UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE …...56f. Orientadora: Profa. Dra. Maria Regina de...

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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL-DESSO RAQUEL CABRAL A JUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO A SAÚDE E OS DESAFIOS PARA EFETIVAÇÃO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE: uma análise sobre o SUS mediado em Natal/RN Natal – RN 2014

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

    DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL-DESSO

    RAQUEL CABRAL

    A JUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO A SAÚDE E OS DESAFIOS PARA

    EFETIVAÇÃO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE: uma análise sobre o SUS

    mediado em Natal/RN

    Natal – RN

    2014

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    RAQUEL CABRAL

    A JUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO A SAÚDE E OS DESAFIOS PARA

    EFETIVAÇÃO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE: uma análise sobre o SUS

    mediado em Natal/RN

    Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Serviço Social, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do Grau de Bacharel em Serviço Social.

    Professora orientadora: Maria Regina de Ávila Moreira

    Natal/RN

    2014

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    Catalogação da Publicação na Fonte.

    UFRN / Biblioteca Setorial do CCSA

    Cabral, Raquel.

    A judicialização do direito a saúde e os desafios para efetivação do Sistema Único de Saúde: uma análise sobre o SUS mediado em Natal/RN/ Raquel Cabral. - Natal, RN, 2014.

    56f.

    Orientadora: Profa. Dra. Maria Regina de Ávila Moreira.

    Monografia (Graduação em Serviço Social) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Departamento de Serviço social.

    1. Direitos sociais – Saúde – Monografia. 2. Judicialização da saúde - Monografia. 3. Políticas de saúde – Monografia. I. Moreira, Maria Regina de Ávila. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

    RN/BS/CCSA CDU 342.7:614

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    RAQUEL CABRAL

    A JUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO A SAÚDE E OS DESAFIOS PARA EFETIVAÇÃO

    DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE: uma análise sobre o SUS mediado em Natal/RN

    Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Serviço Social, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do Grau de Bacharel em Serviço Social.

    ORIENTADORA: Mª Regina de Ávila Moreira.

    Aprovada em ___/___/______

    BANCA EXAMINADORA

    __________________________________________________________ Profª.: Mª Regina de Ávila Moreira.

    Orientadora – Docente UFRN

    ___________________________________________________________ Profª Josivânia Estelita Gomes de Sousa

    Docente UFRN

    ____________________________________________________________ Assistente Social

    Romeika Figueredo Bezerra-CRESS/3481

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    AGRADECIMENTOS

    Agradeço a todos que contribuíram no decorrer desta jornada, especialmente:

    À Deus, a quem devo minha vida, por que para Ele e por Ele são todas as coisas;

    Aos meus pais, que sempre me apoiaram em tudo especialmente nos estudos e nas escolhas

    tomadas, sendo o combustível dessa caminhada, principalmente por acreditarem em cada passo dado durante

    minha vida. Meu agradecimento eterno aos valores transmitidos na minha formação humana, social e

    acadêmica. Sem dúvida essa conquista é de vocês também;

    Ao meu noivo, Pedro Jamys, melhor amigo e companheiro de todas as horas. Obrigada pelo

    incentivo, compreensão, carinho e amor compartilhado durante essa jornada e por tornar minha vida cada

    dia mais feliz. Sem você, essa conquista não teria o mesmo gosto;

    A orientadora Profa. Maria Regina de Ávila Moreira, pela oportunidade e apoio

    nа elaboração deste trabalho. A qual sempre tive grande admiração pela sua competência e pela excelente

    profissional que é. Agradeço por toda dedicação e paciência;

    À professora Josivânia Estelita Gomes de Sousa, pоr seus ensinamentos, paciência е confiança

    ао longo dаs supervisões do estágio curricular;

    As minhas supervisoras de campo, Kamila Luana Santos Marcelino e Romeika Figueredo

    Bezerra, por todo auxílio durante o estágio curricular, pois juntas trilhamos uma etapa importante na

    minha formação acadêmica;

    A toda equipe da Defensoria Pública do Estado, tanto o Núcleo de Justiça Comunitária

    quanto o Núcleo Cível, que durante o período de estágio supervisionado e não obrigatório me acolheu

    maravilhosamente bem. Com vocês, aprendi valores profissionais e pessoais que carregarei comigo por toda a

    vida, sem dúvida levarei um pouco de cada história e vivência comigo. Vocês conquistaram um enorme

    espaço no meu coração;

    Aos meus colegas pelo companheirismo e disponibilidade, por me auxiliar em vários momentos e

    por fazer parte dessa caminhada tornado-a leve e alegre.

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    RESUMO

    CABRAL, Raquel. A Judicialização do direito a saúde e os desafios para

    efetivação do Sistema Único de Saúde: uma análise sobre o SUS mediado em

    Natal/RN. 2014. Trabalho de Conclusão de Curso – Serviço Social, Universidade

    Federal Do Rio Grande do Norte. Natal/RN.

    O presente trabalho pretende analisar o direito à saúde enquanto um direito social

    fundamental conquistado por meio de lutas sociais e normatizado na Constituição

    Federal em 1988. A discussão central será a respeito do fenômeno da judicialização

    da saúde pública no Brasil, o qual se constituiu e vem se expandindo na sociedade

    contemporânea, decorrente da omissão do Poder Público legislativo e executivo. No

    intuito de ampliar as discussões da temática, foi desenvolvida uma pesquisa

    quantitativa e bibliográfica, utilizando-se do método indutivo para interpretação dos

    dados obtidos do Programa SUS MEDIADO, criado e efetivado pela Defensoria

    Pública do Estado do Rio Grande do Norte no município de Natal, com a finalidade

    precípua de constatar a interferência do Poder Judiciário na busca pela efetivação

    do direito a saúde. O primeiro capítulo abordará a conjuntura histórica da política de

    saúde no contexto dos direitos sociais, com ênfase na criação do Sistema Único de

    Saúde e na organização da saúde no Município de Natal/RN. O segundo capítulo

    apresentará os dados da pesquisa, a instituição pesquisada e por fim as conclusões

    obtidas a partir dos resultados da mesma. E no terceiro capítulo serão retomados os

    desafios para a constituição do direito a saúde, principalmente no modo de produção

    capitalista que se encontra em vigor. Logo, pretende-se com a presente investigação

    contribuir para a ampliação da discussão sobre a judicialização do direito a saúde,

    no que se refere a interferência do Judiciário na questão da implementação de

    políticas públicas de saúde como medida de execução desse direito.

    Palavras chaves: Capitalismo; Direitos sociais; Estado; Judicialização da saúde.

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    ABSTRACT

    This paper discusses the right to health as a fundamental social right won through

    social and regulated by the Federal Constitution in 1988. The main discussion will be

    fights about the phenomenon of judicialization of public health in Brazil, which was

    established and is expanding in contemporary society, due to the omission of the

    legislative and executive Government. In order to broaden the discussion of the

    theme, we developed a quantitative and literature search, using the inductive method

    for interpreting the data obtained from the SUS MEDIATED Program, created and

    made effective by the Public Defender of the State of Rio Grande do Norte in Natal

    with the primary aim for the interference of the judiciary in the quest for the realization

    of the right to health. The first chapter will address the historical context of health

    policy in the context of social rights, with emphasis on the creation of the Unified

    Health System and health organization in the city of Natal / RN. The second chapter

    presents the survey data, the research institution and finally the conclusions drawn

    from the results of the same. And in the third chapter will be taken up challenges to

    the establishment of the right to health, especially in the capitalist mode of production

    that is in force. Therefore, it is intended to present research contributes to the

    broadening of the discussion about the legalization of the right to health, as regards

    the interference of the judiciary in the matter of implementation of public health

    policies as a means of implementing Community law.

    Keywords: Capitalism; Social rights; State; Judicialization of health.

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    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1: Orçamento Geral da União (Previsto para 2014)- Total = 2,383 trilhões ..30

    Figura 2: Defensoria Pública do Estado - SUS MEDIADO .......................................40

    Figura 3: Sala de mediação do SUS MEDIADO ..................................................... 40

    Figura 4: Judicialização da saúde no Rio Grande do Norte .....................................45

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    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1: Beneficiários de planos privados de saúde, por cobertura assistencial (Brasil - 2003-2014) ................................................................................29

    Tabela 2: Distribuição das ações realizadas pela UNICAT na DPE em 2014.......... 41

    Tabela 3: Distribuição das ações realizadas pela SMS na DPE em 2014 .............. 41

    Tabela 4: Distribuição das ações realizadas pela SESAP na DPE/2014..................42

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    LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    CAPs- Caixa de Aposentadoria e Pensões

    CF- Constituição Federal

    CONASP- Conselho Consultivo de Administração da Saúde Previdenciária

    DPE/RN- Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Norte

    EBSERH- Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares

    IAPs- Institutos de Aposentadorias e Pensões

    INPS- Instituto Nacional de Previdência Social

    ONU- Organização das Nações Unidas

    OS’s- Organizações Sociais

    PGE- Procuradoria Geral do Estado

    PIB- Produto Interno Bruto

    SUS- Sistema Único de Saúde

    US- Unidade de Serviço

    UTI- Unidades de Tratamento Intensivo

    SESAP- Secretaria de Estado da Saúde Pública

    SMS- Secretária Municipal de Saúde

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    SUMÁRIO

    1-INTRODUÇÃO ..................................................................,................................... 12

    2-A POLÍTICA DE SAÚDE NO CONTEXTO DOS DIREITOS SOCIAIS ................ 14

    2.1- MARCAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA POLÍTICA DE SAÚDE ...........,...... 17

    2.2- O SUS: CONQUISTAS E DESAFIOS..................................................... 24

    2.3- A ORGANIZAÇÃO DA SAÚDE NO MUNICÍPIO DE NATAL/RN ........... 30

    3- A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RN: A JUDICILIZAÇÃO DA

    SAÚDE OFICIALIZADA .......................................................................................... 35

    3.1- O SUS MEDIADO: OS LIMITES DAS PACTUAÇÕES........................... 40

    4-DESAFIOS À CONSTITUIÇÃO DO DIREITO: OS LIMITES DO SUS NA

    SOCIABILIDADE CAPITALISTA ............................................................................ 46

    5- CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 51

    6- REFERÊNCIAS .................................................................................................... 54

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    1. INTRODUÇÃO

    São inegáveis os avanços adquiridos ao longo dos anos no que diz

    respeito à criação e ampliação dos direitos fundamentais, porém sua

    operacionalização tem necessitado além de muitas lutas sociais, a busca pelo poder

    judiciário para a resolução da inoperância das políticas públicas.

