PEDRO PEREIRA LEITE
Estudos de museologia
UNIVERSIDADE LUSÓFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS
FACULDADE DE ARQUITECTURA E ARTES
DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
LISBOA
JULHO 2009
Relatório de Avaliação Curricular
Julho de 2009
2 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
1 Indice 2 Introdução ............................................................................................................................. 4
3 Síntese de Cada Módulo........................................................................................................ 8
3.1 A Função Social dos Museus de Mário Moutinho ......................................................... 8
3.1.1 Síntese Biobibliográfica ......................................................................................... 8
3.1.2 Roteiro dos Seminários ....................................................................................... 10
3.1.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA ............................................................................... 18
3.2 MUSEION-Função Social do Museu ............................................................................ 38
3.3 Museologia e Género de Mário de Souza Chagas ....................................................... 39
3.3.1 Síntese Biobibliográfica ....................................................................................... 39
3.3.2 Roteiro dos Seminário ......................................................................................... 40
3.3.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA ............................................................................... 70
3.4 Museologia e Comunicação de Maria Cristina Bruno ................................................. 82
3.4.1 Síntese Biobliográfica .......................................................................................... 82
3.4.2 Roteiro dos Seminários ....................................................................................... 85
3.4.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA ............................................................................... 93
3.5 Museologia e Comunicação de Marcelo Cunha ........................................................ 101
3.5.1 Síntese Biobibliográfica ..................................................................................... 101
3.5.2 Roteiro dos Seminários ..................................................................................... 103
3.5.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA ............................................................................. 109
3.6 Políticas Culturais Europeias e Museologia de Judite Primo .................................... 116
3.6.1 Síntese Biobibliográfica ..................................................................................... 116
3.6.2 Roteiro dos Seminários ..................................................................................... 118
3.6.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA ............................................................................. 121
3.7 Museologia e Educação de Maria Célia Santos ......................................................... 134
3.7.1 Síntese Biobibliográfica ..................................................................................... 134
3.7.2 Roteiro dos Seminários ..................................................................................... 136
3.7.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA ............................................................................. 147
3.8 MEMORIA, PATRIMNIO E CIDADANIA de Regina Abreu ........................................... 157
3.8.1 Síntese Biobibliográfica ..................................................................................... 157
3.8.2 Roteiro dos Seminários ..................................................................................... 159
3.8.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA ............................................................................. 166
3.9 Pierre Mayrland e a Altermuseologia ....................................................................... 170
3.9.1 Síntese Biobibliográfica ..................................................................................... 170
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3.9.2 190Roteiro dos Seminários ............................................................................... 171
3.9.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA ............................................................................. 174
4 Memórias de Viagens Museológicas - Leituras Complementares .................................. 180
4.1 Os museus paulistas .................................................................................................. 180
4.1.1 Museu de Arqueologia e Etnologia da USP (23MAR) ........................................ 183
4.1.2 Pinacoteca de São Paulo (directora Arminda Tojal) 24 Mar09 ......................... 185
4.1.3 Empresa Municipal de Urbanização (EMURB -24MAR09) ................................ 186
4.1.4 Museu Paulista da USP (25MAR09) Director Paulo Garcez de Melo ................ 187
4.1.5 Museu de Zoologia (parte do Museu de História Natural) ............................... 188
4.1.6 Museu do Futebol (26Mar09) ........................................................................... 189
4.1.7 SESC SP Pompeia (26 Mar09) ............................................................................ 190
4.1.8 EXPOMUS – Linhas de intervenção ................................................................... 190
4.1.9 Memorial da Resistência (27mar09) Katia Fillipini ............................................ 192
4.1.10 Museu da Língua Portuguesa (27Mar09) .......................................................... 193
4.1.11 Museu Afro Brasileiro (28Mar09) ..................................................................... 193
4.2 Fragmentos das Imagens de África nos museus de Lisboa ....................................... 195
4.2.1 Museu do Carmo ............................................................................................... 197
4.2.2 Museu Nacional de Arte Antiga ........................................................................ 199
4.2.3 Museu do Chiado .............................................................................................. 202
4.2.4 Museu da Sociedade de Geografia .................................................................... 205
4.2.5 Museu Nacional de Arqueologia Dr. Leite de Vasconcelos ............................... 208
4.2.6 Museu Nacional de Etnologia ............................................................................ 221
5 Análise Crítica e Transversal dos Temas Abordados ......................................................... 227
5.1 Os trajectos dos museus paulista .............................................................................. 227
5.2 O lugar da herança africana nos museus lisboetas ................................................... 230
6 Resultados Provisórios do Roteiro .................................................................................... 240
6. BIBLIOGRAFIA DE REFERENCIA .......................................................................................... 243
7. BIBLIOGRAFIA COMENTADA PARA APARTE CURRICULAR ................................................ 251
8 DOCUMENTOS COMPLEMENTARES .................................................................................. 252
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2 Introdução O trabalho que ora apresentamos corresponde ao momento de avaliação previsto na
conclusão da componente curricular do Curso de Doutoramento em Museologia. O
Plano do trabalho foi condicionado por normas. Não se trata pois de um trabalho de
investigação científica, embora por vezes tenhamos mobilizado metodologias do
trabalho científico para apresentar o nosso processo curricular. Fizêmo-lo porque
consideramos a Museologia como uma ciência integrada no campo das ciências
aplicadas. E sendo aplicada, um exercício de análise museológica, que mobiliza-se as
componentes abordadas curricularmente deveria ser também um exercício aplicado.
É essa condição, de reflexão crítica acompanhada da acção crítica, integrada nos
problemas do seu tempo e das comunidades que confere à museologia um objecto
próprio de investigação. O Objecto de estudo da museologia são os processos que as
comunidades desenvolvem para mobilizar as suas memórias, integradas nos seus modos
de realacionamento com o território, mediados por profissionais qualificados, com
propósito de constrir o seu futuro. Parte deste objecto de estudo, de processos de
desenvolvimento das comunidades, não é exclusivo da museologia que o partilha com
outras ciências e outras metodologias que podem e devem ser incorporadas no processo
de produção científico. A museolgia como epistemologia científica opta por um
processo de produção cultural e de desenvolvimento para as comunidades, com base nas
suas memórias e heranças.
Esta condição de Ciencia aplicada enformou o nosso currículo. Condicionou-o!
Partimos para ela após uma reflexão sobre os resultados da elaboração do Roteiro
Metodológico. Olhamos para as suas deficiêcias teóricas e metodológicas e verificamos
a existência de várias lacunas teóricas, quer ao nível de leituras, quer ao nível da
reflexão, naquilo que podemos considerar o ―corpus teórico‖ da museologia.
Por isso optamos por num primeiro momento por rever de forma aprofundada os
contributos do pensamento museológico contempoâneo. Consideramos necessário
preencher essa lacuna e mobilizar os conceitos e os pensamentos da teoria museológica
de forma maisconsciente, identificar linhas de pensamento e propostas, dialogar com
essas propsotas e com os seus autores, para a partir daí reflectir sobre as nossas
experiências.
Foi o que executamos na primeira parte deste trabalho. Talvez duma forma exaustiva
mas ncessária. A sua existência vai permitir-nos na fase seguinte continuar a dialogar
com esses autores e com os seus trabalhos. Executamos um recuo calculado para
ganharmos balanço mais à frente.
De seguida, solicitavam-se um conjunto de leituras complementares. Uma das
conclusões a que tínhamos chegado é que existe uma grande distância entre a nossa
proposta de doutoramento e o seu objecto de estudo, localizado noutro território, noutro
universo cultural. Esse é uns desafios que assumimos conscientemente.
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A nossa proposta base, estudar de que forma é que a museologia pode incorporar
processos de hibridização cultutral em contexto pós-colonialobriga-nos a mergulhar
noutro mundo, noutras dinâmicas sócio culturais. Como sempre isso é um desafio de
consequências imprevissíveis e resultados incertos. A certeza que levamos é que é esta
museologia que nos pode orientar no dialogo que vamos ter que establecer.
E como se diz na marinharia, ―quem vai ao mar prepara-se em terra‖, fomos à busca
duma alternativa teórica de análise, sobre a qual pudéssemos efectuar uma leitura de
processos museológicos de hibridação cultural. Deixamos a questão das problemáticas
da museologia pós-colonial para a fase seguinte e mergulhamos num exercício de
leituras sobre processos museológicos na busca de um processo metodológico. Optamos
por exercício de leitura a partir da experiência das viagens museológicas que realizamos
durante este ano. Uma a São Paulo, integrados na visita de estudo; outra pessoal,
pensada para este trabalho. Foi a partir destas viagens que exercitamos a integração dos
temas trabalhados. A análise crítica e transversal
Não concretizamos todas as actividades planeadas. O tempo assim não o permitiu em
parte, o método de trabalho, por outro lado também não ajudou. Em relação ao tempo, é
um problema do nosso tempo. É um bem escasso, e as múltiplas actividades e
responsabilidades sociais nem sempre permitem conjugar o necessário tempo de
reflexão com os prazos de entrega dos trabalhos. Sabemos que isso não será desculpa
uma desculpa no futuro e preferimos cortar agora, para investirmos a seguir no trabalho
da tese.
Em relação ao método adoptado também, no final se detectaram algumas deficiências.
Desde o início que tinha claro que o objectivo era efectuar um exercício. Por isso, as
primeiras viagens pelos museus são titubiantes. Comecei por interrogar o espaço sobre o
que que andava à procura. Sabia que ia procurar o lugar de Africa no museu. Não sabia
o que poderia ser utilizado e validado para este relatório. Há medida que fui avançando
as questões foram ficando mais claras, e esse trabalho foi começando a tomar forma de
um processo de investigação. Os primeiros instrumentos não eram totalmente
adequados e vários ajustes tiveram que ir sendo efectuados.Não fora um exercício, uma
revisão de algumas visitas e as lacunas seriam preenchidas. Preferimos agora assumir
estas imperfeições como resultado dum processo em construção de metodologias de
observação.
Também em relação ao universo de análise não realizamos visitas aos Museus de
Coimbra e Porto, como tínhamos previsto (visitamos Coimbra, mas o Museu Etnologico
estava fechado). Note-se todavia que isso não implica que a reas lacunas não venha a ser
feita noutro momento.
Finalmente uma última deficiência: não nos envolvemos com nenhm destes processos,
não interagimos com nenhuma organização. Neste momento issa não constituía um
objectivo.
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Exemplificando, muitas das questões que aqui abordamos situam-se na esfera de um
contexto de políticas museológicas e culturais. Implicava portanto pela leitura do
processo expográfico, uma interrogação sobre o conceito expositivo, para saber de que
forma esses objectos se realcinavam com a comunidade que os produziu e com a
comunidade que hoje os usufrui. Mais, saber se esses objectos são mobilizados para
algum processo de desenvolvimento da comunidade, e se sim quais as dinâmicas desses
objectos. Implicava igualmente interrogar a evolução da organização museológica, os
seus agentes, os processos de comunicação, sobre os modos de relacionamento com os
públicos, com a comunidade, sobre os seus instrumentos de trabalho, enfim sobre o
processo museológico. Esta leitura de unidades destinava-se a efectuar uma leitura
global sobre a forma como a herança africana se refelctia na museulogia de uma
comunidade.
Ora esta ―consciência metodológica‖ que aqui se expressou iniciou-se com um caderno
de campo onde se fizeram algumas anotações numa visita ao Museu Nacional de
Etonologia. Anotações numa visita e de algumas horas de trabalho na blioteca do
museu, onde nem fotocópias se podia efectuar. Foi um trabalho que foi sendo feito, nas
horas vagas, e que após ter decidio incporpora-lo neste exercício prático foi
sistematizado a partir da informação disponível. Quando se compararam casos
verificou-se diferenças de informação e de aprofndamento. Não procesemos à sua
resolução conscientemente, porque nos interessa mais o processo do que o objecto final.
Outro exemplo: só numa fase relativamente tardia me aprecebi que poderia e devia
mobilizar a imagem para as minhas refelxões. Que ela era uma parte crucial da minha
análise. Ora as burocracias de fazer digitalização são morosas (e caras o que nos levou,
na fase inical a optar por alguma contenção). Ora o que no início devia ter constituido
um inventário mais rigoroso como compoente de uma metodologia mais expelícita,
acaba no final por ser uma lacuna. Embora tenhamos consciência que o objectivo do
trabalho não era esse, isso não nos deixa satisfeito não termos sido mais exaustivos
nessa inventariação e documentação. Embora não constitua objecto de investigação, a
qualidade desse trabalho não justificou esta falta de atenção. Mas a metodologia acabou
por ser criada. E esse é que era o nosso objectivo.
Também não ficamos satisfeitos com a leviendade de algumas afirmações produzidas ao
longo das análises dos museus. Só na fase de redacção do trabalho nos fomos
aprecebendo de muitas lacunas de observação, de informação e de diálogo. Tudo isso
obrigaria a uma releitura que só na fase de redacção do conjunto nos aprecebemos.
Devo também dizer que nas várias análises que temos efectuado de equipamentos
culturais, na maioria dos casos utilizamos o estudo de caso, ou a lógica de planeamento
de uma rede de equipamentos em contexto urbano. Ora aqui nós fizemos um exercício
de leitura duma representação transversal às instituições, dentro do contexto de
evolução dessas instituições, da cidade das sua ―políticas culturais‖. Feita a leitura final
percebe-se os pontos fracos. A síntese não pode ser mobilizada como conhecimento
museológico sem uma aferição.
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Finalmente também não efectuamos a leitura teórica sobre os processos de construção
da Identidade do Outro. Aquele que será uma componente fundamental da nossa
problemática, e que havíamos pensado mobilizar os auotres de referencia neste trabalho,
exactamente para efectuar o cruzamento com os resultados das análises. Não o fizemos
com a consciência da necessidade de trabalhar melhor essas teorias e os seus autores.
Será pois o passo seguinte.
Sabendo de antemão todos estes defeitos apresentamos os resultados. A partir da
construção metodológica e da análise que efectuamos alcançamos uma síntese. Nesse
trabalho mobilizamos o olhar museológico. A partir desse diagnóstico poderíamos partir
para desencadear um processo museológico com um conceito gerador. Como exercício
prático foi conclusivo. A realidade como sabemos é bem diferente.
O que pretendemos foi identificar como exercício prático se conseguíamos identificar a
dinâmica da herança africana nos museus de Lisboa, de que forma essa herançao é
revelada e que consciência a comunidade museológica tem dela. Foi uma leitura
balalançeada entre instituições e os museólogos, e entre a cidade e os seus habitantes,
entre o passado e o presente. Uma leitura de processos museológicos, de práticas
museológica, de políticas culturais e de possíveis soluções, para os quais mobilizamos o
olhar museológico. É também uma leitura possível da cidade e da sua política
museológica
No final assumimos aqui este trabalho que fomos construindo ao longo deste ano, com a
consciência que a este poema ainda lhe falta a gota de sangue. Sabemos que o nosso
poema é outro. Estamos convictos que com trabalho lá chegaremos e que este exercício
nos foi útil.
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3 Síntese de Cada Módulo
3.1 A Função Social dos Museus de Mário Moutinho
3.1.1 Síntese Biobibliográfica
Mário Canova de Magalhães Moutinho é Doutor em Antropologia Cultual (1983)
pela Universidade de Paris VII, e Arquitecto (1982) pela Ecole Nationale Supérieur des
Beaux Arts, França. Tem Certificat de Maitrise Ethnologie. pela Université de Paris
VII, França. (1971) e Certificat Maitrise Cartographie. Pelo Institut Geographique
National, França. (1972). Actualmente é Reitor da Universidade Lusófona de
Humanidades e Tecnologias, onde é professor desde 1994. Entre 1998 e 2007 foi
Assessor principal do Museu Nacional História Natural, e Professor auxiliar na
Universidade de Lisboa (1979-1994). É membro fundador do International Movement
for a New Museology MINOM- ICOM, e da Associação Defesa do Património Cultural
de Monte Redondo Leiria.
Entre a sua produção bibliográfica salienta-se as seguintes obras na área de museologia:
(2007). Sociomuseology,. Lisboa:, Edições Universitárias Lusófonas.
(2000). Imagem do Indígena na Ideologia Colonial Portuguesa, Lisboa: Edições
Universitárias Lusófonas.
(1994). A Construção do Objecto Museológico, Lisboa: Edições Universitárias
Lusófonas 58 p.
(1990). Museus e Sociedade. Monte Redondo, Monte Redondo: Edições Museu de
Monte Redondo.
( 1986) A organização de um museu local de etnologia, Lisboa: Instituto Português do
Património Cultural,
(1985). História da Pesca do Bacalhau: por uma antropologia do "Fiel Amigo", Lisboa:
Editorial Estampa.
(1980). Introdução à Etnologia, Lisboa: Editorial Estampa.
Artigos em revistas
( 2005). "Os compromissos dos museus com a sociedade", MUSA, Museus,
Arqueologia & outros Patrimónios, 1 , pp. 11 - 14.
( 2002). "O Ecomuseu da Murtosa", Patrimónios Boletim ADERAV, 2: 103 - 110.
(1997) "Theory and Practice of Social Museology. Stoneterior", Stoneterior, 46: 22 - 26.
(1997)- Museu de Carenque, Enquadramento da programação museológica", Boletim da
Associação Portuguesa de museologia, 5: 15 - 19.
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9 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
(1996). "A Museologia Informal", Boletim da associação Portuguesa de Museologia, 3:
22 - 24.
(1993) "Sobre o Conceito de Museologia Social", Cadernos de Sociomuseologia,
Revista Lusófona de Museologia, 1: 5 - 7.
(1992) "La Nouvelle Museologie et L'Ethnologie ", Textes de Museologie, Cadernos do
MINOM, 2: 29 - 37.
(1992)"Contribution à la Rédaction d'un texte de base sur la Nouvelle Museologie",
Cadernos do MINOM, 2: 39 - 41.
(1992). "A la Recherche d'un Concept de Museologie", Cadernos do MINOM, 2: 77 -
99.
(1989) "A Arquitectura das Casas dos Emigrantes na Área de Influência do Museu de
Monte Redondo", Sociedade e Território n8, pp. 79 - 80.
(1985) "O Museu Etnológico de Monte Redondo: Quatro anos de actividade,",
Património e Museus Locais-IPPC, pp. 24 - 26.
(1989) ―Reflexões sobre a função social do Museu‖ in Museus e Sociedade, Cadernos
de Património nº 5, Museu Etnológico de Monte Redondo,
Durante o seminário, que ocorreram nos dias 24 e 25 de Outubro de 2008, foram
distribuídos os seguintes textos:
MENEZES, Susana (2004) ―A memória do trabalho e o trabalho da
memória: o caso do museu da indústria da chapelaria‖ – introdução à tese de
mestrado. Lisboa Universidade Lusófona
MOUTINHO, Mário (2008) História do Capuchinho Vermelho in
Museologia: Novos Enfoques / Novos Desafios, Mário C. Moutinho,
Simpósio Internacional "O Processo de Comunicação nos Museus de
Arqueologia e Etnologia"Universidade de São Paulo
MOUTINHO, Mário (2008) Museus com Instituições Prestadoras de
Serviços
CHAGAS, Mário (2003) INTRODUÇÃO ou o enigma do chapeuzinho preto
(Tese de Doutoramento apresentada na UNIRIO Rio de Janeiro de Mário
Chagas ―Imaginação museal: museu memória e poder em Gustavo Barroso,
Gilberto Freire e Darcy Ribeiro‖)
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3.1.2 Roteiro dos Seminários
Mário Moutinho é uma daqueles raros professores que desinquieta. Fala com
simplicidade de coisas complexas, questionando ideias, conduzindo a raciocínio por
caminhos inesperados, algumas vezes alucinantes, para chegar, aparentemente, ao ponto
de partidas com novas qualidades de pensamento. Se quisemos figurar esse processo,
teríamos que desenhar uma espiral. Para a concretização da sua estratégia pedagógica,
de desinquietação, socorre-se normalmente de três instrumentos de mediação, que
manuseia com mestria: A Palavra, A Imagem e o Texto. São três processos narrativos
judicialmente aplicados com objectivo de produzir um efeito de despertar consciência,
emoção e reflexão. Socorre-se da liberdade de pensamento concedida para libertar os
espíritos.
A sua estratégia neste seminário iniciou-se com a proposta de leitura de parte do texto
da introdução da tese de Susana Meneses ―A memória do trabalho e o trabalho da
memória: o caso do museu da indústria da chapelaria‖ 1. No âmbito das teses
académicas, normalmente escritas com mão pesada, reflexivas até à exaustão. Esta curta
introdução realmente introduz a reflexão sobre o que é a museologia, a função social
dos museus, o papel da memória e do património, a formação das identidades e das
heranças. E fá-lo com simplicidade, escrita na primeira pessoa mas referindo-se ao
universal, com agilidade conceitual e rigor analítico. Susana fala de si com
simplicidade, criando um discurso universal sobre os outros. Com isso ela faz
museologia porque coloca o seu discurso na dimensão poética.
Mas o que nos diz afinal a Susana. Sabemos que tem uma cicatriz no pé esquerdo, e que
essa cicatriz a acompanha desde os seus três anos, feita descuidadamente quando usava
um bibe branco, num terreiro de África, depois de não ter seguido os conselhos de sua
mãe. E que chorou. E isto não teria a mais pequena importância, para nós comunidade
museológica, se esse choro não tivesse chegado até nós, hoje. Não teria importância se
não tivéssemos também chorado ao senti, imaginariamente, esse vidro verde a trilhar a
pela daquela criança.
E isso que ela nos diz. Que aquela cicatriz é um património. Foi uma marca,
constatável, transmitida, relacionada com um local, com gente, que se transformou
numa herança dum grupo por ter sido sucessivamente recontada, lembrada, e assim
revivida. Essa cicatriz é dela e dos outros, partilhado que é o momento. Esse
acontecimento, herdado dum tempo que não existe, lembrado num espaço que não
existe, recriado pela memória, valorizado e transformado património transcendeu-se a si
mesmo. Ganhou novos valores e significado. Ultrapassou a materialidade e permitiu, e
continua a permitir, olhares diferentes. E o que é que sobrevive disso a sua
materialidade e a sua poesia, (a narrativa poética de Mário Chagas), que se reproduzem2
como uma memória que provoca desinquietação.
1 MENEZES, Susana (2004) ―A memória do trabalho e o trabalho da memória: o caso do museu
da industria da chapelaria‖ – introdução à tese de mestrado. Lisboa Universidade Lusófona. 2 A marca museológica é o atributo que faz o acontecimento sobressair para além das rotinas.
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Um outro texto de Mário Moutinho, ―A História do Capuchinho Vermelho‖ dá conta
dessa desinquietação. A partir das personagens da narrativa desta história clássica, o
capuchinho, o lobo mau e a avozinha, Moutinho diz que a museologia, como todos nós,
todos os dias procuramos desempenhar alguns destes papéis. Que ao longo do dia, das
semanas, e da vida, alternamos nessa representação. Essa desinquietação acompanha
igualmente o mundo da museologia. ―Reconhecer isto é no fundo aceitar que no mundo
contemporâneo há um novo
espaço de intervenção condicionado antes de mais pela postura de cada um, em cada
dia.
Uma espécie de interdisciplinaridade da postura bem mais complexa que a sempre
pretendida e mal amada interdisciplinaridade do saber‖. E prossegue com a interrogação
― Se existe um novo desafio na floresta da museologia, em nosso entender, ele não diz
respeito no essencial ao feitio que esta tem, mas sobretudo ao lugar que nela queremos
ocupar e sobretudo a possibilidade de aprofundar e enfim reconhecer que a postura dos
actores é que determina o sentido do trabalho que fazemos. Tanto mais que não
podemos controlar nem sequer condicionar o efeito final da nossa intervenção, que na
verdade acaba por ser longínquo, perverso tantas vezes e alheio às intenções primeiras.‖
E conclui com a seguinte reflexão ―Tanto mais que não podemos controlar nem sequer
condicionar o efeito final da nossa intervenção, que na verdade acaba por ser longínquo,
perverso tantas vezes e alheio às intenções primeira. Na cultura do imediato que
determina as nossas submissões, que raramente reconhecemos e que poucas vezes
rejeitamos, esquecemo-nos que o tempo introduz de certa forma novas condicionantes,
que nos escapam, transformando o rumo procurado, irremediavelmente. O que está na
verdade ao nosso alcance não é mais que a possibilidade de escolher o princípio do
rumo que queremos dar à nossa acção‖.
Estando lançada a inquietação sobre o que a o processo de construção da memória (e do
esquecimento) e sobre a relatividade do processo de acção museológica, ao mesmo
tempo que lança, sorrateiramente, a semente que permite criar a orientação na
desorientação3
a. Memória e museologia
Na sua abordagem sobre a Nova Museologia-Museologia Social fez uma breve
referência ao roteiro fundador. A declaração de Santiago do Chile de 1972 e a
Declaração de Caracas de 1992, a declaração do Quebec de (1984). São declarações que
renovam o pensamento museológico no tempo em que os museus são como catedrais
das grandes narrativas. Os Louvres e as National Gallerys, que um pouco por todo o
mundo europeu glorificavam o poder simbólico do Estado Nação. Eram tempos em que
3 No texto seguinte de Mário Chagas a propósito do chapeuzinho preto da formatura do seu filho
está a solução proposta para a síntese conclusiva ― É preciso a existência de uma imaginação
criadora para que as coisas sejam investidas de memória ou sejam lançadas no limbo do
esquecimento‖. Mas já lá iremos.
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o objecto era rei… e a vitrina era rainha. Tempos de vitrinas ―normalizadas‖ (de marca)
que recebiam muitos objectos, ou que eram feitas à medida dos Objectos. Por vezes
tinham efeitos especiais, com luzes ou com sons. Outras vezes ocupavam locais centrais
para que o olhar não se desviasse. Eram tempos em que o conservador ―fechava o
público dentro da vitrina‖4.
Depois, nos anos 60 os museus libertaram-se tirania da tecnicidade5. Encontraram novos
lugares, criaram outros cenários e adoptaram outras estéticas e outros espaços. O mais
importante passou a ser o homem e a mulher, enquanto sujeitos da sua própria história.
E os objectos passaram a ser narrativas que ilustram os processos … Os museus passam
a ocupar novos espaços dentro das cidades.
Mas se estes são os novos museus, onde estão as novas narrativas, interroga Moutinho.
E pergunta : Mas se Expor é ou deveria ser, trabalhar contra a ignorância,
especialmente contra a forma mais refractária da ignorância: a ideia pré - concebida,
o preconceito, o estereótipo cultural. Expor é tomar e calcular o risco de desorientar -
no sentido etimológico: (perder a orientação), perturbar a harmonia, o evidente, e o
consenso, constitutivo do lugar-comum (do banal). “ Ou seja, não basta que o objecto
seja um ponto de partida para a interrogação, porque, prossegue ―No entanto também é
certo que uma exposição que procuraria deliberadamente escandalizar traria, por uma
perversão inversa o mesmo resultado obscurantista que a luxúria pseudo - cultural. ...
entre a demagogia e a provocação, trata-se de encontrar o itinerário subtil da
comunicação visual.”
A proposta de Moutinho, e da nova museologia parte da interrogação: ―E se os Museus
questionassem “o lugar” dos objectos no imaginário de cada pessoa ?‖. Ou seja porque
é que existem os objectos no museu. Que objectos queremos ter nos museus. A resposta
para isso depende da resposta sobre o tipo de museus que queremos ter.6
―Queremos ter um Museu pronto a consumir, ou museu que nós fazemos de acordo com
as aspirações, nossas e dos outros? É a interrogação que Mário Moutinho lança, porque
da resposta a essa questão depende a construção do museu e, por consequência a aquilo
que esse museu devolve à sociedade7. Ou seja ―TUDO DEPENDE, EM EXCLUSIVO,
DO NOSSO CONCEITO DE MUSEU !!!.....”
4 A posse do objecto conduzia à sua reconstituição e a uma encenação da sua materialidade. A
museologia é dual: é simultaneamente classificativa e interpretativa. As técnicas expositivas dos
museus privilegiam as grandes narrativas, e a exposição é o centro do museu. 5 O objecto é visto com a complexidade do ser humano. A museologia passa e ser dual: é
simultaneamente classificativa e interpretativa. 6 A nova opção museológica volta-se para o individuo. Desenvolve a antinomia entre o
individuo e o objecto. Existem várias dimensões da materialidade. 7 Deverá o museu ser um recurso de ensino e comunicação. Um lugar de lazer, um ponto de
encontro da comunidade, um centro de produção de serviços à comunidade. A questão é saber o
que é que o indivíduo encontra no museu. Existem 5 processos cognitivos. O espaço, a forma , o
cheiro, as cores os sons. Através deles o individuo recebe sensações do mundo exterior. As
sensações produzem estímulos.
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Esta é a questão central da reflexão museal para a qual existem certezas8. A certeza no
processo museal é relativa, porque a acção museológica é uma descoberta permanente.
A característica da descoberta transporta em si a emoção da vivencialidade primeira, do
encontro com o acaso. Do encontro consigo próprio, um encontro narcísico, mas
potenciador da razão porque permite o discernimento entre antinomias (bem/mal
belo/feio).Esta antinomia, juízos, são em sociedade democrática e participativa,
propiciadoras de diálogos: Diálogos que libertam das revoltas contidas, que libertam
sonhos, espantos, desilusões ou locais de enganos porque transformar os museus e s
uma museologia em processos e lugares de esperança, são também locais de vida e de
morte. Processos que são finitos ainda que a memória posse ser infinita.
Concluindo, os novos museus e a nova não diz o que é um museu e como se faz um
museu. Diz que devemos criar a nossa própria ideia de museu (nossa aqui deve ser
entendida como específica da comunidade, porque o museu é um processo
participativo). As certezas que temos são afinal as dúvidas de criar um Museu de
Objectos ou Museu de dúvidas?
b. O Museu entre o Poder e a Memoria
Quais são os desafios actuais dos museus? Como resposta a esta questão Moutinho
elenca o seguinte conjunto de desafios:
Assumirem-se como instituições prestadoras de serviços
Aceitarem a avaliação da Qualidade
Reconhecerem que o mundo está em mudança
Reconhecerem o crescente grau de autonomia dos públicos
Abrir-se ao mundo
Libertarem-se da submissão às colecções
Distinguirem público / utilizadores
Adoptarem os novos recursos de comunicação
Basearem a sua actividade em profissionais qualificados
Em relação ao primeiro item, que é a constitui a sua abordagem teórica mais recente,9
vai procurar ancorar a sua reflexão com o que é referido na declaração de Santiago
(1973): ―Que o museu é uma instituição a serviço da sociedade, da qual é parte
integrante e que possui nele mesmo os elementos que lhe permitem participar na
formação da consciência das comunidades que ele serve; que ele pode contribuir para
o engajamento destas comunidades na acção, (…) engajando-se nas mudanças de
estrutura em curso e provocando outras mudanças no interior de suas respectivas
88
Qual é o local do objecto? Os objectos podem ser construídos? Qual é a distinção entre o
exótico e a arte? Os museus são locais de preciosidades ou de identidades? 9 A premissa de Mário Moutinho é a constatação de que o Estado Financiador este em retirada
da gestão dos equipamentos públicos. É portanto necessário criar um critério de avaliação da
qualidade dos museus. Esses critérios devem ser feitos em função de quê? Dos seus objectivos,
do tipo de instituição ou do tipo de actividades?
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realidades nacionais; ― e mais dizia também: ―Que a transformação das actividades
dos museus exige a mudança progressiva da mentalidade dos conservadores e dos
responsáveis pelos museus assim como das estruturas das quais eles dependem…).
Como e porquê devem as instituições museológicas assumirem-se como instituições
prestadoras de serviços à comunidade?
Isto implica, para Mário Moutinho reflectir sobre o que é ―prestação de serviço‖, e
porque é que na sua abordagem considera a museologia como uma prestação de
serviços10
. Os serviços, são nas nossas sociedades contemporâneas caracterizados pela:
Inseparabilidade, Variabilidade, Intangibilidade e perecibilidade. Estas noções vindas da
economia dos serviços e a sua aplicação à museologia são definidas por Mário
Moutinho da seguinte forma
“Inseparabilidade
Todo serviço tem um momento em que sua produção e consumo são
simultâneos, inseparáveis.
Assim o momento em que o público percorre a exposição é exactamente
o tempo em que a exposição é consumida. Ninguém pode comprar uma
visita a uma exposição para utilizar depois de sair do espaço da própria
exposição.
Variabilidade
Serviços são variáveis. Isto é, os serviços variam e podem variar conforme
o prestador do serviço e o cliente (museu-público).
Neste caso há que assumir que as exposições apresentadas pelos museus
vivem essencialmente na busca contínua do maior denominador comum. A
prestação museal não busca uma customização determinada pelas
necessidades do visitante único. Tal ideia é na verdade escandalosa para a
comunidade museal tanto mais que o paradigma do sucesso de uma
exposição é exactamente a sua capacidade de mobilizar no menor espaço de
tempo o maior número de visitantes.
Intangibilidade
10
A questão do Museu como prestadores de serviços apresenta-se como uma importante
legitimação da função social dos museus. A operação efectuada a partir dos anos sessenta, com
o fim da legitimação das grandes narrativas, ou dos museus como catedrais dos objectos,
levantava a questão social de ―afinal para que serve um museu‖. Aliás se o museu deixa de ter
objectos (colecções) para que é que serve, pergunta o senso comum, pois que embora o senso
comum não saiba exactamente o valor dos tesouros das colecções, acredita em algo que os
especialistas sábios dizem que têm. Essa operação de ruptura com as colecções implica a
reconstrução da legitimidade social do museu como instituição e da museologia como produtora
de ciência social. Mário Moutinho opta pela demonstração do ―valor‖ do serviço.
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O serviço é intangível, isto é, não é palpável. Esta é sua mais evidente
característica.
Em museologia não existe qualquer equívoco relativamente ao carácter
intangível dos objectivos que levam o público aos museus. Ninguém que
visite o Louvre tem como objectivo apropriar-se dos objectos expostos. A
tangibilidade do serviço é consumada num acto distinto da visita
propriamente dita, que é na maior parte das vezes, a passagem pela loja do
museu ou pelos comerciantes que vendem souvenirs no exterior do museu.
Folhetos, catálogos…
Perecibilidade
Serviços são perecíveis, isto é, não podem ser estocados. Assim, são
temporais, prestados num tempo e local precisos.
Paradoxalmente a ideia de perecibilidade parece não afectar o Museu que se
exibe ao longo dos anos e que mesmo sem público pode continuar a
aguardar por um eventual visitante, sem que isso pareça exercer qualquer
pressão sobre a sua adormecida direcção.‖
O inscrever a função social do museu dentro da dinâmica económica dos serviços, não
nos parece que esteja a descaracterizar a componente cultural e social proposta pela
nova museologia. Parece-nos um esforço inovador que vis retirar o mundo dos museus
da dependência
dos poderes
dominantes,
adicionando
argumentos para
uma inserção no
campo das
organizações
democráticas
participativa e
criando condições
para a sua
sustentabilidade
económica. Ou seja, ainda que o museu seja um lugar de memórias, e que a comunidade
assuma o encargo da sua manutenção, tal como mantém espaços públicos e outros
equipamentos sociais, é fundamental para o museu, enquanto equipamento, adquirir
multifuncionalidade social que permitam manter e acrescentar as funções museológicas
de lugares de memórias, de desenvolvimento de processos culturais etc.
Num conjunto de três diagramas Mário Moutinho aborta algumas questões na ordem do
dia: No primeiro caso, inscreve o processo de inovação no interior da relação do Museu.
Assim a inovação surge pelo lado da renovação dos serviços tradicionais, como por
1
MUSEU
Adaptação e melhoramento de serviços tradicionais
Criação de novos serviços
Automatização, videoconferência, gestão de colecções
Segurança, Controle de climatização Museu na Web
Expografia multimédiaGuias Áudio/vídeo
IntangibilidadeInseparibilidade
PerecibiliddeVariabilidade
Inovação
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exemplo a melhoria e modernização das narrativas expográficas, como também vai
surgir pelo lado da criação de novas funções ―novos serviços sociais‖ tal como qualquer
organização prestadora de serviços de 3ª geração
No segundo diagrama vai abordar as questões
da relação entre necessidade dos públicos
versus necessidades das exposições. Ou seja,
face a crescente sofisticação dos meios de
comunicação, tais como as técnicas
cinematográficas e de projecção da realidade
virtual, e do aumento das necessidades dos
consumidores, crescem naturalmente as
necessidades das entidades prestadoras de
serviços. Quer isto dizer que um museu hoje,
já não tem espaço (conceptualmente falando) para a manutenção das exposições
permanentes com técnicas narrativas obsoletas face à concorrência de novas
tecnologias. Não quer isso dizer que um museu tem que deixar de ser o que é, mas tem
naturalmente que encontrar soluções para ser um museu dinâmico, onde o seu público
tenha oportunidade de descobrir qualquer coisa.
Finalmente no terceiro diaporama, Mário Moutinho apresenta a relação do Museu com
o investimento tecnológico. Ou
seja, um museu hoje centrado
em colecções exige um
investimento tecnológico,
financeiro e organizacional
pesado. Um museu centrado
nas necessidades dos públicos
implica um investimento
tecnológico, financeiro e
organizacional mais leve,
implica uma menor
mobilização de recursos e uma
maior mobilização das pessoas. É também um modelo que permite uma melhor
percepção da sua utilidade. Estas são linhas de reflexão que ainda estão a ser
desenvolvidas.
Para fechar a reflexão de Moutinho regressamos à questão do ―Enigma do Chapeuzinho
Preto‖11
. Perante a complexidade dos fenómenos museológicos, a resolução dos
problemas muitas vezes está na sua simplicidade e bom senso. Essa característica
11
INTRODUÇÃO ou o enigma do chapeuzinho preto, (Tese de Doutoramento apresentada na
UNIRIO Rio de Janeiro de Mário Chagas ―Imaginação museal: museu memória e poder em
Gustavo Barroso, Gilberto Freire e Darcy Ribeiro‖), material distribuído na aula.
2
Co
mp
lexi
dad
e p
rod
uto
s
Complexidade serviços
Productos/ exposições
Necessidades dos públicos/utilizadiores
3
Engenharia/ Organização
técnica
ProdutoColecções
Qualidade
Custo
Percepção
Utilidade
Serviços
Necessidades Públicos
Será que temos as competências necessárias ?
Ou não… Ou não …
Hard Soft
MUSEU
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17 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
apresenta-se como única e exclusiva da museologia no âmbito das Ciências Humanas.
Como diz Mário Chagas ao descobrir que o filho atribuía significados de memória aos
objectos com ―A singeleza e a naturalidade das palavras de meu filho mais novo
ganharam em mim uma estranha potência e uma centralidade imprevista, o que me
levou a compreender que muito cedo, antes mesmo do aprendizado das primeiras letras
e dos primeiros números, consolida-se nas pessoas a noção de que as imagens e as
coisas concretas podem ser instrumentos de mediação ou âncoras de memórias,
emoções, sensações, pensamentos e intuições‖
Ou seja mais uma vez recorre à questão de que ‖É preciso a existência de uma
imaginação criadora para que as coisas sejam investidas de memória ou sejam lançadas
no limbo do esquecimento. No entanto, justificar a preservação pela iminência da
perda e a memória pela ameaça do esquecimento parece mais um argumento
tautológico, uma vez que, por essa trilha, deixa-se de considerar que o jogo e as regras
do jogo entre esquecimento e memória não são alimentados por eles mesmos e que
preservação e destruição, além de complementares, estão sempre ao serviço de sujeitos
que se constroem e são construídos através de práticas sociais‖ e essa construção é
uma prestação de serviço, uma função museológica essencial, à qual se podem
acrescentar outras, tantas quanto com isso possam conviver.
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18 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
3.1.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA
MOUTINHO, Mário (2001). Imagem do Indígena na Ideologia Colonial
Portuguesa,. Lisboa: Edições Universitárias Lusófonas.
Este texto de Mário Moutinho, aparentemente, está afastado da sua reflexão
museológica e centra-se essencialmente sobre o estudo do colonialismo português.
Independentemente das várias razões que possam ser alocadas para justificação do
texto, ele interessa-nos, do ponto de vista metodológico, para a abordagem da questão
colonial e em particular da ideologia colonial. A história do colonialismo, quer a sua
ideologia quer a sua prática é uma história trágica, feita com sangue, sofrimento e
desprezo pela integridade humana de milhões de seres humanos em benefício dos
projectos materiais e espirituais de alguns, momentaneamente mais fortes. Essa,
digamos, é a essência da história. No entanto, para que todo esse sofrimento não tenha
sido em vão, cabe à memória manter vivo esse aviso e compreender que mecanismos
foram alocados para essa legitimação.
O relativo desinteresse que o tema colonial mereceu até finais do século XIX, deriva da
maior influência da colónia do Brasil nas contas da metrópole. Findo esse domínio
África até praticamente inexplorada, abre-se como campo potencial da afirmação
colonial. É esta afirmação tardia da apetência colonial que Moutinho vai numa primeira
parte reflectir. Quais são as bases da ideologia colonial, vai encontrar uma justificação
da colonização pela negação do indígena. Estes grupos teóricos da ideologia colonial
afirmam-se no final do Século XIX. A legitimação do colonialismo é feita pela
necessidade de civilizar, aquilo que na época se chama o espírito de missão. Esta missão
civilizadora partia do princípio, que afirmava em textos e nas práticas sociais, que as
culturas indígenas necessitavam de ser civilizadas. Essa legitimação negava a identidade
ao africano. O fraternal convívio entre os colonos e os africanos é um dos mitos mais
recorrentes da legitimação do colonialismo português. Mário Moutinho vai apresentar
vária documentação onde se aborda a questão de que a pertença civilização, mais não é
do que a criação para a obtenção de mão-de-obra barata e dócil, isto é, através da
ruptura com a cosmogonia africana e a sua ―aculturação‖ pela civilização europeia, os
africanos eram colocados na base da pirâmide social, sendo que nessa base lhe estavam
vedados, pelo estigma da cor, a circulação social.
Na segunda parte do livro – Explorar Mário Moutinho vai abordar a construção do
aparelho ideológico do estado colonial, que mobiliza a mão-de-obra indígena e a
colocação serviço do objecto económico. Aborda as questões da condição jurídica do
indígena, a sua condição escolar, os impostos e a sua relação com a economia colonial.
Entre os vários autores estudados salienta-se António Enes Estudos sobre a afirmação
colonial efectuada a partir de textos legislativos, da organização do exército colonial, as
questões do imposto de palhota e do regulamento do trabalho indígena, a política de
implementação de culturas e organização de colónias agrícolas e finalmente a
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19 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
consciência da justificação missão civilizadora através da escola e dos recursos da igreja
católica e suas missões. Como actos fundamentais destas operações de
consciencialização metropolitana, refere-se a criação da Sociedade de Geografia de
Lisboa (1876) que patrocina as iniciativas de Exploração de África. A sociedade civil
complementa a acção do Estado. Conferencias, exposições, festas sobre temas coloniais
e organiza uma biblioteca e um boletim trimestral.
Em 1898 cria-se os serviço de informações coloniais, num período em que as
exposições e museus coloniais se afirmam como componentes desta política de
colonização. Cita o exemplo de, em 1892, as colecções existentes passam para a
Sociedade de Geografia de Lisboa. Criação de museus comerciais em Lisboa e Porto.
Exposição colonial em 1893 no palácio de Cristal Porto e 1906 em Lisboa. Exposições
nas colónias. Cabo Verde (1881), Luanda (1882,1885,1895). A presença nas Exposições
Universais de Londres, 1862, Paris, 1867 e 1900, Antuérpia 1885 e a Exposição
Industrial do Cabo da Boa Esperança 1904, a Exposição Colonial de Paris 1906, I
Congresso Colonial em 1901 e a criação dos Estudos Coloniais que em 1906 dá origem
à Escola Colonial, mais tarde Instituto Superior de Estudos Ultramarinos, como
exemplos desta política.
No posfácio a síntese revela que a visão que os portugueses têm do seu próprio
colonialismo, é segundo Moutinho uma visão etnocêntrica que persiste até aos dias de
hoje. Uma visão do outro essencialmente estereotipado, produzida para justificar a
consciência da colonização e o trabalho ―escravo‖ ou sem dignidade.
Para o nosso trabalho é importante criar um quadro de referenciação sobre os
mecanismos de dominação cultural, para tanto quanto possível, apurar a sua influência
da construção das identidades do outro. Ou seja, nos dias de hoje e no âmbito do nosso
trabalho, não nos interessa tanto a análise do processo de dominação e da sua
conceptualização, mas sim a forma como ele se concretizou, quais os mecanismos de
defesa que os africanos criaram, e de como é que sobre essa dominação mantiveram a
sua identidade e como mobilizaram a sua memória. Admitimos assim, que num
primeiro momento devemos procurar a resposta sobre o que é a identidade africana e
como é que ela se construiu. É também um texto importante para centrar a nossa
reflexão sobre o que é hoje a nossa identidade, nossa no sentido de portuguesa europeia
face ao nosso passado e a forma como alocamos as memórias para construir o futuro.
MOUTINHO, Mário (1994). A Construção do Objecto Museológico, The
Construction of the Museological Object,. Lisboa: Edições Universitárias
Lusófonas.
O texto é o numero 4 dos cadernos de sociomuseologia, e foi o resultado dos trabalhos
pedagógicos e de vário. e contributos sobre Formas e Meios de Comunicação. A partir
dele foi efectuada uma exposição no museu de história Natural (1994) que ilustrava uma
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20 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
―museografia de ideias‖. É igualmente uma edição bilingue. O texto inicia-se com
a citação de Michel Thévoz12
, já acima referenciada:
Mas se Expor é ou deveria ser, trabalhar contra a ignorância, especialmente
contra a forma mais refractária da ignorância: a ideia pré - concebida, o
preconceito, o estereótipo cultural. Expor é tomar e calcular o risco de
desorientar - no sentido etimológico: (perder a orientação), perturbar a
harmonia, o evidente, e o consenso, constitutivo do lugar-comum (do banal). No
entanto também é certo que uma exposição que procuraria deliberadamente
escandalizar traria, por uma perversão inversa o mesmo resultado obscurantista
que a luxúria pseudo - cultural. ... entre a demagogia e a provocação, trata-se de
encontrar o itinerário subtil da comunicação visual. Apesar de uma via
intermédia não ser muito estimulante: como dizia Gaston Bachelard, todos os
caminhos levam a Roma, menos o caminho do compromisso”
É um texto muto forte porque posiciona a abordagem expográfica como uma ferramenta
da museologia social. Ainda que a museologia se tenha recentrado na análise dos
processos da formação da memória dos homens e das comunidades, ou seja que se tenha
deslocado do centro dos museus e das suas colecções para a envolvente, o museu
continua a exercer uma centralidade no espaço. Para a criação dessa capacidade de
atracção é necessários instrumentos performativos, eventos, momentos de tensão e
emoção, serviços. (…) a exposição continua a estar no centro da actividade
museológica, quer se trate da exposição produto ou da exposição processo‖ (pag 6).
A exposição mantêm-se assim como um elemento central da museografia. Ainda que
possam conceptualizar-se museus sem objectos, a museografia torna-se cada vez mais
uma narrativa. Essa narrativa, enquanto processo de comunicação, incide sobre ideias
ou sobre objectos. A museografia trabalha essencialmente com suportes de informação
que incidem sobre objectos herdados. Ou seja há uma carga informacional no objecto, e
a museografia adiciona novas cargas informacionais.
No caso dos objectos, Moutinho segue as características dadas por Ulipiano Bezerra de
Menezes13
:
"Objecto fetiche. - A característica mais comum do objecto na colecção e,
portanto, do papel desempenhado na exposição é sua fetichização. Assim, a
fetichização ou reificação consiste em deslocar atributos do nível das relações
entre os homens e apresentá-los como se eles derivassem dos objectos,
12
Thévoz, Michel (1984). Esthétique et/ou anestesie museographique. Objects Prétextes,
Objects Manipulés, Neufchatel, p. 167 13
Ulpiano Bezerra Meneses (1993). A exposição Museológica: Reflexões sobre Pontos Críticos
na Prática Contemporânea. Texto apresentado para debate " O discurso museológico: um
desafio para os museus, Simpósio "O processo de comunicação nos Museus de Arqueologia e
Etnologia Museu de Arqueologia e Etnologia. Universidade de S. Paulo,
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21 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
autonomamente. Ora, os objectos materiais só dispõem de propriedades
imanentes de natureza físico-química: peso, densidade, textura, sabor,
opacidade, forma geométrica, dutibilidade, etc. etc. Todos os demais atributos
são aplicados às coisas. Em outras palavras: sentidos e valores (cognitivos,
afectivos, estéticos e pragmáticos) não são sentidos e valores das coisas, mas
sentidos e valores que a sociedade produz, armazena, faz circular e consumir,
recicla, descarta, mobilizando tal ou qual atributo físico inerente às coisas (e,
naturalmente, segundo padrões históricos, sujeitos à mudança)...
Objecto metonímico. - A metonímia (figura de retórica em que a parte vale
pelo todo) está presente, com reiterada frequência - e riscos de deformação -
nas exposições antropológicas e, em menor escala, históricas. O objecto
metonímico perde seu valor documental, pois passa a contar com valor
predominantemente emblemático. Imaginar-se que é possível, por intermédio
de peças museológicas, expressar o "sentido" de determinado grupo ou cultura
é ingenuidade em que os museus não poderiam cair: não é possível,
decididamente, "exibir culturas"....Enquadra-se, aqui, o emprego do típico, do
estereótipo, para fins de síntese - sempre redutora e com os riscos já
conhecidos e denunciados, principalmente quando estão em cena objectivos
tão suspeitos e problemáticos, como criar ou reforçar a identidade cultural: as
simplificações sempre mascaram a complexidade, o conflito, as mudanças e
funcionam como mecanismos de diferenciação e exclusão
Objecto metafórico. - O uso metafórico do objecto, numa mera relação
substitutiva de sentido, embora menos nocivo que o anterior, leva igualmente a
exposição a reduzir-se a uma exibição de objectos que apenas ilustram
problemas formulados independentemente deles. Ora, com isto perde-se o que
seria vantagem específica do museu e seu recurso mais poderoso o trabalho
com o objecto. Esta postura revela, assim, uma incapacidade de se defrontar
com o objecto, de explorá-lo em seus próprios termos, em lugar de se
preferirem os suportes verbais não só para formular os conceitos, mas também
para expressá-los: nessa linha, esvazia-se consideravelmente a própria
utilidade do museu.
Esta tendência, reveladora de despreparo, indolência ou desorientação, não é
nova. Já na década de 70 do século passado, George Brown Goode, que foi um
dos grandes directores do Museu de História Natural da Smithsonian
Institution, dizia ironicamente que uma boa exposição didáctica é aquela que
dispõe de uma colecção completa de legendas, caucionada aqui e ali por
amostragens de espécimes naturais....
Objecto no contexto. - A consideração banal e corrente de que o objecto
descontextualizado é objecto desfigurado, tem colocado, legitimamente, a
questão do contexto e a necessidade de introduzi-lo na exposição.
Estranhamente, porém, não se tem visto qualquer esforço na conceituação do
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22 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
objecto. Por isso, tem-se tomado como solução imediata, pronta e acabada, e
mera reprodução do contexto enquanto aparência, isto é, recorte empírico
que, como tal, precisaria ser explicado, pois não é auto-significante. Esta
confusão do dado empírico, do registo documental, com a informação
elaborada, a síntese cognitiva, é responsável por um dos piores vícios
alimentados por bons propósitos sem investimento intelectual. Pelo seu
carácter insidioso e omnipresente, conviria apontar mais claramente as suas
insuficiências e distorções.
A primeira delas é que os objectos têm histórias, trajectórias e não há por
que congelá-los arbitrariamente num de seus vários contextos. Em segundo
lugar, a postura dominante ignora que o processo de transformação do
objecto em documento que é, afinal, o eixo da musealização, introduz
referências de outros espaços, tempos e significados numa
contemporaneidade que é a do museu, da exposição e de seu usuário.... Esta
complexa rede não é gratuita. Deve servir, fundamentalmente, para
prevenir o museólogo contra as ilusões e burlas da contextualização e
cenarização que ele pode indulgentemente construir.
Finalmente, e mais importante que tudo, a reprodução de contextos que são
pura aparência, inverte o papel da exposição na produção de
conhecimento: ao invés de partir destas relações aparentes para romper a
unidade superficial daquilo que é apenas empiricamente verificável, mais
profunda e substancial (embora não sensorialmente perceptíveis mas
visualizáveis na exposição), ao invés deste esforço crítico e criativo, a
exposição já de início reforça aquilo que a acção imediata dos sentidos
pode fornecer, mascarando as articulações invisíveis porém
determinantes".(pag.7 e 9)
Outros autores referem-se também à estranha ilusão do objecto documento vitrificado.
Posta assim a sua problemática , Mário Moutinho parte da premissa que ―A museografia
de que vamos falar parte do princípio de que é possível existir uma museografia em que
o objecto não seja herdado mas sim criado‖ (pag. 10). Ou seja a hipótese e de que a
museografia é um meio de comunicação. Será a análise comunicacional que poderá
inovar a potencialidade da FORMA, criada do objecto (e não a forma herdada). Deste
forma a museografia coloca-se ao serviço da interpretação. ―"A percepção da obra de
arte não se baseia num processo de reconhecimento, mas de compreensão. A obra de
arte, é o possível e o provável; ela nunca é a certeza"14
.
A titulo exemplificativo, Mário Moutinho vai procurar demonstrar através da escultura,
disciplina que trabalhar a FORMA, de que modo a museologia pode recolher
contributos de inovação e criatividade para cumprir os seus objectivos. Da
representação por mimetismo à procura de texturas, a escultura percorreu vários
14
Pierre Francastel, L'image, la vision et l'imagination, Denoel/Gonthier, Paris, 1983, p. 42
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23 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
caminhos ao longo do século XX. Pelos anos 60, várias reflexões apontavam para a
importância do espírito que está dentro delas.
“o corpo humano apesar do realismo ou mesmo do hiper realismo com que
é representado só assume verdadeiramente significado pela intenção, ou
pela composição em que é exibido. O olhar dos personagens mesmo quando
não representado fisicamente dá o verdadeiro sentido à obra (…) (pag. 12).
Ou seja, lentamente o olhar sobre as coisas, passou a ser um olhar da relação das coisas
com o seu produtor enquanto personagem dum tempo. Ou seja é necessário entender a
intencionalidade. O gesto que incorpora significados. Por essa razão, na museologia,
―Nestes termos o desafio que se coloca é o de introduzir no museu o utensílio da forma
(não herdada, mas construída como obra de arte entendida nos sentidos referidos)
como suporte para a comunicação das ideias” (pag 16).
Ou seja, é necessário que a museografia perca o seu carácter ―primitivo‖, a sua narrativa
básica dum discurso pedagógico e bem-intencionado, para se assumir como uma
ferramenta de intervenção, de formação de consciência e de motivação para a acção.
“A renovação da escrita museográfica implica pois (para lá da função que
se pode atribuir à exposição e da forma como é concebida) a adopção de
uma linguagem mais eficiente e aberta, ocupando um lugar semelhante ao
da obra de arte.
