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Jurisprudência da Quinta Turma

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA

HABEAS CORPUS N. 21.357 - SP (Registro n. 2002.0034536-2)

Relatora: Ministra Laurita Vaz

Impetrante: Sérgio Roberto Sacchi

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Impetrada: Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3Jl. Região

Paciente: Antônio Muniz Filho

EMENTA: Habeas corpus - Desacato e resistência - Argüição de falta de justa causa - Improcedência - Inépcia da denúncia - Au­sência de crime e inocência - Inexistência de demonstração irrefu­tável - Dilação probatória - Descabimento - Ação penal - Tranca­mento - Impossibilidade.

1. A teor do entendimento pacífico desta Corte, o trancamento da ação penal pela via de habeas corpus é medida de exceção, que só é admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca, a inocência do acusado, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade, circunstâncias essas, in casu, não evidenciadas. Pre­cedentes do STJ.

2. A denúncia descreve, com todos os elementos indispensáveis, a existência de crime em tese, sustentando o eventual envolvimento do Paciente com indícios consistentes e suficientes para a deflagra­ção da persecução penal, não havendo que se falar em ausência de justa causa para a ação penal.

3. Inexiste demonstração irrefutável da alegada inocência do ora paciente, da inépcia da denúncia, nem mesmo a excludente do cri­me argüida, razão pela qual a hipótese em testilha demanda conve­niente dilação probatória para apuração dos fatos, com o devido con­traditório, garantia ampla de defesa ao acusado, sendo incabível, pela estreiteza da via eleita, a antecipação precipitada do mérito.

4. Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, denegar a ordem, nos ter­mos do voto da Ministra-Relatora. Votaram com a Relatora os Srs. Ministros

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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José Arnaldo da Fonseca, Felix Fischer, Gilson Dipp e Jorge Scartezzini. Presidiu a sessão o Sr. Ministro Gilson Dipp.

Brasília-DF, 15 de abril de 2003 (data do julgamento).

Ministra Laurita Vaz, Relatora.

Publicado no DJ de 26.05.2003.

RELATÓRIO

A Sra. Ministra Laurita Vaz: Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de Antônio Muniz Filho, contra acórdão da Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 311. Região, que denegou

a ordem no HC n. 2001.03.00.021371-0-SP, assim ementado:

"Habeas corpus. Delitos capitulados nos artigos 183 da Lei n. 9.472/1997, e 329 e 331, § p., do Código Penal. Tipicidade.

- Imputando a denúncia aos pacientes condutas que constituem crime em tese, não há que se falar em falta de justa causa para a ação penal, as alegações de atividades em condições que dispensam autori­

zação conflitando com as informações da Autoridade-impetrada que refere acusação por fatos de prestação dos serviços para a comunida­de aberta, versando a argumentação exame aprofundado de provas des­

cabido no âmbito do remédio heróico.

- Alegações negando o elemento da clandestinidade com base em

informação das atividades ao Ministério das Comunicações que se profligam diante do conceito de atividades clandestinas ministrado pela lei, que como tal considera as operações de telecomunicações sem au­

torização do Poder Público.

- Alegações de decisão proferida em mandado de segurança a

amparar as atividades que são redutíveis ao princípio da independên­cia das instâncias penal e administrativa, a decisão proferida acaute­

lando a empresa apenas em face das sanções administrativas e civis, correndo por conta e risco dos pacientes as conseqüências de ordem

penal do fato como delito de telecomunicações. Denúncia que, ademais,

imputa aos pacientes fatos de distribuição de sinais de televisão por meios físicos a comunidades abertas, sem qualquer autorização, con­

cessão ou permissão do órgão competente, quando na ação manda­mental alegou-se o oferecimento de serviços a comunidade fechada, não

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se deparando identidade nas matérias tratadas no processo criminal e

segurança impetrada.

- Alegações pertinentes à conduta classificada como delito de

desacato que necessitam de minudente apreciação, também inviável no

âmbito do habeas corpus.

- Ordem denegada." (fi. 49).

Depreende-se dos autos que o ora paciente foi denunciado como

incurso nos arts. 329, § P', e 331, ambos do Código Penal, por ter desacata­

do funcionários da Anatel, bem como por ter oferecido resistência ao cumpri­

mento de suas funções, quando da fiscalização do exercício de atividades de

telecomunicações desenvolvidas, de forma supostamente clandestina, pela

empresa Spectrum Sistemas de Televisão Ltda.

Sustenta o Impetrante, no presente writ, a necessidade de trancamento

da Ação Penal n. 1999.61.09005157-6, em curso perante a 2a Vara Federal

da Seção Judiciária de Piracicaba-SP, aduzindo, para tanto, a falta de justa

causa para a ação penal, caracterizada pela atipicidade da conduta, pois não

configurada a clandestinidade nas operações de telecomunicações, já que

foram devidamente comunicadas ao Ministério das Comunicações.

Alega, também, a inépcia da denúncia, por ter sido respaldada em pe­

ças de informações que ainda não constavam dos autos. Acrescenta que os

fiscais da Anatel faltaram com a verdade, pois o ora paciente não praticou

os crimes pelo qual foi denunciado (desacato e resistência), sendo que, na

realidade, foram eles que agiram com abuso de autoridade.

Requer, assim, "a concessão da ordem para o trancamento da ação pe­

nal, por falta de justa causa, bem como pela inépcia da denúncia". (fi. 28).

A liminar pleiteada foi deferida à fi. 100.

Dispensadas as informações, colheu-se o parecer do Ministério Públi­

co Federal, o qual opinou pela denegação da ordem, nos termos da emen­

ta assim sintetizada:

"Penal. Processual. Trancamento da ação penal. Resistência e de­

sacato. Falta de justa causa.

1. Não se admite o trancamento da ação penal por falta de justa

causa, se esta baseia-se em denúncia contendo indícios razoáveis de

crime em tese e de sua autoria.

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2. O habeas corpus não é meio adequado para apreciar aspec­tos que envolvam o exame do conjunto probatório.

3. Parecer pela denegação da ordem." (fi. 105).

É o relatório.

VOTO

A Sra. Ministra Laurita Vaz (Relatora): O acórdão vergastado não mere­ce qualquer reparo, porquanto inexistente o alegado constrangimento ilegal.

Conforme se extrai dos autos, o ora impetrante pretende, com o pre­sente writ, trancar a ação penal na qual o ora paciente foi denunciado pela possível prática dos crimes de desacato aos funcionários da Anatel, bem como pelo de resistência à fiscalização de atividades de telecomunicações desenvolvidas, de forma supostamente clandestina, pela empresa Spectrum Sistemas de Televisão Ltda.

Alega a ausência de justa causa para a ação penal, a inépcia da denún­cia, bem como a inexistência de conduta delituosa do Paciente. Em defesa das alegações aduz que o ato praticado estava respaldado por ordem judi­cial, que foi mostrada aos fiscais no momento em que intentavam lacrar os equipamentos.

No entanto, observa-se que o Impetrante pretende é obter o reconhe­cimento sumário da inocência do Paciente, sem a averiguação dos indícios que apontam justamente em sentido oposto.

A teor do entendimento pacífico desta Corte, o trancamento da ação penal pela via de habeas corpus é medida de exceção, que só é admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca, a inocência do acusado, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade, circunstâncias essas,

in casu, não evidenciadas.

Nesse diapasão, dentre outros, confira-se os seguintes precedentes, in verbis:

"Processual Penal. Crime de abuso de autoridade e porte ilegal de arma de fogo. Alegação de ausência de justa causa. Inépcia da de­núncia. Inocorrência.

- No âmbito deste Colegiado, tem-se consagrado que o tranca­mento de ação penal por falta de justa causa, pela via estreita do writ,

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somente se viabiliza quando, pela mera exposição dos fatos narrados na denúncia, constata-se que há imputação de fato penalmente atípico ou que inexiste qualquer elemento indiciário demonstrativo da auto­ria do delito pelo :paciente. Hipótese não ocorrente.

- Ordem denegada." (RRC n. 1.959-SP, Quinta Turma, reI. Min. Jorge Scartezzini, DJ de 18.11.2002).

"Recurso em habeas corpus. Abuso de autoridade. Ausência de justa causa. Inépcia da denúncia por falta de descrição da conduta delituosa. Falta de representação do ofendido.

1. Como a denúncia narra fato tipificado criminalmente e exis­tem efetivos indícios de autoria, não sendo o caso de extinção de punibilidade, não há falar-se em trancamento da ação penal por ausên­cia de justa causa.

2. Não se exige, com rigores formais, a representação por parte

da vítima ou seu responsável, sendo suficiente a inequívoca demons­tração do seu interesse na instauração da ação penal.

3. Recurso ordinário a que se nega provimento." (RRC n. 10.303-SP, Quinta Turma, reI. Min. Edson Vidigal, DJ de 15.10.2001).

"Habeas corpus. Trancamento da ação penal. Alegação depen­

dente do exame probatório. Impossibilidade em via de remédio herói­co. Ordem denegada.

Constando no corpo de delito a indicação precisa do nome do Pa­ciente e os indícios suficientes para auferir a conduta delituosa, afigu­

ra-se inviável afastar a propositura acusatória sem adentrar o materi­al cognitivo, obstáculo suficiente ao procedimento de habeas corpus.

Ordem denegada." (HC n. 24.440-SP, Quinta Turma, reI Min.

José Arnaldo da Fonseca, DJ de 19.12.2002).

"Penal. Processual. Ação penal. Trancamento. Denúncia que des­creve crime em tese. Habeas corpus. Recurso.

1. Não se tranca ação penal se a denúncia narra fato configurador de crime em tese, e descreve, efetivamente, a participação do acusado no evento criminoso.

2. As provas, em habeas corpus, devem ser incontroversas, e os

fatos, convergentes.

3. Recurso não provido." (RRC n. 9.147-SP, Quinta Turma, reI. Min. Edson Vidigal, DJ de 13.12.1999).

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Com efeito, a denúncia descreve, com todos os elementos indispensá­veis, a existência de crime em tese, sustentando o eventual envolvimento do Paciente com indícios consistentes e suficientes para a deflagração da persecução penal.

Em sentido contrário à tese sustentada na impetração, verifica-se nos autos outra versão para os fatos. Depreende-se da peça acusatória que o Paciente, sem ter uma conduta condizente "com o Illunus de função essen­cial da Justiça (CF/1988, art. 133)" (fl. 57), desacatou os agentes de fisca­lização da Anatel, quando procediam a inspeção na empresa Spectrum, afir­mando que os mesmos não se passavam de "falsários" (fl.57) e que apenas intencionavam obter alguma vantagem financeira indevida, o que acabou por impedir o cumprimento da fiscalização, determinada pela missão rota WLI 09/062-RE-SP-1999.

Nesse contexto, mostra-se insubsistente o pleito deduzido no presen­te writ, na medida em que o deslinde da questão, isto é, a existência ou não do crime e o aspecto subjetivo da conduta do acusado, demanda conveni­ente dilação probatória para apuração dos fatos, com o devido contraditó­rio e ampla defesa, sendo incabível, pela estreiteza da via eleita, a anteci­pação do mérito.

Tal fundamentação também se aplica à alegada inépcia da denúncia, que, segundo afirma o Impetrante, encontra-se respaldada em peças de in­formações que ainda não constavam dos autos (PRM-PIRA n. 150/2001) no momento de seu oferecimento, sendo necessário, portanto, um aprofundado exame do material fático-probatório dos autos.

De outro lado, inexiste a demonstração irrefutável da alegada inocência do ora paciente, nem mesmo a excludente da ilicitude argüida, razão pela qual a hipótese em testilha não autoriza a medida excepcionalíssima pre­tendida.

Por fim, ~umpre ainda ressaltar a observação feita no parecer do Mi­nistério Público Federal, de que, "nos autos do HC n. 19.968-SP, no qual se pretendia igualmente o trancamento de ação penal a que respondem Glauco Azevedo Casimiro e Gleicom Azevedo Casimiro pela prática, em tese, do delito descrito no art. 183 da Lei de Telecomunicações, fatos estes conexos com o do presente writ, a colenda Quinta Turma do Superior Tri­bunal de Justiça, denegou a ordem, em sessão realizada no dia 24.09.2002" (fl. 110), e que foi publicada no DJ do dia 17.03.2003.

Ante o exposto, denego a ordem.

É o voto.

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HABEAS CORPUS N. 21.645 - RS (Registro n. 2002.0044908-2)

Relator: Ministro Jorge Scartezzini

Impetrantes: Ricardo Fernandes Berenguer e outro

Impetrado: Tribunal Regional Federal da 4J.l. Região

Paciente: Acácio Antônio de Barros Porto

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EMENTA: Habeas corpus - Trancamento da ação penal por au­sência de justa causa - Descaminho - Ausência de dolo - Exame profundo de provas - Instrumento impróprio.

- Consoante o disposto na jurisprudência, em sede de habeas corpus somente é viável o trancamento de ação penal por falta de justa causa quando despontam, primo ictu oculli a inocência do acusado, a atipicidade da conduta ou se acha extinta a punibilidade.

- A via angusta do habeas corpus não pode ser utilizada para fazer trancar ação penal, sob a alegação de ausência de dolo.

- Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, em denegar a ordem. Votaram com o Sr. Ministro-Relator os Srs. Ministros Laurita Vaz, José Arnaldo da Fonseca, Felix Fischer e Gilson Dipp.

Brasília-DF, 20 de fevereiro de 2003 (data do julgamento).

Ministro Jorge Scartezzini, Relator.

Publicado no DJ de 14.04.2003.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Jorge Scartezzini: Trata-se de habeas corpus impe­trado por Ricardo Fernandes Berenguer e Damián Vilutis, em benefício de

Acácio Antônio de Barros Porto, contra o v. acórdão proferido pela egré­gia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 4J.l. Região, que concedeu

em parte a ordem ali impetrada, nos termos da seguinte ementa:

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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"Habeas corpus. Competência. Inépcia da denúncia. Inexis­

tência. Trancamento de ação penal. Falta de justa causa. Interrogató­rio do réu. Precatória.

A competência para o processo e julgamento por crime de con­trabando ou descaminho define-se pela prevenção do Juízo Federal do

lugar da apreensão dos bens (Súmula n. 151 do STJ).

Não há falar em inépcia da denúncia pois atendidos os requisi­tos do art. 41 do CPP.

o habeas corpus não é remédio processual adequado para o deslinde de matéria fática, dependente de exame aprofundado de pro­va controvertida, sendo inadmissível o trancamento de ação penal quan­

do não demonstrada de forma inequívoca a falta de justa causa, deven­do-se aguardar o desfecho da instrução criminal, segundo o devido processo legal.

Em atenção ao princípio da ampla defesa, o interrogatório do

acusado, embora ato pessoal do' Juiz do processo, pode ser colhido mediante precatória." (fl. 272).

Consta dos autos que o Paciente, funcionário da empresa Courier

DHL Worldwide Express Brasil Ltda, foi denunciado, perante o MM. Juízo Federal da 1>1. Vara Criminal da Seção Judiciária de Porto Alegre, por cri­

me de descaminho, descrito no art. 334 do Código Penal, porque, na quali­dade de representante legal da referida empresa, atribuiu o valor de U$ 24,19

(vinte e quatro dólares americanos e dezenove centavos) a mercadorias cuja

fatura do exportador, bem como do transporte aéreo, somavam EUR 4.738,66 (quatro mil setecentos e trinta e oito euros e sessenta e seis cen­

tavos). Assim agindo, consoante consta da exordial acusatória, o Paciente

teria iludido a arrecadação de parte dos tributos federais devidos pela im­portação.

Diante disso, os representantes do acusado impetraram, perante o egré­gio Tribunal Regional Federal da 4>1. Região, ordem de habeas corpus vi­

sando ao trancamento da ação penal, sob o argumento de falta de justa causa

e da inépcia da denúncia, por ausência dos requisitos dispostos no artigo 41

do Código de Processo Penal, e pela manifesta incompetência do Juízo-im­

petrado. A egrégia Oitava Turma, por maioria de votos, concedeu parcial­

mente a ordem, consoante se lê da respectiva ementa acima transcrita, ape­

nas para possibilitar a realização de interrogatório via precatória.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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Daí, a presente impetração, substitutiva de recurso ordinário, objeti­vando o trancamento da ação penal e repisando os argumentos expendidos perante a Corte a quo. Aduz o Impetrante que o valor declarado pelo Pa­ciente originou-se de um erro ocorrido na empresa, que digitou erroneamente

a quantia de UI 24,19 (vinte e quatro dólares americanos e dezenove centa­vos). Tal declaração, apenas teria sido assinada pelo acusado. Alega, portanto,

erro operacional da empresa. Sob outro prisma, aduz que a denúncia aponta como local do desembaraço aduaneiro a cidade de Porto Alegre, quando, na verdade ela se deu em Campinas, na Receita Federal de Viracopos.

Foram apresentadas informações pela autoridade apontada como coatora às fls. 253/266.

A douta Subprocuradoria Geral da República, às fls. 285/290, opina pela denegação da ordem, por entender que "É da jurisprudência dessa Cor­te Superior de Justiça o entendimento de que em sede de habeas corpus somente é viável o trancamento de ação penal por falta de justa causa quan­do, primo ictu oculli, desponta a inocência do acusado, a atipicidade da conduta ou se acha extinta a punibilidade".

Após, vieram-me conclusos os autos.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Jorge Scartezzini (Relator): Sr. Presidente, como re­latado, pretendem os Impetrantes o trancamento da ação penal alegando, para tanto, inépcia da exordial acusatória, que não descreveu, nos termos do art. 41 do CPP, a conduta criminosa, bem como atipicidade do fato, por­quanto a inserção do valor declarado à receita originou-se de erro opera­cional da empresa.

Narra a peça vestibular (fls. 82/83), verbis:

"1. O acusado, na qualidade de representante legal da 'MKS

Transportes Especiais Ltda', despachante aduaneiro, desembaraçou em 22.10.1999, junto à unidade alfandegária nesta Capital, as mercadorias relacionadas à fl. 6 por um valor de US$ 24,19, valor este a menor

inserido no doc. de fl. 79 (sublinhado), assinado pelo acusado, com o

que iludiu parte - R$ 2.924,70 - dos tributos federais devidos pela importação (vide diferença infra). Ocorre que o valor constante da fa­tura do exportador bem como do conhecimento de transporte aéreo

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dão conta de outro valor para as mercadorias, qual seja, de EUR 4.738,66, correspondente na época a US$ 5.098,98.

1.1 Portanto, afim de se z"ludir o real valor dos tributos a serem pa­gos por ocasião do desembaraço das mercadorias oriundas da França desti­nadas a empresa (AGCO do Brasil Com. e Ind. Ltda' em Canoas-RS, o

valor declarado das mercadorias foi consideravelmente inferior ao real valor.

2. Destarte, bem como pelos documentos que instruem a presente representação (representação, auto de infração, faturas, Dar±), verifi­ca-se que a materialidade do delito é indiscutível.

3. O valor dos tributos devidos, acaso o acusado tivesse declara­do corretamente seus valores por ocasião do desembaraço que promo­veu seria de R$ 2.948,89 (dois mil, novecentos e quarenta e oito reais e oitenta e nove centavos), ou seja, mais de 120 vezes superior ao decla­rado, segundo informou a Receita Federal na fl. 6. Prestou a Aduana, também, os esclarecimentos requisitados por esta PR-RS (fl. 92)."

Como se observa, a denúncia descreve, indubitavelmente, a ocorrên­cia de inserção equivocada de valor de desembaraço aduaneiro inferior ao que efetivamente deveria ser declarado. Tal circunstância, aliás, é reconhe­cida pelo próprio Impetrante quando assevera em suas razões (fl. 5), verbis:

«Ocorre, egrégio Tribunal, que em razão de um erro ocorrido na DHL da França, o valor total das mercadorias enviadas pela Fermec para a AGCO foi digitado erroneamente no sistema da empresa, quando da conversão do montante de euros para dólares americanos."

De outro lado, extrai-se do auto de infração (fl. 148):

«É importante que se frise ainda, o quanto representa a diferença entre o valor real (USI 5,098.98) e o valor pelo qual foi desembaraça­da a remessa em tela (USI 24.19), diferença essa de USI 5,074.79, que corresponde a aproximadamente 210 vezes o valor de USI 24.19. Sem dúvida, é muito. Essa diferença ilustra o quão irregular foi a importação dessa remessa."

Evidentemente que a conduta do Paciente, em tese, constitui-se fato tí­pico. Houve, como comprovado e reconhecido pelo Impetrante, a inserção de dados inverídicos que redundou na supressão no pagamento de tributos. As alegações do Impetrante de que o valor declarado foi oriUlJdo de equívoco

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no sistema operacional da empresa é matéria de prova, cuja apuração deverá

ser feita no decorrer da instrução criminal. Assim sendo, considero irretocável o aresto guerreado que esposou este ponto de vista, merecendo destaque o seguinte trecho (fi. 282), verbis:

"Em suma, a falta de justa causa defendida pelo Impetrante passa

pela análise detalhada de elementos probatórios, sendo o âmbito adequa­do para tal discussão o regular procedimento penal, onde poder-se-á ave­

riguar com tranqüilidade se as alegações do acusado, notadamente a au­sência de dolo, são suficientes para afastar os fatos descritos na denúncia. Em contrapartida, na via estreita do habeas corpus, tal atividade não tem espaço. O remédio heróico, até por demandar celeridade, não ad­mite ampla análise de provas. Para que haja, em sede mandamental, a coarctação do feito criminal, a ausência de justa causa deve ser demons­trada de plano.

Em outros termos, o trancamento da ação só tem lugar nesta via pro­cessual quando desde logo se vislumbra a desnecessidade do prosseguimento daquela. Agora, se a questão versa sobre aspecto duvidoso, reitere-se, não convém obstar prematuramente a persecutio crirninis, a menos que as

evidências pré-constituídas demonstrem de maneira indiscutível a total improcedência da acusação formulada pelo Ministério Público o que, por certo, não é o caso dos autos."

Nesse diapasão, esta Corte, através de inúmeros julgados, tem procla­mado que em sede de habeas corpus somente é viável o trancamento de ação penal quando, primo ictu oculli, desponta a inocência do acusado, a atipicidade da conduta ou se acha extinta a punibilidade. A contrario sensu, é inadmissível seu trancamento mediante a proclamação da ausên­cia de justa causa, não reconhecível prima fade. Nesse sentido merece destaque:

"Recurso ordinário em habeas corpus. Homicídio culposo. Ne­

gligência e imperícia médica. Inépcia da denúncia. Inocorrência. Re­quisitos do art. 41 respeitados. Possibilidade de defesa. Trancamento da ação penal por falta de justa causa ante a contradição das provas

carreadas e os termos da denúncia ofertada. Matéria complexa que

exige exame aprofundado de provas, inviável na via eleita.

Narrando a exordial acusatória crime em tese, na forma do art. 41 do CPP, não procede a alegação de inépcia da denúncia, a qual permite

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o exercício pleno do direito de defesa. Descabe o trancamento da ação penal, por falta de justa causa, descrevendo a denúncia-crime em tese,

com indícios mínimos de autoria, se da análise dos autos não desponta

de forma flagrante e incontroversa a inocência dos acusados, a atipici­dade da conduta ou a extinção da punibilidade.

Recurso desprovido." (RRC n. 11.844-MG, reI. Ministro José Arnaldo da Fonseca, in DJU de 13.05.2002).

De outro lado, em suas razões, os Impetrantes alegam que a denúncia

contém, ainda, uma incongruência técnica que a tornaria inepta. Tal como visto, ela aponta como local do desembaraço aduaneiro a cidade de Porto

Alegre, quando na realidade tal fato se deu em Campinas.

Na esteira do v. acórdão combatido, entendo que, conquanto efetiva­

mente tenha ocorrido a falha do órgão ministerial na elaboração da peça

inaugural, verifico que tal circunstância não possui o condão de torná-la inepta.

Com efeito, pelo que se depreende dos autos, a mercadoria foi efetiva­mente desembarcada no aeroporto de Viracopos, em Campinas. Entretanto, sua apreensão e elaboração do auto de infração se deu em Porto Alegre. Somente neste local é que se constatou a ocorrência da ilusão no pagamento

de imposto devido, sendo este fato de pleno conhecimento do acusado, o que lhe possibilita a ampla defesa e contraditório, o que, aliás, vem sendo exercido.