    Os fatores históricos e sociais revelam que ao longo dos anos, o Estado

    vem formulando estratégias para responder os anseios e as necessidades sociais de

    forma seletiva, descentralizada e ineficiente. Ou seja, o Estado durante toda a

    história não criou medidas capazes de enfrentar os problemas advindos da questão

    social. Tão somente criou paliativos para as demandas mais urgentes da sociedade.

    Na contemporaneidade não tem sido diferente, a história volta a se

    reproduzir com uma nova roupagem. O Estado, no Brasil, continua a responder as

    demandas sociais de forma individual, focalizada e superficial, mesmo contando com

    um arcabouço de direitos constitucionais expressos e normatizados na CF 1988.

    Sabe-se que ao longo da história brasileira houve avanços significativos no que diz

    respeito aos direitos e garantias fundamentais, os quais foram expressamente

    consagrados na norma maior do país. Porém, o Estado permanece se posicionando

    diante dessas mudanças, políticas e sociais, de uma forma desapontadora, uma vez

    que continuamente se nega em cumprir com os deveres firmados com a sociedade

    na Constituição da República.

    Diante desse fato, evidencia-se um fenômeno contemporâneo, que se

    intitula como judicialização do direito a saúde. Essa tendência significa que as

    questões referentes ao acesso aos serviços de saúde, estão sendo decididas por

    órgãos do Poder Judiciário, e não pelas instâncias políticas tradicionais: o Poder

    legislativo e o Poder Executivo, ou seja, a judicialização envolve uma transferência

    de poder para juízes e tribunais. O que resulta a expansão do Judiciário no processo

    decisório das democracias contemporâneas, isto significa dizer que a instância

    jurídica está de modo cada vez mais intensivo se alargado na sociabilidade

    capitalista, devido a omissão do Poder Executivo e dos entes federativos na

    elaboração de políticas públicas eficazes que viabilize o acesso aos direitos

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    fundamentais, em especial o acesso à saúde, que são imprescindíveis para

    manutenção da vida humana.

    Sabe-se que a saúde é um direito fundamental de todos e dever do

    Estado, cabendo a ele prestar à população; a promoção, proteção e recuperação da

    saúde, expressamente trazido na Constituição Federal de 1988. Diante da ineficácia

    do Estado na prestação de políticas públicas de saúde, o cidadão invoca o auxílio do

    Poder Judiciário para garantir a prestatividade de serviços relacionados à saúde.

    A importância desse tema se efetiva a partir das análises feitas sob a

    realidade vivenciada no estágio realizado na Defensoria Pública do Estado no

    período de junho de 2013 a julho de 2014. Tornou-se notório o crescimento da

    procura desta instituição por parte da população para ingressar na justiça em busca

    da concretização de direitos, os quais já são normatizados em lei. Todavia não são

    efetivados pelo poder público, e dessa forma obriga-os a procurar alternativas para

    que se tenha o acesso aos serviços básicos.

    A Defensoria Pública tem um programa específico para atender

    demandas referente a saúde, que se denomina O SUS MEDIADO e, foi a partir do

    citado projeto que foram extraídos os dados da pesquisa e subsequentemente

    analisados para elaboração da atual discussão. A pesquisa vale-se do método

    indutivo, isto significa dizer que foi a partir do levantamento particular realizado no

    programa supracitado, que se chegou a determinadas conclusões gerais. Além do

    mais, foi utilizada a pesquisa bibliográfica para aprimorar a discussão.

    Espera-se, sem pretensão de se esgotar o assunto, debater essa

    realidade que tem se apresentando de forma crescente e nova, impactando o

    caráter das políticas públicas, evidenciando a transferência de poder político para o

    Judiciário, encarregando essa instância de suprir a ausência das instâncias

    administrativas.

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    2. A POLÍTICA DE SAÚDE NO CONTEXTO DOS DIREITOS SOCIAIS

    São inquestionáveis os avanços políticos e sociais adquiridos ao longo

    dos anos pela sociedade, fruto de intensas lutas, resultando conquistas expressivas

    no campo dos direitos sociais. Vale mencionar que o reconhecimento e a proteção

    dos direitos fundamentais do homem, foram alcançados gradativamente passando

    por uma série de evoluções até alcançar o estágio atual, isto significa dizer que não

    surgiram simultaneamente, mas aos poucos, em resposta a demanda de cada

    época. Lembra bem Bobbio ao ponderar (1992, p. 5) que:

    Do ponto de vista teórico [...], os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas.

    Na concepção de Noberto Bobbio os direitos humanos se afirmaram

    historicamente em quatro gerações: 1ª Geração: Direitos Individuais – pressupõem a

    igualdade formal perante a lei e consideram o sujeito abstratamente, configurando

    os direitos civis e políticos, exemplo direito à vida, à liberdade, à propriedade, à

    liberdade de expressão, à liberdade de religião, à participação política; 2ª Geração:

    Direitos Coletivos – os direitos sociais, nos quais o sujeito de direito é visto no

    contexto social, ou seja, analisado em uma situação concreta; 3ª Geração: Direitos

    dos Povos ou os Direitos de Solidariedade: os direitos transindividuais, também

    chamados direitos coletivos e difusos, e que basicamente compreendem os direitos

    do consumidor e os relacionados à questão ecológica; 4ª Geração: Direitos de

    Manipulação Genética– relacionados à biotecnologia e bioengenharia, tratam de

    questões sobre a vida e a morte e requerem uma discussão ética prévia (BOBBIO,

    1992).

    Com base nesse posicionamento, da constituição do direito a partir de

    determinados momentos históricos, percebe-se que o direito de segunda geração foi

    marcado pela luta da classe trabalhadora na defesa dos direitos básicos. Tratando-

    se, portanto de direitos sociais positivos, o qual se exige do Estado à prestação de

    políticas públicas, impondo a ele uma obrigação de fazer, efetivando o direito à

    saúde, educação, trabalho, habitação, previdência social, assistência social, entre

    outros.

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    A respeito dos direitos sociais pode-se afirmar que foram tardiamente

    reconhecidos pelo Estado brasileiro. Trazidos no ordenamento jurídico brasileiro

    apenas em 1988. A Organização das Nações Unidas (ONU) em 1948 reconheceu

    os direitos sociais na Declaração Universal dos Direitos Humanos, em conjunto com

    os direitos civis e os direitos políticos. Porém, no Brasil, apenas com a promulgação

    da Constituição de 1988, que se estabeleceu um conjunto de direitos sociais

    inerentes ao cidadão nos campos da educação, saúde, assistência social, trabalho e

    previdência social. Os direitos fundamentais de cunho social estão explícitos em seu

    artigo 6º, da seguinte forma:

    São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (BRASIL, 1988).

    É importante apresentar uma conceituação desse termo, e o

    constitucionalista JOSÉ AFONSO DA SILVA explica bem ao definir que os direitos

    sociais:

    São prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações desiguais. Dessa forma, possibilita ao indivíduo exigir do Estado prestações positivas e materiais para a garantia de cumprimento desses direitos (SILVA, 2010, p.286).

    Como foi dito anteriormente, no Brasil, o marco da legitimação dos

    direitos fundamentais sociais foi a promulgação da Constituição Federal de 1988, a

    qual instituiu o Estado Democrático de Direito1, destinado a assegurar o exercício

    dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o

    desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade

    fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida,

    na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias

    (Preâmbulo da Constituição de 1988).

    Porém, uma década posterior, à promulgação da Carta Magna, a

    conjuntura econômica e política do Estado brasileiro foi marcado pelo advento do

    neoliberalismo. Essa ideologia político-econômica causou um retardamento na

    implantação e desenvolvimento de alguns direitos consagrados na Lei Maior.

    1 Esse processo se deu após ampla mobilização de forças democráticas em resistência a 21 anos de ditadura militar.

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    Hoje se vive em tempo de negação de direitos, de contrarreforma do

    Estado, em que o país se insere na dinâmica do capitalismo contemporâneo,

    marcada pela busca da hegemonia do capital por meio da reestruturação produtiva e

    da mundialização, pela desregulamentação dos mercados, pela redução do deficit

    fiscal e do gasto público, por uma política de privatização, pela capitalização da

    dívida e um maior espaço para o capital internacional, isto significa dizer que o

    neoliberalismo vai à contramão dos avanços constitucionais adquiridos em 1988

    (BEHRING, 2003).

