    CICLO INICIAL E CONSOLIDAO DAS OSCs: ANOS 1980-1990

    OSCs NO BRASIL: A RELEVNCIA DOS ATORES

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    anos 2000, quando as OSCs, especialmente movimentos, redes sociais eONGs, sofrem reduo de apoio financeiro, tanto governamental quanto

    internacional, deixam de se beneficiar da aura positiva que granjearam an-teriormente, entram em crise de sustentabilidade e muitas passam a prestarservios para sobreviver e se legitimar (ABONG, 2009).

    Cinco fatores exercem influncia direta na sustentabilidade das OSCsnesse perodo:

    A reconfigurao das organizaes internacionais, especialmenteeuropeias, as quais reduzem e/ou reconfiguram sua presena nopas, tanto pela maior seletividade temtica, geogrfica e de tipo deparceiros; elas deixam de apoiar as organizaes para apoiar proje-

    tos especficos, isto , o foco passa do apoio ao ator (as instituies)para as atividades-fim.

    O crescimento do apoio de institutos e fundaes privados, ainda quecom limitaes, em funo da crise internacional de 2008, com focoem programas e projetos especficos, o qual se d principalmente pelacontratao de OSCs como prestadoras de servios na rea social.

    Estabilizao do apoio financeiro governamental ao nvel federal4,em parte como resposta s acusaes das foras polticas conserva-

    doras sobre o uso poltico e para fins de corrupo das OSCs. Isto sed em meio a um processo de dificuldade de acesso (devido s pecu-liaridades tcnicas do Siconv Portal dos Convnios do governo fe-deral) e de maior controle e risco de criminalizao, favorecido pelaausncia de um marco regulatrio adequado natureza das OSCs.

    Dificuldade de adaptao poltico-cultural das OSCs ao novo con-texto da sustentabilidade, o qual exige novos padres de lideranae gesto, de relacionamento e de comunicao e novas capacidadestcnicas e gerenciais.

    Mudana dos padres de desenvolvimento econmico e social, daspolticas pblicas sociais e dos nveis histricos de pobreza, pro-duzindo-se uma situao na qual no fica claro para a populao,e tampouco para muitos interlocutores na rea social, qual a re-levncia da contribuio das OSCs neste novo momento do pas.

    A sustentabilidade financeira das OSCs passa crescentemente pelo apoio

    4 Segundo pesquisa recente do Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada Ipea (2011), as transferncias voluntrias do governofederal s OSCs somaram R$ 2,2 bilhes em 1999 e R$ 4,1 bilhes em 2010, mas este crescimento no foi proporcional aocrescimento do oramento federal no perodo.

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    Conjuntura histrica de reduo da militncia social e poltica convencional

    (em torno de partidos, sindicatos e movimentos sociais tradicionais e ONGs) e

    crescimento e diversificao de novos tipos de ao/militncia social (informal

    e no institucionalizada, a partir de redes sociais, aes colaborativas diretas e

    pontuais, organizaes de jovens...).

    Processo de envelhecimento e fadiga militante da gerao de lideranas sociais

    dos anos 1980.

    Reduo do acesso cooperao internacional no Brasil.

    Apoio a projetos e no mais a instituies, com rarssimas excees.Ampliao expressiva e diversificao do acesso a recursos pblicos, com abertura

    discusso sobre a necessidade de um novo marco regulatrio.

    Inviabilidade crescente de implementar projeto institucional prprio, j que agora

    o desafio o de fazer a diferena nas circunstncias propiciadas pela gesto e

    execuo de diversos projetos, alguns deles de prestao de servios.

    Aceitao da possibilidade de as OSCs participarem da execuo de polticas e

    programas pblicos, como parte da nova viso da relao Estado-sociedade.

    Amplia-se a prestao de servios pelas OSCs como estratgia poltica e

    financeira.Viso do papel das ONGs, passando de demiurgos da mudana social para

    catalisadores e facilitadores de processos, a partir da perspectiva dos direitos e do

    aprofundamento da democracia.

    OSCs (especialmente ONGs) perdem aura positiva, sendo muitas vezes

    associadas a mecanismos de desvio de recursos e de corrupo, o que impe s

    organizaes que gozam de credibilidade o desafio de se diferenciarem disso.

    Desafios da credibilidade e da mobilizao de recursos tornam imperativo o

    desenvolvimento de estratgia ampla de comunicao com a sociedade, com o

    planejamento da comunicao considerando os diversos pblicos de interesse

    site institucional includo.

    Ampliao e diversificao dos atores na sociedade civil impem novos desafios

    identidade e capacidade de estabelecer alianas, parcerias e aes intersetoriais.

    Exigncia por mecanismos de governana que favoream a credibilidade, a

    transparncia e a accountability.

    Formas diversificadas de contratao de pessoas, com tendncia maior

    flexibilidade nas relaes de trabalho e menor custo fixo.

    OSCs apenas como um lugar possvel de trabalhar, em um contexto de

    aquecimento do mercado de trabalho e de expanso do ensino superior.

    CICLO ATUAL DAS OSCs: ANOS 2000

    OSCs NO BRASIL: A RELEVNCIA DOS ATORES

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    financeiro a projetos especficos, seja via editais pblicos, privados ou no go-vernamentais, seja via contratao de servios por entes pblicos ou institutos

    e fundaes familiares e corporativas (ABONG, 2009; ARMANI, 2010).Num contexto de crescentes dificuldades de sustentao financeira,de incerteza quanto ao marco regulatrio de acesso a recursos pblicos porparte das OSCs e de desconfiana da opinio pblica sobre o sentido dasOSCs, muitas organizaes so levadas a mobilizar recursos pela via daprestao de servios. Tal movimento tem a vantagem de prover recursosem tempos difceis e recursos com um carter de livre utilizao, no que dizrespeito a eventuais saldos em relao ao servio/valor contratado. O que uma clara virtude em relao figura dos convnios pblicos.