Destarte, a controvérsia acerca do local da ocorrência da infração cin­

ge-se, tão-somente, à discussão competencial, o que, evidentemente, é insu­ficiente para o trancamento da ação penal, calcado na alegação de ausên­

cia de justa causa. Incensurável, por conseguinte, o v. aresto quando alinha­vou (fl. 275):

"Ora, mesmo que a peça tenha se equivocado quanto ao local do

desembaraço das mercadorias - refere como tendo sido nesta Capital,

quando na verdade se deu no Aeroporto de Viracopos, Campinas-SP, -não causou qualquer prejuízo à defesa do acusado que, como se sabe,

tem plena ciência dos fatos que lhe estão sendo imputados. Ademais,

como visto, os elementos que acompanham a acusação são suficientes

ao recebimento da inicial e instauração da ação penal pertinente, atendi­dos que estão os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal."

RST], Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 425

Por fim, impõe ressaltar que improcede a alegação dos Impetrantes de atipicidade da conduta lastreada no fato da empresa destinatária - AGCO do Brasil Comércio e Indústria Ltda, através de seu despachante aduaneiro (fi.

143), ter procurado o Fisco para que se procedesse a correção no lançamen­to dos valores das mercadorias, feito pelo Paciente, representante legal da

DHL. Tal circunstância, na realidade, poderia traduzir-se, apenas, em mera atenuante, não retirando, portanto, o caráter delituoso do fato.

Ante o exposto, denego a ordem.

É como voto.

Relator:

Impetrante:

Impetrada:

Paciente:

HABEAS CORPUS N. 22.591 - SP (Registro n. 2002.0061835-2)

Ministro José Arnaldo da Fonseca

Carlos Castilho dos Santos

Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Carlos Castilho dos Santos (preso)

EMENTA: Processual Penal e Penal - Habeas corpus - Tráfico Guarda penitenciário - Majorantes do art. 18, II e IV, da Lei n.

6.368/1976 - Alegação de bis in idem - Inexistência - Ordem dene­gada.

A aplicação simultânea das causas de aumento de pena cons­tantes do art. 18, II e IV, da Lei de Tóxicos, não resulta em bis in idem, porque ambas têm definição diversa e se aplicam a situações independentes.

Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, em que são partes as acima indicadas, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribu­nal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir,

RST}, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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426 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

por unanimidade, denegar o pedido. Os Srs. Ministros Felix Fischer, Gilson

Dipp e Jorge Scartezzini votaram com o Sr. Ministro-Relator.

Brasília-DF, 7 de novembro de 2002 (data do julgamento).

Ministro José Arnaldo da Fonseca, Relator.

Publicado no D} de 02.12.2002.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca: Carlos Castilho dos Santos, em proveito próprio, impetra habeas corpus, com pedido de liminar, ar­rimado no art. 5ll., LXVIII, da Constituição Federal, e arts. 647 e 648, I e

VI, do Código de Processo Penal, contra v. acórdão proferido pela Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em sede de apelação criminal.

Sentenciado o Paciente à pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de

reclusão, mais multa, porque teria praticado o crime do tipo penal do art. 12, c.c. art. 18, II e IV, ambos da Lei n. 6.368/1976, interpôs apelação,

objetivando a sua absolvição ou desclassificação do crime de tráfico para porte de entorpecentes, sendo-lhe negado provimento.

Contra essa decisão, então, impetra o writ, ao argumento originário da ocorrência de bis in ide:m, em razão de dupla majoração da pena-base pelo mesmo motivo, denotando flagrante coação ilegal, e requerendo, ao final, seja anulada a sentença para que outra seja proferida sem o aumento cogitado.

A liminar foi indeferida por esgotar-se no mérito da impetração.

Autos devidamente instruídos, foram dispensadas as informações.

O Ministério Público Federal manifestou-se às fls. 21/25.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca (Relator): Observa-se, de iní­

cio, que o tema aventado nesta impetração não foi objeto de discussão pelo Tribunal de origem. Entrementes, circunscrito à análise eminentemente ju­

rídica, qual seja, aplicação ou não de causa de aumento de pena a partir dos fatos já decididos, não se cogita de sua inadmissibilidade em face dos pre­

cedentes desta Corte Superior.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 427

No que respeita ao mérito causal, então, a tese preconizada como de­fesa está em dissonância com a melhor interpretação do art. 18 e seus incisos da Lei de Tóxicos. Realmente, as causas específicas do aumento de pena indicadas pelos incisos II e IV daquele artigo não têm a correlação

pretendida, afigurando incontestável o decisum. condenatório.

A propósito, a manifestação do ilustre representante ministerial, às fls. 23/25, muito bem definiu a solução do remédio constitucional, verbis:

"Cinge-se a questão à aplicabilidade ou não da causa especial de aumento de pena prevista no inciso IV do artigo 18 da Lei n. 6.368/ 1976, alegando o Impetrante que, sendo funcionário público, somen­te naquele local comum de trabalho - no caso o estabelecimento pe­nal - poderia praticar o crime.

Ora, consta dos autos que o Paciente, Agente de Segurança da Casa de Detenção de Sorocaba, prevalecendo-se de sua função, ingres­sou no estabelecimento portando cerca de 26,62 gramas de maconha, com a finalidade de ali comercializá-la, tratando-se, pois, de hipóte­se que se adequa perfeitamente à conduta prevista no inciso IV do ar­tigo 18 da Lei Antitóxicos.

A tese esposada na impetração, no sentido de que a causa espe­cial do inciso IV configura circunstância integrante do tipo da majo­ração do inciso II, não merece ser prestigiada, descartando-se, de logo, por absolutamente insustentável.

Com efeito, o fato de o crime ter sido praticado por funcionário público (in casu, agente penitenciário), não implica que, necessaria­mente, abranja a descrição da conduta prevista no art. 18, inciso IV, Lei

n. 6.368/1976 (ser o crime praticado no interior ou nas imediações de estabelecimento penal), a ensejar o alegado bis in idem..

Isto porque, a majorante do inciso IV aplica-se a qualquer pessoa que venha a praticar os atos preparatórios, de execução ou consuma­ção 'nas imediações ou no interior de estabelecimentos de ensino, hos­pitalar, de sede de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo de estabele­cimentos penais, ou de recintos onde se realizem espetáculos ou diver­sões de qualquer natureza, sem prejuízo da interdição do estabeleci­mento ou do local'.

Assim, perfeita a incidência do dispositivo supracitado àquele que, prevalecendo-se de função pública, pratica a mercancia dentro de

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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428 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

estabelecimento penitenciário, devendo, pois, incidir as duas majo­rantes, valendo ressaltar, por oportuno, que, no caso sub judice, ca­beria ao Paciente zelar pelo respeito às instituições penitenciárias, eis que, especificamente, tinha o dever legal de guarda e vigilância.

Nesse sentido, trago à colação precioso julgado do Supremo Tri­bunal Federal, referente ao Habeas Corpus n. 71.813-SP, relatado pelo Ministro Sepúlveda Pertence, in verbis:

'Tráfico de entorpecentes: fixação da pena.

1. Causa especial de aumento: crime praticado no interior,

na portaria ou nas imediações de estabelecimento penitenciário: incidência (Lei n. 6.368/1 976, art. 18, IV).

2. Agravante: crime praticado com abuso de poder ou vio­lação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão: sua incidência não constitui bis in idem com a do art. 18, IV, da Lei de Entorpecentes.' (DJ de 04.08.1995, p. 22.444)."

Diante do exposto, denego a ordem.

HABEAS CORPUS N. 24.480 - MT (Registro n. 2002.0119881-1)

Relator: Ministro Gilson Dipp

Dorgival Gomes dos Santos Impetrante:

Impetrada:

Paciente:

Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Esta­do do Mato Grosso

Dorgival Gomes dos Santos (preso)

EMENTA: Criminal - HC - Homicídio qualificado - Estelionato

- Ocultação de cadáver - Documento falso - Quadrilha - Prejuízo à defesa pela impossibilidade de nomeação de defensor para acompa­

nhar oitiva de testemunhas de acusação - Crime de documento fal­

so que deveria ser absorvido pelo de estelionato - Inépcia da denún­cia - Ofensa ao contraditório - Supressão de instância - Não-conhe­

cimento - Nulidades - Citação por edital - Paciente preso e citado

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 429

pessoalmente - Dispensa de testemunhas pelo Ministério Público -Faculdade da parte - Possibilidade de arrolamento na contrariedade ao libelo - Falta de exame de corpo de delito na vítima - Troca de dados pessoais - Inexistência de laudo comprobatório de documen­to falso e da prática de crime contra o patrimônio - Irrelevância -Outras provas que evidenciam a prática delituosa - Deficiência na fundamentação da sentença de pronúncia - Mero juízo de suspeita -Legalidade do decisum - Ordem parcialmente conhecida e denegada.

I - Não se conhece das alegações de prejuízo à defesa pela im­possibilidade de o Paciente constituir defensor para acompanhar a oitiva das testemunhas de acusação, de que o crime de documento falso deveria ser absorvido pelo de estelionato, de inépcia da denún­cia e de ofensa ao contraditório, se os temas não foram objeto de debate e decisão pelo Tribunal a quo, sob pena de indevida supres­são de instância.

II - Não resta configurada a nulidade da citação por edital se, após o referido ato, o Paciente foi preso e pessoalmente citado na cadeia onde se encontrava, tendo sido interrogado e apresentado de­fesa prévia por intermédio de seu defensor.

III - A desistência da oitiva das testemunhas anteriormente ar­

roladas pelo Ministério Público não depende da concordância do réu, pois constitui faculdade da parte.

IV - Ausência de constrangimento ilegal na dispensa de teste­munhas do Parquet, pois a defesa poderá arrolá-las quando do ofe­recimento da contrariedade ao libelo.

V - Alegação de ausência de exame de corpo de delito da víti­ma que não merece ser acolhida, se evidenciado que o referido lau­do foi realizado, pensando-se tratar do cadáver do próprio paciente, ocorrendo, apenas, a troca de dados pessoais.

VI - Corpo da vítima que teria sido ocultado, em tese, pelo Pa­ciente, impossibilitando posterior exumação e reconhecimento.

VII - A falta de laudo comprovando a existência de documento falso não enseja a nulidade, se os autos noticiam a expedição de cer­

tidão por Cartório de Registro Civil atestando a inexistência de da­dos de nascimento referente ao nome utilizado pelo Paciente no re­gistro de acidente e suposta morte. Tal informação já caracteriza in­dícios da ocorrência de delito de documento falso.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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430 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

VIII - Não se faz necessária a realização de laudo para a com­provação de crime contra o patrimônio, se outras provas constantes dos autos são suficientes para evidenciar a suposta prática do deli­to, tais como apólices de seguro em nome do Paciente, constando como beneficiária sua esposa, que teria já recebido indenização pela "morte" do seu marido.

IX - Somente quando evidente a inexistência de crime ou a au­sência de indícios de autoria - em decorrência de circunstâncias demonstradas de plano e estreme de dúvidas - pode o julgador jul­gar improcedente a pretensão punitiva, deixando de pronunciar o réu, sendo que eventuais dúvidas sobre tais circunstâncias deverão

ser dirimidas apenas pelo Tribunal do Júri.

X - A exposição, pelo julgador monocrático, de consistente sus­peita jurídica da existência do delito, assim como da possível parti­

cipação do Paciente no mesmo, com base nos indícios dos autos, já legitima a sentença de pronúncia.

XI - Ordem parcialmente conhecida e denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, em que são partes as acima indicadas, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribu­nal de Justiça. A Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente do pedi­do e, nessa parte, denegou a ordem. Os Srs. Ministros Jorge Scartezzini, Laurita Vaz, José Arnaldo da Fonseca e Felix Fischer votaram com o Sr.

Ministro-Rela tor.

Brasília-DF, 25 de março de 2003 (data do julgamento).

Ministro Gilson Dipp, Relator.

Publicado no DJ de 28.04.2003.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Gilson Dipp: Adoto, como relatório, a parte expositiva

do parecer ministerial de fls. 86/92, in verbis:

"1. O Tribunal de Justiça do Mato Grosso negou provimento ao recurso em sentido estrito interposto por Dorgival Gomes dos Santos.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 431

Manteve, portanto a sentença de pronúncia, admitindo as acusações

com o objetivo de submetê-lo ao julgamento do júri pela prática, em concurso material, de vários crimes previstos no Código Penal, a sa­

ber: formação de quadrilha (art. 288), homicídio qualificado (art. 121, § 2Q

, I, IV e V), ocultação de cadáver (art. 211), estelionato mediante fraude para recebimento de valor de seguro (art. 171, V), tentativa de

estelionato mediante fraude para recebimento de valor de seguro (arts. 14, II, e 171, V) e uso de documento falso (art. 304).

Inconformada e pleiteando a reforma do acórdão, a defesa impe­trou o presente habeas corpus, que se insere na esfera de competên­cia originária dessa Corte e deve ser conhecido (art. 105, I, c, da CF)."

A Subprocuradoria Geral da República opinou pelo parcial conheci­mento e, nesta parte, pelo indeferimento do writ (fi. 92).

É o relatório.

Em mesa para julgamento.

VOTO

o Sr. Ministro Gilson Dipp (Relator): Trata-se de habeas corpus

contra acórdão do egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso,

que negou provimento ao recurso em sentido estrito interposto em favor de Dorgival Gomes dos Santos, visando à reforma da sentença de pronúncia

prolatada em seu desfavor.

O Paciente foi pronunciado como incurso nas sanções dos artigos 121, § 2 Q

, incisos I, IV e V; 171, inciso V, c.c. o art. 14, inciso II; 171, inciso V;

211,288 e 304, todos do Código Penal.

Em razões, sustenta-se, em síntese, a inexistência de citação válida, pois a citação por edital não teria observado os ditames legais, além de que o Paciente teria sido prejudicado em sua defesa, pois não teria constituído

defensor para acompanhar a oitiva das testemunhas de acusação.

Aduz-se que o Ministério Público não poderia ter dispensado testemu­nhas sem a concordância do Réu; que a falta de exame de corpo de delito

da suposta vítima, do documento apontado como falso, bem como da ocor­

rência de crime contra o patrimônio, acarretaria nulidade absoluta.

Alega-se, ainda, que o crime de documento falso deveria ser absorvi­

do pelo de estelionato, pois o referido documento teria sido utilizado para

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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432 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

o cometimento, em tese, do delito previsto no art. 171 do CP, além da inép­

cia da denúncia, que não descreveria a conduta do Paciente de forma indi­vidualizada.

Por fim, a impetração aponta que teriam sido juntados documentos aos

autos sem o consentimento da defesa, o que ofenderia ao princípio do con­traditório, e que a decisão do Juiz singular não estaria devidamente funda­mentada.

Pugna, então, pelo trancamento ou anulação da ação penal instaurada

em desfavor do Paciente.

Entretanto, não merece prosperar a irresignação.

Inicialmente, deixo de proceder à análise da irresignação quanto às

alegações de prejuízo à defesa pela impossibilidade de o Paciente constituir

defensor para acompanhar a oitiva das testemunhas de acusação, de que o crime de documento falso deveria ser absorvido pelo de estelionato, de inép­

cia da denúncia e de ofensa ao contraditório, sob pena de indevida supres­

são de instância, se os temas não foram objeto de debate e decisão pelo Tri­bunal a quo.

Com efeito, o acórdão impugnado foi restrito à análise das preliminares

de nulidade da citação, nulidade do inquérito policial, dispensa de testemu­nhas arroladas na denúncia, falta de laudo pericial da vítima, da existência

de documento falso, da comprovação do crime contra o patrimônio, e de nulidade da denúncia, pois o inquérito policial teria sido conduzido para

atender aos interesses das seguradoras (fls. 74/77).

No mérito, o aresto do Tribunal a quo analisou o pleito de absolvi­

ção do Paciente quanto aos delitos de estelionato, uso de documento falso,

ocultação de cadáver e formação de quadrilha, ou de despronúncia, ou, ain­da, de desclassificação do delito de homicídio qualificado para homicídio

culposo. (fls. 78/79).

Passo ao exame das demais questões trazidas pelo Impetrante.

No que se refere à nulidade da citação por edital, não assiste razão ao

impetrante.

O Tribunal de origem ressaltou que, após a citação editalícia, o Pa­

ciente foi preso e pessoalmente citado na cadeia onde se encontrava, tendo

sido interrogado e apresentado defesa prévia por intermédio de seu defensor.

Quanto à alegação de que o Parquet não poderia ter dispensado teste­munhas sem a concordância do Paciente, nos termos do art. 404 do CPP,

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDENCIA DA QUINTA TURMA 433

cabe às partes a decisão a respeito da desistência da oitiva das testemunhas

arroladas.

Como bem salientou a douta Subprocuradoria Geral da República, a

dispensa das referidas testemunhas não configura constrangimento ilegal, até

mesmo porque a defesa, caso entenda necessário, poderá arrolá-las quando

do oferecimento da contrariedade ao libelo.

A apontada nulidade absoluta decorrente da suposta ausência de exa­

me de corpo de delito da vítima também não merece ser acolhida.

O decisum ora atacado, proferido em 2.\1. grau de jurisdição, esclare­

ceu que o referido laudo foi realizado, só que, à época, pensou-se que o ca­

dáver seria do próprio Paciente. Assim, a autopsia foi realizada no corpo da

vítima Lázaro, fazendo-se constar os dados de Dorgival.

A respeito, o Ministério Público Federal destacou:

" ( ... )

Na realidade, se o Paciente responde por ocultação de cadáver

porque deu sumiço ao corpo de Lázaro, obstando a exumação e o re­

conhecimento (arts. 163 e 166 do CPP), não deve se beneficiar da pró­pria torpeza.

Em suma: a realização do exame de corpo de delito, através da

exumação do cadáver da vítima, foi inviabilizada pelo acusado, que não

pode agora impedir se prove a materialidade do ilícito por meio de testemunhos." (fi. 88).

Por outro lado, quanto às nulidades relativas à falta de laudo compro­

vando a existência de documento falso, bem como o crime contra o patri­

mônio, melhor sorte não assiste à impetração.

Os autos noticiam que foi expedida certidão por Cartório de Registro Civil atestando a inexistência de registro de nascimento referente ao nome

utilizado pelo Paciente no registro de acidente e suposta morte. Tal infor­

mação já caracteriza indícios da ocorrência de delito de documento falso.

Outrossim, não se faz necessária a realização de laudo para a compro­

vação de crime contra o patrimônio, se outras provas constantes dos autos

são suficientes para evidenciar a suposta prática do delito, tais como apó­

lices de seguro em nome do Paciente, constando como beneficiária sua es­

posa, que teria já recebido indenização pela "morte" do seu marido.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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434 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Por derradeiro, o Impetrante sustenta a deficiência na fundamentação da sentença de pronúncia.

Depreende-se da mencionada decisão:

"( ... )

Pretende-se atribuir ao réu Dorgival Gomes dos Santos, qualifi­cado nos autos, a prática de homicídio qualificado por motivo torpe, pela utilização de recurso que impossibilitou a defesa da vítima, e para assegurar a vantagem de outro crime, contra a vítima Lázaro Leon Pi­res; a prática de associação em quadrilha para cometer crimes; fraude para receber indenização ou valor do seguro; fraude para receber inde­nização ou valor de seguros na forma tentada; ocultação de cadáver; uso de documento falso; em razão dos fatos ocorridos em 24.01.1998, por volta das 23:35 horas, na BR 364, altura do Km 283, nesta Comarca.

A materialidade do delito resulta provada às fls. 18/19, pelo Auto de Exame Necroscópico, bem como pela certidão de óbito de fl. 74, que devem ser entendidos como sendo da vítima Lázaro Leon Pires, reconhecido por sua mulher Rosilene das Graças Maciel e seu primo José Pires dos Santos (fls. 391/390), bem como o Termo de Ratifica­ção de Reconhecimento em fita VHS (fls. 553/554).

Encontram-se nos autos as apólices de seguro contratados pelo réu Dorgival, tendo como beneficiária sua mulher Neuza, bem como o comprovante da importância recebida pela Sasse Seguros (fl. 148) e a tentativa de receber prêmio de outras seguradoras (fls. 120 e 154).

À fl. 73, certidão do Cartório de Registro Civil da cidade de Ouro Verde-GO, atestando a inexistência de registro de nascimento em nome de Davi Fernandes de Matos.

O laudo pericial de exumação de cadáver, de fls. 396/404, que constatou a inexistência de caixão e do corpo da vítima no túmulo, no local onde houve seu sepultamento em Anápolis-GO.

Assim, resta comprovada a materialidade das condutas descritas na denúncia.

( ... )

Quanto à autoria, é ponto pacífico, tanto na doutrina como na jurisprudência, que à pronúncia basta o convencimento da existência do crime e de indícios de que o Réu seja o seu autor, consoante dispõe o art. 408 do Código de Processo Penal Brasileiro. Portanto, prevalece,

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 435

no caso, o juízo de admissibilidade na imputação, a fim de que o Tri­bunal Popular, dentro de suas prerrogativas possa julgar a causa.

Assim, segundo a reportagem dos autos, o acusado está visivel­

mente comprometido com o episódio descrito na denúncia.

Isto posto, estando o processo nas suas condições legais, julgo

procedente a denúncia de fls. 2/11, e pronuncio o réu Dorgival Gomes dos Santos, ( ... ), como incurso nas sanções punitivas do art. 121, § 2.Q., I (torpe), IV (última figura), e V, c.c. o art. 288, caput; art. 171, V; art. 171, V, c.c. o art. 14, lI; art. 211; art. 304; art. 2.Q., todos do CPB, c.c. o art. 1.Q. da Lei n. 8.072/1990; sujeitando-o a julgamento pelo Tribunal

Popular do Júri desta Comarca." (fls. 843/845 - apenso I, volume V).

Como bem decidido pelo acórdão impugnado, não há qualquer ilega­lidade na decisão monocrática de pronúncia, que expôs, nos exatos termos

da lei, um mero juízo de admissibilidade da acusação.

Dessarte, o cotejo analítico da prova e a sua valoração profunda na fase

de pronúncia, como quer a impetração, teria por subtrair do Tribunal Po­pular Soberano causa que lhe é atribuída constitucionalmente (art. 5.Q., inc.

XXXVIII, d, da CF).

Em tal fase processual, sendo inafastável, de plano, o dolo e a tipifi­

cação cominada na exordial acusatória, não se pode adentrar no exame de qualquer aspecto volitivo ou de prova - pois cabe ao júri tal análise.

Assim, somente quando evidente a inexistência de crime ou de que haja indícios de autoria - em decorrência de circunstâncias demonstradas de pla­no e estreme de dúvidas - tão-somente assim, o julgador pode julgar im­

procedente a pretensão punitiva, deixando de pronunciar o Réu.

Diante do exposto, conheço em parte da ordem para denegá-la.

É como voto.

HABEAS CORPUS N. 24.833 - RJ (Registro n. 2002.0129848-7)

Relator: Ministro Gilson Dipp

Impetrantes: Ana Maria Mauro (Defensora Pública) e outros

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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Impetrada:

Paciente:

REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Sétima Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro

M. R. C. L. (internado)

EMENTA: Criminal - ECA - HC - Atos infracionais equipara­dos a lesão corporal e motim de presos - Inépcia da representação - Atipicidade da conduta - Ausência de elementos essenciais a con­figurar o ato infracional - Inocorrência - Correta equiparação da conduta do paciente ao crime do art. 354 do CP - Falta de individua­lização da conduta do menor - Falha não-vislumbrada - Internação provisória - Pleito de anulação da decisão singular - Superveniência

de restabelecimento de medida mais branda (semiliberdade) - Pa­ciente foragido - Fundamentos superados - Perda do objeto - Or­dem denegada.

I - Paciente que, em conjunto com outros dois adolescentes, te­

ria se rebelado nas dependências do Centro de Triagem, na Ilha do Governador-RJ, vindo a praticar, em tese, agressões contra funcio­nários e destruição do patrimônio da instituição.

II - Inexistência de ilegalidade na descrição dos fatos feita pelo Ministério Público, os quais são aptos a configurar, em princípio, os atos infracionais equiparados aos delitos de lesão corporal e motim de presos.

III - Se a representação ministerial apenas equiparou a condu­ta do Paciente ao delito de motim de presos, na medida em que res­

tou configurado, em tese, perturbação, alvoroço, supostamente cau­sado pelo Paciente e outros dois menores, no interior do local onde estariam internados, não há que se falar em deficiência da peça acusatória.

IV - Evidenciado que todos os representados praticaram, em tese, a mesma conduta, atuando na "rebelião" em conjunto, pertur­bando a ordem e a disciplina, quebrando o refeitório, cadeados e jo­gando copos, não se pode falar em ausência de individualização dos

atos infracionais.