    Diante esse cenário político neoliberal, instaurou-se um caos social na

    sociedade brasileira, uma vez que o Estado se omite a garantir o acesso e a

    concretização dos direitos fundamentais inaugurados na CF, em especial no que se

    diz respeito ao direito a saúde pública, de qualidade e universal. Perante essa

    situação, tem se apresentado como uma alternativa, a população brasileira, a busca

    pelo poder coercitivo do Judiciário, já que as vias judiciais tem se posto como uma

    opção eficaz, trazendo respostas às demandas essenciais.

    Deste modo, o fenômeno da judicialização da saúde pública, ou seja, a

    necessidade de instauração de procedimentos na esfera jurídica com o objetivo de

    ter acesso aos benefícios e/ou atendimento no Sistema Único de Saúde, vem

    crescendo significativamente nos últimos anos. Avalia-se que a judicialização da

    questão social tem grande visibilidade na sociabilidade capitalista vigente, tornando

    inclusive uma estratégia do neoliberalismo no que diz respeito ao acesso às políticas

    públicas.

    Para melhor compreender as facetas desse fenômeno que se apresenta,

    é imprescindível conhecermos a história da política de saúde, suas particularidades

    e avanços, até chegar à situação atual que se encontra a saúde brasileira, em

    específico a saúde do município de Natal/RN. Assim sendo, esse capítulo trará a

    discussão do surgimento das primeiras medidas protecionistas que o Estado

    desenvolveu para a sociedade, até chegar na conjuntura atual, em que os cidadãos

    buscam a esfera judiciária para compelir o Estado de cumprir com seus deveres e

    obrigações, os quais deveriam ser contemplados nas políticas públicas formuladas,

    planejadas e executadas pelo governo.

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    2.1 MARCAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA POLÍTICA DE SAÚDE

    Sabe-se que a saúde nunca ocupou lugar central dentro da política do

    estado brasileiro, e a evolução histórica das políticas sociais está relacionada

    diretamente com a evolução político-social e econômica da sociedade brasileira.

    Esse processo evolutivo obedeceu aos avanços do capitalismo.

    Sendo assim, é importante saber que sempre existiu algum tipo de

    proteção social entre os homens, desde primórdios essas atividades defensivas

    eram exercidas por determinados segmentos, são exemplo: a família, a igreja (ações

    que se vinculavam a obra cristã) e até mesmo casas de caridade sociais. Essas

    ações eram voltadas a determinados grupos ou indivíduos que não tinham o mínimo

    para sobrevivência e manutenção da vida.

    No Brasil, ao longo da história, a filantropia e assistência social estiveram

    associadas intimamente à prática de caridade, ou seja, dependiam de iniciativas

    voluntárias e isoladas de auxílio aos pobres e desvalidos. Os problemas sociais

    eram mascarados sob a forma de fatos isolados, a pobreza era tratada como

    disfunção pessoal dos indivíduos (DAMASIO, 2009). No século XVIII, a assistência

    médica era pautada na filantropia e na prática liberal. No século XIX, em decorrência

    das transformações econômicas e políticas, algumas iniciativas surgiram no campo

    da saúde pública e já nos últimos anos do século, a questão saúde surge como

    reivindicação do movimento operário (BRAVO, 2001).

    Antes do reconhecimento da questão social como o conjunto das

    expressões das desigualdades da sociedade, não se existia a formulação de

    políticas sociais que beneficiasse de forma universal e gratuita a população, existia

    um conjunto de medidas coercitivas que controlava as classes subalternas. Porém,

    com o avanço do processo de urbanização e industrialização intensificou-se o

    empobrecimento da classe trabalhadora e a pauperização das condições de trabalho

    da classe operária, desta forma a sociedade burguesa sentindo-se ameaçada pela

    insatisfação dessa classe, como meio de enfrentamento recorreu à implementação

    de políticas sociais. Conforme a concepção de Iamamoto a questão social pode ser

    definida como:

    O conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a

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    apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da sociedade (IAMAMOTO, 1999, p. 27).

    A atenção à saúde com responsabilidade do Estado emerge como

    expressão da Questão Social no Brasil no início do século XX. Esse século surge

    como desafiador para a população, como sendo a época das transformações

    econômicas, políticas e sociais decorrentes dos processos de trabalho e de

    produção; no qual recai sobre o homem/indivíduo, toda responsabilidade para

    manter uma boa qualidade de vida. Mesmo dispondo de um aparato tecnológico

    sofisticado, a saúde se materializa como precária o seu acesso, visto que neste

    processo de desenvolvimento social, a saúde não é só dispor de condições

    psicológicas, físicas e naturais do corpo. Mas, vai muito além do que isso. É

    necessário dispor de condições dignas e qualidade de vida.

    A partir do século XX, o Estado passou a intervir na proteção social e,

    percebeu-se então que essa ganhou mais importância e visibilidade, sendo o Estado

    por direito o principal garantidor da proteção social e tendo recursos destinados para

    o financiamento dessas, devendo amparar os cidadãos em diversas situações, entre

    essas a velhice, desemprego, doença e fome. Porém, todo direito concedido pelo

    Estado sempre foi ligado à relação capital e trabalho, sobretudo se fazendo notório

    nas implicações da exploração da força de trabalho, que se expressa nas precárias

    condições de vida da população subalternizada.

    No que diz respeito à constituição da Seguridade como política pública na

    sociedade brasileira, é válido destacar os sistemas de socorros mútuos e a criação

    das Caixas de Aposentadoria e Pensões (CAPs), em 1923, conhecida como Lei Elói

    Chaves, a qual se torna o grande marco da previdência social, que estabeleceu a

    primeira caixa de aposentadoria e pensão, de início para todos os ferroviários do

    país e depois para outras categorias profissionais, beneficiando com aposentadoria

    por invalidez, por tempo de serviço, pensão por morte para os dependentes e

    assistência médica.

    Nos anos de 1989 a 1930:

    Foram criados e implementados os serviços e programas de saúde pública em nível nacional (central). À frente da diretoria Geral de Saúde Pública, Oswaldo Cruz, ex-aluno e pesquisador do Instituto Pasteur, organizou e implementou progressivamente, instituições públicas de higiene e saúde no Brasil. Em paralelo, adotou o modelo das 'campanhas sanitárias', destinado a combater as epidemias urbanas e, mais tarde, as endemias rurais. (...) Em termos de poder, o próprio nome sugere que o modelo campanhista é de

  • 20

    inspiração bélica, concentra fortemente as decisões, em geral tecnocráticas, e adota um estilo repressivo de intervenção médica nos corpos individual e social (LUZ, 1991, p.78).

    Durante esses anos a saúde era centrada na prática liberal, as

    instituições tinham um cunho caritativo e filantrópico, destinadas aos pobres e

    indigentes, exemplo dessas práticas eram as campanhas sanitárias para higienizar

    as áreas urbanas das epidemias. A assistência médica era destinada a quem

    trabalhava e consequentemente contribuía, ou seja, a proteção era apenas para os

    que se encontravam no mercado de trabalho. Esse era um tipo de acesso à

    seguridade social que se dava pela via do trabalho e, no Brasil chegava a ser uma

    minoria que tinha acesso a esses benefícios. As ações governamentais até meados

    do século XX estiveram ou voltadas para atender demandas pontuais, procurando

    incorporar os problemas de saúde que atingiam determinados grupos sociais, ou

    foram voltadas àqueles que contribuíam com a previdência social.

    Em 1930 ascende ao Governo o Presidente Getúlio Vargas com a

    “Revolução de 30” e marcará a era de desenvolvimento industrial no Brasil. Neste

    momento, o Estado estendeu a todas as categorias do operário urbano organizado

    os benefícios da previdência, sendo as CAPs substituídas pelos Institutos de

    Aposentadoria e Pensões (IAPs). Com a ampliação das caixas e interesses por

    parte do Estado com o montante de dinheiro gerada pelas caixas, esse passou a

    administrar os IAP’s. Apesar de significar um avanço para o Brasil, vale salientar que

    esses benefícios continuavam restritos para as categorias profissionais e seus

    dependentes. Ou seja,

    A medicina previdenciária, que surgiu na década de 30, com a criação dos Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs), pretendeu estender para um número maior de categorias de assalariados urbanos os seus benefícios como forma de “antecipar” as reivindicações destas categorias e não proceder uma cobertura mais ampla (BRAVO, 2001, p. 5).

    A década de 1930 foi significativa na configuração de políticas sociais no

    Brasil, estabelecendo um arcabouço jurídico e material que conformaria o sistema

    de proteção social até um período recente (CONASS, 2011).

  • 21

    A constituição de 19462 teve o importante papel de redemocratizar o

    Brasil e, dentre as principais mudanças, destaca-se que os direitos fundamentais

    passam a ter a proteção oficial pelo Estado.

    Os marcos institucionais desse período foram:

    1. Criação do Ministério da Saúde, em 1953, velha aspiração dos médicos da saúde pública;

    2. Reorganização dos serviços nacionais no Departamento Nacional de Endemias Rurais (DNERu), em 1956;

    3. Implementação da campanha nacional contra a lepra e das campanhas de controle e erradicação de doenças, como a malária, de 1958 a 1964;

    4. Realização da 3ª Conferência Nacional de Saúde, em 1963.

    No período de 1945 a 19643 houve melhorias nas condições sanitárias no

    setor público. No entanto, o setor privado cresceu e se organizou nesse momento

    pressionando o financiamento através do Estado, defendendo a privatização da

    saúde. Apesar dessas pressões, a assistência médica previdenciária até 1964, era

    fornecida basicamente pelos serviços próprios dos Institutos (BRAVO, 2001).