    No obstante, a partir de certo ponto, a prestao de servios comoestratgia de sustentabilidade institucional pode ter srias implicaes paraa autonomia e a identidade de organizaes singulares e tambm para osetor como um todo.

    OSCs: de autoras a coadjuvantes?Os principais financiadores na rea social hoje apoiam projetos es-

    pecficos, e no organizaes. Ou, melhor dizendo, continuam apoiando

    organizaes que consideram relevantes e mesmo estratgicas, mas agorapor meio do apoio a algum de seus projetos.Isto, obviamente, coloca novos desafios gesto das organizaes,

    uma vez que agora elas tm de buscar suprir as necessidades de recursosinstitucionais, ainda que parcialmente, com base em uma complexa enge-nharia financeira e contbil envolvendo uma variedade de projetos e definanciadores, cada qual com suas regras e graus de flexibilidade.

    Mais do que a usual escassez de recursos, este gerenciamento comple-xo do conjunto de necessidades e recursos disponveis em vrios projetos

    tem sido o drama cotidiano em boa parte das organizaes.Mas esta apenas a dimenso gerencial e contbil do desafio; a outra

    dimenso poltica e institucional, dizendo respeito ao risco de reduo daautonomia institucional e, no mdio prazo, de mudana da prpria identi-dade da organizao.

    Uma das principais razes para estes riscos que, muitas vezes, e crescen-temente, os projetos das OSCs so apoiados na tica da prestao de servios.

    Nem sempre os projetos apoiados o so como iniciativas das prpriasorganizaes, sendo muitas vezes de iniciativa de seus financiadores. Mes-mo quando estes apoiam organizaes, o fazem especialmente no sentido de

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    contratao de sua capacidade de prestar servios e no necessariamente pelacondio de exercerem papel destacado de mobilizao e liderana social.

    Pode-se arguir que tudo depende do que se entende por prestao deservios, j que at mesmo a capacidade de uma OSC para mobilizar umacomunidade em torno de um problema social pode ser contratada comoum servio.

    Podem-se identificar trs situaes na relao entre projeto institucio-nal e prestao de servios, com suas respectivas implicaes para a auto-nomia e a identidade das OSCs:

    A organizao formata algo que j faz como um servio em re-lao ao qual existe demanda e o oferece para contratao como

    estratgia de mobilizao de recursos. Esta uma situao virtuosa.Um exemplo seria uma ONG voltada formao e capacitaode lideranas sociais que decide estruturar um curso de formaocomo um servio que pode ser contratado e realizado em territriose situaes que no s os seus habituais. O desafio aqui mais denatureza tcnica e tambm gerencial. No entanto, se o servio seamplia muito e se torna a principal atividade da organizao, istopode ter implicaes para a identidade institucional.

    A organizao, em dilogo com e em resposta a estmulo de algumde seus parceiros/apoiadores, desenha um servio relevante paraser contratado pelo financiador. Esta tambm , em princpio, umaopo interessante, j que a proposio do servio se d como re-sultante de um processo dialogado. Um exemplo seria o de umaorganizao de direitos humanos (DH) brasileira convidada a orga-nizar e oferecer um programa na rea de DH em outro continente.A depender da escala de operaes e do volume de pessoas/recursosenvolvidos na prestao deste servio, entretanto, pode-se verificar

    uma mudana no papel (e identidade) da organizao de umaONG brasileira com atuao nacional em DH para uma organiza-o (nacional) com atuao internacional.

    Organizaes apoiadoras e financiadoras, nacionais e internacio-nais, pblicas ou privadas, desenham suas prioridades e/ou progra-mas e ento buscam identificar OSCs com capacidade instalada oucom potencial de vir a t-la para contratao de servios.

    Esta uma situao bem mais complexa e ambgua. Seria o caso deuma fundao corporativa que desenha um programa de desenvolvimento

    OSCs NO BRASIL: A RELEVNCIA DOS ATORES

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    comunitrio e contrata uma ONG para oper-lo. Ou o caso de um minist-rio que busca via edital pblico a contratao de organizaes para execu-

    tar um programa de formao de empreendedores rurais no Nordeste. Hduas possibilidades aqui: quando o convite/edital se dirige a organizaesj especializadas na prestao de servios na rea, isso no traz maiores im-plicaes para sua condio institucional. J quando a proposio alcanaorganizaes tipo ONG, que se constituram como atores no campo social,a prestao de um servio a uma iniciativa alheia, que no parte de seuplano de ao, pode sim trazer riscos no mdio prazo. Outra varivel im-portante no caso dos editais pblicos a correlao entre a poltica pblicaque deu origem e orienta o edital e a agenda do movimento social/OSCs.

    Quanto mais positiva esta correlao, tanto mais virtuosa a relao.O que se observa na rea social como tendncia que as OSCs so

    cada vez mais apoiadas via contratao para oferecer servios no mbitode programas e projetos de outras instituies, sejam elas pblicas ou pri-vadas. Com isso, emerge no horizonte um risco em relao sua condiode ator autnomo da sociedade civil, a qual pode vir a ficar circunscrita spossibilidades oferecidas pela demanda de servios na rea social.

    importante destacar que faz toda a diferena para a identidade, au-

    tonomia e sustentabilidade de uma OSC o seu grau de autoria nas aes de-senvolvidas. Quanto menor seu envolvimento na concepo da ao, comotambm menor a correspondncia entre a nova ao e sua ao habitual, tan-to maior ser o risco de perda do seu perfil poltico autnomo no processo.

    A questo-chave, ento, que as formas de acesso das OSCs a re-cursos, seu grau de autoria nas aes e os papis exercidos nos relaciona-mentos estabelecidos tm implicaes importantes para a identidade futuradestas organizaes.

    Em situaes virtuosas, as OSCs se mantm como autoras, desenvol-

    vendo aes com assinatura prpria, incluindo-se aqui os editais pblicosreferentes a polticas pblicas construdas em resposta a e com a participa-o da sociedade civil. Em outras situaes, elas se tornam coautoras, comgraus variados de autoria e autonomia. Por fim, em outras situaes, elasperdem a autoria poltico-intelectual das iniciativas para ganhar o status deoperadoras ou executoras de aes de autoria alheia.