Ao chegarmos a este ponto podemos conceber um museu que dotado de
processos, participativos ou não, e de saberes específicos, exponha ideias
para consumo privado ou público através de formas significativas que
apelam ao saber à emoção e aos sentidos e à memória de quem com elas é
confrontado. Um museu onde o discurso se liberta das amarras das
colecções e que por isso mesmo não pode ser entendido como mais um
Museu de Arte” (pag.17-18)
A partir destas premissas foram elaborados vários objectos museográficos e construída
uma grelha de análise de objectos, individualmente em várias escalas ou em conjunto,
inter-relacionados. Estes dois campos extremos balizam ―o itinerário subtil da
comunicação visual‖ (pag 18). As conclusões podem encontrar-se num vocabulário
mínimo de cinco oposições: linear/pictórico, frontalidade/profundidade, forma
fechada/forma aberta, multiplicidade/ unidade, claridade/obscuridade.
Ou seja, a iconicidade dos objectos deverá igualmente transparecer nos discursos
narrativos das exposições. E aqui emerge uma crítica às técnicas museográficas
tradicionais, da museografia tradicional, que não olham para o atributo do conjunto das
imagens dentro do próprio espaço. Fazem uma leitura linear, icónica, dos seus objectos
aprisionado se nas suas vitrinas. Dado o valor simbólico dos museus como
representantes de uma ideologia, a formação do espaço museográfico condiciona a
linguagem da obra e consequentemente o seu processo de comunicação. Esse é um
elemento que deve estar presente na construção da imaginação.
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"Longe de ser um registo mecânico de elementos sensórios, a visão prova
ser uma apreensão verdadeiramente criadora da realidade imaginativa,
inventiva, perspicaz e bela....Toda a percepção é também pensamento, todo
o raciocínio é também intuição, toda a observação é também invenção. A
forma de um objecto que vemos, contudo, não depende apenas de sua
projecção retiniana numa dado momento. Estritamente falando, a imagem é
determinada pela totalidade das experiências visuais que tivemos com
aquele objecto ou com aquele tipo de objecto durante toda a nossa
vida15
"(pag, 21)
Ou seja o museu ideal de Mário Moutinho seria aquele em que se conseguisse conciliar
a intenção e a forma. Aquele que mobiliza-se a memória para a criação da matriz do
imaginário, ―que em última análise condiciona o criativo‖ (pag.21)
MOUTINHO, Mário (1993) "Sobre o Conceito de Museologia Social",
Cadernos de Sociomuseologia, Revista Lusófona de Museologia, pp. 5 - 7.
Este artigo de abertura dos ―Cadernos de Sociomuseologia‖, de 1993 é um texto que
baliza a questão teórica que motiva a abordagem da Nova Museologia ou Museologia
social.‖ O conceito de Museologia Social, traduz uma parte considerável do esforço de
adequação das estruturas museológicas aos condicionalismos da sociedade
contemporânea”. Ou seja partindo duma análise duma realidade museológica, de
museus voltados para os seus objectos, Moutinho propões uma abertura à realidade
exterior. Á comunidade. Não se trata, naturalmente, de uma ideia exclusiva do autor, ele
insere-se dentro dum movimento mais vasto, que de seguida Moutinho referencia. E cita
a propósito as palavras de Frederic Mayor na XV Conferencia Geral do ICOM (1991),
na altura Director Geral da UNESCO. Uma legitimação do discurso pela exemplificação
da sua adopção pelo‖ poder‖ das instituições. Moutinho fala para a comunidade.
O momento de génese da adopção do discurso institucional16
dá-se em Santiago
do Chile, nos democráticos anos de Allende, quando o ICOM declara: ―Que o museu é
uma instituição ao serviço da sociedade da qual é parte integrante e que possui em si
os elementos que lhe permitirem participar na formação da consciência das
comunidades que serve; que o museu pode contribuir para levar essas comunidades a
agir, situando a sua actividade no quadro histórico que permite esclarecer os
problemas actuais, ...
Que esta nova concepção não implica que se acabe com os museus actuais nem que se
renuncie aos museus especializados mas que pelo contrário esta nova concepção
permitirá aos museus de se desenvolver e evoluir de maneira mais racional e mais
15
Francesco Polí, Artistes et Musées, Archicrée, nº 246, Société d'Edition et de Presse, Paris,
1992, p. 112. 16
Para efeitos de análise da história da Museologia Social, interessará distinguir entre as
práticas que operacionalizam essa ―abertura ao mundo‖, que são bastante anteriores, embora se
generalizem no pós-guerra e a sua adopção por parte das instituições. Esta legitimação do
discurso é importante para o movimento para demonstrar, face aos defensores duma museologia
dita ―tradicional‖ a força dos movimentos das ideias.
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lógica a fim de se melhor servir a sociedade... Que a transformação das actividades do
museu exige a mudança progressiva da mentalidade dos conservadores e dos
responsáveis dos museus assim como das estruturas das quais eles dependem;”.(pag 1)
Essa vontade irá ser sucessivamente reafirmada, o que é naturalmente
importante para o crescimento da ideia, salientando Moutinho, a avaliação de Hugues de
Varine, em 1992, em Caracas, sobre os 20 anos dessa declaração fundadora. ― A
abertura do museu ao meio e a sua relação orgânica com o contexto social que lhe dá
vida tem provocado a necessidade de elaborar e esclarecer relações, noções e conceitos
que podem dar conta deste processo‖ . Portanto, instalada a renovação do pensamento é
necessário reavaliar os processos, as operações que dele decorrem. Vejamos o que é que
Mário Moutinho utiliza para justificar. ― O alargamento da noção de património, é a
consequente redefinição de "objecto museológico", a ideia de participação da
comunidade na definição e gestão das práticas museológicas, a museologia como factor
de desenvolvimento, as questões de interdisciplinaridade, a utilização das "novas
tecnologias" de informação e a museografia como meio autónomo de comunicação,
são exemplo das questões decorrentes das práticas museológicas contemporâneas e
fazem parte de uma crescente bibliografia especializada17
.
Estamos em 1993 e as palavras-chave sublinhadas serão as preocupações de futuro que
surgirão nos textos seguintes. Note-se a ausência da ―museologia como prestação de
serviço, que é uma preocupação mais recente. (ver quando surge)
O texto prossegue com uma listagem dos principais acontecimentos em Portugal que
retratam a evolução da Museologia Social, na maioria dos casos enquadrada pelos
princípios do MINOM (Movimento Internacional para um Nova Museologia), da
participação desses eventos da uma comunidade alargada de agentes sociais. È um
testemunho do vigor e que vai justificar a última das consequências dessa renovação,
factor essencial para a sua consolidação, reprodução e legitimação pela comunidade
académica : a Formação. ‖ pois neste contexto nacional e internacional, que a formação
no domínio da museologia, deve ser entendida como um factor fundamental no
desenvolvimento das nossas estruturas museológicas‖ (pag.2).
Será essa uma das intervenções mais relevantes de Mário Moutinho, que conseguirá
anos mais tarde elevar a Museologia ao estatuto de ―Doutoramento‖, simbolicamente
iniciados com Gilberto Gil em 2008.
MOUTINHO, Mário (2004) "Os compromissos dos Museus com a Sociedade‖
,in Musas, nº 1, 2004, Setúbal, pp. 11-14
17
O sublinhado é da nossa responsabilidade
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Neste texto, que serve de apresentação a uma nova Revista, regional, sobre museologia,
Mário Moutinho faz uma reflexão sobre o compromisso entre a liberdade de acção do
pensamento crítico e os museus.
A questão da existência e sobrevivência dos museus determina em grande parte a sua
acção social, o seu compromisso com a comunidade. Mário Moutinho classifica este
compromisso em quatro pontos: os museus comprometidos consigo próprios, com os
seus donos, com a indústria cultural e com o desenvolvimento e a cidadania.
O primeiro caso representam museus ―bem comportados‖ que abrem as portas
regularmente, não agitam as águas ou museus que existem para satisfazer outras
necessidades (por exemplo operações imobiliárias). São Museus que, liminarmente
deviam ser encerrados, assume Moutinho.
O segundo caso, os museus de memórias e esquecimento, são museus comprometidos
com processos políticos vinculados às lógicas do poder. Neles há mais esquecimento do
que memória. Citando os trabalhos de Mário Chagas18
―A tendência para a celebração
da memória do poder é responsável pela constituição e acervos e colecções
personalistas e etnocêntricas, tratadas como se fossem a expressão da totalidade das
coisas e dos seres ou a reprodução museológica do universal, como se pudessem
expressar o real em toda a sua complexidade ou abarcassem sociedades através de
esquemas simplistas dos quais o conflito é banido” São museus do poder, para o poder,
normalmente em locais de poder.
O terceiro grupo, os museus comprometidos com as industrias culturais, são aquelo tipo
de museus que acolhem as grandes exposições, que produzem grandes eventos e que
vivem, para a produção de eventos. Estes museus de ―vernissage‖ são redundantes em si
mesmo. A sua lógica é de reprodução do capital (porque transformam os subsídios em
capital) e ―a lógica dos bens produzidos sai da esfera da cultura crítica, para se
comprometer com a própria lógica do ―capital ― através da actividade de um número
crescente de empresas criadas no exterior dos museus, para desespero de muitos‖(pag.
13).
Finalmente o quarto e último grupo de museus, os que se comprometem com o
desenvolvimento e com a cidadania. Aqui considera Moutinho dois subgrupos. Os que
se comprometem de forma clandestina, com acções e discursos escondidos, e aqueles
que assumem o seu compromisso social. E, a propósito disso cita a Política Nacional de
Museus do Brasil.
Em conclusão diz Moutinho “não é fácil falar em compromisso públicos dos museus,
pois esses compromissos estão dependentes de inúmeros factores. O que importa em
nosso entender é reconhecer que “a parte da cultura” que existe em cada museu toma
18
Chagas, Mário (2002),‖ Memória e Poder: Dois Movimentos‖, in Cadernos de
sociomuseologia, nº 19, Lisboa, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias.pp.
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novas formas e lugares, e, por isso a acção museológica assume novas formas que já
não podem ser analisadas pelas definições dos nossos antepassados” (pag .14)
MOUTINHO, Mário (1996) ―museologia informal‖ , in Boletim APOM II
Série nº 3 , pp. 22 - 24.
Neste artigo, já com alguns anos Mário Moutinho aborda o panorama da profunda
renovação da museologia em Portugal. Desde 1974 multiplicaram-se os museus e as
incitativas museológicas. Os modelos e as propostas são das mais diversas
tipologias e na maior parte dos casos, a museologia apresentada nem sempre é rica,
tecnicamente correcta. Mas foi todo um processo que mobilizou comunidades,
saberes e acções e que produziram alterações no panorama cultural do país. O valor
dessa museologia deve ser assumido, como diz Mário Moutinho.
“Não ser uma museologia da ruptura ou marginal não significa que se
estruture e se fundamente à imagem da museologia tradicional e urbana. Pelo
contrário esta NOVA MUSEOLOGIA que resulta das novas condições de
produção do discurso museológico e que por isso integra o saber museológico
acumulado ao longo de gerações, demonstra nas suas diversas formas uma
consciência mais clara da ideia de participação e provoca uma implicação
social mais evidente‖(pag. 1)
Esta museologia, que Mário Moutinho chama de informal é considerada uma
reacção de adequação das estruturas museológica à evolução da sociedade
“Estamos pois a falar de uma museologia informal que se enquadra no
conceito mais amplo de MUSEOLOGIA SOCIAL o qual traduz uma parte
considerável do esforço de adequação das estruturas museológicas aos
condicionalismos da sociedade contemporânea”(pag.2)
Esta evolução estava já anunciada nas várias declarações constitutivas do MINOM.
Ou seja, estes novos museus e esta museologia informal é susceptível de ser um
factor de modernização dos museus tradicionais. Essa modernização passa
essencialmente pela sua abertura à comunidade
“Julgamos que a urgência esta antes de mais na abertura do museu ao meio
no estudo da sua relação orgânica com o contexto social que lhe dá vida factos
que têm provocado a necessidade de elaborar e esclarecer novas relações,
noções e conceitos que podem dar conta deste processo.” (pag 3)
Esta museologia informal tem também constituído uma museologia susceptível de
produzir uma importante inovação nos discursos e nas práticas museológicas e a na
busca de novos caminhos para a museologia. Implica essa situação um conjunto de
desafios para o ensino da museologia. Como diz Moutinho, mais do que ensinar
técnicas o desafio é ensinar a ler a pensar e a participar.
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“O maior desafio do ensino da museologia em Portugal não é o de ensinar
aquilo que consta dos manuais de museologia mas sim dotar os futuros
museólogos de meios que lhes permitam situar-se e agir num contexto de
mudança social que percorre todos os aspectos da sociedade
contemporânea”(pag.4)
Este foi o desafio lançado por esta museologia informal, o de obrigar a pensar qual o
local que a museologia ocupa, e qual o papel dos actores e sua influencia no que faz a
museologia. Ou seja a narrativa museológica, com a museologia informal salta
definitivamente da esfera da erudição para se inscrever na esfera da participação e da
cidadania.
Como reflecte Moutinho, ao museólogo cabe hoje uma responsabilidade de lançar o
desafio para uma viagem que não sabe como acaba. ―O que está na verdade ao nosso
alcance não é mais que a possibilidade de escolher o princípio do rumo que queremos
dar à nossa acção.‖ (pag, 6).
MOUTINHO, Mário ( 2007) Definição evolutiva de Sociomuseologia ,
proposta para reflexão apresentada no XIII Atelier Internacional do MINOM,
Lisboa - Setúbal
Trata-se dum importante texto teórico que procura reflectir sobra definição de
sociomuseologia como uma ciência ―maior‖ em permanente actualização. Ciência
―maior‖ porque não se caracteriza pela reivindicação dum objecto de estudo, mas
pela relação das várias áreas do conhecimento mobilizadas para a intervenção sobre
os patrimónios e as múltiplas identidades e heranças.
Essa definição resulta da evolução da museologia como adequação às alterações da
sociedade contemporânea. Diz Mário Moutinho
“A Sociomuseologia traduz uma parte considerável do processo de
adequação das estruturas museológicas aos condicionalismos da sociedade
contemporânea.
A abertura do museu ao meio e a sua relação orgânica com o contexto social
que lhe dá vida, têm provocado a necessidade de elaborar e esclarecer
relações, noções e conceitos que podem dar conta deste processo”
Enquanto ciência a museologia caracteriza-se hoje por: ser uma área de ensino e
investigação. Uma área de acção social com uma abordagem multidisciplinar, com
outras ciências humana, com as ciências do desenvolvimento, do planeamento do
território serviços e da economia dos serviços. Nesse sentido a museologia afirma-se
como um recurso de desenvolvimento, susceptível de alocar a herança patrimonial e
a memória que se inscrevem no cento da cultura da comunidade.
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A própria conceptualização da sociomuseologia tem evoluído com o tempo
acompanhando a crescente globalização do mundo e a complexificação das relações.
Neste sentido, as várias declarações sobre a museologia vêm articular o pensamento
local com o global, numa reflexão mobilizadora e propiciadora da acção.
A sociomuseologia está hoje empenhada em: 1, nas questões da valorização do
património cultural; 2- nas questões do desenvolvimento; 3 – nas questões da
mudança permanente das sociedades; 4- nas questões da economia dos serviços,
formalizando a organização museológica como uma organização com valor social e
5, a formação avançada de recursos humanos.
Estes cinco campos da actual actuação da sociomuseologia é uma definição proposta,
ambiciosa nos objectivos, mas ajustada em função dos conteúdos de produção de
sentido social.
E termina Mário Moutinho com a sua proposta:
“E é exactamente para esta realidade, fruto da articulação de áreas do saber que
cresceram por vezes fora da museologia mas que progressivamente se tornaram
recursos incontornáveis para o desenvolvimento da própria Museologia, que a
definição de se revela poder ser um contributo que ajuda a compreender processos
e definir novos limites.
Assim entendida a Sociomuseologia assume-se como uma nova área disciplinar
que resulta da articulação entre as demais áreas do saber que contribuem para o
processo museológico contemporâneo. Entre o paradigma do Museu ao serviço das
colecções e o paradigma do Museu ao serviço da sociedade está o lugar da
Sociomuseologia.”
O documento anexa ainda vários documentos esclarecedores dos argumentos
utilizados no texto, entre as quais se salienta a Declaração de Quebec de 1984, parte da
Política Nacional de Museus do Brasil, de 2003, e a Declaração de Salvador de 2007.
MOUTINHO, Mário (2008) Museus com Instituições Prestadoras de
Serviços, documento distribuído no seminário, 16p.
Este texto reflecte as mais recentes preocupações teóricas no âmbito da Museologia de
Mário Moutinho. Aliás na distribuição do texto o autor refere que a sua reflexão ainda
prossegue. Nas suas linhas gerais a componente de análise apoia a sua exposição
durante o seminário. No texto, no entanto, ficam mais claras as problemáticas, como
igualmente a suas conclusões relativas às alterações nas organizações museológicas no
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30 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
âmbito da introdução das NTIC (Novas Tecnologias de Informação e Comunicação). O
texto é ainda apoiado por dois textos anteriores. 19
Na abordagem, Mário Moutinho considera que abordar a organização do museu como
entidade prestadora de serviços é uma noção de difícil entendimento. Durante a sua
argumentação vai demonstrar a validade e a oportunidade dessa abordagem, defendendo
mesmo a necessidade da sua adopção como estratégia de sobrevivência, face à evolução
global das sociedades20
.
A sua reflexão sobre a abordagem dos serviços inicia-se com uma reflexão sobre a
adequabilidade da definição de Museu do ICOM e a economia dos serviços. :
―É assim um paradoxo que a instituição MUSEU não se reconheça na
generalidade como entidade prestadora de serviços apesar de se definir como
―instituição permanente, sem fins lucrativos, ao serviço da sociedade e aberta ao
público que adquire, conserva, estuda, expõe o património material e imaterial da
humanidade para fins de estudo, educação e lazer”. (pag 1)
Diz Mário Moutinho que as funções adquirir (que substitui a anterior referencia de
coleccionar) e conservar é uma actividade que se situa na esfera da produção, e estudar
e expor, são actividades que se encontram na esfera dos serviços. Esta contradição não
ajuda a clarificar e a melhorar o desempenho dos museus em sociedades competitivas.
Dedica de seguida algumas linhas para referir algumas abordagens teóricas ao conceito
de inovação em serviços. Moutinho refere três linhas de reflexão: A
perspectiva”tecnologista‖, que assenta na produção e introdução de novos
equipamentos e funções; a ―servicionista‖ que procura inovar a partir dos seus próprios
recursos internos e uma terceira perspectiva, ― integradora” que resulta da integração
das duas anteriores. Decorrente destas perspectivas não existe uma uniformidade de
conceitos para ―serviços‖ que abarque a totalidade dos aspectos. Há no entanto, na
literatura da especialidade um acordo em relação às categorias de intangibilidade (o
produto não pode ser apropriado para consumo posterior). No caso dos museus podem
ser criados produtos complementares que permitam registar emoções, visões,
documentar através de estudos ou catálogos, fotografias, gravações. Mas a visita um
momento único.
19
MOUTINH0, Mário C. (1989) ―Reflexões sobre a função social do Museu‖ in Museus e
Sociedade, Cadernos de Património nº 5, Museu Etnológico de Monte Redondo, e
MOUTINHO, Mário C. (2005) ―Os compromissos dos museus com a sociedade‖ in MUSA,
Museus, Arqueologia & outros Patrimónios; Fórum Intermuseus do Distrito de Setúbal nº 1,
2005 20
Aqui Mário Moutinho referes a evolução da organização social eurocêntrica, onde
tendencialmente a economia de serviços gera a maioria dos postos de trabalho, é a maior
geradora de valor acrescentado e a que mais contribui para o PIB. No âmbito da problemática da
museologia em África, como instrumento de desenvolvimento, esta poderá constituir uma
importante problemática a abordar na nossa tese.
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31 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Depois descreve as quatro características dos serviços: Inseparabilidade, Variabilidade,
Intangibilidade e perecibilidade. Para além de definir estas quatro características,
Moutinho aborda-as em contexto da organização museológica.
“Inseparabilidade
“Essa característica aponta para a seguinte questão: todo serviço tem um
momento em que sua produção e consumo são simultâneos, inseparáveis. Assim,
ao mesmo tempo que um professo produz a sua aula, esta é consumida pelos
alunos. Ao mesmo tempo que um médico produz sua consulta, o paciente a
consome, como cliente do serviço. Nesses exemplos, produção e consumo são
simultâneos, diferentemente de uma empresa de produtos, em que claramente
existe um momento de produção e um momento de consumo. (pag 4)
No caso do museu afirma ―Assim o momento em que o público percorre a exposição é
exactamente o tempo em que a exposição é consumida. Ninguém pode comprar uma
visita a uma exposição para utilizar depois de sair do espaço da própria exposição‖.(pag
4). Mais na sua reflexão afirma que existe um tempo de avaliação, tempo esse que
constitui para a noção de ―valor‖ percebido. ―Na verdade cada museu tem um tempo de
crédito para confirmar junto de cada visitante que a opção da visita foi correcta e que a
relação preço /qualidade é positiva‖.Esta percepção de valor, de tempo finito, não
constitui ma preocupação das organizações museológicas. Ora, na economia dos
serviços, qualquer vendedor sabe que a venda é feita no primeiro momento. No contacto
inicial, onde se predispõe para a troca, e logo de seguida na percepção da utilidade/valor
do produto. São dois momentos de um processo. Em que 1 gera-se empatia, 2 mostra-se
valor. De seguida 3 fecha-se o negócio, ou seja produz-se satisfação do cliente. Na
maioria dos museus isto não se verifica
Variabilidade
Serviços são variáveis. Isto é, os serviços variam e podem variar conforme
o prestador do serviço e o cliente (museu-público). (…)O prisma positivo
da variabilidade é que ela permite a customização, a personalização, o
atendimento diferenciado às expectativas de grupos de clientes. (…) O lado
negativo da variabilidade é que ela torna difícil o estabelecimento de um
padrão de serviço, de uma performance padronizada, imune a erros. (pag.
6)
E, prossegue Moutinho em relação aos museus ―Neste caso há que assumir que as
exposições apresentadas pelos museus vivem essencialmente na busca contínua do
maior denominador comum ― (ibidem). Ou seja, nos nossos museus não embora existam
uma oferta para públicos específicos, (por exemplo públicos escolar) o serviço de
exposição não é executado em função do visitante, mas sim duma ideia preconcebida
que procura o maior denominador comum, na busca do indicador de sucesso, maior
número de visitantes/ano.
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Ou seja o museu ainda procura formatar o circuito dos visitantes, da sua experiencia
museal, quer ao nível dos movimentos, quer ao nível dos documentos
(informação/legendas), recusando a diferenciação das necessidades do público, que de
resto não parece quer reconhecer21
Intangibilidade
“ O serviço é intangível, isto é, não é palpável. Esta é sua mais evidente
característica. Contudo, é preciso, aqui, fazer um alerta: embora seja
essencialmente intangível, todo serviço possui diversos elementos
tangíveis., palpáveis, perceptíveis. (…) Dizemos mesmo que uma das
técnicas de marketing de serviços é justamente tangibilizar o serviço., isto
é, tornar visível o invisível, evidenciar aquilo que o serviço promete.(…)
Na verdade, os elementos tangíveis do serviço, que podem mesmo ser as
pessoas que nele trabalham, cumprem o papel de reduzir o nível de dúvida
sobre a qualidade do serviço. É que, como se diz com frequência, todo
serviço é a compra de uma promessa. (…)
Neste ponto, é preciso mais um alerta: os elementos tangíveis de um serviço
estão na esfera do parecer e não do ser, isto é, eles cumprem o papel da
sedução, da transferência da confiança. Somente o próprio serviço é que irá
validar a promessa, e então iremos não apenas parecer, mas também ser
um serviço de alta qualidade. (pag 8)
Aqui Moutinho afirma: ―Em museologia não existe qualquer equívoco relativamente ao
carácter intangível dos objectivos que levam o público aos museus. Ninguém que visite
o Louvre tem como objectivo apropriar-se dos objectos expostos‖ (pag 9) e prossegue.
―A tangibilidade do serviço é consumada num acto distinto da visita propriamente dita,
que é na maior parte das vezes, a passagem pela loja do museu ou pelos comerciantes
que vendem souvenirs no exterior do museu‖ (ib idem). E adverte que a preocupação da
construção do cenário têm estado no centro das preocupações museológicas. Se o ―acto
de parecer é o que credibiliza a proposta‖ o cenário concretiza-a. Essa é um carácter
intangível que associal o acto da visita ao espectáculo do lazer. E é neste ponto que as
NTIC têm contribuído para a renovação da narrativa. E têm sido estes os museus que
mais aderência e visibilidade têm vindo a obter junto dos públicos, regalando os museus
pobres em tecnologia para uma museologia obsoleta22
.―Comparados com estes, os
21
Uma experiencia interessante de observar são as experiencia dos Centros ―Ciência Viva‖.
Estes centros, que procuram criar ―ciência‖ a parti do estimulo ao visitante, têm como
paradigma, na sua génese, a total liberdade de usufruto do espaço e dos equipamentos para a
realização das actividades desejadas. Nem sempre esse conceito tem sido implementado com
eficácia. 22
É um interessante tema de reflexão. Por exemplo na visita de estudo a São Paulo, a visita a
dois museus com elevada carga de NTIC, o museu do futebol e o museu da língua portuguesa,
numa avaliação preliminar mostram que não basta a NTIC para alcançar o efeito desejado. Há
efectivamente a necessidade de mediação da museologia. Por outro lado o Memorial da
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museus tradicionais de objectos passivos de pintura, de numismática, de mobiliário, de
arqueologia ou mesmo contendo tudo isto e mais alguma coisa nas suas exposições, são
de facto cada vez mais, os parentes pobres da museologia‖ (pag. 11).
Perecibilidade
“Serviços são perecíveis, isto é, não podem ser estocados. Assim, são
temporais, prestados num tempo e local precisos. O que essa característica
gera para o marketing de serviços? Uma pressão e uma necessidade de
encontrar um ponto óptimo entre a oferta e a demanda do serviço. Ou seja,
o grande problema é como administrar a demanda de um serviço.(…) o
problema é que haverá momentos de altíssima demanda e outros de
pequena demanda. Em todos eles, contudo, persistirá um alto custo fixo,
que a empresa precisa procurar vender pelo menos ao nível do seu ponto de
equilíbrio operacional. Assim, encontrar o ponto óptimo entre oferta e
demanda é crucial em serviços para não ocorrer um problema comum em
serviços, que tanto pode ser não conseguir atender o excesso de demanda (e
perder clientes em função disso) quanto ter que suportar pesados custos
operacionais sem a demanda correspondente” (pag 11)
Sobre este item reflecte Mário Moutinho a imperiosa necessidade de se trabalhar com o
tempo, com a construção permanente de actividade (o calendário de eventos) para
marcar uma permanente tensão sobre o apelo à visita. Os museus não podem continuar a
ser, anos a fio, locais adormecidos. É demasiado caro para as nossas cidades a
manutenção destes equipamentos.
De seguida Moutinho, num esforço para inscrever este texto no âmbito da sua produção
teórica sobre a ―os compromissos dos museus com a sociedade‖ recorre-se do texto
publicado de 2005. A produção de eventos tem algo de transitório. O museu deverá
saber inscrever a sua produção expográfica no âmbito da sua função social. Assim, o
museu deverá ―fugir‖, defende Moutinho da lógica do ―Espectáculo‖ de capital (as
industrias do espectáculo) e manter a sua postura no âmbito da ―cultura crítica‖. ―A
transitoriedade, o sensacional, o espectacular, a raridade dos eventos, funciona como
precipitadores do processo de produção e de circulação na indústria cultural. Aqui a
lógica dos bens produzidos sai da esfera da cultura, da cultura critica, para se
compromissar com a própria lógica do ―capital‖ através da actividade de um numero
crescente de empresas criadas no exterior dos museus, para desespero de muitos! (pag
13.)
Finalmente aborda a questão da introdução das NTIC. De acordo com a sua reflexão
elas podem propiciar uma dinâmica de inovação e essencial à sua renovação. ―A análise
das relações entre inovações tecnológicas, organizacionais e comerciais e o papel de
cada um destes tipos de inovação sobre o desempenho dos museus permite compreender
Resistência, com um incorporação baixa de NTIC apresenta um nível de emoção muito forte
exactamente pelo trabalho museológico efectuado.
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como os museus podem estabelecer uma dinâmica de inovação contínua necessária à
sua sobrevivência. ― (pag 15).
E conclui com esses desafios. Trata-se de uma reflexão ainda em curso. No texto sente-
se que ainda existem domínios para reflectir. Mas globalmente parece positivo passar a
olhar para a organização museológica como uma organização prestadora de serviços.
Através dos serviços prestados poderá viabilizar a sua existência, acrescentar
sustentabilidade á sua actividade e tornar-se um espaço de memoria e liberdade da
comunidade.
MOUTINHO, Mário (2008) "As fronteiras interiores dos museus ",Documento
da Intervenção no 2º Encontros Transfronteiriço de Museologia ―A função social
dos Museus‖ , Museu de Cáceres, Dezembro, 4 p.
Neste texto, apresentado no congresso sobre a ―função social dos museus‖, Mário
Moutinho, a partir do conhecimento da realidade, lista três domínios onde o Museu se
mantém imune aos movimentos da sociedade.‖Domínios há em que os museus se
matem obstinadamente insensível às mudanças da sociedade e por isso mesmo, vão
aprofundando o fosso que separa uma parte considerável da museologia da sociedade
envolvente‖ (pag 1). São eles: manutenção da dependência da colecção, não
reconhecimento do público, e o desfasamento do quotidiano.
De seguida elabora as premissas que justificam a necessidade, de na organização e na
operação dos museus se ultrapassarem essas situações.
No domínio da dependência das colecções afirma que, embora, em muitos museus se
compreenda a dependência desse elemento gerador, cita Michel Thevoz a propósito da
necessidade do discurso expografico dever ser um acto ―contra a ignorância‖ ou seja
deverá ser um acto libertador 23
“Expor é ou deveria ser, trabalhar contra a ignorância,
especialmente contra a forma mais refractária da ignorância: a ideia pré - concebida,
o preconceito, o estereótipo cultural. Expor é tomar e calcular o risco de desorientar -
no sentido etimológico: (perder a orientação), perturbar a harmonia, o evidente, e o
consenso, constitutivo do lugar-comum (do banal). No entanto também é certo que uma
exposição que procuraria deliberadamente escandalizar traria, por uma perversão
inversa o mesmo resultado obscurantista que a luxúria pseudo - cultural. ... entre a
demagogia e a provocação, trata-se de encontrar o itinerário subtil da comunicação
visual.”24
A solução para ultrapassar essa dependência das colecções é encarar os
museus como ―um local de comunicação‖ Ou seja, o museu e a museologia devem levar
para dentro do museu o mundo exterior. Não é necessário que o museu deixe de ter
colecções.
23
Tema abordado durante os seminários. 24
Cita Michel Thevóz in Esthétique et/ou anestasie museographique, Objects Prétextes, Objects
Manipulées, Neufchatel, 1984, p. 167
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35 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
É preciso que essas colecções, construídas ou herdadas, mostrem o mundo exterior. Os
seja trata-se de encarar a actividade do museus como um local de comunicação. Um
local onde uma mensagem é transmitida e um local onde acontece uma narração ―E se
assim for, teremos de considerar a expografia como tudo o que diz respeito ao museu da
expografia entendida como uma escrita, de algum modo inovadora, como sendo esse
meio de comunicação‖( pag 2). Com esta reflexão Moutinho completa o seu ciclo de
inovação da museologia. Deixa de haver uma distinção entre museologia tradicional e a
nova museologia, para existir uma museologia arcaica face à Museologia.
Ou seja, colocar os objectos numa sala, para mostrar uma colecção, só têm interesse se
narrar uma história socialmente significativa. Mais, a expografia deixa de ser uma
técnica exclusivamente dos museus, para ser uma ferramenta ao serviço da comunidade.
A expografia democratizou-se como técnica. ―A expografia deixando de estar
acorrentada ao serviço das colecções passa a ser um recurso (de comunicação) para
apresentar ideias dentro de fora do museu‖.(pag.2)
O que fazer então dos objectos e das colecções. Ou seja se quisermos assumir uma
exposição de objectos de cerâmica a partir dos problemas da comunidade, temos que
resolver a questão da relação entre ―as regras dos objectos‖ e ―as regras das ideias‖.
―Esta constatação implica por sua vez o reconhecimento de que as regras da expografia
dos objectos provavelmente não coincidem com a expografia das ideias‖ (pag 2). E
prossegue com a resolução ―Porque exactamente essas ideias estão na base do processo
comunicacional devemos reconhecer um lugar próprio à memória de quem fala, de
quem ouve e de quem dialoga‖.(ibidem).
Ou seja, enquanto processo comunicacional, a narração deixa de estar centrada no
objecto, para estar centrada no processo, na interacção dos actores. De quem produz, de
quem consome e de quem faz. E acrescenta ―Não se expõe a memória das coisas, mas
sim constrói-se um processo de comunicação do qual é parte integrante a memória dos
actores‖ (ibidem).
Qual é então o papel dos objectos neste processo comunicacional. Porque. Se eles têm
regras, e se deixamos de centrar o discurso expográfico nessas regras para o centrar nas
ideias, qual é o lugar dos objectos na narrativa.
Aqui Moutinho propõe uma passagem para a ―potencialidade comunicativa da forma‖.
Citando Pierre Francastel, na epistemologia da criação imaginária25
que afirma que ―
longe de ser um registo mecânico de elementos sensórios, a visão prova ser uma
apreensão verdadeiramente criadora da realidade – imaginativa, inventiva perspicaz e
bela… toda a percepção é também pensamento, todo o raciocínio é também intuição,
toda a observação é também invenção. A forma como o objecto que vemos, contudo,
não depende apenas da sua projecção retinana num dado momento. Estritamente
falando, a imagem é determinada pela totalidade das experiência visuais que tivemos
com aquele objecto ou com aquele tipo de objecto durante toda a nossa vida‖. Ou seja, o
25
Ver Pierre Francastel, A Imagem, a visão e a imaginação, Lisboa, Edições 70, 1998
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36 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
objecto entra do discurso expografico como uma estética. Não é uma ilustração da
narrativa mas como um elemento central da narração, contendo todo um potencial de
libertação, de criação de emoções e sensações que permita ao sujeito um dialogo
consigo próprio, com a comunidade e com o seu mundo. Ou seja que propicie uma
cosmogonia.
E aqui Mário Moutinho adiciona o segundo domínio de fronteiras a quebrar: O Público.
Um museu com objectos construídos deixa de ser significativo para o publico
tradicional do museu. Mas o que é o público tradicional dos museus, interroga-se
Moutinho. Como categoria mental, o público do museu não existe. Ele é o somatório de
unidades individuais, dotadas de autonomia, de sensações, conhecimentos, de vivências.
Ou seja o que existe são cidadãos. E o cidadão, nas sociedades democráticas é
autónomo e consciente. O discurso autoritário, directivo deixa de fazer sentido nos
nossos museus. Diz Moutinho ―a recusa dos museus em reconhecer um novo grau de
autonomia na aquisição das informações por parte dos visitantes‖, um dos elementos
que se alterou, representam um afastamento do museu face à sociedade. Tanto mais, que
por mais sofisticado que seja a narrativa, com maior componente tecnológica, essa
narrativa convive com outros processos de comunicação, com elevada mutação e
capacidade de sedução. Ou seja cada visitante tem uma liberdade de reconstruir o seu
discurso, e se o processo de comunicação dos museus não produzir satisfação, ele
afasta-se, recusa-o e abandona o Museu para não mais voltar.
E a propósito deste usufruto do museu, como espaço de comunicação permanente 26
Mário Moutinho introduz o terceiro e último domínio de fronteira a ultrapassar nos
museus. O tempo. ―É um facto que os museus, tal como os conhecemos não têm
capacidade para se renovarem todos os dias‖ (pag. 3). A organização museal não é
concebida para uma renovação permanente. Ela acontece, quando acontece, lentamente.
Por isso ―o tempo dentro do museu é quase sempre entendido como tempo do passado.
Ao museu não compete imiscuir-se no que se passa fora das suas paredes‖ (pag 3). É
claro para Moutinho, pela lógica do discurso, que o tempo do Museu terá que se
adequar ao tempo da cidade. Mais, ―mais tarde ou mais cedo os museus terão que deixar
esta obsessão pelo passado para passar a comunicar por meio de objectos que expressam
ideias, utilizam plenamente os novos recursos da Tecnologia e reconhecem a existência
dum público que não precisa de guias nem de legendas‖. Ou seja, no limite, o museu
passa a competir com o espectáculo, como um espaço de eventos27
onde a comunidade
se exprime para satisfação das suas necessidades culturais, espaço aberto a todos os que
queiram visitar. A propósito diz Moutinho: ―Para ultrapassar as nossas fronteiras
importa pois ter em consideração: O reconhecimento que as questões do
26
Hoje, o cidadão convive com uma necessidade permanente de informação. Mesmo durante o
lazer e o ócio, existe necessidade de comunicação (não confundir com informação). 27
Como vimos em ―Os compromissos dos Museus com a Sociedade‖ o autor não advoga que
esta espectacularidade seja associada à ―indústria cultural‖ ou a fenómenos de alienação. Deverá
interpretar-se esta inovação em função da mobilização das ideias e da memória como processo
transformador, como motivador da acção e como recurso de desenvolvimento da comunidade.
Ou seja, não é o uso da tecnologia que é mau, é o sentido do seu uso que interessa.
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37 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
desenvolvimento social e da cultura são cada vez mais elementos de uma
responsabilidade social onde assenta a intervenção museal‖ (pag 3).
Em conclusão afirma Moutinho, na sua visão actual da função social do museu, que há
que reconhecer que as sociedades estão em permanente mudança ―pelo que a actuação
dos museus deverá assentar nessa própria mudança‖ (pag 4). Ora essa adequação dos
processos museológicos à contemporaneidade exige que o museu deva ser entendido
como ―uma entidade prestadora de serviços‖, e que os recursos humanos envolvidos os
processos museológicos deverão estar capacitados para uma acção diversificada em
diversas funções que implicam a comunidade e os processos de comunicação, muito
longe portanto das tarefas antigas da museografia clássica. Uma formação especializada,
portanto28
, que permita abordar os temas do nosso tempo, das nossas preocupações29
.
28
Em Nvos Rumos da Museologia e o seu Ensino na Universidade Lusófona de Humanidades e
Tecnologia, publicado na Revista de Humanidades e Tecnologias, nº ---, 19-- , pp 136-143,
Mário Moutinho, analisa as necessidades de ensino em Museologia e apresenta os roteiros para
estas formações. 29
Moutinho faz uma lista das principais questões da humanidade: Direitos Humanos, Violência
doméstica, HIV, Iraque, Fronteiras. Poder-se-iam acrescentar muitos outros temos, desde a
fome, os refgados, os genocídios em curso, etc.
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3.2 MUSEION-Função Social do Museu
Realizado em Cáceres nos dias 12 e 13 de Dezembro 2008.
Algumas Ideias genéricas.
Inventário Participativo - Ana Recehna do Museu de Castelo Branco
O Museu como local de acervo intangível do conhecimento
O Museu não deve competir com outras lógicas de ócio e lazer
O conhecimento é capital intangível
Identidade e Memória - Distinção semântica, epistemológica e semiótica
Alcântara – Pontes dentre Museus
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39 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
3.3 Museologia e Género de Mário de Souza Chagas
3.3.1 Síntese Biobibliográfica
Mário Chagas é Poeta e Museólogo, Doutor em Memória Social pela Universidade do
Estado do Rio de Janeiro, UERJ, Brasil, com a tese IMAGINAÇÃO MUSEAL: museu,
memória e poder em Gustavo Barroso, Gilberto Freyre e Darcy Ribeiro., 2003. No seu
mestrado, também em Memória Social na mesma universidade teve como tema “Há
uma gota de sangue em cada museu: a óptica museológica de Mário de Andrade‖,
(1997).
Tem uma bibliografia vasta, constituída por livros, artigos inseridos em publicações
colectivas, artigos de jornais. No âmbito académico é professor adjunto da UFRJ, onde
orientou igualmente dezenas de teses de doutoramento e mestrado e colabora com
diversas instituições universitárias, entra as quais a ULHT e é membro do conselho
consultivo da Universidade Comunitária Regional de Chapeio. Paralelamente à sua
actividade académica desenvolve actividade Instituto do Património Histórico e
Artístico Nacional (Brasil) e acompanha diversos projectos museológicos, onde trabalha
essencialmente as questões da Memória Social, pensamento social brasileiro, educação
museal e gestão de património em Instituições de Memória e Património Cultural
O seu seminário decorreu na Universidade Lusófona em 7 e 8 de Novembro de 2008.
Distribuiu sete textos de autor:
―Museus, Memórias e Movimentos Sociais‖, com referências bibliográficas
―Cultura, Património e Memória‖, versão da comunicação apresentada no 1º
Congresso Internacional de Arquivos, bibliotecas, Centros de Documentação e
Museus, São Paulo Março de 2002.
―A Poética das Casas Museus de Heróis Populares‖,
Os Museus na Sociedade Contemporânea: Um Olhar Poético‖
―O Museu e o Abacaxi‖
―A Radiosa aventura dos Museus‖
―Mário de Andrade e o seu Museu de Sonhos‖
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40 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
3.3.2 Roteiro dos Seminário
O conjunto das sessões envolveu um Roteiro das apresentações30
construído na base dos
textos apresentados. A dinâmica da sessão, e o conjunto de questões levantadas durante
os debates induziram um diálogo entre as várias questões tratadas em cada uma das
apresentações. Mário Chagas inicia a sua exposição com uma proposta de elaboração
duma
a. Uma Arqueologia da museologia31
Através duma citação “(...) Se alguém falasse ou escrevesse sobre Museologia como
uma ciência há trinta, ou mesmo vinte anos atrás, receberia um sorriso indulgente e
piedoso de grande número de pessoas. Hoje, a situação é bastante diversa.” ( J. J.
Graesse, Agosto de 1883, : Dresden, Alemanha, Estudos de Museologia e Antigüidades
e Ciências Afins (Citado por: Waldisa Russio))
Cem anos depois, na decada de 80 do seculo XX, Vinos Sofka, coloca a pergunta:
Quem nasceu primeiro a museologia ou o museu?, decorrente desta perguta:
O que é museologia?
O que é museu?
Qual é o objeto de estudo da museologia?
A Respostas situa-se a dois niveis
Ao nivel do senso comum, em que a Museologia é ― estudo e a organização dos
museus‖
E ao nível do pensamento crítico, em que a museologia é ―uma pedra lançada no
lago provocando marolas circulares‖ (Amareswar Galla)
No quadro síntese de Peter Van Mensh (apresentado nos anos 80/90) museologia pode
ser:
a museologia como o estudo das finalidades e da organização dos museus
a museologia como estudo da implementação de um número básico de
atividades envolvendo a preservação e o uso da herança cultural e natural:
o no contexto da instituição museu
o independentemente de quaisquer instituições
a museologia como o estudo dos objetos museológicos da musealidade, isto é,
uma qualidade distintiva dos objetos de museu –
30
O roteiro é reconstruído com base nos elementos fornecidos por Mário de Souza Chagas. Não
vincula o autor porque manipulamos o seu discurso segundo as nossas interrogações. Também
não é um texto original produzido por nós, uma vez que é escrito em cima do discurso de Mário
Chagas. Para melhor distinção entre o que é escrito por Mário Chagas, e as nossas notas ou
observações reduzimos o nosso texto reflexivo a notas de rodapé. São apontamentos, reflexões e
interrogações ou notas que ocorreram durante o próprio seminário. 31
Procura-se aqui uma analogia ao texto de Michel Foucolt ―A Arqueologia do Saber‖
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41 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
a museologia como estudo de uma relação específica entre o homem e a
realidade
-Dois exemplos brasileiros:
Segundo Gustavo Barroso (1946) - Chama-se Museologia o estudo científico de
tudo o que se refere aos Museus, no sentido de organizá-los, arrumá-los,
conservá-los, dirigí-los, classificar e restaurar os seus objetos.
Segundo Waldisa Russio (1984) - A Museologia é a ciência que estuda o facto
museológico, ou seja, a relação entre o homem e o objeto num cenário
Na sequência desta questão Mário Chagas articula os seguintes postulados32
Um debate passo a passo
Passo 1: Se a Museologia estuda o fato museal, ou seja, a relação33
entre o
homem, sujeito que conhece, e o objeto, bem cultural, num cenário
institucionalizado que é o museu, de que modo podemos compreender o museu a
partir desse entendimento de museologia?
Passo 2: Se o Museu, na perspectiva museológica de Russio, pode ser
considerado como um espaço ou cenário propício à relação entre o homem,
sujeito que conhece, e o objeto, bem cultural, não poderíamos compreender a
Museologia como o estudo dos museus (onde esta relação se dá) ?
Passo 3: Nesse caso, qual a diferença entre a Museologia de Barroso e a
Museologia de Waldisa Russio? 34
Passo 4: Levando em conta a relação sujeito-objeto, não poderíamos
compreender que, em determinados casos, os objetos nos constróem? Neste
caso, eles (os objetos) não seriam sujeitos que nos objetificam?35
32
Trata-se de um exercício, quanto a nós bem sucedido, de constituir uma reflexão teórica sobre
a ciência dos museus 33
Nosso sublinhado. A operação mental de considerar a museologia como uma relação, um
processo, constitui a questão essencial que distingue a museologia como ciência, da
museografia, ou da arte de criação colecções, de as expor publicamente, de as conservar e
divulgar. Esta operação exprime o acto de produção científica, em que numa primeira
abordagem se processa a classificação, seriação, ordenação, para permitir, que sobre esse
quadro, o exercício duma análise. Da análise produz-se uma síntese. Assim museografia trata do
conjunto de técnicas e procedimentos auxiliares da ciência museológica. Enquanto a ciência dos
museus, a museologia, em si estuda a relação entre o sujeito e o objecto. 34
Este postulado é crucial na apresentação de Chagas. Pois comprovando a existência duma
ciência, chamada museologia, que ocorre num espaço (a questão do espaço é um elemento
crucial para esta ciência), introduz a questão da relação como um processo. Ou seja não é o
objecto que é o centro da atenção, e não é a sociedade ou o poder que coloca esses objectos
nesses locais (museus) que é o foco da museologia mas a relação produzida pelo objecto
(escolhido) colocado (por critérios) num espaço (criado para esse efeito) com determinados
objectivos (funções). Acresce a este processo a consciência, (maior ou menor) e o
empenhamento ou engajamento (maior ou menor) do agente sobre esse seu trabalho como
cidadão (sendo que a consciência profissional está sempre presente e decorra da função
cidadania)
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42 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Passo 5: Qual a relação entre o fato museal e o fato social de Emile Durkheim
(1858-1917) ? 36
Passo 6: O museu não poderia ser considerado como um fato social total, na
perspectiva de Marcel Mauss ? 37
35
A questão da relação ou do processo, que aqui Chagas inverte para lhe atribuir uma função
biunívoca, ocorre num determinado espaço. O chamado espaço museológico. Esta questão do
espaço como expressão duma ciência é interessante porque, através desta abordagem a relação
não tem necessariamente que ocorrer num museu. O espaço museológico não está
necessariamente confinado ao equipamento ou instituição ―museu‖. 36
A partir daqui é possível efectuar ―uma sistematização do campo do conhecimento‖. Uma
visão positiva da ciência, com base num axioma ― A verdade está disposta na s coisas, e nós
podemos conhecer a verdade‖.
37 A distinção entre facto museal e facto social é uma distinção operada por Mário Chagas entre
a sociologia e a museologia.
Na sociologia o acto social (de Émile Durkheim, 1858-1917) depende das seguintes
características: as Estruturas sociais; as normas culturais; e dos valores externos aos indivíduos.
O facto social tem como características: a generalidade, a exterioridade, coercitividade (pressão
exercida pela colectividade), questão que são explicitadas na ―Regras do Método Sociológico‖
(1895). O facto social transforma-se na teoria de Durkheim na essência da sociologia com
disciplina autónoma. Dois anos antes, em 1893, em ―Divisão do Trabalho Social: Estudo sobre a
organização das Sociedades Superiores‖, Durkheim apresenta uma outra noção essencial para a
sua reflexão que é a ―consciência colectiva‖. A consciência colectiva é a totalidade dos
sentimentos e das crenças que une a comunidade. Esta consciência é um facto complexo, que
depende de múltiplos factores sociais e contêm aspectos simbólicos.
O seu discípulo Marcel Mauss (1872-1950) amplia a noção de facto social com o conceito de
Fenómeno Social Total. Segundo Mauss, o estudo das sociedades humanas inclui a morfologia
social, ou a análise das estruturas sociais, a psicologia social, ou o estudo da s representações e
dos movimentos sociais, e a sociologia geral, que compreende o estudo dos fenómenos globais
das relações internacionais entre sociedades Em ―Essai sur le don: forme et raison de l‘echange
dans les sociétés archaiques‖, publicado em 1922-1923 em L‘Anné Sociologique, a sociologia
deverá explicar os fenómenos sociais significativos para encontrar as suas estruturas racionais.
Isto implica a colaboração com a psicologia e a biologia, para entender o homem na sua
totalidade. Assim como deve compreender a sua expressão mecânica (a gestualidade do Pedro
Cardoso), como os fenómenos de formação da sociabilidade e da sua relação com o indivíduo, e
ainda a formação do inconsciente colectivo a partir das representações simbólicas. Da
concepção de homem total, Mauss cria a noção de Fenómeno Social Total, que deverá revelar as
estruturas escondidas da identidade das comunidades e das culturas. Esta noção de inconsciente
colectivo permite relacionar as estruturas sociais e inter-relacionar as suas funções.
A contribuição do pensamento de Mauss irá desempenhar, nos anos seguintes, uma importante
contribuição para as várias ciências sociais, em particular das antropologias da história, da
psicologia. A mobilização deste conceito por Mário Chagas para a museologia, criando o facto
museal total, não só o insere no contexto da evolução das ciências sociais, como o transforma
num conceito operativo crucial para entender a sua proposta de ―uma teoria museológica‖.
A especificidade da museologia realiza-se por duas vias. Por um lado, a partir da especificidade
simbólica do objecto, da técnica e da expressão do pensamento (seja movimento, seja através do
verbo), , por outro lado da especificidade da museologia como uma expressão única da
actividade humana, que ocorre num espaço, num determinado tempo, por determinados sujeitos,
que operam determinadas memórias. Nesse sentido estar no museu é uma experiência única, não
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43 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Síntese provisória
A Museologia pode ser compreendida como um ―campo‖38
e nesse sentido tem pouco
interesse discutir se ela é arte, ciência, disciplina ou técnica.
Como ―campo‖ a sua configuração situa-se na relação entre:
os seres humanos
os objetos culturalmente qualificados
os espaços socialmente constituídos 39
Assim Chagas chega à reflexão sobre o que é um Museu40
:
repetível. ―Ninguém entra num rio mais do que uma vez‖. O acto Museológico é um processo
de produção de espaço onde ocorre a relação do homem com o objecto e do objecto com o
homem. Aqui introduz a questão de IMAGINAÇÃO MUSEAL como explicação do processo
museográfico que a seguir aprofundará. A imaginação Museal (processo museológico) produz
um facto museológico que exprime as relações entre : ( o Homem sujeito ↔
objecto/colecção/bem cultural ↔espaço, ou Publico ↔ colecção ↔edifício, ou ainda
Comunidade↔ património ↔território .
38 Campo do Saber, do conhecimento. O contributo de Mário Chagas para uma epistemologia da
museologia desenvolve-se a partir deste ponto. Sendo a epistemologia uma ciência que estuda o
discurso (lógos) sobre ao ciência (epistême). Esta distinção formal é a legitimação necessária à
ciência para a afirmar como campo autónomo do conhecimento. Sendo indubitável que a
museologia estuda o campo museal ou o conteúdo dos museus, a articulação da sua legitimação
como discurso implica igualmente a especificidade da sua forma Ou seja saber o que a
distingue das demais ciências da memória, e dos demais discursos sobre patrimónios e heranças.
Esta distinção é importante para articular a lógica subsequente do discurso de Mário Chagas.
39 Ao colocar a referência legitimadora da museologia no ―Estudo da relação do espaço com o
bem cultural e com o ser humano‖, Chagas mobiliza um conjunto de referências teóricas das
ciências sociais, nomeadamente André Malroux – O Museu Imaginário (edições 70), Walter
Benjamim – em que na metamorfose introduz a distinção do objecto museológico como: Valor
de culto ( valor da religião ou culto religioso, ou Valor de exposição (Valor cultural).
40 O Museu como local simbólico. A herança clássica. Museu surge da relação entre Zeus (o
poder, a política) e a Menemósis (a memória), que produzem as nove musas. O ainda dentro da
tradição clássica a relação de Orpheu e Seléne (a deusa da Lua, responsável pelo cantos
óphilicos). O orphismo, , é um movimento filosófico desenvolvida no Século VI AC, na Grécia
clássica. Foi um movimento religioso ou mágico, em que Orpheu é o mestre dos encantamentos.
Orpheu era um músico sublime que encantava todos o que o ouviam. A sua mulher Eurípedes
foi mordida por uma serpente. Orpheu inconsolável desceu ao Hades e com o encantamento da
sua música resgatou-a do reino dos mortos. Contudo, não tendo respeitado as condições das
deidades, Eurídice volta à sua condição d espectro e Filho duma musa, Calíope ou Polimínia
Orpheu vagueou toda a vida tendo sido objecto de culto na ilha de Lesbos. O ritual órfico
consistia num ritual de passagem para a morte, onde a alma solicita aos desusa para beber do
lago da Memória. A memória é a água da vida por oposição da água do esquecimento. Orpheu é
também o nome da Revista dos modernistas portugueses em 1915,
A ligação da museologia com a Poésis, como forma de comunicação, que permite a criação da
capacidade de simbolização, uma proposta de Mário Chagas que mais à frente apresenta. A
relação entre a Política, o Museu como templo (antro) e o Poeta – (Ente) são componentes desta
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no senso comum: poderá ser um lugar de coisas velhas que alguém vai ver;
no sentido clássico: edifício, coleção e público
na nova museologia: território, patrimônio integral e comunidade local41
Assim, na Política Nacional de Museus42
: Os Museus podem ser compreendidos como
práticas sociais colocadas ao serviço da sociedade e de seu desenvolvimento, cujas
principais características são43
:
o trabalho permanente com o patrimônio cultural
o uso do patrimônio cultural como recurso educacional
a presença de acervos (herdados ou construídos) e de exposições (de longa,
média ou curta duração) abertos ao público, com o objetivo de propiciar:
o a construção social da memória
o a percepção crítica da realidade cultural brasileira
o o estímulo à produção de conhecimento
o novas oportunidades de lazer
abordagem. São FERRAMENTAS TOTAIS de um Museu como local de celebração do
poder ou o museu como projecto político. Há três perguntas que devem ser sempre feitas. Qual
é o interesse do museu? Para que serve o museu? Qual é a dimensão politica do museu?.