    A partir de 1964 o Brasil entrou no período mais conturbado da história,

    representou um retrocesso político e social para os brasileiros, momento de

    supressão de direitos e garantias, afetando profundamente a saúde pública e a

    medicina previdenciária. Em 1966 foi estabelecida a unificação do IAPs no Instituto

    Nacional de Previdência Social (INPS), o qual concentrava todas as contribuições

    previdenciárias.

    A saúde pública nesse período foi marcada pela prática médica curativa,

    assistencialista, individual com ações voltadas a saúde coletiva. Além de privilegiar

    uma prática médica curativa, em detrimento de medidas de ações preventivas de

    interesse coletivo, a política de saúde acabou por propiciar um processo

    2 A constituição de 1946 é conquista da derrubada da ditadura de Getúlio Vargas, instaurada em 1937 e que durou até 1945. 3 Em 1945, a queda de Getúlio Vargas foi seguida pela reestruturação do regime democrático no Brasil, pondo fim à Era Vargas. Em dezembro de 1945, o Marechal Eurico Gaspar Dutra venceu as eleições para presidente. Em 1950, Getúlio Vargas vence as eleições. Juscelino Kubitschek foi eleito presidente nas eleições de 1955, assumindo em 1956 até 1961, quando passou o cargo para Jânio Quadros que governou 206 dias até renunciar o cargo, o vice-presidente João Goulart, conhecido como Jango, assumiu após uma rápida crise política: os militares não queriam aceitá-lo na presidência, alegando ser comunista, porém, em 1963, João Goulart recuperou a chefia de governo com o plebiscito que aprovou a volta do presidencialismo. No entanto em 31 de março de 1964, o movimento militar eclodiu em Belo Horizonte e espalhou-se rapidamente por todo o Brasil, praticamente sem reação da esquerda, o golpe militar encerrou o governo do presidente democraticamente eleito João Goulart.

  • 22

    incontrolável, por parte dos setores privados, que, na busca do superfaturamento,

    multiplicavam e desdobravam os atos médicos, optavam por internações mais caras,

    enfatizavam procedimentos cirúrgicos desnecessários, alem de utilizar pouco

    pessoal técnico e equipamentos antigos, entre outros expedientes (CORDEIRO,

    2004).

    Faltavam recursos para o investimento no público, enquanto o setor

    privado crescia graças ao financiamento do Estado com recursos advindos da

    Previdência Social.

    Na década de 1970, a assistência médica financiada pela Previdência Social conheceu seu período de maior expansão em número de leitos disponíveis, em cobertura e em volume de recursos arrecadados, além de dispor do maior orçamento de sua história. Entretanto, os serviços médicos prestados pelas empresas privadas aos previdenciários eram pagos por Unidade de Serviço (US) e essa forma de pagamento tornou-se uma fonte incontrolável de corrupção (CONASS, 2011, p.17).

    Portanto, com a privatização da esfera pública prevalece a lógica do lucro

    e da capitalização, o modelo de assistência médica voltado para a alta tecnologia,

    de caráter individual e curativo. Diante dessa conjuntura intensificam-se as críticas

    ao modelo de saúde vigente, movimentos populares e de profissionais da área.

    A década de 1980 inicia-se com um movimento cada vez mais forte de

    reivindicação do modelo de saúde vigente, os movimentos demandavam a

    democratização do sistema, a participação popular, à universalização dos serviços,

    à defesa do caráter público do sistema de saúde à descentralização. Foi nesse

    contexto que se originou o Conselho Consultivo de Administração da Saúde

    Previdenciária (CONASP), o qual deveria atuar como organizador e racionalizador

    da assistência médica, tendo como prioridade as ações primárias, com ênfase na

    assistência ambulatorial e integração dos três níveis, e no sistema regionalizado e

    hierarquizado. Dentro do CONASP surgiram as Ações Integradas de Saúde (AIS),

    que acarretaram avanços significativos (CONASS, 2011).

    Em 1985 no Brasil dá-se o processo de redemocratização após 21 anos

    de ditadura militar (1964/1985), período marcado pela opressão, censura,

    perseguição política, supressão dos direitos constitucionais e principalmente pela

    falta de democracia.

  • 23

    Um importante fato desta década foi a 8ª Conferência de Saúde4, com o

    tema Democracia é Saúde, a qual influenciou e impulsionou a constitucionalização e

    a universalização do direito a saúde, marcando um momento importante no

    processo de concepção da constituição cidadã nos anos 1980, a qual marcou o

    início do restabelecimento dos princípios democráticos no país, representando um

    avanço nas conquistas pelos direitos e garantias fundamentais, sejam eles

    individuais, coletivos, sociais ou políticos. Sendo resultado das reivindicações da

    população nas ruas, nos fóruns sociais realizado pelo movimento Sanitário, o fruto

    de toda esta luta pela saúde pública foi à proposta dos fundamentos do Sistema de

    Saúde Único (SUS), no qual está contido o legado do conceito de saúde ampliada:

    A principal proposta da Reforma Sanitária é a defesa da universalização das políticas sociais e a garantia dos direitos sociais. Nessa direção, ressalta-se a concepção ampliada de saúde, considerada como melhores condições de vida e de trabalho, ou seja, com ênfase nos determinantes sociais; a nova organização do sistema de saúde por meio da construção do SUS, em consonância com os princípios da intersetorialidade, integralidade, descentralização, universalização, participação social e redefinição dos papéis institucionais das unidades políticas (União, Estado, municípios, territórios) na prestação dos serviços de saúde; e efetivo financiamento do Estado (CFESS, p.19 2010).

    Segundo Bravo (2014, p. 8):

    A saúde, nessa década, contou com a participação de novos sujeitos sociais na discussão das condições de vida da população brasileira e das propostas governamentais apresentadas para o setor, contribuindo para um amplo debate que permeou a sociedade civil. Saúde deixou de ser interesse apenas dos técnicos para assumir uma dimensão política, estando estreitamente vinculada à democracia.

    Nessa conjuntura de concepção da Constituição cidadã inaugurou-se um

    novo sistema de proteção social pautado na concepção de Seguridade Social que

    universaliza os direitos sociais concebendo a Saúde, Assistência Social e

    Previdência como questão pública, de responsabilidade do Estado. É a partir dessa

    década que veremos a abordagem da universalização dos direitos e sobre o

    significado da seguridade social:

    Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social (BRASIL, 1988).

    4 8ª Conferencia Nacional de Saúde realizada entre 17 a 21 de março de 1986 em Brasília - Distrito Federal. O temário central versou sobre: I A Saúde como direito inerente a personalidade e à cidadania; II Reformulação do Sistema Nacional de Saúde, III Financiamento setorial.

  • 24

    Isto significar dizer que a partir dessa década os debates e embates de

    milhares de cidadãos ganharam uma força maior, pois suas discussões e propostas

    foram normatizadas no ordenamento jurídico brasileiro, significando que a partir

    daquele momento que os cidadãos brasileiros podiam exigir do Estado a efetivação

    e a tutela de seus direitos, que estavam garantidos explicitamente na Constituição.

    Em contrapartida, ao normatizar os direitos sociais o Estado assumiu o

    dever de prestar atendimento por meio de políticas sociais que garantissem o

    acesso gratuito, universal, laico e de qualidade aos bens essenciais e necessários

    da população, que são eles: saúde, educação, lazer, segurança, habitação e

    assistência social.

    Porém, em 1990 ascende o neoliberalismo no Brasil, atacando o caráter

    público das políticas sociais, pois essas deviam ser garantidas pelo Estado para

    diminuir as desigualdades sociais e amenizar os efeitos da acumulação capitalista.

    Porém, o Estado se omite em atender as demandas da classe trabalhadora e

    fortalece a defesa dos interesses do mercado. Os serviços apresentam-se como

    mercadorias pela via de privatização. Foi a partir da década de 1990 que:

    [...] instalou ‑ se uma forte tendência neoliberal de desmonte e contrarreformas do Estado, fazendo com que as políticas não fossem capazes de atender às demandas societárias e aos quesitos de proteção de direitos sociais determinados pela Constituição. Tampouco o movimento social e os sindicatos, centrais sindicais e entidades representativas dos trabalhadores tiveram força suficiente para fazer valer esses direitos para amplas parcelas da população brasileira (BORGIANNI, 2013, p. 426).

    Com isso, a defesa do papel do Estado na saúde para o atendimento dos

    segmentos mais pobres da população tem sido fortalecida, pois com a pressão do

    desfinanciamento, a universalização está longe de ser alcançada. Considera-se que

    a proposição de políticas focalizadas é a “anti-política” social, na medida em que

    permite a “inclusão” não por direito de cidadania, mas por grau de pobreza, não

    garantindo a base de igualdade necessária a uma verdadeira política social

    (SOARES, 2004).

    O caráter conservador do projeto neoliberal se expressa, de um lado, na naturalização do ordenamento capitalista e das desigualdades sociais a ele inerentes tidas como inevitáveis, obscurecendo a presença viva dos sujeitos sociais coletivos e suas lutas na construção da história; e, de outro lado, em um retrocesso histórico condensado no desmonte das conquistas sociais acumuladas, resultantes de embates históricos das classes trabalhadoras, consubstanciadas nos direitos sociais universais de cidadania, que têm no Estado uma mediação fundamental. As conquistas sociais acumuladas são transformadas em ‘problemas ou dificuldades’, causa de ‘gastos sociais

  • 25

    excedentes’, que se encontrariam na raiz da crise fiscal dos Estados (IAMAMOTO, p. 02-03).