    O cenrio atual do financiamento s OSCs parece sinalizar para umasituao na qual cresce o apoio a elas concebido como a contratao de umservio.

    E isso diz respeito a todos os tipos de financiador. Eles valorizam as

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    OSCs como organizaes capazes de contribuir com a execuo de seusprprios projetos.

    E o fazem por razes compreensveis, por certo. Se no, vejamos: asorganizaes e agncias internacionais deixaram de apoiar organizaes epassaram a apoiar projetos com foco definido e de curta durao, desde osanos 1990, em grande medida devido ao recrudescimento das condies demobilizao de recursos em seus pases e regies. Isto as levou a desenvolverestratgias que permitissem maior controle sobre o alcance de resultadostangveis, como: seleo mais rigorosa de parceiros, priorizao temtica eterritorial, intensificao do dilogo, mas tambm dos controles gerenciais,participao direta na elaborao de projetos de parceiros, maior exigncia

    tcnica na elaborao de projetos, maior limitao para incorporao decustos institucionais nos oramentos de projetos especficos e maior objeti-vidade na avaliao dos mesmos (ARMANI, 2010).

    Muitas vezes, ainda que o apoio internacional se d via projetos es-pecficos, no se perde a dimenso de apoio ao protagonismo poltico daOSC, ainda que este fique encapsulado no formato projeto.

    As organizaes e agncias internacionais dizem ser necessrio ampliara sua capacidade de demonstrar resultados, em um contexto no qual sua

    prpria credibilidade e sua estratgia de ao esto muitas vezes em questo.Muitas lideranas sociais acreditam que este acento na qualidade enos controles sobre os projetos por parte de organizaes internacionaislevou a um foco maior nas dimenses tcnica e gerencial do desenvolvi-mento social, reduzindo sua contribuio no que se refere ao protagonismoe autonomia das OSCs apoiadas. Perdeu-se tambm fora e sustentaoem muitas redes importantes na sociedade civil. Muitas OSCs apoiadas pororganizaes internacionais afirmam ter, em geral, menos recursos, menosautonomia e mais controles externos.

    O setor pblico, especialmente federal, tambm tem dado sua contri-buio a este processo de maior nfase a projetos e menor apoio s organi-zaes em si, com vis de contratao de servios.

    O marco legal vigente, regulado pela figura jurdico-administrativados convnios, associado maior sensibilidade poltica do apoio pblico aOSCs nos ltimos anos, tem feito com que o financiamento pblico federala OSCs se d fundamentalmente pela via do apoio a projetos, com limitadaspossibilidades de suporte aos custos de manuteno da organizao.

    O resultado que muitas organizaes hoje tm acesso significativoa recursos pblicos, mas tm enormes dificuldades para se manter ativas

    OSCs NO BRASIL: A RELEVNCIA DOS ATORES

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    como atores sociais, j que no conseguem recursos para atividades queno aquelas estritamente inscritas nas rubricas dos convnios.

    Uma dificuldade muita conhecida neste sentido a de custear inte-gralmente os salrios das pessoas mais qualificadas na organizao.A justificativa maior para esta situao que, do ponto de vista do in-

    teresse pblico, como percebido pelos atuais gestores pblicos, h um riscomaior de uso poltico dos recursos quando o Estado apoia organizaes doque quando isso se d pela via do apoio a projetos determinados.

    No entanto, o que escapa a esta viso que possvel aperfeioar omarco regulatrio para que este permita tanto o apoio legtimo, transparen-te e com controle social de projetos como de organizaes.

    Isto pode ser realizado tanto pela possibilidade de incorporao de cus-tos diversos de manuteno da organizao no oramento de projetos espec-ficos como pela criao de novos arranjos institucionais para financiamentode OSCs (como fundos autnomos de gesto compartilhada, por exemplo).

    Por fim, tambm o campo do investimento social privado via, espe-cialmente, institutos e fundaes corporativas tem contribudo para estasituao.

    Duas tendncias recentes neste setor so justamente a promoo de

    programas e projetos prprios, em detrimento do apoio a projetos de OSCs(GIFE, 2010), e o apoio a OSCs pela via da contratao de seus servios.A lgica deste processo pode ser, pelo menos em parte, explicada pelo

    horizonte de incertezas do movimento da economia, vide crise financeira de2008 e seus efeitos, o que levou a uma necessidade de maior controle sobreo investimento social, seus resultados e o valor eventualmente agregado(TEODSIO, 2008).

    Como pano de fundo, pode-se perceber a projeo de certa culturaempresarial orientada por resultados materiais de curto prazo para a rea

    social, nem sempre com efeitos virtuosos.As vises destes trs tipos de financiador, ainda que legtimas e com-

    preensveis, compartilham o pressuposto de que organizaes sociais tcni-ca e gerencialmente qualificadas, capazes de elaborar e executar bons proje-tos e prover bons servios, representam o novo horizonte das OSCs.

    Ser mesmo?Certamente, dois dos principais desafios das OSCs so a qualificao

    tcnica do seu fazer e a dos seus processos de gesto.Prestar servios e executar projetos, neste sentido, no representam

    problemas para a legitimidade e sustentabilidade das OSCs. O que, sim,

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    pode ser percebido como problemtico assumir que estes dois elementosso suficientes para definir sua identidade e seu sentido de existncia.

    Por isso necessrio enfatizar outro desafio das OSCs, este primor-dial, porque identitrio, que a sua capacidade de exercer protagonismovinculado defesa de direitos e ao interesse pblico na sociedade.

    E, mais amplamente, o desafio da existncia e manuteno de um cam-po de organizaes sociais identificadas como atores da sociedade civil, comocondio de democracia e de um padro de desenvolvimento mais sustentvel.