V - Sobrevindo decisão monocrática que restabeleceu medida socioeducativa mais branda, qual seja, semiliberdade, anteriormen­

te imposta ao Paciente, e havendo notícia de que o mesmo encon­tra-se foragido, restam superados os fundamentos da impetração, no

RST], Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 437

que diz respeito à pretensão de nulidade do decisum que determi­

nou sua internação provisória.

VI - Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, em que são partes as acima

indicadas, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribu­

nal de Justiça. A Turma, por unanimidade, denegou a ordem. Os Srs. Mi­

nistros Jorge Scartezzini, Laurita Vaz, José Arnaldo da Fonseca e Felix

Fischer votaram com o Sr. Ministro-Relator.

Brasília-DF, 25 de março de 2003 (data do julgamento).

Ministro Gilson Dipp, Relator.

Publicado no DI de 28.04.2003.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Gilson Dipp: Adoto, como relatório, a parte expositiva

do parecer ministerial de fls. 66/69, in verbis:

"1. Cuida-se de habeas corpus impetrado em favor do menor

M. R. C. L., contra quem foi oferecida representação e imposta me­

dida de internação provisória, por ter praticado atos infracionais se­

melhantes aos previstos nos arts. 129 (três vezes) e 354, ambos do Có­

digo Penal.

2. Alega a Impetrante, em síntese, que a decretação da internação

provisória do Paciente, menor, configura constrangimento ilegal, pois

o ato infracional praticado não pode ser equiparado ao crime de mo­

tim de presos previsto no art. 354 do CP; aduz que delito de tal na­

tureza não pode ter como sujeito ativo alguém que ostente a condição

da menoridade, pugnando pela atipicidade de conduta."

A Subprocuradoria Geral da República opinou pelo não-conhecimento

do writ (fl. 69).

É o relatório.

Em mesa para julgamento.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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438 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

VOTO

O Sr. Ministro Gilson Dipp (Relator): Trata-se de habeas corpus, substitutivo de recurso ordinário, contra acórdão do egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que denegou ordem anteriormente impetrada em favor do Paciente, visando ao reconhecimento da atipicidade da conduta por ele praticada.

Os autos dão conta de que o Ministério Público ofereceu representa­ção em desfavor do Paciente, menor, imputando-lhe a prática, em tese, de atos infracionais equiparados aos crimes dos artigos 129 (três vezes) e 354 (motim de presos), ambos do Código Penal.

O Magistrado da 2Jl. Vara de Infância e Juventude da Comarca da Ca­pital do Estado do Rio de Janeiro, ao receber a representação, determinou a internação provisória do Paciente.

Irresignada, a defesa impetrou habeas corpus perante o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, sustentando a ilegalidade da internação do Paciente, já que faltaria elemento essencial para a configuração do ato infracional equiparado ao art. 354 do Estatuto Punitivo.

O eminente Desembargador-Relator negou seguimento ao writ, enten­dendo não ser a via eleita o meio adequado para a discussão de questões que demandem a incursão sobre fatos e provas (fi. 24).

A defesa interpôs agravo regimental, tendo sido reconsiderado o despa­cho denegatório do habeas corpus e indeferido o pedido de liminar (fi. 31).

A Corte Estadual denegou a ordem, sob o fundamento de que a repre­

sentação ministerial traz descrição de conduta, em tese, típica praticada pelo Paciente, motivo pelo qual a adoção de medida socioeducativa seria neces­sária.

A ementa do aresto possui o seguinte teor:

"Tipicidade da conduta. Narrativa constante de representação onde é descrito (sic) a existência de conduta, em tese, análoga a tipo penal." (fi. 48).

Daí a presente impetração, na qual se sustenta a atipicidade da con­duta praticada pelo Paciente, pois o crime do art. 354 do CP não poderia ser praticado por quem não está sujeito à sanção penal. Assim, a eventual indisciplina do Paciente poderia ser causa de sanção administrativa e não configuraria ato infracional passível de internação.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 439

Aduz-se, ainda, que a representação não descreveria de forma indivi­dualizada a conduta do Paciente, no que diz respeito à imputação de atos

infracionais equiparados a lesão corporal e danos ao patrimônio da insti­tuição onde o mesmo estaria internado.

Pugna-se, então, pela decretação de inépcia da representação ofereci­da pelo Ministério Público contra o Paciente, e a conseqüente anulação do decreto de internação provisória.

Entretanto, não merece prosperar a irresignação.

Narra, a peça acusatória, que o Paciente, em conjunto com outros dois adolescentes, teria se rebelado nas dependências do Centro de Triagem, na Ilha do Governador-RI, vindo a praticar, em tese, agressões contra funcio­nários e destruição do patrimônio da instituição, conforme se depreende dos seguintes termos:

"No dia 14 de julho de 2002, por volta das 18h30, no interior do alojamento n. 2 do Centro de Triagem e Recepção - CTR, situado na Estrada do Caricó, Ilha do Governador, nesta cidade, os representados, agindo de forma livre e consciente, em comunhão de ações e desígni­os entre si, amotinaram-se, perturbando a ordem e a disciplina da re­ferida instituição, quebrando o refeitório, cadeados e jogando copos.

( ... ) Os representados, agindo em comunhão de ações e desígnios entre si e, com inequívoco animus laedendi, também ofenderam a inte­gridade física dos agentes de disciplina que estavam de plantão, sendo que o agente Roberto Carlos de Oliveira Ramos, foi agredido com um soco na boca; o agente Sérgio Oliveira da Silva foi lesionado no bra­ço, por um prato que foi arremessado em sua direção e o agente Allan Carlos Vitipó foi agredido na cabeça, com uma cadeira." (fls. 17/18).

Não vislumbro, portanto, deficiência na descrição dos fatos feita pelo Ministério Público, os quais são aptos a configurar, em princípio, os atos infracionais mencionados.

A acusação traz a lume determinadas condutas de adolescentes, inclu­sive o Paciente, que caracterizam rebelião, tumulto, desordem em estabe­lecimento de internação de adolescentes.

Dessa forma, a suposta conduta foi apenas equiparada ao delito de

motim de presos (art. 354 do CP), na medida em que configurou, em tese, perturbação, alvoroço, supostamente causado pelo Paciente e outros dois menores, no interior do local onde estariam internados.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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440 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Não há que se falar, portanto, em atipicidade, já que, como ressaltado

pela própria impetração, o Paciente não está sujeito à prática de fato típico.

Por outro lado, quanto à falta de individualização da conduta do Pa­ciente, todos os representados praticaram, em tese, a mesma conduta, atu­ando na "rebelião" em conjunto, perturbando a ordem e a disciplina, que­brando o refeitório, cadeados e jogando copos, não se podendo falar em ausência de individualização dos atos infracionais.

Dessa forma, não se vislumbra consistente imprecisão nos fatos atribuí­dos ao Paciente, hábil a impedir a compreensão da acusação formulada, que

se encontra, em princípio, devidamente amparada pelos elementos de prova.

Por derradeiro, quanto ao pleito de anulação da decisão que determi­nou a internação provisória do Paciente, melhor sorte não assiste ao Impe­

trante.

A douta Autoridade indigitada coatora informou que, em audiência rea­

lizada no dia 20.08.2002, o Magistrado singular restabeleceu medida socioeducativa de semiliberdade, anteriormente imposta ao Paciente, sendo que o mesmo empreendeu fuga no dia 09.10 .2002 (fi. 60).

Assim, restam superados os fundamentos da impetração, no que diz respeito à pretensão de nulidade da decisão que determinou a internação provisória do Paciente.

Diante do exposto, denego a ordem.

É como voto.

HABEAS CORPUS N. 26.147 - DF (Registro n. 2002.0176129-0)

Relatora: Ministra Laurita Vaz

Impetrante: Adelino de Carvalho Tucunduva Júnior

Impetrado: Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios

Paciente: Delci Marques de Oliveira (preso)

EMENTA: Habeas corpus - Processo Penal - Prisão preventi­

va - Sentença condenatória superveniente - Modificação da natu­

reza jurídica da prisão processual - Pedido prejudicado.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 441

1. Diante de novo título judicial a justificar a prtsao cautelar, restam superados os fundamentos da impetração, restritos às ale­gações de ilegalidade da prisão preventiva.

2. Writ prejudicado.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, julgar prejudicado o pedido, nos termos do voto da Ministra-Relatora. Votaram com a Relatora os Srs. Ministros José Arnaldo da Fonseca, Felix Fischer, Gilson Dipp e Jorge Scartezzini. Presidiu a sessão o Sr. Ministro Gilson Dipp.

Brasília-DF, 15 de abril de 2003 (data do julgamento).

Ministra Laurita Vaz, Relatora.

Publicado no DJ de 02.06.2003.

RELATÓRIO

A Sra. Ministra Laurita Vaz: Trata-se de habeas corpus, com pedido

de liminar, impetrado em favor de Adelino de Carvalho Tucunduva Júnior, em face do acórdão da Segunda Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios que não concedeu a ordem, nos termos da se­guinte ementa:

"Habeas corpus. Prisão em flagrante. Atentado violento ao pu­

dor. Liberdade provisória.

- Tratando-se de crime hediondo, vedada está pela Lei n. 8.072/

1990 a concessão de liberdade provisória com fiança ou sem ela (inciso II do art. 2.Q)." (fl. 109).

A liminar foi indeferida à fl. 75, durante as férias forenses, pelo emi­nente Ministro Presidente Nilson Naves, que determinou a remessa dos au­tos ao Ministério Público Federal. Este, por seu turno, manifestou-se às fls.

78/79, opinando pela "conversão do julgamento em diligência, a fim de que

se requisitem, ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, as cópias dos documentos apontados (vide decisão à fl. 75), bem como o en­vio de informações atualizadas acerca do andamento do processo."

RST], Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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442 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Determinei que fosse cumprida a diligência requerida (fi. 81).

Em seguida, prestadas as informações pelo Tribunal a quo, o Minis­tério Público Federal opinou para que fosse julgado prejudicado o writ, nos seguintes termos:

"Com as informações prestadas, verifica-se que, em 28 de janei­ro de 2003, o ora paciente foi condenado à pena de 8 (oito) anos e 9 (nove) meses de reclusão, em regime inicial fechado, modificando-se, com isso, a natureza jurídica da prisão processual, resultante, agora, da sentença condenatória, a teor do disposto no artigo 393, inciso l, do Código de Processo Penal.

Assim, editada a sentença condenatória, novo título legal da pri­são do Paciente, cuja impugnação faz-se adequada ao recurso de ape­lação, fica prejudicado o pedido de revogação da prisão preventiva." (fi. 119).

É o relatório.

VOTO

A Sra. Ministra Laurita Vaz (Relatora): O habeas corpus encontra-se prejudicado.

Diante de novo título judicial a justificar a prisão cautelar, restam su­perados os fundamentos da impetração, restritos às alegações de ilegalida­de da prisão preventiva.

É nesse sentido a jurisprudência uníssona desta Corte. Confira-se:

"Criminal. HC. Prisão preventiva. Excesso de prazo. Superve­niência de sentença monocrática. Fundamentos superados. Writ julga­do de sentença monocrática. Fundamentos superados. Writ julgado pre­judicado.

Evidenciado que já houve prolação de sentença monocrática em desfavor do Paciente, restam superados os fundamentos da impetração, restritos às alegações de ilegalidade da custódia e de excesso de pra­zo na formação da culpa.

Com a decisão condenatória, outro é o título a respaldar a con­denação.

Pedido julgado prejudicado." (HC n. 22.897-MG, Quinta Turma, reI. Min. Gilson Dipp, DJ de 14.10.2002).

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 443

"Criminal. HC. Prisão preventiva. Superveniência de sentença condenatória a respaldar a segregação do réu. Fundamentos superados. Pedido julgado prejudicado.

I - Sobrevindo sentença condenatória, outro é o título a respal­dar a segregação do réu, razão pela qual não prosperam os fundamen­

tos da impetração, restritos à aduzida insuficiência de fundamentação da prisão preventiva.

II - Pedido julgado prejudicado." (HC n. 22.463, Quinta Turma, reI. Min. Gilson Dipp, DJ de 18.11.2002).

"Habeas corpus. Prisão preventiva. Revogação. Excesso de prazo. Sentença condenatória superveniente.

1. Julgado procedente o pedido da acusação pública, a sentença condenatória, ela mesma, passa a ser o título da prisão do réu preso cautelarmente no curso do processo, como exsurge da disposição

inserta no inciso I do artigo 393 do Código de Processo Penal.

2. Recurso prejudicado." (RRC n. 10.261-RJ, Sexta Turma, reI. Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 18.02.2000).

"Processual Penal. Recurso em habeas corpus. Prisão preventiva. Sentença condenatória superveniente. Análise prejudicada.

A condenação superveniente que não faculta ao réu o direito de apelar em liberdade modifica a natureza da custódia, prejudicando, assim, o exame do writ.

Recurso prejudicado." (HC n. 19.963-SC, Quinta Turma, reI. Min. Felix Fischer, DJ de 01.04.2002).

Ante o exposto, com arrimo no art. 209 do RISTJ, julgo prejudicado o habeas corpus.

É o voto.

Relatora:

Impetrante:

HABEAS CORPUS N. 26.251 - SP (Registro n. 2002.0177086-9)

Ministra Laurita Vaz

Roberto José Fiore

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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444 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Impetrado: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Richard Perez Nino (preso) Paciente:

EMENTA: Habeas corpus - Ausência de publicação do acórdão proferido em sede de apelação cerceando o direito de defesa - Pe­dido prejudicado em razão de sua publicação - Acórdão que deter­

mina a expedição de mandado de prisão - Recurso especial - Efeito meramente devolutivo - Possibilidade de execução provisória da condenação - Precedentes - Inexistência de ofensa ao princípio da

presunção de inocência - Writ parcialmente conhecido e, nessa par­te, denegado.

1. Encontra-se prejudicada a alegação de constrangimento ile­gal, caracterizado pela ausência da publicação do acórdão proferido na Apelação n. 366.815.3/0, uma vez que, conforme se vê na Certi­dão de Publicação, acostada aos autos à fi. 52, o referido acórdão foi devidamente publicado no Diário Oficial da Justiça no dia 20 de de­zembro de 2002.

2. Na esteira da jurisprudência pacífica desta Corte, em perfei­ta harmonia com o disposto no art. 637 do CPP, os recursos para os

Tribunais Superiores, em regra, possuem apenas o efeito devolutivo, não obstando a execução provisória da condenação imposta pelo Tri­bunal a quo.

3. Writ parcialmente conhecido e, nessa parte, denegado.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer parcialmen­te do pedido e, nessa parte, denegar a ordem, nos termos do voto da Sra.

Ministra-Relatora. Votaram com a Relatora os Srs. Ministros José Arnaldo da Fonseca, Felix Fischer, Gilson Dipp e Jorge Scartezzini. Presidiu a ses­

são o Sr. Ministro Gilson Dipp.

Brasília-DF, 15 de abril de 2003 (data do julgamento).

Ministra Laurita Vaz, Relatora.

Publicado no DI de 02.06.2003.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 445

RELATÓRIO

A Sra. Ministra Laurita Vaz: Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de Richard Perez Nino, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, por votação unânime, deu "provimento ao apelo do Ministério Público para reclassificar o crime do Réu para o artigo 12, caput, da Lei n. 6.368/1976, e aplicar-lhe as penas de 3 anos de reclusão e 50 dias-multa, cada um no limite mínimo, estabe­lecido o regime prisional integralmente fechado, e devendo ser expedido contra ele o competente mandado de prisão"(fl. 45).

Sustenta o Impetrante que, até a presente data, não foi publicado o referido acórdão hostilizado, ficando o Paciente, assim, impossibilitado de interpor os "competentes recursos especial e extraordinário" (fl. 3), neces­

sários para a busca da sua liberdade e demonstração de sua inocência.

Aduz, ainda, ser desnecessária a custódia cautelar do Paciente, uma vez que o Juiz de 1ll. grau concedeu-lhe o direito de poder apelar em liberda­de, tendo em vista a ausência de circunstâncias ensejadoras da medida constritiva, devendo, assim, por conseguinte, ser lhe concedido o direito de permanecer em liberdade até o efetivo trânsito em julgado da decisão condenatória.

A liminar fOI indeferida às fls. 14/15.

As informações foram prestadas às fls. 20/21, acompanhadas das cópias das principais peças do processo.

O Ministério Público Federal manifestou-se às fls. 60/62, opinando pela denegação da ordem.

É o relatório.

VOTO

A Sra. Ministra Laurita Vaz (Relatora): Cumpre observar, de início, que encontra-se prejudicada a alegação de constrangimento ilegal, caracte­rizado pela ausência da publicação do acórdão proferido na Apelação n. 366.815.3/0, uma vez que, nos termos da Certidão de Publicação, acosta­da aos autos à fl. 52, o referido acórdão foi devidamente publicado no Diá­

rio Oficial da Justiça no dia 20 de dezembro de 2002.

Ademais, já houve, até mesmo, a interposição do recurso especial, con­forme se observa nos autos às fls. 53/58.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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446 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

De outro lado, no que diz respeito à irresignação do Impetrante, de

que o ora paciente deve aguardar em liberdade até o trânsito em julgado da

decisão condenatória, por ter-lhe sido concedido pelo Juiz de 1.Q. grau o di­

reito de apelar em liberdade, não merece prosperar.

É que na esteira da jurisprudência pacífica desta Corte, que encontra­

-se em perfeita harmonia com o disposto no art. 637 do CPP, os recursos para os Tribunais Superiores, em regra, possuem apenas o efeito devolutivo,

não obstando, in casu, a execução provisória da condenação imposta pelo Tribunal a quo.

Confira-se, a propósito, dentre inúmeros outros:

"Processo Penal. Estelionato. Réu condenado em 1.Q. grau. Deci­

são confirmada em sede de apelação. Efeito suspensivo. Recurso espe­cial. Impossibilidade.

- Esgotadas as instâncias ordinárias e pendente apenas recurso

especial, nada impede a execução provisória da decisão condenatória.

- Ordem denegada." (HC n. 19.289-RJ, Quinta Turma, reI. Min.

Jorge Scartezzini, DJ de 24.02.2003).

"Processual Penal. Habeas corpus. Interposição de recurso es­

pecial. Efeito.

Contra decisão condenatória de 2.Q. grau cabem, apenas, em prin­cípio, recursos de natureza extraordinária - recurso especial e recurso

extraordinário - sem efeito suspensivo (art. 27, § 2.Q., da Lei n. 8.038/

1990), razão pela qual pode ser dado cumprimento ao mandado de

prisão em forma de execução provisória (Precedentes).

Writ denegado." (HC n. 23.278-PE, Quinta Turma, rel. Min. Felix

Fischer, DJ de 18.11.2002).

"HC. Penal. Processual. Tráfico ilícito de entorpecentes. Exe­

cução provisória. Recursos especial e extraordinário. Ofensa ao prin­

cípio da presunção de inocência. Não ocorrência.

1. Não configura constrangimento ilegal a determinação da ex­

pedição de mandado de prisão contra o réu com condenação transita­da em julgado para a acusação em 2.Q. grau, já que o recurso especial

e o recurso extraordinário, a princípio, não possuem efeito suspensivo.

2. Habeas corpus conhecido. Pedido indeferido." (HC n. 18.860-

SP, Sexta Turma, reI. Min. Edson Vidigal, DJ de 29.04.2002).

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 447

Ante o exposto, conheço parcialmente do writ e, nessa parte, denego a ordem.

É o voto.

RECURSO EM HABEAS CORPUS N. 13.618 - ES (Registro n. 2002.0154521-0)

Relator:

Recorrente:

Advogado:

Recorrido:

Paciente:

Ministro Jorge Scartezzini

Marcos Daniel Paiva

Marcos Daniel Paiva

Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo

Alex Coutinho dos Santos (preso)

EMENTA: RHC - Processo Penal - Roubo qualificado - Direito de apelar em liberdade - Prisão em flagrante - Réu que permane­ceu preso durante a instrução - Inviabilidade - Ofensa ao princípio da presunção de inocência - Inocorrência - Súmula n. 9-STJ.

- O Paciente que permaneceu sob cárcere durante toda a ins­trução criminal, tendo sido preso em flagrante delito, não tem di­

reito de apelar em liberdade, conforme entendimento desta Corte.

- De outra parte, convém registrar que a prisão para apelar não

ofende o princípio da presunção de inocência. Tal princípio impede que se atribuam à acusação penal conseqüências jurídicas apenas

compatíveis com decretos judiciais de condenação irrecorrível. Tra­

ta-se de princípio tutelar da liberdade individual, cujo domínio mais expressivo de incidência é o da disciplina jurídica da prova. A presun­

ção de inocência, portanto, é meramente relativa (Súmula n. 9-STJ).

- Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da

Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos

e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, em negar provimento

RST], Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

Page 38: Superior Tribunal de Justiça - Jurisprudência da …...Jorge Scartezzini, DJ de 18.11.2002). "Recurso em habeas corpus. Abuso de autoridade. Ausência de justa causa. Inépcia da

448 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ao recurso. Votaram com o Sr. Ministro-Relator os Srs. Ministros Laurita Vaz, José Arnaldo da Fonseca, Felix Fischer e Gilson Dipp.

Brasília-DF, 18 de fevereiro de 2003 (data do julgamento).

Ministro Jorge Scartezzini, Relator.

Publicado no DI de 14.04.2003.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Jorge Scartezzini: Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus interposto por Marcos Daniel Paiva, em benefício de Alex Coutinho dos Santos, contra v. acórdão proferido pelo egrégio Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, que denegou a ordem ali impetrada, nos termos da seguinte ementa:

"Ementa. Roubo qualificado. Prisão em flagrante. Condenação.

Habeas corpus. Apelação em liberdade. Antecedentes. Primariedade.

Domicílio certo. Conduta social. Recurso em liberdade. Impossibilidade.

Tendo o Paciente respondido preso em flagrante durante a tramitação de todas as fases do processo-crime e ocorrendo a conde­nação, a ele não é permitido recorrer em liberdade até a decisão su­perior." (fl. 82).

Consta dos autos que o Paciente, preso em flagrante delito, foi con­

denado, como incurso nas sanções do art. 157, § 211., incisos I e lI, e art. 70, por duas vezes, ambos do Código Penal, à pena de 7 (sete) anos de reclu­são, em regime inicial semi-aberto, e 21 (vinte e um) dias-multa, tendo-lhe sido negado o direito de apelar em liberdade.

Inconformada, a defesa impetrou habeas corpus perante o egrégio Tribunal a quo, objetivando o reconhecimento ao Réu do direito de ape­lar em liberdade.

No presente recurso ordinário, o Recorrente sustenta, em síntese, ofen­sa ao princípio constitucional da presunção de inocência. Aduz ser o Réu primário, detentor de bons antecedentes, possuir domicílio certo e condu­ta social boa.

A douta Subprocuradoria Geral da República, às fls. 103/105, opina no sentido de que seja negado provimento ao recurso.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA

Após, vieram-me conclusos os autos.

É o relatório.

VOTO

449

O Sr. Ministro Jorge Scartezzini (Relator): Sr. Presidente, o presen­te recurso cinge-se, essencialmente, no direito de apelar em liberdade do paciente primário, detentor de bons antecedentes, com residência fixa e con­duta social boa.

No que tange ao pedido de apelar em liberdade, não assiste razão ao Recorrente.

O v. acórdão impugnado restou assim fundamentado:

"A pretensão do Paciente não tem respaldo processual penal, pois que responde processo recolhido e sob guarda da autoridade policial e afinal condenado nas penas dos arts. 157, § 2ll., itens I e 11, e 69 do Código Penal (isto duas vezes).

Dos fatos relatados, além da evidência dos fatos, presença de la­cunas na participação e prova testemunhal evidente. As razões do ma­gistrado concessiva do benefício para cumprimento da pena em liber­dade, não têm respaldo processual.

Respondendo processo recolhido em estabelecimento prisional por infração ao art. 157, § 2ll., incisos I e 11, mais art. 69 do Código Pe­nal, não deve merecer cumprimento da pena em liberdade quando con­denado a 7 (sete) anos de reclusão e 21 dias-multa. Toda razão assis­te ao Dr. Procurador de Justiça, razão pela qual conheço do recurso interposto, negando-lhe porém provimento.

Bons antecedentes, primariedade, domicílio certo, conduta social boa, não têm condão de benefício quando ocorre prisão em flagrante e preso se mantém o Paciente durante todas as fases do processo, a ele vedada na hipótese requerimento para que recorra em liberdade até decisão superior." (fls. 83/84).

Como se vê, o Paciente respondeu a todo o processo recolhido, em razão de sua prisão em flagrante.