    Ao observar os fatores históricos mencionados entendem-se os motivos

    das políticas públicas atuais possuírem uma baixa eficiência, um caráter clientelista,

    paternalista e não universalizante. Durante a maior parte da história viu-se políticas

    de saúde seletivas, centralizadas, ineficientes e contributivas, ou seja, a saúde

    brasileira passou por um longo processo de desenvolvimento, até ser reconhecida

    como um direito de todos, garantido pelo Estado de forma gratuita (BRAVO, 2004).

    2.2- O SUS: CONQUISTAS E DESAFIOS.

    É inquestionável que a saúde é um direito fundamental de todos e dever

    do Estado, cabendo a ele prestar à população: a promoção, proteção e recuperação

    da saúde, visto que está expressa na Constituição Federal de 1988.

    É o que estabelece expressamente o art. 196 da Lei Magna de 1988:

    A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

    Foi a partir da difusão e ampliação desse debate, que se colocou a saúde

    na pauta política, e assim aprovou-se o Sistema Único de Saúde. A implantação

    desse projeto iniciou-se nos anos 1990 após ampla mobilização social. Tem como

    grande marco normativo a Lei Orgânica da Saúde (lei nº 8.080/90) que dispõe sobre

    as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o

    funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. De acordo,

    com essa lei, o SUS é definido pelo artigo 4º como “O conjunto de ações e serviços

    de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e

    municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder

    Público, constitui o SUS” (BRASIL, 1990).

    O SUS tem como características principais: a universalidade, a

    integralidade, a regionalização e hierarquização, a equidade, a descentralização e a

    participação popular, além do mais, deve ser eficaz, eficiente e democrático.

    Seguindo os princípios trazidos na Lei n. 8.080, no Art. 7º que diz:

    As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:

  • 26

    I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência;

    II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema;

    III - preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral;

    IV - igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie;

    V - direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde;

    VI - divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e a sua utilização pelo usuário;

    VII - utilização da epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a alocação de recursos e a orientação programática;

    VIII - participação da comunidade;

    IX - descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo:

    a) ênfase na descentralização dos serviços para os municípios;

    b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde;

    X - integração em nível executivo das ações de saúde, meio ambiente e saneamento básico;

    XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação de serviços de assistência à saúde da população;

    XII - capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de assistência; e

    XIII - organização dos serviços públicos de modo a evitar duplicidade de meios para fins idênticos. (BRASIL, 1990)

    Ao analisar esses princípios que norteiam o SUS, verifica-se que cada um

    está intrinsecamente ligado ao outro, pois a proposta desse Sistema Único é

    universalizar o acesso às ações e serviços de saúde, garantido esse direito a todas

    as pessoas, sem distinção de qualquer característica, incluindo a promoção da

    saúde, a prevenção de doenças, o tratamento e a reabilitação. Além disso, deve

    articular a política de saúde com outras políticas públicas, para assegurar uma

    atuação intersetorial entre as diferentes áreas que tenham repercussão na saúde e

    qualidade de vida dos indivíduos. O poder e a responsabilidade entre os três níveis

    de governo de ser distribuído, hierarquizando o sistema público de saúde em três

    níveis: baixa (unidades básicas de saúde), média (hospitais secundários e

    ambulatórios de especialidades) e alta complexidade (hospitais terciários).

    O princípio da hierarquização é consagrado como basilar para sua

    operacionalização, este princípio refere-se a possibilidade de organizar as unidades

  • 27

    conforme o grau de complexidade dos serviços, ou seja, o a construção de uma rede

    que articula as unidades mais simples às unidades mais complexas. Conforme

    disciplina o Art. 8º da lei 8.080/1990:

    Art. 8º As ações e serviços de saúde, executados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), seja diretamente ou mediante participação complementar da iniciativa privada, serão organizados de forma regionalizada e hierarquizada em níveis de complexidade crescente.

    O SUS utiliza-se da política de promoção da saúde como estratégia,

    articulando assim, diversas outras políticas para consolidação do seu projeto.

    Pensar num projeto de saúde ampliada é pensar em que condições estes sujeitos se

    encontram na sociedade, como vivem o que lhes são dados enquanto homens e

    mulheres sujeitos de direitos e deveres sociais. Os objetivos do Sistema Único de

    Saúde, são especificados no Art. 5º da lei 8.080/90:

    São objetivos do Sistema Único de Saúde SUS:

    I - a identificação e divulgação dos fatores condicionantes e determinantes da saúde;

    II - a formulação de política de saúde destinada a promover, nos campos econômico e social, a observância do disposto no § 1º do art. 2º desta lei;

    III - a assistência às pessoas por intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, com a realização integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas. (BRASIL, 1990)

    É inegável que a sociedade vem passando por transformações e junto

    com elas surgem diariamente novas necessidades, fazendo com que a saúde

    também alcance novos desafios, e um dos maiores desafios a ser superado é a

    implementação de uma política de saúde voltada para população, que de fato

    reverta índices que vão da defasagem do saneamento básico à serviços de saúde

    de alta complexidade:

    O pleno exercício desse direito, entretanto, exige a superação das barreiras econômicas, sociais e culturais que ainda se interpõem entre os usuários e o sistema de serviços de saúde. Do ponto de vista econômico, ainda que a população não precise pagar diretamente pelos serviços (o financiamento é assegurado pelo Estado, mediante a utilização de fundos públicos), não se pode negar que a enorme parcela da população pobre, que vive em pequenos municípios com baixo grau de desenvolvimento econômico ou habitam a periferia das grandes cidades, não dispõem de condições mínimas de acesso aos serviços, às vezes até porque não tem como pagar o transporte necessário para chegar a uma unidade de saúde. Por outro lado, o Estado precisa dispor de um volume de recursos financeiros capaz de ser investido na ampliação da infra-estrutura do sistema, isto é, na construção e reforma de unidades de saúde, na compra de equipamentos e insumos, na contratação e pagamento de pessoal qualificado a trabalhar na produção de ações e serviços de saúde de distintas naturezas e graus de complexidade (TEIXEIRA, p.4)

  • 28

    No entanto, o que se observa é um sistema de saúde precário e

    ineficiente, que obriga uma parte da população a procurar a saúde privada por meio

    de planos de saúde, os quais também não atendem os anseios e necessidades da

    população, obedecendo a lógica capitalista. Enquanto a população carente e

    vulnerável que não pode se enquadrar nessa nova realidade, fica a mercê das

    deficiências e das crises do sistema público de saúde.

    A capitalização da saúde é outro fenômeno que vem crescendo e se

    expandindo por todo Brasil, porém não será analisado no presente trabalho. Vale

    mencionar o posicionamento de Vera Telles a respeito da mercantilização dos

    direitos:

    A destituição dos direitos – no caso brasileiro, a recusa de direitos que nem mesmo chegaram a se efetivar – significa também a erosão das mediações políticas entre o mundo social e as esferas públicas, de tal modo que estas se descaracterizam como esferas de explicitação de conflitos e dissenso, de representação e negociação; é por via dessa destituição e dessa erosão, dos direitos e das esferas de representação, que se ergue esse consenso que parece hoje quase inabalável, de que o mercado é o único e exclusivo princípio estruturador da sociedade e da política, que diante de seus imperativos não há nada a fazer a não ser a administração técnica de suas exigências, que a sociedade deve a ele se ajustar e que os indivíduos, agora desvencilhados das proteções tutelares dos direitos, podem finalmente provar suas energias e capacidades empreendedoras (TELLES, 1998, p.42).

    A tabela a seguir demonstra essa realidade do crescimento de planos de

    saúde privados.

  • 29

    Tabela 2- Beneficiários de planos privados de saúde, por cobertura assistencial (Brasil -

    2003-2014)

    Ano

    Beneficiários em planos privados de assistência

    médica com ou sem odontologia

    Beneficiários em planos privados

    exclusivamente odontológicos

    Dez/2003 32.074.667 4.325.568

    Dez/2004 33.840.716 5.312.915

    Dez/2005 35.441.349 6.204.404

    Dez/2006 37.248.388 7.349.643

    Dez/2007 39.316.313 9.164.386

    Dez/2008 41.468.019 11.061.362

    Dez/2009 42.706.147 13.280.371

    Dez/2010 45.175.151 14.545.246

    Dez/2011 46.517.113 17.003.648

    Dez/2012 48.278.725 19.169.961

    Dez/2013 50.464.395 20.643.993

    Jun/2014 50.930.043 21.078.384

    Fonte: Sistema de Informações de Beneficiários/ANS/MS - 06/2014

    Frisa bem Natalia Cuminale em seu artigo publicado no portal da revista

    Veja:

    O Sistema Único de Saúde tinha um objetivo claro: universalizar o atendimento aos brasileiros, que, em troca, pagam altos impostos. Como é de conhecimento público, não foi isso o que aconteceu. Passados 22 anos, usuários enfrentam filas e esperam meses e até anos para conseguir realizar uma cirurgia eletiva - os procedimentos não emergenciais. Seria ainda pior se parte da população - 26,3% - não tivesse abandonado o SUS,

  • 30

    pagando um valor extra por planos privados de saúde (Artigo publicado no portal da Veja em 26.08. 2008).