    Se no for revertida a tendncia de apoiar OSCs apenas pela via dosprojetos de curta durao com foco definido, associada com o estabeleci-mento de parcerias com vis de prestao de servios, corre-se o risco

    de mudanas significativas na identidade e no papel das organizaes queperfazem o tecido social que hoje consideramos organizaes da socieda-de civil entes sociais autnomos ancorados no interesse pblico e comcapacidade de voz crtica e inovao na sociedade.

    Este tecido social condio de possibilidade e de perenidade de todotipo de iniciativa e projeto sociais, pblicos e privados. Se no, como confe-rir legitimidade, efetividade e sustentabilidade aos projetos sociais (pblicose privados) sem o protagonismo e a capacidade catalisadora desta ampla e

    diversa rede de lideranas e organizaes sociais autnomas?Tanto gestores pbicos como gerentes de institutos e fundaes pri-vadas e de ONGs necessitam de um outro para dialogar, para estabelecerparcerias, para validar suas iniciativas e para servir como referncia de resul-tados. Quanto mais este outro for colocado na posio de ator coadjuvante ecolaborador operacional nos processos, tanto mais decrescente tendero a sera legitimidade e a efetividade das aes desenvolvidas no longo prazo.

    Se esta situao de crescente invisibilidade das organizaes sociaisno for superada, a sociedade brasileira pode perder parte considervel da

    energia necessria para fazer avanar a efetividade das polticas pblicas, a for-mao democrtica e cidad das novas geraes, a responsabilidade social dasempresas e a mobilizao social exigida para o desenvolvimento sustentvel.

    Diante disso, importante que as prprias OSCs e suas articulaese redes mais representativas tematizem de forma direta esta situao, apro-fundando a anlise de cenrios, as tendncias do financiamento social, asnovas oportunidades e os riscos e desafios envolvidos. Faz-se necessrio iralm das constataes para tomar iniciativas de dilogo estratgico com osfinanciadores.

    Urge impulsionar um amplo e diversificado processo de dilogo e ar-

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    ticulao intersetorial visando ao resgate do sentido estratgico do pontode vista dos direitos e da democracia, da sustentabilidade poltica, tcnica

    e financeira das OSCs. Tal debate deveria ter incidncia tanto nos novosformatos de apoio pblico, no mbito do novo marco legal ora em discus-so, como na concepo de doao e parceria no campo do investimentosocial privado.

    Espera-se que isso d origem ao desenho de iniciativas, setoriais emultisetoriais, voltadas ao financiamento e fortalecimento duradouro dasOSCs como autoras no campo social.

    Isso simplesmente porque, sem a dinmica poltica, social e culturalcatalisada por este tipo de organizao, boa parte da capacidade de recons-

    truo permanente dos laos de confiana, solidariedade e cooperao deque todas as sociedades necessitam para persistir poder ser perdida.

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    FORMAS DO FAZER

    CAPTULO II

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    UMA METODOLOGIA PARAO APRENDIZADOAlais vila

    1. AntecedentesQuando foi criado, no ano de 1991, o Instituto C&A definiu como

    foco de seu investimento social a educao de crianas e adolescentes eidentificou nas organizaes da sociedade civil um campo propcio pararealizar os seus objetivos institucionais.

    poca, no entanto, as organizaes sociais eram ainda marcadaspor um baixo grau de institucionalizao. Para fazer frente a este quadrode relativa informalidade, os investidores sociais foram lhes demandandoaes planejadas, monitoradas, avaliadas, com prestao de contas e de-monstrativos de resultados, como requisitos bsicos para o financiamentode seus projetos.

    Nesse sentido, o Instituto C&A capitaneou importantes iniciativas,como a de incentivar a formao de grupos de instituies sociais, por re-conhecer que as organizaes sem fins lucrativos voltadas educao decrianas e adolescentes padeciam dos mesmos problemas, mas, isoladamen-

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    te, tinham poucas condies de super-los. O modelo de trabalho em grupopermite o ganho de escala na realizao das aes, tornando mais vivel,por exemplo, a contratao de capacitaes para a formao dos quadrosde pessoal das instituies. Este modelo propicia, ainda, ganho de represen-tatividade e de fora poltica para as instituies caminharem na direo dese tornarem mais sustentveis1.

    Outras iniciativas construdas pelo Instituto C&A posteriormente

    concorriam para esta ideia de que as organizaes necessitavam de instru-mentos e procedimentos que pudessem contribuir para o aprimoramentoda gesto e da qualidade tcnica da organizao como um todo, de forma apotencializar boas prticas de educao e de gesto nas suas comunidades2. nesse momento, mais precisamente ao final da dcada de 1990, que a no-o de fortalecimento institucional comea a surgir com fora no cenriodas organizaes sociais.

    Em 2005/2006, o Instituto C&A realiza seu Planejamento Estratgi-

    co Decenal de Investimento Social, a definindo as suas reas programticasprioritrias. sob essa perspectiva que o escopo do programa Fortaleci-mento Institucional construdo, tal como demonstra o quadro a seguir.

    1 Cf. Instituto C&A. Relatrio de Atividades. Barueri, SP, 2003.

    2 O Instituto C&A apoiou projetos de formao de educadores e gestores, como os do Instituto Avisa L (Capacitar SP e PR), Centro deCultura Luiz Freire, Cooperapic (Tutoria), Associao Cirandar (Multiplicar), s para mencionar alguns; apoiou projetos de formao demobilizadores de recursos (o apoio do Instituto C&A foi importante para o surgimento, em 2001, da Associao Brasileira dos Capta-dores de Recursos (ABCR); apoiou tambm a elaborao de planejamentos estratgicos de diversos projetos: Acredite, Gaes, GIS, de

    2002 a 2003; contribuiu para a elaborao de planos de comunicao de diversas instituies: Campo, Associao Terra dos Homens,de 1999 a 2005.

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    Por que importanteo programaFortalecimentoInstitucional?

    Contribui diretamente para o fortalecimento/desenvolvimento

    das organizaes e assegura o cumprimento de sua misso

    e projetos.