Tanto a jurisprudência quanto a doutrina majoritária entendem que, nes­ses casos, o Paciente deve continuar sob custódia. Seguindo essa orientação, Magalhães Noronha salienta que estando o Réu preso, assim deve permanecer

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450 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

em razão de sua sujeição a coerção processual que persiste com a condenação, inexistindo nesses casos, qualquer afronta legal ou constitucional. (v.g. E. Ma­galhães Noronha, in Curso de Direito Processual Penal, voI. 3, p. 358):

Nessa linha, esta egrégia Corte vem decidindo pacificamente, do que cito como exemplo os sumários dos seguintes arestos:

"Constitucional. Processual Penal. Sentença condenatória. Apela­ção. Princípio da presunção de inocência: CF, art. 5ll., LVII. Direito de recorrer em liberdade. CPP, art. 594. Garantia não violada.

- À luz da nova ordem constitucional, que consagra no capítulo das garantias individuais o princípio da presunção de inocência (CF, art. 5ll., LVII), a faculdade de recorrer em liberdade objetivando a re­forma de sentença penal condenatória é a regra, somente impondo-se o recolhimento provisório do Réu à prisão nas hipóteses em que enseja a prisão preventiva, na forma inscrita no art. 312 do CPP.

- O direito de apelar em liberdade de sentença, assegurado pelo Có­digo de Processo Penal, art. 594, não se aplica ao réu que, desde o início da instrução criminal, se encontra submetido à prisão processual.

- Habeas corpus denegado." (HC n. 11.117 -MS, reI. Ministro Vicente Leal, DJU de 27.03.2000).

"Habeas corpus. Apelação em liberdade. Réu preso durante a instrução do processo. Efeito da condenação. Decreto fundamentado. Condições pessoais favoráveis. Irrelevância. Ordem denegada.

I - Não se concede o direito ao apelo em liberdade a réu que per­maneceu preso durante toda a instrução do processo, desde flagrante em delito de tráfico de entorpecente, pois a manutenção na prisão se consti­tui em efeito da respectiva condenação, inobstante eventuais condições pessoais de primariedade, bons antecedentes, ocupação lícita e residência fixa.

II - Ordem denegada." (HC n. 10.575-SP, reI. Ministro Gilson Dipp, DJU de 06.12.1999).

"- Habeas corpus. Penal e Processo Penal. Direito de apelar em liberdade. Prisão em flagrante. Paciente que respondeu ao processo sob custódia. Art. 12 da Lei n. 6.368/1976. Carência de fundamentação.

- Desnecessidade de, na sentença condenatória, motivar-se a imperiosidade da prisão para poder o réu apelar em liberdade. Prece­dentes do STF e do STl No caso, além de invocar o art. 35 da Lei

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 451

de Tóxicos, o que, em si só, já era suficiente, o magistrado negou fun­damentadamente o direito ao apelo em liberdade.

- Tratando-se de Paciente preso em flagrante e que permaneceu recolhido durante o curso do processo, não tem direito de apelar em liberdade, porquanto um dos efeitos da sentença condenatória é ser o preso conservado na prisão. Precedentes.

- Ordem denegada." (HC n. 10.547-PE, reI. Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJU de 17.04.2000).

De outra parte, convém registrar que a prisão para apelar não ofende o princípio da presunção de inocência, como alega o Recorrente. Nesse diapasão, é sólida a jurisprudência desta Corte e do Pretório Excelso. O ilustre Ministro Francisco Rezek, por ocasião do julgamento do HC n. 69.901-GO, ressaltou que aquele Excelso Tribunal não tem, pela sua juris­prudência, desautorizado qualquer espécie de prisão processual - dentre as

quais a decorrente de sentença condenatória recorrível - sob o argumento de violação ao princípio da presunção de inocência ou da não-culpabilida­de. Tal princípio impede que se atribuam à acusação penal conseqüências jurídicas apenas compatíveis com decretos judiciais de condenação irrecorrível. Trata-se de princípio tutelar da liberdade individual, cujo do­mínio mais expressivo de incidência é o da disciplina jurídica da prova. A presunção de inocência, portanto, é meramente relativa.

Sob o mesmo prisma, editou-se, no âmbito deste Colegiado, a Súmula n. 9, que diz:

"A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a ga­rantia constitucional da presunção de inocência."

Nesses termos, não merece reparos o v. acórdão objurgado.

Assim, ante o exposto, nego provimento ao recurso.

É como voto.

RECURSO EM HABEAS CORPUS N. 13.621 - RJ (Registro n. 2002.0154493-2)

Relator: Ministro Jorge Scartezzini

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Recorrente: Albino José da Silva

Advogado: Albino José da Silva

Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro

Paciente: Belarmino Pereira da Silva (preso)

EMENTA: Processual Penal - Homicídio qualificado - Excesso de prazo - Prisão preventiva - Clamor público - Acusado que per­maneceu foragido por mais de 10 anos - Aplicação da lei penal.

- Inexiste constrangimento ilegal em decreto de prisão preven­tiva lastreado no clamor público, bem como no fato do réu haver foragido, permanecendo nessa condição por mais de 10 anos, somen­te sendo capturado em outro local, fora do distrito da culpa. Tal cir­cunstância, por óbvio, ocasionou certo atraso na conclusão da ins­trução criminal.

- Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, em negar provimento ao recurso. Votaram com o Sr. Ministro-Relator os Srs. Ministros Laurita Vaz, José Arnaldo da Fonseca, Felix Fischer e Gilson Dipp.

Brasília-DF, 25 de fevereiro de 2003 (data do julgamento).

Ministro Jorge Scartezzini, Relator.

Publicado no DI de 12.05.2003.

RELATÓRIO

o Sr. Ministro Jorge Scartezzini: Trata-se de recurso em habeas corpus interposto contra o v. acórdão proferido pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que denegou a ordem ali impetrada, nos termos da seguinte ementa (fi. 26), verbis:

"Habeas corpus. Artigo 121, § 2.2., II, c.c. artigo 129, caput, N/F 69, CP. Relaxamento de prisão. Excesso de prazo. Instrução cri­minal regular. Constrangimento ilegal. Inexistente. Denegação da or­dem. Unânime.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 453

Paciente pronunciado em 1993 por infração ao artigo 121, § 2.\" n, do Código Penal, objetiva através do presente writ relaxamento de sua prisão, ao argumento de que preso por mais de 200 (duzentos) dias no Estado de São Paulo, não é recambiado para a Comarca de Magé.

Preso em 19.12.2001 na cidade de Pereira Barreto, Estado de São Paulo, em razão de decreto de prisão preventiva datado de 13.03.1990, foi solicitado pela douta autoridade judiciária apontada como coatora o recambiamento do Paciente para aquela Comarca, aguardando resolu­

ções administrativas entre a Secretaria de Estado de Segurança Pública e a Corregedoria de São Paulo, tendo sido devolvida a respectiva Carta Precatória no último dia 26.08.2002 devidamente cumprida. Os fatos narrados na impetração se prejudiciais aos direitos do Paciente, não podem ser atribuídos à acusação ou ao juízo. Devem-se mesmo à con­duta do próprio, que agora deve suportar os resultados de seus atos e

decisões, não podendo locupletar-se de sua torpeza. Por outro lado, não

se mostra aconselhável a que presentes os pressupostos do artigo 312 do CPP. Constrangimento ilegal inexistente. Ordem que se denega."

Consta dos autos que o Paciente foi preso preventivamente acusado da prática do delito previsto no art. 121, § 211

, n, do Código Penal.

No presente recurso, alega, essencialmente, a ocorrência de constran­gimento ilegal, porquanto o Paciente encontra-se preso a mais de 200 dias

sem que tenha havido a conclusão da instrução criminal. Sustenta, portan­to, excesso de prazo para a formação de culpa.

A douta Subprocuradoria Geral da República, em seu parecer, às fls.

49/55, opina pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Jorge Scartezzini (Relator): Sr. Presidente, no presente recurso, o Recorrente alega a ocorrência de excesso de prazo para o término da instrução, pleiteando, diante disso, a revogação da preventiva.

O pedido improcede.

Com efeito, compulsando os autos verifico, pelas informações presta­

das pelo Juízo de Direito da Vara Criminal Única da Comarca de Magé, que o acusado estava foragido desde 13 de março de 1990, tendo todo o processo corrido à revelia, somente sendo capturado em dezembro de 2001, na cidade

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de Pereira Barreto. Destarte, permaneceu nessa condição por 11 anos. Das referidas informações merece destaque (fls. 12/13):

"Ocorre que, desde que prestou declarações em sede policial, na data de 14 de fevereiro de 1990, o Réu, ora paciente, não compareceu aos atos do processo, sendo citado por edital, com sua revelia decretada.

A prisão preventiva foi decretada em 13 de março de 1990, como garantia da ordem pública, tendo sido indeferido o pedido de liberdade provisória (19.10.1990), já em razão do Réu estar foragido.

Insta consignar que foi impetrado Habeas Corpus (n. 1.128/1991 - Segunda Câmara Criminal), que foi denegado, tendo em vista que a prisão havia sido efetivada, encontrando-se o Réu em lugar incerto e não sabido, situação que perdurou até o dia 21 de dezembro de 2001."

De outro lado, há que se ressaltar a necessidade de expedição de precatória, já que o Paciente foi preso em outra Comarca. Como ressalta­do pela Procuradoria de Justiça local (fi. 22), "os fatos narrados na impetração se prejudiciais aos direitos do Paciente, não podem ser atribuí­dos à acusação ou ao juízo. Devem-se mesmo à conduta do próprio, que agora deve suportar os resultados de seus atos e decisões, não podendo lo­cupletar-se de sua torpeza".

Considero, portanto, incensurável o v. acórdão recorrido, que esposou idêntico entendimento adotado por esta Corte. Nesse sentido:

"Criminal. HC. Furto e extorsão qualificados. Prisão preventiva. Decreto fundamentado. Necessidade da custódia demonstrada. Gravi­dade do crime. Periculosidade do agente. Réu foragido. Garantia à aplicação da lei penal. Presença dos requisitos autorizadores. Irrele­vância. Depoimentos de co-réus, que inocentariam o Paciente. Impro­priedade da via eleita. Ordem denegada.

I - Não se vislumbra ilegalidade na decisão que decretou a cus­tódia cautelar do Paciente, se demonstrada a necessidade da prisão, atendendo-se aos termos do art. 312 do CPP e da jurisprudência do­minante.

II - Ressalva de que o Paciente ameaçou a vida da família da ví­tima, caso a mesma não lhe entregasse determinada quantia em dinhei­ro, mostrando-se disposto mesmo a seqüestrar o filho da vítima, com o fim de concretizar seu intuito criminoso.

RST], Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDENCIA DA QUINTA TURMA 455

IH - A gravidade do crime, bem como a evidenciada periculo­sidade do agente também podem impedir a cassação da custódia cautelar. Precedentes.

IV - A evasão do réu pode ser suficiente para motivar a segrega­ção provisória a fim de garantir a aplicação da lei penal. Precedente.

V - O habeas corpus constitui-se em meio impróprio para a análise de alegações que exijam o reexame do conjunto fático-proba­tório - como a suposta inocência do réu, que seria confirmada pelo depoimento dos demais co-réus.

VI - Ordem denegada." (HC n. 23.327-SP, reI. Ministro Gilson Dipp, DJ de 10.02.2003).

Por tais fundamentos, nego provimento ao recurso.

É como voto.

RECURSO EM HABEAS CORPUS N. 13.944 - SP (Registro n. 2003.0003643-3)

Relator: Ministro Gilson Dipp

Recorrente: Enrico Picciotto

Advogados: José Roberto Batochio e outros

Recorrido: Tribunal Regional Federal da 311. Região

Paciente: Enrico Picciotto

EMENTA: Criminal - RHC - Gestão fraudulenta de instituição financeira - Quadrilha - Nulidade do acórdão recorrido - Inexistên­cia de coisa julgada - Adoção das razões do parecer do Ministério Público - Possibilidade - Inépcia da denúncia - Falhas não-vislum­bradas - Narrativa clara, permitindo ciência e plena defesa - Justa causa evidenciada - Autoria coletiva - Possibilidade de denúncia mais ou menos genérica - Inexistência de prejuízo ao direito de de­fesa - Ausência de constrangimento ilegal - Recurso desprovido.

I - Hipótese que cuida de paciente denunciado pela prática de gestão fraudulenta de duas instituições financeiras - das quais era

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456 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

sócio-majoritário e administrador - cometido por quadrilha, nas

modalidades de movimentação de recursos, paralelamente à conta­bilidade legalmente exigida, e negociação de valores mobiliários sem prévio registro de emissão junto à autoridade competente.

II - Não constitui nulidade o fato de Tribunal a quo ter adota­do as conclusões do parecer do ilustre representante do Ministério

Público como razões de decidir acerca da inexistência de coisa

julgada, a impedir o oferecimento da denúncia.

III - Eventual inépcia da denúncia só pode ser acolhida quan­do demonstrada inequívoca deficiência a impedir a compreensão da acusação, em flagrante prejuízo à defesa dos acusados, ou na ocor­

rência de qualquer das falhas apontadas no art. 43 do CPP - o que

não se vislumbra in casu.

IV - Exordial acusatória que narra com clareza a possibilidade de existência dos fatos típicos, permitindo ao acusado o perfeito co­

nhecimento da extensão da narração e, por conseqüência, facultan­do-lhe a ampla defesa.

V - Noticiada a existência de crime em tese, não se pode im­

pedir a imperiosa necessidade de esclarecimentos a respeito do ocorrido, o que só será possível no transcurso da respectiva ação penal.

VI - Tratando-se de delito de autoria coletiva, não se tem como inepta a denúncia que não descreve, pormenorizadamente, a con­

duta dos denunciados, quando não obstrui, nem dificulta o exercí­

cio da mais ampla defesa, admitindo-se a narração mais ou menos genérica por interpretação pretoriana do art. 41 da Lei Processual

Penal.

VII - Recurso desprovido, nos termos do voto do relator.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, em que são partes as aCIma

indicadas, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribu­

nal de Justiça. A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso. Os

Srs. Ministros Jorge Scartezzini, Laurita Vaz, José Arnaldo da Fonseca e

Felix Fischer votaram com o Sr. Ministro-Relator.

Brasília-DF, 25 de março de 2003 (data do julgamento).

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 457

Ministro Gilson Dipp, Relator.

Publicado no DJ de 28.04.2003.

Embargos declaratórios acolhidos em parte, p. 463.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Gilson Dipp: Trata-se de recurso ordinário contra

acórdão da Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3 Ji Região, que

concedeu apenas parcialmente ordem de habeas corpus impetrada anterior­

mente em favor de Enrico Picciotto, nos termos da seguinte ementa (fls.

430/431):

"Habeas corpus para trancamento de ação penal. A época pendendo

conflito de competência posteriormente julgado improcedente. Denúncia de

crime societário atende aos requisitos do art. 41 do CPP. Inocorrência de

inépcia. Descabida a apreciação antecipada de fragmento de prova em

HC. Afastado bis in idem, pois distintos os fatos narrados nas ações pe­nais citadas. Inexistindo inquérito policial e iniciada a ação penal, é

abusivo o indiciamento do acusado. Ordem parcialmente concedida.

- Este writ objetiva o trancamento da Ação Penal n.

2000.61.81.003633-3, em curso na 3 Ji Vara Federal Criminal em São Paulo, na qual figura como réu o Paciente.

- Quando apresentada a presente impetração, pendia de julgamen­

to o Conflito Positivo de Competência n. 2000.03.00.053985-3 entre

o Juízo Federal da 4 Ji Vara Criminal em São Paulo-SP e o da 3 Ji Vara

Criminal em São Paulo-SP, em que o primeiro se entendia prevento

para processar e julgar a Ação Penal n. 2000.61.81.003633-3. Por de­

cisão unânime de 17.04.2002, a Primeira Seção desta Corte julgou-o

improcedentes. Prevenção não ocorrida pois despacho proferido não

tinha conteúdo decisório.

- Não ocorre inépcia da denúncia. Descrevem-se os fatos crimi­

nosos e apontam-se seus autores, entre os quais o Paciente, sócio-ma­

joritário da SPLIT - DTVM e SPLIT - Corretora (SPLIT - CM).

- Extrai-se da denúncia o papel central da SPLIT - STVM e da

SPLIT - CM nos fatos delituosos. O papel de um de seus administra­

dores, o Paciente, está caracterizado na trama delitiva. Para efeito da

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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458 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

descrição de crimes societários, a peça acusatória atende o artigo 41 do CPP. Sobre a efetiva participação, somente a instrução probatória o revelará. Descabida a apreciação antecipada de fragmentos de pro­va no âmbito deste writ.

- Mastada a alegação de bis in idem, pois são distintos os fatos relatados na Ação Penal n. 95.01.02177-7 e na de n. 2000.61.81.0036533-3, além de distintos os pedidos nelas deduzidos. Na primeira, o Réu foi denunciado tão-somente como incurso no artigo 16 da Lei n. 7.492/1986. Sequer se aludiu o complexo esquema criminoso engen­drado envolvendo várias outras empresas e instituições financeiras, além da SPLIT DTVM e da SPLIT CM, que redundou no denomi­nado 'escândalo dos precatórios', objeto da última.

- A determinação de indiciamento do Paciente se mostra impró­pria juridicamente. Não houve inquérito e, iniciada a ação penal, o ato se apresenta abusivo, porquanto indicar alguém como autor de um fato criminoso se dá no bojo de investigação pela autoridade policial. Fazê­-lo no recebimento da denúncia é despropositado, porque o Ministé­rio Público já concluiu que o Paciente é o responsável pelo delito e o juízo avaliou que há elementos suficientes para processar o feito.

- Ordem parcialmente concedida para impedir o indiciamento de Enrico Picciotto."

Em razões, o Recorrente sustenta, em síntese, a desfundamentação do acórdão recorrido; a inépcia da denúncia; falta de justa causa e existência de coisa julgada, a impedir a ação penal.

A Subprocuradoria Geral da República opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 542/544).

É o relatório.

Em mesa para julgamento.

VOTO

O Sr. Ministro Gilson Dipp (Relator): Trata-se de recurso ordinário contra acórdão do egrégio Tribunal Regional Federal da 3li. Região, que

denegou ordem anteriormente de habeas corpus impetrada em favor do Paciente, visando ao trancamento da ação penal contra ele instaurada.

Consta dos autos que o Paciente foi denunciado como incurso "nas

penas dos artigo 4ll., caput, da Lei n. 7.492/1986, por duas vezes, em concurso

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 459

material com os artigos 11, por manter movimentação de recursos parale­lamente à contabilidade exigida pela legislação, e 7'\ II, da mesma legis­lação, por negociar valores mobiliários sem registro prévio de emissão junto à autoridade competente; incurso, ainda, nas penas do artigo 288, caput, do Código Penal, por associar-se a grupo de mais de três pessoas para o fim de cometer crimes - todas as penas agravadas de acordo com o disposto no artigo 62, I, do Código Penal".

Diante disso, impetrou ordem de habeas corpus, perante o Tribunal Regional Federal da 3<1. Região, através do qual pretendia o trancamento da ação penal, com base nos seguintes argumentos:

a) inépcia da denúncia, que não teria descrito individualizada e pormenorizadamente a conduta do Paciente;

b) falta de justa causa, eis que não teria sido demonstrada a partici­pação do Paciente, nos fatos, de forma consciente e voluntária - ou sequer indícios de participação;

c) existência de coisa julgada, a impedir a denúncia, em relação aos fatos que envolviam a empresa Split Corretora de Mercado Ltda.

Pretendeu-se, ainda, fosse obstado o indiciamento do Paciente.

O Tribunal a quo, por sua vez, concedeu a ordem apenas para impe­dir o indiciamento do Paciente, entendendo insubsistentes os demais argu­mentos dos impetrantes.

Diante disso, foi interposto o presente recurso ordinário, pretenden­do-se o trancamento da ação penal, através da renovação dos argumentos apresentados perante o Tribunal Regional Federal da 3<1. Região e acrescen­tando-se, a estes, a desfundamentação do acórdão recorrido, que teria se li­mitado à reprodução das razões do julgamento de anterior conflito de com­petência, e aos termos da denúncia.

Não assiste razão ao Recorrente.

Inicialmente, a argumentação de que o acórdão não estaria fundamen­tado não procede.

Verifica-se que o acórdão ora impugnado, às fls. 427/429, adotou, ex­pressamente, as conclusões trazidas na manifestação da Procuradoria Regio­nal da República, no sentido de não existir a figura da coisa julgada, eis que as duas ações a que se referem os impetrantes (95.01.02177-7 e 2000.61.81.0036533-3) versariam sobre fatos diversos.

Esta Corte já entendeu, em mais de uma oportunidade, que o fato de o julgador adotar as conclusões do douto parecer do Ministério Público como

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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460 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

razões de decidir não constitui nulidade (HCs n. 12.964-RJ; 9.7:?8-SP;

12.528-SP).

De outra banda, tem-se que, ao rejeitar o argumento referente à inép­cia da denúncia, o Tribunal a quo procedeu à transcrição dos excertos que

julgou necessários à demonstração da aptidão para a formalização da acusa­

ção.

Nesse passo, ressaltou, o acórdão recorrido, que a denúncia descreveu,

adequadamente, os fatos criminosos, apontando-se os Réus como autores

destes fatos, e, especificamente quanto ao Paciente, apontando sua condição de sócio-majoritário e administrador das pessoas jurídicas SPLIT - DTVM

e SPLIT - Corretora.

Nos excertos transcritos no acórdão, assinalou-se que algumas das prá­

ticas financeiras, em tese, ilegais, foram detectadas a partir de fiscalização realizada pelo Banco Central, sobre o período de julho de 1994 a dezem­bro de 1996 e que, a partir dessa constatação, houve o acirramento da fis­

calização, que acarretou na descoberta de outras condutas, praticadas, a prin­cípio, em desacordo com normas legais pré-estabelecidas, e, sempre, pelos administradores das pessoas jurídicas ali relacionadas, entre elas, a SPLIT

- DTVM e SPLIT - Corretora, das quais o Paciente era, ainda, como já

referido, sócio-majoritário.

A denúncia descreve, em detalhes minuciosos, como se processavam as

operações financeiras apontadas como irregulares pelo Banco Central, bem como ressalva a responsabilidade de cada um dos acusados - 15 (quinze)

ao todo.

Assim, pelo exame da peça pórtica, cuja cópia encontra-se às fls. 162/

194, tem-se o atendimento aos requisitos do art. 41 do CPP, uma vez que houve a exposição do fato criminoso, com suas circunstâncias, assim como

se deu a devida qualificação do acusado, a classificação do crime, além do

oferecimento do rol de testemunhas.

Não se vislumbra consistente imprecisão nos fatos atribuídos ao Pa­ciente, hábil a impedir a compreensão da acusação formulada, devidamen­

te amparadas pelos elementos de prova. Ademais, não ocorre qualquer das

falhas previstas no art. 43 do Código de Processo Penal.

Como bem ressaltado pelo egrégio Tribunal a quo, a exordial acusa­

tória narra com clareza a possibilidade de existência dos fatos típicos, per­

mitindo ao acusado o perfeito conhecimento da extensão da narração e, por

conseqüência, facultando-lhe a plena defesa.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 461

Outrossim, é cediço que em caso de crimes de autoria coletiva, não se tem como inepta a denúncia que não descreve, pormenorizadamente, a con­duta dos denunciados, quando não obstrui, nem dificulta o exercício da mais ampla defesa, admitindo-se a narração mais ou menos genérica por inter­pretação pretoriana do art. 41 da Lei Processual Penal.

Entender diferente seria inviabilizar a acusação e tolher a oportunidade de o dOlllinus litis provar o que alega.

Eventual inépcia da denúncia, portanto, só pode ser acolhida quando demonstrada inequívoca deficiência a impedir a compreensão da acusação, em flagrante prejuízo à defesa do acusado, ou na ocorrência de qualquer das falhas apontadas no art. 43 do CPP - o que não se vislumbra in casu.

Com efeito. É posição desta Corte que o trancamento da ação, normal­mente, é inviável em sede de writ, pois dependente do exame da matéria

fática e probatória.

A alegação de ausência de justa causa para o prosseguimento do feito

só pode ser reconhecida quando, sem a necessidade de exame aprofundado e valorativo dos fatos, indícios e provas, restar inequivocamente demonstra­da, pela impetração, a atipicidade flagrante do fato, a ausência de indícios a fundamentarem a acusação, ou, ainda, a extinção da punibilidade.

Tais hipóteses, contudo, não foram verificadas in casu.