E aqui Mário Chagas socorre-se novamente de Michel Foucault ao enunciar as 4 características
do poder, que aplicadas à instituição Museu lhe conferem um Poder disciplinador: A
Organização do espaço, o Controle do tempo, a Produção de vigilância e segurança e a
Produção de conhecimento
Assim Museu pode ser visto Casa dos Demiurgos. Segundo Mário Chagas ― Há uma gota de
sangue em cada museu‖, porque o museu, como espaço de encenação da memória pode ser um
espaço libertador. O Poder libertador da memória também pode ser ensurdecedor. A museologia
como teoria do Teoria do Conhecimento, como Lógica da Ciência articula o Poder e o Saber. A
Museologia é o exercício do direito à memória. O poder é também a resistência ao
esquecimento e pode ser, em museologia uma expressão da Poésis no domínio da expressão do
Sensível. Ou seja ler e escrever a linguagem das coisas
41 Ao fazer esta reflexão sobre a disciplina científica ―museologia‖, a ao mobilizar estas
referências teóricas, Mário Chagas insere a sua reflexão sobre a ―nova museologia‖, ou ―sócio-
museologia‖. A sócio-museologia opera uma ruptura com a concepção de uma museologia mais
tradicional, mais centrada no objecto ou no espaço, ao colocar no centro do discurso
museológico a relação Ser humano ↔ Bem cultural ↔ Espaço. Desta forma a abordagem
museológica não recusa a produção museológica, do passado ou de outros modos de produção
museológica. Mas acrescenta novas componentes de análise em que ―o objecto também tem
vida social , (aquilo que é a objectividade do objecto, e a questão de que ―O homem é
objectificado pelo objecto‖
42 Do Brasil
43 Aqui assume claramente o seu ―engajamento‖ na sócio-museologia‖. Ou seja, ainda que
qualquer abordagem museológica seja válida (desde que feita com o rigor técnico que a
disciplina exige), a opção por uma prática museológica centrada no homem, no território, e nas
suas memórias inserido num processo social, é uma prática social virtuosa do museólogo,
porque se insere, de forma consciente, no desenvolvimento da comunidade, mobilizado os
seus recursos memoriais e as suas heranças patrimoniais, não para reviver o passado, mas para
construir o futuro
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45 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
a vocação para a comunicação, investigação, interpretação, documentação e
preservação de testemunhos culturais e naturais44
.
Deste modo as Funções identitárias dos Museus 45
exprimem-se em três pontos :
Comunicação
Preservação
Investigação
44
Há essencialmente duas abordagens ou dois tipos de museologia: A museologia normativa,
em que se diz que a museologia é um Conjunto de normas e procedimentos, uma técnica; e uma
museologia interpretativa em que o objectivo é questionar Porque é que isso se passa. Esta
abordagem define o CAMPO MUSEOLOGICO como espaços socialmente construídos, onde
um museu é constituído por seres humanos e objectos culturalmente qualificados
45 Como se vê, nesta proposta de Mário Chagas o MUSEU é visto como um CAMPO DE
PRATICA SOCIAL, onde as suas funções identitárias são os instrumentos do património
(património é comunicar) onde a Preservação é saber receber, a Comunicação é saber dar e a
pesquisa é saber retribuir. Para Mário chagas os objectos também têm vida social, e o homem é
objectificado pelo objecto. O que é imperativo para o museólogo é saber Ler e escrever a
linguagem das coisas.
Como se vê há uma manutenção das três funções centrais da museologia(Conservar, que implica
inventariar e preservar, Comunicar, que implica expor e divulgar, e Investigar, que implica
ampliar o conhecimento de forma sustentável. A inovação proposta é a postura perante a
comunidade, sendo o museu uma estrutura social facilitadora da mudança social, e o museólogo
um agente dessa mudança social.
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46 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Função Comunicação 46
Quadro 1- Função Comunicação, no museu, elaborado por Mário chagas e
apresentado durante o seminário
46
Nesta função destaca-se a inter-relação entre a emissão e o receptor. O acto museológico é um
processo de comunicação puro. Na museologia tradicional, o emissor tende a ser o museólogo
que escolhe a mensagem e o meio (o objecto e a sua catalogação ou roteiro). O receptor é
passivo.
Na nova museologia, o processo è dinâmico e o papel do museólogo é activo. Deverá participar
no processo museológico contribuindo para a criação do facto museológico e da comunicação
museológica. O emissor é a comunidade museológica que define o conjunto dos objectos
museológicos que são reordenados e reinterpretados. Este processo de participação distingue a
função da museologia na comunidade. A partir dessa operação também será reconstruída a
função social do museu.
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47 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Função Preservação47
47
A ideia de Preservação é abordada a partir de Walter Benjamim :em ―A Minha infância em
Berlim. A ideia chave da preservação é PERIGO. E VALOR (não há preservação sem
valoração).
Na Função Preservação ou conservação está implícito a questão da inventariação (o inventário
ou classificação é o passo primeiro da actividade científica. É efectuado pela taxonomia, ou
sistema de classificação dos objectos em categorias. Esta ordenação permite a criação dum
código comum entre objectos, permite a organização dum sistema de comunicação por inter-
relação. (Desenvolver inventario participativo). A inventariação corresponde a um processo de
conhecimento de objectos a que são atribuídos valor. A valoração é a consciência da pertença a
um universo significante. São atribuídos valores de memória ou valores patrimoniais a objectos
escolhidos num determinado tempo por determinados agentes. Assim como alguns são
escolhidos (inventariados) outros são excluídos (esquecidos). O valor é a operação de
significação que inclui ou exclui o objecto.
Reconhecido o valor através da inclusão no Inventário o objecto é alvo duma acção de
preservação (ou conservação e restauro). A conservação depende dos recursos tecnológicos e
materiais (técnica, saber, e capital). A conservação pode ser preventiva, intervenção para evitar
a acção dos agentes erosivos sobre o material, ou pode ser reconstrutiva. Estas duas opções
dialogam ao longo da história museológica e a das intervenções patrimoniais. Ou seja, também
no campo da teria da preservação existe uma tensão entre os valores. Por simplismo poder-se há
considerar que oscila entre dois extremos, de manter um fragmentos conforme foi encontrado,
eliminado na medida do possível a acção dos agentes erosivos, o que corresponde a ―isolar‖ o
objecto do mundo; ou a reconstruir, para simular o que foi ou o que se pretende que tenha sido.
Mário Chagas não valoriza este debate. Também não é um debate central na nova museologia,
(não é ??) e porque não (??)
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48 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Pesquisa Museológica48
Produção de conhecimento original no campo da museologia, com base em critérios
científicos e com relevância social. O PROCESSO MUSEAL é o Processo de atribuição
de valor, através da preservação, da investigação e da divulgação. Assim o Museu
assume-se como um local onde se realiza um microcosmo social.
48
Aqui a reflexão de Mário Chaga é mais inovadora. Ao inserir a Pesquisa ou a Investigação,
efectua dois movimentos que são da maior importância.
O primeiro é colocar no centro da actividade museológica a investigação como processo de
conhecimento. Ou seja opera uma ruptura sistémica com a prática do ―coleccionismo‖ ou seja
da criação de colecções, que resultam de interesses pessoais ou da necessidade de universalizar
o inventário, ou de conservar objectos. Nos museus de ciência, por exemplo, a colecção deverá
ser o mais universal possível para permitir atingir o grau de ―completo‖ ou enciclopédico. Nos
museus arqueológicos, por exemplo, a colecção deverá ser conservada da forma a que o seu
valor de uso possa ser estudado, comparado para entender as práticas culturais ou as técnicas de
trabalho. Quanto mais universal for a colecção melhor se poderá apurar o valor social e
tecnológico do respectivo acervo.
A investigação é que orienta a formação da colecção. Obviamente que isso não exclui a
universalidade da mesma. O que a diferencia é que ela resulta como um processo de
conhecimento, feito na instituição museológica, e não o museu como caso exemplar da
investigação feita numa academia.
O segundo é atribuir um grau de originalidade. Ou seja, além da investigação decorrer dentro
dum processo museológico, ela deverá também incorporar uma característica de relevância por
ser um processo que revela a identidade. Uma identidade museológica é o processo pelo qual
um objecto se afirma pela sua especificidade, é o modo como se diferencia dos demais. O seu
carácter único que legitima a sua existência. Este processo de investigação, tanto se pode
debruçar sobre uma cidade, sobre uma tecnologia, sobre uma comunidade, desde que
corresponda à função social que o museu deve conter
O terceiro é atribuir valor social à actividade de investigação museológica. Não se trata de
investigar qualquer objecto ou qualquer comunidade. Trata-se de investigar para permitir que o
museu realize as suas funções sociais.
Ou seja o processo de investigação é um processo que permite o museu renovar-se
permanentemente através da participação da comunidade onde se insere. Embora a metodologia
museológica seja uma técnica e um conhecimento do museólogo, ele aplica-a em contexto de
participação social, partilhando-a com a comunidade, recebendo da comunidade os
ensinamentos para produzir os conteúdos inovadores. O museólogo não é um dirigente mas um
facilitador de processos.
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49 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
B. Diversidade Museal e Movimentos Sociais
A vontade do museu é uma vontade de memória49
, uma vontade de patrimônio. Foi uma
vontade modernidade (século XVIII). O Exemplos classicos são oMuseu do Louvre (
1793) e 0 Museu Britânico ( 1753).
No Brasil as Raízes da Imaginação Museal, têm origens no Museu do Palácio de
Vrijburg (PE) feito no século XVII, na Casa de Xavier dos Pássaros (RJ)feito no XVIII.
Os exemplos clássicos do Século XIX são , o Museu Real (hoje Museu Nacional), o
Museu Paraense Emílio Goeldi e o Museu Paulista. É preciso esperar pelo seculo XX
para ver surgir o Prédio da Rocinha, na entrada do Parque Zoobotânico, (1902.)
Os movimentos sociais50
no século XX vão influenciar os museus e a museologia: são
influencia do Movimento de maio de 68, do Movimento ambientalista, do Movimento
hippie, do Movimento negro, do Movimento dos povos indígenas,do Movimento
feminista, do Movimento estudantil, do Movimento antimanicomial, do Movimento
gay, do Movimento dos imigrantes. Estes movimentos sociais vão produzir uma
evolução dos museus clássicos(museu de história ou aruqueologia, de etnografi a, de
arte ou ciência) aos museus de um tipo novo. São os Museus na 3ª. pessoa – experiência
dominante até os anos 70/80, a nova museologia (anos 70 e 80), os Museus na 1ª.pessoa
– depois dos anos 70/80, ou mesmo algumas experiência de Museologia de alteridade
mínima.
Os Museus de um tipo novo produzem a evolução das funções tradicionais do museu51
.
Assim do Edifício passa-se para o Território, da Coleção ao Patrimônio, do Público para
a Comunidade, e do Desenvolvimento institucional passa-se para uma prespectiva de
49
Mário Chagas distingue entre Vontade de Memória, como expressão do direito à memória (o
local onde se ganha o direito à memória versus esquecimento) do Direito ao Património, que
coloca como um dever. A abordagem da memória é sincrónica, a abordagem patrimonial é
diacrónica. A ―Fractmória‖ é a herança de futuro, a partilha da herança no tempo 50
A questão colocada por Mário Chagas é saber o que é que aconteceu no mundo dos museus
na década de 60 e que relação é que isso tem com a museologia. Recordou a célebre frase de
Hugo de Varin ―Desviar o curso do Sena para dentro do Louvre‖, ou os olhares cinéfilos de
Bernardo Bertolucci em os ―os sonhadores‖ e de Jean Luc- Godard em ―Banda Parque‖ .
Aborda igualmente as propostas de Georges Henri de Riviere: Museus Abertos /Museu Barco
(sobre esta questão sugere consulta de tese de Judite Primo relatórios da Unesco sobre Museus
de Ar Livre. Os movimentos de renovação surge com Franz Boas no Museu de História Natural
dos USA com a análise do papel do sector educativo nos museus. Também a antropologia,
termina com noção de raça e introduz a noção de cultura. Foram importantes movimentos de
renovação das ciência sociais e da museologia.
51 A questão de saber de que modo os museus podem contribuir para os movimento sociais, é
levantada por Hugo de Varin em ―O Mundo dos museus‖, entrevista a Salvats. Cita a propósito
o exemplo do Museu dos Ratos (EEUU). Um museu que é criado no EEUU para resolver o
problema dos ratos. Depois de resolvido o problema o museu desaparece. Ou seja até aos anos
60/70 o museu é sobretudo sobre o OUTRO. A partir dos anos 80 o museu passa os factos para
a primeira pessoa.
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50 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Desenvolvimento local52
. O museu torna-se diverso, a museologia acolhe uma
DIVERSIDADE MUSEAL . A museologia choje caracteriza-se por ser uma
museodiversidade. Os novos museus são museus onde se expressam as tenções dos
movimentos sociais. A tensão entre a diversidade e a unidade. Da alteridade e da
identidade. Das diferenças e igualdades. Dos Diversos versos Universos. A diversidade
torna-se um discurso e uma prática.
―(…) o futuro tem caminho/ Na unimultiplicidade, Pois cada homem é sozinho/ A casa
da humanidade‖. (Tom Zé)
Mas os Museus Clássicos (como por exemplo o Museu da Inconfidência) Ouro Preto –
MG, Museu Imperial – Petrópolis/RJ, o MASP, Museu de História Natural – Paris)
enfrentam também as tensões da modernidade. São museus onde se assite a uma
HIPERVALORIZAÇÃO DO ESPETÁCULO E DO CONSUMO.
Há museus COMO CASCA OU EMBALAGEM ( tipo Museu Clássico Interativo,
Museu de Astronomia e Ciências Afins – RJ), Museu Clássico com Coleções Vivas (-
Jardim Zoológico, Oceanário – Lisboa), Parques Nacionai/ sítios naturais musealizados,
(Parque Nacional das Emas – GO / MS, Parque Nacional da Serra da Capivara – PI) ,
Cidades Monumentos(Ouro Preto – MG, Olinda – PE, Parati – RJ), Museus Virtuais,
Os museus Comunitários, Museus de Território, Ecomuseus e outros, enfrentam
também desafios. O de Museus associados ao meio ambiente e à vida não natural e
cultural, ou Museus comunitários ( Antiga Sede da fazenda de Santa Cruz / Atual
Batalhão-Escola de Engenharia Villagran Cabrita, Casa do Sal , Casa Ciraudo, Vila
Celina, Palacete Horácio Leme, Marco XI , Antigo solar da família Araújo, hoje
incorporado ao Shopping Santa Cruz, 8. Antiga residência do Senador Júlio Cesário de
Melo / Atual Colégio Ferreira Lins, Atalaia dos Jesuítas, hoje Morro do Mirante (ponto
mais elevado) , Vila Operária do Matadouro, Centro Cultural de Santa Cruz, antiga
Sede Administrativa do Matadouro de Santa Cruz, Hangar do Zeppelin, na Base Aérea
de Santa Cruz
Abrem-se também espaços para NOVAS EXPERIÊNCIAS DE MUSEUS CASAS.
Museu Casa de Chico Mendes- Xapuri - AC, Museu Casa de Cora Coralina, Goiás - GO
Os grandes desafios dos MUSEUS de COMUNIDADE. A questão orienta-se em torno
da mobilização da memória da comunidade para a construção do museu. A experiencia
52
Como o museu passa do outro para nós - ou da forma como o MUSEU SE TORNA
COMO UM ESPELHO. Os museus deixaram de contar as grandes narrativas (como o fizeram
os museus nacionais) para passar a contar pequenas histórias. O museu global é um museu de
fragmentos narrativos. O Museu tornou-se um espaço de cidadania porque: o museu passa a
trabalhar com a comunidade. Não existe neste aspecto uma identidade entre o museu como
espaço de cidadania e a noção de ecomuseu. O museu interroga-se sobre o que é a comunidade?
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51 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
da construção do Museu da Maré53
. Algumas questões colocadas sobre o que a
comunidade quer que seja o museu: Um museu para a cidade
“O museu está lindo só tenho uma ressalva a fazer, o primeiro morador da Maré é
seu Otávio da Capivari, e o 1º bloco de carnaval é o Bloco dos Tamanqueiros que
depois se transformou no Cacique de Ramos.”
“O conteúdo do museu está bom, mas poderia ser melhor, porque tem fotos de
algumas igrejas e não tem as fotos da igreja dos navegantes e nem da São José
Operário (no Pinheiro), pois são igrejas muito antigas e também fazem parte da
história da Maré. E não tem nenhum comentário sobre o Conjunto Esperança deveria
ter mais fotos sobre o Conjunto e claro a minha foto também, afinal estou aqui desde
que nasci e também faço parte da história da Maré”.
“Gostaria que vocês colocassem uma bandeira do G.R.B.C. Corações Unidos de
Bonsucesso, que trocassem ou adicionassem a bandeira do Mataram meu gato pois
pra história ele é mais importante que a Escola de Samba, que colocassem o nome do
mestre Nilo no tempo da cultura (bumba meu boi) a família dele mora na rua
Capivari ele era responsável pelo ARRAIÁ DO BICO MUDO, e que incluissem na
maketi do Tempo do Futuro a Lona Cultural. Pois é um espaço muito importante para
a cultura na maré”.
“Acrescentar o CIEP Ministro Gustavo Capanema na maquete do bairro. Acrescentar
fotos da Dona Maria Rezadeira (Nova Holanda) no museu. Acrescentar um pouco da
história das pessoas que aparecem nas fotos. Porque só roupas brancas? Tudo de
bom, este museu!!!”
“Eu morei nas palafitas, hoje moro no Pinheiro, tenho 31 anos, já levei tiro, já fui
agredido fisicamente mentalmente. Mas essa visita faz vc notar a evolução de um povo
que não tinha nenhuma chance, um povo que luta, que sofre e que com certeza vence a
cada dia que passa. Falo isso como um vencedor que tem muito que fazer para
continuar na luta!”
“Hoje foi a 1ª vez que visitei o museu: estava passando e resolvi entrar. Foi uma das
melhores experiências que tive nos últimos anos. Incrível, não!!! É bom saber que
temos história, cultura, tradição, etc... Não somos números ou censo de pobreza;
somos gente. Que bom que há quem saiba disso e nos faça lembrar porque as vezes
esquecemos. Obrigado
“Gostei muito. Foi como se eu tivesse voltado no tempo e visto quanto éramos felizes
apesar da pobreza e miséria, mas podíamos brincar sem medo da violência, só das
assombrações que imaginávamos ter. Saudades do meu pai que ajudou a fazer vários
barracos desses. Cristina nascida e criada na Maré e com orgulho ter uma história
para contar para filhos e netos.”
53
Foi facultado um filme com o processo de construção do museu
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52 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
“Me transportei ao meu passado, quando era criança. Parabéns pelo belo trabalho.
Procurando demonstrar a realidade vivida aqui por muitas famílias, me sinto
orgulhoso de fazer parte desta história e de poder ajudar de alguma forma mudar esta
realidade.”
“Sensacional. Se toda nossa memória, a memória da nossa cultura, fosse tão bem
representada não repetiríamos os mesmos erros e nossa sociedade avançaria para ser
mais igual.”
Os grandes desafios do museus54
. São os museus locais de tradição e contradição, são
locais lugar de memória e de esquecimento, são locais de poder e resistência, são locais
ar de conformar e transformar55
. São os museus locais de Antropofagia ? . São os
museus gestos rebeldes e antropofágicos. São locais de educação como gesto rebelde e
antropofágico. São locais de movimentos sociais como gestos rebeldes e
antropofágicos?
Há que contudo voltar ao básico para responder a questões básica. A quem o museu
pode servir? Como podem ser moblizadas a memória, o patrimônio e o museu dos
movimentos sociais. Há vários exemplos de museus que quebram preconceitos: Museu
de Imagens do Inconsciente (RJ), Museu de Arte Negra (RJ), Museu do Índio (RJ),
Museu Casa de Vitalino (PE), Museu Casa de Chico Mendes (AC), Ecomuseu de Santa
Cruz (RJ), Museu dos Índios Ticuna (AM), Museu Pataxó de Coroa Grande (BA),
Museu Terreiro de Mãe Mirinha (BA), Museu da Maré (RJ).
Os museus podem servir aos movimentos sociais e contribuir para os processo de
transformação social. Há que quebrar perconceitos e identificar o que o é movimento
social hoje. Há que construir Redes de museus, de memória e demovimentos sociais56
54
Os museus são processos de escolha de memórias e de patrimónios. (aqui levanta-se a questão
do Anti-património, de vontade de memória ou vontade de património e da vontade de museu.
O museu é polifónico. Fala pelas 9 musas (. É como um Diorama que vai dar corpo ao cinema
(literatura, teatro, dança, musica, escultura e pintura) cinema 7ª arte. O Museu é o lugar de
colorir o pensamento, o Museu é o lugar que segura o mundo, o Museu é a casa da alegria. O
Museu como meio de produção cultural, Museu como lugar de recepção cultural, Museu como
lugar do Vinicultura (Gilberto Gil) que diz que é preciso energizar os pontos de cultura existente
no Brasil.
55 O Direito á Memória surge aqui como novo elemento conceptual. O Museu como
antropologia da memória e do património . Os museus são agentes da contradição tradicional
(ver revista património nº 31).
56 O Mito do Prometeu (PRAMANTHA) vem do Sânscrito ― aquele que produz o fogo‖. É
Aquele que vê o futuro. Aquele que sabe o que vai acontecer. Em ESQUILO, Prometeu
Agrilhoado, fala-se dos 10 encantos do Prometeu. Do Encantamento do fluxo com o fixo. O
Museu é como um desafio entre o fixo e aquilo que permanece. Identidade ou diversidade.
Permanência ou mudança. Ou seja em conclusão ―tudo pode ser um museu, tudo pode ser
museável, mas nem tudo é musealizado. O que é que é o universo museável. O Cosmos com
universo museável. Ou seja o todo e o nada O que se musealiza é os significados e os símbolos.
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53 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
O que é museu hoje: Qual é a Ferramenta e o Processo museológico57
. Hoje isto é
Campo de múltiplas possibilidades: Pode constituir-se como uma Arena política, como
um Campo discursivo, como um Espaço de interpretação. São tudo campos da profunda
renovação do campo museal.
C- A POÉTICA DAS CASAS MUSEUS DE HERÓIS POPULARES
Mário Chagas apresenta nesta exposição a sual ―leitura‖ do processo museológico como
poética que levou à produção de dois espaços museológicos: A Casa Chico Mendes, e a
Casa Museu da Maré.
Parte da citação de Gaston Bachelard ―Evocando as lembranças da casa, adicionamos
valores de sonho. Nunca somos verdadeiros historiadores; somos sempre um pouco
poetas, e nossa emoção talvez não expresse mais que a poesia perdida.‖
O processo de construção museológica parte da leitura de três espaços: - Ler as casas
museus a partir das três zonas: ―estar‖, ―repouso‖ e ―serviço‖. Essa leitura propicia uma
compreensão arquitetônica, histórica e social da casa museu. Essa leitura não toca na
dimensão poética, filosófica e política da casa museu. A poética é acrescentada pela
figuração do ―heróis são os que dia-após-dia vencem as batalhas da vida , e ainda
encontram tempo/ para amar cantar e dançar / heróis constroem casas e museus
/semeiam vida /e levam suas casas nas costas /e seus museus nos bolsos .58
57
O processo de musealização é um processo de produção de mediatização. O museu é um
espaço Holístico. (O Museu é um Todo) O Processo de musealização é o que produz
significados. O Processo implica: 1 – Selecção (exercício de escolha de inclusão e exclusão), 2-
Longa duração/ pequena duração (linha temporal de escolha de significados); 3- Político
(processo de tensão entre os poderes), 4 – Voluntário (processo de participação da comunidade)
58 A Dimensão poética do Museu é um outro conceito introduzido por Mário Chagas na análise
museológica. A poética é um discurso sobre o mundo, um modo de expressão clássica. Sendo o
museu uma casa abrigo da cultura, um abrigo simbólico, o museu, como templo das musas é
como um abrigo onde se repousa e onde se prepara a jornada seguinte. Assim resguardado do
mundo exterior as ideias organizam-se em discursos sobre a realidade envolvente. Neste
conceito de Casa Abrigo de Calíope, a poética é o discurso que permite dizer aquilo que não
pode ser expressamente comunicado de outra forma. Citando Manuel de Barros, ―O olho vê a
lembrança real, a imaginação transvê‖. Ou seja ―É preciso transver o mundo‖
A abordagem da poética do espaço e feita com base em Gaston Bachelard. ―Uma
fenomenologia da casa‖. As Casas museus permitem a relação entre
ESTAR/REPOUSO/SERVIÇO. É uma leitura da arquitectura e da história social .
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54 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
D- A IMAGINAÇÃO MUSEAL
Mário Chagas Aprsenta a propósito da questão da imaginação59
museal três museólogas
brasileiras, cujos trabalhos foram tndamentais para a formação da renação do
pensamento museológico. Nise da Silveira (1006-1999) Heloísa Alberto Torres (1895-
1977) e Regina Real(1901-1969).
Começa por definir o que é a imaginação ―(...) Capacidade singular e efetiva de
determinados sujeitos articularem no espaço (tridimensional) a narrativa poética das
coisas. Essa capacidade imaginativa não implica a eliminação da dimensão política dos
museus, mas, ao contrário, pode servir para iluminá-la. Essa capacidade imaginativa - é
importante frisar - também não é privilégio de alguns; mas, para acionar o dispositivo
que a põe em movimento é necessário ter interesse na mediação entre mundos e tempos
diferentes, significados e funções diferentes, indivíduos e grupos sociais diferentes. Em
síntese: é preciso iniciar-se na "linguagem das coisas". Essa imaginação não é
prerrogativa sequer de um grupo profissional, como o dos museólogos, por exemplo,
ainda que eles tenham o privilégio de ser especialmente treinados para o seu
desenvolvimento. Tecnicamente ela refere-se ao conjunto de pensamentos e práticas que
determinados atores sociais de "percepção educada" desenvolvem sobre os museus e a
museologia‖. (Chagas, 2002)
Como é que as três museologas contribuem para a imaginação museal e a museologia.
Segue-se um roteiro biográfico das três:
Nise da Silveira (Maceió, 15 de Fevereiro de 1906 — Rio de Janeiro, 30 de Outubro de
1999). Dedicou sua vida à psiquiatria e manifestou-se radicalmente contrária às formas
agressivas de tratamento, tais como o confinamento em hospitais psiquiátricos,
eletrochoques, insulinoterapia e lobotomia. De 1921 a 1926 cursa a Faculdade de
Medicina da Bahia, onde formou-se (única mulher entre os 157 homens da sua turma).
Nise da Silveira foi militante da Aliança Nacional Libertadora ( ANL). Durante a
Intentona Comunista foi denunciada por uma enfermeira pela posse de livros marxistas.
A denúncia levou à sua prisão em 1936 no presídio da Frei Caneca por 15 meses. Neste
presídio ela foi vizinha de cela de Graciliano Ramos, e veio a tornar-se uma das
personagens de seu livro "Memórias do Cárcere". Em 1944 é reintegrada ao serviço
público e inicia seu trabalho no "Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II", no Engenho de
Dentro, no Rio de Janeiro, onde retoma sua luta contra as técnicas psiquiatricas que
considera agressivas aos pacientes. Por sua discordância com os métodos adoptados nas
59
No conceito de imaginação museal é importante estar atento à linguagem das coisas. Saber
Ler, quantificar e eximir o mundo das coisas, ter capacidade de contar histórias. O objecto da
imaginação museal é a memória. A comunicação é neste processo o suporte da memória. A
preservação é neste sentido uma forma de comunicação. A Leitura das coisas como uma
construção duma geografia das coisas.
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55 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
enfermarias, recusando-se a aplicar eletrochoques em pacientes, Nise da Silveira é
transferida para o trabalho com terapia ocupacional, actividade então menosprezada
pelos médicos. Em 1946 funda nesta instituição a "Secção de Terapêutica Ocupacional".
No lugar das tradicionais tarefas de limpeza e manutenção que os pacientes exerciam
sob o título de terapia ocupacional, ela cria ateliês de pintura e modelagem com a
intenção de possibilitar aos doentes reatar seus vínculos com a realidade através da
expressão simbólica e da criatividade, revolucionando a Psiquiatria então praticada no
país. Desse ateliê nasceu em 1952 o Museu de Imagens do Inconsciente
Heloísa Alberto Torres ( 1895-1977) Esteve diretamente envolvida com diferentes
campos científicos, especialmente na área de Antropologia, Arqueologia e Museologia,
com a preservação e constituição do patrimônio histórico e museológico nacional e com
políticas públicas indigenistas entre as décadas de 1930 e 60. Foi personagem
fundamental para a consolidação e institucionalização da Antropologia e das Ciências
Sociais no país. Além do Museu Nacional, onde foi diretora por 17 anos, de 1938 a
1955, esteve envolvida em várias atividades: Associação Brasileira de Antropologia
(Integrante da Comissão Organizadora da I RBA em 1953, no Museu Nacional);
Contribuiu para a fundação do SPHAN, em 1937 Presidente da ONICOM (Organização
Nacional de Museus), vinculado ao ICOM, em 1955. Participou da organização do 1º.
Congresso Nacional de Museus em 1956. Atuou com destaque na ciência, na política e
na administração de diferentes instituições do governo brasileiro. Foi presidente do
Conselho Nacional de Proteção ao Índio, de 1959 a 1967, substituindo o Marechal
Cândido Rondon, e colaborou na criação da FUNAI. Sua atuação política em defesa dos
direitos da mulher foi relevante e pode ser percebida através das relações que manteve
com várias instituições como a Liga Internacional de Mulheres Pró Paz e Liberdade, o
Instituto Feminino da Bahia e a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino/FBPF,
fundada por Bertha Lutz, principal representante nacional do movimento feminista da
época. Bertha e Heloisa foram funcionárias e pesquisadoras do Museu Nacional.
Bertha entrou no Museu em 1919 como secretária e posteriormente tornou-se naturalista
– zoóloga.Heloisa entrou como assistente de Roquette-Pinto em 1918, e em 1925
tornou-se professora substituta da Divisão de Antropologia.
Regina Monteiro Real (1901-1969) , Formada em Assistência Social e no Curso de
Museus (1937). Foi aluna de Gustavo Barroso, Edgar Romero, João Angyone Costa e
outros. Trabalhou no MNBA (1937-1954).Teve um papel decisivo na criação do Comitê
Brasileiro do Icom, do qual foi secretária (1948-1956) e da ONICOM(1956-1959). Teve
atuação de destaque no Museu Casa de Rui Barbosa (1955-1969). Foi responsável pela
instalação do Museu Carlos Costa Pinto (BA) e de vários outros museus. Fundadora da
Associação Brasileira de Museologistas (1967). Escreveu, entre outros, os seguintes
textos: O Museu Ideal (1958); Dicionário de Belas Artes (1962) e Binômio: Museu e
Educação (1968).
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56 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
E- Museologia e Género - Poder e Género
A partir do texto ―Gênero, Estudos de Público e Museologia‖ de Mario Chagas . O
Público não é um todo
homogéneo. Existem vários
públicos: o público escolar,
público de famílias, público
especial, etc. (Almeida, 1997).
Podem-se classificar Categorias
de Público (segundo Roger
Miles, 1986): público visitante –
pessoas que de fato frequentam
museus e podem ser conhecidas
por meio de levantamento de perfil de visitantes; público potencial – pessoas que
podem ser atingidas pela acção do museu; público-alvo – trata-se de uma selecção do
público potencial, a qual se pretende atingir com determinado programa ou actividade
do museu.
O Género como Experiencia museal decorre dos
estudos de visitantes nos museus. São estudos que
tiveram uma forte influência, nos EUA e Inglaterra, de
correntes da Psicologia, como a ―psicologia
comportamental‖ (behaviorism) e as ―ciências
cognitivas‖. Para o Behavorismo as pesquisas de
público tem por base a sustentação de que
comportamentos podem ser descritos cientificamente
por meio da observação (principais nomes do
Behaviorismo : Pavlov, Skinner ) .Desde os primórdios
da psicologia no século XIX, a escola comportamental
caminhou paralelamente a outras correntes de
pensamento. A partir de meados do século XX a corrente comportamental foi eclipsada
pela revolução cognitiva . O Cognitivismo é um Movimento fortalecido a partir dos
anos 1950 chamado ―ciências cognitivas‖, também originando a psicologia cognitiva e
nasce no contexto moderno de pesquisas interdisciplinares. É uma de intercâmbio da
psicologia, antropologia e linguística, além de abordagens advindas dos campos da
neurociência e inteligência artificial. (Principais nomes: Jerome Bruner, Benjamin
Bloom, entre outros).
Os principais instrumentos de investigação 60
que são usados em estudos de público e
avaliação vêm das Ciencias Sociais: São questionários , Observações , Gravações ,
Entrevistas, Grupos focais .
60
A propósito dos Instrumentos de análise cita o trabalho de Vânia Carneiro de Carvalho
―Género e Artefacto, em que a partir da questão do tema de ―Coleccionando Arte e cultura‖
como reflexão da experiência etnográfica de James Clifford, exprime a questão da Colecção
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57 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Segundo Wells, M. & Butler, B. (2002) ―A Visitor-Centered Evaluation Hierarchy‖.
Visitor Studies Today! Spring. p. 5-11. Existe uma hierarquia nos estudos de público
em função das necessidades de informação. Os estudos tornam-se progressivamente
mais complexos exigindo instrumentos e metodologia diferenciadas até se atingir
questões como o valor social do museu.
Os Primeiros estudos de público em museus registam-se a partir do final do século XIX:
Em 1884 (Henry Higgins, Inglaterra, e (um dos fundadores da Associação de Museus da
Inglaterra e seu primeiro presidente em 1890, Publicou artigo na “Transactions of the
Literary and Philosophical Society of Liverpool” em 1884, sobre Museus de História
Natural (parte 1: Museum Visitors); e em 1897 (Fechner, G.T., Leipzig, Alemanha).
Nos anos 30 os estudos de visitantes são desenvolvidos por Hay Murray, 1932, The
Free Public Museums Liverpool, Inglaterra, com base na questão “How to estimate a
museum´s value―. Foi Um dos primeiros estudos interessado na investigação da relação
obra-informação-espaço-tempo-aprendizagem. Entrevistou e mediu o tempo que os
visitantes ficavam em cada galeria. O tempo gasto em frente as obras foi considerado
um fator indicativo do valor da visita (―Value factor ‖). A discussão ao final do artigo é
interessante, indicando opiniões diversas (com outros interlocutores) sobre possíveis
aprendizagens em um museu.
Em 1933 Arthur Melton, Yale University, USA, publica em ―Studies of Installation at
the Pennsylvannia Museum of Art‖ The Museum News, No. 14, January 15 (published
by the American Association of Museums) o primeiro tracking study de visitantes em
exposições. O estudo teve o objetivo de determinar a
eficácia do aproveitamento das salas de exposição e
arrumação das obras, por meio da observação do
percurso que o visitante fazia
na galeria, quanto tempo
observava cada objeto, e qual
lado da sala dava preferência
. Descobriu que somente 10%
dos visitantes observados
enquanto uma expressão duma observação organizada. Ou seja a Colecção como expressão
duma organização do mundo, duma mundividência. O processo de produção de sentido da
colecção é feito a partir do sujeito, transportando por isso as suas ideias sobre o mundo. Uma
colecção é, nesse sentido ―as marcas da memória‖. Têm uma analogia com as pedras que
marcam territórios.
Nos trabalhos de Nestor Garcia Canclini são apresentados 4 PAR os 4 paradigmas da
preservação dos objectos: 1 O Tradicionalismo substancialista (o chamado olho bom); 2.A
Concepção mercantilista (o objecto é preservado pelo seu valor de troca); 3. A Concepção
conservacionista e monumental (o objecto é conservado pelo seu significado simbólico) e 4 O
Paradigma participacionista, (a prática mais recente, que advém da entrada dos movimentos
sociais nos museus, ou dos museus como representação das tensões da sociedade, em que os
objectos são preservados como elementos significativos duma memória motivação.
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58 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
faziam todo o percurso da sala e que existe uma preferência pelo lado direito das salas.
As suas Observações procuravam determinar: Em que seqüência os visitantes olhavam
as pinturas e outros objetos, Tempo gasto em frente as obras, Qual o percurso preferido
dos visitantes.
Tinha como Hipótese do estudo: Pinturas recebem mais atenção quando expostas
juntamente com outros objetos ou sozinhas ? A Metodologia utilizada foi a observações
sistemáticas do comportamento dos visitantes nas exposições (tempo e percurso) . Estes
trabalhos foram criticado por o estudo ignora os interesses e o perfil dos visitantes
Nos anos 50, Brooks & Vernon, UK, 1956, do Birkbeck College and Institute of
Education, University of London publica ―A Study of
Children´s Interests and Comprehension at a Science
Museum‖ no British Journal of Psychology 48, p.175-
182. 1956. Foi um Estudo pioneiro sobre os interesses e
comportamento de crianças em uma galeria interativa
(Children´s Gallery) no Museu de Ciências de
Londres.Investigaram os interesses das crianças na
exposição e a compreensão dos módulos interativos.
Analisaram o Número de visitantes em num dia típico
de semana. Revelaram que mais meninos do que
meninas visitam a Galeria). Os Resultados foram: As crianças reclamaram do tamanho
dos textos e da dificuldade dos mesmos. Muitas disseram que gostariam que tivesse
alguém no local para explicar os módulos. As exposições para o público infantil devem
explorar a curiosidade natural das crianças pelos fenômenos e processos.O estudo
chama a atenção de que o planejamento de espaços para o público infantil em museus
deve ter a colaboração de psicólogos na equipe, que ajudem a criar módulos que
desenvolvam adequadamente os interesses e as capacidades das crianças.
De um modo geral regista-se um interesse progressivo nos Estudos de Publico em
Musesu. Em 1964 uma lista de artigos preparada pelos americanos Borhegyi e Hanson.
Museum News revela o seguinte:
Nos anos 20 e 30:
1928 Robinson, Edward S. The Behavior of the Museum Visitor. (Publications
of the American Association of Museums, n.s., nº5) Washington, D.C.,
1929 Bloomberg, M. An Experiment in Museum Instruction. (Publications of
the American Association of Museums , n.s., nº5) Washington, D.C.
1930 Pennsylvania Museum Classifies Its Visitors. Museum News, v.8, Feb.1,
pp.7-8.,
1930 Rea, Paul Marashall. How Many Visitors Should Museums Have?
Museum News, v.8, May 1, pp.9-12.
Nos anos 30 e 40
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59 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
1936 Melton, A.W., Feldman, N. Goldberg, and Mason, C.W. Experimental
Studies of the Education of Children in a Museum of Science. (Publications
of the American Association of Museums, n.s., nº15) Washington
1938 Porter, M.C. Behavior of the Average Visitor in the Peabody Museum
of Natural History; Yale University. (Publications of the American Association
of Museums, n.s., nº16) Washington, D.C.
1938 Powell, Louis H. A Study of Seasonal Attendance at a Midwestern
Museum of Science. Museum News, June 1, pp. 7-8.
1939 Coleman, Laurence Vail. Public Relations: Attendance. The Museum in
America : A Critical Study, v. II, Washington, D.C., American Association of
Museums, pp. 297-301.
1940 Kearns, William E. Studies of Visitor Behavior at the Peabody Museum
of Natural History, Yale University. Museum News, v.15, January 15, p.40.
Association of Museums, n.s., nº14) Washington, D.C.
Nos anos 50
1952 Monzon, A. Bases para incrementar el publico que visita el Museo
Nacional de Antropologia. Anales de Instituto Nacional de Antropologia y
Historia, tomo 6, 2ª parte, nº 35. Mexico City, Mexico.
1953 Niehoff, Arthur. Characteristics of the Audience Reaction in the
Milwaukee Public museum. Midwest Museums Quarterly, v. 13, nº1, pp.19-24
(include sample of questionnaire).
1956 Bigman, Stanley K. Art Exhibit Audiences. The Museologist. nº 59-60,
June to September.
1956 Bureau of Social Science Research, Inc. The Japanese House: A Study of
Its Visitors and Their Reactions. Washington, D.C. (Prepared for the Japan
Society)
1956 Niehoff, Arthur The Physical Needs of the Visitor. Lore, Milwaukee
Public Museum, v.6, nº 4, pp. 155-157.
1952 Monzon, A. Bases para incrementar el publico que visita el Museo
Nacional de Antropologia. Anales de Instituto Nacional de Antropologia y
Historia, tomo 6, 2ª parte, nº 35. Mexico City, Mexico.
1953 Niehoff, Arthur. Characteristics of the Audience Reaction in the
Milwaukee Public museum. Midwest Museums Quarterly, v. 13, nº1, pp.19-24
(include sample of questionnaire).
1956 Bigman, Stanley K. Art Exhibit Audiences. The Museologist. nº 59-60,
June to September.
1956 Bureau of Social Science Research, Inc. The Japanese House: A Study of
Its Visitors and Their Reactions. Washington, D.C. (Prepared for the Japan
Society)
1956 Niehoff, Arthur The Physical Needs of the Visitor. Lore, Milwaukee
Public Museum, v.6, nº 4, pp. 155-157.
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60 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Nos anos 60
1960 Abbey, D. S., and Cameron, Duncan F., The Museum Visitor: 2- Survey
Results. Royal Ontario Museum. Reports from Information Services 2.
1960 Cameron, Duncan F. and Abbey, D.S. Investigating a Museum Audience.
The Museologist, nº77, Dec., pp2-7.
1960 Cameron, Duncan F. and Abbey, D.S. Visits versus Visitors: An Analysis.
Museum News, v.39, nº, Nov., pp 34-35.
1960 Daifuku, Hiroshi. The Museum and the Visitor. The Organization of
Museums: Pratical Advice (Museums and Monuments Series, IX), Paris,
UNESCO, pp. 73-80.
1960 Frese, H. H. Anthropology and Public: The Role of Museums.
Mededelingen van Het Rijksmuseum voor Volkenkunde, nº 14. Leiden. The
Netherlands. (―The Museum and the Public‖). pp. 73-97.
1961 Abbey, D. S., and Cameron, Duncan F., The Museum Visitor: 3-
Supplementary Studies. Royal Ontario Museum. Reports from Information
Services 3.
1962 Cameron, Duncan F., and Abbey, D.S. Museum Audience Research: The
Effect of an Admission Fee. Museum News, v.41, nº3, Nov., pp.25-28.
1963 Stites, Raymond S. Leisure Time and the Museum: A Reply. Museum
News, vol.41, nº6, Feb,. pp. 29-33.
1963 Parsons, Lee. Exhibit Testing in the Milwaukee Public Museum.
1963 Borhegyi, Stephan F. Museum Exhibits, How to Plan and Evaluate Them.
Midwest Museums Quartely, vol. 23, nº 2, pp. 4-8. Spring 1963.
Ainda nos anos sessente desenvolvem-se estudos de público na vertente com Pierre
Bourdieu e Alain Darbel, 1969, ―O Amor pela Arte. Os Museus de Arte na Europa e seu
Público‖, (pesquisa realizada entre 1964-65 e primeiramente publicada 1966). Nele se
conclui: A freqüência dos museus em todos os países pesquisados aumenta
consideravelmente à medida que se eleva o nível de instrução, correspondendo quase
que exclusivamente a um modo de ser das classes cultas. A ―necessidade cultural‖ é um
produto da educação, da escola, da ação familiar (capital cultural). ―A estatística revela
que o acesso às obras culturais é privilégio da classe culta; no entanto, tal privilégio
exibe a aparência da legitimidade. Com efeito, neste aspecto, são excluídos apenas
aqueles que se excluem. [...] Parece que há motivos para invocar a desigualdade das
‗necessidades culturais´.‖ (p.69)―A obra de arte considerada enquanto bem simbólico
não existe como tal a não ser para quem detenha os meios de apropriar-se dela, ou
seja, de decifrá-las.‖ (p.71). ―As mulheres oriundas da classe alta visitam os museus
com maior freqüência do que os homens.‖ (p.41) Nota (p.231)―Freqüentemente, as
mulheres recusaram-se a responder ao questionário quando o marido era entrevistado
(―ele sabe melhor do que eu ‖). A Exposição Dinamarquesa constitui uma exceção: se
as mulheres deixam ao marido, naturalmente, o monopólio dos julgamentos
―intelectuais‖, é compreensível que,na qualidade de detentoras estaturárias do exercício
cotidiano do gosto, elas forneçam de forma mais natural sua opinião sobre obras que
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61 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
pertençam à ordem dos objetos familiares e da decoração doméstica, tais como móveis e
cerâmica.‖
Nos anos 70 os Museus e Centros de Ciências são responsáveis por uma grande
produção de estudos de publico, principalmente para investigar ganhos cognitivos e
afetivos, aprendizagem em espaços não formais, bem como o entendimento e uso dos
módulos expositivos. Em Children´s Gender Behaviour at Science Museums
Exhibits”, Kremer,K. and Mullins,G. Curator, 35/1, 1992 faz uma revisão das
ocorrêias sobre gênero. A conclusão foi a seguinte:
As características culturais masculinas favorecem os meninos a seguirem
carreiras em ciências e tecnologia, mais do que as meninas (Barr, 1985).
Estudos sobre famílias em situações não formais de aprendizagem indicam
diferenças de gênero entre os adultos. Homens costumam guiar os grupos,
enquanto as mulheres expressam papéis sociais múltiplos (Rosenfeld, 1980).
Observações em museus de ciência apontam que as mães, entre todos os
membros da família, são as mais propensas a seguir o grupo (Diamond, 1980).
Estudos em museus e centros de ciência sugerem que estes espaços tendem a
ser ambientes mais ―masculinos‖ do que femininos (Cone and Kendall, 1976).
Daí foram efectuados um conjunto de recomendações para os setores responsáveis pelo
planeamento de exposições e educação:
Familiarizar-se com a literatura sobre gênero e como experiências em espaços
não formais têm impacto na aprendizagem das ciências em meninos e meninas.
C riar exposições com conteúdo e design igualmente atraentes para o sexo
masculino e feminino.
Formular programas educativos que tenham as meninas como público-alvo, a
fim de encorajar o interesse do sexo feminino no campo das ciências.
Criar um ambiente que promova o uso de habilidades inter-generacionais.
T er monitores do sexo feminino em exposições de ciência.
Apoiar pesquisas para investigar de que maneira os museus podem criar um
ambiente que estimule o interesse e as habilidades de ambos os sexos, sem
formentar esteriótipos.
A partir dos anos 70 a investigação sobre as questões do génro multiplicaram-se nos
EUA.
Dix, Linda F. (Ed.) (1987). Women: Their Under-representation and Career
Differential in Science and Engineering. Washington, DC: National Academy
Press.
Eakins, Barbara, and Eakins, R. Gene. (1978). Sex Difference in Human
Communications. Boston, MA: Houghton Mifflin Company.
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62 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Erb, T. O. (1981). Attitudes of Early Adolescents Towards Science, Women
in Science, and Science Careers. In: Middle School Research: Selected Studies.
Fairborn, OH: National Middle School Association.
Kremer, Kristin. (1989).―A Qualitative Analysis of Children‟s Gender
Behavior as Observed While Interacting with Science Museum
Participatory Exhibits. Master´s Thesis. The Ohio State University, Columbus,
OH.
Moody, Judith B. (1989). Women in Science – Their Move Together into the
21st Century. National Women Studies Action. 22: 7-10.
Sprung, Barbara. (1987). Beginning Science Equitably. In Jane Z. Daniels and
Jane B. Kahle (Eds.) Contributions of the Girls in Science and Technology,
Fourth International Conference. Washington, DC: National Science
Foundation.
Weitzman, Lenore J. (1979). Sex Role Socialization. Palo Alto, CA: Mayfield
Publishing Company.
Finalmente nos anos 90 os estudos sobre públicos e género centram-se na investigações
sobre diferenças de gênero em museus de ciência: Family Learning in Museums, 1998
foi um Projeto conjunto: Academy of Natural Sciences / The Franklin Institute / The
New Jersey State Aquarium / The Philapelphia Zoo coordenado por: J.Dritsas; Minda
Borun ; J.Johnson
O projeto desenvolveu um método para observar a experiência dos grupos
familiares em museus.
Investigou a relação entre medidas qualitativas e quantitativas de aprendizagem.
Identificou 5 indicadores de aprendizagem
o responder a uma questão;
o perguntar alguma coisa;
o explicar algo;
o ler silenciosamente;
o ler em voz alta
As variáveis ―gênero‖ e ―faixa etária‖ influenciaram os indicadores de aprendizagem do
grupo familiar. Em ambos os grupos estudados (controle e tratamento), as mulheres
adultas tiveram indicadores de performance bem mais altos que homens, meninos e
meninas, sugerindo que as mulheres são „ líderes de aprendizagem´, que facilitam a
experiência educativa da família. ‖ (p.49)
Em The Perceptions and Behaviours of Children and their Families in Child
Orientated Museum Exhibitions, 2000, de Denise Studart, University College
London, Inglaterra os resultados das Análises Estatísticas (relativos às características,
percepções e comportamento dos adultos)revelaram que
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63 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Tempo gasto na galeria: pais e homens gastaram menos tempo na exposição para
crianças do que mães e mulheres (p=.002 e .007)
As mulheres (mais do que os homens) acharam que aprenderam alguma coisa
nas exposições interativas (p=.006), demonstrando uma atitude mais receptiva
com relação ao conteúdo das exposições.
Escolaridade dos entrevistados: mães tinham um nível escolar mais alto que os
pais (p=.05)
As crianças disseram com mais frequência que aprenderam algo na galeria
quando estavam com as mães do que com os pais (p=.05).
Existe uma tendência de que as meninas prefiram usar os módulos interativos
em cooperação, enquanto os meninos parecem ser mais autônomos (p=.04).
Além disso, as meninas expressaram mais sentimentos negativos (desconforto)
ou neutros ao usarem os módulos do que os meninos (p=.06).
Um outro estudo revela BARREIRAS À VISITA A MUSEUS PORQUE AS PESSOAS
OPTAM POR NÃO VISITAR MUSEUS . Foi um estudo de Marilyn Hood (1983),
―Staying Away – Why people choose not to visit museums‖. Museum News, 61(4),
realizado em Ohio (Toledo), EUA, com uma amostra de 502 pessoas, entrevistadas por
por telefone. A questão inicial era saber se o o Museu como opção de lazer . Segundo
pesquisas anteriores na área de marketing e sociologia, identificou-se seis razões que
influenciam as pessoas nas suas decisões em como passar o seu tempo livre / de lazer:
A) estar com outras pessoas (socializar), B) fazer alguma coisa proveitosa, C) sentir-se à
vontade / relaxar, D) experimentar novas experiências, E) criar oportunidades de
aprender , F) participar ativamente em alguma coisa. Os resultados identificaram 3
segmentos distintos de público na população entrevistada e como cada um prefere usar
o seu tempo livre: o Visitante Frequente que visita museus 3 ou mais vezes no ano
(14% dos entrevistados), usa o tempo livre para: oportunidades de aprender algo novo;
experimentar novas experiências; fazer alguma coisa proveitosa ; oPúblico não-visitante
/ não-participante, que não inclui museus nas suas opções de lazer (46% dos
entrevistados) e usa o tempo livre para: estar com outras pessoas (socializar); participar
ativamente em alguma coisa; sentir-se à vontade / relaxar; e o Visitante Ocasional, que
visita museus 1 ou 2 vezes ao ano (40% dos entrevistados), com razões para uso do
tempo livre similares às do público não-participante.
Algumas das conclusões do estudo indicam que cada segmento do público tira
benefícios diferentes de suas experiências de lazer. Se o museu quer atingir outros
segmentos (público ocasional e não-participante), precisa atender às diferentes
necessidades de lazer de cada público. Por exemplo, se o museu quer atender ao público
ocasional e não-visitante, deve criar possibilidades e difundir a imagem do museu como
um local de onde as pessoas se sintam à vontade para socializar uns com os outros ,
relaxar e participar ativamente de alguma coisa.
Algumas questões do debate actual sobre Barreiras à visita que devem ser consideradas.
(‗Building Bridges, 1998, M&GC)
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64 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
LOCAL / TRANSPORTE : O museu é de fácil ou difícil acesso? Qual a
frequência de transporte público? Possui estacionamento para visitantes ?
ACESSO CULTURAL, As exposições e colecções reflectem os diversos
segmentos da sociedade?
ACESSO INTELECTUAL, Os textos são de difícil compreensão para pessoas
que possuem nível de escolaridade baixo?
ACESSO EMOCIONAL/AFECTIVO, Como é a atmosfera dentro do seu
museu: informal, agradável ? Como a equipa do museu atende os visitantes?
ACESSO FÍSICO / SENSORIAL, O museu é acessível a pessoas com
deficiências físicas, auditivas etc. ?
ACESSO A DECISÕES. O museu consulta a comunidade com relação a novos
projectos ?
ACESSO À INFORMAÇÃO. De que forma o seu museu difunde as suas
actividades na comunidade ?
F - Os museus como agentes da Contradição Cultural
Mário Chagas propõe o roteiro de MUSEUS como a antropofagia da memória e do
património61
. Inicia com um poema Tupi, citado por Gonçalves Dias. ―- Mentiste que
um Tupi não chora nunca /E tu choraste! … parte; não queremos/ Com carne vil
enfraquecer os fortes‖. Esta rebeldia, está presente na mitologia clássica. Foi a rebeldia
de Prometeu contra Zeus, o seu amor à Humanidade, que o transformou num herói. O
seu fígado, a renovação continuada do seu suplício pelo abutre devorador é o desafio
permanente para a museologia. Só o encontro com a Deusa Io pode acalmar essa dor.
Hoje assistimos à museologia como o campo da possibilidade total. O Museu pode
devorar tudo62
: Os documentos, os monumentos, o património Cultural ou natural, festa
61
A questão da antropofagia dos museus têm obvias ligações à ―Revista de Antropofagia‖ e ao
―Manifesto antropofágico‖ , publicado em 1928 pelo modernista Oswaldo de Andrade (1890-
1954). A questão da antropofagia cultural, construída a partir da degustação do outro pelo índio,
para adquirir as suas qualidades como ente diferente. Ou seja, defende que a cultura no Brasil,
apesar das suas raízes europeias, antropofagisou-a, tornando-a mais forte. A ligação que chagas
pretende fazer sobre a antropofagia dos museus é esta, de que o museu ―come‖ tudo o que pode
ter significado. 62
Se tudo hoje pode ser musealizado, tudo hoje é antropofagizado. A questão hoje é de saber
como podemos deixar de ser devorados pelo museu? Ou seja é preciso enfrentar o museu. Cada
geração deve ressignificar a ideia de museu . O museu não é só um local de memórias. ―A
memória não têm valor em si‖, porque ―A memória não tem compromisso com a verdade‖. É
preciso aprender a trabalhar com a tensão e com constelação do mundo contemporâneo. A
antinomia poder/liberdade - A iluminação do poder dos ricos que os museus transportavam no
seu início coloca-se hoje a opção do museu de todos. Da liberdade, da igualdade, da fraternidade
(na trilogia da Revolução Francesa, têm hoje mais um significado de solidariedade, do direito à
dignidade e à identidade). Ou seja como nos ensinou Prometeu Os museus são fogos. Os
museus são locais onde o belo surge com espiritualidade. São locais onde se produzem
metamorfoses. São Locais de mudanças.