    Aprimora (assegura) a sustentabilidade (poltica, econmica,

    ambiental e a relao com o meio).

    Aprimora a gesto e a qualidade tcnica dos educadores,

    projetos e programas.

    Expressa a misso do Instituto C&A.

    Contribui para a qualidade da educao em todos os nveis

    (gesto, formao e procedimentos metodolgicos).

    Contribui para fortalecer (para dentro e para fora) aidentidade institucional do Instituto C&A, como tambm das

    organizaes parceiras.

    Aonde se querchegar com oprograma?

    Aportar conhecimentos e influenciar no campo de

    desenvolvimento de organizaes sociais, aprimorando a

    sustentabilidade dessas instituies, potencializando boas

    prticas de gesto e de participao no que se refere atuao

    em prol da educao.

    Quais os aportesque o programadever levar paraas organizaes?

    Aprimorar o processo de (captao) mobilizao de recursosdas organizaes parceiras.

    Contribuir para a sua sustentabilidade.

    Aprimorar a comunicao institucional das organizaesparceiras.

    Contribuir para a mobilizao da comunidade e do poderpblico para a causa.

    Aprimorar a gesto e reestruturao (quando for o caso) dasorganizaes parceiras.

    Aprimorar terica e tecnicamente o trabalho dos profissionaisdas organizaes sociais.

    Contribuir para um melhor atendimento das crianas eadolescentes.

    Contribuir com o Instituto C&A no que se refere aodesenvolvimento institucional e dos programas, fortalecendo

    sua identidade neste campo de atuao.

    Produzir conhecimento neste campo.

    UMA METODOLOGIA PARA O APRENDIZADO

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    Entre 2007 e 2008, o Instituto C&A conclui seu processo de planeja-mento estratgico, com a formulao de objetivos amplos, de longo prazo

    (2015), e definio de suas principais iniciativas estratgicas, orientadas porprogramas e projetos, a se realizarem em um ciclo de trs anos3: (1) progra-ma Prazer em Ler, (2) programa Educao Infantil, (3) programa EducaoIntegral, (4) programa Fortalecimento Institucional, (5) programa Redes eAlianas e (6) programa Voluntariado.

    A estrutura programtica do Instituto C&A foi definida consideran-do os antecedentes institucionais e as experincias bem-sucedidas da orga-nizao, no perodo de 1991 a 2006, mas agregando, concomitantemente,dados e informaes oriundos de estudos do cenrio educacional brasileiro,

    a identificando suas principais demandas e lacunas. Foi mediante aportedo cenrio nacional no campo da educao e da leitura que o programaPrazer em Ler foi criado, tornando-se a experincia-piloto para a criaodos demais programas do Instituto C&A.

    2. Estrutura para a construo e desenvolvimento dos programas doInstituto C&A: os macroprocessos

    A construo do programa Prazer em Ler, em fevereiro de 2006, foi

    um campo experimental fecundo para os demais programas do InstitutoC&A, principalmente para o programa Desenvolvimento Institucional, lan-ado trs anos depois. na vigncia do primeiro ciclo do programa Prazerem Ler, em 2007 e 2008, que o Instituto C&A implanta um modelo degesto matricial, estruturado por macroprocessos4.

    Inicialmente, foi realizado o mapeamento de todos os processos or-ganizacionais5, especificamente os processos que compem os programase projetos. A partir deste mapeamento, foram construdos quatro macro-processos, horizontalmente integrados, por meio de uma dinmica de flu-

    xos: (1) Macroprocesso da Gesto do Conhecimento, (2) Macroprocessode Programas e Projetos, (3) Macroprocesso da Gesto do Relacionamen-

    3 A noo de ciclo de investimento contrape-se ao apoio pontual a programas e projetos. O ciclo compreende desenvolvimento, com focona melhoria contnua da ao que est sendo apoiada. O ciclo envolve planejamento, execuo, monitoramento e avaliao, com vistasaos resultados. No mbito desta noo de ciclo de investimento est contida a perspectiva de continuidade da ao desenvolvida, a suasustentabilidade, possibilitando ao Instituto C&A que se d a concluso do apoio.

    4 O mapeamento dos processos do programa Prazer em Ler propiciou a identificao de recursos e gerou instrumentos e produtos, permitindopadronizar os processos em relao aos demais programas.

    5 O mapeamento dos processos consiste em identificar, analisar, descrever e documentar os processos organizacionais e, ainda, identificar

    suas interfaces internas e externas, suas entradas e sadas, recursos necessrios e produtos gerados, possibilitando a padronizao daoperao desses processos e a implantao de aes para a sua melhoria contnua.

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    to, (4) Macroprocesso da Gesto da Comunicao, alm dos processos deapoio. Posteriormente, os macroprocessos Gesto da Comunicao e Ges-

    to do Relacionamento se fundem.A construo do programa Desenvolvimento Institucional foi pautadapelo Macroprocesso de Programas e Projetos, com insumos aportados peloMacroprocesso da Gesto do Conhecimento, guardio da misso, viso, ob-jetivos estratgicos, princpios, valores e diretrizes institucionais, contempla-das em seu Documento de Referncia. Tambm o Macroprocesso da Gestoda Comunicao integra-se dinmica dos processos de construo do pro-grama, por meio da elaborao do plano de comunicao do programa.

    Existia, portanto, para o programa Desenvolvimento Institucional

    um passo a passo estrutural, definido no nvel do Macroprocesso de Pro-gramas e Projetos, que dizia exatamente o que fazer, quando fazer e queinstrumental utilizar.

    De forma esquemtica pode-se afirmar que para construir um progra-ma necessrio:a) Estudar o cenrio (vinculado ao tema do programa);b) Elaborar proposta tcnica e proposta oramentria;c) Selecionar projetos, a partir de edital pblico ou carta-convite;

    d) Executar programas (a considerando os momentos formativos e o mo-nitoramento das aes);e) Avaliar programas (na finalizao do ciclo prev-se uma avaliao externa).