    A crise atual do SUS é ocasionada por uma série de fatores de ordem

    social, político e econômico. O orçamento nacional mostra claramente onde estão as

    prioridades para a destinação dos recursos públicos. O orçamento para 2014 aponta

    uma previsão de gasto de 4,11% do Produto Interno Bruto (PIB) na área da saúde

    no Brasil, enquanto mais de 40% é gasto para pagar a dívida externa, percebe-se

    uma discrepância de prioridades de investimentos do governo. Esse endividamento

    do país tem custos sociais, revelando-se por meio das estatísticas de desemprego,

    falta de moradia, redução nos investimentos da educação, saúde, saneamento. É

    notório que o percentual destinado a saúde não é suficiente para atender as

    necessidades do SUS. Segue abaixo o demonstrativo do orçamento da União para

    2014, confirmando o baixo percentual destinado a saúde.

    Figura 2: Orçamento Geral da União (Previsto para 2014)- Total = 2,383 trilhões

    Fonte: Gráfico extraído do site da Auditoria Cidadã da Dívida.

    Essa situação de insuficiência dos recursos e ineficiência dos serviços

    são problemas de caráter geral que atinge brutalmente os estados da federação

  • 31

    brasileira, o estado do Rio Grande do Norte (RN) não fica fora dessa realidade

    caótica da saúde. No tópico seguinte enfatizaremos a situação da Capital do RN.

    2.3- A ORGANIZAÇÃO DA SAÚDE NO MUNICÍPIO DE NATAL/RN

    A organização do sistema de saúde em Natal é determinada por um

    modelo de atenção, que são duas: a básica e a especializada em média e alta

    complexidade, tanto ambulatorial, quanto hospitalar. Em Natal a prioridade nos

    serviços é dada pelo eixo da Estratégia Saúde da Família - ESF; atendendo a

    pessoa em sua singularidade, de sua família e toda comunidade a sua volta. No

    município de Natal é através da rede básica que há o primeiro contato e do

    acolhimento da população pela equipe de saúde, que possibilita a promoção da

    saúde e prevenção de doenças e questões sanitárias, já que essa equipe tem a

    oportunidade de acompanhar de perto a realidade de seus usuários.

    Segundo a portaria GM/MS nº. 648 de 28 de março 2006, a atenção

    básica caracteriza-se como.

    Conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrangem a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde. É desenvolvida por meio do exercício de práticas gerenciais e sanitárias democráticas e participativas, sob forma de trabalho em equipe, dirigidas às populações de territórios bem delimitados, pelas quais assume a responsabilidade sanitária, considerando a dinamicidade existente no território em que vivem essas populações.

    Na atenção especializada o usuário tem acesso a uma linha da produção

    de cuidados estruturados em projetos: Alta complexidade - Urgência e emergência,

    Especialidades - Hospital, apoio diagnóstico e terapêutico, medicamentos. Na

    atenção básica prioriza obrigatoriamente as áreas da Saúde da criança, Saúde

    Mental, Saúde do adolescente, Urgências, Saúde da mulher, Meningite, Saúde do

    Idoso, Malária, Saúde do Adulto, Hepatites, virais, Saúde Bucal, Hanseníase, Saúde

    da Pessoa com Deficiência, Tuberculose, Saúde do Trabalhador, DST/AIDS.

    Na atualidade a garantia do direito universal a saúde chega a ser um

    grande desafio para a implantação do sistema único de saúde no país e não tem

    sido diferente no município de Natal. A construção de redes de serviços

    competentes que atendam a população com efetividade é um desafio complexo, que

    envolve a compreensão de várias unidades, seus diferentes perfis assistenciais e a

  • 32

    articulação funcional, entre elas os mecanismos de gestão, financiamento e

    avaliação de resultados.

    A situação atual da saúde pública do Rio Grande do Norte é trágica. Os

    hospitais públicos de Natal, Walfredo Gurgel, Santa Catarina, João Machado, estão

    superlotados, faltam os materiais mais básico até os mais imprescindíveis para

    manutenção da instituição, além de não oferecem as mínimas condições de trabalho

    para os profissionais. A superlotação do hospital demonstra o fato de que estamos

    em um Sistema Único de Saúde que está sendo sucateado e privatizado. Uma rede

    de atendimento que está sendo violentamente atacada desde o âmbito municipal,

    estadual e federal. No município de Natal as Organizações Sociais (OS’s) foram

    utilizadas para privatizar unidades e só não permaneceram porque o Ministério

    Público interveio. Nos hospitais estaduais o sistema de cooperativas conspira contra

    o sistema público e também em nível federal, a entrega dos hospitais universitários

    como o Onofre Lopes para a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares

    (EBSERH) é um claro ataque à saúde pública.

    Os hospitais do Estado estão em crise, há um caos generalizado no

    setor, com a ausência de leitos, medicamentos e insumos em níveis altíssimos. A

    maioria dos pacientes está em macas nos corredores, esperando vagas de

    Unidades de Tratamento Intensivo (UTI'’s) e sem tratamento humano. Por todas as

    unidades de saúde, é comum a falta de materiais básicos. O quadro caótico do

    Hospital Walfredo Gurgel, o maior do Rio Grande do Norte em urgência e

    emergência, se tornou preocupante, os pacientes sofrem uma série de violações e

    desrespeitos diariamente.

    Em 2006, a rede municipal de saúde de Natal era composta por 147

    unidades, sendo 80 públicas municipais, 10 estaduais e 4 federais. De forma

    complementar, prestando serviço ao SUS municipal, conta-se com 6 unidades

    filantrópicas e 47 unidades privadas contratadas (Redesenhando a Rede de Saúde

    na cidade do Natal/ Janeiro de 2007).

    A Secretaria Municipal de Saúde de Natal (SMS/Natal) faz articulações

    com essas organizações da rede de serviços com atuação transversalizada, atuando

    em uma perspectiva de atenção integrada, cabendo a essa:

    I – promover medidas de prevenção e proteção à saúde da população do

  • 33

    Município de Natal, mediante o controle e o combate de morbidades físicas,

    infectocontagiosas, nutricionais e mentais;

    II – promover a fiscalização e o controle das condições sanitárias, de

    higiene, saneamento, alimentos e medicamentos;

    III – promover pesquisas, estudos e avaliação da demanda de

    atendimento médico, paramédicos e farmacêuticos;

    IV – promover contratação supletiva de serviços médicos, paramédicos e

    farmacêuticos, em situações emergenciais;

    V – promover campanhas educacionais e informativas, visando à

    preservação das condições de saúde e a melhoria na qualidade de vida da

    população;

    VI – implementar projetos e programas estratégicos de saúde pública;

    VII – promover medidas de atenção básica à saúde;

    VIII – capacitar recursos humanos para a saúde pública;

    IX – atender e orientar, com cordialidade, a todos quantos busquem

    quaisquer informações que se possa prestar relacionadas ao sistema de saúde da

    Cidade do Natal, em particular aqueles gerenciados pela Secretaria Municipal de

    Saúde;

    X – proceder, no âmbito do seu Órgão, à gestão e ao controle

    financeiro dos recursos orçamentários previstos na sua Unidade, bem como à

    gestão de pessoas e recursos materiais existentes, em consonância com as

    diretrizes e regulamentos emanados do Chefe do Poder Executivo;

    XI – atender ao disposto na Lei Federal n° 8.080, de 19 de setembro de

    1990;

    XII – manter, em local visível em cada unidade de Saúde, informações

    para os cidadãos acessarem a Ouvidoria através de telefone ou “site”, fazendo valer

    os seus direitos a um atendimento digno;

    XIII – exercer outras atividades correlatas. (informações obtidas no site

  • 34

    da SMS-Natal)

    Segundo informações da Secretaria de Saúde de Natal, disponíveis no

    site do órgão, a atenção à saúde é igual a uma complexa rede que exige mais do

    que uma simples ação solitária ou setorial. Na sua dimensão de bem estar físico,

    psíquico e social ela é necessariamente uma coprodução que tem de trabalhar com

    as oportunidades, com os agravos e com os fatores dos agravos. Portanto, é

    importante reconhecer o usuário como sujeito e participante ativo no processo de

    produção da saúde.

    Na SMS/Natal, o acolhimento surgiu como uma estratégia para a

    reorganização do processo de trabalho, melhorando a qualidade dos serviços de

    saúde e o fluxo de entrada dos usuários, através de uma escuta qualificada

    possuindo como objetivo a identificação de riscos e suas vulnerabilidades.

    Em Natal, como em todo Brasil, ainda não vemos a implantação de um

    sistema de monitoramento e da avaliação de políticas públicas dos setores e

    especialmente na área da saúde. O monitoramento é responsável pela análise da

    política durante a execução, dando retorno aos progressos e aos problemas

    identificados na rede da saúde. A avaliação corresponde a uma investigação

    sistemática do mérito para ter o resultado (positivo ou negativo) da execução da

    política. No caso da política de saúde, tanto uma quanto outra (monitoramento e

    avaliação) deveriam ser feitas em continuidade, ou seja, com o caráter permanente

    e sob a perspectiva do controle social.

    Vale destacar que o controle social é a política pela qual a sociedade

    pode regular de forma participativa as políticas públicas, ou seja, fiscalizar as ações

    do Estado, garantindo sua participação e estabelecendo um compromisso entre

    gestores e os usuários junto aos conselhos para que haja a eficiência, eficácia e

    efetividade garantindo os princípios da constituição.