Nesse sentido, trago à colação os seguintes precedentes:

"RHC. Crime contra a fé pública. Formação de quadrilha. Trancamento da ação penal. Falta de justa causa. Inocorrência. Indí­cios suficientes de participação nos eventos delituosos a permitir o prosseguimento da ação penal. Inépcia da denúncia. Requisitos do art.

41 do CPP, respeitados. Tratando-se de crime de autoria coletiva não é necessário pormenorizar a conduta dos Pacientes. Recurso desprovido.

A Paciente não foi denunciada somente por ser sócia da empre­sa envolvida nos eventos ditos criminosos, há indícios suficientes a cor­roborar a persecutio crilllinis, não havendo que se falar em falta de

justa causa para o prosseguimento da ação penaL

Ademais, em sede de habeas corpus, conforme entendimento pretoriano, somente é viável o trancamento da ação penal por falta de jus­ta causa quando, prontamente, desponta a inocência do acusado, a

atipicidade da conduta, ou se acha extinta a punibilidade, circunstânci­as não evidenciadas na espécie.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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462 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Descabe falar-se em inépcia da denúncia. A mesma está formulada de acordo com requisitos exigidos pelo art. 41 do CPp, descrevendo crime em tese e possibilitando a defesa por parte da acusada.

Nos crimes de autoria coletiva, conforme jurisprudência firmada nesta Corte e no Excelso Pretório, não é necessário que a denúncia por­menorize a conduta de cada um dos acusados, remetendo-se para a ins­trução criminal a efetiva individualização de cada ação criminosa.

Recurso desprovido." (RRC n. 11.389-RJ, DI de 25.02.2002, relator Min. Iosé Arnaldo).

"Criminal. RC. Crimes contra a honra de delegado da polícia federal. Trancamento da ação. Inépcia da denúncia. Requisitos do art. 41 do CPP. Ausência de justa causa não evidenciada. Crime de auto­ria coletiva. Denúncia mais ou menos genérica admitida. Inquérito policial. Prescindibilidade. Prova da materialidade e suficientes indí­cios de autoria. Ordem denegada.

A falta de justa causa para a ação penal só pode ser reconhecida quando, de pronto, sem a necessidade de exame valorativo do conjunto fático ou probatório, evidenciar-se a atipicidade do fato, a ausência de indíci­os a fundamentarem a acusação ou, ainda, a extinção da punibiHdade.

Eventual inépcia da denúncia só pode ser acolhida quando demons­trada inequívoca deficiência a impedir a compreensão da acusação e em flagrante prejuízo à defesa dos Réus, sendo que, tratando-se de crimes de autoria coletiva, de difícil individualização da conduta de cada parti­cipante, admite-se a denúncia de forma mais ou menos genérica, por in­terpretação pretoriana do art. 41 do CPP.

O inquérito policial não é imprescindível para o início da ação penal por denúncia ou queixa, se tais peças vierem embasadas em ou­tros elementos que demonstrem a materialidade e indiquem a autoria, sendo que, para o tipo de delito ora apurado, tem-se como suficien­tes o panfleto no qual veiculadas as ofensas e a presunção de que seus autores seriam os Pacientes, pelo fato deles integrarem a Diretoria que subscreveu o texto.

Ordem denegada." (RC n. 16.285-RS, DI de 25.02.2002, de mi­nha Relatoria).

Diante do exposto, nego provimento ao recurso, nos termos da funda­mentação acima.

É como voto.

RST], Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO EM HABEAS CORPUS N. 13.944 - SP

(Registro n. 2003.0003643-3)

Relator: Ministro Gilson Dipp

Embargante: Enrico Picciotto

Advogados: José Roberto Batochio e outros

Embargado: Tribunal Regional Federal da 311. Região

Paciente: Enrico Picciotto

463

EMENTA: Criminal - RHC - Embargos de declaração - Coisa

julgada - Inocorrência - Incompetência do juízo - Omissão verifi­

cada - Conflito de competência não dirimido - Impossibilidade de

análise e julgamento por esta Corte - Embargos parcialmente aco­

lhidos, para sanar a omissão apontada.

I - Ausente qualquer omissão quanto à alegada ofensa à coisa

julgada, se o acórdão embargado foi claro ao repetir o que já havia

decidido a Corte Regional, no julgamento do Habeas Corpus n.

10.558-SP, no sentido de que ausente a figura da coisa julgada, "eis

que as duas ações a que se referem os impetrantes (95.01.02177-7 e

2000.61.81.0036533-3) versariam sobre fatos diversos".

H - Acolhem-se, em parte, os embargos de declaração, se

verificada a ocorrência de omissão no que diz respeito à alegação

de incompetência da 3l! Vara Federal Criminal de São Paulo para o

julgamento do delito relacionado à empresa SPLIT DTVM Ltda.

IH - Em que pese a ocorrência de omissão no julgado quanto à

incompetência da 3l! Vara Federal Criminal de São Paulo para pro­

cesso e julgamento do feito de n. 2000.61.81.3633-3, é defeso a esta

Corte proferir qualquer decisão a respeito dessa questão, uma vez

que o conflito de competência instaurado entre as duas varas fe­

derais ainda não foi dirimido.

IV - Embargos declaratórios que devem ser parcialmente aco­

lhidos, tão-somente para sanar a omissão apontada.

V - Embargos parcialmente acolhidos, sem efeitos infringentes,

nos termos do voto do Relator.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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464 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, em que são partes as acima indicadas, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribu­nal de Justiça. A Turma, por unanimidade, acolheu parcialmente os embar­gos, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Jorge Scartezzini, Laurita Vaz, José Arnaldo da Fonseca e Felix Fischer votaram com o Sr. Ministro-Relator.

Brasília-DF, 15 de maio de 2003 (data do julgamento).

Ministro Gilson Dipp, Relator.

Publicado no DJ de 23.06.2003.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Gilson Dipp: Trata-se de embargos de declaração opos­tos contra o acórdão de fls. 546/555, proferido pela Quinta Turma desta Corte que, à unanimidade, negou provimento ao recurso em habeas corpus interposto em favor de Enrico Picciotto, nos termos da seguinte ementa:

"Criminal. RHC. Gestão fraudulenta de instituição financeira. Quadrilha. Nulidade do acórdão recorrido. Inexistência de coisa julgada. Adoção das razões do parecer do Ministério Público. Possibi­lidade. Inépcia da denúncia. Falhas não vislumbradas. Narrativa cla­ra, permitindo ciência e plena defesa. Justa causa evidenciada. Auto­ria coletiva. Possibilidade de denúncia mais ou menos genérica. Inexistência de prejuízo ao direito de defesa. Ausência de constrangi­mento ilegal. Recurso desprovido.

I - Hipótese que cuida de paciente denunciado pela prática de gestão fraudulenta de duas instituições financeiras - das quais era só­cio-majoritário e administrador - cometido por quadrilha, nas moda­lidades de movimentação de recursos, paralelamente à contabilidade legalmente exigida, e negociação de valores mobiliários sem prévio registro de emissão junto à autoridade competente.

II - Não constitui nulidade o fato de o Tribunal a quo ter ado­tado as conclusões do parecer do ilustre representante do Ministério Público como razões de decidir acerca da inexistência de coisa julgada, a impedir o oferecimento da denúncia.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 465

III - Eventual inépcia da denúncia só pode ser acolhida quando demonstrada inequívoca deficiência a impedir a compreensão da acusa­ção, em flagrante prejuízo à defesa dos acusados, ou na ocorrência de qualquer das falhas apontadas no art. 43 do CPP - o que não se vis­lumbra in casu.

IV - Exordial acusatória que narra com clareza a possibilidade de existência dos fatos típicos, permitindo ao acusado o perfeito co­nhecimento da extensão da narração e, por conseqüência, facultando­-lhe a ampla defesa.

V - Noticiada a existência de crime em tese, não se pode impe­dir a imperiosa necessidade de esclarecimentos a respeito do ocorri­do, o que só será possível no transcurso da respectiva ação penal.

VI - Tratando-se de delito de autoria coletiva, não se tem como inepta a denúncia que não descreve, pormenorizadamente, a conduta dos denunciados, quando não obstrui, nem dificulta o exercício da mais ampla defesa, admitindo-se a narração mais ou menos genérica por interpretação pretoriana do art. 41 da Lei Processual Penal.

VII - Recurso desprovido, nos termos do voto do relator."

Em razões, alega-se omissão no julgado, que teria deixado de apreci­ar duas das cinco questões defensivas lançadas no recurso, quais sejam, a da coisa julgada quanto ao delito relacionado à empresa Split Corretora de Mercadorias Ltda, e a da incompetência do Juízo da 3-'1. Vara Federal Cri­minal de São Paulo para o processamento e julgamento do delito relativo à empresa SPLIT DTVM Ltda.

Pugna-se, então, pela apreciação destas questões.

É o relatório.

Apresento os autos em mesa para julgamento.

VOTO

O Sr. Ministro Gilson Dipp (Relator): Trata-se de embargos de decla­ração opostos contra o acórdão de fls. 546/555, proferido pela Quinta Tur­ma desta Corte que, à unanimidade, negou provimento ao recurso em habeas corpus interposto em favor de Enrico Picciotto, em que se alega­va a nulidade do acórdão recorrido, a inépcia da denúncia, a ausência de justa causa, violação à coisa julgada e incompetência do Juízo da 3-'1. Vara Federal Criminal de São Paulo.

RST], Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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466 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Nos presentes embargos, aponta omissão do julgado relativamente à ale­gação de ofensa à coisa julgada quanto às imputações relativas à empresa Split Corretora de Mercadorias Ltda e à incompetência do Juízo da 3Jl Vara Federal Criminal de São Paulo para julgar o delito relacionado à empresa SPLIT DTVM Ltda.

No recurso ordinário, o ora embargante pugnava pelo trancamento da ação penal instaurada por fatos sobre os quais alega já ter sido declarada extinta a punibilidade.

Nos presentes embargos, reiterando os mesmos argumentos, passa a afirmar que o acórdão embargado foi omisso relativamente a esse ponto. Ocorre que, conforme se extrai da fl. 549, o acórdão foi claro ao repetir o que já havia decidido a Corte Regional, no julgamento do Habeas Corpus n. 1 0.558-SP, no sentido de que ausente a figura da coisa julgada, "eis que as duas ações a que se referem os Impetrantes (95.01.02177-7 e 2000.61.81.0036533-3) versariam sobre fatos diversos".

Inexistente qualquer omissão quanto à alegada ofensa à coisa julgada, incabível o acolhimento dos embargos nessa parte.

Tenho por reconhecer, entretanto, a ocorrência de omissão no acórdão embargado, no que se refere à alegação de incompetência do Juízo da 3Jl

Vara Federal Criminal de São Paulo.

A questão foi devidamente suscitada nas razões do recurso ordinário em habeas corpus, não tendo sido objeto de análise e decisão pelo acórdão embargado.

O Embargante sustenta a competência do Juízo da 4Jl Vara Federal Criminal para conhecer e julgar a Ação Penal n. 2000.61.81.3633-3 seja pela conexão, seja pela continuidade delitiva.

Para tanto, alega que a 4Jl Vara Federal Criminal suscitou Conflito Positivo de Competência em face da 3Jl Vara Federal Criminal da mesma Subseção Judiciária de São Paulo, uma vez que o feito de n. 96.0102108-6, distribuído à primeira, diz respeito aos mesmos fatos versados no Pro­cesso n. 2000.61.81.3633-3, sendo, assim, manifestamente conexos.

Em que pese a ocorrência de omissão no julgado quanto a esse pon­to, é defeso proferir qualquer decisão a respeito dessa questão, uma vez que não há sequer notícia nos autos sobre o julgamento do conflito de compe­tência instaurado entre as duas varas federais.

Realizando pesquisa junto ao Tribunal Regional Federal a respeito de ambos os feitos acima referidos, verificou-se a prolação de sentença absolutória

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 467

relativamente ao primeiro (96.0102108-6), publicada em 07.05.2003, cujo trâmite se deu perante a 4a Vara Federal Criminal, sendo que o segundo processo, de n. 2000.61.81.3633-3, continua em andamento perante a 311

Vara Federal Criminal, o que leva à conclusão que o conflito de competên­cia suscitado ainda não foi dirimido, não sendo possível, como já se refe­riu, ser objeto de análise ou decisão perante este Tribunal.

Diante do exposto, acolho em parte os embargos, sem efeitos infrin­gentes, nos termos da fundamentação acima.

É como voto.

RECURSO ESPECIAL N. 231.859 - RN (Registro n. 1999.0085605-8)

Relator:

Recorrente:

Advogados:

Recorrida:

Advogados:

Ministro Felix Fischer

Instituto Nacional do Seguro Social - INSS

Fernando Antônio Correia e outros

Alzira Dantas Ferreira

Enélio Antônio Galvão Petrovich e outro

EMENTA: Administrativo - Ex-combatente - Marinha Mercan­te - Lei n. 1.756/1952 - Viúva - Pensionista - Lei n. 1.756/1952 - Pres­crição - Relação de trato sucessivo - Dissídio jurisprudencial -Súmula n. 83-STJ

I - Não se conhece do recurso especial cuja matéria nele ver­sada não foi apreciada, sequer implicitamente, pelo egrégio Tribu­nal a quo (Súmulas n. 282 e 356-STF).

11 - Em se tratando de ação proposta por pensionista para ob­ter retificação da renda mensal inicial, a prescrição não incide so­bre o chamado fundo de direito, atingindo apenas as parcelas vencidas há mais de cinco anos, contados do ajuizamento da ação (Súmula n. 85-STJ). Precedentes.

111 - A pensão devida à viúva de ex-combatente, integrante da Marinha Mercante, atendidos os requisitos previstos na Lei n. 1.756/ 1952 e no Decreto n. 36.911/1955, deve ser igual aos proventos a que teria direito o falecido, se vivo estivesse. Precedentes.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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468 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

IV - No tocante ao dissídio jurisprudencial alegado, é aplicá­vel, in casu, o enunciado da Súmula n. 83 do STJ.

Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, em que são partes as acima indicadas, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso e, nessa par­te, negar-lhe provimento. Os Srs. Ministros Gilson Dipp, Jorge Scartezzini, Laurita Vaz e José Arnaldo da Fonseca votaram com o Sr. Ministro-Relator.

Brasília-DF, 8 de abril de 2003 (data do julgamento).

Ministro Felix Fischer, Relator.

Publicado no DJ de 02.06.2003.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Felix Fischer: O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS interpôs recurso especial com fulcro no art. 105, UI, alíneas a e c, da Constituição Federal, contra decisão do egrégio Tribunal Regional Fe­deral da 511. Região, que afastou a preliminar de prescrição do fundo do di­reito sobre a pretensão da recorrida de perceber pensão especial com o valor integral ao que seria pago ao de cujus, ex-combatente da Marinha Mercante.

O v. acórdão reprochado está assim ementado:

"Previdenciário. Prescrição. Inocorrência. Revisão de pensão. Viú­va de ex-combatente da Marinha Mercante. Categoria Arrais. Lei n. 1.756/1952. Decreto n. 36.911/1955.

1. Não existe prescrição do fundo do direito, mas tão-somente das prestações vencidas antes dos 5 (cinco) anos anteriores ao ajuizamento da ação.

2. A pensão devida a viúva de ex-combatente, integrante da Ma­rinha Mercante, na categoria de Arrais, atendidas as condições previstas na Lei n. 1.756/1952 e Decreto n. 36.911/1955, deverá ser igual aos proventos de aposentadoria que receberia aquele, se vivo estivesse.

3. Apelação improvida." (fl. 99).

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 469

Alega o Recorrente violação ao art. 1ll. do Decreto n. 20.910/1932, ao art. lll', §§ 1ll. e 2'\ da Lei n. 6.899/1981; ao art. 219 do Código de Proces­so Civil, aos arts. 1.062 e 1.536, § 2Q

, ambos do Código Civil de 1916, bem como dissídio jurisprudencial.

Preliminarmente, alterca que é inaplicável ao presente caso o enuncia­do da Súmula n. 85-STJ, incidindo a prescrição qüinqüenal, ante o fato da Recorrente manter-se inerte quando foi fixada a pensão em quantia inferi­or ao que realmente faria jus.

Quanto à questão de fundo, assevera que, com relação aos Marítimos,

a expressão "no que couber", contida no texto do Decreto n. 36.911/1955, permite à Recorrida apenas a percepção da aposentadoria no cargo imedia­tamente superior àquele exercido pelo ex-combatente, sendo indevida qual­quer outra vantagem.

Além disso, sustenta a incidência da correção monetária sobre as par­

celas anteriores ao ajuizamento da causa. Aduz, ainda, pela aplicação dos juros de mora no percentual de 6% ao ano, com o início da sua fluência a partir da citação.

Não foram apresentadas contra-razões (fl. 120).

Admitido o recurso, subiram os autos a este Tribunal.

A douta Subprocuradoria Geral da República se pronunciou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Felix Fischer: Versa o caso acerca da ocorrência ou não da prescrição do fundo de direito em ação proposta por pensionista de ma­rinheiro mercante a fim de obter o pagamento do benefício no valor cor­respondente aos vencimentos integrais do servidor.

Inicialmente, cumpre assinalar que a insurgência quanto à suposta ofensa ao art. l Q

, §§ l Q e 2Q, da Lei n. 6.899/1981, ao art. 219 do CPC e

aos arts. 1.062 e 1.536, § 2Q, ambos do Código Civil de 1916, não está apta

a transpor o juízo prévio de admissibilidade. Com efeito, as questões pos­

tas no presente apelo - incidência da correção monetária sobre as parcelas anteriores ao ajuizamento da causa, aplicação dos juros de mora na taxa de

6% ao ano, com o início da sua fluência a partir da citação - não foram apreciadas, sequer implicitamente, pelo v. acórdão recorrido, que se ateve

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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470 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

apenas a discutir a questão da prescrição do chamado fundo de direito e a revisão da pensão em vista das vantagens dispostas no art. 111. da Lei n. 1.756/1952.

Assim, inviável o apelo excepcional, à míngua do necessário preques­

tionamento da matéria. Observe-se, ademais, que tampouco foram opostos

embargos declaratórios para ensejar ao colegiado a quo o exame da

quaestio posta no recurso especial, o que atrai a incidência dos enuncia­dos das Súmulas n. 282 e 356 do Pretório Excelso.

É cediço que o prequestionamento consiste na exigência de que o as­sunto tratado no recurso interposto para os Tribunais Superiores tenha sido previamente decidido pela Corte de origem. Nesse passo, não basta que a

parte-recorrente tenha suscitado o tema, ainda que à exaustão, sendo neces­

sário, para a satisfação desse requisito de admissibilidade, que a matéria veiculada tenha sido decidida pelo Tribunal-recorrido, ainda que de forma implícita, o que, a toda evidência, não ocorreu na espécie.

A propósito, reporto-me a elucidativa decisão proferida pela Corte

Especial no EREsp n. 78.017-SC, reI. Min. Garcia Vieira:

"Embargos de divergência. Ausência de pressupostos.

Não caracterizada a divergência. A egrégia Primeira Turma, no

acórdão embargado, entendeu não se dever conhecer de recurso espe­

cial se o tema nele abordado não foi objeto de debate na Corte de ori­gem. Os acórdãos apontados como paradigmas não divergem deste entendimento.

Embargos não conhecidos."

Nesse sentido tem se manifestado a jurisprudência desta Corte, exigin­

do-se, para fins de prequestionamento, que a questão tenha sido ventilada

na instância de origem:

"Processual Civil. Honorários advocatícios. Execução não embar­

gada. Recurso especial. Prequestionamento. Ausência.

Não se conhece do recurso especial cuja matéria nele versada não

foi apreciada, sequer implicitamente, pelo egrégio Tribunal a quo. (Súmulas n. 282 e 356-STF).

Recurso não conhecido." (REsp n. 439.986-RS, de minha

relatoria, DJU de 16.09.2002).

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 471

"Recurso especial. Administrativo. Servidor. Vencimento. Plano de

carreira. Efeitos financeiros. Dissídio não demonstrado. Art. 255,

RISTJ. Ausência de prequestionamento.

O alegado dissenso pretoriano não foi eficazmente demonstrado nos moldes regimentais exigidos.

Constata-se que a questão abordada no presente apelo não foi

objeto de análise e discussão na instância ordinária, carecendo, assim,

do necessário prequestionamento.

Recurso não conhecido." (REsp n. 180.832-PB, reI. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU de 20.03.2000).

"Processual Civil. Recurso especial. Ausência de prequestio­

namento.

Impossível o acesso ao recurso especial se o tema nele inserto

não foi objeto de debate no acórdão recorrido.

Recurso especial não conhecido." (REsp n. 125.951-RJ, reI. Min. Cesar Asfor Rocha, DJU de 27.03.2000).

"Processo Civil. Recurso especial. Ausência de prequestiona­mento. Recurso desprovido.

- A questão veiculada no recurso especial não foi objeto de apre­ciação pelo Tribunal de origem, carecendo de prequestionamento." (AgRg no Ag n. 201.341-SP, reI. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira,

DJU de 08.03.2000).

"( ... ) - Ausente no acórdão debate sobre a tese suscitada no re­curso especial, inviável sua análise, por faltar o requisito do prequestio­namento, incidindo na espécie o enunciado n. 282 da Súmula-STE"

(REsp n. 130.766-CE, reI. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU de 14.06.1999).

"( ... ) I - Para que ocorra o prequestionamento, não basta que a parte suscite as questões em suas razões recursais; é mister vê-las deci­

didas pelo Tribunal de origem, pena de supressão de instâncias. ( ... )." (Ag n. 208.757-RS, reI. Min. Waldemar Zveiter, DJU de 14.06.1999).

"( ... ) I - A ausência de prequestionamento das questões federais

no acórdão a quo impede o seu conhecimento pelo Superior Tribunal

de Justiça, caso da legitimidade para a causa, da prescrição e dos ju­

ros de mora. ( ... )." (REsp n. 182.465-SC, reI. Min. Aldir Passarinho

Junior, DJU de 07.06.1999).

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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472 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

No que tange à alegada prescrição, é preciso observar que o cerne da discussão recai sobre o quantuIIl do benefício.

Assim sendo, a prescrição não é a do art. 12 do Decreto n. 20.910/1932, e não atinge o chamado fundo de direito. Incide, portanto, apenas sobre as parcelas vencidas antes de cinco anos, contados do ajuizamento da ação.

Sobre o assunto vale transcrever passagem do voto do Ex. mo Sr. Mi­nistro Moreira Alves no RE n. 1l0.419-SP, que muito contribui para escla­recer a quaestio:

"São merecedoras de transcrição, pelas diretrizes seguras que fi­xam, estas palavras que se lêem no voto do Ministro Rodrigues Alckmin:

'É certo que a relação funcional não prescreve, mesmo por­que o que prescreve são pretensões, fundadas ou infundadas. Assim, se a lei outorga determinada vantagem pecuniária a uma classe funcional, quem se encontre em tal classe terá direito à vantagem pecuniária. Se a Administração não efetua pagamento devido, prescrevem as parcelas (Decreto n. 20.910, art. 32 ). A pretensão deduzida, aí, é a de perceber a vantagem - não, a de ser consi­

derado integrante de determinada classe ou categoria funcional.

Mas se a lei concede reestruturação, ou reenquadramento e a Administração não dá nova situação funcional ao servidor (si­tuações cujos ganhos seriam melhores), a pretensão a ser deduzi­da é a de obter esse reenquadramento. Essa pretensão prescreve.

O termo inicial da prescrição corresponde ao da actio nata. Se a Administração deve praticar, de ofício, ato de reenquadra­

mento, e o pratica, excluindo o interessado, desse ato nasce a ofensa a direito e a conseqüente pretensão a obter judicialmente a satisfação dele. Se a Administração, que deve agir de ofício, se omite e não há prazo para que pratique o ato, pelo que a omissão não corresponde à recusa, ainda não corre a prescrição.

Se a lei marca prazo (como no caso dos autos) para que o interessado requeira o benefício, findo o prazo se positiva, igual­mente, para quem o considera incapaz de acarretar decadência, a

possibilidade de deduzir, em juízo, a pretensão.

E inegável é que, aí, a pretensão é a de obter reenquadra­mento (do qual decorrerão vantagens pecuniárias), não a de ob­

ter simples parcelas mensais de proventos. Porque o direito a

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 473

proventos melhores decorre, necessariamente, da prévia questão

do direito do reenquadramento.' (RTJ n. 84/194 e 195).