    3. A metodologia ciclo 2009-2011A elaborao do programa Desenvolvimento Institucional envolveu

    atores diversos, nas distintas fases que o compem, desde o momento deestudar o cenrio neste campo especfico, de estabelecer um desenho meto-dolgico condizente com seus princpios, diretrizes e fundamentos, assim

    como na implementao e monitoramento do programa, a considerandoos momentos de formao das organizaes sociais parceiras que integra-ram o ciclo de apoio entre 2009 e 2011.

    equipe interna somou-se a presena de alguns assessores, denomi-nados naquele momento de equipe ampliada. Assim, a sistematizao detodos os procedimentos do programa, em seu primeiro ciclo, parte do tra-balho desta equipe e est descrita em um texto de uso interno do InstitutoC&A denominado Passo a passo do programa Desenvolvimento Institu-cional ciclo 2009-2011, de Daza Amador (Recife, abril de 2012). A me-todologia do programa aqui expressa est referendada por este documento.

    UMA METODOLOGIA PARA O APRENDIZADO

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    3.1. Estudo de cenrio6, com foco em fortalecimento institucionalO estudo de cenrio do programa Desenvolvimento Institucional ad-

    quiriu o formato de pesquisa7

    (conceitual e de campo), gerando relatrios,em duas etapas:a) Relatrio de pesquisa sobre fortalecimento institucional, concludoem dezembro de 2007. Este documento analisa a realidade social,com foco direcionado para o cenrio das organizaes sociais brasi-leiras, em relao ao desafio de pensarem suas prticas na perspectivado desenvolvimento institucional e da sustentabilidade, tambm en-tendido como fortalecimento institucional.b) Relatrio de pesquisa sobre fortalecimento institucional: fase 2.

    Ampliao e aprofundamento do tema. Concludo em junho de 2008,este relatrio expressa mais detalhadamente a compreenso a respei-to do tema, tomando-se por base experincias prticas, no formato deestudos de caso. A partir deste segundo documento, pde-se chegara alguns resultados relevantes, os quais, efetivamente, contriburampara o planejamento do programa Desenvolvimento Institucional, emseu primeiro ciclo de trs anos.

    Pontos de destaque dos relatrios do estudo de cenrio:a) A noo de fortalecimento institucional foi compreendida nesteduplo movimento, isto , para dentro do Instituto C&A, ao buscaros antecedentes do programa, possibilitando que a se observassemas fragilidades internas em relao ao tema, prprias de um tempoem que a institucionalizao ainda estava se construindo nas organi-zaes; e um movimento para fora, que consistiu em observar outrasorganizaes que trabalhavam com o desenvolvimento institucionalde instituies.

    b) No movimento para dentro foram identificados contextos marcan-tes do Instituto C&A em relao ao tema, com perguntas criteriosasrelacionadas com o desenvolvimento institucional das organizaesapoiadas, levantando aprendizados e resultados obtidos at ento.c) No movimento para fora, buscou-se levantar a base terica e a es-

    6 O estudo de cenrio tem por finalidade levantar estudos e pesquisas que envolvem questes de contedo, anlises de tendncias e deindicadores, identificao de atores, de organizaes e instituies sociais e educativas e a maneira como estas concebem a dimenso detemas especficos aos programas do Instituto C&A. Outra finalidade mapear territrios e a identificar as demandas sociais prioritriaspara fazer investimento social.

    7 Realizada pelo Instituto Fonte, em 2007-2008. So Paulo, SP.

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    trutura das organizaes (instituies, fundaes empresariais e agen-tes de cooperao internacional) que desenvolviam iniciativas voltadas

    para o desenvolvimento institucional de outras organizaes. Busca-va-se saber como estava sendo compreendido este tema nas referidasorganizaes apoiadas e que impactos um programa de fortalecimentoe desenvolvimento institucional poderia provocar no Brasil.

    Importante concluso para o programa:trabalhar na perspectiva dodesenvolvimento institucional, em vez de fortalecimento.

    A opo de trabalhar na perspectiva do desenvolvimento institucionalpermitiu equipe do programa enxergar que qualquer organizao est em

    situao de estgio de desenvolvimento. Assim como o ser humano umente em processo de desenvolvimento, as organizaes tambm passam poresse processo. Tal contexto tem a ver com escalonamentos, com interaoentre atores, tem a ver com fragilidades, fortalezas, com processos constru-dos para que o desenvolvimento acontea.

    Desenvolvimento

    Institucional

    Escalonamento Interao entre atores

    Fragilidades

    Fortalezas

    Construo de processos

    alimentadores

    UMA METODOLOGIA PARA O APRENDIZADO

    O estudo de cenrio e os produtos decorrentes desse processo en-sejaram a realizao de uma oficina para uma escuta qualificada de ato-res-chave que estavam fazendo desenvolvimento institucional de algumamaneira. Pelo acerto de sua metodologia e consequente replicao desseformato em situaes que sero abordadas mais frente desta exposio,a oficina foi denominada Dilogo Ampliado Original (posteriormente ou-tros dilogos ampliados foram se sucedendo, j no contexto do programaDesenvolvimento Institucional, como etapas do processo de formao dasorganizaes).

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    Dilogo Ampliado OriginalEsta oficina foi uma extenso do estudo de cenrio, com a consulto-

    ria do Instituto Fonte, realizado no ano de 2007. Para esta escuta sobre otema desenvolvimento institucional foram convidados o Instituto Comuni-trio Grande Florianpolis (ICom), a Aliana Interage e a Oxfam, ambasde Recife, a Associao Brasileira de Organizaes No Governamentais(Abong), com sede em So Paulo, e a Coordenadoria Ecumnica de Servio(Cese), localizada em Salvador.