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65 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
e ou quotidiano. Tudo é pretexto. Nada resiste ao encanto desta museologia, a esta
capacidade de produção simbólica e de transformação dos sentidos. Isto conduz a uma
primeira síntese provisória de que Tudo é MUSEÁVEL. Em tese ―TUDO PODE SER
INCLUÍDO NO CAMPO DE POSSIBILIDADES DO MUSEU. ESSA CAPACIDADE
INCLUSIVA TEM RELAÇÃO DIRETA COM O SEU PODER DE PRODUZIR
METAMORFOSES DE SIGNIFICADOS E FUNÇÕES, COM A SUA APTIDÃO
PARA A ADAPTAÇÃO AOS CONDICIONAMENTOS HISTÓRICOS E SOCIAIS E
A SUA VOCAÇÃO PARA A MEDIAÇÃO CULTURAL.‖
São aspectos da realidade que só a museologia une. Ou seja, numa primeira abordagem
tudo pode ser ―antropofagizado‖ pelo museu. Só a museologia une e separa. Ou seja se
a museologia pode ser consideração como uma antropofagia da realidade, o canibalismo
dos museus pode ser um problema.
Será possível escapar aos museus, é a questão de Mário Chagas. Como se pode evitar
ser devorado pelos museu? Se os museus são antros (antropofágicos) também podem
eles próprios ser antropofagizado. Devorar e ressignificar o museu é um desafio
contemporâneo.
Afirmar que os museus são lugares de memória é uma redundância. A memória por si
só não tê valor. A memória não tem compromisso com a verdade. O esquecimento não é
um mal em si, ou um vírus que deve ser eliminado. A memória é um instrumento. Tanto
serve para libertar como para escravizar o passado. Através dela a Ciência, a História e
a arte podem ser tiranizadas.
Se os museus são antros (locais) também são entes (seres). São portanto agentes que
expressam as tensões da sociedade. São locais de confronto entre a tradição e a
contradição63
.
Neste âmbito Mário Chagas faz duas sugestões para enfrentar este problema: A
contradição não é necessariamente um mal . O mundo de hoje é um mundo de
contradições. Se assim é, talvez seja melhor aceitar e aprender a lidar com a tensão e a
contradição.
Ou seja se aceitarmos o óbvio, de que os museus são antros e entres de
memória/esquecimento, de poder/resistência, de combate/conflito, De discurso/dicção,
de Tradição/Contradição os museus são locais de silêncio
SILÊNCIO
63
Contradição tem neste âmbito um sentido de dialéctica, de campo de expressão da oposição
entre forças contraditórias.
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66 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
A proliferação e a ressignificação dos museus, a diversidade museal ou a
museudiversidade , a apropriação cultural continua a ser uma antropofagia que nos
continua a unir e a separar. E esta antropofagia não é uma exclusividade brasileira.
Mas se aceitarmos os MUSEUS COMO CAMPOS DE TENSÃO E DE
CONTRADIÇÃO, se aceitarmos os museus como locais de mobilidade/imobilidade, de
permanência e mudança, locais de valores fixos e voláteis, de diferença e de identidade,
de memória e de esquecimento, de poder e de resistência, de tradição e criação, de
tradição e contradição. Temos museus como PROJECTOS E METAMORFOSES.
Ou seja os MUSEUS FAZEM PARTE DO CONJUNTO DOS GESTOS HERÓICOS
DE PROMETEU.
OS MUSEUS SÃO FOGO.64
Os museus são locais de acção.
POSITIVO E OPERANTE. CÂMBIO.
O ELEMENTO ACABA DE CONCLUIR PALESTRA. CÂMBIO.
OLHO VIVO NO ELEMENTO. CÂMBIO.
O ELEMENTO ACABA DE DIZER: CAVEIRÃO NÃO! CAVEIRÃO NÃO!
CAVEIRÃO NÃO! CÂM BIO.
POSITIVO E OPERANTE. CÂMBIO.
O ELEMENTO DISSE ADEUS E MUITO OBRIGADO. CÃMBIO.
FUI! A FILA ANDOU! MUITO OBRIGADO!
G -MUSEUS NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA: um olhar poético
Mário Chagas aprsenta uma selecção de poemas
Museu da Inconfidêcia de Mário de Andrade: São palavras no chão/ e memória nos
autos./As casas inda restam,/os amores, mais não./E restam poucas roupas, /sobrepeliz
de pároco,/e vara de um juiz, /anjos, púrpuras, ecos./Macia flor de olvido,/sem aroma
governas/o tempo ingovernável./Muros pranteiam. Só./Toda história é remorso. C.D. de
Andrade
64
Opera-se aqui uma alteração da visão tradicional do museu, como espaço meramente cénico,
para um museu como espaço da acção social. Como um centro da comunidade. Por outras
palavras, ao defender que o museu deve deixar de ser a agia que devora o fígado de Ícaro, que
impede o seu poder criativo, para ser o fogo que dá vida, Mário Chagas está a fazer uma
proposta equivalente á máxima que se ouvia em Paris nos dos de 68, em que se escrevia nas
paredes ―Deixem o Sena entrar no Louvre‖
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Museu de Cecília Meireles : Espadas frias, nítidas espadas,/duras viseiras já sem
perspectiva,/cetros sem mãos, coroa já não viva/de cabeças em sangue naufragadas;
/anéis de demorada narrativa,/ leques sem falas, trompas sem caçadas,/ pêndulos de
horas não mais escutadas,/ espelhos de memória fugitiva;/ouro e prata, turquesa e
granadas,/que é da presença passageira e esquiva/das heranças dos poetas,
malogradas:/a estrela, o passarinho, a sensitiva,/a água que nunca volta, as bem amadas,
/a saudade de Deus, vaga e inativa...?/
O Ramo de Flores do Museu de Cecília Meireles: Ó Cinérea Princesa, as vossas
flores/ficarão para sempre mais perfeitas,/já que o tempo extinguiu brilhos e cores;/já
que o tempo extinguiu a habilidosa/mão que levou, serenas e direitas, /a tulipa sucinta e
a ardente rosa.
Não há mais ilusão de outra presença/que a do Amor, que inspirou graças tão finas/que
ninguém viu e em que ninguém mais pensa/porque os homens e o mundo são de
ruínas./E este ramo de pétalas franzinas,/leve, liberto da mortal sentença, /tinha, ó
Princesa, fábulas divinas/em cada flor, sobre o nada suspensa.
Museu Wislawa Szimborka :Há pratos, mas falta apetite./Há alianças, mas falta
reciprocidade/Pelo menos desde há 300 anos./Há o leque – onde os rubores?/Há espadas
– onde há ira?/E o alaúde nem tange a hora gris./Por falta de eternidade juntaram/Dez
mil coisas velhas./Um guarda musgoso cochila docemente/Com os bigodes caindo sobre
a vitrine./Metais, barro, pluma de ave/Triunfam silenciosamente no tempo./Apenas um
alfinete da galhofeira do Egito/Ri zombeteiro./A coroa deixou passar a cabeça./A mão
perdeu a luva./A bota direita prevaleceu sobre a perna./Quanto a mim, vivo, acreditem
por favor./Minha corrida com o vestido continua/E que resistência tem ele!/E como ele
gostaria de sobreviver!
H - Em Museus mudança social e desenvolvimento
Em Museus mudança social e desenvolvimento, propõe um roteiro em torno do Tema
Modernidade e Museus. São os museus um factor de mudança social, um factor de
desenvolvimento e uma expressão da vontade de memória. Aqui distingue a Vontade à
memória como direito à memória, da vontade de patrimônio, como direito ao
património e direito ao museu como vontade de museu. E expressa este direito ao
museus como exemplo da modernidade do Museu Paraense Emílio Goeldi. Os
movimentos sociais deram espaço a novos tipos de museus e a novos espaços de
memória. Os Movimento de maio de 68, o Movimento ambientalista, Movimento
hippie, Movimento negro, Movimento dos povos indígenas,Movimento feminista,
Movimento estudantil, Movimento antimanicomial, Movimento gay, Movimento dos
imigrantes foram factores de modernidade na museologia. Dos Museus na 3ª. Pessoa,
experiência dominante até os anos 70/80, e da nova museologia nos anos 70 e 80,
passou-se para Museus na 1ª.pessoa , ou como lhe chama Experiências de Museologia
de alteridade mínima.
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68 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Segundo Mário Chagas este movimento é uma reacção à hipervalorização do
espectáculo e do consumo, do museu como casca ou embalagem. A valorização de um
personagem insólito como a ―Louca de Rua Maria Grampim. Os museus podem ser
locais de desenvolvimento social a favor da dignidade social. A propósito cita o
exemplo do Museu de maré, já referido acima. Neste museu, o Arquivo Orosina Vieira
foi criado com o objetivo de constituir um conjunto de informações, nos mais diversos
suportes, sobre a história local do bairro Maré na perspectiva da história da cidade.
Nesse sentido, a iniciativa de constituição do arquivo contribui para ampliar as práticas
de cidadania por parte dos moradores da Maré, democratizando o acesso a informações
sobre a história local e da cidade. O museu torna-se um local onde além de contar a
história, valorizar a cultura local e suas múltiplas formas de identidade e propor uma
reflexão que perpassa a idéia do tempo, é sobretudo um lugar onde as pessoas se
encontram, e talvez por isso a experiência de visitá-lo se converta em emoção
―Com a criação do museu, há um movimento de valorização da experiência
vivida. O sentimento de pertencimento e orgulho, desperta o desejo de
transformação da realidade. É por isso que o Museu da Maré se propõe a não
limitar-se a uma exposição, o objetivo é atingir a vida das pessoas e chamá-las a
participar da construção dessa história. Se elas fazem parte do que vêem e se o
que vêem é um momento de um processo contínuo, que elas se sintam convocadas
a permanecer como agentes nesse processo, que é o processo de construção da
própria vida‖. Cláudia Rose
Assim os museus enquanto locais de mudança social e desenvolvimento tranformam-se
em locais de tradição e contradição, em locis de memória e de esquecimento, em locais
de poder e resistência, em locais e conformar e transformar. Os os museus como gestos
rebeldes e antropofágicos quebram preconceitos. São os exemplos de Museu de
Imagens do Inconsciente (RJ), Museu de Arte Negra (RJ), Museu Casa de Vitalino
(PE),Museu Casa de Chico Mendes (AC), Museu dos Índios Ticuna (AM), Museu
Pataxó de Coroa Grande (BA), Museu Terreiro de Mãe Mirinha (BA),Museu da Maré
(RJ),
Isto conduz Mário Chagas à pergunta O que é museu hoje? , quais são as suas
ferramentas. Hoje num musseu qualquer coisa pode ser uma ferramente desde um
simples lapis até à mais moderna tecnologia. O importante é entender que o museu é um
processo, um campo de múltiplas possibilidades, uma arena política (de confronto de
poderes), um campo discursivo e um Espaço de interpretação. São estes os modos da
Renovação do Campo Museal e do Museu como Construção do Futuro
Lista bibliográfica fornecida sobre o tema
ALVAREZ, Sônia E. et alli (orgs.) Cultura e política nos movimentos sociais latino-
americanos. Berlo Horizonte: UFMG, 2000.
CHAGAS, M. S. Há uma gota de sangue em cada museu. Chapecó: Argos, 2006.
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69 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
----. Museus, educação e movimentos sociais: só a antropofagia nos une. Revista
Eletrônica do IPHAN.
---- e NASCIMENTO, J. Política de museus, de patrimônio e de memória. In: I
Conferência Nacional de Cultura. Basília: Ministério da Cultura, 2007.
HONS, Ma. Inmaculada Pastor. Pedagogía museística: nuevas perspectivas y tendencias
actuales. Barcelona: Ariel patrimonio, 2004.
FOUCAULT, M. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 1996.
GOHN, M. G. O protagonismo da sociedade civil: movimentos sociais, ongs e redes
solidárias. São Paulo: Cortez, 2005 (coleção questões da nossa época, 123).
----. (org.). Movimentos sociais no início do século XXI: antigos e novos atores sociais.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2003.
MOREIRA, F. J. O processo de criação de um museu local. In: Anais do X Encontro
Nacional Museologia e Autarquias, Monte Redondo, 2000.
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70 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
3.3.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA
“Museus, Memórias e Movimentos Sociais‖,
Organizado em três pontos aborda a questão de como os museus são um instrumento
de modernidade para a construção dum diálogo cultural para os movimentos sócias
contemporâneos. Como locais de diálogo, são espaços que mobilizam as memórias
para motivar a acção libertadora. Têm referências bibliográficas no final. O primeiro
ponto organiza-se em torno do conceito do museu como uma metáfora que constrói
pontes entre espaços, indivíduos ou grupos a partir de imagens. Os movimentos
sociais e as exigências de modernidade nos museus exigiram a ressignificação da
função do museu. Exigiram a ―democratização do espaço‖ que deixa de ser um
espaço de elites para se tornar um espaço republicano e de exercício da cidadania.
Mobiliza a noção de Democratizar a democracia, de Boaventura de Sousa Santos,
para referir a modernidade do espaço museológico enquanto espaço de diálogos e
participação da comunidade. Nesse sentido, a transformação da organização museu
também implicou uma modernização das suas ferramentas.
Utiliza a metáfora do lápis para descrever a aprendizagem museológica. Ou seja, a
museologia não é só uma técnica é também uma filosofia, uma atitude perante o
mundo. Assim como manipular um lápis exige uma técnica (e uma borracha para
apagar segundo Regina Abreu), mas está sempre associado a uma outra
competência, de escrever ou desenhar. E a orientação da leitura e do desenho é que
dão sentido à construção do mundo. Assim a problemática dos museus não é só o de
os tornar acessíveis a todos (democratização versus local de elites) mas o de os
tornar como espaços da comunidade. De os arremessar para o interior do
Altermundismo (referencia aos trabalhos de Pierre Maryland). É esse poder de ser
palco que permite a sua mobilização para a representação simbólica das memórias
dos movimentos sociais. ―É por poder ser palco, tecnologia e nave que os museus
podem ser compreendidos como lápis (e borracha), com os quais é possível produzir
uma escrita capaz de narrar histórias híbridas, histórias com múltiplas entradas,
meandros e saídas.‖ (pag. 3)
No segundo ponto analisa a emergência dos museus no Brasil, ao longo dos 150
últimos anos, para concluir que é perante o reforço da poder do estado que se produz
uma maior génese museológica. Ou seja a mobilização da imaginação museal
relaciona-se com ressimbolização do poder, enquanto exercício de legitimidade. No
entanto, esse fenómeno de extensão e universalização dos museus não pode ser
reduzida a uma simples lógica de reprodução simbólica do estado, pois,
paralelamente regista-se uma evolução notável dos serviços e abordagens
museológicas. São sinais duma nova compreensão da função social dos museus, do
seu papel educativo e do desenvolvimento de experiencias museais.
Finalmente no terceiro ponto recentra-se na caracterização da proliferação de
museus e na questão (levantada por Preziosi em 1998), da canibalização que os
museus produzem sobre tudo, dando origem a museus de tudo. Chaga reconhece
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71 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
esse facto mas afirma que o importante é reconhecer o poder transformador do
homem. ― Reconhecer o poder antropofágico do museu, a sua agressividade e o seu
gesto de violência em relação ao passado é, ao que me parece um passo importante;
mas talvez o maior desafio seja reconhecer que essas instituições criam e acolhem o
humano, e, por isso mesmo, podem ser devoradas‖ (pag.7)
A operação da ressignificação do museu é a exigência da actualidade. São os casos
de Casa Museu (museu da maré). Ou seja os museus hoje dessacralizam-se e
tornam-se casa. Deixam de ser templos para serem locais habitados por humanos.
Locais onde se trabalha sobre a memória. Aqui rebate o conceito de ―local de
memória‖ de Pierre Norá. Não faz sentido valorizar o local de memória, que por
absurdo, existe em tudo o que é humano. Tudo é local de memória. Tudo é
potencialmente um museu. A memória não tem valor por si mesma. O que têm valor
é as mobilizações que fazemos com essa memória. A construção de modernidade
que essa memória permite. É nesse sentido que os‖ museus tanto servem para
libertar como para tiranizar o passado e a história a arte e a ciência ‖(pag. 7).
Entendido numa perspectiva crítica os museus são locais de memória e de
esquecimento. São locais vivos onde acontece vida. Por isso, essa diversidade
museal, não só é uma expressão da contemporaneidade dos museus, como é uma
oportunidade para mobilizar a imaginação museal para construir narrativas ao
serviço dos homens do presente. Assim se o museu canibaliza tudo, também os
grupos podem antropafagizar o museu e transforma-lo numa ferramenta ao seu
serviço.
De qualquer forma, a ideia de novos museus não implica o abandono dos museus de
―tesouros‖. Eles devem continuar a existir. Nesses ―velhos‖museus ―Um dos
desafios é aceita-los campos de tensão. Tensão entre a mudança e a permanência,
entre a mobilidade e a imobilidade, entre o fixo e o volátil, entre a diferença e a
identidade, entre o passado e o futuro, entre a memória e o esquecimento, entre o
poder e a resistência‖ (pag.9). Ou seja é preciso introduzir o sentido crítico nos
velhos museus. Introduzir outras leituras e outros olhares. Introduzir o pulsar da
vida, do nosso tempo. Não existe uma única possibilidade de memória. A memória é
versátil. A que a mobiliza é o acto criador. ―a possibilidade de criação humana
habita e mora na aceitação da tensão entre recordar e esquecer, entre o mesmo e a
negação da mesmice, entre a permanência e a mudança, entre a estagnação e o
movimento‖ (pag. 9).
“Cultura, Património e Memória”, versão da comunicação apresentada no 1º
Congresso Internacional de Arquivos, bibliotecas, Centros de Documentação e
Museus, São Paulo Março de 2002.
Mário Chagas faz neste texto uma abordagem aos conceitos de cultura, património e
memória, e da sua utilização por três instituições que conservam, estudam e
divulgam os saberes, os objectos de conhecimento, as técnicas e as narrativas. Estas
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72 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
instituições são as Bibliotecas, os arquivos e os museus. Ou sejam, um conjunto de
instituições que operam em campos de grande semelhança, que essencialmente se
diferencia pelo objectos, em que num são livros, noutro documentos, e ainda noutro
em objectos seleccionados pelo poder para representação de significados. Na sua
reflexão evoca ainda os trabalhos de Waldisa Russo sobre este assunto em 1982, que
segundo chagas constituiu um trabalho ―seminar‖ desta museologia dialógica,
processual e socialmente comprometida.
O campo de trabalho destas três instituições acaba por ser complementares, já que
todas elas acabam por estar presentes umas nas outras, como elementos de
investigação, de exposição e de divulgação. Todas estas instituições se encontram
implicadas no trabalho sobre a memória, todas detêm objectos que se constituem
como património, e todas elas operam a relação de poder memória/esquecimento.
Nas suas considerações sobre o trabalho da memória, Mário Chagas acaba por
precisar o uso desta ferramenta. ―Em termos práticos não há como separar a
memória e a preservação do exercício do poder‖ (pag. 5). E prossegue, ―reconhecer
a Inseparabilidade entre memória e poder, entre preservação e poder, implica a
aceitação que esse é um terreno de litígio e implica também a consciência de que o
poder não é apenas repressor e castrador, é também semeador e promotor de
memórias e esquecimentos, de preservações e destruições‖ (pag. 5). Ou seja, com
isto Mário Chagas defende que a memória não pode constitui uma prisão para o
processo museológico. Memória e patrimónios são apenas objectos que resultam do
exercício do poder. O que é importante é reconhecer a tensão existente na sociedade
que produziu essas memórias e esses patrimónios, e, de forma consciente, libertar
essa memória, revelando a dialéctica das coisas.
O trabalho museológico sobre a memória trabalha com as noções de património
enquanto bens tangíveis e intangíveis e naturais A noção de patrimonialização, é
uma operação que confere valor social, seja ele valor de saber, valor de transmissão
de identidades dum tempo para outro tempo, ou mesmo dentro do mesmo tempo. A
relação patrimonial é uma relação dinâmica, construída socialmente e fruto das
tensões sociais e das lutas de poder. Na nova museologia, a responsabilidade pelo
processo de patrimonialização é maior porque, como afirma Canclini, citado por
Chagas ―as investigações sociológicas e antropológicas sobre as maneiras como se
transmite o saber através das escolas e museus, demonstram que diversos grupos se
apropriam de forma desigual e diferente da herança cultural. Não basta que as
escolas e museus estejam abertas a todos, que sejam gratuitos e promovam todos os
sectores da sua acção difusora; à medida que descemos na escala económica e
educacional, diminui a capacidade de apropriação do capital cultural transmitido por
estas instituições‖65
.
65
Canclini, N.G, (1994), O património cultural e a construção imaginária do nacional, in
Revista do Património Histórico Artístico Nacional, nº 23, pp. 94-115. Citado por Mário Chagas
no texto na pagina 6
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Continuando a desenvolver a sua reflexão sobre a noção de património, afirma que
durante o século XX ele se afirmou como herança preferencialmente diacrónica.
Como um bens transmitido por via paterna, simbolicamente de modo autoritário. Ou
seja, no exemplo do património nacional, a passagem dum bem, de valor
inquestionável, como qualquer coisa de sagrada que deve ser preservada sem
questionamento. A este propósito, mais uma vez se socorre da herança teórica de
Russio, ao defender a necessidade de se trabalhar o património de forma sincrónica,
ou seja como uma herança de vida, como uma conexão da vida gerada no ventre
materno, como uma dádiva divina. Ou seja, defende a necessidade de trabalhar o
património do seu ponto de vista ―poético‖. Esta opção pelo sensível é a
possibilidade de se introduzir no trabalho patrimonial novos olhares e novas
interpretações.
De seguida, no ponto II do texto, reflecte de que forma esta relação poética sobre a
cultura, o património, a memória e o documento, de que forma estes novos olhares
são trabalhados pelas três instituições, bibliotecas e arquivos. Um diálogo que
procura um olhar critico que ultrapassa a ideia de Biblioteconomia como o estudo
das bibliotecas, e a arquivologia, como o estudo dos arquivos.
Ou seja, não é o espaço que preocupa Mário Chagas, mas sim o ―locus‖, o olhar
sobre a preservação e sobre o seu uso social. Tal característica inscreve estas
instituições na matriz teórica definida por Waldisa Russio, ―ao afirmar que a
museologia tem por objecto específico o estudo da relação entre o objecto/bem
cultural, num/espaço cenário denominado museu‖(pag. 9). 66
Esta delimitação duma
área do conhecimento, para o museu como espaço de ―memória do valor‖ e da
biblioteca como o lugar da ―memória do saber‖ e o arquivo como ―memória do
poder‖, configura uma base de mediação cultural que, para ultrapassar a
representação simbólica com base na escrita, deverá incluir também a dimensão
estética e sensorial. Ou seja, uma biblioteca e um arquivo, tal como os museus são
também espaços de lazer, de ócio e entretimento.
Ora a unidade conceitual dos bens culturais destas três instituições as suas
características ―auráticas‖ (pag 11) têm por base uma mesma identidade de
ferramentas. Os trabalhos dos seus técnicos são idênticos. Da crítica interna á crítica
externa do documento, do livro ou do objecto, da produção de conhecimento sobre o
mesmo, da produção da comunicação, e da possibilidade de sobre qualquer um deles
ser efectuada uma análise crítica como representação do poder, da sua mobilização
para a acção são as razões que levam da unidade conceitual à identidade do trabalho
sobre a memória e sobre o património.
Em todas estas casas se abrigam elementos do poder, elementos da memória e do
património. Por isso, qualquer uma destas casas (instituições) pode ser mobilizada
66
Citando Waldisa Russio (1990) em O Conceito de Cultura e a sua Inter-relação com
património cultural e a preservação, in Cadernos museológicos (IBPC), Rio de Janeiro, nº 3 pp.
7-12
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74 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
para lógicas de compromisso social, ―como espaços alternativos de resistência à
lógica de ―mercantilização massificadora‖. As ferramentas básicas são idênticas ou
similares. São portanto instituições que podem e devem desenvolver os seus
mecanismos de cooperação conjunto. Enquanto instituições de cultura e de memória
evidenciam a interdisciplinaridade do mundo contemporâneo
“A Poética das Casas Museus de Heróis Populares”, Aula Inaugural -
Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação - Univ. Federal do Rio Grande do
Sul. Do museu como prática social: Casa museu de heróis populares. 2008.
(Outra).
Em a Poética das Casas Museus de heróis Populares, Mário Chagas evoca mais uma vez
Gaston Bachelard67
e a sua abordagem onírica da história. Neste caso concreto, a Casa
enquanto elemento central da vida individual, enquanto espaço de produção de sentido
da vivência cultural do indivíduo, da representação dos seus tempos, dos seus lazeres,
das suas formas de estar e de ser, constitui uma narrativa para a construção dum
processo museológico. A casa como espaço simbólico, como espaço de memórias e
como espaço de vivências dessas memórias. A casa é também o espaço do
esquecimento, das memórias perdidas. Das memórias que caíram no limbo do
esquecimento.
A criação duma casa-museu tem constituído um dos processos museológicos que
efectua a narração na primeira pessoa, seja das elites, ou das classes populares. Todos os
museus, em certa medida são casas. Nesse sentido, todas elas são espaço de sonho.
Dessa forma, Mário Chagas defende que numa perspectiva crítica da museologia, as
casa museus podem ser um local para o exercício da Imaginação Museal, para um
processo narrativo poético e socialmente empenhado. ―Talvez seja possível exercitar
uma nova imaginação museal que, abrindo mão de toda a ingenuidade, valorize a
perspectiva crítica sem abrir mão da poética, e busque conectar a casa museu com as
questões da actualidade, com os desafios do mundo contemporâneo. O exercício da
imaginação museal também permitiria e estimularia a criação de novas casas museus,
casas que encenassem novas dramaturgia, que valorizassem a dignidade social, o
respeito das diferenças, o respeito aos direitos humanos, à liberdade; à justiça; que
registassem no presente e projectassem no futuro a memória criativa daqueles cuja
memória é frequentemente esquecida, silenciada, apagada.‖ (Pag,5)
A partir desta premissa Mário Chagas vai reflectir sobre as propostas de 3 casas de
heróis populares. Chico Mendes, líder sindical e ambiental, assassinado nos anos 80,
Mestre Vitalino, um artesão de referência na cultura popular brasileira e Cora Coralina,
uma ―poeta rebelde‖referencia na emancipação das mulheres. A sua criação é a prova
das alterações no panorama museológico brasileiro. ―Constituem exemplos de
67
Mais uma vez socorre-se de ―La poétique de l‘espace‖, veja-se nota --
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exercícios de direito à memória que valorizam (… ) as vozes normalmente silenciadas‖
(pag. 13). A criação dessas casas-museus constitui gestos conscientes dum processo
museológico que valoriza a memória.
Os Museus na Sociedade Contemporânea: Um Olhar Poético‖, 13 p.
Neste artigo Mário Chagas aborda os sentidos das novas práticas museológicas. O
mundo dos museus é hoje um mundo de mudanças permanentes, o que conduz a ideia
de que o museu, enquanto lugar de depósito de memória, museu como cemitério de
objectos tornados inúteis para o uso pelo nosso tempo, está obsoleto. Interroga-se se a
nova museologia que está a inundar o nosso tempo não é o próprio movimento da vida.
Assiste-se a uma mudança de concepções sobre o papel dos museus. Há grandes
tendências no mundo dos museus. A diversidade museal implica uma multiplicidade de
abordagens museológica e novos desafios para os programas de formação de
museologia. Duma aprendizagem centrada nas técnicas, Chagas de defende a
diversidade duma aprendizagem centras no humano. Trata-se duma alteração das
mentalidades e de modelos educativos. É preciso uma ruptura com o modelo do valor
mercadológico do museu para o centrar no valor da ―cultura viva‖ da relação entre os
seres e das suas relações com os bens tangíveis e intangíveis.
De seguida, a partir dum texto de Espinosa (Ética e Preposição VII), onde o filosofo
relaciona a identidade das coisas materiais com a identidade das ideias, Chagas propõe
―sou levado à compreensão de que a ordem e conexão do património espiritual é que o
património material, e ainda que o património espiritual e material são diferentes modos
e aspectos de uma mesma coisa, (…) ainda que expressa de duas maneira diferentes‖
(pag 2.)68
68
Esta abordagem de Mário Chagas fez-nos recordar o livro de Gaston Bachelard, La Poétique
de l‘Espace, Paris, PUF 1957. O autor diz na introdução. ―Um filosofo que formou todo o seu
pensamento aos temas fundamentais da filosofia das ciências, que segui, cuidadosamente, o eixo
do racionalismo activo, o eixo do racionalismo crescente da ciência contemporânea, deverá
esquecer o seu saber, romper com todos os seus métodos de investigação filosófica se quiser
estudar os problemas colocados pela imaginação poética. Aqui o passado da cultura não conta
nada. O longo e penoso esforço de ligações e construção dum pensamento, esforços de semanas
e meses de trabalho tornaram-se ineficazes. É necessário ter presente, estar presente no minuto
da imagem. Se há uma filosofia da poesia, essa filosofia deverá renascer em cada ocasião no
verso dominante. Na adesão total de uma imagem isolada e exactamente no êxtase duma nova
imagem. A imagem poética é um saudável relevo da psique, Um assunto ainda mal estudado das
causalidades psicológicas subalternas‖ (pag 3). Este enorme poder a imagem poética, que
irrompe dum objecto, esta capacidade de arruinar com a racionalidade da causalidade, como
fenómeno‖ iluminante ―, e que virá, constituir a fenomenologia da imagem, porque revela uma
ligação à sensibilidade e à emoção. Esta capacidade de produção de imagens poéticas, cujo
campo semântico se aproxima do processo de produção da memória, é uma das maiores forças
da criação do espírito humano. Essa capacidade de criar uma síntese, um símbolo que carrega o
todo. E é essa capacidade de permanente renovação do todo que a poesia e a imaginação museal
defendida por Chagas, deverá ser alocada para o mundo museal.
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É a partir desta reflexão, deste jogo entre a materialidade e as ideias que Mário Chagas
parte para a análise das alterações das colecções é simultaneamente a essência e desafio
do trabalho museológico. ―Os museus e as colecções transitam entre o abstracto e o
concreto, entre o material e o imaterial, entre o virtual e o não-virtual, entre o real e a
ficção, entre o ínfimo e grandioso, entre a poesia e o prego enferrujado‖ (pag. 2). Os
seja o trabalho do museólogo é revelar o valor do objecto, encontrar a sua singularidade
e a sua universalidade. Ou seja a condição de objecto museológico, por analogia à
poética, é algo que se eleva da sua materialidade concreta, para revelar valores, em cada
tempo considerados como necessários à vida da comunidade. Ou seja, o objecto
exprime na sua simplicidade o belo.
De seguida inventaria um conjunto de poemas sobre os museus para, para além de
mostrar que a abordagem poética também é uma forma de análise das colecções e das
funções sociais dos museus, que a poesia pode ser ao mesmo tempo uma linguagem
museológica e um instrumentos de interpretação dos objectos do mundo sensível e
material. Ou seja se os museus, hoje, podem ser plurais e diversos, ―interessa pensa-los
como campos de encontro, paisagens de convivência, de lazer e de luta, tendo como
pano de fundo a memória e o esquecimento, a preservação e a destruição‖ (pag. 11).
Regressando ao trabalho de Espinosa, da relação entre o espírito e a matéria, e à poética
como instrumento e como linguagem conclui que no museu, ―o nervo central‖ da
narrativa ―resulta da insuperabilidade entre o espírito e a matéria, em que um confere
sentido ao outro‖ (pag.11). Mais, no museu, como na poética, o material e o espiritual
alimentam-se mutuamente. E o intangível que dá vida ao tangível, que alimenta com
vida e que lhe proporciona a dança. Ou seja, Chagas descreve aqui a essência da
condição museológica contemporânea, ou a condição para a imortalidade do discurso,
ainda que essa imortalidade seja transitória.
Mas conclui ainda mais. A experiência poética transportada para o museu pode ajudar a
resolver a necessidade de subversão da ordem, criar novas leituras, novos olhar, novas
interrogações, e no limite novas motivações para a acção. A poética museográfica é
aquela que é susceptível de criar ―conhecimento e emoção, ali mesmo no coração do
inesperado‖. (pag 11)
Colocando o gesto de rebeldia na criação poética, cita o exemplo de Nise da Silveira,
sua mestra, e das suas rupturas com a ordem clássica da museografia, a propósito do
museu do inconsciente. A rebeldia da Nise, foi o de ter tido a capacidade para entrar
dentro da gramática do espírito, de ter aprendido a lidar com a emoção, ―aprendeu a
falar a linga das coisas‖. A rebeldia, ou se quisermos a capacidade de criação de um
discurso ―através da mediação dos objectos implica um pleno domínio da linguagem
museal, clareza conceitual, e interesse nas pessoas‖ (pag.12). Esta trilogia, teoria (―rigor
conceitual‖), linguagem e implicação com o outro, são elementos básicos para a
capacidade de inovar. De ser rebelde. De despertar emoções. De motivar consciências.
De criar sonhos e de concretizar a plenitude da vida social.
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77 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
O alcance desta abordagem teórica de Mário Chagas é profundamente inspirador para
recentrar o debate da museologia contemporânea. Qual é a centralidade do museus na
actualidade. Qual é o seu lugar social. Quais são as tensões do mundo. Este conjunto de
questões não tem uma resposta fácil. Mário Chagas advoga, que na contemporaneidade
o microcosmos social, as pequenas comunidade os pequenos grupos, (minoritários
diríamos nós69
) são os locais onde se encontra a ―gota de sangue70
‖ de suor e lágrima,
ou seja os utensílios para gerar emoção
―O Museu e o Abacaxi‖ 71
É um artigo em que Mário Chagas ironiza em relação a uma tendência de dotar as
cidades de certo tipo de museus, instalados em edifícios exuberantes mas vazios de
conteúdo (museologicamente falando). A propósito do Guggenhein no Rio de Janeiro
comenta uma fotografia publicado no jornal Globo, de Ana Branco, em que um duplo
do director do museu surge a dormitar com um abacaxi por cima da cabeça A partir da
interrogação dessa foto, ou da situação desse ―objecto museológico‖, ou seja através
duma análise museográfica crítica interroga-se sobre esse significado. Note-se que
abacaxi tem neste caso uma conotação depreciativa, de ―mau dançarino, pesadão‖. A
ironia do comentário é construída a partir da equação entre o custo total do museu, 43
milhões de U$. (um peso enorme) quando comparado com o números de escolas,
bibliotecas e demais equipamentos culturais ou sociais, que esse dinheiro público
poderia concretizar.
Mas para além disso É uma questão que evidencia a importância simbólica do museus
no mundo actual. A opção dos poderes públicos pela construção de raiz dum
equipamento simbólico. Mais, para além dos equipamentos citados isso acontece
quando inúmeros museus necessitavam de intervenção. Quando uma parte do valor da
construção do novo museu representam décadas de orçamento destes museus ―agora
menosprezados‖.
A crítica de Mário Chagas, após este contraste é feita a partir da análise da actividade de
cada museu, e daquilo que poderíamos chamar a mobilização de activos sociais ou a
criação de mais-valias para a comunidade. Segundo Mário Chagas isso acontece
fundamentalmente em pequenos museus de comunidade, em articulação de redes de
museus, que trabalham com pequenos orçamentos. Ou seja a museologia não necessita
69
A capacidade de gerar mudança social a partir de ideias e grupos minoritários é um processo
de renovação a organização social. (Vejam-se os Trabalhos de Lígia Amâncio e Isabel Guerra.
(ver onde está trabalho ISCTE- Psicossociologia II) 70
No artigo ―Mário de Andrade e o Seu museus de sonhos‖ esta ideia será desenvolvida. Ver
também tese de mestrado “Há uma gota de sangue em cada museu: a óptica museológica de
Mário de Andrade‖, (1997) e também I Seminário Museologia, Patrimônio e Pesquisa - 5ª
Semana Nacional de Museus na Escola de Museologia. Há uma gota de sangue em cada museu:
A Óptica museológica de Mário de Andrade. 2007. (Seminário).. 71
Não encontramos, até ao momento, a referência da publicação deste texto.
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78 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
de elefantes brancos, mas sim de espaços museográficos democráticos e participativos
―o Guindeis é no Rio um abacaxi. ―coisa e obra gigantesca,, grande na sua
monumentalidade , mas culturalmente supérflua, vazia de significação‖ (p 2), citando o
Ministro da Cultura (Gilberto Gil).
―A Radiosa aventura dos Museus ― CHAGAS, M. S. . La radiante aventura de
los Museos. In: IX Seminário sobre Patrimônio Cultural: Museos en Obra, 2007,
Santiago, 2007. v. 1. p. 28-42.72
Em a Radiosa aventura dos Museus, Mário Chagas retoma a sua abordagem à
museologia pelo seu lado estético que, segundo o autor, representa uma grande inovação
na museologia contemporânea. É um discurso que é construído a partir duma reflexão
sobre o papel do museu durante o século XX, a herança da museologia e dos debates da
renovação museológica no último quartel desse século. Diz Chagas ―Os museus ainda
são lugares privilegiados do mistérios e da narrativa poética que se constrói com
imagens e objectos. O que torna possível a narrativa, o que fabula esse ar de mistério é o
poder de utilização das coisas como dispositivos de mediação cultural entre mundos e
tempos diferentes, significados e funções diferentes, indivíduos e grupos sociais
diferentes‖ (pag. 1).
Não constituindo uma norma ou uma imposição, Chagas de fende que a diversidade da
museologia, a sua riqueza como local de representação das memória, lhe é conferida por
essa possibilidade de encenação plural. Defende mesmo que a abordagem poética como
ferramenta museal, confere-lhe essa capacidade de renovação dos discursos mais
arcaicos, dos museus arqueologizados em si mesmos e sobre os seus discursos. Essa
capacidade de renovação dentro do velho, da capacidade de repensar o museu clássico a
partir dos paradigmas da nova museologia, é conferida pela ―imaginação museal‖. Ou
seja a reinvenção dos discursos, a antropofagização do próprio museu como processo de
renascimento ou de criação de novas sínteses discursivas.
Como é que o discurso dos museus se torna central no mundo contemporâneo. O
intenso debate cultural e os movimentos sociais nas ultimadas décadas colocaram as
imagens e os objectos como elemento central da mediatização do poder, por um lado, e
pela própria capacidade de renovação da imaginação museal, por outro. Ou seja, as
profecias do fim dos museus não se confirmaram, porque o poder metamorfoseou-se
passando a atribuir novas significações às imagens. Do carácter relativamente
permanente dos signos, as sociedades contemporâneas passaram a produzir uma
pluralidade de significações simbólicas. O museu como local de produção ganha assim
novos significados sociais, assumindo, por consequência novos protagonismos. Esse
72
Uma outra versão deste texto foi também inserido em Museus como Agentes de Mudança
Social e Desenvolvimento: Propostas de Reflexão Museológica, Xingó, Museu de Arqueologia
de Xingó, pp. 41-52
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79 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
fenómeno explica o crescimento exponencial do nº de museus por todo o mundo, a
crescimento da oferta de serviços aos profissionais de museus, e uma maior atenção aos
públicos. ―A modernização trouxe maior preocupação com os serviços destinados ao
público e maior atenção para as práticas pedagógicas além do aprimoramento dos
recursos expográficos e do refinamento dos procedimentos técnico-científicos nas áreas
de preservação, conservação, restauração e documentação expográfica.‖ (pag. 4).
Ou seja, os museus, como instituições, na última metade do século XX cresceram em
extensão e em qualidade. Mas quererá isso dizer que temos por isso melhores museus.
Mário Chagas diz que a variação depende do posicionamento crítico do museu. Se por
um lado, assistimos a um movimento de crescente espetacularização dos museus e das
suas actividades. ―Os museus de dinossauros e os museus dinossáuricos voltaram a estar
na moda‖ (pag.4), assistimos igualmente a uma renovação da imaginação museal.
Mário Chagas faz radicar a evolução do conceito de imaginação museal nos trabalhos
de Hughes de Varrine, na década de 60, com o conceito de Ecomuseu. Relatando a
surgimento da ideia conclui que ele surge da imaginação, do jogo de palavras, quando
se procurava uma conexão com a natureza. A formulação teórica dessa integração do
território conduz igualmente à integração da comunidade que nela habita, e a
formulação da necessidade de participação da população (participação comunitária), da
sua ligação às questões do desenvolvimento do território. ―Na raiz desse novo tipo de
museu, estava presente a importância da utilização da linguagem das coisas‖ (pag. 6).
Em Santiago do Chile, em 1972, a formulação do conceito de ―Museu Integral‖, ―isto é
um processo que leva em consideração a totalidade dos problemas da sociedade‖ e o
―museu enquanto acção‖ (pag. 7)
Essa reformulação da imaginação museal, não implicava a ruptura com o paradigma de
conservação patrimonial, que orientava a acção do museu nos últimos 200 anos. O fim
da conservação é que passa a incluir o ―conceito de património global (Varrine) ― que é
a conservação em função do interesse da comunidade. Prosseguindo a evolução do
conceito de ―imaginação museal‖, a abordando os trabalhos de Pierre Maryland e René
Rivard, no Canadá, e o desenvolvimento, silêncios, das novas experiencias que levaram
à Criação do MINOM. (1984). Ou seja, a imaginação museal de Mário Chagas é a
ruptura que permite aqueles que trabalham em museus abordar os problemas da
humanidade e das comunidades. Os museus que melhor desenvolveram a imaginação
museal foram aqueles que abandonaram ―a lógica da acumulação patrimonial (pag 9) e
que em vez de se orientarem para grandes narrativas, se passam a centrar um ―Short
stories‖: as experiencias concretas dos seres e das coisas. A visão poética da vida, com
toda a sua intensidade.
É esta apropriação, da imaginação museal como ferramentas, que permite a
antropofagização do museu pelos grupos minoritários, que combinando os seus próprios
saberes geram novas narrativas, híbridas; por um surgimento duma narrativa
expográfica na primeira pessoa, por uma multiplicação de museus locais de participação
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comunitários, e por uma fusão da materialidade com o espiritual nas narrativas,
propiciando e irrupção da poética (pag, 9).
Contudo alerta, que a capacidade de sedução desta nova museologia, pelo facto de ser
nova, não impede que possam ocorrer um conjunto de ―ameaças‖ que enviesam ou
alteram o carácter destes museus. Algumas destas ameaças já tinham sido identificadas
por Varrine, Chagas acrescenta 7 novos alertas. Prendem-se essencialmente com a
lógica do poder, com a maturidade de execução, e com a possibilidade de com a
tendência para o arejamento do modelo se cair numa ―velha narrativa‖ onde o museu
não se constitua como um espaço de diálogo, e a museologia como um processo de
construção de narrativas socialmente produtivas.
Os novos desafios da imaginação museal centram-se na necessidade de ultrapassar a
dialéctica entre passado/presente, tradição/modernidade. Ou seja, o museu não tem que
mostrar uma linha cronológica finalista da comunidade, mas sim as tensões e os actos
criativos que são simbólicos e produtores de memórias. Um outro desafio é a
necessidade dos museus serem entendidos como campos de relações onde o homem se
encontra presente. E terminando a sua exposição, citando Waldisa Russio e o seu museu
da imaginação, afirma ―Essa narrativa parecia sugerir: os museus podem ser
compreendidos como máquinas, tecnologia ou ferramentas; mas nós não somos museus,
não somos coisas, somos humanos. Nós trazemos o amor e a humanidade em nossos
corações; nós temos o poder de criar artefactos e museus; temos o poder de criar esta
vida livre esplêndida … de fazer da vida uma aventura radiosa…‖ (pag 11).
―Mário de Andrade e o seu Museu de Sonhos‖
A alegoria do ―tupi tangendo o seu alude‖ com a sua sonora pujança figurativa, serve
para associar a prática coleccionista de Mário de Andrade ( 1893-1945 ) notável homem
da cultua brasileira. Colecção de fragmentos duma memória que o ―olhar museológico‖
de Mário de Andrade reuniu como significantes duma realidade brasileira, sobre a qual
exercia o seu olhar crítico. Um olhar que buscava a essência, as raízes duma cultura
nacional. O museu de Mário de Andrade foi o espaço onde desfrutava de vida. Onde
vivia e convivia. Os objectos que reuniu eram como ―gotas de sangue‖, marcas
significantes que despertavam interrogações.
O Museu, para Mário Chagas é cimentado com essas ―gotas de sangue‖. Os objectos
coleccionados e vividos por Mário de Andrade eram símbolos duma realidade. O seu
estudo e o seu usufruto eram modos de vida. Viver o museu era um modo de vida.
E esse museu, enquanto espaço total está presente na obra ficcional de Mário de
Andrade. Mário Chagas mapeia esse roteiro. O primeiro exemplo dado é a obra
Manucaíma. Na obra transparece uma tensão entre o material e o imaterial, a propósito
da colecção de bocagens que substitui a colecção de pedras. Num segundo exemplo,
Mário de Andrade considera que a dimensão humana da obra cultural, não está no
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objecto, mas sim no agente que a trabalha e difunde. Ou seja, a música pode ser
conservada em suportes fiscos, mas só atinge a sua plenitude através do agente que a
exercita. Que a faz crescer e transformar. Ou seja o importante não é preservar por
conservar, mas conservar para alocar a memória para novas realizações.
Essa dimensão universalizante da colecção de Mário de Andrade esta depois presente
nos projectos culturais propostos para a prefeitura de São Paulo. Concebido, mas não
concretizado. O objectivo era democratizar o acervo musical da cultura mundial. O
museu deveria disponibilizar a informação. Essa concepção, inovadora nos anos 40,
trazia para a discussão museológica a questão da réplica como objecto museal.
Considerava-se na época que a uma réplica faltas dignidade para figurar no museu: Não
tinha ―aura‖. Ao desmitificar o original e a elevar a réplica Mário de Andrade, fazia
intervir o sujeito. O museu tinha que ser possuído pelos seus utilizadores, concepção
revolucionária na época. Esse debate entronca numa polémica da época em volta da
―obra de arte na era da sua reprodutibilidade técnica‖, texto de Walter Benjamim ( -
nota sobre benjamim), e da questão da democratização do acesso a bens culturais.
Essa capacidade de compreensão da totalidade do fenómeno museológico, da sua
proposta modernista. Distinta das propostas modernistas de Itália, onde é proposto o fim
dos museus, Mário de Andrade propõe o museu como centro de actividade Social. Essa
renovação do discurso sobre o objecto museológico advém das suas propostas de pensar
e fazer cultura.
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3.4 Museologia e Comunicação de Maria Cristina Bruno
3.4.1 Síntese Biobliográfica
Maria Cristina de Oliveira Bruni é Doutorada doutorado em Arqueologia pela
Universidade de São Paulo com a tese MUSEALIZAÇÃO DA ARQUEOLOGIA: UM
ESTUDO DE MODELOS PARA O PROJETO PARANAPANEMA, 1995. Fez
mestrado em História Social pela Universidade de São Paulo em 1984, com a tese O
MUSEU DO INSTITUTO DE PRÉ-HISTÓRIA: UM MUSEU A SERVIÇO DA
PESQUISA CIENTÍFICA, e é Licenciada em História pela Universidade Católica de
Santos (1975), especialização em Arqueologia e Museologia pela Escola de Sociologia
e Política de São Paulo (1980). Actualmente é Professora Associada da Universidade de
são Paulo e Vice-Directora do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de
São Paulo, onde coordenou as quatro edições do Curso de Especialização em
Museologia (1999 - 2006) e participa do Programa de Pós-Graduação em Arqueologia
onde ministra disciplinas optativas de graduação sobre Museologia e desenvolve
pesquisas de comunicação museológica. Colabora com várias instituições académicas,
entre as quais a ULUT, onde ministra seminários e orienta mestrados e doutoramentos
no Centro de Estudos de Sociomuseologia.
Tem experiência na área de Museologia, com ênfase para o Ensino e Projectos de
Comunicação Museológica, com especialização principalmente nos seguintes temas:
museologia, museu, museologia brasileira e musealização da arqueologia. Presta
consultorias a outras instituições para a elaboração de programas museológicos.
Cristina Bruno é uma referência na museologia actual, aliando uma profunda reflexão
teórica à observação atenta do fenómeno museológico actual e a uma prática muito
sólida na programação e execução de projectos de processos museológicos. Por essa
razão a sua obre têm cós mais centenas e livros, artigos e colaborações publicados nos
mais diversos locais. Entre ele destacamos. Os anais da USP onde prestou provas de
Livre-docência com o título MUSEOLOGIA: A LUTA PELA PERSEGUIÇÃO AO
ABANDONO. BRUNO, Maria Cristina Oliveira . Museus, identidades e património
cultural. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, v. S-7, p. 145-151, 2008,
BRUNO, Maria Cristina Oliveira. Museologia e Museus: os inevitáveis caminhos
entrelaçados. Cadernos de Sociomuseologia, Lisboa, v. 25, p. 3-15, 2006, BRUNO,
Maria Cristina Oliveira. Museu da Cidade de São Paulo: as mudanças éticas sonhadas
por Mário de Andrade. Revista do Arquivo Municipal (São Paulo), v. 204, p. 119-127,
2006.,BRUNO, Maria Cristina Oliveira . O Trabalho com o abandono: entrevista com a
museóloga Maria Cristina Oliveira Bruno. Cadernos do CEOM, Chapecó, SC, v. 21, p.
303-336, 2005, BRUNO, Maria Cristina Oliveira . Arqueologia e antropofagia: a
musealização dos sítios arqueológicos. Revista do Serviço do Património Histórico e
Artístico Nacional, Rio de Janeiro, v. 31, p. 234-247, 2005. BRUNO, Maria Cristina
Oliveira . A Museologia como uma Pedagogia para o Património. Ciências e Letras
(Porto Alegre), Porto BRUNO, Maria Cristina Oliveira . Os necessários alicerces para o
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83 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
desenvolvimento dos processos museais: o Programa de Estudos Museológicos.
Ciências em Museus, Belém, n. 4, p. 45-49, 1992. BRUNO, Maria Cristina Oliveira . A
pesquisa em museologia: o programa técnico-científico do Museu de Arqueologia e
Etnologia - USP. Ciências e Letras (Porto Alegre), Belém, n. 3, p. 9-26, 1991. BRUNO,
Maria Cristina Oliveira (Org.) ; Felipini, K (Org.) . Museus como Agentes de Mudança
Social e Desenvolvimento - Propostas e Reflexões Museológicas. São Cristóvão: Museu
de Arqueologia de Xingó, 2008. 210 p. BRUNO, Maria Cristina Oliveira (Org.) ;
CHAGAS, Mário (Org.) ; MOUTINHO, M. (Org.) . Sociomuseology. 1. ed. Lisboa:
Edições Universitárias Lusófonas, 2007. 220 p. BRUNO, Maria Cristina Oliveira
(Org.) . V Semana dos Museus da Universidade de São Paulo - Acções afirmativas em
museus: educar e preservar. 1. ed. São Paulo: Museu de Arqueologia e Etnologia/USP,
2007. v. 1. 524 p. BRUNO, Maria Cristina Oliveira . Museologia e Museus: princípios,
problemas e métodos. Lisboa: Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologia,
1997. 133 p. BRUNO, Maria Cristina Oliveira . Museologia e Comunicação. Lisboa:
Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, 1996. 116 p. BRUNO, Maria
Cristina Oliveira ; ARAUJO, M. . A Memória do Pensamento Museológico. São Paulo:
ICOM / Brasil, 1995. 45 p. BRUNO, Maria Cristina Oliveira . Museus, identidades e
património cultural. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, v. S-7, p. 145-151,
2008, BRUNO, Maria Cristina Oliveira . Museologia e Museus: os inevitáveis
caminhos entrelaçados. Cadernos de Sociomuseologia, Lisboa, v. 25, p. 3-15, 2006,
BRUNO, Maria Cristina Oliveira . Museu da Cidade de São Paulo: as mudanças éticas
sonhadas por Mário de Andrade. Revista do Arquivo Municipal (São Paulo), v. 204, p.
119-127, 2006., BRUNO, Maria Cristina Oliveira . O Trabalho com o abandono:
entrevista com a museóloga Maria Cristina Oliveira Bruno. Cadernos do CEOM,
Chapecó,SC, v. 21, p. 303-336, 2005, BRUNO, Maria Cristina Oliveira . Arqueologia e
antropofagia: a musealização dos sítios arqueológicos. Revista do Serviço do
Património Histórico e Artístico Nacional, Rio de Janeiro, v. 31, p. 234-247, 2005.
BRUNO, Maria Cristina Oliveira . A Museologia como uma Pedagogia para o
Património. Ciências e Letras (Porto Alegre), Porto BRUNO, Maria Cristina Oliveira .
Os necessários alicerces para o desenvolvimento dos processos museais: o Programa de
Estudos Museológicos. Ciências em Museus, Belém, n. 4, p. 45-49, 1992. BRUNO,
Maria Cristina Oliveira . A pesquisa em museologia: o programa técnico-científico do
Museu de Arqueologia e Etnologia - USP. Ciências e Letras (Porto Alegre), Belém, n.
3, p. 9-26, 1991. BRUNO, Maria Cristina Oliveira (Org.) ; Felipini, K (Org.) . Museus
como Agentes de Mudança Social e Desenvolvimento - Propostas e Reflexões
Museológicas. São Cristóvão: Museu de Arqueologia de Xingó, 2008. 210 p. BRUNO,
Maria Cristina Oliveira (Org.) ; CHAGAS, Mário (Org.) ; MOUTINHO, M. (Org.) .
Sociomuseology. 1. ed. Lisboa: Edições Universitárias Lusófonas, 2007. 220 p.
BRUNO, Maria Cristina Oliveira (Org.) . V Semana dos Museus da Universidade de
São Paulo - Acções afirmativas em museus: educar e preservar. 1. ed. São Paulo: Museu
de Arqueologia e Etnologia/USP, 2007. v. 1. 524 p. BRUNO, Maria Cristina Oliveira .
Museologia e Museus: princípios, problemas e métodos. Lisboa: Universidade Lusófona
de Humanidades e Tecnologia, 1997. 133 p. BRUNO, Maria Cristina Oliveira .
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84 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Museologia e Comunicação. Lisboa: Universidade Lusófona de Humanidades e
Tecnologias, 1996. 116 p. BRUNO, Maria Cristina Oliveira ; ARAUJO, M. . A
Memória do Pensamento Museológico. São Paulo: ICOM / Brasil, 1995. 45 p.
O seu seminário na Universidade LUSÓFONA DECORREU nos dias 3 e 4 de
Fevereiro de 2009. Cristina Bruno, juntamente com os seus colaboradores Marcelo
Araújo (Museu Pinacoteca) e Katia Felipini (Museu da Resistência) foram os principais
organizadores da visita de estudo a São Paulo em Abril de 2009.
Durante o seminário foi distribuído o programa, o suporte de slides de apoio à
exposição, lista de referências bibliográfica e dois textos de referência, que foram
discutidos durante a sessão:
VARINE-BOHAN, Hugues de (2008): ―Museus e Desenvolvimento Social:
Balanço Crítico‖, in Museus como Agentes de Mudança Social e
Desenvolvimento: Propostas de Reflexão Museológica, Xingó, Museu de
Arqueologia de Xingó, pp. 11-20.