    Raichelis (2000) considera controle social como um dos elementos

    constitutivos da estratégia política da esfera pública:

    [...] implica o acesso aos processos que informam decisões da sociedade política, que devem viabilizar a participação da sociedade civil organizada na formulação e na revisão das regras que conduzem as negociações e arbitragens sobre os interesses em jogo, além da fiscalização daquelas decisões, segundo critérios pactuados (RAICHELIS, 2006, p. 9).

  • 35

    Bravo (2002, p. 45), igualmente partindo do aspecto legal, coloca que o

    sentido do controle social inscrito na Constituição de 1988 “é o da participação da

    população na elaboração, implementação e fiscalização das políticas sociais”.

    Considera os Conselhos de saúde “como inovações ao nível da gestão das políticas

    sociais que procuram estabelecer novas bases de relação Estado-Sociedade com a

    introdução de novos sujeitos políticos na construção da esfera pública democrática”

    (BRAVO, 2000, p. 41-3).

    As Conferências e Fóruns de saúde também são espaços fundamentais

    para o controle social das condições necessárias para a implementação das

    políticas. É por meio do controle social que é possível expor os problemas na área

    da saúde no âmbito municipal, estadual e nacional. Porém, esses espaços ainda

    não são ocupados em grande quantidade, acreditamos que sejam tanto pela falta de

    incentivos, informações como por questão de hábito ao controle social, devidos há

    décadas anteriores a falta de oportunidade e repressão a participação.

    E o que temos notado é que o poder executivo e legislativo tem se

    eximido de garantir políticas públicas que enfrentem essas demandas universais que

    perpassam toda a população e o poder judiciário tem tomado para si esse encargo.

    Já que é mais vantajoso e conveniente para o Estado conceder uma decisão

    favorável, por meio de uma ação judicial, para uma demanda individual e pontual, do

    que elaborar, planejar, implementar e monitorar uma política pública efetiva que

    beneficiaria todos aqueles que necessitam. Vale destacar que os pedidos

    jurisdicional que chegam à justiça são demandas individuais que não atinge a

    coletividade, essas pessoas que procuram essa instâncias são pessoas um pouco

    mais instruída do que a massa da sociedade, uma vez que o acesso ao judiciário é

    extremamente burocratizado e limitado, dificultando e até mesmo impendido a

    população mais necessitada da sociedade tenham acesso a essa novo fenômeno.

    Frente a essa realidade de ineficiência de um sistema de saúde público e

    universal, vê-se a procura do judiciário, levando centenas de pessoas a recorrerem à

    justiça para a garantia desse direito positivado na Carta Magna e, veremos adiante

    dados que comprovam que essa situação fática.

  • 36

    3- A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RN: A

    JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE OFICIALIZADA.

    No contexto retratado no capítulo anterior, deu-se a expansão institucional

    do Ministério Público bem como da Defensoria Pública. Neste sentido a Defensoria

    Pública do Estado é uma instituição encarregada pela Constituição Federal de

    prestar assistência jurídica integral e gratuita às pessoas que não têm condições de

    pagar um advogado, garantindo os princípios constitucionais de acesso à justiça e

    igualdade entre as partes, e o direito à efetivação de direitos e liberdades

    fundamentais. Atuando em qualquer espécie de caso, desde que seja de

    competência da Justiça Estadual, sempre na defesa de um cidadão ou de um grupo

    de cidadãos hipossuficientes nos termos da lei. Nesse sentido, age garantindo o

    direito de pessoas sem condições de arcar com custas processuais, nem honorários

    advocatícios. Deste modo, é de primordial importância o papel da Defensoria no

    acesso à Justiça, visto que visa melhorar e tornar digna a vida da população

    brasileira que necessita de uma resposta do judiciário.

    O conceito jurídico de hipossuficentes encontra definição no ordenamento

    jurídico brasileiro através da Lei Federal nº 1.060/1950, na qual estabelece critérios

    para concessão de assistência judiciária aos necessitados, conforme o texto:

    Art. 2º. Gozarão dos benefícios desta Lei os nacionais ou estrangeiros residentes no país, que necessitarem recorrer à Justiça penal, civil, militar ou do trabalho.

    Parágrafo único. - Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.

    Com base nesse artigo a Lei Complementar Estadual do RN de n.

    251/2003 apresenta uma definição mais precisa daqueles que são considerados

    hipossuficientes, citando como necessitado todo aquele que possui renda mensal

    individual de até 02 salários mínimos5 ou renda familiar (soma de todas as rendas

    individuais dividida pelo número de pessoas da família) de até 01 salário mínimo. Ao

    analisar essa definição percebe-se que o direito de acessar ao Judiciário

    5 O salário mínimo vigente no Brasil equivale ao valor de 724,00 (setecentos e vinte e quatro reais).

  • 37

    gratuitamente é restrito, ou seja, mais uma vez se cria uma forma de selecionar as

    pessoas que terão acesso a esse direito.

    Vale mencionar que a assistência jurídica integral e gratuita aos

    hipossuficientes é direito e garantia fundamental de cidadania, inserido

    na Constituição Federal, sendo dever da União, dos Estados e do Distrito Federal

    instalar a Defensoria Pública em todo o país.

    Por conseguinte, com o encargo de atender e de facilitar o acesso a

    Justiça das pessoas carentes, a Defensoria apresentou uma proposta de criação do

    programa “SUS MEDIADO”, junto a Procuradoria Geral do Estado, a Secretaria de

    Saúde do Estado, a Defensoria Pública da União, a Procuradoria Geral do Município

    de Natal e a Secretaria de Saúde do Município de Natal, o qual foi lançado em 14 de

    fevereiro de 2012, tendo como parceiros os respectivos entes citados.

    Acrescente-se a isso, que a parceira tem por objetivo o estabelecimento

    de ampla cooperação entre os partícipes, o intercâmbio de ações e a difusão de

    informações, visando garantir maior efetividade às políticas públicas de saúde no

    Estado do Rio Grande do Norte: evitar demandas e assegurar o acesso dos usuários

    hipossuficientes ao SUS, a medicamentos e procedimentos médicos de

    responsabilidade do Estado do Rio Grande do Norte e dos Municípios participantes,

    previstos no Sistema Único de Saúde – SUS.

    As sessões de mediação para resolução administrativa das questões de

    saúde amparadas pelo programa ocorrem todas às terças-feiras, através de uma

    Câmara de Conciliação, composta por uma representante da Unidade Central de

    Agentes Terapêuticos (UNICAT), uma representante da Secretária Estadual de

    Saúde Pública (SESAP), uma representante da Secretária Municipal de Saúde de

    Natal (SMS) e pelo assistido, que se reúnem na Sede da Defensoria Pública do

    Estado, uma vez por semana, com o escopo precípuo de solucionar a demanda

    extrajudicialmente, garantindo a esse a efetivação, no plano concreto, do direito à

    saúde. Ainda, através do referido programa, assegura-se ao cidadão que não teve o

    seu caso solucionado no âmbito extrajudicial, a possibilidade de opor demanda

    judicial própria, através de Defensor Público Estadual ou Federal, para efetivação do

    seu direito.

  • 38

    Diante do crescente aumento de demandas de saúde no nosso Estado e

    com a finalidade de resolver alguns litígios no âmbito extrajudicial e dessa forma

    acelerar a garantia do acesso aos serviços de saúde, foi que a Defensoria propôs

    realizar esse programa citado acima. Assim, esse visa não somente apresentar

    soluções administrativas, como também facilitar o acesso ao judiciário da população

    desprovida de recursos financeiros e principalmente de conhecimento.

    Nessa ordem de ideias, a Constituição Federal consagra ser o direito

    social à saúde um direito de todos e dever do Estado, devendo o mesmo ser

    garantido por intermédio de políticas públicas que visem tanto à redução do risco de

    doenças e outros agravos quanto ao acesso universal e igualitário às ações e

    serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Daí incumbir ao Poder Público

    dispor, nos termos da lei, sobre a regulamentação, fiscalização e controle dos

    serviços públicos de saúde, devendo, sua execução, ser feita diretamente ou por

    intermédio de terceiros.

    Percebe-se que dos direitos positivados o mais importante sem dúvida é o

    direito a vida, o qual é um direito público subjetivo inalienável e indisponível de todo

    e qualquer ser humano, exigindo prestações positivas por parte do Poder Público, de

    modo que não se submete à "reserva do possível" 6 , ou seja, independe das

    disponibilidades orçamentárias do ente público responsável pela sua prestação, uma

    vez que nada justifica a negativa da falta de fornecimento de medicamentos,

    realizações de exames, cirurgias e até mesmo vagas de UTI’s a pessoas

    desprovidas de recursos financeiros para adquiri-los.

    Dirley Cunha Junior afirma que: “nem a reserva do possível, nem a

    reserva de competência orçamentária do legislador podem ser invocados como

    óbices, no direito brasileiro, ao reconhecimento e à efetivação de direitos sociais

    originários a prestações”. Deste modo, pactuamos da posição de Leyla Brito de

    Castro Sampaio quando aduz que:

    A imposição por parte do Executivo do argumento da reserva do possível como grande barreira para a promoção de uma melhor e maior implementação de políticas públicas e de qualidade, e como salvador e

    6 Reserva do possível estabelece limites a efetividade dos direitos fundamentais prestacionais, como os direitos sociais.