Em voto de vista que então proferi, na mesma linha da manifes­

tação do Ministro Rodrigues Alckmin, procurei assim caracterizar o que seria o denominado fundo do direito:

' ... não posso concordar com a tese radical do eminente Ministro Eloy da Rocha, cuja falha, em meu entender, consiste em

considerar que a prescrição só não será das prestações se se dis­

cutir a existência, ou não, de relação funcional entre o servidor e o Estado, porque tudo o mais se traduz em vantagens periódi­

cas. A falha dessa tese consiste em não considerar que a situação

jurídica fundamental - ser funcionário - não é estática, imutável.

Ela se modifica no tempo, por força de promoções, acessos,

reclassificações. O direito a essas modificações, à semelhança do que ocorre com a própria situação jurídica básica - ser funcioná­

rio -, é susceptível de ser violado, nascendo daí a pretensão para que se afaste tal ofensa, pretensão que prescreve dentro de cinco

anos a contar da violação. E tanto isso é certo que, sem o reco­nhecimento da modificação na situação funcional (assim, o reco­nhecimento à reclassificação), não há que se falar em violação ao

direito de receber vantagens econômicas decorrentes dessa modi­ficação que é a causa mesma do nascimento de tal direito, nem,

portanto, em pretensão à obtenção dessas vantagens, pretensão que se prescreve periodicamente.' (RTJ n. 84/199 e 200).

Fundo do direito é expressão utilizada para significar o direito de

ser funcionário (situação jurídica fundamental) ou os direitos a modifi­cações que se admitem com relação a essa situação jurídica fundamen­

tal, como reclassificações, reenquadramentos, direito a adicionais por tempo de serviço, direito à gratificação por prestação de serviços de

natureza especial, etc.). A pretensão ao fundo do direito prescreve, em

direito administrativo, em cinco anos a partir da data da violação dele,

pelo seu não reconhecimento inequívoco. Já o direito a perceber as

vantagens pecuniárias decorrentes dessa situação jurídica fundamental

ou de suas modificações ulteriores é mera conseqüência daquele, e sua

pretensão, que diz respeito a quantum, renasce cada vez em que este é devido (dia a dia, mês a mês, ano a ano, conforme a periodicidade

RST], Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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474 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

em que é devido seu pagamento), e, por isso, se restringe às prestações

vencidas há mais de cinco anos, nos termos exatos do artigo 3ll. do

Decreto n. 20.910/1932, que reza:

'Art. 3ll.. Quando o pagamento se dividir por dias, meses ou

anos, a prescrição atingirá progressivamente as prestações, à me­

dida que completarem os prazos estabelecidos pelo presente de­creto.'

Se - como está expresso nesse dispositivo legal - a pretensão à prestação legalmente devida (que é simplesmente um quantum) re­

nasce, para efeito de prescrição, periodicamente por ocasião do momen­

to em que deve ser feito seu pagamento, tudo o que a esse quantum, que é a prestação, está indissoluvelmente ligado (assim, portanto, in­

clusive o critério de sua fixação, decorra ele de ato normativo inconstitucional ou ilegal, ou de má interpretação da Administração

Pública) se rege pelo mesmo princípio. Se o Estado paga, e reconhe­

ce, portanto, a existência incontroversa do fundo do direito, mas paga

menos do que é constitucional ou legalmente devido, o direito ao pa­

gamento certo renasce periodicamente.

Nota-se, por fim, que esse renascimento periódico só deixa de

ocorrer - e isso foi construção jurisprudencial, para impedir que ele

se desse apesar de indeferimentos sucessivos da Administração Públi­

ca a reclamação expressa do funcionário -, se o servidor público re­

quer ao Estado a correção da prestação que lhe está sendo indevida­

mente paga, e seu requerimento é indeferido. A partir de então, tem o

servidor de ajuizar a ação para obter o resultado querido, sob pena de

prescrever definitivamente essa pretensão." (RTJ n. 130, pp. 328/330).

o presente caso, portanto, não envolve prescrição do fundo de direi­

to. Trata-se de relação de trato sucessivo, com caráter alimentar, e não houve

ato da Administração negando o direito, mas apenas pagando valor menor.

É o caso da aplicação do enunciado da Súmula n. 85-STJ, verbis:

"Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda PÚ­

blica figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio

direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas

antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação."

RST], Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 475

Nesse sentido há precedentes desta Corte:

"Processual e Previdenciário. Ex-combatente marítimo. Pensão. Prescrição parcial. Correção monetária e juros de mora.

I - As matérias de respeito à correção monetária e aos juros de mora não foram suscitadas na apelação, e nem ventiladas no acórdão recorrido, carecendo, assim, de prequestionamento, consoante Súmulas n. 282 e 356-STF.

11 - Em se tratando de pedido de retificação da renda mensal ini­cial, com o pagamento de diferenças, a prescrição é parcial, consoan­te Súmula n. 85-STl

111 - Recurso conhecido em parte, mas desprovido." (REsp n. 230.973-RN, reI. Min. Gilson Dipp, DJU de 04.06.2001).

"Previdenciário e Processual Civil. Pensão por morte. Ex-comba­tente. Lei n. 1.756/1952. Percentual. Prescrição das parcelas anterio­res ao qüinqüênio legal. Súmula n. 85-STl

1. Sendo relação jurídica de trato sucessivo, cujo direito postu­lado em juízo não foi inequivocamente negado pela Administração, a prescrição atinge apenas as parcelas vencidas anteriormente ao qüin­qüênio legal precedente ao ajuizamento da ação. Incidência da Súmula n. 85-STJ.

2. O preenchimento dos requisitos legais a concessão do benefí­cio é matéria fática, não podendo ser analisada por esta Corte. Súmula n. 7-STl

3. Recurso não conhecido." (REsp n. 284.389-RN, reI. Min. Ed­son Vidigal, DJU de 05.03.2001).

"Previdenciário. Revisão de pensão paga a menor. Ex-combatente. Prescrição qüinqüenal. Obrigação de trato sucessivo.

Sendo a relação jurídica de trato sucessivo, cujo direito postulado em juízo não foi inequivocamente negado pela Administração, a prescri­ção atinge apenas as parcelas vencidas anteriormente ao qüinqüênio le­gal precedente ao ajuizamento da ação. Incidência da Súmula n. 85-ST}.

Recurso não conhecido." (REsp n. 233.340-RN, reI. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU de 23.10.2000).

"Processual e Previdenciário. Ex-combatente marítimo. Pensão. Prescrição. Súmula n. 85-ST}. Correção monetária. Índices. Decisão ultra petita. Juros de mora. Reformatio in pejus. Súmula n. 45-STl

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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476 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

1. Em se tratando de pedido de retificação de renda mensal ini­cial, com o fim de receber diferenças de pensão, a prescrição é par­cial, consoante Súmula n. 85-STl

C·· .) 4. Recurso conhecido em parte e, nessa, provido." CREsp n.

209.836-RN, reI. Min. Gilson Dipp, DJU de 11.09.2000).

Quanto à questão de fundo, a irresignação da autarquia previdenciária também não deve prosperar.

A Lei n. 1.756/1952 estendeu ao pessoal da Marinha Mercante Nacio­nal os direitos e vantagens concedidos pela Lei n. 288/1948 aos militares e civis que participaram de operações de guerra. Diz o art. 10 da Lei n. 288/1948:

"O Oficial das Forças Armadas que serviu no teatro de operações na Itália, ou tenha cumprido missões de patrulhamento de guerra em qualquer outro teatro de operações, definidas pelo ministro respecti­vo, quando transferido para a reserva remunerada, ou reformado, será previamente promovido ao posto imediato, com os respectivos venci­mentos integrais."

Já a Lei n. 1.756/1952 dispõe, em seu art. 10:

"Art. 1ll.. São extensivos a todo o pessoal da Marinha Mercante Nacional, no que couber, os direitos e vantagens da Lei n. 288, de 8

de junho de 1948.

Parágrafo único. Ao pessoal da Marinha Mercante Nacional que, a partir de 22 de março de 1941, durante a última grande guerra, hou­ver participado ao menos, de duas viagens na zona de ataques subma­rinos, ser-Ihe-ão calculados os proventos de aposentadoria na base dos vencimentos do posto ou categoria superior ao do momento."

A Lei n. 1.756/1952 foi regulamentada pelo Decreto n. 39.611/1955, que em seu art. 4ll. dispôs o seguinte:

"Art. 4ll.. Quando se tratar de segurados falecidos em atividade, atingidos pela Lei n. 1.756, de 5 de dezembro de 1952, serão obser­vadas, no cálculo das pensões aos beneficiários, as melhorias decorren­tes da mesma lei."

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 477

Esse dispositivo, portanto, garante aos pensionistas as vantagens asse­guradas aos servidores pela Lei n. 1.756/1952, razão pela qual a Recorri­da tem o direito à pensão calculada sobre os vencimentos do posto ou ca­tegoria superior ao que ocupava o servidor quando do seu falecimento.

A alegação da autarquia previdenciária de que a pensão não deve corresponder ao valor integral dos vencimentos do de cujus, mas sim à fra­ção indicada no Decreto n. 48.959-A/60, não tem procedência, tendo em vista que a pensão, no caso, é de natureza especial, não se submetendo às regras gerais da Previdência Social.

Nesse sentido é o entendimento desta Corte:

"Administrativo. Viúva de ex-combatente da Marinha Mercante. Pensão paga a menor. Reajustamento igualitário à remuneração dos ativos. Prescrição. Obrigação de trato sucessivo.

- A prescrição qüinqüenal das ações contra a Fazenda Pública, bem como suas autarquias e entidades paraestatais atinge o fundo de direito quando o ato lesivo da Administração negar a situação jurídi­ca fundamental em que se embasa a pretensão veiculada.

- Na hipótese, encontrando-se a situação jurídica consolidada pelo direito reconhecido à pensão e objetivando-se o pagamento do benefício no percentual de 100 %, nos termos que dispõe a Lei n. 1.756/1952, aplica-se o comando inserto na Súmula n. 85-STJ, que disciplina a prescrição qüinqüenal nas relações de trato sucessivo, em que são atingidas apenas as parcelas relativas ao qüinqüênio antece­dente à propositura da ação.

- As pensões concedidas aos beneficiários de ex-combatente têm que corresponder aos proventos de aposentadoria do instituidor da pensão se vivo estivesse.

- Recurso especial não conhecido." (REsp n. 437.081-RN, reI. Min. Vicente Leal, DJU de 14.10.2002).

"Administrativo. Ex-combatente. Marinha Mercante. Lei n. 1.756/ 1952. Viúva. Pensionista. Lei n. 1.756/1952. Prescrição. Relação de tra­to sucessivo. Súmula n. 85-STJ.

I - Em se tratando de ação proposta por pensionista para obter retificação da renda mensal inicial, a prescrição não incide sobre o chamado fundo de direito, atingindo apenas as parcelas vencidas há mais de cinco anos, contados do ajuizamento da ação. Súmula n. 85-STJ. Precedentes.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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478 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

H - A pensão devida à viúva de ex-combatente, integrante da Marinha Mercante, atendidos os requisitos previstos na Lei n. 1.756/

1952 e no Decreto n. 36.911/1955, deve ser igual aos proventos a que teria direito o falecido, se vivo estivesse. Precedente.

Recurso desprovido." (REsp n. 307.246-RN, de minha relatoria, DJU de 04.06.2001).

"Administrativo e Previdenciário. Ex-combatente marítimo. Pen­

são. Prescrição parcial.

I - Em se tratando de pedido de retificação da renda mensal ini­

cial, com o pagamento de diferenças, a prescrição é parcial, consoan­

te Súmula n. 85-STJ.

H - Assiste direito à viúva de ex-combatente marítimo de ter a sua pensão no valor integral dos proventos do ex-marido, se vivo fos­se, consoante Lei n. 1.756/1952 e Decreto n. 36.911/1955.

IH - Recurso conhecido, mas desprovido." (REsp n. 232.679-RN,

reI. Min. Gilson Dipp, DJU de 09.04.2001).

"Administrativo. Processual Civil. Recurso especial. Viúva de ex­-combatente da Marinha Mercante. Pensão paga a menor. Reajustamen­to igualitário à remuneração dos ativos. Prescrição. Obrigação de trato

sucessivo. Juros de mora. Majoração em 2l1. grau sem recurso do ven­

cedor. Reformatio in pejus. CPC, art. 512.

- A prescrição qüinqüenal das' ações contra a Fazenda Pública,

bem como suas autarquias e entidad,es paraestatais atinge o fundo de

direito quando o ato lesivo da Administração negar a situação jurídi­ca fundamental em que se embasa a pretensão veiculada.

- Na hipótese, encontrando-se 'a situação jurídica consolidada

pelo direito reconhecido à pensão e objetivando-se o pagamento do benefício no percentual de 100%, nos termos que dispõe a Lei n.

1.756/1952, aplica-se o comando inserto na Súmula n. 85-STJ, que

disciplina a prescrição qüinqüenal nas relações de trato sucessivo, em que são atingidas apenas as parcelas relativas ao qüinqüênio antece­

dente à propositura da ação.

- As pensões concedidas aos beneficiários de ex-combatente têm

que corresponder aos proventos de aposentadoria pelo instituidor da pensão se vivo estivesse, consoante o artigo 1l1. da Lei n. 1.756, de

1952, C.c. o artigo 4l1. do Decreto n. 36.911, de 1955.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 479

- O acórdão que modifica o critério de fixação dos juros de mora, agravando a situação do recorrente, implica reformatio in pejus e afronta a regra do art. 512 do Código de Processo Civil.

- Recurso especial parcialmente conhecido e nesta extensão pro­vido." (REsp n. 232.733-RN, reI. Min. Vicente Leal, DJU de 24.04.2000).

Cumpre ressaltar que, com relação ao dissídio jurisprudencial alega­do, inviável o conhecimento do recurso com base na alínea c do permissi­vo constitucional, ante a incidência da Súmula n. 83-STJ, que encerra este enunciado: "Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida".

Pelo exposto, conheço em parte o recurso e, nessa parte, nego-lhe pro­vimento.

É o voto.

RECURSO ESPECIAL N. 252.613 - SP (Registro n. 2000.0027572-7)

Relator: Ministro Felix Fischer

Recorrente: Francisco Nobre de Oliveira

Advogados: Eduardo Reale Ferrari e outros

Recorrido: Ministério Público do Estado de São Paulo

EMENTA: Penal - Recurso especial - Crime contra a Adminis­tração Pública - Prescrição superveniente - Recurso prejudicado.

I - Uma vez decorrido o prazo prescricional, extinta está a punibilidade, prejudicado o recurso porquanto afastada a pretensão punitiva.

II - O acórdão que, em 2Q grau, confirmando a condenação de primeiro, apenas, reduz a resposta penal, estabelece tão-só novo referencial de contagem, não sendo causa interruptiva do prazo prescricional. No caso, a última seria a sentença condenatória (pre­cedentes).

Extinta a punibilidade, prejudicado o recurso.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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480 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, em que são partes as acima indicadas, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribu­nal de Justiça, por unanimidade, julgar prejudicado o recurso e declarar extinta a punibilidade, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Gilson Dipp, Jorge Scartezzini e José Arnaldo da Fonseca vota­ram com o Sr. Ministro-Relator. Sustentou oralmente: Dr. David Teixeira de Azevedo (pelo recorrente).

Brasília-DF, 26 de novembro de 2002 (data do julgamento).

Ministro Felix Fischer, Relator.

Publicado no DI de 24.02.2003.

Embargos declaratórios acolhidos com efeito modificativo, p. 482.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Felix Fischer: Trata-se de recurso especial interposto, com fulcro no art. 105, inciso 111, alíneas a e c, da Carta Magna, por Fran­cisco Nobre de Oliveira, contra v. julgado do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

O Réu-recorrente foi condenado, em primeiro, como incurso nas san­ções do art. 316 do CP a 4 anos de reclusão, afora a pena pecuniária. Ape­lou. Em 211. grau, o inconformismo foi parcialmente acolhido com a redução da reprimenda para 2 anos e 4 meses de reclusão afora a multa. Foram opos­tos embargos de declaração e posteriormente embargos infringentes, rejei­tados. Daí o apelo excepcional em que se sustenta violação aos arts. 59 e 68 do CP e divergência jurisprudencial.

No provisório juízo de prelibação a súplica foi obstada, subindo por agravo.

A douta Subprocuradoria Geral da República se pronunciou pelo não-co­nhecimento e, posteriormente, pela inocorrência da extinção da punibilidade.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Felix Fischer: O fato descrito na exordial acusatória ocorreu em outubro de 1987 (fi. 394).

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 481

A denúncia foi recebida em 19.02.1992 (fl. 130).

A r. sentença condenatória foi tornada pública em cartório em 27.06.1995 (fl. 403).

Ao acolher parcialmente a apelação do acusado, o egrégio Tribunal a quo reduziu a pena para dois anos e quatro meses nos termos do parecer do douto Procurador de Justiça (cf. v. acórdão à fl. 487 e parecer referencial de fl. 468). Aí, tornou-se, como pena para o delito, 2 anos de reclusão e mais 4 meses de reclusão, de acréscimo pela continuidade delitiva (v., fl. 468).

Pois bem, a última causa interruptiva foi então, a r. sentença. E o referencial são os dois anos de reclusão (ex vi art. 119 do CP).

Tanto o v. acórdão que confirmou a condenação, reduzindo a pena, não interrompe o prazo prescricional, como, também, o dos embargos infrin­gentes. Para tanto:

"Penal. Processual Penal. Prescrição retroativa. Sentença conde­natória recorrível. Causa interruptiva.

- A prescrição penal retroativa, espécie regulada pelo quantum. da pena fixada na sentença condenatória recorrível, transitada em jul­gado para a apelação, ocorre com o decurso do prazo entre a data da consumação do delito e a do recebimento da denúncia, ou entre esta e a da sentença condenatória.

- A prescrição da pretensão punitiva tem como causa interruptiva a data da publicação da sentença condenatória, ainda que a pena tenha sido reduzida pela instância ordinária recursal.

- Habeas corpus denegado." (HC n. 9.299-SP, Sexta Turma, reI. Min. Vicente Leal, DJU de 30.08.1999).

"HC. Dosimetria. Fundamentação suficiente. Prescrição inter­corrente. Inocorrência. Acórdão confirmatório da condenação. Ordem denegada.

I - Tendo sido dosada, a pena imposta ao Paciente, de maneira fundamentada, ainda que sucintamente, não se acolhe alegação de afronta ao art. 59 do Código Penal.

II - A decisão colegiada que, confirmando a condenação, apenas diminui a reprimenda imposta em 1!J. grau, não se constitui em marco interruptivo da fluência do prazo prescricional.

III - Ordem denegada." (HC n. 9.947-SP, Quinta Turma, reI. Min. Gilson Dipp, DJU de 22.11.1999).

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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482 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

"Criminal. REsp. Extinção da punibilidade. Prescrição inter­corrente. Acórdão confirmatório da condenação. Decretação em preli­minar. Recurso julgado prejudicado.

I - Ultrapassado o prazo prescricional previsto no art. 109, inc. V, do CP, da sentença condenatória até o presente momento, decreta­-se a extinção da punibilidade pela ocorrência da prescrição inter­corrente, julgando-se prejudicado o recurso.

II - A decisão colegiada que, confirmando a condenação, apenas diminui a reprimenda imposta em lll. grau, não se constitui em marco interruptivo da fluência do prazo.

III - Não há que se falar em prescrição da pretensão executória enquanto não transitada em julgado a decisão condenatória para ambas as partes.

IV - Declarada a extinção da punibilidade do recorrente e re­curso especial julgado prejudicado." (REsp n. 121.439-SP, Quinta Tur­ma, reI. Min. Gilson Dipp, DJU de 28.02.2000).

Os marcos interruptivos, no caso, são o recebimento da prefaciaI acusatória e a sentença (com o novo referencial dado em 211. grau).

Daí, por via de conseqüência, quando o feito veio, a primeira vez, à conclusão (com parecer), em 01.08.2002 (fl. 675), já havia decorrido o pra­zo prescricional de forma superveniente, ex vi arts. 107, inciso IV; 109,

inciso V, e 119 do Código Penal.

Declaro, pois, extinta a punibilidade pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva (prescrição superveniente) e prejudicado o recurso.

É o voto.

Relator:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL N. 252.613 - SP

(Registro n. 2000.0027572-7)

Ministro Felix Fischer

Embargante: Ministério Público Federal

Embargado: Francisco Nobre de Oliveira

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 483

Advogados: Eduardo Reale Ferrari e outros

Parte: Ministério Público do Estado de São Paulo

EMENTA: Processual Penal - Recurso especial - Crime contra a Administração Pública - Concussão - Erro na do simetria da pena - Dissídio jurisprudencial - Não demonstração - Prescrição - Re­conhecimento - Embargos declaratórios - Contradição - Ocorrência.

I - Ao reconhecer a prescrição da pretensão punitiva estatal, o acórdão embargado partiu da premissa equivocada de que o acrés­cimo de 4 1neses à pena-base (dois anos de reclusão) decorria da continuidade delitiva, em verdade inexistente.

U - A fixação da pena um pouco acima do mínimo legal (qua­tro meses) está devidamente fundamentada em face da existência de diversas circunstâncias judiciais desfavoráveis ao réu, como o elevado grau de culpabilidade, as circunstâncias em que foi pratica­do o ilícito (com premeditação), e as conseqüências do crime. Hipó­tese em que para se infirmar as conclusões a que chegou o v. Acór­dão a quo seria necessário o reexame de todo o arcabouço fático-pro­batório contido nos autos, o que se torna inviável nesta via eleita, ante o enunciado da Súmula n. 7-STJ.

lU - Para caracterização do dissídio, indispensável que se faça o cotejo analítico entre a decisão reprochada e os paradigmas invo­cados.

IV - A simples transcrição de ementas, sem que se evidencie a similitude das situações, não se presta para demonstração da diver­gência jurisprudencial.

Embargos acolhidos para, afastada a prescrição e superada a prejudicialidade do recurso especial, dele não se conhecer.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, em que são partes as acima indicadas, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribu­nal de Justiça, por unanimidade, acolher os embargos, nos termos do voto

do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Gilson Dipp, Laurita Vaz e José Arnaldo da Fonseca votaram com o Sr. Ministro-Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Jorge Scartezzini.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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484 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Brasília-DF, 6 de maio de 2003 (data do julgamento).

Ministro Felix Fischer, Relator.

Publicado no DJ de 16.06.2003.

RELATÓRIO

o Sr. Ministro Felix Fischer: O Ministério Público Federal opôs em­bargos de declaração em face do v. acórdão de fi. 686, assim ementado:

"Penal. Recurso especial. Crime contra a Administração Pública. Prescrição superveniente. Recurso prejudicado.

I - Uma vez decorrido o prazo prescricional, extinta está a punibilidade, prejudicado o recurso porquanto afastada a pretensão punitiva.

II - O acórdão que, em 2Q. grau, confirmando a condenação de primeiro, apenas, reduz a resposta penal, estabelece tão-só novo refe­rencial de contagem, não sendo causa interruptiva do prazo prescricio­nal. No caso, a última seria a sentença condenatória (precedentes).

Extinta a punibilidade, prejudicado o recurso." (fi. 686).

Alega o Parquet-embargante que o decisum. padece de contradição diante dos elementos constantes dos autos, porquanto a prescrição da pre­tensão punitiva, in casu, rege-se pela pena concretizada em 2Q. grau, que é de 2 anos e 4 meses de reclusão. Logo, para que ocorresse a prescrição

superveniente seria necessário o transcurso do lapso temporal de 8 anos entre os marcos interruptivos, nos termos do art. 109, IV, do Código Penal, e não de 4 anos, como entendeu o acórdão embargado.

Requer o acolhimento dos embargos para que, sanada a contradição apontada, seja modificado do julgado.

Em vista do possível efeito infringente dos embargos, abri vista ao Recorrente, que não se manifestou (fi. 703).

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Felix Fischer: Tem razão o Embargante. Com efeito, o v. acórdão embargado partiu da premissa equivocada de que o acréscimo

RST], Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDENCIA DA QUINTA TURMA 485

de 4 meses à pena-base (dois anos de reclusão) decorria da continuidade

delitiva (fi. 682). E esta em verdade inexistiu.

Logo, a pena a ser considerada para efeito de contagem do lapso

precricional é mesmo a de 2 anos e 4 meses de reclusão. Logo, para que ti­

vesse ocorrido a prescrição superveniente, in casu, seria necessário o trans­curso do lapso temporal de 8 anos entre os marcos interruptivos, nos ter­mos do art. 109, IV, do Código Penal, o que não aconteceu.

Assim, acolho os presentes embargos para, sanada a contradição, afastar a ocorrência da prescrição.