BRUNO, Maria Cristina Oliveira , FONSECA, Andrea Matos, NEVES, Kátia
Regina Felipini (2008):Mudança Social e Desenvolvimento no pensamento de
Waldisa Rússio Camargo Guarnieri: textos e contextos in Museus como Agentes
de Mudança Social e Desenvolvimento: Propostas de Reflexão Museológica,
Xingó, Museu de Arqueologia de Xingó, pp. 21-36
BRUNO, Maria Cristina Oliveira (2004), ―Principais Campos da Acção
Museológica ―com a referência de terem sido apresentados como comunicação
no Seminário CCBB 20-24 Julho de 2004, em Museus e Exposições do Século
XXI:
BRUNO, Maria Cristina Oliveira (2008) ―Vectores e Desafios Contemporâneos
―Definição de Curadoria: Caminhos do enquadramento, tratamento e
extroversão da herança patrimonial‖, 24 p. com bibliografia, publicado no Livro
Caderno de Directrizes Museológicas 2, Secretaria de Estado da Cultura de
Minas Gerais.
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85 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
3.4.2 Roteiro dos Seminários
O programa do seminário envolveu a apresentação de uma reflexão teórica, a
apresentação de casos e o exercício individual e em grupo de propostas de reflexão
previamente elaboradas. O temo de trabalho organizou-se em três eixos,
cronologicamente sequenciais. O primeiro, de saber quais são as premissas teórico-
metodológicas da museologia, como ciência aplicada ?e qual a engrenagem teórica de
pedagogia museológica. O segundo eixo de reflexão, que decorre do primeiro, foi
identificar as premissas da gestão museológica , a partir da elaboração da missão, metas
(objectivos) e elaboração de plano director. O terceiro eixo orientou-se em torno da
discussão ―Museu e Sociedade: os desafios da pedagogia museológica.
Para o primeiro eixo de reflexão foram apresentados os seguintes casos: ―Museus de
Arqueologia no Brasil: Museus de Arqueologia e Etnologia da USP, Museu de
Arqueologia de Xingó/UFS e Museu de Arqueologia da Universidade de Mato Grosso
do Sul‖; e ―Os conflitos temáticos: Memorial da Resistência de São Paulo. Neste eixo
de reflexão foi ainda efectuado um exercício prático com a‖elaboração duma proposta
de intervenção museológica‖, que partiu dum momento de reflexão individual seguida
da produção de um documento em grupo (processo de participação) Para o segundo
eixo de reflexão foram apresentados dois casos: o Programa de ―Pioneiros e
Empreendedores: a saga do desenvolvimento do Brasil: são Paulo, e o caso do Museu
de Artes e Ofícios de Belo Horizonte – Minas Gerais. Foi ainda proposto, como
exercício prático o desenvolvimento da proposta de desenvolvimento expográfico da
proposta elaborada pelo grupo no eixo de reflexão anterior. O terceiro tema foi
efectuada uma discussão em conjunto de todos os participantes, com mobilização das
experiencias individuais.
a. Estudo museológico: premissas teóricas metodológicas
A partir das tensões entre as premissas teóricas e das premissas metodológicas da
museologia, Cristina Bruno procura identificar os objectivos dos processos patrimoniais
e dos processos museológicos. A primeira questão que procura responder é saber quais
são os desafios epistemológicos. A ciência é feita de superação de paradigmas. Qual é o
histórico da construção do campo de conhecimento da museologia? Não há dúvidas, que
existe um campo e um modelo teórico da museologia. Há um crescente número de
cursos de formação teórica nas academias de todo o mundo, existe um crescente número
de discussões e publicações académicas sobre o assunto. Existe igualmente diferentes
tendências no pensamento museológico, que expressam um diversidade de problemas
no mundo dos museus. Por exemplo, dentro do ICOM existe uma linha de reflexão
expressa pelo MINOM
Esta diversidade de pensamento começa por uma distinção entre Museografia, enquanto
técnica aplicada à construção da exposição, como construção duma colecção de objectos
e como conservação de objectos, e uma Museologia, como universo de pensamento.
Existe uma reciprocidade, uma vez que a museologia integra a técnica museográfica,
integra o estudo dos objectos e a sua comunicação. Existe no entanto um campo de
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86 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
confronto entre a ―colecção‖ versus ―não colecção‖. Ou seja para a museografia tem
sempre que existir um catalogo de acervo, enquanto a museologia não faz depender a
sua existência dum colecção. Por sua vez, no interior da museologia também existem
confrontos entre uma museologia mais tradicional, a nova museologia e a
sociomuseologia73
. Uma sistematização proposta pelo ICOFON, por exemplo,
estabeleceu uma sistematização dos novos museus como Ecomuseus, Museus de
Cidade, Museus de Sítio. Nesse documento o ICOFON procurou reflectir o papel do
museu no mundo contemporâneo.
No entanto, para além destas tensões há convergência que interessa mobilizar: Em
primeiro lugar, para todos é claro que a museologia é uma ciência aplicada, isto é um
campo de conhecimento onde a reflexão se expressa pela construção de acções. De
seguida, é também consensual que a preservação é um campo de actuação comum, seja
preservação de objectos matérias, seja da imaterialidade, que se pode constituir em
torno de valores, ideias, memórias, etc. Há também uma crescente convergência da
museologia com as disciplinas que tratam a informação (as ciências de comunicação e
os sistemas de informação). Há também uma convergência em torno da questão do
potencial do museu para apoiar (subsidiar) os processos de educação da memória. Há
também uma convergência de que a disciplina se organiza a partir de um conjunto de
procedimentos técnicos, duma metodologia. O seu compromisso com as discussões
sobre o desenvolvimento (da comunidade ou da nação) constitui também uma
finalidade. Finalmente, reconhece-se à museologia uma cumplicidade com o
desenvolvimento de acções inclusivas (inclusão social)74
. Todas estas componentes da
ciência museológica se concretizam no interior do museu.
Os problemas epistemológicos deste campo do conhecimento -se portanto em torno de
dois problemas básicos: Como identificar e analisar o comportamento individual e
colectivo do homem frente ao seu património; e como desenvolver processos (técnicos e
científicos) para a partir da relação (do homem/comunidade – património) transformar o
património numa herança que contribua para a ―construção de identidades‖. O eixo da
preservação trabalha sobre a herança.
A partir destas definições Cristina Bruno propõe pressupostos definidores da
museologia, como uma possibilidade de organização epistemológica geral, especial e
aplicada75
. Ou seja, se a museologia é a ciência que ―estuda a relação entre o homem, o
73
No Brasil, os estudos sobre museus surge a partir dos anos 30. Só a partir dos anos 90 do
século XX é que se passa a estudar a museologia. A museologia também estuda a tendência dos
museus. A sociomuseologia apresenta um carácter diferenciador em relação às demais
abordagens, Nela o carácter social domina sobre o carácter cultural. 74
Neste âmbito por exemplo estuda-se o lugar do museu na cidade. A museologia tem também
uma dimensão de síntese, capaz de apresentar o conteúdo informacional disponível no mundo
para pequenos conjuntos de públicos diferenciados. A museologia, com a sua dimensão estética
é capaz de sintetizar. O território dos museus pode reflectir várias narrativas (espelho da
memória). 75
Em 1992, Peter Van Mensch, propõe esta diferenciação MENSH, Peter v. (1992): Towards a
methodology os museology, Zagreb, tese de doutoramento consultada em www.xs4all.nl/~rwa.
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87 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
objecto num cenário‖ Mais, acrescenta a necessidade de incluir no estudo e análise dos
processos museológicos a ―Função Social‖ do museu, enquanto componente do
conhecimento, da formação e especialização académica.
A reflexão da museologia a partir dos campos semânticos
(memória/património/preservação) e (ressignificação/acessibilidade/pertença) são
elementos que permitem reequacionar a museologia. A museologia, como ciência,
acontece num campo de tensões, numa campo de poder social com protagonistas que
negoceiam escolhas e decisões. A elaboração e tratamento da informação sobre o
património fornece eixos de output para o campo semânticos de ―administração da
memória‖, enquanto locais museológico, ―pertença‖, enquanto mecanismo de vinculo
adesão e motivação, ―acessibilidade‖, como campo de leitura ou ponto de apropriação
mediática, e ―ressignificação‖ como campo de acesso ao conteúdo da informação, sua
reinterpretação e reformulação. Nesta perspectiva como é que esta proposta de síntese
pode ser trabalhada pela Pedagogia Museológica, como caso exemplar.
A Pedagogia museológica parte duma oferta de objectos, lugares, colecções e acervos
que constitui o conjunto de bens patrimoniais, referências culturais e indicadores de
memórias, passíveis de serem, alocados e apropriados para o processo museológico (que
se apropria (guarda), protege (conserva), intervenciona (estuda e investiga) e devolve
(expõe)). Esta relação entre a significância e a materialidade constitui a cadeia
operatória da museologia.
A cadeia operatória da museologia trabalha com: A identificação da musealidade (o
incentivo à observação, a percepção), com o aprimoramento da percepção selectiva
(exercício do olhar e da identificação de significados), com o tratamento dos bens
seleccionados (uso qualificado de referencias culturais), atribuindo uma valorização dos
bens patrimoniais (construindo uma herança cultural, e finalmente
interpretando/extrovertendo/difundindo os bens seleccionados, ou seja a divulgação e
contextualização sócio cultural.
A criação destes marcadores de memória constitui, no âmbito da função social do
museu, o carácter interdisciplinar da museologia, a especificação do campo de
conhecimento. Ou seja, segundo Cristina Bruno, museologia define-se pela sua acção
sobre o mundo, pela sua função na comunidade.
A museologia geral, relaciona-se com os princípios comuns da conservação, investigação e
comunicação das evidências materiais da humanidade, do seu ambiente natural e do seu
enquadramento institucional. Examina igualmente as condicionantes sociais que produziram
essas evidências, bem como o seu impacto. A museologia técnica dedica-se aos fundamentos
epistemológicos e filosóficos destes princípios e a museologia aplicada encontra-se relacionada
com a dimensão metodológica do trabalho de museu. A museologia especializada faz a
interligação entre a museologia geral e as disciplinas de base, relacionando-se com a história da
arte, a antropologia, a história natural ,etc. Finalmente a museologia histórica fornece a
perspectiva histórica global
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A Museologia é um processo, com regras de conhecimento. É o funcionamento da
cadeia operatória que está no cerne do processo museológico enquanto formação da
ciência.
A questão do processo museológico torna-se portanto o espaço onde acontece ciência,
onde se reflecte a ciência, onde se cria ciência, e onde se devolve a ciência à
comunidade. O processo museológico é um processo dialógico. É feito com a
participação da comunidade numa permanente negociação. Está implícito que a coesão
duma comunidade se expressa através duma identidade. Essa identidade tem uma
memória. A memória estrutura a comunidade e permite, no seu interior desenvolver os
mecanismos de adaptação ao mundo e de viabilização do grupo.
Sendo a museologia uma ciência são as suas metodologia, as suas ferramentas e
instrumentos de trabalho o estudo das relações ou campos de tensão:
avaliação do funcionamento da comunidade e a gestão das suas expectativas
a identificação dos protagonistas e suas relações
análise sobre o enfoque central e as perspectivas de mudança
avaliação sobre a informação disponível e organizada
reavaliação permanente sobre espaços sociais de expografia e sua perspectiva de
gestão
discussão permanente sobre conceitos e levantamentos bibliográficos e
documentais
Reavaliação de propostas de museografia, apresentação de projectos
Estes instrumentos têm vindo a originar um novo tipo de programas museológicos:
Museus como centros de referência cultural e de serviços à comunidade
Redes de lugares de memória. (marcadores da memória)
Incorporação regular de testemunhos com reconstrução permanente de acervos
Novos conceitos expositivos, com emergência de exposições regulares
Emergência dos serviços educativos e culturais
Em síntese epistemológica, a museologia enquanto disciplina aplicada, pode ser
definida como: o estudo da percepção, apropriação, tratamento e socialização da
musealidade inerente à realidade, e como uma disciplina que organiza o seu quadro
referencial a partir dos procedimentos de salvaguarda e comunicação aplicados nos
museus ou a processos museológicos.
A museologia articula (opera) o Facto Museal, O fenómeno museológico e o processo
museológico. Sendo que o facto museal é a expressão da relação entre o homem/objecto
e vice-versa, o Fenómeno museológico articula a dimensão simbólica e social dos
objectos e das suas ralações com a comunidade. Sendo o processo museológico a forma
de como estas duas relações de expressam no espaço e no tempo. Estes campos de acção
museológica decorrem em simultâneo em diversas dimensões. Assim, o campo
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essencial (dimensão unitária) trabalha com o facto museal, o campo da interlocução
(campo relacional) trabalha com o fenómeno museológico, e o campo de projecção
(dimensão processual) trabalha com o campo processo museológico.
b. Metodologia do trabalho museológico: a gestão museológica e a investigação
A formalização dum campo operativo da museologia, a criação duma cadeia operativa
própria é o parâmetro definidor da disciplina. Ela trabalha sobre o equilíbrio de diversas
actividades. Por exemplo, no campo essencial, o campo da unidade museológica, do
tratamento da relação do homem com os objectos, são necessárias, em conjunto de
actividades que se constituem em torno da salvaguarda e da comunicação. Salvaguarda
implica conservação e documentação e comunicação implica expor e desenvolver uma
acção educativa e cultural. Essa relação é mediada, no trabalho museológico pelos
processos de planeamento e avaliação76
. A expressão da relação da sociedade com o seu
património, através do museu é um processo de gestão, onde o planeamento e avaliação
constituem motivadores e correctores do processo, agindo sobre a salvaguarda e
comunicação, de forma a assegurar a função museológica.
Este modelo de gestão museológica permite igualmente identificar os problemas de
funcionamento da cadeia operatória. Se ela não estiver a funcionar não se realiza em
pleno a sua função77
.
A adequação teórica do processo museológico é revelada pela adequação entre os
princípios conceituais, a sua inclusão no fenómeno museológica e pelos seus
procedimentos técnico—científicos.
Aqui, Cristina Bruno regressa à análise do quadro referencial da disciplina da
museologia para apresentar as questões da Museologia Geral, Especial e Aplicada. Para
76
A avaliação no museu pode ser efectuada a partir de Livros de registos de opiniões,
questionários, avaliações ―on-line‖. Podem ser feitas abordagens individuais ou de grupo. Na
avaliação da acção educativa devem ser produzidos materiais pedagógicos. A avaliação da
comunicação deve ver a adequação da mensagem ao público. A avaliação da salvaguarde deverá
ter em linha de conta os critérios de conservação e o acesso ao púbico. 77
Os outros campos de acção museológica, o campo de interlocução e de projecção operam com
as mesmas actividades, incorporando novas exigências formais e decorrem, de forma mais ou
menos evidente em todos os processos museológicos, dependendo da sua regulação e dos
equilíbrios existente entre todos os campos. Por exemplo no campo de interlocução estão
implicados o desenvolvimento dos processos participativos. O processo participativo leva a
incorporação de novos elementos no campo essencial, alimentando a sua renovação. Finalmente
o campo de projecção opera a essência de renovação museológica. A museologia utópica seria
este museu integral em permanente renovação como campo de expressão da identidade duma
comunidade e da sua relação com o mundo.
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Bruno, qualquer exercício museológico deverá ser enquadrado por um quadro
referencial78
.
Assim a museologia geral trata da teoria da história e da gestão do facto museal, do
fenómeno museológico e do processo museológico. A teoria museológica é o ―conjunto
de princípios que se articulam a partir da análise das experimentações ou do estudo do
facto museal e a respectiva sistematização dessas reflexões (categorias universais)‖. A
História dos Museus é o conjunto de ―estudos voltados para a inserção desse modelo
institucional nas suas respectivas sociedades, enfatizando a análise sobre mudanças de
forma e conteúdo e identificando a origem e desenvolvimento de novos processos de
musealização‖, e finalmente a administração dos museus (ou gestão) são as
―experimentações estruturais e regimentais visando o exercício profissional processual e
interdisciplinar, à aproximação com órgãos mantenedores e com a sociedade em geral
(gestão orientada e auto-gestão)‖
A museologia especial, por sua vez trata especificamente do texto e do contexto. Ou
seja, os estudos teóricos, históricos ou de gestão devem ser orientados a partir da
identificação do facto museal numa das vertentes: do texto museológico, ou seja ―
relacionado com o tipo de museu ou processo museológico (natureza do acervo ou perfil
das referencias patrimoniais)‖; ou do Contexto Museológico com ―referente à sociedade
onde o processo museológico está fixado ou o museu localizado‖.
A museologia aplicada (museografia) trata das questões de: a)planeamento institucional
ou elaboração do programa museológico; b) da aquisição de acervo ou de referências; c)
da preservação; d) comunicação; e) da avaliação ou diagnóstico.
A museologia aplicada dispõe de um conjunto de métodos e técnicas de investigação
que depende da natureza das colecções ou das referências patrimoniais (assim as
colecções arqueológicas dependem das técnicas de preservação arqueológica, as
colecções de arte da história de arte, da ciência da história natural, zoológicas ou
botânicas da respectiva ciência, etc.).
a) O Planeamento Institucional e/ou elaboração do programa para o
estabelecimento do processo de musealização utiliza as seguintes técnicas:
estrutura, organização, cronograma e financiamento
b) Compra, aquisição, doação e identificação
c) Conservação (preventiva – restauro – uso qualificado) documentação
(cadastro/inventário/banco de dados), Armazenamento (temporário ou
definitivo, reserva técnica)
d) Tipo de exposição: (permanente, longa duração ) e sistemas de exposição,
Serviço educativos (projectos pedagógicos sistemáticos) acção sócio educativa e
cultural ou educação permanente.
78
A autora aconselhou a fazer o exercício de adequação teórica da metodologia da tese com
estes princípios. Verificar a sua harmonia e conformidade como ―chek list‖
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e) Avaliação sobre conteúdos, sobre comportamentos do público e da comunidade
sobre audiência. Avaliação sobre o processo museológico e museográfico.
Para utilizar o arsenal metodológico à que efectuar um exercício de análise do potencial
de investigação versus potencial de trabalho museológico. Essa análise deverá ter em
linha de conta a identificação do perfil museológico /o potencial do facto museológico;
das características do fenómeno museológico e uma avaliação dos processos
museológicos. A escolha da referencia metodológica implica desafios que deverão ser
resolvidos durante o processo museológico. Por exemplo do planeamento79
da cadeia
operatória SALVAGUARDA (preservação /documentação) e COMUNICAÇÃO
(exposição/ acção educativa e cultural) saem acções de gestão da memória (influencia
sobre o processo de formação e consciencialização). Por esse motivo o Programa
museológico deverá ser um processo de participação.
Enquanto processo de participação, o diagnóstico deverá identificar o recorte
patrimonial, aquilo que é específico. A missão deve justificar o museu de definir
objectivos gerais. Cada museu deverá ter um conceito gerador, um conceito de opção
preservacionista e uma opção por um modelo de intervenção museológica. As metas
estratégicas, as questões essenciais, as propostas e as escolhas possíveis devem ser
formalizadas consensualmente. Devem estar consubstanciadas no plano directos,
incluindo: Propostas de Salvaguarda e Comunicação, Planos Estratégicos, Cronograma,
Equipa, Orçamento. O Plano deverá ser implementado e deverá conter um processo de
avaliação.
Haverá que ter em atenção quais são as expectativas institucionais. As expressões
patrimoniais implicam uma pressão da sociedade para preservar ou musealizar. O
património é alvo de acções de conservação. A musealização, contudo, é o que permite
coligir objectos colecções ou acervos, organiza-los e expô-los de forma a criar um
campo de indicadores de memória e um conjunto de referencias culturais.
Em suma a gestão museológica envolve fundamentalmente uma gestão da tensão entre a
salvaguarda e a comunicação
c. Museus, Museologia e Pedagogia Museológica: Potencialidade para a mudança
social?
Após a análise dos vários casos apresentados e do conjunto dos argumentos
anteriormente apresentados, verifica-se que existe, na museologia, um potencial de
mudança social efectivo. Que essa mudança apresenta várias propostas de caminhos. No
contexto de olhar e descobrir quais os caminhos da museologia para a mudança social,
79
O planeamento em museologia implica pensar o museu. Implica diagnosticar qual é o facto
museal.
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92 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Cristina Bruno propõe discutir a importância dos trabalhos académicos a partir do texto
distribuído. É sobre a reflexão sobre textos de referencia que procura revelar quais os
desafios da pedagogia museológica para a relação entre os museus e a sociedade. A
criação de um sistema de conhecimento museológico implica a execução dum trabalho
sistemático sobre o tema. No caso de São Paulo, o museu da cidade é um exemplo de
um trabalho sistemático de defesa dum modelo educativo com uma mesma equipa.
A elaboração dum projecto educativo envolveu: a formação dos educadores, a
elaboração de conteúdos didácticos, a discussão de conteúdos educativos, a criação dum
kit educativo, a criação da semana para educadores sobre empreendorismo e semanas
académicas. A criação duma área de recursos multimédia envolveu. Catálogos de
exposição, livro de acções educativas, publicações, base de dados museológicos, kit
educativos.
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93 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
3.4.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA
VARINE-BOHAN, Hugues de (2008): ―Museus e Desenvolvimento Social:
Balanço Crítico”, in Museus como Agentes de Mudança Social e
Desenvolvimento: Propostas de Reflexão Museológica, Xingó, Museu de
Arqueologia de Xingó, pp. 11-20.
O autor é uma das referências da museologia mundial. Neste texto reuni um
conjunto de reflexões sobre o papel que os museus e a museologia têm vindo a
assumir no âmbito do desenvolvimento social das comunidades e dos territórios. E
um texto que reflecte uma longa experiencia de avaliação do trabalho museológico,
ancorado numa profunda reflexão da museologia, das suas potencialidades e que, de
certa maneira, se torna num texto apologético porque apresenta rumos possíveis para
a actividade museológica assumida como um compromisso social.
Museu e museologia para Varine é mais do que um local aberto ao publico com uma
colecção, enquadrada por profissionais ou amadores. Também não é um local,
exclusivamente vocacionado para a oferta de tempo de lazer à actividade turística,
embora reconheça que os resultados destas actividades tenham proporcionado
museus maiores, mais ricos e mais caros80
. Mas esse movimento não é o que
interessa a Varine. O que lhe interessa são os movimentos de reflexão e práticas que
se iniciaram nos anos setenta, que classifica em três classes. Os museus que
reforçam a identidade nacional e as independências políticas da novos países (em
África). Os museus que nascem de reivindicações de grupos minoritários e
marginalizados, e os museus comunitários, em rede ou ecomuseus, que surgem após
a Mesa Redonda de Santiago do Chile em 1972. Todos eles têm em comum uma
implicação da sua actividade com o Desenvolvimento Social. São museus que
praticam uma museologia que se sente implicado com o envolvente, que se dedica á
sua população e que procura que a sua actividade tenha efeitos sobre essa
comunidade.
Mas, aqui Varine coloca a questão. De que forma a sociedade está incluída nesses
museus? Ou seja, o que é importante para estes museus não é a colecção que ali
existe (se é que a colecção têm necessariamente que existir no museu) mas as
pessoas que aí habitam. Como é a comunidade ocupa o museu, sendo que aí cabe
um papel de mediação aos profissionais (que podem ser voluntários) da museologia.
Propõe-se analisar o caso de três tipos de museus: Os grande museus , os museus
locais e as ―instâncias de desenvolvimento local‖ (organizações de desenvolvimento
local, ONGD).
80
Sobre as relações dos museus com a actividade turística veja-se MOREIRA, Fernando João
de Matos (2008): O Turismo e os Museus nas Estratégias e nas Práticas de Desenvolvimento
Local, Tese de Doutoramento em Museologia, Lisboa, Universidade Lusófona de Humanidades
e Tecnologias
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94 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Os grandes museus têm vindo progressivamente a desenvolver, no âmbito dos seus
objectivos políticos e culturais, as instâncias de mediação com o público.
Normalmente é o sector educativo que é chamado a desenvolver essa actividade. É
ele que têm vindo a desenvolver métodos de comunicação adequados a
diferenciação de públicos. Normalmente começa por públicos escolares, mas pode
ser facilmente adaptada a outros públicos. Para que isso aconteça nos grandes
museus é naturalmente necessário que exista vontade política a capacidade
organizativa. É necessário que seja reconhecida as necessidades da população
envolvente e que o museu seja capaz de oferecer algo que essa população necessite.
Ou seja, é necessário que o museu se democratize. É também necessário que este
museus se adeqúe aos seus visitantes. Por exemplo, a abertura à comunidade implica
que os grupos, as famílias e as organizações passem a sentir o museu como a sua
casa. Por essa razão o museu deve oferecer condições para a uso em grupo, ao invés
de continuar a insistir na unidade indivíduo, que raramente na visita ao museu.
No âmbito dos novos museus de comunidade, eles em grande maioria dos casos têm
vindo a beneficiar dos contributos da nova museologia. Por essa razão, são já
concebidos como elementos abertos à comunidade e ao território. Nestes museus os
desafios são evitar a ―nova museologia como moda‖ ao serviço de interesses
particulares. Cada um destes museus é único. Os seus profissionais deverão por isso
ter a capacidade de se tornar agentes locais de desenvolvimento, capazes de
mobilizar o capital cultural do património, organizar a capacidade de utilização
social do património, criando redes de solidariedade e confiança com base na
identidade e visualizar o património económico como elemento susceptível de
alocar à sustentabilidade dos projectos e acções da comunidade.
Existem naturalmente várias tendências, de ―mosaico‖ que estes museus podem
prosseguir, dependendo dos seus conceitos geradores. E contudo de salientar a
necessidade de criar pontos de dialogo entre os responsáveis do desenvolvimento do
território e os museus. Esse dialogo é o que permite, por um lado construir o museu
(o museu é um projecto sempre aberto que incorpora permanentemente as
experiencias da comunidade) e ao mesmo tempo projectar o espaço do museu como
elemento alocado e mobilizável para o desenvolvimento. O Acervo destes museus é
o património da comunidade mobilizado como memória identitária.
Finalmente o conjunto de organizações que constituem ―instituições de
desenvolvimento local‖ que em muitos casos se aproximam da organização
museológica. São instituições que permitem a mediação entre o património das
comunidades e o compromisso para o desenvolvimento local. No fundo a proposta
de Varine é levar as praticas museológica para a comunidade, criando pólos
geradores de desenvolvimento com base no património e na memória. Termina
referindo a reflexão ―A nova museologia incluiu e transformou em profundidade a
instituição museológica para liga-la ao território e à comunidade, ao património e à
vida quotidiana. Resta sem dúvida um passo a dar, para que o museu venha a ser um
dos instrumentos das agendas 21 locais‖ (pag 19). Ou seja,
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95 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
BRUNO, Maria Cristina Oliveira , FONSECA, Andrea Matos, NEVES, Kátia
Regina Felipini (2008): Mudança Social e Desenvolvimento no pensamento
de Waldisa Rússio Camargo Guarnieri: textos e contextos in Museus como
Agentes de Mudança Social e Desenvolvimento: Propostas de Reflexão
Museológica, Xingó, Museu de Arqueologia de Xingó, pp. 21-36
Este texto insere-se num programa de reflexão sobre a museologia e a sua
historicidade no Brasil. É o primeiro texto, assumido como ensaio, integrado no
programa da USP, as autoras mapeiam o percurso de Waldisa Rússio, em particular
a sua reflexão pioneira no âmbito da implicação da museologia nos processos de
mudança social e de desenvolvimento da comunidade. É igualmente um texto
esclarecedor sobre a pujança do pensamento museológico brasileiro actual, na
medida em que se deve a Waldisa Rússio a ousadia e a capacidade de pensar a
formação dos profissionais como uma vertente do desenvolvimento da ciência, ou se
quisermos da sua capacidade de reprodução. O artigo acompanha ainda a ligação de
Waldisa ao mundo museológico, Na medida em que esta ciência é uma ciência
aplicada, a reflexão museológica dever ser seguida em paralelo com a reflexão sobre
a prática museológica.
Este trabalho de mapear a biografia dum museólogo não é inédito81
mas é bastante
eficaz para esclarecer o mapa mental da autora, o seu contributo para a consistência
teórica e, sobretudo, como pioneira da acção museológica comprometida. O texto
efectua uma leitura global da obra teórica de Waldisa Rússio, com apresentação de
textos significativos do seu pensamento. Procura portanto uma leitura de síntese da
autora.
O primeiro ponto, de natureza mais biográfica relata a aproximação de Waldisa ao
campo da museologia onde chega, já formada, na década de sessenta. Tendo
falecido prematuramente em 1990, Waldisa terá 30 anos de intensa actividade
museológica. Ao serviço da edilidade desenvolve actividades profissionais em
alguns museus da cidade, e em paralelo efectua pós-graduação em ciências sociais
na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). Diga-se
entretanto, que politicamente Waldisa já está comprometida com as ideias socialista
81
Por exemplo no caso português conhecemos o caso de Leite de Vasconcelos e Possidónio da
Silva, dois dos pioneiros da arqueologia e da museologia arqueológica. Veja-se COITO, Livia
Cristina, CARDOSO, João Luís, e MARTINS, Ana Cristina (2008) José Leite de Vasconcelos :
fotobiografia, Lisboa, Verbo, e MARTINS, Ana Cristina (2003) Possidónio da Silva e o elogio
da Memória (1806-1896): Um percurso na arqueologia de oitocentos, Lisboa, Associação
Portuguesa de Arqueólogos. Este último é uma tese de mestrado, mais centrada no problema
metodológico. Em ambas as publicações não existe uma intencionalidade de estudar a
abordagem museológica, embora ela decorra da especificidade da actividade profissional dos
biografados. Trata-se de textos de elogio e que aqui se diferenciam do texto das autoras que
estamos a analisar, onde embora seja notório a admiração por Waldisa, o tratamento biográfico
é mais analítico em busca dos contributos e dos pensamento inovadores na museologia. Ou seja
reflectem a museologia como ciência e não os museus que foram feitos
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96 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
(nos anos 70 era frequente o engajamento político social) . Este dialogo com a
universidade e com o mundo concreto dos museus, é a sua matriz básica. Em 1977
ingressa no comité do ICOM do Brasil e defende a 1ª tese em museologia com o
tema ―Museus: um aspecto das organizações culturais num país em
desenvolvimento‖. A sua tese permite uma primeira reflexão moderna, porque a
graduação já existia desde os anos 30 (no Rio de Janeiro), sobre a história dos
museus e sobre o papel da museologia como elementos de desenvolvimento social.
É , por assim dizer um primeiro esforço de sistematização da ciência museológica
no Brasil. Também é nessa tese que conclui a necessidade de ampliar a formação de
técnicos em museologia.
Será nessa FESPSP que serão organizadas as primeiras acções de formação em
museologia, que sob a sua orientação irão permitir o surgimento de toda uma
geração que marca o actual pensamento museológico brasileiro (1978), e em 1984
com o Curso de Especialização em Museologia.
Depois de traçado o percurso profissional e biográfico, o texto, na segunda parte
aborda o processo de difusão das ideias, projectos e aulas. É um mapa do
pensamento museológico, O momento crucial desse pensamento dá-se com a sua
tese de doutoramento, em 1980, com o título ―um museu de industria para São
Paulo‖.Trata-se dum projecto museológico, com vários pólos pela cidade, O museu
é visto, nessa tese como um processo institucional. Além de conferir cientificidade à
disciplina, por defender numa especialidade, a tese avança com ideias que a
aproximam da nova museologia, ―A praxis museológica proposta por Waldisa
Rússio rompe com uma possível dicotomia entre o homem e o mundo, ou ainda,
com uma separação objectiva entre o homem e a sua realidade, tornando-se numa
teoria e numa pratica que entendem que o homem, o objecto e o cenário desse
encontro são constituídos pelo mesmo estofo social, histórico e político‖(pag.28).
A abordagem museológica de Waldisa surge sempre, para as autoras, muito
influencia pelas ciências sociais. A busca de explicações e correlações com outra
ciência permitia que incorpora-se outros contributos, como por exemplo as ciências
da educação a formação e a gestão museológica. É por exemplo pioneira na
abordagem das questões dos museus e turismo. O seu trabalho não foi fácil e teve
fortes reacções da própria classe profissional da museologia, mais conservadora na
sua abordagem. A sua constante inquietação pelos problemas sócias, pela
democratização dos conhecimentos e pela igualdade social, foram determinantes
para o sucesso, numa época recorde-se, pouco democrática na vida política
brasileira.
A sua participação no comité de epistemologia do ICOM também é um factor que a
estimula a uma reflexão profunda da ciência. É nesse comité que formula a questão
do trabalho do museólogo como um agente social. Mais do que um técnico, é um
agente ―que trabalha de forma consciente com o social, colaborando para incutir
acções de mudança‖. Várias questões que irão preencher os campos de debate
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97 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
teórico da museologia surgem nos vários textos de Waldisa com alguma
prematuridade. Por exemplo a questão da inclusão social ou da interlucção entre a
teoria e a prática e a sua envolvente.
Deve-se igualmente a Waldisa a identificação do objecto de estudo da museologia
como o ―FACTO MUSEOLOGICO‖, segundo Waldisa, o trabalho museológico
incorpora um conjunto de técnicas , de disciplinas cientificas. Mas o conhecimento
museológico é ―construído por uma prática, na qual este conjunto de conhecimentos
adquire um carácter processual de interdependência, reciprocidade, conexões e
coerência.‖ (pag, 34).
Em síntese Waldisa Rússio deixou, segundo as autoras, um legado à museologia
contemporânea que afectam o seu quotidianos quando faz desfilar questões como a
inclusão sócio cultural, a interdisciplinaridade do conhecimento, a necessidade de
formação especializada. A necessidade de colocar o homem como centro da
reflexão, e pala necessidade dum debate crítico sobre si própria.
BRUNO, Maria Cristina Oliveira (2004), “Principais Campos da Acção
Museológica ―com a referência de terem sido apresentados como comunicação
no Seminário CCBB 20-24 Julho de 2004, em Museus e Exposições do Século
XXI:
Em os principais campos da acção da museologia Cristina Bruno define a Museologia
como ―surgiu e tem sido organizada como um campo de conhecimento, justamente para
equacionar os aspectos técnicos, teórico e metodológicos, relativos à implementação e
avaliação dos processos que as sociedades estabeleceram para selecção, tratamento e
extroversão dos indicadores de memória, transformando-os em referências patrimoniais
e projectando-os em campos constitutivos da herança cultural.‖ (pag. 1 ). Ao definir este
campo de conhecimento, confere-lhe um objecto de estudo, o enquadramento dos bens
patrimoniais, uma historicidade, porque decorre das acções conscientes dos homens
sobre o mundo, assim tornados sujeitos que actuam como profissionais da educação da
memória.
Embora possa partilhar com outras áreas de conhecimento campos de análise, a
especificidade da museologia consistem em ―aproximar os objectos interpretados dos
olhares interpretantes, como também, em resgatar dos indicadores de memória dos
diferentes sentidos e significados‖ (pag 2). A especificidade da ciência museológica
advém da busca duma racionalidade do olhar sobre o sonho da narrativa. A lucidez que
conduz à apropriação dos significados culturais duma comunidade, criando instituições
onde decorrem processos de comunicação, narrativas poéticas onde convivem as
memórias e seus construtores. E igualmente uma ciência do homem, uma arte da
humanidade que se reconstrói a cada momento com a experiencia e cada um. São, neste
sentido, construções infinitas de mundos organizados. Como processo é também um
exercício de encenação da sociedade. Como tal é um espaço de tensão, de negociação e
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de aprendizagens. É uma ciência aplicada, mobilizada pelo seu objecto. A sua
contemporaneidade implica-a com memórias diferenciadas de grupos com interesses,
motivações e identidades patrimoniais. Exige-lhe portanto o ―o estabelecimento de
ligações afectivas e cognitivas‖ (pag 3).
De seguida a sua reflexão aborda a especificidade da museologia e do seu trabalho com
os três campos de acção interligados: o campo essencial, de interlocução e de projecção.
Sendo o campo essencial, uma área consensual da intervenção museológica, Cristina
Bruno propões que a preocupação essencial da Museologia se centro no campo da
interlocução a ―necessidade de identificar e compreender o comportamento individual
e/ou colectivo do homem, ao longo do tempo, frente ao seu património‖; e no campo de
projecção; (onde surgem os processos que possibilitam que, a partir da relação do
homem com o seu património, este seja alocado ou ―transformado em herança‖.
Todos os processos destes campos estão reflectidos na cadeia operatória, já referenciada
no campo essencial. A vocação de preservação e de investigação. Estas acções em
museologia, são sempre enquadradas nos seus processos de gestão que envolvem o
planeamento e a avaliação. No âmbito da preservação (salvaguarda) exige-se um
trabalho de conservação (uma técnica aplicada) e de documentação (outra técnica
aplicada ou investigação). No âmbito da Comunicação encontram-se igualmente
trabalhos específicos como a exposição (técnica da expografias e conteúdos
comunicacionais) e a acção educativa e cultural (que exige o desenvolvimento de
trabalhos com grupos, sejam eles escolares ou específicos).
A gestão museológica tem que articular de forma harmoniosa as várias componentes
destes campos de tensão. Cada uma das componentes são inter-dependentes e
alimentam-se mutuamente. Por isso a cadeia operatória da museologia implica a
mobilização de técnicas diferenciadas cuja eficiência depende essencialmente da gestão
das tensões existentes nas ―relações da sociedade e o seu património musealizado‖.
Estes campos têm constituído nos últimos tempos os campos de inovação museológica.
Defende Cristina Bruno que em cada momento, o museu respondeu a questões que lhe
eram colocadas pela sociedade onde se inseria. Criado pelo ideal iluminista, de tornar
publico os grandes objectos de cultura humana, as suas realizações artísticas e os seus
conhecimentos, os museus são hoje chamados à democratização da cultura. A
democratização da cultura implica a apropriação das memórias pelas comunidades,
implica que os museus consigam dialogar com toda a sociedade, consigam revelar todas
memórias e os esquecimentos, que falem todas as linguagens, que abranjam novos
públicos. E esse enriquecimento da museologia, essas novas aprendizagens vêm na
maioria dos casos de pequenos museus comunitários. Essa riqueza, de várias
organizações contribuírem para a riqueza da ciência é uma das suas principais
características.
Finalmente Cristina Bruno enuncia os 4 grandes desafios da museologia
contemporânea:
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99 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
I. Refinar as metodologias de trabalho de salvaguarde e comunicação;
através do exercício sistemático no quotidiano
II. Implementar procedimentos sistemáticos de planeamento e avaliação; ou
a prestação de contas à sociedade,
III. Desdobrar as potencialidades de acessibilidade aos processos de
musealização; através da ampliação dos espaços e dos conteúdos;
IV. Especializar os olhares profissionais a partir do mundo académico;
acreditar nas novas gerações.
BRUNO, Maria Cristina Oliveira (2008) ―Vectores e Desafios
Contemporâneos “Definição de Curadoria: Caminhos do enquadramento,
tratamento e extroversão da herança patrimonial”, 24 p. com bibliografia,
publicado no Livro Caderno de Directrizes Museológicas 2, Secretaria de Estado
da Cultura de Minas Gerais.
Neste texto Cristina Bruno reflecte sobre a museologia a partir da evolução dos
significados da palavra curador. Em português de Portugal, a evolução do termo não
será por certo coincidente. Assim Curador, Conservador, Comissário Director de
museu são palavras que surgem frequentemente para identificar profissionais com
conteúdos funcionais equivalente. No entanto, nesta análise do texto, para uma
melhor clarificação do seu conteúdo, vamos manter o significado de Cristina Bruno.
A historicidade do conceito é um indicador das tensões que se sentiram no âmbito
da museologia ao longo da sua afirmação como campo do conhecimento. Este
mapeamento de significados e interpretações e aplicações ajuda a reflectir a sua
própria disciplina, a forma como os seus profissionais a interpretam e como a
sociedade olha para essa disciplina.
A análise dos significados do conceito e o seu enquadramento na disciplina é
executada a três níveis: A um nível, mapeando o seu percurso histórico, num
segundo nível de campo ou matrizes de aplicação, e num terceiro nível, da análise
do exercício profissional a partir da própria função profissional. É uma reflexão que
procura inscrever as transformações nos processos de transformação.
Na origem do termo verifica-se uma tensão entre o curar o espólio (sobretudo nos
museus de ciência que trabalha com organismos vivos) e conservar o saque (nos
museus históricos, arqueológicos e de artes). As operações de manutenção das
colecções eram então os principais objectivos profissionais. No entanto, esse esforço
profissional já implicava o conhecimento sobre matérias, sobre as técnicas e saberes.
Assim esse profissional afirmava-se essencialmente como um especialista, como um
detentor de informações qualificadas e capacidade de as operar melhor do que
ninguém.
Relatório de Avaliação Curricular
Julho de 2009
100 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
A especificidade das técnicas de conservação e restauro conduziu à especialização
no interior das organizações museológicas, que se constituíram como nichos de
virtuosidade e uma hierarquia profissional. Os procedimentos ou a cadeia operatória
consolida-se em função das actividades selecção, colecta, registo, análise,
organização, guarda, e difusão do conhecimento produzido. Cada ma destas
operações consolida-se igualmente no mundo académico e nas publicações da
especialidade.
A ligação do curador à academia conferiu, durante todo o século XX, um estatuto de
cientificidade, uma legitimação que acrescentava á dignidade da função. Todavia,
em pleno século XX, esse monopólio do saber começa a ser contestado pelas
correntes que defendiam a democratização da função museológica, a incorporação
de novos saberes e novas narrativas. Essas tensões implicaram a incorporação de
novos saberes e a interdisciplinaridade entre os profissionais. Esta inovação no
trabalho museológico irrompe no trabalho curatorial através das novas experiencias
museológicas. Novos contributos dados pela participação da comunidade, pela
incorporação dos territórios. São novos desafios das actividades curatoriais que
exigem capacidade de liderança comunitária, o domínio dos processos de auto-
gestão. Com eles vieram novos processo expositivos e novas exigência de
relacionamento com a comunidade de comunicação. O perfil profissional passa a
centrar-se mais na componente dos procedimentos expositivos, nas acções
educativas. O curador passa a incorporar uma função que se transforma num
processo de participação permanente. O curador já ã está exclusivamente centrado
no saber, mas também deve dominar o relacionamento social.
As actuais definições de curadoria estão portanto influenciadas pelas transformações
nos processos museológicos. A actualidade do trabalho do curador parte do olhar
sobre a especificidade da cadeia operatória e dos procedimentos a implementar e a
desenvolver. Mas, para alem do olhar sobre os procedimentos, o curador terá que
apresentar igualmente um ―olhar reflexivo‖ que permita a leitura do enquadramento
social, das acções interdependentes, das leituras das cumplicidades e solidariedades,
do potencial dos processos participativos.
Em conclusão, a actualidade da definição da função curatorial implica o domínio de
um conjunto muito diversificado de operações, ―que entrelaçam intenções, reflexões
e acções, cujo resultado evidencia um conjunto de compromissos‖ (pag, 21) com as
colecções, com a conservação e divulgação de colecções através de processos
educativos, e com a capacidade de identificar as necessidade da comunidade e da
modernidade da função.
BRUNO, Maria Cristina Oliveira (2004) ―As expedições no Cenário museal‖,
in Expedição São Paulo 450 anos, São Paulo Museus da Cidade de São Paulo,
pp.36-47.
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Julho de 2009
101 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
3.5 Museologia e Comunicação de Marcelo Cunha
3.5.1 Síntese Biobibliográfica
Marcelo Nascimento Bernardo da Cunha, é museólogo, doutorado em História
Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2006), com a tese Teatro de
Memórias, Palco de esquecimentos: Culturas africanas e das diásporas negras em
exposições. Mestrado em Informação Estratégica pela Universidade Federal da Bahia
(1999), com a tese Título: A Exposição como um Sistema de Informação: o Caso do
Museu Afro-Brasileiro da Universidade Federal da Bahia, e graduado em Museologia
pela Universidade Federal da Bahia (1992).
É desde 1994, professor adjunto do Departamento de Museologia da Universidade
Federal da Bahia, e professor do quadro permanente do Programa Multidisciplinar de
Pós-Graduação em Estudos Étnicos e Africanos, do Centro de Estudos Afro-Orientais -
UFBA e do programa de Mestrado e Doutorado em Museologia da Universidade
Lusófona de Humanidades e Tecnologias, em Lisboa.
É coordenador do Museu Afro-Brasileiro da Universidade Federal da Bahia. Na área de
Museologia, aborda as seguintes problemáticas, exposição, museus, acervos, e educação
patrimonial com utilização do património afro-brasileiro.
O seu seminário decorreu na Universidade Lusófona em 23 e 24 de Janeiro de 2009.
Actualmente efectua investigações sobre A arqueologia da identidade étnica na África e
no Brasil, e desenvolve o programa de Acção Educativa do Museu Afro-Brasileiro da
Bahia. As suas investigações desenvolvem-se em duas linhas. O observatório da
Museologia Baiana, e a História da Museologia Baiana
Tem dezenas de artigos publicados em várias publicações da especialidade. Entre as
quais se salienta: -CUNHA, M. N. B. da. Teatros de Memórias, Palcos de
Esquecimentos: culturas africanas e das diásporas negras em exposições museológicas.
Anais do Museu Histórico Nacional, v. 40, p. 149-171, 2008, CUNHA, M. N. B. da .
Memórias Institucionalizadas de Culturas Afro-Brasileiras: Tentando ler exposições de
museus e periódicos institucionais. Projecto História, São Paulo, v. 26, p. 273-283,
2003. -CUNHA, M. N. B. da . Museus, Exposições e Identidades: os desafios do
tratamento museológico do património afro-brasileiro. In: BRUNO, Maria Cristina
Oliveira; NEVES, Kátia Regina Felipini. (Org.). Museus como Agentes de Mudança
Social e Desenvolvimento: Propostas e Reflexões Museológicas. Acaju: Museu de
Arqueologia de Xingó - Universidade Federal da Sergipe, 2008, v. , p. 157-171.,
CUNHA, M. N. B. da ; BURNHAM, T. F. . As exposições museológicas como
estratégia comunicacional. In: Othon Jambeiro; Henriete Ferreira Gomes; Nídia
Lubisco. (Org.). Informaçõa (contextos e desafios). 01 ed. Salvador: EDUFBA, 2003, v.
01, p. 85-100.
No seu seminário distribuiu o roteiro da sua reflexão, bibliografia temática e 11 textos
de referência
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102 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
CUNHA, MNB, (2009) Exposições Museológicas como Estratégias de
Comunicação, roteiro de seminário na ULHT
CUNHA, MNB,, (2008), Museologia e desenvolvimento social: Ou desafios a
uma prática com sentidos, Palestra proferida no Museu Eugénio Teixeira Leal,
em Salvador, por ocasião da abertura das comemorações pelo Dia Internacional
de Museu – DIMUS – 09/05/2008.
ROMERO, Fanny Longa (2002): Reflexões sobre o museu e suas mediações:
Uma versão deste texto foi encaminhada ao IV Congresso Virtual de
Antropologia em: www.naya.org.ar
CHAGAS, Mário (2002): ―A escola de Samba uma lição de processo museal, in
―Caderno Virtual de Turismo, vol 2, nº 2
ENES, Elisa Guimarães (2003), ―A narrativa na exposição museológica‖ ,
dissertação do Programa de Pós-Graduação em Design na Universidade
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUL-Rio
CANDIDA, Manuelina Maria Duarte, (2004), Arqueologia Musealizada:
património Cultural e preservação em Fernando de Noronha, Dissertação do
Programa de Pós-Graduação em Arqueologia (mestrado), na Universidade de
São Paulo, Faculdade de Filosofia. Letras e Ciências Humanas
SANTOS, Vânia Carvalho Rola (2005), ―Cultura, Identidade e Memória: uma
leitura informacional dos Museus históricos em ambientes comunitários‖,
dissertação de mestrado em Ciência da Comunicação na Universidade Federal
de Minas Gerais.
CARVALHO, Solange Ferraz de Lima e Vânia Carneiro de (2005),‖Cultura
visual e curadoria em museus de história‖, in Estudos Ibero Americanos,
PUCRS, Vol XXXI, nº 2 pp. 53- 77
LIMA, Ana Paula Felicíssimo de Camargo (?) , sem referência bibliográfica.
colecção de Artes visuais do Instituto de Estudos Brasileiros
BITTENCOURT, José (2003), ―Cada coisa em seu lugar: ensaio de
interpretação de um museu de história‖, in Anais do Museu Paulista, ano/vol 8/9
, nº 9, pp. 151-176
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103 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
3.5.2 Roteiro dos Seminários
Marcelo Cunha aborda a questão da exposição museológica como um momento de
catarse. Procura olhar e fazer da exposição um momento libertador. A construção da
exposição torna-se uma ferramenta nas mãos do museólogo para descobrir a memória.
A memória como revelação é um processo de comunicação.
O processo de comunicação expográfica é constituído por um texto: o texto
expográfico, que pode ser ideia, conceitos, propostas estéticas, recursos técnicos (como
luzes, cores, musicas, ou locais. A Ideia é a criação dum ponto onde converge o olhar, o
acidente holístico, olhar que interroga para descobrir significados.
O espaço da expografia, por seu lado é normalmente um local de afirmação política, no
sentido de afirmação e de projectos e ideologias. O objecto museológico integra-se
assim num texto museológico. Num processo narrativo.
Dimensões da Exposição.
A Exposição museológica que se concretiza numa relação espácio-temporal caracteriza-
se por 3 dimensões.
A dimensão real, composta por elementos materiais. A matéria concreta que
constitui o objecto;
A dimensão abstracta, resultante das várias leituras individuais, das formas
como os observadores olham e interpretam os objectos em função do campo dos
seus próprios quadros mentais, sejam eles museólogos, sejam publico,
E a dimensão virtual, que resulta da criação duma exposição imaginada, tornada
real por imagens e ambientes simulados.
A questão da dimensão virtual levanta uma questão relativa à relação entre o peso da
tecnologia e a interactividade. Aquilo a que Marcelo Cunha chama o ―Raid
Tecnológico‖ ou seja a capacidade de projectar o pensamento sobre a tecnologia, para a
produção de significados. O pensamento aqui é abordado no sentido de imaginação. A
imaginação, para Marcelo Cunha é ―conduzida pelo conhecimento pré-existente do
visitante, bem pelos conhecimentos ali encontrados, e que permitem recriar e reconstruir
novos quadros de referências‖. Deste modo, esta relação expressa um ―diálogo
museológico‖ entre a exposição → o público → a referência. O público efectua uma
leitura que pode produzir novos significados ou manter velhos significados. Este é o
desafio da expografia, o de ser capaz de produzir novos significados sobre os mesmos
objectos.
A introdução de novos olhar expográficos tem vindo a ser feita a partir da abordagem
do olhar do outro. Da metamorfose do outro. Nos museus clássicos a narrativa sobre os
outros é feita a partir das nossas referências simbólicas. A nova narrativa introduz o
discurso do outro a partir do seu próprio quadro identitário. Os seja, o outro como
sujeito narrador da sua própria cultura, sem preconceitos. A representação da tradição,
segundo Hobesmman, é feita pela museologia.
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104 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Interessa ainda precisar alguns conceitos:
A museologia, como ciência maior, a conceptualização do processo museológico
e das relações museológicas
A museografia, como técnica, como aplicação da ciência que utiliza os documentos e a
exposição. A museografia é o campo da aplicação museal. A expografia, como a técnica
da aplicação da exposição e a ecologia, como a ciência que estuda a relação dos
objectos na exposição (cores, luz, enquadramento, posicionamento, etc.)
Os 3 eixos da EXPOSIÇÃO COMO PROCESSO COMUNICACIONAL
1. A FUNDAMENTAÇÃO:
2. A PRODUÇÃO IMAGÉTICA:
3. EXTROVERSÃO – COMUNICAÇÃO:
O desenvolvimento destes eixos:
1. A FUNDAMENTAÇÃO: Consiste na capacidade de captar as ideias, de
apresentar conceitos, de fornecer propostas e objectivos do grupo que produziu a
exposição, que a mantém e que nela se mostra representado. No discurso
institucional surgem normalmente ideias e experiências de indivíduos
envolvidos directamente no processo, na sua produção enquanto produtores ou
agentes dos fenómenos apresentados. Na fundamentação interessa
fundamentalmente apresentar o problema da exposição como um problema de
tradução. Um sincretismo proposto pelo museólogo.
A exposição traduz um discurso por meio de imagens, de referências espaciais,
interlocutores. Não é somente o que se expões que é importante. É também
importante o que se oculta. A função primordial do profissional é saber traduzir
a afirmação do objectos como gesto, como prazer, como amor, de vida, como
um uma proposta de um processo de soluções colectivas e sociais. Aqui Marcelo
afirma claramente a necessidade do processo expográfico assumir o seu papel na
transformação social. O objectivo duma exposição é democratizar
conhecimentos, completar aprendizagens, m recurso didáctico e uma pratica
pedagógica que privilegia a interacção dos sentidos. Defende a exposição como
um processo cognitivo.
A questão dos sentidos na expografia é um processo fundamental. Quanto mais
sentidos estiverem envolvidos, mais intenso é o processo cognitivo, maior é a
eficácia da exposição. A expografia tanto pode ser um espaço de mentira como
um espaço de verdade. Cabe ao museólogo saber escolher a narrativa.
Marcelo Cunha salienta também a importância duma boa relação estética na
exposição. Uma boa comunicação imagética não necessita de tradução (não
necessita de mediação).
Ainda no domínio da fundamentação, um outro campo onde o museólogo actua
é o da relação Função/Forma. Muitas vezes é necessário operar uma ruptura
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105 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
nesta função para melhorar a consciência do objecto. A exposição deverá
possibilitar a ludicidade do processo educativo. As técnicas educativas devem
privilegiar a aprendizagem com o corpo, como reacção a estímulos sensoriais. A
exposição deve ser divertida
A questão da réplica do objecto é também abordada por Marcelo Cunha. As
coisas, os objectos são perecíveis. Muitas coisas têm um tempo de vida. No
trabalho de educação nos museus existe um paradoxo entre a conservação (não
mexer) do objecto e a sua apropriação (desenvolvimento da sensorialidade). As
réplicas podem resolver este paradoxo.
Para a criação dum processo museográfico o espaço dum museu deve ser
multifuncional. Deverá permitir a rearrumação das coisas, a reocupação dos
espaços. Deve poder transformar-se internamente para melhor de narrar os
objectos.
Finalmente, ainda âmbito da fundamentação expográfica Marcelo Cunha
defende a necessidade do conceito expográfico estar fundamentado em
conteúdos e exposições que resultem de investigações e estudos realizados de
forma sistemática. Segundo ele a eficiência do discurso expográfico depende de
:
o Eficácia da pesquisa;
o Das reservas técnicas do sector de pesquisas;
o Da formação adequada dos profissionais do museu;
o Da capacidade de integrar a interdisciplinaridade;
o Da capacidade de integrar um sistema de comunicação integrado com
uso da internet.