    Na oficina, foram apresentados os elementos do estudo de cenrioe os resultados dos relatrios dessa pesquisa, a contendo as experin-cias dos prprios participantes do Dilogo Ampliado Original. A pergun-

    ta motivadora era: para um programa de desenvolvimento institucionalque est iniciando, que aprendizados da prtica so necessrios debater eapropriar-se? As organizaes participantes puderam expor os processoscomplexos pelos quais vivenciavam no dia a dia, no enfrentamento dequestes desafiadoras do desenvolvimento institucional. No entanto es-tabeleceu-se consenso que o desenvolvimento institucional um processoque deve ocorrer para dentro e para fora da organizao, algo que j foiexposto neste texto.

    Este formato de escuta qualificada e trocas de experincias alcanouresultados muito satisfatrios, podendo-se afirmar que o programa De-senvolvimento Institucional comeou a tomar corpo nesse momento. E foitambm esse momento que batizou um dos processos metodolgicos doprograma Desenvolvimento Institucional os Dilogos Ampliados e re-forou a ideia de pensar um programa para influenciar processos internosdo Instituto C&A.

    O esquema a seguir mostra esta etapa inicial da metodologia do pro-grama:

    Relatrios

    Dilogo ampliadooriginal

    Estudo de cenrio

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    3.2. A proposta tcnica do programaA proposta tcnica foi desenhada para contemplar o ciclo de apoio

    de trs anos. no final do ciclo que se verifica a necessidade de atualizar ouno o estudo de cenrio, bem como de atualizar ou propor novos encami-nhamentos para o programa, redefinindo assim sua proposta tcnica parao ciclo seguinte.

    UMA METODOLOGIA PARA O APRENDIZADO

    Estudar cenrioElaborar proposta

    tcnica do programa

    Na formulao da proposta tcnica, a equipe tem a possibilidade decontar com o apoio de consultoria externa, com conhecimento especficodo tema proposto. Este procedimento previsto pelo Macroprocesso deProgramas e Projetos, que tambm define a linha estruturadora desta pro-posta, com formulrios padronizados, orientaes gerais e procedimentostambm comuns a todos os demais programas.

    O programa Desenvolvimento Institucional teve sua proposta tcni-

    ca construda pela equipe do programa, uma vez que o processo vividoat ento estudos de cenrio e dilogo ampliado gerou especificidadesque determinaram esta orientao (definir que conceito adotar, desenharprocedimentos, estabelecer diretrizes programticas, apontar princpios ereferenciais tericos que embasam o programa, entre outros).

    O desenho da proposta tcnica considerou as questes trazidas nosrelatrios do estudo de cenrio, as consideraes tecidas no decorrer dodilogo ampliado original. Considerou tambm o desafio da elaborao deum conceito abrangente, que contemplasse no seu arcabouo a viso de de-

    senvolvimento institucional, tanto interna como externamente, e o cenriode complexidade apresentado em torno do tema.

    O referencial terico que embasou a proposta do programa foi emgrande parte baseado na produo de Domingos Armani, que vem traba-lhando amplamente sobre o tema Desenvolvimento Institucional e que,posteriormente, realizou a avaliao crtica da proposta tcnica (prevista noMacroprocesso de Programas e Projetos). A leitura crtica de Armani trazaperfeioamentos e complementaes e consolida o que a equipe j vinhaproduzindo em relao construo do programa.

    Um ponto de realce trazido pelas contribuies da consultoria de

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    Domingos Armani o princpio da integralidade. Em um processo de de-senvolvimento sistmico, pautado por este princpio, so abarcadas todas

    as dinmicas que fazem acontecer os movimentos institucionais, levan-do-se em conta, de forma permanente e integrada, as quatro dimensesfundamentais do desenvolvimento institucional, abarcadas como eixosestruturadores do programa.

    Os eixos conceituais estruturadores so a porta de entradapara o apoio a projetos

    As organizaes proporiam projetos a partir dos eixos conceituaisestruturadores. Os eixos estruturadores seriam os elementos de entrada do

    projeto, e a partir deles a dinmica do programa se estabeleceria. O desafioda proposta tcnica era dar um formato de processo ao lastro conceitual,dar aplicabilidade terica e tcnica ao conceito, definir enfim como o con-ceito funcionaria na prtica. Os eixos permitiam um pensar de forma inte-grada, o que se revelou de grande importncia.

    EIXOS ESTRUTURADORES DO PROGRAMA DESENVOLVIMENTO INSTITUCIONAL

    IDENTIDADE:quem sou eu e o

    que me mobiliza

    AO SOCIAL:o que eu fao e

    como eu fao

    GESTO:como me organizo

    e me governo

    MOBILIZAO

    DE RECURSOS:como mobilizo os

    recursos necessrios

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    3.3. A seleo de projetos do programa Desenvolvimento InstitucionalO Instituto C&A estabeleceu em sua poltica de investimento o uso de

    editais ou cartas-convite como procedimento para a convocatria e seleo deprojetos parceiros. Este procedimento tambm se ampara no Macroprocessode Programas e Projetos e vale para todos os programas do Instituto C&A.

    UMA METODOLOGIA PARA O APRENDIZADO

    Estudar cenrioElaborar proposta

    tcnica do programa

    Selecionar

    projetos

    O programa Desenvolvimento Institucional estabeleceu diversas di-nmicas a partir do edital: definio de critrios de seleo; recebimentode projetos; e instalao de um comit de seleo, que no primeiro ciclo doprograma foi de mbito interno. No entanto, percebeu-se que a participa-o de tcnicos externos poderia ampliar a viso sobre os projetos apresen-tados. Ficou a aprendizagem.

    Fase classificatria um processo muito complexo e so muitas as intervenincias. Fo-ram consideradas nesta fase: a territorialidade; a regionalidade; a heteroge-neidade; a concepo de como se constroem processos de desenvolvimentoinstitucional; a capacidade da organizao de estabelecer dilogo; a idade eestgios das organizaes; os pblicos e outras intervenincias.