Em conseqüência, passo a apreciar o apelo excepcional.

Alega o Recorrente violação aos arts. 59 e 68 do Código Penal, bem

como dissídio jurisprudencial, sustentando que o v. acórdão hostilizado, embora tenha reduzido a reprimenda imposta ao Paciente, não fundamen­

tou a fixação da pena acima do mínimo legal, tendo ocorrido bis in ideIIl

na do simetria da pena, consubstanciado na consideração, para exacerbação

da resposta penal, de elemento do próprio tipo do art. 316 do Código Pe­nal, qual seja, o recebimento da vantagem ilícita.

Da análise do v. acórdão hostilizado, constata-se que a pena imposta ao Recorrente foi fixada em 4 meses acima do mínimo previsto para o tipo

penal do art. 316 (cuja pena cominada é de 2 a 8 anos de reclusão) com a devida fundamentação, tendo-se em vista o elevado grau de culpabilidade

do agente, bem como em face das circunstâncias em que foi praticado o ilí­cito (com premeditação), e as conseqüências do crime. Confira-se:

"No caso em exame, a culpabilidade do agente (expressão que

substitui na lei as expressões 'intensidade do dolo' e 'grau da culpa')

merece especial destaque, além da ousadia, da frieza e do descaso,

acentuado, demonstrado para com a sua atividade funcional de funcio­

nário público encarregado da fiscalização tributária.

Com efeito, pois do exame das provas, se verifica que o Embar­gante se dirigiu até um determinado lugar, fora de seu local de traba­

lho, para onde foi sem comunicar, com o visível objetivo de conseguir, para si, vantagem indevida, em razão de seu cargo de agente fiscal de

rendas. Ao avistar um caminhão conduzindo algumas cabeças de gado,

mandou que o condutor parasse o veículo, exigindo a apresentação da

respectiva nota fiscal, que o motorista disse não possuir, pois que esta­

va levando os animais de um imóvel para outro, do mesmo proprietário.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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486 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Foi chamado ao local o administrador dos imóveis, Renato Bertato, a quem o Embargante disse que lavraria uma multa de Cz$ 250.000,00, mas acrescentando que aceitaria Cz$ 50.000,00 para não lavrar a au­tuação. Renato entrou em contato com João de Oliveira Dorta, respon­sável pela escrituração fiscal dos imóveis e essa pessoa viu que o auto de infração já estava lavrado, auto que o Embargante cancelou. O Embargante acabou aceitando Cz$ 15.000,00. O tesoureiro Osório Luiz Dias Ferreira, a pedido de João, preencheu um cheque e foi ao banco descontá-lo e em seguida retornou com aquela quantia que foi entregue ao Embargante.

O art. 316 do Código Penal tem por objetivo tutelar a regulari­dade da Administração Pública, 'no que tange à probidade dos funcio­nários, ao legítimo uso da qualidade e da função por eles exercida' (Mirabete, Manual de Direito Penal, 3/305), sendo que, in casu, a Administração teve a imagem bastante ferida pela atuação do Embar­gante, pois não bastasse em se revelar um mau funcionário, fez mais, pouco se importando com que várias pessoas tomassem conhecimen­to do que fazia de errado, qual seja, o motorista do caminhão, o admi­nistrador dos imóveis, o responsável pela escrituração fiscal e o tesou­reiro da empresa rural. Enfim, revelou dolo de intensidade acima do normal e o seu comportamento foi revelador de que premeditou o gol­pe, o que mostra uma conduta ainda mais reprovável. Feriu e muito a imagem da Administração Pública.

Sem se esquecer que o Embargante estava buscando uma vanta­gem indevida, em razão da sua função de agente fiscal de rendas, que dos funcionários públicos são dos mais bem pagos.

Por tudo isso é que se tem como acertadas as penas, inclusive a pecuniária, que não poderiam mesmo ficar no mínimo legal, com a devida vênia do ilustre prolator do voto-vencido." (fls. 527/529).

No particular, ponderou a douta Subprocuradoria Geral da Repúbli­ca, com remissão aos fundamentos expedidos pelo Parquet local, in verbis:

"É que o v. acórdão hostilizado, após aprofundado exame do con­tingente probatório entranhado nos autos, ofertou adequada solução condenatória, agindo com o mesmo critério na dosagem da repri­menda, desmerecendo qualquer censura.

Na verdade, o ponto central da crítica desencadeada no presente apelo raro é de que teria sucedido bis in idem na do simetria penal,

RST}, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 487

materializado na consideração de elemento do próprio tipo contido no artigo 316 do Código Penal como circunstância exasperante: o recebimen­to da vantagem ilícita, que seria mero exaurimento da conduta delituosa.

Todavia, a insurgência se apresenta equivocada na medida em que considerou apenas um dado referencial lançado no v. Aresto combati­do, quando o texto, às expressas, reporta-se a outros elementos aludidos na r. Sentença monocrática, para alicerçar o quantum da reprimenda. Confira-se, a propósito, o que consta à fl. 487, último parágrafo:

'No que pertine à pena, esta, de fato, se mostrou aplicada de forma exacerbada. Merece redução, mas não ao mínimo legal­mente previsto, haja vista a intensidade de seu dolo no agir, ali­ás bem delineada na r. decisão de p. grau, e devendo ser levado em conta, ainda, o exaurimento do crime.'

E, nesse passo, cumpre transcrever o que veio consignado na r. Decisão do MM. Juiz a quo (fl. 400):

'Posto isso, passo a fixar a pena aplicável:

Observo, inicialmente, que, para acobertar sua atividade ilí­cita, o acusado praticou inúmeras infrações administrativas, fazen­do relatórios falsos, entregando documentos de sua responsabili­dade para que terceiros colhessem as assinaturas e demonstram que o increpado agiu com dolo intenso na prática do crime, le­vando até às últimas conseqüências o seu propósito criminoso (fls. 27/29 e 38/45), razão pela qual, na fixação da pena-base, deverá haver um acréscimo de um terço.' (fls. 673/674)."

Vê-se, assim, que inocorreu a alegada ofensa aos citados dispositivos do estatuto repressor.

Noutro vértice, para se infirmar as conclusões a que chegou o v. Acórdão a quo seria necessário o reexame de todo o arcabouço fático-pro­batório contido nos autos, o que se torna inviável nesta via eleita, confor­me o disposto no enunciado da Súmula n. 7-STJ ("A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial.").

Nesse sentido:

"Penal. Recurso especial. Pena-base. Dosimetria. Circunstâncias judiciais. Reexame de prova. Vedação. Súmula n. 7 -STl

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488 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

1. Aferir se a fixação da pena-base, reduzida em 2ll. grau, foi cor­reta ou não, esbarra no óbice da Súmula n. 7-STJ, pois demanda o revolvimento de critérios fático-probatórios (culpabilidade, anteceden­tes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias, etc.), soberanamente delineados pelas instâncias ordinárias, razão pela qual não há como apreciar, em sede de recurso especial, a alegada vio­

lação ao art. 59 do CP.

2. Recurso não conhecido." (REsp n. 172.849-PR, Sexta Turma, reI. Min. Fernando Gonçalves, DJU de 21.06.1999).

"Penal e Processual Penal. REsp. Tráfico de drogas. Violação à Lei

Federal. Dissídio pretoriano.

I - Se a afirmação de violação ao art. 59 do CP exige o reexame de questão fática, a pretensão recursal esbarra no verbete insculpido na

Súmula n. 7-STJ.

H - O dissídio jurisprudencial, nos termos do art. 255 do RISTJ, não dispensa o cotejo analítico entre paradigma e julgado recorrido.

- Recurso não conhecido." (REsp n. 147.995-MG, Quinta Turma,

de minha relatoria, DJU de 15.12.1997).

"Penal. Processual Penal. Recurso especial. Art. 386, VI, do Có­digo de Processo Penal. Valoração da prova. Pretensão de reexame do material fático-probatório. Súmula n. 7-STJ. Arts. 59 e 92, I, do Có­digo Penal. Divergência jurisprudencial não demonstrada. Recurso não conhecido.

I - Não se conhece de recurso especial fundado em pretensão de

reexame de material fático-probatório, ainda que a título de valoração da prova colhida, indispensável para a análise da sua suficiência para a condenação. Aplicação da Súmula n. 7 desta Corte.

H - Impõe-se, para demonstração da divergência jurisprudencial, a realização do confronto analítico entre os julgados, de modo a evi­denciar sua identidade ou semelhança, a teor do que determina o art. 255, § 2ll., do RISTJ, não restando caracterizado o dissídio pela mera

compilação de ementas, tal como ocorrido in casu.

IH - Recurso não conhecido." (REsp n. 127.921-RJ, Quinta Tur­

ma, reI. Min. Gilson Dipp, DJU de 19.06.2000).

Por fim, no que se refere ao dissídio jurisprudencial, o recurso não

merece ser conhecido.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 489

Em obediência ao art. 255 do RISTJ, é indispensável que se faça, en­tre os acórdãos paradigmas e a decisão reprochada, o cotejo analítico mos­trando a similitude das situações. In casu, isso não ocorreu.

Neste sentido:

"Recurso especial. Violação de lei federal e dissídio pretoriano não demonstrados. Não-conhecimento. Incidência do óbice da Súmula n. 284-STF. Aplicação do art. 541, parágrafo único, do CPC c.c. o art. 255 e parágrafos do RISTl

1. Não obstante o fato de a Recorrente sustentar violação de lei federal e dissídio pretoriano, limitando-se à negativa genérica, não indicou em suas razões, claramente, nenhum dispositivo legal que te­ria sido malferido pelo julgado a quo, tampouco, olvidando as reco­mendações do art. 541, parágrafo único, c.c. o art. 255 e parágrafos do RISTJ, logrou demonstrar, de forma analítica, com transcrição de tre­chos divergentes de acórdãos paradigmas, não se aperfeiçoando pela simples citação de ementas, o verberado dissenso jurisprudencial, incidindo, pois, no contexto delineado, ao conhecimento do recurso especial, o óbice da Súmula n. 284 da Suprema Corte. In casu, ape­sar de citado o repositório oficial, conforme já afirmado, a recorren­te não desenvolveu o cotejo analítico dos paradigmas.

2. Recurso especial não conhecido." (REsp n. 88.925-RJ, Sexta Turma, reI. Min. Fernando Gonçalves, DJU de 19.05.1997).

"Agravo regimental. Agravo de instrumento. Recurso especial. Alegado dissídio não demonstrado nos moldes exigidos. Ausência de impugnação quanto a um fundamento da decisão agravada. Súmula n. 182-STJ.

- 'É indispensável a demonstração analítica em casos nos quais só a comparação das situações fáticas evidencia o dissídio pretoriano.' (REsp n. 6.650-RJ). Não havendo tal demonstração, não há que dar seguimento ao recurso.

- Deixando o agravo de impugnar um fundamento da decisão agravada, é de aplicar-se a Súmula n. 182-STl

- Agravo improvido." (AgRg no Ag n. 135.010-RS, Quinta Tur­

ma, reI. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU de 15.09.1997).

Ressalte-se que, não obstante existirem decisões desta Corte admitin­do a demonstração do dissídio jurisprudencial apenas pela transcrição das

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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490 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ementas (ver Theotonio Negrão, Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor, Saraiva, 1999, 3011. ed., nota 18 ao art. 255 do RISTJ, p. 1.678), isso somente é possível quando o dissídio seja claro, de modo que apenas pela leitura das ementas seja possível se constatar que as hipóteses confrontadas são idênticas e que as soluções adotadas, divergentes, o que não ocorre in casu.

Ante o exposto, acolho os embargos para afastar a prescrição e, supe­rada a prejudicialidade do recurso especial, dele não conheço.

É o voto.

RECURSO ESPECIAL N. 331.888 - RS (Registro n. 2001.0093941-4)

Relator: Ministro José Arnaldo da Fonseca

Recorrente: Instituto Nacional do Seguro Social - INSS

Procuradores: Siegfried Antônio Ghilardi Ritta e outros

Recorrida: Elda Mercês Duczak

Advogados: Waldir Francescheto e outro

EMENTA: Recurso especial - Previdenciário - Processual Civil - Ação rescisória - Termo inicial - Trânsito em julgado da sentença

- Dissídio não demonstrado.

Este Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento de que "se partes distintas da sentença transitaram em julgado em momentos também distintos, a cada qual corresponderá um prazo decadencial com seu próprio dies a quo, para fins de ajuizamento de ação rescisória" (precedentes).

Recurso não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, em que são partes as acima indicadas, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribu­nal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir,

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 491

por unanimidade, não conhecer do recurso. Os Srs. Ministros Felix Fischer, Gilson Dipp e Jorge Scartezzini votaram com o Sr. Ministro-Relator.

Brasília-DF, 7 de novembro de 2002 (data do julgamento).

Ministro José Arnaldo da Fonseca, Relator.

Publicado no DI de 02.12.2002.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca: Trata-se de recurso especial interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, com fundamen­to no art. 105, inciso lU, alíneas a e c, da Constituição Federal, contra o v. acórdão proferido pela Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 4ll Região que, por votação unânime, negou provimento ao agravo regimen­tal, estando assim ementado (fl. 87):

"Rescisória. Recurso parcial. Trânsito em julgado.

Tendo sido interposto recurso parcial, ocorre o trânsito em jul­gado da matéria que não foi por ele abarcada."

Sustenta que, enquanto houver recurso impugnando parcial ou total­mente a sentença ao acórdão, não terá a decisão transitado em julgado, por­que essa deve ser vista de forma una e não fracionada, não se podendo ad­mitir o cabimento de mais de uma ação rescisória a uma mesma sentença ou acórdão. Alega violação aos artigos 485 e 495 do CPC.

Aduz, ainda, que há dissídio jurisprudencial sobre o tema.

Contra-razões (fls. 147/9).

O Tribunal a quo admitiu o regular processamento do feito.

O Ministério Público, em seu parecer, opina pelo não-conhecimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca (Relator): Adoto, como razões de decidir, o parecer da douta Subprocuradoria Geral da República, da la­vra do ilustre Subprocurador Dr. Roberto Casali, verbis (fls. 155/8):

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492 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

"Distribuído a este gabinete no dia 5 de junho do corrente ano,

embora recebido pela Procuradoria Geral da República em 10 de se­tembro de 2001 (fl. 154v.), este recurso especial (fls. 90/105), funda­

do no artigo 105, inciso IH, alíneas a e c, da Constituição Federal,

invoca os artigos 485 e 495 do CPC, bem como dissídio jurispru­

dencial, para impugnar acórdão (fls. 82/87) da Terceira Seção do Tri­bunal Regional Federal da 4l!. Região que, ao negar provimento a

agravo regimental de indeferimento da inicial da Ação Rescisória n. 1999.04.01.030976-3-RS, decidiu nestes termos: 'Compulsando os

autos, observa-se às fls. 17/27 que o recurso de apelação interposto

pela Autarquia não ventilou a matéria ora examinada em sede de ação

rescisória. Tenho entendimento que a interposição de recurso parcial

não impede o trânsito em julgado daquela parte da sentença não cons­tante do mesmo, configurando-se, portanto, a irresignação da Autar­

quia quanto a tais pontos. Assim, tendo sido a sentença publicada em

21.01.1994, a mesma transitou em julgado naquilo que não foi obje­

to de recurso em 22.02.1994, tendo esvaído o prazo para interposição

da rescisória, quanto à matéria, em 22.02.1996, enquanto que a pre­

sente ação foi protocolada em 03.03.1999'. (fl. 73).

o acórdão recorrido ficou assim ementado: 'Rescisória. Recurso par­

cial. Trânsito em julgado. Tendo sido interposto recurso parcial, ocorre

o trânsito em julgado da matéria que não foi por ele abarcada'. (fl. 87).

O Recorrente alega que 'o direito de propor ação rescisória so­mente nasce com o trânsito em julgado da sentença ou do acórdão

rescindendo (RT 636/167). Assim, enquanto couber recurso, não se

inicia o prazo da rescisória. Entende o colendo Supremo Tribunal Fe­

deral que não se dá o trânsito em julgado enquanto couber, até mes­

mo, embargos de declaração ou agravo regimental (RTJ 120/958).

Evidente que estes recursos nem sempre atacam toda a decisão, mas

mesmo assim, enquanto couber qualquer deles, impugnando parcial ou totalmente a sentença ou acórdão, não terá a decisão transitado em jul­

gado, porque a sentença ou o acórdão devem ser vistos de forma una

e não fracionada. Não se pode admitir o cabimento de mais de uma

ação rescisória relativa a uma mesma sentença ou acórdão. Se isto fosse

possível estaríamos atentando contra a segurança e paz social, que

constituem a própria razão de ser da coisa julgada'. (fl. 91).

Mas a egrégia Sexta Turma desse Superior Tribunal de Justiça de­

cidiu que 'o termo inicial do prazo decadencial para a propositura de

RST], Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 493

ação rescisória não se conta da última decisão proferida no processo, mas, sim, do trânsito em julgado da que decidiu a questão que a par­te pretende rescindir. Deliberando o magistrado acerca de questões au­

tônomas, ainda que dentro de uma mesma decisão, e, como na espé­cie, inconformando-se a parte tão-somente com ponto específico do decisum, olvidando-se, é certo, de impugnar, oportunamente, a ma­téria remanescente, tem-se-na induvidosamente por trânsíta em julga­do. ( ... ) Se partes distintas da sentença transitaram em julgado em mo­mentos também distintos, a cada qual corresponderá um prazo decadencial com seu próprio dies a quo: vide Pontes de Miranda,

Trat. da ação resc., 511. ed., p. 353'. (in Comentários ao Código de Pro­cesso Civil, de José Carlos Barbosa Moreira, volume V, Editora Fo­rense, 711. ed., 1998, p. 215, nota de rodapé n. 224). Nesse sentido essa

egrégia Quinta Turma no REsp n. 293.926-SC, reI. Min. Felix Fischer, DJU de 04.06.2001.

Quanto ao dissídio, a jurisprudência colacionada no sentido de não se operar o trânsito em julgado enquanto couber recurso, pressu­põe impugnação da matéria objetada na rescisória, que não é o caso dos autos.

Assim, parece-nos que o recurso não deve ser conhecido."

À vista do exposto, não conheço do recurso.

RECURSO ESPECIAL N. 363.699 - PE (Registro n. 2001.0118526-0)

Relator: Ministro José Arnaldo da Fonseca

Recorrente: Estado de Pernambuco

Procuradores: Leonardo José Carneiro da Cunha e outros

Recorrida:

Advogados:

Valdízía de Miranda Carvalho

Gerson Venâncio de Carvalho e outro

EMENTA: Recurso especial - Previdenciário e Processual Civil - Mandado de segurança - Embargos declaratórios - Questões devi­

damente analisadas - Contagem de tempo de serviço - Justificação

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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judicial - Ausência de prova material - Impossibilidade para fins de ação mandamental - Precedentes.

Não se verifica a alegada contrariedade ao art. 535 do CPC, con­siderando que as questões colocadas foram devidamente analisadas e debatidas, ou no julgamento do mandado de segurança, ou quan­do da apreciação dos embargos declaratórios.

Esta Corte já tem firme jurisprudência no sentido de que a pro­va obtida mediante justificação judicial deve ser examinada e sub­metida ao contraditório, em ação de conhecimento, não se prestan­do para fins de prova em ação mandamental, principalmente in casu, onde se discute a contagem de tempo de serviço para fins de aposentadoria.

Precedentes.

Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, em que são partes as acima indicadas, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribu­nal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Felix Fischer, Gilson Dipp e Jorge Scartezzini votaram com o Sr. Ministro-Relator.

Brasília-DF, 7 de novembro de 2002 (data do julgamento).

Ministro José Arnaldo da Fonseca, Relator.

Publicado no DI de 02.12.2002.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca: Trata-se de recurso especial interposto com fulcro no art. 105, inciso UI, alíneas a e c, da Constituição Federal, contra acórdão do egrégio Tribunal de Justiça de Pernambuco que, em autos de mandado de segurança, assim consignou verbis (fls. 121/122):

"Ementa: Mandado de segurança Contagem de tempo de servi­ço mediante justificação.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 495

1. O direito à aposentadoria adquire-se com o preenchimento dos requisitos exigidos pela lei à época.

2. A Impetrante, ao fazer sua justificação e ter seu tempo de ser­viço anotado, em sua ficha funcional, não pode modificação posterior nas normas para concessão do tempo de serviço, afetar o seu direito à época da aposentação.

3. Configura-se direito líquido e certo da Impetrante à contagem do tempo de serviço dos períodos reconhecidos, judicialmente, já ano­tados em sua ficha funcional."

Dessa decisão foram opostos embargos declaratórios (fls. 133/41), sen­do que os mesmos restaram rejeitados (fls. 145/146).

Sustenta o Recorrente, preliminarmente, violação ao artigo 535, lI, do CPC, por negativa de prestação jurisdicional, na rejeição dos embargos declaratórios e por persistir nas omissões e obscuridades apontadas.

Quanto ao mérito alega que o egrégio Tribunal a quo, ao conceder a segurança, reconhecendo o direito líquido e certo da Recorrida com base em mera justificação judicial, vulnerou o disposto no art. lll. da Lei n. 1.533/ 1951.

Indica a ocorrência de divergência jurisprudencial e, para comprová­-la, colaciona julgados desta Corte (fls. 178/180).

Foram oferecidas contra-razões (fls. 217/223) e o recurso foi regular­mente admitido na instância ordinária (fls. 237/238).

Em sua manifestação, opina o Ministério Público Federal pelo não­conhecimento do recurso (fls. 262/268).

Apensada a estes autos encontra-se a Medida Cautelar n. 3.587-PE, na qual concedi a liminar requerida nos seguintes termos:

"O Estado de Pernambuco, por seu ilustre representante judici­al, interpôs recurso especial, sob as alíneas a e c, contra decisão do egrégio TJPE, que concedera mandado de segurança a servidora pú­blica estadual para lhe assegurar aposentadoria por tempo de serviço, este em parte comprovado mediante justificação judicial, sob o funda­mento de infringência ao art. 535, lI, do CPC, por não ter se exauri­do, por completo, a prestação jurisdicional, ou seja, omissões e obscuri­dades levantadas nos embargos aclaratórios não foram dissipadas, ca­bendo o apelo excepcional, já admitido na origem. Para assegurar o

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resultado útil do recurso, evitando-se o cumprimento do acórdão hostilizado.

o fumus boni iuris assenta-se no descabimento de comprovar­-se o tempo de serviço, para fins de aposentadoria, com base exclusi­vamente em prova testemunhal, apontando precedentes das Quinta e Sexta Turmas do STJ e da Segunda Turma do STF.

Feito esse breve relato, concedo a liminar para emprestar efeito suspensivo ao recurso especial interposto no MS n. 38.582-8, inten­tado por Valdízia de Miranda Carvalho, suspendendo a eficácia da de­cisão até o julgamento do recurso especial, admitido.

Comunique-se ao ilustre Relator-Desembargador Luiz Carlos de Freitas Medeiros. Cite-se a requerida."

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca (Relator): Não vislumbro as omissões apontadas.

Aquelas que teriam restado após o julgamento do mandado de segu­rança, foram analisadas quando do julgamento dos embargos declaratórios, conforme se comprova facilmente da leitura de fi. 145 e seguintes.

Em relação ao mérito, afirma o Estado-recorrente que o decisum teria infringido o art. 1 J:I. da Lei Mandamental, visto que a prova, no mandado de

segurança, deve ser documental e pré-constituída, não se configurando a jus­tificação judicial como elemento comprobatório do direito líquido e certo.

Realmente, em razão da particularidade do caso, não estamos diante do óbice da Súmula n. 7 -STJ, pois não se está a revolver matéria fática nem a revalorar a prova constante.

A irresignação encontra-se centrada na impossibilidade de a justifica­ção judicial se prestar como prova de direito líquido e certo para fins de mandado de segurança, e esse é exatamente o entendimento jurisprudencial desta Corte:

"Mandado de segurança.

- Da justificação judicial não resulta declaramento de relação ju­rídica.

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JURISPRUDÉNCIA DA QUINTA TURMA 497

Recurso ordinário denegado." (RMS n. 10.311-GO, DJ 01.08.2000, reI. Min. Fontes de Alencar).

"Administrativo. Servidor. Pedido de demissão motivado por coa­ção. Exame da prova obtida mediante justificação judicial. Impossibi­lidade. Mandado de segurança. Recurso.

1. A prova obtida mediante justificação judicial deve ser exami­nada e submetida ao contraditório em ação de conhecimento, não substituÍvel por mandado de segurança.