O Resultado da exposição, a composição e ordenamento da narrativa é o
resultado de uma síntese conceitual, alcançada através dum cenário, da sua
composição, da sua exploração e capacidade de utilização;82
2. A PRODUÇÃO IMAGÉTICA: domínio do sensorial, onde se materializa ou
explicita o discurso institucional. A fundamentação através da utilização dos
objectos e do diálogo entre os mesmos (as suas posições no espaço como inter-
relação).
Trata-se do campo de produção da exposição propriamente dita. O espaço
expositivo é um espaço de conexão de diversas referências para dar sentido a um
texto que se quer construir. Há semelhança de qualquer narrativa (um texto
literário ou poético, dum filme ou duma composição musical) tem que se
verificar um ritmo, uma gramática própria, uma sintaxe lógica que coordene a
articulação dos diversos elementos.
Implica portanto o domínio de diversos códigos culturais, implica o
entendimento das diversas linguagens. A exposição é também o local onde se
concretizam essas diversas linguagens de mediação: ênfase, percepções,
82
Cita Pierre Levy, Engenharia do Conhecimento, em que o mundo é feito de cegos e aleijados.
(Não é referenciado na bibliografia)
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106 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
metáforas, afirmações, negações e jogos entre os vários elementos constituem os
recursos disponíveis do discurso.
Afirma Marcelo Cunha ―No espaço de exposição há um sequestro dos elementos
materiais. Os objectos perdem a sua função original e tornam-se objectos
museais‖. Propõe por isso que o objecto seja trabalhado como um poema.
Trabalhar o objecto como um poema83
. O espaço da expografia é um espaço
constantemente inventado.
3. EXTROVERSÃO – COMUNICAÇÃO: Observação e resposta do observador
visitante. É o momento em que se opera a síntese de compreensão do discurso
das propostas institucionais e do discurso imagético.
O objecto torna-se museal, não por estar no museu, mas quando é apropriado
pelo público. Este ―sequestro do objecto museal‖ constitui o mesmo processo da
formação do património. O seja da atribuição dum valor de apropriação
colectiva. A exposição é sempre um processo de escolhas. Escolhas de cenários
que apresentam categorias. Uma exposição é marcada pela relação entre as
ideias dominantes , as ideias científicas e os conceitos operacionais.
Uma exposição apresenta-se sempre incompleta. Apresenta-se sempre
influenciada por aqueles que a projectara, pela capacidade de entender o
fenómeno apresentado.
Ao incorporar o objecto museal num cenário criado pela exposição museal,
procura-se tornar a sua função mais próxima da realidade concreta. O cenário é
uma mediação entre o ambiente concreto da existência do objecto e objecto em
si mesmo. Este objecto torna-se assim um objecto mentira dum tempo ao mesmo
tempo que se assume como um objecto verdade dum quotidiano. Ou seja o
objecto, lido pelo público representa simultaneamente o tempo em que foi
produzido e a leitura que hoje fazemos sobre esse tempo.
Esta relação estabelece o ―paradoxo museológico‖. Este paradoxo é definido
como o facto do objecto museológico transcender o estatuto de coisa e passar a
ser individualizado pelo sistema. Ele é retirado dum mundo, para representar
esse mesmo mundo, de forma encenada. Ou seja ele, individualmente, carrega
significados, que podem ser revelados pelo processo expositivo.
Dessa forma a exposição torna-se igualmente num processo cognitivo, porque
para além duma imagem, é necessário interpretar os significados implícitos e
explícitos.
Como resultado dum processo de cognição, a formação duma exposição obtêm
sempre resultados diferentes dos esperados, porque é impossível ao museólogo
antever a totalidade dos processos de cognição dos outros.
O objectivo duma exposição é atingir o maior número possível de indivíduos.
Por esse motivo, no processo expositivo podem estar presentes diversos níveis
de informação, tantos quanto os possíveis.
83
Ver referência a Mário Chagas, e a leitura do museu como um poema, como um processo de
renovação da leitura museológica através da estética e do sensível.
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O processo de cognição é um processo de formação de identidade. É o processo
de formação de crenças e de formação de valores e quadros de referência. O
processo de cognição, enquanto processo de produção de identidade referencial
realiza o acto museológico.
Através do acto museológico o individuo deixa de ser sujeito para passar a ser
indivíduo84
. A expressão da eficiência da função social do museu, a sua
eficiência museológica revela-se nesta operação de construção de conhecimento,
de prazer, de emoção e de vida.
Para a construção do processo de avaliação é preciso construir mecanismos de
escuta do público. É preciso saber ouvir as expressões dos visitantes.
A propósito dos processos de avaliação dos discursos museológicos apresenta a
evolução da matriz afro-brasileira na museografia.
Originalmente, a ideia do Brasil tinha por base a ideia de Raça (ideia dominante no
início do século XX).a antropóloga Nina Rodrigues em 1903 aborda a questão da raça
europeia e a presença da raça negra. Na época a presença do negro na sociedade era
considerada como um fenómeno de degeneração social. Nessa época multiplicaram-se
as sociedades secretas, de índole racista que procuravam combater a influência e a
presença do negro. No entanto na expressão do folclore popular, os elementos culturais
dos negros tendem a relacionar-se com a pobreza. Nos museus da época, as expografias
baseiam as suas descrições com base na dicotomia entre popular e pobreza. Não
deixaram lugar para a presença do negro. Ou seja, tudo o que era negro passou a ser
representado com o tempo como branco e pobre. Na nova museologia essa relação é
claramente ultrapassada.
O museu pode ser um reflexo da contemporaneidade. Pode e deve incorporar novas
imagens e novas metodologias. O grande movimento de renovação da museologia tem
vindo a ser feito pela incorporação da ideia de desenvolvimento social.
Esta reflexão é feita a partir de três pontos.
1. Dos conceitos e teorias;
2. Das metodologias e das práticas;
3. Das acções e dos resultados.
4. A grande questão quando se procura avaliar a actividade dos museus, tem
sido a resposta à questão de que forma se pode colocar o museu ao serviço
da comunidade.
84
Esta operação é fundamental para entender a abordagem de Marcelo Cunha à expografia. Ou
seja, mais do que criar ma exposição bem-feita, com conteúdos bem elaborados, apoiada em
investigação sólida, correctamente apresentada. O que é fundamental na exposição é que o
sujeito se aproprie da mensagem que o objecto transporta, da carga ou tensão emocional e
cognitiva que lá foi colocada, ou facilitada pelo museólogo, para ele próprio de apropriar desse
objecto. E esse acto de apropriação, de assunção da sua individualidade, da sua identidade, da
sua memória como princípio motivador da acção que mede a eficiência global do museu
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Esta questão prende-se com a noção da consciência do museu. Do compromisso
assumido pelo museu e pelos museólogos com a sociedade onde vivem e trabalham.85
Como exercício prático Marcelo Cunha propôs um exercício museológico de
observação e análise duma proposta museográfica. Para esse efeito propôs um guião
com base numa percepção individual de observação, análise e questionamento
permitisse uma resposta sobre o processo de comunicação, sobre o conceito da
exposição e sobre as soluções expográfica apresentadas.
Foi assim avaliado a exposição do Museu da Cidade, com base nos seguintes critérios:
a) Conceito gerador
b) Modulação da exposição
c) Recursos e linguagens informacionais utilizadas, nomeadamente texto
(informação gráfica e de conteúdo) e etiquetas (informação sintética)
d) Análise do espaço expográfico: avaliação do preenchimento (volume), análise
do movimento interno, e o nível de elaboração do desenho
A leitura da proposta museológica teve por base a percepção individual tendo os
resultados das avaliações individuais foram discutidos em grupo.
O museu da cidade foi criado em 1942, localizava-se no Palácio da Mitra. Em 1979 é
transferido para o Palácio Pimenta, ao Campo Grande. E sua directora actualmente Dr.ª.
Cristina Leite.
O museu encontra-se instalado num palácio do século XVIII, parcialmente adaptado
para o efeito. Efectua uma leitura diacrónica da cidade, iniciando-se na pré-história e
percorrendo as várias idades clássicas. O espólio é constituído por peças arqueológicas,
cerâmicas, artefactos, quadros, mobiliário, desenhos de arquitectura, estatuária. Os
módulos não se relacionam entre si e os discursos expográficos são diferenciados. O
conceito gerado é uma pertença à cidade. Mas raramente esta relação transparece nos
objectos, para além do óbvio. O painel de azulejos estava instalado num palácio, o
quadro, numa igreja, os desenhos eram da Sala do Risco. O que mais sobressaiu desta
exposição é a ausência de protagonistas (só muito raramente surgem alguns heróis tipo
Nuno alvares Pereira, Marquês de Pombal)
Por outro lado, o museu não apresenta os grandes momentos de construção da cidade.
Não se sentem os ritmos da cidade (com excepção do terramoto e 1755). É um museu
mito ligado á arte do objecto individual.
85
Neste ponto a discussão entrou pela teria do Pedro Cardos (ver tese) sobre as 4 dimensões do
objecto museológico. A dimensão da materialidade, que segundo o autor é a dimensão
dominante nos museus tradicionais, a oralidade, a gestualidade e a simbólica. A exposição
museológica só é realizada quando constrói um espaço para o objecto. Um espaço substância.
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3.5.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA
CUNHA, MNB, (2009) Exposições Museológicas como Estratégias de
Comunicação, roteiro de seminário na ULHT
O texto distribuído é o guião do seminário apresentado. Por essa razão não se
apresentam comentários.
CUNHA, MNB,, (2008), Museologia e desenvolvimento social: Ou desafios a
uma prática com sentidos, Palestra proferida no Museu Eugénio Teixeira Leal,
em Salvador, por ocasião da abertura das comemorações pelo Dia Internacional
de Museu – DIMUS – 09/05/2008, 12 p.
O artigo apresentado por Marcelo por Marcelo Cunha está dividido em duas partes,
a primeira, em que efectua uma síntese sobre o que tem vindo a ser dito sobre a
museologia e o seu compromisso com o desenvolvimento social. É um discurso
sobre o seu enquadramento teórico, da museologia no âmbito das ciências sociais
aplicadas, que têm como problemática as relações dos indivíduos e dos grupos na
sua articulação com o mundo e dos seus processos e acções de formação de
identidades e produção de memórias. É um processo que se tem vindo a acelerar e
que tem criado grandes exigências aos museus para explicar as noções de pertença
aos universos, ou seja de explicar como são construídas uma memórias e são
esquecidas outras, como se salientam identidades e se excluem outras.
Essa produção museológica tem sido construída com base em três elementos: os
conceitos e teorias, as metodologias e as práticas, e as acções e os resultados. No
primeiro elemento, defende Cunha, que as teorias e os conceitos devem explicar os
modos de construção de identidades, mobilizando os instrumentos necessários e
numa base de transdisciplinaridade. Por consequência, no segundo elemento, as
praticas devem corresponder à satisfação de expectativas de um número cada vez
maior de consciências grupais, de discursos e de valores. Devem ser eficientes, na
medida em que devem corresponder ao desenvolvimento das comunidades e dos
grupos. Mas, paralelamente esse esforço tem que ser efectuado num mundo em
permanente mudança, com uma aceleração e uma democratização sem precedentes
nos acessos aos meios de comunicação. Um esforço que exige à museologia e aos
museólogos um permanente actualizar de competências profissionais e a criação de
compromissos com a sociedade.
A questão do compromisso, enquanto atitude consciente do museólogo, é o tema da
segunda parte do artigo. A questão do compromisso social de organizações pré-
existentes, construídas noutros tempos, com outros poderes não tem sido fácil para a
museologia. Ou seja aquilo que é obvio, a democratização das instituições, na
prática, não tem uma expressão unânime, uma vez que depende das relações de
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poder. Falar de democratização e inclusão social é um discurso elegante mas como
pode ser operacionalizado.
Marcelo Cunha interroga-se sobre este assunto quando viaja na cidade patrimonial.
Interroga-se sobre a forma de como os homens e destes bens, e as mulheres
usufruem os bens patrimoniais. Relaciona os esforços e o valore dispendidos na
preservação e em paralelo, a persistência da pobreza. Isso leva Cunha a interrogar-se
de que forma esse mundo, essa consciência, está presente nos ―nossos museus‖. De
que cor são os nossos museus? Aqui o autor conclui que malgrado a doutrina
―politicamente correcta‖ do discurso museológico, das instituições museológicas, as
praticas museológicas têm sido contrárias.
A seguir, dando continuidade à sua reflexão, aborda a questão dos públicos e da sua
relação com o museu. Hoje não existe o público do museu. Existem públicos. O
museu não pode ter um único discurso. Tem que ter um discurso plural. Esse desafio
poderá permitir voltar a centrar-se como equipamento urbano. Como exemplo
dessas novas centralidade aborda o caso de alguns museus de consciência que tem
vindo a trabalhar essas metodologias. No caso do Brasil fala do Museu de Maré, já
referido por Mário Chagas e pelo Museu da Resistência, cuja visita foi efectuada no
âmbito da viajem de estudo a São Paulo. Há época não estava executado. São
exemplos de ma museologia com compromissos.
ROMERO, Fanny Longa (2002): Reflexões sobre o museu e suas mediações:
Uma versão deste texto foi encaminhada ao IV Congresso Virtual de
Antropologia em: www.naya.org.ar 11 p.
Este artigo é um interessante dialogo entre a museologia e outros discursos
simbólicos, produzidos pelas outras ciências, nomeadamente a comunicação (na
componente mediação), a espacialidade e a linguística de Saussure e Bakhtin. O
ponto de partida é o processo do discurso museológico a análise critica da sua
representação.
Depois dum discurso sobre a evolução do conceito de Museu, que ultrapassou a
referencia de lugar encenação de ideologias, supostamente a-histórico e que se
transforma num espaço de transformação social. Um espaço publico e de lazer, onde
ocorrem processos de formação de memórias. A evolução desse processo deve-se a
vários eventos de discussão museológica, (IX Encontro do ICOM) e em particular
das reflexões da Nova Museologia86
.Esse momento de discussão permitiu a
alteração da postura da museologia, enquanto ciência de acção, capaz de mobilizar a
capacidade transformadora do homem. Por outro lado também actualiza a noção de
86
O conjunto de documentos que importam para este tema foram publicados por PRIMO, Judite
Santos (1999) Museologia e Patrimónios – Documentos Fundamentais Cadernos de Sócio
Museologia, nº 15 , Lisboa, ULHT..
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111 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
património, como elemento que pode e deve ser apropriado pela comunidade como
ferramenta de desenvolvimento.
De seguida discute a noção de espacialidade como elemento de mediação
museológico. Espaço museológico é aqui assumido como um espaço socialmente
construído, que abriga memorias, de fala dessas memórias, e que apresenta essas
mesmas memórias. Ou seja a espacialidade do museu, condiciona a mediação e a ao
mesmo tempo cria instâncias discursivas. O espaço do museu é por isso mesmo
interpelado por diversas ordens ganhando fluxos de significação. ―Pensamos que a
importância dessa reflexão reside na possibilidade de ampliar o nosso entendimento
sobre o museu e suas diversas mediações. O museu é, pois, o espaço por excelência
onde se representa a interface entre o real e o representado, entre o presente e o
vivido que se torna parte integrante da nossa memória social. Como espaço, o
museu não reproduz a realidade, no entanto ele a significa tornando-a
compreensível‖ (pag. 6)
Finalmente no segundo ponto, em termos de diálogo com a linguística a autor
recorda que o museu como espaço dialógico produz símbolos cognoscíveis e
influencia essa produção no seu exterior. Ou seja, se o Museu é em geral
reconhecida pelo grande público como ―templo de colecções, com um acervo ou
colecção, e com um diálogo reduzido com a academia e outros espaços de produção
de ciência. A compreensão do museu como espaço culturalmente construído, na
acepção de Saussure, é um local onde se expressam representações sociais87
.A
questão da representação simbólica dos objectos é facultada pela ordenação dos seus
significados, ou seja da sua gramática. E esses objectos símbolos dialogam com a
envolvente. E uma realidade que reflecte outra realidade, e que pode ser
cognoscível. Nesse sentido é uma linguagem. No caso dos museus é o seu valor
social, enquanto pertença a um grupo, que lhe confere a categoria de signo. Valor
Social é uma reflexão que o museólogo e o seu museu devem praticar de forma
constante com a sua comunidade.
CHAGAS, Mário (2002): ―A escola de Samba uma lição de processo museal, in
―Caderno Virtual de Turismo, vol 2, nº 2, 4 pag.
Um pequeno artigo de Mário Chagas que se interroga sobre a relação entre o
mundo do Samba e dos museus. Para além do óbvio espaço de preservação, Chagas
atribui ao Mundo do Samba 3 características que constituem processos idênticos aos
dos museus. Em primeiro lugar o ―lugar social‖ ou função social, em segundo lugar
a‖ comunidade‖ e em terceiro o ―património cultural‖. O modo como o mundo do
samba dialoga com a museologia é o singelo objectivo desse escrito.
87
A representação social é um termo que vêm da psicologia social que se refere ao modo como
os indivíduos, estimulados pela acção social, reagem à regulação do grupo. Isto é o sistema de
símbolos e signos que ordenam a posição do indivíduo no grupo.
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112 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Partindo da análise dos movimentos de ressignificação patrimonial da cultura que
têm constituído o movimento de renovação da museologia, Mário Chagas faz a
análise das escolas de Samba, do ponto de vista da museologia. Uma escola de
samba é um local de vida. É um local vivido. Por isso o processo desenvolvido pela
escola de samba é idêntico, ou deveria ser idêntico ao processo museológico. Em
primeiro lugar porque é um espaço de representação, é um espaço onde decorre uma
acção social. O terreiro do samba é um local de lazer e de educação. É um local de
concentração da comunidade, de centralidade e de convívio. A comunidade, é o
conjunto da escola, objecto do processo de lazer e ao mesmo tempo sujeito activo.
Dá vida ao processo integrando as preocupações, as vivências as emoções.
Finalmente o património, os objectos museológicos, são todos os que participam na
escola de samba. Sãos criadores da cultura, que a partir das suas memórias, das
memórias das identidade, todos os anos reconstroem as suas identidades. O espaço
de exposição, no samba o desfile, é o momento de concretização do facto
museológico. Todos os anos renovado, todos os anos recriados. Todos os anos
vivido, como uma festa e como um processo de construção de memória. É um
museu ideal para Mário Chagas.
ENES, Elisa Guimarães (2003), ―A narrativa na exposição museológica‖ ,
dissertação do Programa de Pós-Graduação em Design na Universidade
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUL-Rio, 9 pag. Com
bibliografia.
E um texto sintético que aborda a questão da narrativa museológica como processo
comunicacional. Estruturada em 4 pontos: 1- Introdução, 2. O objectos, 3- Narrativa
e 4 –Exposição, (existe um ponto 5 com a bibliografia), a autora aborda o discurso
museológico como um processo de construção de narrativa. Como todas as
narrativas ela tem uma composição (forma), está organizada no espaço (suporte
físico) e têm uma intencionalidade (mensagem). Ou seja é um processo através do
qual os significados são transferidos para outro local, através dum meio, processo
esse que ocorre num determinado espaço e num determinado tempo. Esse processo é
socialmente construído e contém uma intencionalidade.
A abordagem do museu como espaço de comunicação pode ajudar a clarificar
algumas ideias e alguns processos expográficos. A ressignificação do objecto ou a
sua transformação ocorre porque esse objecto contém um determinado nível de
informação. Essa informação é simultaneamente semântica e estética. Estas duas
propriedade do conteúdo informacional, semântico transporta um valor de
cientificidade, ao passo que o conteúdo estético transporta um valor cultural. Estas
duas propriedades agregam-se ao objecto de modo diferenciado. O Valor cultural,
tende a incorpora-se no próprio objecto, a mesclar-se com ele, criando emoções,
sensações ou estados interiores. Provoca sistemas simbólicos intraduzíveis em
linguagens específicas. O carácter científico, no domínio da racionalidade, por seu
lado já poderá ser dominado pela linguagem organizada e assim apresentada como
conteúdo paralelo, ou texto educativo.
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113 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
No entanto os objectos, isoladamente no espaço, sem contexto não sustentam uma
exposição. São como que náufragos no espaço. O que confere uma ordem é a
narrativa. A narrativa concretiza-se no espaço e no tempo e é dotada de
intencionalidade. O espaço e o tempo são factos sociais, podem ser físicos sociais ou
simbólicos. A narrativa é também dotada de personagens. Este discurso das coisas, a
diegese, é a organização da trama, o modo como os objectos se sucedem no espaço e
no tempo, e que por sua vez influencia os conteúdos informacionais dos mesmos. O
tempo nem sempre tem que ser cronológico.
Aquilo que se poderá chamar ―o domínio da linguagem das coisas‖ é determinante
para a clareza da composição. Para que os objectivos comunicacionais sejam
atingidos. O Narrador e o seu posicionamento definem o ritmo, a clareza e a
objectividade do discurso museológico.
A exposição é onde se materializa a narrativa. ―E uma expressão da formulação de
ideias, conceitos e problemas sentidos e expresso por meios materiais‖ (pag .6 e 7).
A organização e apresentação da exposição são portanto determinantes para a
função comunicacional dos museus. É através dela, transformada em canal
comunicacional, que a fonte informacional é passada para o destinatário, para o
receptor. Mais, a sua configuração é determinante para a amplificação e para a
ressignificação dos conteúdos. A sua apropriação e manipulação pelo receptor são
fundamentais para uma leitura no âmbito do discurso museológico. A modelagem
da mensagem é um acto de comunicação, cuja destreza influencia os resultados da
exposição. Ou seja, o museu, como a comunicação, são instrumentos de
conhecimento capazes de alavancarem a acção social.
CANDIDA, Manuelina Maria Duarte, (2004), Arqueologia Musealizada:
património Cultural e preservação em Fernando de Noronha, Dissertação do
Programa de Pós-Graduação em Arqueologia (mestrado), na Universidade de
São Paulo, Faculdade de Filosofia. Letras e Ciências Humanas
SANTOS, Vânia Carvalho Rola (2005), ―Cultura, Identidade e Memória: uma
leitura informacional dos Museus históricos em ambientes comunitários‖,
dissertação de mestrado em Ciência da Comunicação na Universidade Federal
de Minas Gerais.
CARVALHO, Solange Ferraz de Lima e Vânia Carneiro de (2005),‖Cultura
visual e curadoria em museus de história‖, in Estudos Ibero Americanos,
PUCRS, Vol XXXI, nº 2 pp. 53- 77
O artigo apresenta uma interessante abordagem de experiências museológicas a
partir do elemento ―fotografia‖ no museu de Paulista de São Paulo. Constitui
igualmente uma interessante abordagem para a renovação e inovação da narrativa
museológica a partir deste tipo de objectos em museus de história. O trabalho das
autoras permite efectuar, a partir do diálogo entre história cultural e tecnologia da
comunicação e da fotografia, uma interessante abordagem a contextos narrativos
que ultrapassam a simples exposição de objectos mediados pelo conservador através
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114 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
da ordem de exposição e da sua etiquetagem. A partir dos exemplos da leitura das
imagens da cidade de são Paulo no século XIX (paisagem urbana) e dos retratos (de
memoria ou de documento) as autoras identificaram um conjunto de problemática,
situadas na esfera da produção e preservação documental, da investigação histórica e
produção de conhecimento na área da cultura e numa abordagem educacional desse
conhecimentos produzido, ou na forma como o conhecimento é mobilizado para o
contexto museológico. Nestas últimas experiência as autoras descrevem o processo
de disponibilização do conjunto documental ao público. A novidade é que ao invés
da construção dum roteiro fechado, os documentos/objectos são disponibilizados
conjuntamente com as suas várias vivências museológicas (critérios de
inventariação e seriação), sendo o público, através das suas opções, que constrói a
narrativa. O Animatoscópio !
“Ao contrário do vídeo, onde os critérios de selecção e as sequencias de
apresentação das séries fotográficas da colecção de imagens está
exclusivamente nas mãos do criador da narrativa que a oferece pronta ao
espectador, a instalação quer apresentar este tipo de problema ao usuário.
Por isso, a obra é oferecida a ele de forma “inacabada”. Ao usuário
outorga-se o controle de certas combinações de princípios organizativos.”
(pag 68)
LIMA, Ana Paula Felicíssimo de Camargo (?) , sem referência bibliográfica.
colecção de Artes visuais do Instituto de Estudos Brasileiros
A autora do texto efectua uma reflexão sobre os processos de conservação e
documentação no âmbito da arte contemporânea. Aquilo que poderemos chamar
―dilema do conservador‖, não sua vã tentativa de tentar cristalizar a viva, duma obra
de arte ou dum outro objecto ou documento. A autora dá conta da alteração dos
tempos. O tempo da arte antiga e do tempo da arte moderna, fluida, imaterial,
sintética. Como pode ser conservada e documentada. Fazem registos diários que
anotam a evolução duma montagem Não se documenta a evolução da obra e perde-
se a sua memória? Qual é o papel da conservação museológica?
Perante a impossibilidade duma conservação na totalidade duma obra, mais ainda
quando o museólogo se apercebe da impossibilidade dessa total preservação há que
ajustar os procedimentos metodológicos de preservação. No caso das obras de arte,
essa metodologia pode ser elaborada, caso a caso, com a participação do autor.
Todos têm interesse que a memória da obra perdure. Uma solução possível e ―a
preservação da sua face musealizada.‖
“A solução do paradoxo talvez possa apresentar-se aqui como uma dobra
na fita de Moebius - sendo ora sua face artística, ora sua face musealizada
– sempre mantendo a ideia criadora, ou seja, a intenção do artista.
Teríamos assim um universo provável aberto a diferentes actualizações.
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Mesmo com a extinção material de uma obra - sua entropia negativa ou
grau de desorganização atómica resultando em perda irreversível; falência
de um sistema vivo, ou seja, a morte (FLUSSER; 1998) - poder-se-ia fruí-la
pelo conhecimento de seus elementos formadores, preservando-se assim a
proposta poética do artista.”(pag 4)
BITTENCOURT, José (2005), ―Cada coisa em seu lugar: ensaio de
interpretação de um museu de história‖, in Anais do Museu Paulista, ano/vol 8/9
, nº 9, pp. 151-176
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3.6 Políticas Culturais Europeias e Museologia de Judite Primo
3.6.1 Síntese Biobibliográfica
Judite Santos Primo é doutorada em Educação pela Universidade Portucalense Infante
D. Henrique, com a tese Museologia e Políticas Culturais Europeias: O Caso Português
(2007). É Mestre em Museologia pela Universidade Lusófona de Humanidades e
Tecnologias com a tese, Museus Locais e Ecomuseologia: Estudo do Projecto para o
Ecomuseu da Murtosa, (2000). Licenciada em Museologia pela Universidade Federal da
Bahia (1996).
É Directora do Doutoramento e do Mestrado em Museologia na ULHT, docente em
Museologia e Património e membro do Conselho de Redacção dos Cadernos de
Sociomuseologia.
Tem experiência na área de Museologia social, onde realizou vários trabalhos para
museus regionais e tem participado em vários trabalhos sobre políticas culturais.
A sua bibliografia mais relevante é a seguinte
PRIMO, J. S. (2000). Museus Locais e Ecomuseologia: Estudos do Projecto para
o Ecomuseu da Murtosa. Lisboa: Edições Universitárias Lusófonas, 246 p.
PRIMO, J. S. (Org.) (1999) . Museologia e Património: documentos
fundamentais. Organização e Apresentação. Lisboa: Edições Universitárias
Lusófonas. 268 p.
PRIMO, J. S. ; SILVA, D. R. ; MATEUS, D. (1999). Informusa. Base de Dados
Museológica. Manual do Utilizador, Lisboa: Edições Universitárias Lusófonas,
40 p.
PRIMO, J. S. . (2007): To think museology today.. In: MOUTINHO,M.;
BRUNO, M.; CHAGAS, M.. (Org.). Sociology. Lisboa: Edições Universitárias
Lusófonas , p. 63-90.
PRIMO, J. S. (2007): The importance of Local Museum in Portugal... In:
MOUTINHO, M.; BRUNO, M.; CHAGAS, M.. (Org.). Sociomuseology,
Lisboa: Edições Universitárias Lusófonas, p. 91-112.
PRIMO, J. S. . A (2006), A Importância dos Museus Locais em Portugal.
Cadernos de Sociomuseologia, nº 25, Lisboa: Edições Universitárias Lusófonas.
pp. 34-51.
PRIMO, J. S. . Pensar Contemporaneamente a Museologia.. Museologia: Teoria
e Prática,( 1999), Lisboa, Edições Universitárias Lusófonas, pp. 5-36.
PRIMO, J. S. (1999). O sonho do Museólogo. A exposição: Desafio para uma
nova linguagem museográfica.. Museologia: Teoria e Prática, Lisboa: Edições
Universitárias Lusófonas, pp. 93-118.
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O seminário decorreu nos dias 6 e 7 de Março de 2009. Foi distribuído o programa,
bibliografia, e textos de apoio.
O objectivo do seminário foi efectuar uma reflexão sobre as politicas culturais e a sua
incidência na museologia. Interrogam-se as grandes questões contemporâneas, como os
fenómenos das imigrações, hibridações, identidades locais e multiculturalismos na sua
ligação com a museologia. Nesse contexto a interrogação de base é saber como é que os
museus podem ser mobilizados como actores de desenvolvimento, capazes de mobilizar
os recursos locais para uma acção crítica global.
O plano dos seminários orientou-se por um roteiro da génese e evolução da politica
cultural dos estados nação, e qual o papel dos museus no âmbito dessas políticas
culturais. Operacionalizaram noções de memória, identidade, património herança,
construção de nacionalidades e políticas públicas. Na segunda parte abordou-se o caso
da política pública cultural da União Europeia e a sua aplicação no caso português. Foi
especialmente focado o caso da museologia no âmbito do Programa Operacional de
Cultura.
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118 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
3.6.2 Roteiro dos Seminários
O seminário iniciou-se com uma proposta de debate sobre o ―que é a política cultural
europeia?‖. A definição de política cultural remete para a esfera das atribuições do
estado que formalizam políticas públicas sectoriais. Neste caso, aplicadas ao sector
cultural. Ou seja o conjunto de orientações, instrumentos e recursos mobilizados directa
ou indirectamente para satisfação de objectivos pré-determinados. Esta intervenção do
Estado, através das suas políticas influência as organizações culturais e condiciona a
intervenção dos profissionais. No caso português, actualmente, Judite Primo considera
que as políticas culturais estão condicionadas pelo processo de integração europeia e
pela experiência da lusofonia.
De seguida traça uma evolução do quadro de referência do Estado Nação. É com a
constituição do Estado como representante da nação que se criam as primeiras
instituições vocacionadas para a acção cultural88
. Os objectos vão ser relidos pelos
Estado-nação como cones da sua essência e da sua grandeza.
A grande época da afirmação dos Estados-nação é o século XVIII, o século das luzes, e
que culminam com as Revoluções Americana (1776) e Francesa (1789). Surgem por
toda a Europa teatros, bibliotecas, museus, surgem as primeiras políticas de protecção
ao património que definem o que é e o que não património. Os novos ícones do Estado
passam por processos de musealização, patrimonialização e socialização.
A Revolução Francesa de desenvolve um programa cultural que reorganiza a
apropriação pública dos bens patrimoniais e ordena a sua musealização. A arte é
remetida para o campo da estética, a arqueologia para o belo, o património/monumento,
para o campo do mito, a etnologia descreve o outro, por oposição à nação, e a ciência
apresenta-se como o instrumento de libertação do espírito. É a época em que a estética é
sinónimo de civilização por oposição ao caos e à barbárie. A ordenação dos espaços dos
outros, do rural e do colonial representam campo do mundo não desejado ou
abandonado. Oposições que reforçam a acção do estado como normalizador.
A museografia deste tempo organiza-se para dar resposta às questões disciplinares, por
exemplo nos museus de ciência por disciplinas (geologia, botânica, zoologia,
etonologia), de arte de arqueologia e história. Geralmente de iniciativa central,
assumem-se como nacionais. Nos museus de arte e de história valoriza-se o civilizado, a
grandeza da nação, nos museus etnológico valoriza-se o outro por ser diferente,
realçando essa diferença.
Mas é também nesse tempo que o museu se torna espaço público. É um elemento de
valorização da cidade, seja através da ocupação dos mais belos edifícios, seja através
das colecções, que se pretendem as mais ricas e belas. A arquitectura desses edifícios
88
Ver trabalho de Mário Chagas ― Memória e Poder‖
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119 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
acentua a legitimação do discurso. Ou seja, o museu é ―uma ferramenta do estado
para o próprio estado.” Uma função de legitimação do próprio Estado-Nação89
.
A consciencialização de que o museu, para além de espaço público é também um
espaço do Estado leva ao abandono do público. Os serviços educativos não são capazes
de resolver o problema de fazer afluir mais público e de legitimar o discurso dos
museus. Em 1793. O Louvre procura reconstruir o passado mítico pelo presente. Não é
na altura a França histórica que é revelada, mas sim o conjunto de criações belas e
artísticas que a nação, libertada, e porque libertada e igual, é capaz de dar aos seus
membros melhor que o espírito humano conseguiu criar. E dominar, porque o espólio, a
colecção, foi criada através do saque, dos despojos de guerra.
O pragmatismo destas colecções baseava-se numa dualidade simples
contemplação/intervenção observação/selecção. A um mundo essencialmente parado,
ordenado por inúmeros códigos barreiras e demais peias, sucedia um mundo de acção,
de igualdade. A ciência facilitava o entendimento de que o homem podia seleccionar o
mundo, podia ordena-lo a seu belo prazer e formata-lo segundo as suas necessidades.
O património pode ter diferentes discursos consoante os objectivos que pretende
defender. Só é possível cumprir um desígnio se conseguirmos dialogar com ele, se
formos capazes de o interpretar.
A institucionalização dos locais de memória (bibliotecas, arquivos e museus) são
produtos duma classificação, duma ordenação do SABER, Do BELO e da MEMÓRIA.
Guarda-se o que se quer, expõe-se o que se considera belo, musealiza-se o que é para
lembrar. A celebração do poder no século XVIII está fortemente impregnada pelo
domínio do saber. Um país rico têm que mostrar as suas grandezas, nas grandes obras,
na existência de museus arquivos e biblioteca. É isso que D. João VI vai mandar fazer
em Lisboa, na ajuda. Com o Jardim Botânico, o Museu, o Observatório e a biblioteca.
É também nesta altura que se individualiza o visitante. O museu é portador de um
dispositivo disciplinador ao estabelecer os horários e modos de comportamento a
mostrar no interior das instituições do saber. É também disciplinador porque apresenta o
que se deve saber.
Este dispositivo disciplinador do museu revela uma dualidade entre o que se lembra e o
que se esquece. Esta legitimação do poder é um dos valores dos museus. Os museus
oferecem um produto duplo. O que se expões e o que se preserva. Dois produtos que
nem sempre são coincidentes.
No pós-guerra emergem novas matrizes nos museus que mostram novas realidade. Por
um lado emerge a matriz local, que por vezes se opõe á matriz nacional. Nos anos
8989
Segundo Manuel Castells, Identidade Nacional é constituída por factores primários (etnia,
idioma, religião e território) , por factores geradores (méis de comunicação, cidades), por
factores induzidos (gramáticas uniformizadoras) e por factores reactivos (desprezo pelas
identidades oprimidas)
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120 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
oitenta, por altura da consciencialização dos fenómenos de globalização emerge uma
matriz transnacional. Esta matriz resulta da desterritorialização e da emergência da
informação multicomunicacional.
Se durante cerca de 200 anos os museus trabalharam com fenómenos homogéneos. A
partir do pós-guerra começaram a trabalhar com fenómenos heterogéneos. Foram
desafiados a compreender as hibridações, a miscigenação das culturas dos objectos e
das linguagens.
Este movimento implicou um reordenamento dos objectos museológicos. Na
actualidade todo é património. As grandes narrativas são substituídas por fenómenos
locais. Onde é que está a identidade nacional hoje? Os antigos territórios nacionais são
hoje palco de confrontação entre identidades locais e minoritárias. A síntese da
nacionalidade parece estar obsoleta. Verifica-se sem dúvida a manutenção de estratégias
de manutenção de identidades através de novos desenhos de elementos simbólicos. Mas
a nacionalidade necessita sempre de um ―regis finiis‖ , duma fronteira que delimita o
discurso. O local a partir do qual já é outro. E é nesta confrontação que se tem vindo a
afirmar a política cultural europeia.
O campo patrimonial é um campo de emoção e afectividade. Deles têm surgido muitas
linhas de investigação sobre formação de identidades, sobre os lugares de memória.
Homi Bhabha têm trabalhado sobre estudos híbridos, Apadurai sobre Estudos
multiculturais.
O museólogo é hoje um mediador. Tem que conhecer o outro, saber comunicar com o
outro, saber gerir a informação local. O museólogo tem que trabalhar com uma dupla
identidade dos objectos. O seu potencial libertador e o seu potencial de agrilhoamento
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121 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
3.6.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA
PRIMO, J. S. (2007).‖ Museologia e Políticas Culturais Europeias: O Caso
Português‖ Porto, dissertação de doutoramento em educação.
PRIMO, J. S. (2006) ― A museologia como instrumento estratégico nas políticas
culturais contemporâneas‖ in Revista MUSA- DEMU, Brasil, 11p .
Judite Primo refere neste artigo o grosso do processo de reflexão que a conduziu no
âmbito da sua tese de doutoramento ―museologia e Politicas Culturais Europeias‖ de
2007. A autora inicia a sua reflexão por uma constatação de que os processos de
globalização estão a introduzir tensões no âmbito da identidade e nas consciências
das comunidades. Se por um lado, a abertura ao mundo e a crescente
interdependência dos modelos culturais afirmam uma ―hibridação cultural‖ ; por
outro lado assistimos igualmente a ma crescente afirmação das identidades locais
como forma de preservar as diferenças dos grupos.
Afirma Judite que ―O desafio que se apresenta é entender como as identidades
locais (regionais e nacionais) estão a ser reconstruídas pelos processos de
hibridização intercultural”. (pag 2) e prossegue citando Canclini (2001, p.175) o
―importante nesses processos é, sobretudo, estudar e entender a forma como as
relações de continuidade, ruptura e hibridização estão a ser produzidas entre
sistemas globais e os locais, tradicionais e modernos, nos processos de
desenvolvimentos culturais‖ (pag. 3)
O seja o processo de globalização está a implicar um processo de reelaboração das
identidades e das memórias ao nível das comunidades, que poderá ser vista
igualmente como um processo de resistência das comunidades face à pressão da
produção identitária externa. Esta lógica da afirmação do vinho tinto face sobre a
coca-cola tem sido vista com alguma surpresa pelos Maios académicos, convencidos
que estavam do fim dos nacionalismos. Castells90
propõe uma reformulação da
problemática do conceito do nacionalismo contemporâneo, com base em 4 pontos
fundamentais. O primeiro ponto, a de que a questão do nacionalismo não está
necessariamente ligada à questão da constituição do Estado-Nação. Ou seja, a
afirmação do Estado Nação contemporâneo se afirma, como corpo social
organizado, numa realidade pré-existente. O que conduz à segundo ponto. Depois,
de que a nação e o nacionalismo não são necessariamente um fenómeno de elites,
mas sim, derivado dessa existência que lhe é anterior, é pertença colectiva. E
finalmente a constatação de que o nacionalismo moderno é mais reactivo do que
activo. Ou seja afirmação por oposição do contrário, do que pela afirmação de um
90
Castells, Manuel de (2003) Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, (3 vol), vol II, O poder da
identidade, pp. 29-36
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122 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
projecto ou de um processo autónomo e próprio decorrente de alguma necessidade
social.
É neste contexto que Judite Primo inscreve a questão da afirmação da emergência
das políticas culturais europeias como processo e instrumento de afirmação da
cidadania. Ou seja reconhecendo que há um processo de afirmação das diferenças
culturais, que procura no património a sua referenciação específica, advoga que o
estado deve construir um instrumento da política cultural que afirma a democracia
participativa e os processos de afirmação da cidadania para legitimar exactamente
esse código genético cultural, inscrito na comunidade, nas suas artes, nos seus
saberes, nos seus modos de ver o mundo, nas suas sensibilidades e nas suas
cosmogenias, como parte do património global e diversificado.
Já não se trata, portanto de justificar o estado iluminista e patriótico e dos seus
valores e crenças na educação e ciência universal, já não se trata duma afirmação da
educação e formação por necessidades de mão-de-obra qualificada. A emergência
do reconhecimento do valor das especificidades do território e dos saberes passou a
constituir uma importante valorização da cultura, a que o estado deve responder
através da criação de instrumentos de política. É também, segundo Judite,
representativo da emergência duma nova valoração do cidadão como produtor de
―bens de mérito‖. É esse o entendimento da política pública cultural. ― As acções de
política pública no domínio da cultura contemplam, hoje noções de preservação e
protecção das referencias culturais implicam, progressivamente, a aceitação da
cultura como: elemento gerador de projectos, de novas acções e de empregos,
elemento que potencia o entendimento do presente; bem de mérito; veiculo de
coesão; instrumento para o exercício pleno da cidadania; factor de
competitividade; e factor de afirmação das comunidades no exterior (construção e
afirmação de identidades)”(pag.6).
Com base nesta reflexão prossegue depois a autora para a análise das implicações
das políticas públicas culturais na museologia. Aqui vai enquadrar o movimento de
renovação da museologia, dos seus discursos e narrações, como uma importante
adequação destas organizações a uma prática activa de intervenção social. Os
museus encontram aqui a sua legitimação para se tornarem agentes de
transformação social.
Como conclusão afirma Judite Primo que a globalização e generalização das redes
de informação, identificadas como estruturas do poder, da riqueza (capital) e
tecnologia são estruturas dialécticas. Aportam comunicação e criatividade mas
também privam a sociedade de direitos políticos (por exclusão, de minorias, de
identidades, etc..). As alterações das formas de produção, difusão e consumo de
referencias culturais não só se assumem como campo de disputa política como
obrigam a uma reformulação das politicas patrimoniais.
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123 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
E neste contexto, de transformação do conceito de património, não exclusivamente
como bem cultural, mas como um bem social e económico, é o que permite
mobilizar o que ele contém de activo para mobilização da comunidade para a
criação do seu futuro. Ou seja é o que permite que o património deixe de representar
objectos passadistas para alocar a vida com as suas tensões e conflitos, com as suas
memórias e esquecimentos.
Termina Judite Primo com a posição: ―uma política cultural que assuma os museus
como espaços de acção política e, por isso, instrumentos de acção cultural dever
procurar implementar, por meio das suas acções: o reforço da cultura como factor de
desenvolvimento: a promoção de um maior equilíbrio espacial no acesso à cultura: a
valorização do património histórico e cultural como factor de desenvolvimento
económico: a valorização do papel das actividade culturais no apoio às políticas de
emprego. Trata-se, no fundo, de incluir as políticas culturais como factores
determinantes para a inclusão e o desenvolvimento económico e social‖ (pag,9-10)
PRIMO, J. S. (2007).― A importância Social dos Objectos: os processos de
patrimonialização e de musealização como legitimadores da memória social‖ in
XVIII Jornadas sobre a Função Social do Museus – MINOM, 2007, 5 p .
A partir das questões que se colocam à museologia como ―disciplina
aplicada‖nomeadamente os diálogos entre as reflexões teóricas e as praticas
museológicas, criaram-se novos caminhos de inovação na relação entre
patrimonialização e musealização, que Judite Primo se propõe problematizar neste
texto.
A reflexão parte da concepção de ―objecto museológico‖ ―entendido como
referencias de memórias, como fragmentos da realidade, ou ainda como recortes
que representam uma parte da história e dos seus mecanismos de socialização” pag
1). Ou seja mais do que uma artefacto o objecto museológico incorpora uma função
de ―representação‖ e, processo que o transforma (artefacto em representação) ―é o
facto de que provém duma coisa concreta da vida, mas a relação que nós
procuramos com esta coisa é uma relação de afecto ou simbiose‖ (ibidem). Portanto
o ―objecto museológico não é a realidade intrínseca do artefacto mas a
representação de uma parte desta realidade através dum objecto síntese‖.
A partir desta definição, Judite Primo procura clarificar os conceitos de
musealização e patrimonialização. Para isso vai utilizar o tempo de
consciencialização (aquisição de significação e representação) do objecto. Diz:
―Numa escala de representações e significações entendemos que a
patrimonialização é um momento que antecede a musealização e que inicia o
processo de transformação do artefacto em objecto museológico‖ (pag 2). Portanto
o processo de consciencialização (atribuição de valor) dos objectos culturais como
bens culturais inicia a ―consciência do património‖ ou seja quando um objecto
representa um valor social (um valor que transcende a soma das partes de fabrico).
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124 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
A patrimonialização contudo, enquanto valor social, implica um processo de
partilha. Por isso é um processo, que se inicia através da constatação (individual ou
de grupo) de objectos portadores de valores simbólicos, que através diversas
práticas sociais (escritas, ou orais, simbólicas ou de uso) se difundem pela
comunidade, em graus diferenciados. ―o processo de patrimonialização não se
extingue com a tomada de consciência do processo de significação, no entanto a
consciência de atribuição de valores simbólicos tende a criar a necessidade de
partilhar com outras pessoas, outros grupos, outras sociedades esses valores‖.(pag
2)
E é este processo de difusão, de divulgação do valor simbólico, que é um processo
de comunicação que permite iniciar o processo de musealização. Diz Judite Primo ―
e é neste novo contexto, quando a sociedade decide exteriorizar os valores
simbólicos atribuídos aos objectos, que se inicia um novo processo denominado
processo de musealização‖. (idem).
Grosso modo poderemos sintetizar que a patrimonialização é um processo de
atribuição de significados, e o processo de musealização é um processo de
comunicação desses mesmos significados. Mas nem toda a comunicação do objecto
patrimonial é mobilizável para processos de musealização.
Para o processo de musealização é necessário que ocorram mais operações. De
seguida Judite Primo vai especificar a distinção e a caracterização do processo de
musealização. Enquanto noção de processo o termo cientifico de ―musealização
surge na década de 1980 com um sentido comum de ―valorização de objectos
patrimoniais em contexto museológico‖ (pag 2). A musealização confere-lhe
características de comunicabilidade e de partilha . Este conjunto de valores
permitem inscrever o objecto no campo da identidade e memória colectiva.
―O processo de musealização pressupõe três elementos estruturantes: a pré-
existência de objectos patrimonializados, a intencionalidade de selecciona-los e
preservá-los através do olhar museológico, e das museografias, e a
intencionalidade de comunicar e divulgar os valores atribuídos. ―
O Olho museológico é definido por Mário Chagas em ―No museu com a Turma de
Charlie Brown‖91
e museografia é o conjunto de técnicas museológicas. E é essa
intencionalidade que acrescenta novas características ao objecto. Ou seja, no
processo de musealização verifica-se um reconhecimento do ―valor de herança92
‖ tal
como no processo de patrimonialização, mas acrescenta-lhe a intencionalidade de
91
Cadernos de Sociomuseologia, nº 2, 1994 92
Em inglês Heritage significa património, o legado que nos é transmitido pelas gerações
anteriores. Nesse sentido, inclui os saberes e as técnicas, que o conceito de património, por estar
correlacionado com a materialidade (o que é passado) não abarca. Para suprir esse defeito de
conteúdos tornou-se vulgar acrescentar a palavra de imaterial. Curiosamente da palavra
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125 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
representação e de comunicação como significado de memória social e identidade.
O processo de patrimonialização não terá esta intencionalidade93
Para aprofundar a noção de musealidade Judite Primo, de seguida aborda as
características do objecto museológico. Com a musealidade ―deu-se início ao
processo que nos conduziu à compreensão do valor simbólico e social dos objectos
musealizados‖ (pag,3), o que por sua vez legitima a sua preservação, o seu estudo, e
a divulgação publica. É essa musealidade que confere ao objecto museológico a
característica de documentalidade, exemplo (testemunhabilidade) e símbolo. ― a
musealidade é a característica intrínseca do objecto, tornando-o documento e
testemunho real duma outra realidade. Desta forma a materialidade, a forma, a
função, a testemunhabilidade, e a simbologia são características da musealidade.‖
(pag.3)
Mobiliza ainda Zbynek Stransky (1970)94
, que para além de ter inserido o conceito
de musealidade acrescente ainda musealia. “para o autor é o objecto museológico
autentico – distinto do artefacto, do objecto património – raramente substituto da
realidade testemunhada, por isso seleccionado para o contexto museológico como
documento da realidade produzida.” (pag 3).
A mobilização destes conceitos legitima o processo de afirmação da Museologia
enquanto disciplina científica de rigor, ―o autor distinguiu três características
essenciais: a historicidade do seu objecto de estudo, a lógica do seu conhecimento
científico, e a necessidade de legitimar as acções museológicas associando-as a um
objecto social‖(pag, 1).
Depois de afirmar a cientificidade da disciplina museológica, Judite Primo regressa
às ideias de musealidade e musealia para afirmar que conduziram a dois caminhos
distintos: ―a ideia de que o objecto patrimonial no contexto museológico, seria
privado das suas funções originais para cumprir a função de documento; e (2) a
ideia de que o objecto patrimonial em contexto museológico, ao lhe reconhecer a
função de documento, atribui-lhe mais uma função que é ser um elemento capaz de
testemunhar sobre realidades diferentes e exteriores ao contextos museal‖.
Desta definição partiu Waldisa Russio para a definição de musealização em 1981,
quando refere, no contexto do ICOM, que é ―um processo que ao recair sobre as
diferentes museografias reconhece e potencia as informações inerentes ao objecto
musealizados‖
Ou seja o processo museológico acrescenta algo ao objecto patrimonial e que essas
características introduzidas são um processo que legitima a salvaguarda da memória
colectiva (social) desde que seja operada a cadeia museológica (preservar, partilhar
93
Não nos parece inteiramente justificada esta fronteira de não intencionalidade do processo de
patrimonialização e de não divulgação das significações atribuídas ao artefacto/objecto
museológico (pag. 3). 94
Não citado na bibliografia (ver se está na tese)
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e educar) ―através dos objectos intencionalmente seleccionados‖ (pag 4) como
testemunhos dessa mesma memória.
Inscrita nesta dupla função, de testemunhar e documentar, o objecto museológico
legitima-se como elemento estruturante do processo de constituição da memória
social (colectiva), como informação de mobilização de referências das gerações
seguintes.
―Podemos então compreender que o processo de musealização começa com uma
valorização selectiva de alguns elementos previamente patrimonializados mas
segue gradualmente, através de técnicas museológicas, num processo que busca
transformar o objecto seleccionado em documento e testemunho dos processos
sociais e das memórias colectivas e transforma-los em recursos de socialização‖
(pag 4)
Consolida-se portanto a valia da museologia como um ciência que opera com
categorias de génese comum, mas que opera com instrumento próprios,
metodologias próprias, para alcançar resultados que se situam na esfera da acção
social. O património não é alocado desta forma nem é conferido o estatuto de
ciência. Distingue-se da museologia como uma patrimoniografia.
Para rematar a sua reflexão sobre o objecto museológico, Judite Primo convoca
ainda Peter van Mensh (1992) que fala das três etapas/contextos dos objectos na
sociedade: a) o contexto primário, no qual o objecto tem valor de uso; o contexto
arqueológico ou secundário, em que o objecto perde o valor de uso mas é valorado
como memória do tempo; e o contexto museológico onde o objecto ganha valor
cultural de comunicação e de educação (utilização social). A patrimonialização tem
de comum os dois primeiros contextos.
―Em conclusão, torna-se necessário distinguir claramente o conceito de
patrimonialização e do conceito de musealização enquanto processos distintos, mas
que em determinadas condições se reencontram na acção museológica‖ (pag 4)
PRIMO, J.S. (2008). ―Museus, hibridação cultural e novas territorialidades‖, texto
distribuído pela autora em Julho 2009, sem referência de publicação. 23 p.
O texto refere que mobiliza um conjunto de reflexões apresentadas na tese de
doutoramento. É objectivo da autora contextualiza a actividade museológica no âmbito
da construção das noções do património e Estado-Nação e sua relação com a expansão
colonial. A reflexão parte da museologia como um processo de narração de patrimónios
e memórias colectivas amarrada a territórios e a comunidades. Essa reflexão obriga a
incorporar as questões da globalização, as novas territorialidade, as novas sociabilidades
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127 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
e os processos de hibridação cultural. Isso justifica a mobilização dos processos de
urbanização e massificação da cultura que a autora vai apresentar.
Construído em 4 pontos: 1- legitimação pública dos museus e dos patrimónios; 2-a
construção do museus contemporâneo; 3- hibridação cultural ; 4_- Novas
territorialidades, o texto vai concluir que os museus e a museologia se encontram num
quadro económico em profunda transformação. ―Não somente pelas indefinições
socioeconómica, mas sobretudo numa tentativa de compreender as diferentes
dimensões da globalização, da homogeneização das culturas e da
desterritorialização‖(pag 22). Essa situação não está ainda clara e é necessário
continuar a reflectir, no âmbito da acção museológica, de que forma a tensão entre os
processos de homogeneização cultural e de diferenciação cultural estão a interagir para
elucidar a ―essência das relações sociais de poder‖. Ou seja alerta-se para os processos
de alteração das regulações de poderes.
No primeiro ponto aborda a emergência das ideias de patrimónios, ocorridas nos séculos
XVIII e XIX, integradas na construção do Estado Nação. O Estado-Nação, definido
como território identitário, com base no código e comunicação (língua), no código de
conduta e sistema de crenças (religião) pertencentes a uma etnia que partilha um
passado comum (mitologia). Os objectos materiais dessas ideias eram patrimónios, as
suas provas, ou os seus registos comprovativos da linha de herança eram manifestações
a identidade colectiva, e transformados em memória. Ainda como necessidade de
afirmação dessa pertença, havia a necessidade de afirmar a Nação, como uma forma
superior da organização social, e como tal, imbuída duma missão civilizadora dos
povos, pensados como inferiores, dos territórios colonizados.
A património cultural, ou a herança de bens materiais, alicerçados numa antiguidade
mítica, levou a um conjunto de estudos, comparados como os das ciência naturais, de
inventariação, classificação e descrição. ―ou seja os objectos passaram a ser valorizados
independente da sua natureza‖ O triunfo do olhar (sobre o mundo do património) levou
a dois caminhos, o das ciências e o da criação de palcos e cenários para a exibição dos
estudos e investigações. Os museus são exemplos desta construção . E o Estado-nação é
a organização que opera essa construção de significados, abarcando todas as operações
dentro dum código comum. Seja ele de línguas, de organização de forma de conceitos
ou de ideias.
A construção do território é complexa. Implica a delimitação das fronteira, que o poder
inclui e o que exclui, a construção de códigos partilhados, formas de comunicação
comuns (línguas e escritas). As memórias desses territórios são também comuns e as
instituições que as operam são criadas e controladas pelo Estado. O estado transforma-
se na grande instituição que opera na acção sobre o real. Os museus são na sua maioria
organizações públicas. Não significa que não exista outras iniciativas da sociedade civil.
Elas são é menos visíveis ou conhecidas, até porque na maioria dos casos não chegaram
até nós. No século XX, todavia, com a emergência de novos actores sociais, as
intervenções da sociedade civil se vão consolidando no âmbito museológico.