    Visita tcnicaOs critrios de seleo devem permitir um afunilamento at chegar

    a um nmero possvel para estabelecer escolhas. neste momento que severifica a necessidade de fazer uma visita tcnica s organizaes selecio-nadas, para dirimir dvidas e fazer a escolha acertada. A visita tcnica uma dinmica orientadora do processo de seleo e somente aps a suarealizao que se faz a publicao do edital, confirmando as organizaesselecionadas para o recebimento de apoio do Instituto C&A.

    Seleo de projetosForam escolhidas organizaes que queriam atuar no seu prprio de-

    senvolvimento, assim como organizaes que iriam fortalecer o desenvolvi-

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    mento de outras (o que daria capilaridade ao programa). No primeiro ciclodo programa, foram selecionados onze projetos: sete vieram a partir do

    edital e quatro por carta-convite.A escolha consciente do programa foi compor um grupo diversificado:tentar a composio heterognea de um grupo enriquecedor do processode contribuies; desenvolvimento um processo de construo de vriosolhares e de vrias compreenses, sendo a diversidade de estgios em orga-nizaes com 10, 15, 30, 40 anos um elemento desafiador para o programa.

    Formalizao de parceriasConcludo o processo de seleo, segue-se a formulao do contrato

    entre Instituto C&A e organizao parceira. Mesmo que o ciclo de apoioseja de trs anos, o que fica acordado com a organizao parceira que oapoio ser renegociado a cada ano, considerando os relatrios produzidose as informaes trazidas pelo monitoramento do programa.

    Na citao de Daza Amador (2012), o que se queria era propiciaravanos no nvel dos desafios ano a ano para alimentar a motivao e odesejo de se desenvolver. O pacto tinha por base a concepo de que desen-volvimento institucional processo e no se reduz a projetos.O apoio de

    trs anos visava o alcance de um processo maior, qual seja, aproximar-se,na prtica, de uma viso de desenvolvimento institucional orientada pelaintegralidade dos processos institudos.

    Aps a formalizao de parcerias, o programa Desenvolvimento Ins-titucional inicia a sua fase de implementao.

    3.4. Executar programasO executar programa um processo inerente a todos os demais pro-

    gramas do Instituto C&A, indicado pelo Macroprocesso de Programas e Proje-

    tos. Todos tambm apresentam subprocessos em comum, como os momentosformativos e a elaborao de relatrios semestrais, mas permite-se, no entanto,que cada programa encontre caminhos metodolgicos que lhe sejam especficos.

    O diagrama a seguir mostra claramente um passo a passo com osprincipais processos do programa Desenvolvimento Institucional, no qualo processo executar programa definido por um conjunto de subpro-cessos, a que se chamou de ciclos de implementao. So ciclos menoresdentro do ciclo maior de trs anos e que abrigam todos os procedimentosmetodolgicos do programa. A cada semestre processado um ciclo de im-plementao, computando, ao final do trinio, um total de seis ciclos de im-

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    plementao, integrados e recorrentes, permeados por processos de forma-o e de planejamento das organizaes parceiras, criao de instrumentos

    de monitoramento, reflexes, aprendizagens e construo de conhecimento.

    UMA METODOLOGIA PARA O APRENDIZADO

    Selecionar projetos

    Estudar cenrio Elaborar propostatcnica

    Proposta oramentria

    Executar programa

    Plano anual Autodiagnstico das

    organizaes Visitas tcnicas e institucional

    s organizaes

    Avaliar programa

    Relatrios semestrais Dilogo ampliado Marcos institucionais

    Pode-se considerar que uma das grandes conquistas para o desenhometodolgico do programa Desenvolvimento Institucional foi a de tra-balhar em um ciclo de investimento trienal, aqui reiterando que o apoioa projetos mediante prazos mais longos propicia a melhoria contnua daao que est sendo apoiada. Isto foi uma diretriz certeira para o progra-ma, j sabendo que o primeiro ano no se prope a alcanar resultados

    (embora sempre haja algum tipo de resultado), pois um tempo de ex-perimentar, de conhecer, de estabelecer relaes, sendo estas definidoraspara os dois anos seguintes. Se houver esta compreenso, confirma DazaAmador (2012), criam-se condies de abertura para o conhecimento dooutro, d-se tempo para este conhecimento aflorar, para esclarecer d-vidas. Assim, o outro estar aberto para novas percepes e aceitaes,como, por exemplo, aceitar a ideia de monitoramento.

    As relaes entre a equipe do programa e as organizaes parceirasj so forjadas no incio do primeiro ciclo de implementao, a envolven-

    do visitas institucionais, visitas tcnicas de monitoramento, o processo deformao das organizaes parceiras, chamado de Dilogo Ampliado, ea produo de relatrios semestrais. D-se tambm, a partir do primeirociclo, a elaborao dos primeiros marcos institucionais, cuja descriodos procedimentos est sumariamente descrita a seguir.

    esta estrutura que praticamente ser desenhada nos demais ciclosde implementao do programa, com pequenas variaes formais entreum ciclo e outro. O importante a considerar que as organizaes voano a ano amadurecendo os processos, enriquecendo suas prticas, oumelhor, desenvolvendo-se.

  • 7/26/2019 Protagonismo Sustentabilidade

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    3.4.1. Sumrio descritivo dos principais procedimentos metodolgicos eseus instrumentos8

    Um instrumento metodolgico no tem vida prpria. Ele sempre estligado a um processo, que por sua vez abarca uma concepo do fazer pe-daggico-institucional. Assim so tambm os instrumentos de trabalho noprograma Desenvolvimento Institucional, ora relacionados ao plano do mo-nitoramento, ora ao planejamento da organizao ou mesmo construo doconhecimento. So ricos e at complexos os procedimentos que definem o pro-

    grama Desenvolvimento Institucional, mas sua organicidade to processualque, ao final do ciclo trienal, tem-se a percepo cristalina de um movimentocoeso no sentido da integralidade. Assim, expor os procedimentos do progra-ma, sem levar em conta este carter articulado e integrado dos processos, seriatal como um caminhar pela fragmentao de um cenrio catico. No esteo caso aqui apresentado. Ass