2. Não comportando o mandado de segurança dilação probatória, impossível o reconhecimento do direito líquido e certo a ser protegi­do ... " (RMS n. 11.1l6-RJ, DJ 26.03.2001, reI. Min. Edson Vidigal).

"Administrativo. Recurso em mandado de segurança. Policial mi­litar. Reserva remunerada. Averbação de tempo de serviço. Atividade privada. Justificação judicial. Prova exclusivamente testemunhal. Im­possibilidade.

1. A comprovação de tempo de serviço na iniciativa privada por meio de justificação judicial, com base em prova exclusivamente tes­temunhal, não é válida, posto não possuir força declaratória em favor da parte que a aproveita, somente sendo reconhecida se acompanhada de um início razoável de prova material.

2. Precedentes. (REsp n. 195.788-PI e RMS n. 10.311-GO) (RMS n. 9.234-RO, DJ de 23.04.2001, reI. Min. Jorge Scartezzini).

Desse último precedente, extraio os seguintes trechos elucidativos:

"

" ... A expressão acima negritada (comprovação judicial) não pode ser interpretada como sinônimo de justificação judicial porquanto dis­tinta. Esta última, nas lições de Pontes de Miranda, in Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo XII, p. 295, Ed. Forense, 1976, ' ... é ação constitutiva de prova, e não declaratória. Ponto esse que é as­saz importante. Não se pode pensar em força de coisa julgada mate­rial, ainda que se tenha discutido sobre a relação jurídica cuja existên­cia se pretende provar em justificação. O mais que pode ocorrer é con­ceber-se como constitutiva de prova para a ação declaratória. Talvez para a ação declarativa do art. 412• Nunca, desde logo, como ação declarativa da relação jurídica (. .. ) Constituir prova de relação jurídica e declarar são coisas distintas'. Grifei. Já na comprovação judicial, a coisa julgada material existe e há possibilidade de declaração de existência ou não

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de relação jurídica, o que se faz mediante procedimento ordinário, res­peitado o princípio do contraditório e da ampla defesa.

Neste diapasão, percebe-se que a justificação judicial, com base em prova exclusivamente testemunhal, de nada serve. Ela não possui força declaratória em favor da recorrente, que aconteceria tão-somente se acompanhada de um indício razoável de prova material, o que no caso não ocorreu.

Aliás, vários textos legais exigem início de prova material para a comprovação do tempo de serviço .. .'

Tais casos se amoldam perfeitamente à espécie, considerando que Valdízia de Miranda Carvalho teria impetrado a presente ação manda­mental, com o objetivo de ' ... determinar a inclusão no cômputo do tempo de serviço da Impetrante, para efeito de aposentadoria, os pe­ríodos de serviços prestados, como professora no Município de Jupi e de Angelim, ambos deste Estado, estes últimos objeto da Ação de Justificação Judicial ... '."

Tal justificação foi obtida ao desamparo de prova material.

Merecem acolhida os seguintes argumentos expendidos pelo Estado­-recorrente (fls. 180/182):

"Com efeito. A prova produzida na justificação prévia é testemu­nhal, cuja colheita não contém formação de contraditório, sendo im­possível a apresentação de defesa e a interposição de recursos. Não se afigura cabível, portanto, a justificação judicial como elemento comprobatório do direito líquido e certo, defensável na via angusta do mandamus.

Se já é despropositada a comprovação do direito líquido e certo por meio de justificação judicial, o descabimento de tal comprovação se revela mais acentuado quando se trata de tempo de serviço de ser­vidor público.

Aliás, o reconhecimento, pelo egrégio Tribunal a quo, do cabi­mento do writ na espécie conflita com a firme orientação já assentada nesse colendo STJ, sendo de se anotar o seguinte aresto, in expressis:

'Recurso especial. Administrativo. Aposentadoria. Comprova­ção de tempo de serviço. Atividade privada. Justificação judicial. Prova exclusivamente testemunhal.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 499

Invocando a legislação pertinente, e tendo em mira a juris­prudência desta Corte, não cabe comprovar-se tempo de serviço, para fins de aposentadoria, com base somente em prova teste­munhal.

Recurso provido.' (Ac. uno da Quinta Turma do STJ, REsp n. 195.788-PI, reI. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 16.03.1999, DJ de 19.04.1999, p. 167).

Dessa forma, inviabilizada está a pretensão da concessão do be­neficio, visto que a comprovação do tempo de serviço foi feita unicamen­te por prova testemunhal. Nesse sentido:

'Previdenciário. Processual Civil. Funcionário público mu­

nicipal. Aposentadoria por tempo de serviço. Prova da atividade laborativa. Início razoável de prova documental.

- A jurisprudência da egrégia Terceira Seção consolidou o entendimento de que, para fins de obtenção de aposentadoria previdenciária por tempo de serviço, deve o trabalhador provar o exercício de sua atividade por meio de, pelo menos, início ra­zoável de prova documental.

- Recurso especial conhecido e provido.' (REsp n. 62.904-SP, reI. Min. Vicente Leal, DJ de 29.05.1995).

De tal entendimento não diverge a orientação que dimana do colendo STF, sendo oportuno registrar trecho dos seguintes arestos, verbis:

'Não tem a Impetrante direito líquido e certo contra o Es­tado, que não foi citado nem interferiu na justificação judicial requerida pela interessada. Denegação da segurança.' (Ac. uno da Primeira Turma do STF, RMS n. 3.143, reI. Min. Luís Galloti, j. em 07.05.1956, ement., vol. 260-01, p. 168).

'Tempo de serviço. Não há direito líquido e certo à conta­gem do tempo de serviço por meio de justificação judicial, dada a necessidade de comprovação documental subsidiária (art. 5Jl. do Decreto-Lei n. 2.410/1940).' (Ac. uno da Segunda Turma do STF, RMS n. 18.343-CE, reI. Min. Aliomar Baleeiro, j. em 07.12.1967, DJ de 08.03.1968).

RST], Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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500 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Ora, sendo evidente que não se presta a justificação judicial como meio de comprovação do direito líquido e certo, resulta curial que a concessão da segurança, pelo egrégio Tribunal a quo, quedou por ne­gar vigência ao disposto no art. p. da Lei n. 1.533/1951, visto que tal dispositivo exige, para o cabimento do writ, a presença do direito lí­quido e certo."

Por essas razões, dou provimento ao presente recurso, com a conse­qüente denegação da ordem.

RECURSO ESPECIAL N. 441.591 - CE (Registro n. 2002.0073561-4)

Relator:

Recorrente:

Ministro Felix Fischer

Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísti­ca - IBGE

Representada por: Advocacia Geral da União

Recorridos:

Advogados:

José Evaldo Pires Teixeira e outros

Francisca Martins Ribeiro e outros

EMENTA: Processual Civil - Administrativo - Lei n. 8.030/1990 Prequestionamento - Ausência - Ação rescisória - Prazo deca­

dencial - Início - Trânsito em julgado - Acórdão - Recurso não co­nhecido.

I - Não se conhece do recurso especial quanto à matéria que não foi apreciada pelo egrégio Tribunal a quo. (Sú1nulas n. 282 e 356-STF).

11 - O prazo de dois anos para a propositura de ação rescisória conta-se a partir do trânsito em julgado da decisão rescindenda.

111 - A interposição de recurso tempestivo impede que transite em julgado a sentença, mesmo que na instância ad quem o recurso não seja conhecido por ausência de outro pressuposto de admissibi­lidade que não a tempestividade. Dessa forma, a contagem do biênio terá início com o fim do prazo para se impugnar o acórdão que não conheceu do apelo. Precedentes.

Recurso especial parcialmente conhecido e nessa parte provido.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 501

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, em que são partes as acima

indicadas, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribu­nal de Justiça, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso e, nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Gilson Dipp, Jorge Scartezzini, Laurita Vaz e José Arnaldo da Fonseca votaram com o Sr. Ministro-Relator.

Brasília-DF, 22 de abril de 2003 (data do julgamento).

Ministro Felix Fischer, Relator.

Publicado no DJ de 02.06.2003.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Felix Fischer: Trata-se de recurso especial interposto

pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE contra v. acórdão do egrégio Tribunal Regional Federal da 511. Região que julgou extinta a ação rescisória proposta pela Recorrente, em face da decadência.

Eis a ementa do v. julgado:

"Processual Civil. Embargos infringentes. Início de prazo para ajuizamento da ação rescisória. Decadência.

1. Ocorrência de interposição de recurso especial sem oposição de embargos infringentes, resultando na decisão de não-conhecimen­

to do especial.

2. Para se estabelecer o prazo inicial para ajuizamento da ação rescisória deve se considerar o dies ad quem para a interposição dos embargos infringentes e não o trânsito em julgado da decisão do STJ

que não conheceu do recurso especial.

3. Embargos infringentes desprovidos." (fi. 177).

Irresignada, a Recorrente interpôs o presente recurso especial, com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, alegando vio­

lação aos artigos 467 e 495 do Código de Processo Civil, bem como diver­gência com julgados desta Corte, sustentando que o prazo para o ajuiza­mento da ação rescisória inicia-se com o trânsito em julgado do acórdão proferido no recurso especial, que, " ... embora não tenha sido conhecido

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502 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

pelo egrégio STJ, foi regular e tempestivamente aviado pela Fundação, já que, em tese, era cabível, e, portanto, impediu a formação da coisa julgada material". (fi. 184).

Alega também violação à Lei n. 8.030/1990, sustentando a inexistência de direito adquirido ao reajuste de 84,32%.

Admitido o recurso, subiram os autos a este Tribunal.

A douta Subprocuradoria Geral da República manifestou-se pelo não­-provimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

o Sr. Ministro Felix Fischer: Inicialmente, cumpre ressaltar que o presente recurso não merece ser conhecido, por ausência de prequestio­namento, no tópico referente à alegada ofensa à Lei n. 8.030/1990, perti­nente à matéria de fundo discutida na ação rescisória. Com efeito, tendo o v. acórdão hostilizado julgado extinto o processo por reconhecer a decadên­cia do direito de propor a ação rescisória, a matéria relativa ao reajuste de 84,32% não foi apreciada pelo decisum ora hostilizado. Inviável o recurso, neste tópico, ante os enunciados das Súmulas n. 282 e 356 do STF.

É cediço que o prequestionamento consiste na exigência de que o as­sunto tratado no recurso interposto para os Tribunais Superiores tenha sido previamente decidido pela Corte de origem. Nesse passo, não basta que a parte-recorrente tenha suscitado o tema, ainda que à exaustão, sendo neces­sário, para a satisfação desse requisito de admissibilidade, que a matéria veiculada tenha sido decidida pelo Tribunal-recorrido, o que, a toda evidên­cia, não ocorreu na espécie.

A propósito, reporto-me a elucidativa decisão proferida pela Corte Es­pecial no EREsp n. 78.017-SC, reI. Min. Garcia Vieira:

"Embargos de divergência. Ausência de pressupostos.

Não caracterizada a divergência. A egrégia Primeira Turma, no acórdão embargado, entendeu não se dever conhecer de recurso espe­cial se o tema nele abordado não foi objeto de debate na Corte de ori­gem. Os acórdãos apontados como paradigmas não divergem deste entendimento.

Embargos não conhecidos."

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 503

Nesse sentido tem se manifestado a jurisprudência desta Corte, exigin­do-se, para fins de prequestionamento, que a questão tenha sido ventilada na instância de origem:

"Recurso especial. Administrativo. Servidor. Vencimento. Plano de carreira. Efeitos financeiros. Dissídio não demonstrado. Art. 255, RISTJ. Ausência de prequestionamento.

O alegado dissenso pretoriano não foi eficazmente demonstrado nos moldes regimentais exigidos.

Constata-se que a questão abordada no presente apelo não foi objeto de análise e discussão na instância ordinária, carecendo, assim, do necessário prequestionamento.

Recurso não conhecido." (REsp n. 180.832-PB, reI. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU de 20.03.2000).

"Processual Civil. Recurso especial. Ausência de prequestionamento.

Impossível o acesso ao recurso especial se o tema nele inserto não foi objeto de debate no acórdão recorrido.

Recurso especial não conhecido." (REsp n. 125.951-RJ, reI. Min. Cesar Asfor Rocha, DJU de 27.03.2000).

"Processo Civil. Recurso especial. Ausência de prequestionamento. Recurso desprovido.

- A questão veiculada no recurso especial não foi objeto de apre­ciação pelo Tribunal de origem, carecendo de prequestionamento." (AgRg no Ag n. 201.341-SP, reI. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU de 08.03.2000).

"( ... )

- Ausente no acórdão debate sobre a tese suscitada no recurso es­pecial, inviável sua análise, por faltar o requisito do prequestionamento, incidindo na espécie o enunciado n. 282 da Súmula-STF." (REsp n. 130.766-CE, reI. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU de 14.06.1999).

"( ... )

I - Para que ocorra o prequestionamento, não basta que a parte suscite as questões em suas razões recursais; é mister vê-las decididas pelo Tribunal de origem, pena de supressão de instâncias.

( ... )." (AgRg no Ag n. 208.757-RS, reI. Min. Waldemar Zveiter, DJU de 14.06.1999).

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504 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

No que diz respeito à alegada ofensa aos artigos 467 e 495 do Códi­go de Processo Civil, o apelo da Fundação merece prosperar.

Trata-se de discussão acerca do início da contagem do prazo a que se refere o art. 495 do CPC, para a propositura de ação rescisória.

° v. acórdão reprochado considerou que, como o recurso especial in­terposto pela ora recorrente (REsp n. 93.057-CE) não foi conhecido por este Tribunal por não exaurida a instância ordinária (fi. 96), o biênio então de­

veria ser contado a partir do termo final para a oposição dos embargos infringentes, e não do termo final para a interposição de recurso contra o

acórdão proferido no apelo raro.

Sem embargo do brilhantismo da tese abraçada na decisão objurgada, apoiada em forte corrente doutrinária e jurisprudencial, não encontra ela respaldo na jurisprudência desta Corte, cuja orientação dominante é no sen­tido de que, mesmo que não conhecido o recurso na instância ad quem, o prazo decadencial para propor ação rescisória deve ter início com o término do prazo para se impugnar esse último julgamento, e não a decisão que se quer rescindir.

Confira-se, a respeito, os seguintes precedentes:

"Processual Civil. Recurso especial. Ação rescisória. Possibilidade jurídica do pedido. Prazo para propositura. Decadência.

É juridicamente possível o pedido formulado em ação rescisória quando a parte indica expressamente na petição inicial que pretende a desconstituição de sentença de mérito, e não de decisão proferida em

sede de embargos de declaração.

- A contagem do prazo decadencial para a propositura de ação

rescisória se inicia da data do trânsito em julgado da decisão que apre­

cia eventual recurso interposto contra a sentença de mérito que se pre­tende rescindir." (REsp n. 332.762-GO, rel. a Min.' Nancy Andrighi,

DJU de 10.03.2003).

"Processual Civil. Ação rescisória. Prazo de decadência. Início da

sua contagem.

° prazo de decadência para ingresso de ação rescisória conta-se a partir do trânsito em julgado da decisão rescindenda que ocorre com

o término do prazo para interposição do último recurso, em tese, pela parte, sem se levar em consideração a situação peculiar de cada par­

te, isto é, se está em prazo simples ou em dobro para recorrer.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 505

Embargos rejeitados." (EDcl na AR n. 1.275-SP, reI. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU de 22.10.2001).

"Processual Civil. Ação rescisória. Prazo decadencial. Início. Trânsito em julgado. Acórdão. Recurso deserto.

I - O prazo de dois anos para a propositura de ação rescisória conta-se a partir do trânsito em julgado da decisão rescindenda.

II - A interposição de recurso, cabível e tempestivo, impede que transite em julgado a sentença, mesmo que na instância ad quem seja julgado deserto. Desta forma, a contagem do biênio terá início com o fim do prazo para se impugnar o acórdão que não conheceu do apelo.

Precedentes.

Recurso especial conhecido e provido." (REsp n. 203.067-PR, de minha relato ria, DJU de 14.02.2000).

"Processual Civil. Recurso especial. Ação rescisória. Decadência. Início da fluência do prazo (CPC, art. 495). Inépcia da inicial. Inexis­tência. Súmula n. 343-STF. Inaplicação. Ausência de prequestio­namento. Improvimento dos recursos.

De acordo com a lei de ritos (art. 495), o direito de propor ação rescisória se extingue em dois (2) anos e este prazo só começa a correr da data do trânsito em julgado da decisão rescindenda. A interposição de re­curso previsto na legislação, ainda que despido de efeito suspensivo, afas­ta o dies a quo da decadência, salvante a hipótese de ser utilizado extemporaneamente.

A Súmula n. 343 do STF, impeditiva da procedência da ação rescisória, só tem aplicação quando a causa de pedir (na rescisória) é a ofensa literal a texto legal de interpretação controvertida nos Tribu­nais, não alcançando, todavia, preceito constitucional.

É desinfluente no julgamento da rescisória a juntada, com a ini­cial, do acórdão que decidiu o incidente de inconstitucionalidade de lei, documento só exigível na apreciação do extraordinário.

No âmbito do especial, só se examina questões jurídicas discuti­das e decididas nas instâncias ordinárias. Até mesmo os defeitos intrín­secos do julgado carecem do pronunciamento do Tribunal a quo, pela via dos embargos declaratórios, sob pena de supressão de instância (e não-conhecimento do especial).

Recursos improvidos. Decisão unânime." (REsp n. 130.404-DF, reI. Min. Demócrito Reinaldo, DJU de 08.03.1999).

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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506 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

"Processual Civil. Ação rescisória. Decadência. Início da conta­gem do biênio. Demora na concretização da citação, apesar dos esfor­ços do autor em busca da realização do ato citatório. Requerimento de prorrogação do prazo: desnecessidade. Prescrição intercorrente: inexistência. Inteligência dos arts. 219, 220, 485, V, e 495 do CPC. Precedentes do STF e do STl Recurso não conhecido.

I - O biênio para a propositura de ação rescisória corre da passa­gem in albis do prazo para recorrer da decisão proferida no último recurso interposto no processo, ainda que dele não se tenha conhecido. Isso porque a interposição de recurso, mesmo que posteriormente o juízo de admissibilidade seja negativo, obsta que a última decisão de mérito pro­ferida no processo seja acobertada pelo manto da coisa julgada material. Inteligência do art. 495 do CPC. Precedentes do STP e do STJ: RE n. 87.420-PR, REsp n. 2.447-RS, REsp n. 18. 691-RJ, REsp n. 21. 751-CE, REsp n. 29. 572-RJ e REsp n. 34.014-RJ.

I! - Proposta a ação rescisória dentro do biênio legal, e tendo o autor diligenciado em busca da citação do réu, a eventual demora na realização do ato citatório não prejudica o autor, ainda que ele não te­nha formulado expressamente o requerimento previsto na parte final do 'antigo' § 311. do art. 219 do CPC. Inteligência dos arts. 219 e 220 do CPC. Aplicação da orientação consubstanciada nos enunciados n. 5, 78 e 106 das Súmulas do TARS, do extinto TFR e do STJ, respectivamente. Precedentes do STF e do STJ: AR n. 883-DF, ERE n. 65.125-GB, RE n. 62.553-SP, RE n. 91.412-GO, RE n. 12.229-SP e REsp n. 52.744-SP.

lI! - Não há que se falar em prescrição intercorrente, se a para­

lisação da ação rescisória por mais de dois anos no Tribunal Estadual não se deu por culpa do autor, mas, sim, em virtude da complexidade da causa, combinada com a pletora de processo que assoberbam o Po­der Judiciário. Precedente do STJ: AR n. 7-Rl

IV - ° vocábulo 'lei' inserto no inciso V do art. 485 do CPC deve ser interpretado em sentido amplo, abrangendo os decretos federais, as leis estaduais e as leis municipais.

V - Recurso especial não conhecido." (REsp n. 11.106-SC, reI.

Min. Adhemar Maciel, DJU de 10.11.1997).

"Ação rescisória. Decadência. Prazo. Contagem. Deserção.

1. A interposição de agravo de instrumento contra decisão que considera deserta apelação, impede o trânsito em julgado da sentença, sem retro ação dos efeitos daquele recurso a data da decisão agravada.

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUINTA TURMA 507

2. Recurso especial conhecido e provido." (REsp n. 135.956-MG, reI. Min. Fernando Gonçalves, DJU de 02.02.1998).

"Processual Civil. Recurso especial. Ação rescisória. Prazo deca­dencial. Termo a quo. Trânsito em julgado. Pena de deserção.

- O prazo decadencial de dois anos para a proposição da ação rescisória tem início na data do trânsito em julgado do acórdão, mes­mo que este se limite a proclamar deserto o recurso de apelação, por falta de preparo.

- Somente contar-se-ia o prazo em tela a partir do 15l1. dia da pu­blicação da sentença de 1l1. grau na hipótese de ser o recurso interposto fora do prazo.

- Precedentes deste Superior Tribunal.

- Recurso especial conhecido." (REsp n. 170.636-MG, reI. Min. Vicente Leal, DJU de 17.08.1998).

"Ação rescisória. Prazo. Início.

Ainda que não conhecido o recurso, salvo se por intempestividade, ou por absoluta falta de previsão legal, o prazo para a rescisória se ini­cia a partir do momento em que preclusa a decisão a propósito dele proferida." (REsp n. 84.530-RS, reI. Min. Eduardo Ribeiro, DJU de 29.10.1996).

"Ação rescisória. Decadência. Contagem do prazo.

- Não corre o prazo para o exercício da ação rescisória se inter­posto recurso especial ou extraordinário, ainda que não venha a ser ad­mitido.

- Ofensa aos arts. 467 e 495 do CPC e dissídio pretoriano com­provado.

- Recurso especial conhecido e provido." (REsp n. 21.751-CE, reI. Min. Antônio Torreão Braz, DJU de 10.04.1995).

"Ação rescisória. Decadência. Termo inicial do prazo.

O prazo de dois anos conta-se do trânsito em julgado. Tal não se verifica pendendo recurso, cabível e tempestivamente ofertado.

Não faz retroagir aquele termo a circunstância de haver sido jul­gado deserto. O termo a quo coincidira com o momento em que se exaurir o prazo para impugnar o provimento que reconheceu a deser­ção." (REsp n. 5. 722-MG, reI. Min. Eduardo Ribeiro, DJU de 25.11.1991).

RSTJ, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.

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508 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Em casos semelhantes, assim também entendeu o colendo Supremo Tribunal Federal:

"Ação rescisória.

Alegação de ofensa à lei, desde que teria ocorrido o prazo de de­

cadência (art. 178, § 10, inc. VIII, do Código Civil). Sua improcedên­cia. Pendentes embargos, em princípio cabíveis, por força de previsão legal, embora não conhecidos, claro que impediam o trânsito em jul­

gado da decisão embargada, ou seja, aquela proferida no recurso ex­

traordinário. O prazo de decadência somente começou a correr da data do trânsito em julgado do acórdão nos embargos 'infringentes e de di­vergência', quando já não cabia qualquer recurso. Não se caracteriza a argüida afronta à coisa julgada (art. 485, IV, do Código de Proces­so Civil). Por igual, não procede a alegação de afronta ao art. 485, inc. V, do Código de Processo Civil, eis que o acórdão rescindendo não se

limitou a substituir uma interpretação plausível por outra, a ação rescisória deve assentar em erro ou defeito grave, nos limites da enu­meração legal. Improcedência da ação." (AR n. 988-DF, STF, Pleno, reI. Min. Djaci Falcão, DJU de 01.10.1982).

"Ação rescisória. Decadência. O prazo para propor ação resci­

sória conta-se da passagem em julgado do último recurso interposto do acórdão rescindendo." (RE n. 87 A20-PR, Segunda Turma, reI. Min.

Cordeiro Guerra, publicado na RTJ n. 84/684).

Em campo doutrinário, seguindo essa orientação, temos: Nesol Luiz

Pinto, Recurso Especial, 2l! ed., 1996, p. 80; Nery Júnior, Código, 4l! ed.,

1999, p. 916, comentário 11; e Princípios Fundamentais, 5l! ed., 2000, pp. 235, 236 e 237; Vicente Greco Filho, Direito, volume lI, 11l! ed., 1996, pp. 421 e 422; Bernardo Pimentel Souza, Introdução aos Recursos Cíveis

e à Ação Rescisória, 2l! ed., 2001, p. 531.

Pelo exposto, conheço em parte do recurso e, nessa extensão, lhe dou provimento para que, afastada a decadência, prossiga o egrégio Tribunal a

quo no exame da causa.

É o voto.

RST}, Brasília, a. 15, (171): 411-508, novembro 2003.