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128 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Com esta alteração entra-se no segundo ponto de reflexão do texto, com a construção
contemporânea do museu. Judite Primo considera que durante o século XX dois
movimento explicam a alteração da dinâmica dos museus. Em primeiro lugar a
emergência da globalização e a emergência da democratização dos processos
educacionais (universalização e extensão).
O Museu do Estado Nação mostra o discurso sobre a grandeza e sobre a especificidade,
uma narrativa tão exaustiva quanto possível da totalidade duma nação, dos costumes
perdidos que deram lugar á modernidade (museus de etnologia), tudo foi encenado e
teatralizado para melhor entender. È nisso acompanhado pela escola, que transmite o
discurso sobre a história e os patrimónios. Todavia, em pleno século XX emergem
novos museus que introduzem as referencias sócias sobre o património, introduzem as
comunidades e os territórios que tem por objectivo ―estimular a colectividade na
valorização e descodificação dos seus patrimónios e das suas memórias colectivas‖
(pag 6). Ou seja estes museus vão introduzir a questão da acção sobre o património para
mobiliza-lo para as questões do desenvolvimento sustentado da comunidade.
Património não é mais uma coisa do passado, é algo que podemos mobilizar para o
nosso presente. E a museologia é uma das formas de mobilizar essa memória. Uma
forma de institucionalizar a memória de acordo com lógicas narrativas próprias95
.
A opção pela narrativa, a consciência do seu presente conduz a uma profunda reflexão
sobre a museologia e sobre o seu papel na sociedade. A nova museologia e a
sociomuseologia introduzem a ideia dum museu novo, um local de dialogo da
comunidade com a sua memória, em que os objectos deixam de ser o centro da
narrativa. No centro dessa operação inscreve-se uma opção pelo social. Esta opção não
exclui o trabalho sobre a materialidade. Vai recentrar a operação sobre os objectos em
função da sua significação social. ―O novo museu, nas suas diferentes formas e
tipologias, ao trabalhar com o social pretende responder aos dilaceraremos da vida
cultural e social. O social é então totalmente reinvestido na vida das comunidades,
tornando-se objecto das acções culturais‖ (pag 8).
É certo que na lógica da legitimação do poder do Estado-nação estas novas tipologias de
poder transportam uma subversão. Nessa lógica, estes museus de comunidade são
estruturas de contra-poder. Mas essa lógica tende a ser ultrapassada se reflectirmos o
que se passa com os fenómenos de globalização e de desenhos de novos territórios.
No terceiro ponto analisa as questões da hibridação cultural. Sendo a nação, e a sua
expressão das ideias, uma construção cultural, ela resulta dum processo histórico, da
satisfação duma necessidade social, da recomposição de territórios económicos e dispõe
de agentes operacionais. Ou seja a identidade nacional corresponde a uma configuração
social, organizada, lógica mas mutável. Ao procurar a racionalidade da identidade, ao
atribuir historicidade, linhagem que culmina num momento fundador experiencial sofre
95
As instituições de memória museus, bibliotecas e arquivos, organizam, conservam e divulgam
as suas memórias de acordo com procedimentos de organização e selecção que são factos
sociais.
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mutações. A pressão para integrar a totalidade são constantes, e a integração de novas
realidades conduz a transformação de velhas realidades.
No interior das sociedades civis permanecem áreas de renitência provenientes dos
excluídos dos marginalizados, dos que foram colocados á margem dos processo sociais.
Ou seja não existe uma sociedade uniforme e coesa no seio da nação, mas sim m
conjunto de comunidades. Uma mais integradas e que partilham os códigos culturais,
outras menos integradas, que partilham alguns desses códigos. Estes conceitos de
―comunidades culturais‖ construídas nas memórias colectivas, nas mentalidades
enquanto processos sociais são determinantes para compreender as tensões no interior
dos territórios.
Ou seja não há uma história nacional, mas sim a história duma configuração social, que
ocupa um determinado território durante um certo tempo, que organiza a sua
legitimidade e o seu poder através de operações materiais, instituições, e operações
abstractas (nas ideias) que dão coerência ao conjunto. Nessa configuração convivem
várias comunidades, cada uma delas partilhando códigos comuns e códigos identitários
específicos. Juntas partilham uma memória comum, mas cada uma delas transporta
memórias específicas. Essas configurações sociais têm tensões no seu seio. Essas
tensões exprimem no campo do património, com as tensões dominantes a expressarem
as ideias e os objectos determinantes dessa significação.
Tendencialmente no mundo contemporâneo, a relação entre as comunidades vão
criando novas comunidades, que elas próprias criam novas identidades, novos
patrimónios, novas memórias. Essas manifestações de agregação e desagregação das
culturas (porque também há desagregação das comunidade através dos fenómenos de
emigração) manifestam-se no território de forma contínua os descontínua. Contínua
quando tratamos de processos de urbanização, onde a cidade atrai comunidades
vizinhas, descontínuas quando os processos de globalização implicam movimentações
sociais para territórios distantes. Em qualquer dos caso, quem parte e quem chega
transforma-se. Não há portanto ma cristalização da cultura, nem existe uma cultura
nacional, nem uma cultura regional, nem uma cultura de grupo. Existe um processo, que
em determinado momento mobiliza ideias, saberes e técnicas capazes de organizar o
mundo com sucesso. Quando organiza e materializa esse sucesso contamina as outras
culturas, com as quais nunca deixou de dialogar, mas influenciando-as irradiando as
suas aquisições.
Regressando ao texto Judite afirma (citando Castells) que a comunidade é o local onde o
individuo realiza a vida comum. É o local onde se efectua a relação entre a cultura e o
território na medida em que as pessoas interagem e socializam-se no seu ambiente,
formando redes sociais entre os seus pares‖ (pag 12) Esta celulerização da observação
social é crucial para a abordagem museológica porque estabelece um padrão mínimo de
trabalho sobre a memória. Não é o indivíduo, que é alvo de memorização. ´É a relação
do indivíduo com os outros num contexto territorial note-se que aqui território não tem
que ser necessariamente um espaço físico contínuo. Nessa acepção território é o espaço
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130 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
por onde os indivíduos transitam, pode ser cibernético e multi-dimensional, porque os
indivíduos podem desenvolver relações de pertença com vários códigos identitários)
Aqui entra Judite Primo no último ponto da sua reflexão. Os movimentos sociais e
urbanos nos anos oitenta e noventa que fizeram emergirem uma nova sociologia urbana,
com base nos processos de transformação social. São movimentos migratórios, são as
questões do género, do ambiente. A tendência destes movimentos é organizarem-se
como contra-poder e logo que surge oportunidade, organizam-se como governos locais.
O facto de se organizarem como estruturas defensivas conferiu-lhe uma forte
capacidade de resistência, uma coesão inter-grupal forte, e uma grande capacidade de
mobilização. Como as democracias tendem a compor-se como gestoras das pressões de
grupos, existe sempre uma janela de oportunidade para a emergência dos pequenos
poderes locais.
Esta caracterização das comunidade como ―reactivas, pois aparecem como reacção a
tendências sociais predominantes, defensivas, pois servem de refugio e solidariedade e
protecção ao mundo hostil, e culturais, pois se organizam em torno de um conjunto
específico de valores, cujos significados e usos compartilhados são marcados por
códigos de auto-identificação‖ (pag 13), e surgem a partir de condições pré-existentes.
Manuel de Castell em O Poder da Identidade‖, organiza-as em torno do
fundamentalismo religioso, nacionalismo cultural, e comunas territoriais. Estas três
comunidades enfrentam, pelo processo de globalização enfrentam a ameaça da
dissolução através da perda da autonomia e o surgimento de novos poderes, da
emergência de redes de comunicação e flexibilidade alternativas à comunicação
controlada pela rede social, a flexibilização das fronteiras, a individualização das
relações de trabalho e de produção, a dissolução do modelo social da família patriarcal,
etc.
A sociedade em rede constitui a grande transformação das composições sociais no
nosso tempo. Os movimentos sociais organizam-se em redes de comunicação e acção.
Pensa-se globalmente e age-se localmente.
Todas estas questões lançam o desafio de pensar o património e a museologia de acordo
com as novas tendências. E é a essas tendência que a nova museologia e a
sociomuseologia procuram responder.
Ou seja as comunidade locais, estão hoje perante uma dinâmica de globalização, com a
emergência de novos hábitos culturais, novas formas de entretenimento, novos formas d
estar que são globais. Em paralelo, procura-se, no interior dos territórios, os fenómenos
identitários, sejam eles nacionais ( na maioria dos casos já obsoletos do ponto de vista
das ideias) ou regionais ou que de alguma forma permita conectar com o território de
origem (as raízes).
A política cultural emerge aí como uma estratégia para a intervenção museal e
patrimonial. Ou seja, é necessário distinguir o património arcaico (do passado), o
residual, o que vem do passado, mas se encontra presente nos programas culturais) e o
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131 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
emergente (entendido como os novos significados, os novos valores e as novas práticas
de relações sociais). Estas propostas reposicionamento das políticas culturais permite
ultrapassarem a tensão entre tradição e inovação, entre passado e modernidade. Ou seja
a questão da autenticidade na esfera das produções patrimoniais ilustra estas questões. A
produção artesanal de cerâmica constitui em muitos locais uma actividade económica,
que marcou o território, a organização social, os saberes. A sua revitalização simples é
um processo arcaizante. A sua mobilização acrítica, ou fabricação de peças que o
mercado não procura, é uma actividade residual. A criação de inovação e um processo
de integração nas novas condições de globalização. Ou seja exige, individualidade,
qualidade, e tem que ir de encontro ao consumidor no mercado, que já não é o velho
território vicinal. ―No que toca à autenticidade do património cultural deve-se ter em
conta alguns factores de risco, como idealizar de algum momento do passado e propô-
los como paradigma sociocultural do presente.‖ (pag 17)
E prossegue, ―as representações culturais devem ser entendidas como simulações e
teatralizações e não como factos. (…) Apenas a consciência crítica, por seu lado, leva a
que se assuma que os bens culturais, enquanto representações, adquirem e mudam o
seu sentido por conta dos processos históricos, dentro de diversos sistemas de relações
sociais submetidos a construções e reconstruções imaginárias‖ (pag 17) .
Aqui o museu surge como espaço por excelência para a configuração dessas narrativas.
―os museus como espaços narrativos, são por essência territórios de representação
capazes de proporcionar uma visão mais complexa sobre a sociedade e das formas de
diferenciadas de apropriação de memória colectiva‖ (ib idem). E esta nova função já
consciencializada pela museologia, poderá permitir irradiar as suas reflexões, para as
outras instituições de memória (arquivos, bibliotecas e escolas).
Esta reflexão da museologia, sobre o impacto da globalização sobre a sociedade, é um
processos de crescimento natural das ciências sociais . Este novo modelo museológico
(a sócio museologia) responde às necessidades dialógicas das organizações
sociais.”Entender a sociedade como global implica novos desafios empíricos e
metodológicos que exigem a elaboração de novos conceitos, a construção de novas
categorias de classes e levam a novas e diferentes interpretações.‖ (pag 18)
Para situar a questão dos modos de produção da globalização, que implicam modelos
organizacionais diferente, Judite Primo mobiliza Boaventura Sousa Santos
(Globalização: Fatalidade ou utopia: 2005). Apresenta os quatro modelos de
globalização (o localismo globalizado, o globalismo localizado, o cosmopolitismo e
património comum da humanidade) e de seguida refere Castells, também para referir a
questão da emergência dos fenómenos nacionais em contexto de globalização.
No entanto a globalização é um fenómeno que deve ser analisado simultaneamente nas
esferas do económico, social e cultural. Essas análises tem permitido um crescente
desenvolvimento das ciências sociais e em particular na emergência dos estudos
culturais “ a globalização cultural assumiu papel importante nos anos oitenta do século
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132 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
XX, no contexto de mudança de ênfase nas ciências sociais, antes focada nos fenómenos
sociais e económicos, para um novo enfoque nos fenómenos culturais‖ (pag 21)
E aqui chega aos textos de Appadurai com a sua tese de que a globalização se efectua
fundamentalmente por via dos processos de emigração e comunicação. A conclusão
deste impasse explicativo sobre as razões da globalização é a razão da sua interrogação
conclusiva. De qualquer forma a museologia inscreveu-se nesse movimento de
renovação a procurar centrar os seus processos museológicos nas comunidades, nas suas
memórias e identidades. Ao procurar colocar a narrativa na perspectiva dos outros para
motivar o desenvolvimento.
Numa nota final à reflexão, não foi abordada a questão do outro e das questões
coloniais.
PRIMO, J.S. ( )O sonho do Museólogo. A exposição: Desafio para uma nova
linguagem museográfica. Museologia: Teoria e Prática, Lisboa: Edições
Universitárias Lusófonas, 1999, v. 16, p. 93-118
PRIMO, J. S. (2001) ―O museólogo educador frente aos desafios económicos e
sociais da actualidade.
A propósito do tema da conferencia internacional do ICOM, em 2001 em Barcelona)
sobre o tema museologia e globalização Judite Primo faz um contributo sobre o reflexo
no campo dos bens culturais, identidades e diversidade cultural, no âmbito do debate da
―unificação universal das culturas‖. O texto aborda a questão da tensão para a
unificação cultural e as resistências das comunidades.
“Essa mesma tensão entre o local e o universal é também sentida na Cultura. A questão
é de saber como equacionar essa tensão. Como preservar e valorizar a
economicamente frágil cerâmica da Bajouca? Como preservar e valorizar as
desertificadas aldeias históricas da Serra da Freita, com a sua beleza única, a sua
distância e sua solidão? Como preservar e valorizar a fogaça e os pastéis de nata
diante do avanço avassalador dos mc-sanduíches? Como atrair os jovens para a
música tradicional sem “perdê-los” para o rock nem afastá-los da dinâmica própria da
contemporaneidade?” E Acrescenta, “ Actualmente, no Ocidente, a grande tensão da
Cultura é justamente a progressiva perda de identidade cultural por parte das
comunidades.” (pag 2)
Ou seja perante o avanço da tecnologia é acompanhado por um crescimento e
generalização dos valores universais. Restaria às comunidades locais integrar esses
valore s de forma crítica. E os museus seriam locais de educação para essas
capacitações. ― Assim caberá ao campo teórico da museologia, trabalhar com essas
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133 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
novas manifestações e referências culturais, assim como “capacitar” as nossas
comunidades e utilizadores das instituições museológicas, para o exercício pleno da
criticidade.” (pag 3) e inscreve nesse treino a educação ―O processo de “capacitação”
dos utilizadores dos espaços museológicos passará, inevitavelmente, por acções
educativas. A educação, em particular no campo de actuação da museologia, deve
destacar-se como ferramenta social importante no processo de oposição à globalização
da cultura” (Ibidem).
De seguida apresenta a proposta de modelo de objectivos de formação que passa pela
consciência da complexidade das funções, a noção de responsabilidade social e de
compromisso, a capacidade de planear estrategicamente as actividades, uma atenção
permanente à comunidade e uma atenção às necessidades do público. Judite Primo
acrescenta a este modelo de Denise Studart e Adriana Almeida mais duas funções, a
titulo de actualização, que é a consciência da crescente autonomia dos visitantes e a
função social do museu.
Desta forma o museu assume uma função de espaço de educação não formal e o
museólogo o papel de educador porque ―É importante que os cidadãos conheçam a
realidade sócio cultural na qual estão inseridos. O primeiro instrumento para esse
conhecimento é a educação e a seguir encontra-se o património e a cultura como
suportes estruturais que capacitam o indivíduo para a sua inserção no grupo social
(pela consciência que resulta desse processo do seu verdadeiro papel dentro do
grupo)” (pag 4). O museu e o museólogo são mobilizados para o campo da educação
patrimonial e esta é considerada uma ferramenta do trabalho museológico. A educação
patrimonial pode igualmente transformar-se num recurso para o museu estender a sua
acção a todos os grupos sociais, no sentido da pedagogia da libertação de Paulo Freire.
Colocando estas questões, Judite Primo interroga-se se os museus do futuro poderão
responder de forma positiva a estes desafios. A resposta passa pela democratização dos
museus, e pela adequação da actividade dos museus às linguagens, e objectivos da
comunidade.
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134 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
3.7 Museologia e Educação de Maria Célia Santos
3.7.1 Síntese Biobibliográfica
E doutorada em Educação pela Universidade Federal da Bahia (1995), a tese ― Processo
Museológico e Educação: construindo um museu didático-comunitário, em Itapuã. Fez
mestrado em Educação pela Universidade Federal da Bahia (1981) com a tese e Museu-
Escola: uma experiência de integração., Ano de Obtenção: 1981. É licenciada em
Museologia pela Universidade Federal da Bahia (1973). Tem experiência na área de da
museologia e da pedagogia, tendo desenvolvido diversos trabalhos de consultadoria
com ênfase em Gestão e Organização de Museu, actuando principalmente nos seguintes
temas: museologia-educação, acção educativa dos museus, museu, política nacional de
museus, formação e capacitação. É professora da Universidade Lusófona de
Humanidades e Tecnologias, conselheira no Conselho Internacional de Museus -
ICOM/BR, e coordenadora do Eixo 3 da Política Nacional de Museus do Ministério da
Cultura, Têm vários artigos e livros publicados onde se destaca: SANTOS, Maria Célia
Teixeira Moura. Museu e Educação: conceitos e métodos. Ciências & Letras - Revista
da Faculdade Porto Alegre, Porto Alegre, v. 31, 2002. SANTOS, Maria Célia
Teixeira Moura. Estratégias Museais e Patrimoniais Contribuindo para a Qualidade de
Vida dos Cidadãos: diversas formas de musealização. Ciências & Letras - Revista da
Faculdade Porto Alegre, Porto Alegre, v. 27, 2000. SANTOS, Maria Célia Teixeira
Moura. Reflexões Museológicas: caminhos de vida. Lisboa: ISMAG/UHLT, 2002. v.
1.SANTOS, Maria Célia Teixeira Moura . Processo Museológico e Educação:
construindo um museu didáctico-comunitário. Lisboa: ISMAG/UHLT, 1996. SANTOS,
Maria Célia Teixeira Moura . A Exposição Museológica: Reflexões Sobre os Pontos
Críticos na Prática Contemporânea. Ciência e Museu.. In: Simpósio O Processo de
Comunicação dos Museus de Arqueologia e Etnologia, 2005, 2005., SANTOS, Maria
Célia Teixeira Moura . A implantação de uma política museológica participativa: o
olhar da coordenação do Projeto-Bahia. Salvador: MINC/IPHAN, 2005 (Relatório).
O seu seminário decorreu nos dias 8 e 9 de Maio de 2009. Foi distribuído o programa,
bibliografia, textos de apoio e fichas para trabalhos práticos.
O conjunto das sessões foi organizado em torno de quatro pontos: A Análise da relação
entre o Museu, a Educação e a pedagogia, com e evolução histórica dessa relação e a
sua situação no Brasil; a análise da acção museológica como acção de comunicação; os
desafios contemporâneos da relação museu-educação e património e o planeamento
museológico como praticam educativa. O debate foi dinâmico e participativo, e foram
apresentados casos práticos e foi solicitada a mobilização de experiências individuais
para reflexão em grupo.
Os textos distribuídos foram os seguintes:
Da autora SANTOS, Maria Célia
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135 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
PROCESSO MUSEOLÓGICO: critérios de exclusão, Texto apresentado na II
Semana de Museus da Universidade de São Paulo, realizado no período de 30 de
Agosto a 03 de Setembro de 1999.
OS MUSEUS E A BUSCA DE NOVOS HORIZONTES, Texto a ser
apresentado no IIII Fórum de Profissionais de Reservas Técnicas de Museus, a
ser realizado em Salvador-BA, no período de 18 a 22 de Novembro de 2002,
organizado pelo Conselho Federal de Museologia – COFEM e Conselho
Regional de Museologia, 1a. Região – COREM-BA.
Os Museus e seus Públicos Invisíveis Texto apresentado no I Encontro Nacional
de Rede de Educadores de Museus e Centros Culturais, realizado no Rio de
Janeiro, na Casa de Rui Barbosa, nos dias 17 e 18 de Setembro de 2007.
MUSEU E EDUCAÇÃO: conceitos e métodos: Artigo extraído do texto
produzido para aula inaugural – 2001, do Curso de Especialização em
Museologia do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP, proferida na abertura
do Simpósio Internacional ―Museu e Educação: conceitos e métodos‖, realizado
no período de 20 a 25 de Agosto.
MUSEU E COMUNIDADE: uma relação necessária1 Texto a ser apresentado
na 13a Reunião Anual do Instituto Biológico, a ser realizada em São Paulo, no
período de 6 a 11 de Novembro de 2000.
De autor
GADOTTI, Moacir, ( ) Dimensão Política do Projecto Pedagógico da Escola .
Sem referência bibliográfica , 11 p. 96
GADOTTI, Moacir (2000) ―Perspectivas Actuais da Educação‖, São Paulo em
Perspectiva, 14, 2 pp. 3-11
AZEVEDO, Maria do Rosário Palma de Melo ( ) DINÂMICAS DE
APRENDIZAGEM NOS MUSEUS: A MEDIAÇÃO, Museu Calouste
Gulbenkian - Serviço Educativo , Sem referência bibliográfica
BENNASSAR, Maria del Cármen Fernadez , PASTOR HOMZ, Maria
Immaculda (2008): La education emocional en los âmbitos formal e no formal:
Propuesta aplicable a una visita museisitica. In Revista Compultense de
Education, vol 19 nº 2, 347-366.
96
Moacir Godotti é Director do Instituto Paulo Freire.
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136 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
3.7.2 Roteiro dos Seminários
A- Os Museus e seus Públicos Invisíveis
Em os museus e os seus publicos invisíveis Maria Célia iniciou a sa apresentação com
uma cistação de Murilo Mendes . ―O Invisível não é irreal: é o real que não é visto‖. Ou
seja, Maria Célia vai procurar olhar para a acção edcativa nos museus a partir do
Contentamento que é uma proposta de “olhar a ação educativa dos museus de uma
forma mais abrangente, buscando vencer as nossas dificuldades em operar as partes e as
totalidades, na complexidade da ação museológica‖.
Ou seja a acçãomuseológica deve superar a sua ―compartimentação‖ entre os vários
sectores do museus e desenvolver a sua interação (entre sectores) e no âmbito duma
acção cultural. Essa assumção têm como objectivo evitar as ―cegueiras museológicas‖
ou paradigmas, que fomos assumindo como verdades absolutas da actividade
museológica, tal como: seleção dos acervos ; museu uma ilha tranqüila ; ―salvaguarda‖
dos acervos como principal missão; ação educativa como um corpo de regras
estabelecidas que denominamos de ―metodologia da educação patrimonial‖.
Este ―Conformismo cognitivo‖ nada mais é do que um ― ilusão racionalizadora‖ e, por
consequencia traduz a nossa dificuldade em olhar o invisível, oque está para além do
que conseguimos ver e que nos impede de realizar a nossa autocrítica e criar novos
paradigmas.
Maria Célia considera que o ―tecnicismo” é uma das principais cegueiras
museológicas, ―uma erva daninha, que invade a instituição museu e nos cobre com seus
ramos, nos isolando em verdadeiros guetos e nos impedindo de refletir sobre o sentido
das nossas ações e sobre as amplas possibilidades que temos de integrar as partes ao
todo, no interior e fora do museu, às globalidades e às complexidades‖.
Ora se assumirmos um concepção de Museu um fenômeno social97
, ―um espaço
relacional e, como tal, resultado da ação de muitos sujeitos sociais, que estão no interior
da instituição e fora dela, e o constroem e reconstroem, a cada dia‖ se os considerarmos
como ― actores da ação educativa98
”, em todos os seus processos, do planejamento à
operacionalização e à avaliação, o que constitui o centro teorico da proposta de Maria
Célia, atribuimos à museologia uma dimensão social e educativa.
Como operar as partes e as totalidades ?
97
O objectivo do museu é devolver à comunidade o conhecimento do seu património. Somos
todos nós que fazemos os museus. Todos somos o seu público invisível. 98
A museologia social têm uma postura de Acção Cultural efectiva. A educação é vista como
acção cultural. O conceito de Educação Patrimonial chega por influência dos ingleses e tem por
base a reconstituição histórica. Utiliza fundamentalmente as técnicas de representação (teatro).
O que a educação patrimonial acaba por fazer é representar a sua colecção. Para a museologia
social o museu não é a colecção. O museu é um local onde se concretizam práticas sociais que
tem como contexto de produção objectos culturais (que podem ser patrimoniais) e que por sua
vez pode ela própria produzir os seus objectos que se tornam por essa via culturais.
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137 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
O primeiro processo é o desenvolvimento de ―Ações de pesquisa, preservação e
comunicação99
planejadas e aplicadas, em interação, como resultado de um processo
de planejamento estratégico, envolvendo o coletivo dos museus, criando redes de
parcerias, proporcionando a oportunidade de uma troca efetiva, formando comunidades
de aprendizagem, em diferentes contextos, produzindo conhecimento e ampliando as
dimensões de valor e de sentido das práticas sociais de todos os envolvidos no
processo‖100
. A actividade cultural é também uma actividade interna de partilha de
informações, é o reconhecimento de da importância de todos os trabalhadores da
instituição, e é, ―sobretudo, o estabelecimento de uma ética de confiança e de
parcerias”.
E conclui ―Considero que os museus mudarão de uma forma mais eficaz quando a
melhoria tiver origem no seu interior, como compromisso de todos. A cultura dos
museus faculta um apoio, positivo ou negativo à aprendizagem de todos os envolvidos
com o fazer cotidiano da instituição‖.
Esta construção do Planeamento museologico como Ação Cultural e Educativa101
,
permite que os projetos museológico e pedagógico se tornem, com o envolvimento de
todos os sectores, num momento único de aprendizagem e crescimento conjunto. ―É
produção de conhecimento, é relação entre teoria e prática, é exercício de reflexão
crítica e criativa, e é comprometimento. É o primeiro passo para a reflexão conjunta
sobre a instituição e sobre os referenciais nos quais nos apoiaremos para o
desenvolvimento das ações museológicas‖
Implica este planeamento um trabalho de base cooperativa, e pensar a unidade na
diversidade. A acção participativa é a única visão capaz de mostra a complexidade do
real. Esta proposta implica igualmente reflectir e problematizar as práticas
museológicas e educacionais, em interação, a partir das diferenças que coexistem nos
museus e nas escolas, principalmente a diversidade de culturas
99
Comunicação e Educação são, tradicionalmente, consideradas duas funções dos museus.
Muitos estão organizados sectores distintos de educação e de comunicação. Para Maria Célia
não há museologia sem comunicação. Por outro lado, o processo educativo é próprio um
processo de comunicação. 100
Ao operar com redes de pareceria e ao formar comunidade de aprendizagem a museologia
parte da interrogação de qual é o sentido de preservar, investigar e comunicar. A produção de
sentido da museologia é proporcionar um lugar onde as praticas da comunidade se possam
acontecer, com base no seu património. Por exemplo a cozinha, a arte da cestaria, das técnicas
de trabalho, etc. Essa praticas devem mobilizar a herança patrimonial como recurso de
desenvolvimento. 101
O planeamento da acção educativa tem como objectivo pensar e antecipar a acção. A
referência a Plano Museológico chega por influência espanhola (Godoy). Maria Célia prefere a
utilização ―Projecto Museológico‖, porque Projecto é uma noção mais abrangente, mais
dialógico. A museologia implica a capacidade de construir um processo com a participação do
outro. Por outro lado, pensar a museologia como um processo, obriga a definir a sua missão, os
seus objectivos e as suas funções também como componentes de um processo em permanente
actualização. Os avanços na conceptualização da museologia implicam um trabalho muito árduo
de adequação das práticas. A museologia social como prático museológica pode estar em todo o
lado porque quem faz o museu são as pessoas.
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138 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
― Olhar a instituição museu, em sua totalidade, considerar o invisível que é real, no
interior e fora da instituição, talvez seja um dos aspectos mais importantes da ação
cultural e educativa da instituição. ― Este olhar, que desloca o olhar tecncico e
profissional sobre a acção, para o olhar colectivo, publico, desloca a produção
museológica para a esfera da ―pessoa‖ . Nos sectores educativos nos nossos musesus o
invisível é o ―contexto, é o professor, é o aluno, são os trabalhadores dos museus”.
Que reflexos têm a esta concepção sobre a nossa ação muselógica ?
A adopção duma concepção participativa no processo de planeamento102
da educação
no interior do museu conduz a: Abertura de espaços democráticos; Evita
compartilhamento de poder e de saberes; possibilita a abertura de novos espaços de
participação; permite a articulação de sectores sociais distintos englobando a
diversidade de actores e lugares; permite uma construção coletiva; a abertura de novos
espaços de comunicação e da utilização da tecnologia da informação –TI, para a
democratização da ação museal; produz de resultados concretos, alimentando setores e
pessoas, por meio de um processo contínuo de avaliação; permite a Integração entre
pesquisa, ensino e extensão103
; cria circuitos abertos de produção, com a realização de
ações multiprofissionais, interinstitucionais e intersectoriais; permite a contextualização
social do conhecimento; e revela a compreensão do planejamento como um ato
educativo e de participação.
Quais são os indicadores desta operacionalização?
A concepção da acção educativa como projecto cultural, a criação de ojetivos
partilhados no interior da organização museal conduz a uma partilha solidaria de
caminhos, uma co responsabilização pela eficácia, motiva a melhora constante de
procedimentos, estimula a aprendizagem ao longo da vida, democratiza o acesso ao
saber. Por outro lado, a partilha a a busca constante de novos caminhos estimula o risco
pela iniovação. Com base no respeito mútuo (todos temos algo para oferecer) podemos
falar das diferenças e desenvolver formas de apoio. E umaforma de Celebração e humor
― Sentimo-nos bem conosco‖. Chistoper Day (2004:192) indicadores elaborados por
Stoll e Fink (1996)
O que é então a acção cultural e educativa nos museus ?
Para Maria Célia a ação educativa dos museus não pode ser reduzida a uma
metodologia, com a aplicação de determinadas técnicas. Ela é a essência do trabalho
museológico e da instituição museu. É o movimento de ação e reflexão que estimula a
produção do conhecimento e amplia as dimensões de valor e de sentido das ações de
102
O trabalho da acção educativa no museu inicia-se com o próprio diagnóstico. È aí que se
pode escutar a‖voz do outro‖. A participação deve estar inscrita no museu desde o seu início.
Em museologia social, a participação é um compromisso. 103
Aqui distingue-se entre acção cultural e extensão cultural. Acção cultural pressupões a
construção de algo com o outro, ao passo que extensão cultural é ―levar qualquer coisa ao
outro‖.
Relatório de Avaliação Curricular
Julho de 2009
139 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
pesquisa, preservação e comunicação, bem como do patrimônio cultural de cada
indivíduo e da coletividade‖.
―A sua riqueza está nas escolhas que fazemos dos métodos e das técnicas, em interação
com os nossos pares e com os muitos sujeitos sociais envolvidos com os projetos, tendo
como referencial as nossas concepções de museologia, de museu e de educação,
buscando, a cada momento, a flexibilidade necessária no sentido de adaptá-los aos
diferentes contextos e patrimônios.‖
E termina com um conjunto de ―Lições que não nos devem escapar “ de Dom Hélder
Câmara, 1976
―Diante do colar
– belo como um sonho –
admirei, sobretudo,
o fio que unia as pedras
e se imolava anônimo
para que todas fossem um...‖
B-RELAÇÃO EDUCADOR EDUCANDO - MUSEALIZANDO COM O OUTRO:
ESTRATÉGIAS MUSEAIS UTILIZADAS AO LONGO DOS ANOS
História de Vida – formação. Apresentação de vários slides com acções educativas
sobre pessoal dos museus como ponto de partida para a abordagem darelação do
educador com o educando
CONCEPÇÃO ( 1) - PROCESSO MUSEOLÓGICO COM ÊNFASE NA COLEÇÃO,
NO OBJETO
MUSEU. Tem como objectivo divulgar a instituição , tornar a instituição útil ao
processo de aprendizagem, e melhoria da qualidade de ensino. Nesta concepção os
precedimentos são os seguinte. Segue-se a colecção tendo como vector da ação com
professores e alunos-características intrínsecas aos objetos. A colecção e o objecto são
contectalizados e releva-se a análise e a percepção doobjecto com base na sua relação
passado-presente. Tem uma forte relação com os conteudos da História e da Edicação
Artísitica. Nesta concepção as acções dos sujeitos centra-se no domínio tecnico do
conhecimento sobre os objetos; na transmissão do conhecimento a professores e alunos.
Verifica—seuma acção integrada técnico, aluno e professor.
CONCEPÇÃO ( 2 ) - PROCESSO MUSEOLÓGICO COM ÊNFASE NA COLEÇÃO
E NO CONTEXTO URBANO
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Julho de 2009
140 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Projetos com a comunidade – ENTORNO DO MUSEU . A integração do msue com a
comunidade pode ser feita por meo do processo educativo, ensino pesquisa e extenção.
CONCEPÇÃO ( 3 ) - PROCESSO MUSEOLÓGICO COM ÊNFASE NA
RELAÇÃO/HOMEM/ PATRIMÔNIO CULTURAL
Nesta concepção a muselaização do património é um exercício de cidadania. Tem por
base a musealização do fazer cultural local, a qualificação do professor, a melhoria do
processo de aprendizagem, a melhoria da qualidade de vida, um relacionamento ético
com o meio ambiente, oreconhecimento da pluralidade cultural, o reconhecimento do
valor social do trabalho, e o reconhecimento do patrimônio cultural como referencial
para o exercício da cidadania.
Quais são os procedimentos. Exemplo em São Salvador: Integração da escola com o
Bairro e com a Cidade do Salvador: Escolha de Núcleos básicos temáticos: identidade,
tempo, espaço e transformação, Seleção de temas/problemas, integração com todas as
áreas-abordagem sistêmica, Qualificação do fazer cultural local, Análise e interpretação
do patrimônio cultural, produção de conhecimento em todos os níveis de ensino,
Aplicação das ações museológicas de forma integrada, Aplicação das ações
museológicas a partir dos acervos institucional e operacional, Estruturação e
organização de um museu, integrado ao processo educativo a partir da iniciativa do
grupo, Utilização de outros museus e processos museais .
Como é que é feito o exercício de cidadania? As acções dos sujeitos são: Alunos e
professores indicando os temas a serem musealizados (iniciativa do grupo); Aplicação
das ações museológicas com a participação de alunos, professores e membros da
comunidade; A musealização é feita no interior do museu e fora do museu. Do museus
para o bairro. Do Bairro para o museus
Como é que a MUSEOLOGIA APLICADA na relação com o homem e com o território
pode contribuir para a criação e a transformação de cultura. São as AÇÕES DOS
SUJEITOS Sujeitos de todo o processo - Iniciativa, participação e autodeterminação
que são construtores do MUSEU COMO PROCESSO.
A escola o teritório a população e o património global podem contribuir para a
qualidade de vida . O Compromisso social dos sujeitos envolvidos aumenta de 1 para 3 .
Para isso é igaulmente necessário um Planeamento Museológico com acção cultural e
educativo.
C- “museologia e educação”
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141 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
A proposta do tema ―MUSEOLOGIA E EDUCAÇÃO104
‖ iniciou-se com um análise de
contexto do surgimento das instituições Escola e Museu. Foi uma época em surge o
Estado Contêmporâneo, em que a sociedade confiava da Razão Absoluta e ultrapassava
a concepção monista do mundo. A premisse á a de o conhecmento é verdadeiro,
indubitável e universal.
Oabsolutismo ilminado do seculo XVIII vai aproveitas as instituições pré-existentes (a
igreja, a catequese, o exerciot) para criar mecanismos de uniformização dos indivduos
sob a forma de um pensamento secular. É a época da emergência e consolidção dos
Estados-Nação. No interir dessa construção, a escola vai representar o centro do papel
da reprodução dos conhecimentos, do saber e do fazer. A escola constroi idenidades.
A frequência da escola é um caminho para o acesso ao mundo do trabalho. Ao mesmo
tempo os museus tornam-se locais símbolo da formação nacional. Neles são expostos
coleções de objetos provenientes das colônia, mostrando a grandeza da nação, a sua
identidade e, por contrapartida, a imagem do outro, dominado. Concepção evolucionista
da civilização. Os objectivos era educar o indivíduo e estimular o seu senso estético e
afirmar o sentimento nacional. Os museus eram espaços de educação para a elite, onde
se valorizavao método experimental e a observação da natureza. Procurava-se sair do
ensino livresco para a experimentação. No seculo XVIII, o papel educativo do museu já
existe mas é limitado
Durante o século XIX os museus e a escolas acompanham a trajectória de afrimação e
autonomia da pedagogia e educação como disciplinas científicas. Nessse processo a
crianção é colocada no centro do sistema . Durante o seculo X são criados inúmeros
museus públicos. Museus etnográficos, antropológicos e históricos, símbolos da
afirmação do colonialismo europeu, mas também compreendidos como instituições
educacionais. O museu como instituição pública foi é uma das ideias básicas do
liberalismo do século XIX. Casos de museus com sectores educativos: Louvre
(1880),Suerry – Inglaterra, 1883 1º museu para crianças, Metropolitan (1908), Museu
de Arte de Toledo, Ohio (1903), Museu de Belas Artes , Boston (1914).
Em Portugal o Decreto de 26 de maio de 1911 cria o serviço educativo, mas não se
passa à prática. Só virá a surgir no Museu de Arte Antiga de Lisboa (1953). O Museu é
visto como ponto estratégico, complemento fundamental para o ensino artístico e
elemento essencial da educação geral. Fez-se o Museu-Escola João de Deus, e previa-se
a criação de museus em todas escolas industriais. Em 1963, é criado o Comitê para a
Educação e Ação Cultural do ICOM e a Educação passa a ser uma função ―legitimada‖
em qualquer museu.
ESCOLAS E MUSEUS Formação geral para todos como condição de esclarecimento e
emancipação. ― Idéias de natureza humana universal, de autonomia do sujeito, de
104
Tal como em Mário Chagas utilizamos o material disponibilizado pela autora para a
reconstrução do discurso, passado as nossas reflexões para notas de rodapé.
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142 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
educabilidade humana, de emancipação humana pela razão e de libertação da ignorância
e do obscurantismo pelo saber‖. (Libâneo, 2005).
A relevância do papel da educação é uma consequencia da actividade de UNESCO: Nos
anos 50 efectuam-se vários seminários com destaque para a ação educativa dos museus.
1º Seminário Internacional em New York, 1952. Atenas, 1954. Rio de Janeiro, 1958
(parceria com o ICOM) - foi proposta a contratação de um profissional especialista na
área. Cabe a este fazer a articulação entre os serviços educativos e as escolas. Na
Europa, durante o século XX conceptualiza-se uma diferença entre o papel do
conservador e do educador.
O conservador é aquele que obteém o conhecimento legitimado no meio
acadêmico. Domina um conjunto de disciplinas específicas. ―Liberta-se da
subserviência à educação‖. (Recolhe, publica e expõe, sem simplificar os
conteúdos).
O educador passa a ser reconhecido. Afasta-se do funcionamento global do
museu. Trabalha com o objetivo de melhorar a compreensão da exposição.
A FORMAÇÃO DA POLÍTICA CULTURAL E O COMPROMISSO SOCIAL
Política cultural é programa de intervenções realizadas pelo Estado, instituições civis,
entidades privadas ou grupos comunitários com o objetivo de satisfazer às necessidades
culturais da população e promover o desenvolvimento de suas representações
simbólicas. (Teixeira Coelho). A formulação de uma política cultural por parte do
Estado é reveladora do tipo de relacionamento com a sociedade. É necessário entender o
Estado não apenas como um conceito, mas como um fenômeno histórico, resultado de
situações específicas e mutáveis. Por essa razão, nos museus não existia um
compromisso social. Os seu objectivos eram a evocação da idéia de Nação unificadora,
a busca de uma identidade nacionalcom base em práticas e propostas museológicas, e
um concepção de memória, de tradição, como um corpo consolidado de crenças, normas
e valores definidos no passado, sem projecção no presente e muito menos no futuro. A
prática museal na esfera da educação era caracterizada por: uma reprodução de
conhecimentos previamente formalizados (crsitalizados) em função da investigação
(universitáris). A coleção satisfaazia a interesses acadêmicos. Os serviços educativos
não tracavam objectivos metas ou indicações, e verificava-se, regra geral uma grande
falta de autonomia e excesso de burocracia. Em 1958, de 7 a 30 de Setembro, no Rio de
Janeiro realiza-se o Seminário Regional da Unesco sobre a Função Educativa dos
Museus, em que ficou definido a necessidade de desenvolver os serviços educativos nos
diferentes tipos de Museus ajudando a objectivar conceitos abstractos dos currículos
escolares.
Definiram-se vários tipos de exposições:
• Ecológica (os objectos são apresentados como estavam no seu meio natural ou
cultural de origem)
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143 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
• Exposição polivalente (exposição geral adaptada a um nível médio de visitante,
mas que não poderá decepcionar quem pretende mais informação)
• Exposição especializada (exposições que correspondam aos vários níveis de
visitantes)
• Exposição polivalente e ambiente sonorizado (deve ser aplicado
preferencialmente a exposições temporárias educativas para não incomodar o
visitante, ou, nas outras, restringi-lo a alguns dias e algumas horas)
Em 1969, o Ministério da Educação e Cultura (no Brasil) , através da Portaria
Ministerial número 653, de 10 de setembro de 1968, cria uma comissão para fazer o
levantamento da situação dos museus nacionais, a fim de estudar a criação de serviços
educativos. O grupo de trabalho era composto por: 1 antropólogo, 5 conservadores de
museus, 3 técnicos de educação, 1 professor universitário, 1 professor secundário, 1
professor universitário, membro do Conselho Federal de Cultura e os objectivos foram:
1- Levantar a situação dos museus nacionais; 2- Estudar a criação de serviços
educativos nos museus, 3- Elaborar um projeto que contivesse diretrizes para criação ou
desenvolvimento dos setores educativos dos museus. O justificação foi os ―Museus – o
museu-tesouro está se convertendo em museus educativos. 90% dos museus dos
Estados Unidos da América do Norte têm programas educativos. Vale citar o êxito do
museu educativo do México. Nos países em vias de desenvolvimento, o museu é
considerado instrumento de cultura popular. Exemplo: o Museu Nacional de Niamey
(Nigéria). As atividades culturais podem depender diretamente do Ministério da
Educação nacional ou de um ministério especial. O essencial é a existência de uma
política cultural e uma política de lazeres correntes e que sejam estritamente
coordenadas com a educação na escola e fora dela. A enquete da UNESCO sobre o
papel do fator humano no desenvolvimento dos países recentemente independentes
mostrou a importância da tal integração‖. Em 1969, também é aprovado, pelo MEC, o
Parecer no 971 / 69 que irá normatizar a implantação de Cursos de Museologia, no
País.Em 1969, é criada a Am ICOM-Brasil – Associação de Membros do ICOM-Brasil,
que irá ser oficializada em 1972.
Como resultados destes percurso podemos afirmar que o Museu é considerado como um
agente educativo, em todos os períodos. Talvez possamos afirmar que a educação é o
referencial básico adotado, em todos os momentos, no sentido de justificar a existência
da instituição e sua relação com a sociedade. Entretanto, na análise dos pontos críticos
apontados, desde 1969, há registros da falta de setores educativos nos museus, de
carência de pessoal para atuar no setor, da falta de interação entre os órgãos da Cultura e
da Educação, da falta de intercâmbio entre os museus e as escolas e da necessidade de
cursos para os professores, com o objetivo de capacitá-los para o trabalho com os
museus e com o patrimônio, bem como da carência de bibliografia específica sobre o
tema
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144 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
PEDAGOGIA - NÚCLEO TEÓRICO – características comuns: Acentuação do poder
da razão – atividade racional, científica e tecnológica – objeto do conhecimento –
pensar com autonomia e objetividade contra todas as formas de ignorância e
arbitrariedade; Conhecimentos e modos de ação, deduzidos de uma cultura universal
objetiva, comunicados às novas gerações e recriados em função da continuidade; Os
seres humanos possuem uma natureza humana básica – direitos básicos universais;
Educadores representantes legítimos dessa cultura. Ajudar os alunos a internalizarem
valores universais – racionalidade, autoconsciência, autonomia e liberdade –
intervenção pedagógica direta, esclarecimento de valores em âmbito pessoal
As críticas à Razão como instrumento de dominação são: Abafam-se o sentimento,a
imaginação, a subjetividade e a liberdade; Questão problemática: separação entre razão
e sujeito, entre o mundo científico e o mundo da subjetividade; Conseqüências da
Grande acumulação de conhecimentos científicos e tecnológicos comcConstituição de
campos disciplinares isolados, fragmentados, ignorando o conjunto de que faz parte e a
perda de significação onde a própria sociedade reproduz essa fragmentação, dissociando
a cultura, a economia, a política, o sistema de valores, a personalidade. A museologia e
a educação são também construções humanas.
D- MUSEOLOGIA E EDUCAÇÃO EM CONTEXTO PÓS-MODERNO
Nesta altura foi efectuada uma proposta de reflexão em grupo sobre como é que o
património cultural pode ser utilizado como recurso educativo?.
As várias respostas, abordaram questões que oscilaram entre a emrgência de redes que
potencializam os recurso e as tecnicas105
ou daquilo que poderia um ―aumento da
vantagem competitiva da sociedade‖ através da criação dum DNA cultural, derivado do
processo de exteriorização dos insdividuos e dos grupos‖106
Foi um ponto de partida para a abordagem do tema seguinte “MUSEOLOGIA E
EDUCAÇÃO num contexto “pós-moderno”. Segundo Maria Célia, a sociedade
caracteriza-se por um conjunto de:Mudanças no processo de produção industrial –
avanços científicos e tecnológicos, mudanças no perfil da força de trabalho, e
intelectualização dos processos produtivos; pela emergência de novas tecnologias da
informação; por mudanças na forma de fazer políticas – novos movimentos e sujeitos
sociais, novas identidades sociais e culturais; e por mudanças nos paradigmas do
conhecimento – não separação entre sujeito e objeto, construção social do
conhecimento, caráter não absolutizado da ciência, acentuação da linguagem.
Na ciência tem-se vindo a acentuar o ―buscar critérios de restabelecimento da unidade
do conhecimento – princípios da integração – onde os saberes eliminam as fronteiras e
comunicam-se entre si‖. Isto tem por base: Não há uma natureza humana universal –os
sujeitos são construídos socialmente, formam a sua identidade, são construtores de sua 105
O património é um processo em construção que resulta da interacção do meio ambiente, das
técnicas (do saber fazer e do saber) e das características do artefacto. 106
Comentário do Pedro Cardoso
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vida pessoal e podem operar um papel transformador. Na esfera da Educação, os
educadores devem ajudar os estudantes a construírem seus próprios quadros valorativos,
a partir dos contextos das suas próprias culturas, não há valores universais. Valores a
serem cultivados no grupo: diversidade, tolerância, liberdade, criatividade, emoções,
intuição. Isto conduz que a Escola e Museus são concebidos como um sistema aberto,
em permanente relação com o meio, diminuindo a distância entre a educação formal e a
não-formal107
.
O ensino formal ou institucional é que decorre do sistema de ensino. O ensino108
não-
formal é o ensino que não faz parte do sistema educativo institucional, mas é organizado
de forma sistemática, planificada em função de objectivos educacionais determinados,
mas não confere nenhum grau académico. O Ensino Informal ou educação ao longo da
vida é onde o indivíduo adquire conhecimentos a partir das experiências do quotidiano e
dos recursos que lhe estão próximos (definição de Pastor, 2004).
Estas aquisições, que Maria Célia reporta como definitivas foram incorporadas no
pensamento pelo movimento da ―Educação Nova‖. A ―Educação Nova‖ começa a
desenhar-se a partir do pensamento de Rousseau (1712-1778). A escola de Decroly
(1871-1932) preconizava uma ―Educação Nova‖ a partir das experiências vivenciais,
quando o ensino não-formal foi bastante explorado. Jonhn Dewey (1859-1952), com a
utilização do ―método-problema‖, colocando a tónica na dimensão social da educação.
A metodologia de projecto tinha uma tónica fortemente sociabilizante e valorizava
sobretudo o ―aprender a fazer ― e o ―aprender a ser‖. Célestin Freinet (1896-1966)
pretendeu estabelecer, também, uma continuidade entre o meio envolvente e a Escola.
Paulo Freire (1921-1997) rejeita uma ―concepção bancária da educação‖, conciliando a
humanização, o diálogo, o respeito, a democracia e a educação. Defende a educação
―problematizadora‖ e o conhecimento como um processo construtivo: “A educação
problematizadora, de carácter autenticamente reflexivo, implica um constante acto de
desvelamento da realidade. ― O construtivismo freireano defende que todos podem
aprender e todos sabem alguma coisa que contribui para a construção do seu saber.
Educação como acto político.
No século XX a EDUCAÇÃO torna-se PERMANENTE E SOCIAL. O traço mais
original é o deslocamento do enfoque individual para o social, para o público e para o
ideológico. A aprendizagem ocupa toda a vida.
A BUSCA DE UMA PÓS-MODERNIDADE PROGRESSISTA E CRÍTICA, é feita
atrvés das PROPOSTAS POLÍTICO-PEDAGÓGICAS – Paulo Freire, 1992. As
premissas são as seguinte: Esperança na construção ―de uma sociedade que seja menos
107
Qual é a função do museólogo nesta quadro. É preciso construir novas propriedades. Por
exemplo o acervo institucional é o que se compra, o acervo operacional é o se mobiliza para as
práticas do museu. 108
Neste âmbito seria preferível conceituar como educação. A distinção entre ensino e educação
pode ser útil para precisar os significados e os processos. Ensino, têm a ver com a lógica da
construção de um ―currículo‖ de um caminho, que é essencial no Âmbito dos sistemas
educativos. Educação, tem um sentido mais lato, de tomar conta de, ajudar a percorrer.
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perversa, menos discriminatória, menos racista, menos machista, que a sociedade que
temos agora‖. Batalha por uma sociedade mais justa e democrática – solidariedade,
coletivismo, diálogo como pedagogia, o respeito à diferença, à valorização do saber
popular, a ética, o repúdio a todas as ditadura, a criticidade ativa docente e o
conhecimento problematizado. Ou seja é a concretização do que foi negado pela
modernidade às camadas poplares. O ― RECHAÇO DO ABSOLUTISMO DA RAZÃO
TÉCNICA-ECONÔMICA – INSTRUMENTAL QUE ATROFIOU AS
POSSIBLIDADES DE ―HOMINIZAÇÃO‖. (Gadotti, 2005).
No Relatório da UNESCO EDUCAÇÃO DO FUTURO (Jaques Delors , 1998), define-
se educação como : Aprender a conhecer, Aprender a fazer, Aprender a viver juntos,
Aprender a ser, Cidadania, Planetaridade, Sustentabilidade, Virtualidade, Globalização,
Transdisciplinaridade , Dialogicidade, dialeticidade .
Neste contexto é necessário reflectir sobre o Papel da MEDIAÇÃO . E essa mediação
torna-se necessário reflectir sobre o lugar da Educação e do Museu109
. ―Num mundo de
mudanças confusas e incontroladas, as pessoas tendem a reagrupar-se em tono de
identidades primárias: religiosas, étnicas, territoriais e nacionais‖ (Castells, 2002).
Nos espaços sociais multiculturais, vão ser geradas as dinâmicas e os processos de
mediação. A renovação e a negociação estão no cerne de uma sociedade que é
multicultural, é inter e transcultural.A mediação também é entendida como uma
plataforma de entendimento das várias subculturas. (Azevedo, 2003). ― A mediação
seria, efetivamente, um meio de aproximar pontos de vista, agitar as certezas, e de
dissipar mal-entendidos(...) espaço terceiro entre duas partes que permitem que os
cidadãos cooperem para criar dia a dia a democracia‖. (Jean-François, 1995).
Para finalizar foram colocadas para reflexção as seguintes questões:
Quais são os limites da acção museológica?
Qual a relação entre a museologia e a tecnologia?
Que serviços o museu pode prestar á comunidade?
Sinteticamente concluiu-se que o museu é um local do mundo, o museu não pode
resolver tudo, mas que tem um papel de futuro porque se encontra inscrito na matriz
identitária das comunidades. O facto de ser capaz de construir relações informais com
todos os membros confere-lhe um papel relevante neste futuro.
109
O Museu torna-se um centro de referência da comunidade. É um espaço de produção de
conhecimento, um espaço da valorização da memória, e um espaço de construção de novos
projectos de identidade. Os museus trabalham, com Projectos Museológicos, Com Acções
Museológica e com Projectos Político Pedagógicos. A gestão museológica deve estabelecer os
objectivos e a missão que o museu deve alcançar a partir de diversos sectores e da sua relação
com a comunidade. Para isso deve conhecer os procedimentos e as técnicas da museologia. O
museu deve estabelecer uma ética de confiança com escolas, com empresas, com universidades
e com outros museus.
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3.7.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA
SANTOS, Maria Célia (1999) PROCESSO MUSEOLÓGICO: critérios de
exclusão, Texto apresentado na II Semana de Museus da Universidade de São
Paulo, realizado no período de 30 de Agosto a 03 de Setembro de 1999.
Em Processo Museológico: Critérios de exclusão Maria Célia faz uma reflexão
sobre a exclusão dentro da instituição museal e sobre os seus processos. Sendo a
acção museal um processo de comunicação, mediado por agentes que efectuam
escolhas, a sua preocupação é revelar de que forma a consciência dessa exclusão
pode ajudar-nos a melhorar a consciência do trabalho sobre o património e sobre as
memórias. O processo museológico como acção de aproximação do real social deve
reflectir as tensões, os antagonismos e os conflitos existentes.
Na sociedade existem exclusões e as exclusões derivam das desigualdades sociais.
A pobreza é um factor gerador de exclusão. Não se trata apenas da satisfação das
necessidades básicas, é necessário compreender igualmente que as pessoas em
situação de pobreza também são excluídas do acesso a bens de cultura . Sendo a
cultura uma vantagem social, é necessário interromper este ciclo de exclusão social
no acesso dos cidadãos à cultura.
Mas exclusão também acontece dentro da instituição museal, entre os seus técnicos
e entre as várias instituições. Sendo a museologia uma disciplina que se baseia na
comunicação, em muito do museus verifica-se que os saberes e as instituições não
dialogam entre si, que não interagem criando ou discutindo projectos comuns. Essa
é também uma forma de exclusão por via do convencimento da ―superioridade
absoluta do saber‖. Diz Célia ― Estamos assumindo, neste trabalho, a definição de
fato museal como a qualificação da cultura em um processo interactivo de acções
de pesquisa, preservação e comunicação, objectivando a construção de uma nova
prática social.” (pag 3)
Ou seja ―Na organização e gestão dos nossos museus ou dos projectos desenvolvidos
em nossa área, ou em relação a outras áreas do conhecimento, percebe-se que os sujeitos
envolvidos são considerados como categorias estanques, onde a cada um cabe a tarefa
de executar as acções previstas e pensadas por algumas ―cabeças iluminadas‖, pois, em
geral, estão excluídos do momento da concepção, da definição dos objectivos e metas
do plano director da instituição, se é que eles existem, ou sequer foram ouvidos e
devidamente esclarecidos sobre o plano de acção a ser executado. Não há espaço para
contribuição do grupo, para troca, para o enriquecimento mútuo, para a crítica salutar,
porque a nossa pobreza política não nos permite ver além dos nossos interesses e do
nosso próprio umbigo. Além disso, a nossa pobreza socioeconómica é utilizada para
justificar a acomodação, estagnação, e a ausência de acções criativas que apontem para
as soluções dos nossos problemas. (ib idem)
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148 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Esta opacidade e estanquicidade excluem a participação e a cidadania. E necessário que
na perspectiva de Maria Célia, o processo museológico é essencialmente um processo
educativo, com aprendizagens partilhadas.