  • 39

    justificador das suas omissões gerou total descrédito. Na verdade, ainda que a situação seja de complexa resolução, não seria plausível que a reserva do possível justificasse o injustificável, haja vista ser inquestionável a falta de organização administrativa, os gastos públicos desmedidos e desnecessários em serviços e bens dispensáveis, e a má gestão em todas as esferas públicas, uma vez que não são estabelecidas metas prioritárias pautadas na transformação da realidade social garantidora de melhor qualidade de vida através da oferta do mínimo vital. É irrefutável a dificuldade de lidar com o argumento da reserva do possível, principalmente no que tange a prestações relacionadas à saúde. Quando se está diante de um questão individual o problema se agrava, basicamente porque não há como o Judiciário dimensionar os recursos disponíveis para tanto.

    Igualmente, o at. 2º. da Lei n. 8.080/90, que regula as ações e serviços de saúde, prescreve que:

    Art. 2º - A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.

    § 1º - O dever do Estado de garantir a saúde consiste na reformulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação (BRASIL, 1990).

    Logo para que haja procedência nessas ações judiciais impetradas pelas

    Defensorias Públicas, referente à saúde, interposta em desfavor do Estado, os (as)

    defensores (as) apoiam-se na necessidade de garantia do direito fundamental à

    saúde, previsto no artigo 196 da Constituição Federal, no artigo 125 da Constituição

    Estadual e na Lei 8.080/90. Sustenta-se assim a necessidade de intervenção do

    Poder Judiciário para efetivação de políticas públicas de saúde em favor das

    pessoas carentes, diante da omissão do Poder Público e a inaplicabilidade do

    princípio administrativo da reserva do possível, visto que o direito á saúde e à vida

    prevalece sobre limitações de ordem orçamentária.

    Diante da necessidade de proteção e efetivação desse direito líquido e

    certo de todo cidadão brasileiro a saúde pública, as Defensorias Públicas (tanto

    Estadual como da União) atuam na defesa destes direitos violados diariamente por

    essa lógica seletiva, focalizada e descentralizada das políticas sociais, que

    apresentam esses serviços de saúde como mercadorias pela via da privatização.

    A seguir fotos do programa SUS Mediado realizado na DPE/RN:

  • Figura 2- Defens

    Fonte: Foto tira

    Figura 3- Sala de

    Fonte: Foto tirada

    soria Pública do Estado - SUS MEDIADO

    irada no dia 10.06.2014 (terça-feira), na Defensoriadia do programa SUS MEDIADO.

    de mediação do SUS MEDIADO

    da em 20.10.2014 na Defensoria Pública do Estad

    40

    ria Pública do Estado no

    ado/RN.

  • 41

    3.1- O SUS MEDIADO: OS LIMITES DAS PACTUAÇÕES.

    Cumpre, pois, analisar os dados correspondentes ao mês de Fevereiro de

    2014, correspondente ao programa SUS MEDIADO.

    Tabela 2: Distribuição das ações realizadas pela UNICAT na DPE em 2014.

    UNICAT

    DATA ATENDIMENTOS RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA

    AÇÃO JUDICIAL

    DPU** OUTROS

    04/02/2014 8 1 1 5 1

    11/02/2014 8 0 2 6 0

    8/02/2014 9 0 5 4 0

    25/02/2014 6 0 2 4 0

    TOTAL 31 1 10 19 1

    Fonte: elaboração própria a partir dos dados extraídos do programa SUS MEDIADO/2014/RN.

    Tabela 3: Distribuição das ações realizadas pela SMS na DPE em 2014.

    SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE – SMS

    DATA ATENDIMENTOS RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA

    AÇÃO JUDICIAL

    DPU** OUTROS

    04/02/2014 8 4 4 0 0

    11/02/2014 9 7 2 0 0

    18/02/2014 10 9 1 0 0

    25/02/2014 11 5 5 1 0

    TOTAL 38 25 12 1 0

    Fonte: elaboração própria a partir dos dados extraídos do programa SUS MEDIADO/2014/RN

  • 42

    Tabela 4: Distribuição das ações realizadas pela SESAP na DPE/2014.

    SETOR DE REGULAÇÃO DA SESAP

    DATA ATENDIMENTOS RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA

    AÇÃO JUDICIAL

    DPU** OUTROS

    04/02/2014 7 0 4 0 3

    11/02/2014 * * * * *

    18/02/2014 2 0 1 0 1

    25/02/2014 2 0 2 0 0

    TOTAL 11 0 7 0 4

    Fonte: elaboração própria a partir dos dados extraídos do programa SUS MEDIADO/2014/RN.

    *Não houve atendimento nesta data.

    ** Defensoria Pública da União: é instituição essencial à função

    jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa dos

    necessitados, em todos os graus, perante o Poder Judiciário da União (a Justiça

    Federal, a Justiça Eleitoral, a Justiça do Trabalho e a Justiça Militar).

    É importante esclarecer que as resoluções administrativas são atos

    normativos que partem de autoridades superiores, mas não do chefe do executivo,

    através das quais disciplinam matéria de sua competência específica. Todos os

    cidadãos tem o direito a propor uma ação judicial, por meio de um processo, a fim de

    obter uma resposta do Poder Judiciário, no entanto antes que se chega nessa fase é

    necessário que se esgote todas as possibilidades administrativas.

    Ao analisar os dados evidenciamos que no mês de fevereiro/2014, 49

    novas demandas foram encaminhadas para a via judicial por não apresentar solução

    no plano extrajudicial, sendo 29 (vinte nove) litígios da competência da Defensoria

    Pública do Estado para ingressar com ações correspondentes as demandas

    solicitadas. E, 20 (vinte) são da competência da Defensoria Pública da União, as

    quais são encaminhadas, a fim de requerer efetivação da sua demanda.

  • 43

    Os dados revelam que o objetivo do programa SUS MEDIADO não tem

    sido alcançado, pois o mesmo pretendia solucionar as lides no plano administrativo,

    sem precisar que as pessoas recorressem ao poder judiciário para ter seu direito

    efetivado. No entanto, observa-se o baixo número de resoluções administrativas, por

    parte dos órgãos que compõem o programa. E, com isso confirma-se que o Estado

    tem se omitido em garantir políticas públicas que enfrentem essas demandas

    colocadas pela Questão Social que perpassam essa sociedade.

    Em relação a essas ações que são impetradas pela Defensoria para

    viabilizar o acesso à saúde, os resultados tem sido satisfatórios, na sua grande

    maioria, ou seja, ao pleitear esse direito líquido e certo o demandante tem alcançado

    seu objetivo, o seu desígnio no que se diz respeito à prestação jurisdicional

    realizada pelo estado7.

    Porém, o caminho que é preciso percorrer para se ter garantido este

    direito, é burocrático, moroso e desgastante, fazendo com que muitas pessoas que

    necessitam dessa intervenção jurídica desistam de pelejar por seu direito aos

    serviços de saúde. O processo judicial no todo é extremamente corrosivo em todos

    os aspectos, seja ele físico ou psíquico, uma vez que as pessoas que chegam à

    procura desse órgão já sobrevieram de uma série de violações de direitos, além da

    fragilidade em relação à demanda que lhe fizera chegar até ali, já que essa está

    estreitamente relacionada ao bem maior de qualquer ser humano, a VIDA. Além de

    todos esses desgastes, ainda se tem a burocracia legislativa, pois cada ação

    estabelece que seja seguido um procedimento legal, ou seja, cada uma tem suas

    particularidades e exigências próprias, dificultando ainda mais a situação dos

    usuários.

    Assim, é bastante comum haver a desistência de ingressar na Justiça,

    devido a vários fatores, dentre eles: as condições objetivas e/ou subjetivas dos

    assistidos, pois muitos não têm recursos financeiros suficientes para se locomover

    diversas vezes a instituição ou a outros órgãos necessários; outra barreira diz

    respeito às regras do sistema jurídico. Esse fator é referente à competência

    7Jurisdição: poder que detém o Estado para aplicar o direito ao caso concreto.

  • 44

    territorial8 e atuação da Defensoria a qual é limitada; outro obstáculo e o mais

    importante deles é a questão da utilidade da decisão, pois alguns até conseguem

    ultrapassar os limites e óbices impostos pela burocracia, entretanto, quando se

    alcança o objetivo esse não tem mais importância alguma, uma vez que a vida, em

    geral, não mais existe para que seja executada a medida. É habitual acontecer nas

    ações que demandam vagas em Unidade de Tratamento Intensiva (UTI), quando os

    familiares até chegam a acionar o Judiciário. Porém, quando a decisão vem ser

    proferida, o usuário já veio a óbito.

    Vale mencionar que em 2013 o Governo do Estado foi condenado a

    pagar, R$ 40 milhões em demandas judiciais originárias no âmbito da Secretaria de

    Estado da Saúde Pública (SESAP). Com esse montante seria possível abastecer o

    Hospital Walfredo Gurgel – o maior do Estado – por quase um ano. Atualmente,

    segundo a Procuradoria Geral do Estado (PGE), 4,6 mil ações judiciais com a

    mesma temática tramitam no Judiciário. A demanda é de usuários do SUS que são

    obrigados a recorrer à Justiça para conseguir, na maioria das vezes, um leito de UTI,

    medicamentos ou procedimentos cirúrgicos. Portanto:

    Ocorre que nessa esteira, forma-se um circulo vicioso para todos os envolvidos, através do qual o Judiciário se mostra cada vez mais parcial, as demandas individuais satisfeitas por meio de decisão judicial afetam as contas públicas e, nesse sentido, afetam por consequência a implementação das políticas e programas que deveriam beneficiar a uma coletividade, enquanto o dinheiro está sendo utiliz