Os desafios que Maria Célia lança para o debate, bem como a suas perspectivas situam-
se a vários níveis. O primeiro, ao nível das avaliações dos indicadores não só da
qualidade formal, mas igualmente pela qualidade política, que Célia define como o
―desafio educacional no sentido de conceber futuros alternativos para a sociedade‖ e
acrescente ― a nova matriz de poder mundial que necessitamos construir colectivamente
deve suplantar, tanto a perspectiva dicotómica, quanto a visão unidimensional na
política e na sociedade, cedendo lugar a uma orientação multidimensional ou
multiparadigmática com crescente conteúdo cultural e uma estratégia equitativa de
acção baseada na participação democrática (pag 6).
A acção democrática, de participação cidadã, é essencial para a preservação da
identidade. É esse património comunitário, que Célia refere como ―essencial‖ que deve
ser alocado para o desenvolvimento social.
Outro dos desafios de Maria Célia revela-se na gestão das instituições museológicas.
Nelas deve ser fundamental a compreensão de que a construção de conhecimento é um
processo. Como tal cada instituição teve momentos próprios e agentes que actuaram de
acordo com determinados contextos, produzindo determinados conhecimentos,
partilhados ou não com a comunidade. Pelo facto de ser um processo, é necessário que
cada momento deve ter a produção correspondente, o que obriga cada agente a estar
preparado para enfrentar os desafios que se lhe colocam. E neste domínio a formação
dos agentes é determinante.
Em suma, conclui Maria Célia, na instituição museal as escolhas estão sempre
presentes. As exclusões fazem parte desse processo. A participação e a mobilização da
comunidade é a chave que permite calibrar o processo museológico.
SANTOS, Maria Célia (2007) OS MUSEUS E A BUSCA DE NOVOS
HORIZONTES, Texto a ser apresentado no IIII Fórum de Profissionais de
Reservas Técnicas de Museus, a ser realizado em Salvador-BA, no período de
18 a 22 de Novembro de 2002, organizado pelo Conselho Federal de
Museologia – COFEM e Conselho Regional de Museologia, 1a. Região –
COREM-BA.
Neste texto Maria Célia procura reflectir a partir da sua acção museológica em
interacção com os agentes no interior e exterior do museu, para partilhar o seu
conhecimento sobre a acção educativa nos museus, ao mesmo tempo que procura
contextualizar esse conhecimento na âmbito da reflexão geral da museologia.
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149 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
O ponto de partida para o despertar museológico advém do património cultural.
Toda a acção museológica se baseia na acção do homem sobre o ambiente, sobre o
território interagindo com os outros. Há portanto uma totalidade patrimonial que é
mobilizável. Ao longo dos últimos anos verificou-se uma ampliação do conceito de
património, que Maria Célia relaciona com a emergência de novas categorias de
museus (ecomuseus, museu de vizinhança, museu comunitário) abertos à
comunidade e aos problemas dos territórios. Esses processos de musealização
fizeram introduzir no debate muitas soluções criativas, muitas formas inovadoras de
resolução de problemas museológicos.
Existem um conjunto de procedimento museológico básicos (preservar, investigar e
comunicar) mas que não esgotam a totalidade e o alcance da acção museológica. A
museologia não é uma técnica de procedimento padronizado, nem é uma técnica que
age acriticamente sobre o património. Para além da sua componente formal,
verifica-se uma componente política, que implica a reflexão sobre a forma de
aplicação da museologia. `necessário que a acção museológica tenha uma
componente educativa. O processo museológico deve ser entendido como uma
acção que transforma.
Enquanto acção educativa a acção museológica pode também ser caracterizada
como uma acção de comunicação. O processo de comunicação está presente em
todos os momentos da acção museológica
―Portanto, considero que o trabalho dos museus com a comunidade, ou seja, com os
grupos com os quais estejamos realizando projectos, em relação, construindo na
troca, no respeito mútuo, é o resultado das concepções de Museu e de Museologia
que adoptamos. Pesquisa, preservação e comunicação, em interacção,
questionadas e problematizadas, deverão ser, pois, os vectores no sentido de se
produzir conhecimento, assumindo o compromisso de contribuir com a construção
de uma sociedade ética, mais equitativa e solidária” (pag. 6)
De seguida Maria Célia apresenta um conjunto de casos e experiencias
profissionais: as acções museológicas no Colégio Estadual do Governador Lamato
Júnior Museu Didáctico de Itapuã. A partir destes casos a autora parte na busca de
―novos horizontes‖. A sua partilha sintetiza-se da seguinte forma:
A ampliação do conceito de património e a sua aplicação a partir da relação homem-
património cultural são referenciais básicos para a acção museológica. De seguida, a
acção museológica entendida como um processo é que alimentou e ampliou o
alcance dos projectos; a articulação constante e o diálogo entre o saber científico e o
saber popular permitiu igualmente ampliar o impacto das acções e projectos; que os
novos processos de participação permitem a emergência de novos tipos de museus;
os museus são instituições que se abriram ao mundo e aos problemas do mundo; a
preservação do património é um elemento catalisador da acção comunitária; que
assumir a musealização como um projecto de intervenção e de conhecimento é uma
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acção transformadora; o dialogo entre diferentes tipos de museus é produtivo, e
finalmente é necessária ma constante pratica de reflexão sobre a acção museológica.
Nesses novos paradigmas de intervenção a acções museológica, no âmbito da
participação da comunidade propícia a diversidade cultural e o diálogo entre
diferentes sectores da sociedade. ―Museus são como colecções de pedaços de vida‖
SANTOS, Maria Célia (2007) ―Os Museus e seus Públicos Invisíveis‖ Texto
apresentado no I Encontro Nacional de Rede de Educadores de Museus e
Centros Culturais, realizado no Rio de Janeiro, na Casa de Rui Barbosa, nos dias
17 e 18 de Setembro de 2007.
Neste artigo de Maria Célia serve de base às ideias apresentadas no seminário. (A).
A preocupação fundamental do artigo é reflectir de que forma o invisível se pode
tornar real pelo desenvolvimento de processo de participação da comunidade no
âmbito da actividade educativa dos museus. Existe efectivamente um risco de
cegueira por parte do conhecimento científico se estiver deslocado da realidade.
Principalmente do conhecimento científico no âmbito das ciências sociais.. Sendo
esta cegueira naturalmente humana, o reconhecer a sua emergência é uma forma de
nos precavermos, dos museus se precaverem contra ela. O que implica uma visão
crítica da acção do museu. Para isso há que igualmente que ultrapassar as
armadilhas da nossa racionalidade e da compartimentação dos nossos
conhecimentos. “os critérios para selecção dos acervos a serem expostos nos
museus, tendo como referencial a racionalização da civilização ocidental, a
compreensão equivocada de que o museu é uma instituição à qual devemos nos
adaptar, como se fosse uma ilha tranquila imune às influências das dimensões
social, económica, cultural, ambiental e político-institucional, de que a
“salvaguarda” dos acervos é a principal missão da instituição, de que a acção
educativa é um corpo de regras estabelecidas que é denominada de “metodologia
da educação patrimonial”, só para citar alguns, colaborou para o nosso
conformismo cognitivo, para a nossa ilusão racionalizadora e, consequentemente,
para nossa dificuldade de olhar o invisível, de realizar a nossa autocrítica e criar
novos paradigmas” (pag3)
Para ultrapassar as possibilidades das acções do processo museológico decorrerem
fora das necessidades da comunidade, há que tomar consciência de que o processo
museológico é um processo de comunicação, com interlocutores. E é essa riqueza,
esse potencial de comunicação que o museu têm que aproveitar para se inscrever no
campo da acção cultural da comunidade.
Maria Célia propõe uma listagem de itens (apresentado ‖, Chistoper Day (2004:192) em
―A Paixão pelo Ensino) ―que, considero, podem contribuir, também, para a melhoria
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151 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
das nossas relações pessoais e profissionais, e, consequentemente, para aprimoramento
da actuação da instituição museu:
Objectivos partilhados – Sabemos para onde estamos indo;
Responsabilidade em relação ao sucesso – Temos de obter êxito;
Colegialidade – Estamos trabalhando juntos;
Melhoria contínua – Podemos ser ainda melhores;
Aprendizagem para toda a vida – A aprendizagem é para todos;
Correr riscos – Aprendemos experimentando novas coisas;
Apoio – Há sempre alguém presente para ajudar;
Respeito mútuo – Todos têm algo a oferecer;
Abertura de espírito – Podemos falar sobre as nossas diferenças;
Celebração e humor – Sentimo-nos bem com nós mesmos.
A atitude de participação deve estar em todos os sectores do museus e em todos os
momentos da sua actividade desde o planeamento até à avaliação.
De seguida a autora aborda alguns contextos profissionais que a fizeram reflectir sobre a
necessidade de envolvimento e participação de todos os profissionais dos museus e da
comunidade no âmbito dos processos museológicos. Experiências realizadas no Museu
de Arte Sacra da UFBA, no Centro Histórico de Salvador, no Museu Sacaca de
Desenvolvimento Sustentável, no Museu Nacional de Cultura Afro-brasileira. Em
conclusão a autora remata com a conclusão de que o sector educativo não é uma
metodologia que pode ser usada como técnica acriticamente aplicada. E reforça a ideia
de que a acção educativa é a essência do trabalho museológico e da instituição museu
(pag. 14)
SANTOS, Maria Célia (2001) ―MUSEU E EDUCAÇÃO: conceitos e métodos‖:
Artigo extraído do texto produzido para aula inaugural 2001, do Curso de
Especialização em Museologia do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP,
proferida na abertura do Simpósio Internacional ―Museu e Educação: conceitos e
métodos‖, realizado no período de 20 a 25 de Agosto.
O texto de Maria Célia analisa as relações entre os conceitos de educação e processo
museológico no seu aspecto de produção de conhecimento e na produção de projectos
conjuntos, de base patrimonial, para o desenvolvimento em instituições museais ou
escolares.
A autora aborda em primeiro lugar as relações entre o processo museológico e a
educação. O ponto de partida da sua visão de educação é a de que se trata igualmente
dum processo.
“O termo processo, que também será utilizado quando da discussão da
aplicação das acções museológicas, está sendo considerado em sua origem
latina, ou seja: acção de avançar, actividade reflexiva que tem como
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152 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
objectivo alcançar o conhecimento de algo110
, sequência de estados de um
sistema que se transforma. Assim, educação significa reflexão constante,
pensamento crítico, criativo e acção transformadora do sujeito e do mundo;
actividade social e cultural, historico-socialmente condicionado” (pag 2)
Com base nesta definição de processo de produção de conhecimento, verifica-se um
campo de identidade no objecto entre a educação e a museologia. Esta interacção dos
dois campos do conhecimento é tanto mais legitimo quanto nas ciência de hoje se
privilegia o dialogo interdisciplinar como forma de abertura às realidades do mundo “
no sentido de transformar a extensão em acção, acreditando que é possível construir
conhecimento na troca, na relação entre o ensino formal e o não-formal, no respeito à
experiência e à criatividade dos muitos sujeitos sociais que estão fora das academias e
que podem nos indicar caminhos e soluções muitas vezes por nós despercebidos, os
quais, também, serão enriquecidos a partir das nossas reflexões e do conhecimento por
nós produzido.” (pag, 3).
Tal como a museologia após a década de setenta, após a Declaração de Santiago, a
educação também sentiu a necessidade duma abertura ao meio como forma de aumentar
a implicação dos vários sujeitos no processo no desenvolvimento da sua acção. A
mobilização destas duas áreas de conhecimento é feita no âmbito do ―referencial do
património cultural “considerando que este é um suporte fundamental para que a acção
educativa seja aplicada, levando em consideração a herança cultural dos indivíduos,
em um determinado tempo e espaço, considerando que as diversas áreas do
conhecimento não funcionam como compartimentos estanques, mas são parte de uma
grande diversidade, que é resultado de uma teia de relações, em que cultura, ciência e
tecnologia em cada momento histórico, são construídas e reconstruídas pela acção do
homem, produtor de cultura e conhecimento.” (pag 3)
E também necessário ter em consideração que a escola, é ela própria um património
cultural onde a tradição convive com o processo de construção da mudança. Mas o
papel da museologia no âmbito da educação pode ir ainda mais longe, pois ao trabalhar
sobre as heranças, sobre os saberes e fazer patrimoniais, pode aloca-los à escola, e dessa
forma contrabalançando a função de reprodução de saberes produzidos exteriormente à
comunidade.
Após a abordagem das áreas de convergência entre a educação e a museologia, bem
como os contributos que ambos podem potenciar por desenvolverem um processo inter-
relacionado, Maria Célia passa pela abordagem do ―processo museológico e da acção
educativa como acção de comunicação. No âmbito da abordagem teórica da nova
museologia, todos as acções base (pesquisa, preservação, comunicação) são vistas como
um acto de comunicação.
110
Japiassú, Hilton. Dicionário Básico de Filosofia / Hilton Japiassú, Danilo Marcondes. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Ed.,1996.
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153 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Depois de abordar as razões porque considera as funções museológicas como acções de
comunicação, adverte que a acção museológica não se esgota nas técnicas e na mera
aplicação da técnica pela técnica. Ora, para que a museologia tenha uma função social é
necessário que ela use o património cultural e se vincule ao exercício da cidadania. E a
acção educativa é uma das possíveis formas da museologia realizar esta sua vocação.
“Assim como na educação, o processo museológico é compreendido como
acção que se transforma, que é resultado da acção e da reflexão dos sujeitos
sociais, em determinado contexto, passível de ser repensado, modificado e
adaptado em interacção, contribuindo para a construção e reconstrução do
mundo. Daí, o sentido de associarmos o termo processo às acções de
musealização, compreendido como uma sequência de estados de um sistema
que se transforma, por meio do questionamento reconstrutivo, e que, ao
transformar-se, transforma o sujeito e o mundo. A utilização do termo
processo permite atribuir, portanto, as dimensões social e educativa à
Museologia.‖
Ou seja, em conclusão o processo museológico assim abordado é simultaneamente um
processo de educação e comunicação. Nesta abordagem o processo museológico é um
processo de participação da comunidade na reconstrução das suas próprias memórias.
De seguida descreve um conjunto de objectivos que a museologia, enquanto produção
de conhecimento em conjunto com a acção educativa e enquanto processo de
comunicação deve atingir: um processo de apropriação do património, um processo de
preservação do património, um espaço de participação dos cidadãos, um espaço de
democracia, um espaço de lazer transformador.
Finalmente efectua um conjunto de sugestões de estímulo à prática museológica como
forma de ampliar a reflexão e a prática neste domínio. Tais sugestões resultam duma
abordagem com muitos anos de prática e com uma preocupação de formação de agentes
e técnicos de educação museológica.
SANTOS, Maria Célia (2000), ―MUSEU E COMUNIDADE: uma relação
necessária‖1 Texto a ser apresentado na 13
a Reunião Anual do Instituto
Biológico, a ser realizada em São Paulo, no período de 6 a 11 de Novembro de
2000., 20 pag, com bibliografia
E um texto onde a autora reflecte o projecto ―Preservar a Escola Preservar a Vida‖,
realizado em 1997 pelo Museu Didáctico de Itapuã, na Cidade de São Salvador no
Brasil. As linhas gerais do projecto e os seus resultados foram apresentados no
seminário.
O texto está dividido em duas partes. A primeira reflecte do ponto de vista teórico a
emergência da acção educativa no âmbito da nova museologia, situa os seus
principais fundamento teóricos e os documentos de referência. A segunda parte do
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154 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
texto apresenta o projecto, assumido aqui como um ―caso exemplar‖ de intervenção
do museu na comunidade através dum projecto educacional com base na ideia de
―preservação‖ e de que como a partir dessa ideia são desenvolvidas as restantes
componentes da acção museológica: investigação e comunicação integrando a
comunidade e o território.
Numa abordagem do contexto histórico da relação do museu com a comunidade, a
autora cita os exemplos americanos, que procuram tornar os museus mais dinâmicos
através da oferta de um conjunto de serviços especializados, essencialmente
relacionados com o objectivo de aumentar a atractividade do museu, reflectido no
número de visitantes.
“Buscava-se, nos moldes dos Museus Norte-Americanos, tornar os museus
“dinâmicos”, oferecer serviços, programas como cursos, palestras, projectos com
as escolas, etc. Esses programas, na maioria das vezes, estavam relacionados
com a nossa ansiedade no sentido de justificar a existência da instituição junto
aos órgãos responsáveis por sua manutenção, com o aumento do número de
visitantes” (pag 2)
Esta relação simples, de utilizar o indicador visitantes como medida de avaliação, à
medida que avançam a reflexão teórica da relação com o público e com a comunidade
vai sendo alterada. A nova museologia é uma das correntes da museologia que mais
contribuiu para essa alteração.
Desde 1958 que nos encontros do ICOM que a questão do papel social dos museus e em
particular o seu papel pedagógico é tratado como um sinal da necessidade dos museus
alterarem os seus procedimentos para um melhor acompanhamento das alterações da
sociedade. Em 1971 a IX Conferência do ICOM em Grenoble discute a questão ―o
museu ao serviço do homem‖, nomeadamente na preocupação de efectuar um bom
serviço aos públicos escolares e aproveitar o momento da visita para criar situações de
aprendizagem pratica. Como se dizia na época, grandes mudanças na sociedade devem
impulsionar grandes mudanças nos museus‖. Nesse evento é reconhecida a importância
do ―neiggbourdhood museum‖ um novo modelo de museu baseado na história das
comunidade. Reconhecia-se aqui que os museus e as suas técnicas poderiam contribuir
para solucionar problemas sociais e urbanos, tal como foi apresentado por Jonh Kinar
do museu de Anacostia de Nova York.
Aqui realiza-se uma operação que vai ser determinante para a transformação do papel
dos museus defendendo-se que deveriam deixar de se tornar organizações passivas, de
recepção de objectos, para organizações activas, que participavam na comunidade e
provocavam a comunidade para vir até si. Sugeria-se a realização de exposições
temporárias, sobre os problemas da comunidade, das minorias, os problemas do
quotidiano, procurando parecerias com outras organizações locais.
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Como defendia Riviére, esta defesa da participação da população, enquanto parte
integrante da instituição, constante da Declaração de Santiago do Chile de 1972,
introduz a instituição museu no campo das organizações sociais activas.
Hoje, dentro destes princípios de inclusão da comunidade, o trabalho museológico
continua a enfrentar os mesmos desafios “É necessário esclarecer o conceito de
comunidade que estou adoptando para o desenvolvimento do trabalho museológico, no
interior do museu ou fora dele, considerando a complexidade das relações sociais nesse
mundo pós-moderno. A comunidade à qual estou me referindo pode ser um grupo de
indivíduos que, apoiado em um património, realiza acções museológicas, com
objectivos e metas definidas a partir das suas necessidades, dos seus anseios, definindo,
em conjunto, os problemas e as soluções para os mesmos, situando-os no contexto mais
amplo da sociedade” (pag 4).
Desta forma o museu encontra razões para um trabalho a favor da comunidade, com
resultados de acções concretas que aumentam o grau de satisfação de confiança, de
acção cooperativa e solidária, com reflexos no mundo da comunidade através da
melhoria dos equipamentos e dos serviços.
Portanto, considero que o trabalho dos museus com a comunidade, ou seja: com os
grupos com os quais estejamos realizando projetos, construindo na troca, no respeito
mútuo, é o resultado das concepções de Museu e de Museologia que adotamos.
Pesquisa, preservação e comunicação, em interação, questionadas e problematizadas,
deverão ser, pois, os vetores no sentido de se produzir conhecimento, assumindo o
compromisso de contribuir com a construção de uma sociedade ética, mais eqüitativa e
solidária. (ibidem)
Na segunda parte do texto a autora apresenta os resultados práticos do projecto
desenvolvido numa escola, com base na ideia de Preservação. Era um equipamento
deteriorado, onde as relações inter-pessoais estavam degradadas. Uma intervenção
autoritária da direcção da escola despoletou um movimento de revolta, aproveitado pelo
museu para desenvolver o projecto participativo. O ponto de partida do novo projecto
parte do património existente, do território envolvente e da comunidade, que aqui forma
mobilizados para uma reflexão sobre a escola e a sua actividade. A revitalização
operada na escola permitiu alterar os padrões de comportamento com a escola
GADOTTI, Moacir, ( ) Dimensão Política do Projecto Pedagógico da Escola .
Sem referência bibliográfica , 11 p.
GADOTTI, Moacir (2000) ―Perspectivas Actuais da Educação‖, São Paulo em
Perspectiva, 14, 2 pp. 3-11
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O conhecimento tem presença garantida em qualquer projecção que se faça do futuro.
Por isso há um consenso de que o desenvolvimento de um país está condicionado à
qualidade da sua educação. Nesse contexto, as perspectivas para a educação são
optimistas. A pergunta que se faz é: qual educação, qual escola, qual aluno, qual
professor? Este artigo busca compreender a educação no contexto da globalização e da
era da informação, tira consequências desse processo e aponta o que poderá permanecer
da "velha" educação, indicando algumas categorias fundadoras da educação do futuro.
AZEVEDO, Maria do Rosário Palma de Melo ( ) DINÂMICAS DE
APRENDIZAGEM NOS MUSEUS: A MEDIAÇÃO, Museu Calouste
Gulbenkian - Serviço Educativo , Sem referência bibliográfica
BENNASSAR, Maria del Cármen Fernadez , PASTOR HOMZ, Maria
Immaculda (2008): La education emocional en los âmbitos formal e no formal:
Propuseta aplicabel a una visita museisitica. In Revista Compultense de
Education, vol 19 nº 2, 347-366.
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3.8 MEMORIA, PATRIMNIO E CIDADANIA de Regina Abreu
3.8.1 Síntese Biobibliográfica
Regina Maria do Rego Monteiro de Abreu é doutorada em Antropologia Social pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro (1996), com a tese ―O historiador dos bárbaros.
A trajectória de Euclides da Cunha e a Consagração de Os Sertões‖, onde igualmente
fez o mestrado, com a tese ―Nobreza e Política no Templo dos Imortais‖. É licenciada
Ciências Políticas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
(1977) ,fez ainda o Année Préparatoire à La Recherche en Sciences Soci pela École des
Hautes Études en Sciences Sociales (1995) e uma especialização em Séjours Culture
pela Ministère de La Culture Et de La Communication (1997)
Actualmente é Professora Adjunto da Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro, Membro de corpo editorial da Anais do Museu Paulista, Membro de corpo
editorial da Musas (IPHAN) e Membro de corpo editorial da Cadernos de Antropologia
e Imagem (UERJ). Tem experiência na área de Antropologia, com ênfase em Teoria
Antropológica.
A sua produção bibliográfica é diversa. Salienta-se os seguintes Livros: ABREU, R. M.
R. M. (Org.) ; CHAGAS, M. S. (Org.) ; SANTOS, M. S. (Org.) . Museus, colecções e
patrimónios: narrativas polifônicas. Rio de Janeiro: Garamond Universitária, 2007. v. 1.
390 p. ABREU, R. M. R. M. . Memória e Patrimônio - ensaios contemporâneos. Rio de
Janeiro: DP&A editora Ltda., 2003. v. 1. 316 p. ABREU, R. M. R. M. . O ENIGMA DE
OS SERTÕES. 1. ed. Rio de Janeiro: Rocco/Funarte, 1998. v. 1000. 409 p. ABREU, R.
M. R. M. . A FABRICAÇÃO DO IMORTAL. 1. ed. Rio de Janeiro: Rocco/Lapa, 1996.
v. 1000. 200 p.
Artigos: ABREU, R. M. R. M. ; CHAGAS, M. S. . Museu da Maré: Memórias e
narrativas a favor da dignidade social. Musas (IPHAN), v. 3, p. 130-152, 2007.
ABREU, R. M. R. M. . Museus etnográficos e práticas de colecionamento: antropofagia
dos sentidos. Revista do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Rio de
Janeiro, v. 1, p. 100-126, 2006. ABREU, R. M. R. M. . Quando o campo é o património:
notas sobre a participação dos antropólogos nas questões do património. Sociedade e
Cultura, v. 8, p. 37-53, 2005. ABREU, R. M. R. M. . As coisas da casa e as coisas da
rua: ritual e memória de Euclides da Cunha. Revista do Museu da Inconfidência, Ouro
Preto, v. 1, p. 1-50, 2004. ABREU, R. M. R. M. . A Cidade das Mulheres. Mana (Rio de
Janeiro), Rio de Janeiro, v. 9, n. 1, p. 151-154, 2003. ABREU, R. M. R. M. . Entre o
Universal e o Singular, o museu - Notas sobre a experiência dos índios waiãpi no museu
do índio. História representada: o dilema dos Museus, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p. 157-
172, 2003. ABREU, R. M. R. M. . O vestido de Maria Bonita e a escrita da História nos
museus. Revista Anais do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro, v. 34, p. 24-38,
2002. ABREU, R. M. R. M. . O livro que abalou o Brasil. Os Sertões de Euclides da
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Cunha.. Littérature et Culture, Paris, v. 27, 2002. ABREU, R. M. R. M. . Síndrome de
Museus?. Série Encontros e Estudos, Rio de Janeiro, v. 2, n. 1, p. 51-68,
Este seminário ocorreu no dia 23 de Maio de 2009.
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3.8.2 Roteiro dos Seminários
O tema geral do seminário é ― Patrimônio e Cidadania: museus sociais e museus em
comunidades‖, trata-se dum um programa de Pós-Graduação em Memória Social –
UNIRIO, onde a Memória Social é o objecto de estudo. Trata-se de uma abordagem
interdisciplinar, centrada nos movimentos sociais. Nesse âmbito têm procurado
trabalhar com grupos locais, pensar sobre o museu e fazer o museu reflectir a sociedade.
A teoria da Memória Social têm origem nos trabalhos de Durkheim e do seu disciplo
Mauirce Hallvachs, que vai estudar a memória como objecto teórico. Estuda ―os
quadros sociais da memória‖ ainda dentro dum paradigma funcionalista.
Uma sociedade dispões de uma Memória que é uma representação social do ―todo
social‖. No campo social verificam-se conflitos e disputas e acções individuais que são
ou podem ser transformadoras. Essa constatação levou a uma linha de investigação da
―mudança social como objectivos dos sujeitos‖.
O Campo da Memória surge hoje ligado a duas linhas de investigação no âmbito da
museolgia: Uma linha que estuda a memória como representação social duma
sociedade, e uma outra linha, onde a autora inscreve os seus trabalhos, no museu como
local tranformador. A Memória Social pode ser usada como ―elemento funcional‖
enquanto manutenção duma linhagem, seja ela família, classe, grupo, ou como
―elemento trnasformador‖.
Na abordagem da questão da memória social podemidentificar-se três movimentos da
sua afrimação, situados em três períodos distintos :
O primeiro movimento na transição do século XIX para o XX, através da escola de
Frankfurt, onde genéricamente se efectua um alerta para o perigo da amnésia
coletiva. Cita ostrabalhos de Hannah Arendt: que afirmava ― quando o passado não
ilumina mais o futuro a humanidade caminha às cegas e se perde num presente eterno,
perda da espessura, da densidade, da profundidade do tempo‖ . Há aqui a afirmação
dum tempo primitivo, ciclico, mais próximo da natureza, perdido para um tempo
industrial, um tempo dinâmico, em flecha, sem retorno.
Um outro autor, Walter Benjamin ( que vai influenciar fortemente a escola
estruturalista) afirma que o tempo industrial é essencialmente um tempo de informação,
versus o tempo arcaico, que era um tempo essencialmente de experiencia. ―Afirma que
com a perda do sentido da experiência, prenúncio da sociedade da informação se regista
um sentido de homogeneização do tempo e achatamento do mundo ―
O mundo das experiencia é o mundo das narrativas, um mndo das vivências, um mundo
de afectos. ―São os mundos do encantamento‖. Neste âmbito a informação, enquanto
domínio da razão, opõe-se ao domínio da experiência, enquanto domínio da emoção e
espaços de narrativa. É necessário contextualizar estas reflexões ao século XIX, onde a
cidade deixa de ter espaços de contemplação para passar e ser um ―espaço canal‖, locais
por onde se fazem deslocamentos.
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160 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
O segundo movimentoo a partir da decada de 50 do século XX , onde se alerta para o
excesso da memória. Cita os trabalhos de Pierre Nora que afirma que ― as sociedades
ocidentais modernas buscam compensar a amnésia com seu oposto: tudo é
memorializável, políticas de preservação, ―lugares de memória‖. A memória torna-se
assim num local de vivência.
Finalmente o terceiro movimeto que denomina ―Convite para a Rememoração
Produtiva‖ . Cita os trablhos de Andréas Huyssen111
onde ― Excesso de memória
significa esquecimento: devemos fazer um esforço para distinguir os passados usáveis
dos passados dispensáveis / tomada de posição / memórias afirmativas, postura proativa,
nem tudo deve ser lembrado. O que eu quero que seja lembrado? Qual a posição de cada
cidadão neste debate.‖
A partir desta última reflexão, Regina Abreu vai colocar a interrogação sobre que
caminhos podemos adoptar quando trabalhamos a memória social hoje. Quais sãoos
caminhos do futuro da memória social ?
O trabalho com a memória social é um ― convite à rememoração produtiva nos aponta
para o Futuro nos libertando do Passado nostálgico‖ ou seja remomeração produtiva
implica a mobilização do futuro. Implica a construção de UTOPIAS. Implica que
remembrar está associado ao projecto colectivo para a sociedade. Implica interrogar o
que queremos que seja o futuro, o que quermos lembrar e quais são as nossas utopias ?
No final do século XX, os modelos de afirmação do Estado-Nação, baseados em
processos de autoridade centralizadora, normativos entram em declínio e tendem a ser
substituídos por processos de redes112
. É necessário tomar a memória como instrumento
do poder social e vamos assumir o que é o musealizável como afirmação da memória.
É nesta tendência que se inserem os museus sociais no Brasil e na América do Sul, de
que apresentará alguns exemplos. Nesta relação entre o movimento social e o museu
enquanto instituição implica a criação de um grande dinamismo. Principalmente em
pequenos municípios ou em regiões isoladas. Exige igualmente a ―apropriação da
instituição museal como instrumentos para reflexão e construção de novos sentidos para
movimentos sociais e populações em situação de risco social‖ e a ―Incorporação de
práticas de intercâmbio e trocas de idéias: o museu como forum e espaço de discussão‖,
ou seja o museu como construção dum espaço de cidadania.
De seguida interroga em que medida os Museus Sociais são um fenômeno
contemporâneo ?
111
Indica como referencia bibliográfica de HUYSSEN, Andreas, (2000) Seduzidos pela
Memória, Rio de Janeiro, Aeroplano Editora, 2000. Veja-se também os trabalhos de Elisabete
Jelin, autora argentina 112
Ver Castells Manuel (2003) O Poder da Identidade, Lisboa , Fundação Calouste Gulbenkian,
Vol II
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161 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Regina Abreu defende que isso é um resultado da Implosão dos antigos sistemas de
património e das mudanças nos sistemas de classificação que ordenavam o mundo dos
museus. Ou seja do tudo é património, tudo é museu, da sindrome dos museus, a opção
é inscrever os processos de musealização no âmbito da acção social. Centralo nos
interesses da comunidade. Esta situação corre também no âmbito dos processos de
evolução dos sistemas de poder. O Estado centralizador, ordenador da realidade social
esta-se a transformar em articulador e mediador social. Ainda que esse movimento não
seja visível em todo o lado, é notório a passagem para a esfera da sociedade civil de
papeis cada vez mais ativos no âmbito da intervenção social. A ideia de museu é neste
contexto uma ideia de simplificação e de sensiblização da comunidade. No processo
museológico a comunidade pode regular-se em função dos seus interesses.
Como se cracterizam os novos Museus Sociais é outra questão que Regina Abreu coloca
?
Este novos musesus sociais são museus na Primeira Pessoa, ou seja a o ―Protagonismo
dos narradores ou sujeitos dos discursos narrativos das exposições‖ é assumido através
da actuação conjunta com técnicos das instituições museais. O Museólogos,
antropólogos e investigadores e tecncicos das instituições museais actuam como
―mediadores e articuladores‖ do processo expográfico; Por outro lado, estes museus
sociais procuram uma dinamização da relação com o entorno e uma revitalização da
função social do museu;
Esta concepção dos novos Museus Sociais e a revitalização da sua função social
constroi-se a partir da construção do pertencimento dos agentes locais. a vida dos
museus sociais depende da acção dos cidadãos (sujeitos, narradores pro ativos da
memória social), são eles que manipulam todas as ferramentas . Por isso os‖museus
sociais são instrumentos activos do presente‖. Eles fomentam e e crião espaços e
debates sobre temas que afetam o cotidiano dos cidadãos.
Este novo protagonismos dos museus, esta nova missão conduz a alteração da sua
inserção na contemporaneidade. Por exemplo nas Cidades onde ―sob o signo da
velocidade converteram-se em lugares de passagem‖ (Richard Sennet – O declínio do
homem público) o museus pode assumir uma nova centralidade. ―A Modernidade
hipervaloriza a informação/novidade em detrimento da experiência/tradição (Walter
Benjamin – O narrador), o museu pode fazer a sintese entre tradição e modernidade,
tornando a tradição moderna e construindo a modernidade a partir da tradição. Os
Museus sociais também podem ser lugar de ―parada‖ onde se pode viver a
―experiência” e de tempos coetâneos (o passado pode iluminar o futuro - Hannah
Arendt)113
. Os museus podem-se tornar espaços extraordinários, por oposição aos
espaços ordinários. Nestes museus exige-se ―participantes (sujeitos pro ativos) e não
apenas visitantes‖, exige-se ―turistas com responsabilidade social” e combatem o
113
Veja-se a propósito o caso dos SESP visitado em São Paulo
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162 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
turismo predatório. Em suma os ―Museus sociais exigem cidadãos e rejeitam
consumidores‖.
Implica esta postura, naturalmente novas funções e novas atitudes do corpo técnico
nestas instituições museais. O museólogo, ou o téncico é aquele que é capaz de propor
linhas de acção ―capazes de agregar e explicitar sentimentos e demandas do coletivo‖;
de ―orientar e difundir os canais de informação existentes; ― de facilitar o acesso ao
conhecimento; ― de realizar campanhas de esclarecimento com relação a temas
polêmicos que envolvam a sociedade; de‖ buscar parcerias junto a órgãos de fomento e
empresas privadas potencialmente financiadoras; de ―estimular a socialização de
crianças e jovens no ambiente museal dentro do espírito de formação da consciência
crítica e do pensamento reflexivo; ―realizar exposições sobre trajetórias exemplares nos
campos de abrangência específicos (ciência, arte, história, entre outros) visando
despertar vocações e apontar caminhos para a ação; e de ―utilizar os recursos
tecnológicos e museográficos à disposição para entusiasmar, animar, envolver, convidar
à participação consciente e cidadã.‖
Com a construção deste nova centralidade na vida da comunidade o Museus Sociais é
concebido como um espaço de experiências onde ―de se procura ―levar o cidadão a
experimentar outras vivências além das que está habituado‖; de ver ―o mundo do
extraordinário, do mágico, do encantamento, da imaginação‖ e onde se pratica o
―Exercício da tolerância, do respeito às diferenças, do combate a todas as formas de
racismo e etnocentrismo‖
Como é que estes novos Museus Sociais se têm vindo a relacinar com a
cidade/comunidade, é a qestão seguinte que Regina Abreu aborda: Estes museus
―fomenta m a relação direta com o habitante da cidade/ morador de um bairro, região,
comunidade (não privilegia o turista ou visitante eventual); e procura ―criar programas
de visitas continuadas despertando a sensibilidade para os temas focalizados pelo
museu, sobretudo voltado para as crianças‖. Ou seja o museu social assume-se como
espaço comunitários, como espaço de ocupação dos tempos livres e como espaço de
visita. Essa postura tem como objectivo desenvolver múltipla articulações :a
solidariedade e interdependência entre o museus e a sociedade, e a ― Necessidade de
imbricação de todos os tipos de organismos preocupados com a cidade/comunidade,
públicos ou privados, instituições de pesquisa, órgãos de planejamento,
desenvolvimento urbano e preservação cultural, ongs, arquivos, bibliotecas, associações
de moradores, colecionadores, líderes comunitários, pesquisadores‖.
No âmbito da práticas museológica forma-se também o objectivo de ―trazer a
cidade/comunidade para o museu‖, através do ―Desenvolver políticas de acervo que
permitam cobrir campos estratégicos na relação cidade/comunidade-museu‖; e ―Trazer
os habitantes da cidade/comunidade (crianças e adultos) para o museu dentro de um
programa de ação continuada e interarticulada com outros setores e instituições sociais,
notadamente educacionais e científicas.‖
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163 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Em sintese o museu social é caracterizado por:
• Trabalhar noção de pertencimento;
• Formar comunidades de sentido em torno de propostas e linhas de ação;
• Entender a cidade/comunidade como campo de forças (polifonia): interfere no
debate, assume pontos de vista e os afirma.
• Não teme a postura militante.
• Museus Sociais não são espaços de neutralidade mas de políticas afirmativas.
A partir daque apresentou um conjnto de casos e exemplos:
- Museu Maguta ( a cornologia é a seguinte: 1988 – massacre de índios tikuna por
pistoleiros ligados a madereiros e latifundiários na Amazônia , 1988-1991 – lideranças
indígenas e antropólogos (CGTT): idéia de criar museu - estratégia para revigorar
identidade étnica (musealizar para não apagar, para não esquecer), Mobilização de 95
aldeias com população de 28 mil índios – recuperar antigas tradições e técnicas
artesanais em desaparecimento, Consultas a registros e fotografias feitas por Curt
Nimuendajú em 1929; consultas a anciãos das aldeias: organização do acervo ,
Dezembro de 1991 – inauguração do Museu sob forte pressão contrária das elites locais
na cidade de Benjamin Constant, Julho de 1995 – Prêmio de ―Museu Símbolo‖ do
ICOM; Prêmio Rodrigo Mello Franco de Andrade, Ação com turistas e com escolas
municipais e estaduais – museu se converte num patrimônio local com a participação
crescente de índios e da população da cidade.
-Museu da Maré114
: 1997 – criação do Centro de Ações Solidárias da Maré – jovens
formados na militância da Pastoral das Favelas / experiência da TV Maré – vídeos
comunitários exibidos em praça pública, 1988 – criação da Rede Memória da Maré,
2001 - Arquivo Dona Orosina Vieira, 2001 - Encontros e parcerias com Fundação
Oswaldo Cruz; UNIRIO; 2004 - realização de exposições temporárias da Maré no
Museu da República e outros centros culturais no Rio de Janeiro, Maio de 2006 –
inauguração do museu, resultado da ação de ativistas do Centro de Ações Solidárias da
Maré (criada em 1997) com apoio do Departamento de Museus do IPHAN, O museu é
premiado pelo Ministério da Cultura (Prêmio Rodrigo Mello Franco de Andrade e
Cultura Viva).
- Museu Kuahí : 19 de abril de 2007 – Inauguração do museu q teve como fonte de
inspiração o Museu Maguta dos índios tikuna e o museu paraense Emilio Goeldi q os
índios tinham como referência. O projeto é de 1998. Museu é resultado de muitas
articulações de pessoas e instituições: Associação dos Povos Indígenas do Oiapoque;
Secretaria Estadual de Cultura do Amapá; Programa para Populações Indígenas do
114
Igualmente apresentado por Mário Chagas
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Ministério do Meio Ambiente; IEPÉ – Instituto de Pesquisa e Formação em Educação
Indígena; Petrobrás Cultural, entre outras. Museu possui salas de exposição, reserva
técnica, auditório, arquivo, biblioteca, sala de pesquisa com equipamentos e tecnologia.
Público alvo: 5.000 índios área contínua entre Macapá e Oiapoque. Índios são formados
como gestores do Patrimônio Cultural – Projeto IEPÉ com apoio da Petrobrás. Objetivo
do museu: possibilitar mudança da percepção indígena sobre a própria produção –
objetos comercializáveis se transformam em objetos-documento. Produção de coleções
de artefatos
- A SEDE DO CRPH E CEPEMHED: UM PROJETO EM CONSTRUÇÃO. Após um
processo reivindicatório pela reforma do prédio, nos anos de 2006 e 2007, esta entrou
no orçamento público municipal de 2008. O espaço terá sala de multimídia, arquivo,
loja, poema bar, sala de exposições.
-Museu das memórias no Paraguai.
Após a apresentação destes casos colocou em debate as questões relativas a estes
Museus Sociais
• Quais os alcances e os limites desta modalidade de museu?
• Quais os desafios destes museus?
• Quais as contribuições dos museus sociais no sentido de imprimir narrativas a
favor da dignidade social?
No debate abordaram-se as questões relativas às políticas do património. Por exemplo a
relação entre a antropolgia e os nativos. Estes estudos têm-se vindo a inscrever nos
estudos sobre alteridade. Os estudos da alteridade radical (objecto de estudo são os
nativos), os estudos de alteridade próxima (estudos urbanos) e os Estudos de alteridade
mínima (estudos sobre antropologia). Se olharmos para as categorias júridicas da
constituição de 1988 origina uma mudança de categorias. Verificamos 3 conjntos: 1-
populações tradicionais, 2-indígenas, 3- Qilombos (antigos escravos) .Isto implica a
emergência de novos sugeitos que exige pensar em termos de uma socio-diversidade,
uma bio-diversidade e um desenvolvimento sustentável. O que que está a mudar no
campo do património?
Do património artístico ao património cultural
Do património de ―pedra e cal‖ ao património imaterial e património genético
(com implicação em novas política pública)
Das grandes narrativas épicas, à inclusão de novos narradores de memória social
(novos patrimónios e novos museus)
No Brasil está em curso um grande inventário e registo do acervo amplo e
diversificado (fests, rituais, danças, lendas, mitos, musicas, saberes, tecnicas e
fazeres, de expressões.O Inventário dos Registo Culturais LIVROS DE …. O
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património genético é o reconhecimento da biodiversidade, constitui uma área
de dialogo entre acultura e as ciências da natureza (biologia e botânica)
A ideia de património imaterial da UNESCO tem por base as ideias de diversidade.
Ainda subsiste a base do ideal iluminista de património como campo erudição e
civilização.
A oficina do antropologo é o património. Pode ser um local de reflexão ou um local de
acção.
Projecto da amazonia: recuperação da tecnologias de tecelagem da palmeira. Linha de
Tocum. Linha da Lealdade. A linha que não se rompe nunca. Como é possível
sobreviver na floresta sem estragar a floresta. Conceito de auto-sustentação.
Regressa-se à questãodas sociedade em rede. O Empowerment ou Empoderamento
social, tem como objectivo devolver à comunidade os saberes e a informações
necessárias para mobiliza-las na ação115
.
A importância das histórias de vida no contexto museológico é mostrar os exemplos de
outras histórias para contrabalancar os modelos dominantes. Num bairro da favela os
modelos só representam os espaços de poder. É necessário representar outros poderes.
É necessário trabalhar com a ideia de encantamento. O museu como espaço de
imaginação.
É necessário trabalhar a relação com o habitante/morador ( não se deve previligiar o
turista ou o visitante, deve-se criar condições para o integrar. É importante trabalhar
com visitas continuadas junta das crianças.
O museu social articula a natureza solidarias com as políticas de acervos. Os acervos
são estratégias que fomentam caminhos.
É necessário ter em atenção que a cidade é polifônica. O corpo social têm vários
espaços e vários campos que devem estar integrados no museu.
115
Ver Castells
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3.8.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA
HUYSSEN, Andreas ( s/d) ―Escapando da amnésia: O museu como cultura de massa‖
in Revista do Património Histórico e Artístico Nacional, s/l, pp. 35-55. (Publicado uma
tradução em Museumania-Museus de Hoje, Museus de Ontem, Porto, Fundação
Serralves, pp 162-174 (do Livro do Autor, ―Escape from Amnesia: The Museum as
Mass Medium‖ in Twiligth Memoires, London, Routledge, pp 13-35)
―Andreas Huyssen efectua neste ensaio uma proposta de explicação sobre as acções
museológicas contemporâneas. Propões três modelos explicativos de museus: O ―museu
como COMPENSAÇÃO‖, a teoria ―pós-estruturalista, ou o modelo da SIMULAÇÃO‖ e
a ―teoria criticou o modelo MIDIA (comunicação) ‖. Estes três modelos são propostos
após uma análise da evolução da sedução do museu, dos museus como ordem simbólica
e museus como vanguarda. Após estas análises entra numa reflexão sobre a pós-
modernidade, das alternativas criadas para os museus, das suas seduções e polémicas. É
a partir dessa análise que vaio propor os seus modelos explicativos.
A idade contemporânea tem questionado o papel dos museus de forma consistente ao
longo dos últimos trinta anos. Herdeiro da tradição da Revolução Francesa, o museu
começou por ―suportar o olho cego do furacão do progresso ao promover a articulação
entre a nação e a tradição, a herança e o cânone, além de ter proporcionado a planta
principal para a construção da legitimidade cultural, tanto no sentido nacional como
universal. A partir das suas fronteiras disciplinares ajudou na definição da identidade da
cultura ocidental ao desenhar as fronteiras externas e internas baseadas, principalmente
na exclusão e marginalização, assim como na codificação positiva‖ (p.33)
A questão da passagem do museu para a era da pós-modernidade, leva o museu a uma
profunda transformação. Deixa de ser um bode expiatório, como as vanguardas o
definirão como guardião das culturas velhas e obsoletas, e passa ser ―a menina dos
olhos das instituições culturais‖. Os anos oitenta são os anos das explosões dos museus,
a época da democratização da cultura, das sociedades do espectáculo, onde os museus
mais expeditos passaram a representar os seus processos culturais. Foi também o tempo
em que as colecções passaram de permanentes a temporárias. Sujeitas a re-arranjos
permanentes. São processos de adaptação dos velhos museus aos novos públicos. ―No
actual cenário do museu, a ideia dum templo com musas foi enterrada, surgindo num
lugar um espaço híbrido entre a diversão pública e uma loja de departamento‖ (pag 2).
A velha ordem do museu era um espaço simbólico da memória duma história nacional
em processo de secularização. ―uma sociedade tradicional sem um conceito teleológico
secular não precisa de um museu‖ (op.cit). Na velha ordem só existiam museus quando
o conceito se tornava histórico. Isso explica que os modernismos só tenham entrado no
museu após a sua absorção pela sociedade, pela sua instucionalização. Nessa medida, os
velhos museus representam memórias legitimadoras do passado. Essa negociação com o
passado, com a memória que é apropriada para explicar o presente. Nesse sentido o
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museu tornou-se um processo de ordenação do simbólico, no interior do qual se operam
negociações entre as várias correntes culturais, com os intelectuais vanguardista a
reclamarem e anunciarem, insistentemente, a morte dos museus.
No entanto, ao invés da morte anunciada, em plena pós-modernidade os museus,
enquanto instituições, explodiram. Multiplicaram-se e reorganizaram-se como
elementos da nova sociedade cultural, como elementos do capital cultural. De qualquer
forma, conclui o autor, a morte dos museus como foi durante grande parte do século XX
reclamada pelas vanguardas culturais, é uma questão que a realidade se encarregou de
desmentir.
Em alternativas, onde aborda a questão da relação do museu com a pós-modernidade, a
procura duma redefinição para o papel do museu Andreas Huyssen reinvoca as funções
inscritas nos museus do romantismo, enquanto narrativas ordenadas duma história,
duma cultura que se construía como base identitárias duma nação. O museu como isco
onde o passado é selectivamente ordenado, era concebido como um equipamento
essencial para a projecção dessa identidade no futuro. A base da identidade, a fonte
onde a juventude vai buscar as suas referencias essenciais como escopo da nação. A
questão deste passado ordenado, como refere Huyssen ressalta a tensão que existe entre
o desejo de lembrar e a necessidade de esquecer. A memória realiza-se numa tensão
entre a tradição e a antecipação. Ou seja o desejo de mobilizar a construção do novo
confronta-se, no lugar do museu, com a construção duma tradição. O cânone da
herança. O que é inovação sai fora do cânone. São acções deserdadas.
As vanguardas culturais (dos inícios dos anos dez até aos anos trinta, com os seus
processos de ruptura com os princípios da cultura burguesa, vão ter alguma
responsabilidade na emergência, no pós-guerra, de novas formas de organização dos
museus. Nelas sobressaem a exposição temporárias, como construção narrativa duma
realidade que está em constante transformação. Desta forma o museu transforma-se num
espaço de constante transformação, em que os objectos integram sucessivamente um
conjunto de narrativas, no seu museus ou noutros museus, como palco de um
espectáculo onde a sociedade se revê permanentemente. Esta situação, na opinião do
autor conduz a que o museu deixe de ser ―o guardião do passado‖ de objectos selectos e
escolhidos para um conjunto de eleitos, para passar a ser uma sala de espectáculos duma
cidade onde a capacidade de atracão e riqueza se mede pela sua condição de líder
cultural. Um sinal dessa espetacularização do museu surge quando nas paredes do
museu aparecem os grandes cartazes. A adesão ao espectáculo, a pressão exercida sobre
os museus para passarem a servir a industria do turismo ou as culturas dominantes,
conduz ao esquecimento das minorias e dos marginalizados. Este museus tendem a não
só representarem narrativas construídas nas expectativas de culturas dominante, como
são instituições que negam a identidade dos marginalizados pelos processos de
globalização. Ou seja ao democratizarem-se fazem-no, já não para uma elite, mas para
uma ideias elitista, maioritariamente negociada. ―É uma grande ironia que as
reivindicações de Walter Benjamim expressas como desejo de varrer a Historia, mesmo
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que a contragosto, e arrancar o conformismo da tradição, fossem ouvidas em um tempo
em que o próprio museu se entregou á cultura capitalista do espectáculo‖ (pag. 44).
De qualquer forma a pós-modernidade, com a sua aceleração do tempo e a sua ruptura
nas fronteiras das instituições acarretou inúmeras vantagens. As obras de arte têm um
percurso muito mais célere. Muitas obras entram directamente nos museus sem
necessidade de serem mediadas pelo circuito dos marchands. Os visitantes dos museus
também são eles corredores de metros quadrados museografados. Os museus também se
tornaram em lojas de sociedade de consumo, com as suas imagens a serem produtos de
merchandising. Até os próprios espaços dos museus, outrora sagrados, passa a ser
possíveis de apropriação temporária para eventos e outras manifestações ocasionais.
Essa é segundo o autor uma das grandes seduções que estes espaços de cultura
continuam a exercer sobre a sociedade. Ou seja, se existe o desejo de museu é porque
existe uma necessidade cultural que o exige.
É aí que Huyssen entra na explanação dos seus três modelos explicativos. O modelo da
“COMPENSAÇÃO” concebem a musealização como espaço central da sensibilidade
das mudanças. Ou seja o que o museu tem tendência para mostrar são processos de
mudança. São momentos, em que a história registou alterações, inovação. O tempo
contemporâneo é um tempo que tende a arrastar os objectos para a sincronia. Para a
ausência de tempo e de espaço. O museu contraria essa sensação. Compensa a
sociedade dos referenciais dinâmicos perdidos.
A homogeneidade das culturas também acarreta uma dimensão que bloqueia a
perspectiva de inivação. O velho, o cânone, a partir de certa altura funciona como uma
entropia. Numa sociedade bloqueada, a entropia toma conta dos seus processos gerando
uma sucessão de processos que bloqueiam a sociedade. A sua evolução. O museu é um
local, onde pela observação e pela sensibilidade essas entropias não se verificam. No
entanto, essa visão do museu acarreta alguns problemas epistemológicos. Os indivíduos,
nestes museus, tomam posse de memórias fragmentadas. São pedaços de memórias que
bloqueio qualquer processo de formação de identidades coerentes ou portadores da
necessária explicação de totalidade.
A teoria do museu como ―SIMULAÇÂO” assume que o museu nada mais é do que um
espetaculo. Uma encenação que não se distingue de outras formas de espectáculo. ―A
musealização e suas variantes, é para Baudrillard, uma tentativa da cultura
contemporânea de preservar, controlar e dominar o real com o intuito de esconder o
facto do real se encontrar em agonia devido `expansão da simulação‖ (pag 51). Essa
dissimulação da realidade determina a existência, no interior do museu dos objectos.
Eles cotem uma aura, que depende da sua materialidade e da sua opacidade. É esse
olhar que os transporta do passado ao presente. E esse segredo de sedução permanece
em estado de ―pureza‖, conferindo-lhes significados.
Finalmente, no terceiro modelo, o museu como Comunicação (consumo de media) ou a
teoria da Kultürgesellschaft desenvolvida pelo Jornal berlinense ― Ästhetik und
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Kummunikation”. Defendem que a ―sociedade na qual as funções de actividade cultural
crescem como uma agência socializadora, quase sempre contrária à noção de nação,
família, profissão e Estado. Especialmente nas culturas jovens ou nas subculturas‖(pag.
52). Nestas culturas as identidades são concebidas como estilos de vida. Nessas
subculturas articulam-se identidades e códigos culturais, por onde emergem forças de
criatividade e acção social. Ao contrário da harmonia romântica, a cultura urbana é
inquietante, é mobilizadora e geradores de crítica. Esta teoria, aplicada às indústrias
culturais, principalmente televisão, indica que as nossas sociedades têm um desejo
elevado de imagem. Esse desejo de imagem transforma-se numa outra necessidade, da
imagem como identidade.
Esta teoria, aplicada aos museus, recoloca a questão do ―boom2 dos anos oitenta, em
coincidência com a explosão das televisões e do mundo do audiovisual, do cabo e da
internet. O mundo como representação recoloca o museu como centro das narrativas.
Ou seja, a narrativa, ou melhor a comunicação é permanente. O input informacional é
constante e recepção é contínua. As lógicas dos museus antigos, com narrativas
―românticas‖ não satisfazem as necessidades de consumo das sociedades urbanas
críticas. O museu é o local de construção de diálogos com o tempo. Mais do que uma
simples peça de informação o museu é um ―hieróglifo histórico‖ (pag 53). A sua leitura
é um acto de memória e a sua verdadeira materialidade assume a sua aura de
distanciamento histórico e transcendência no tempo.
Nesta abordagem o objecto ganha uma nova centralidade. Ao contrário das grandes
encenações espectaculares, o museus é tanto mais memorável, quanto mais aura os seus
objectos tiveram. É a materialidade a sobrepor-se à lógica da simulação, do efémero. A
materialidade do objecto. Assim ―através da actividade da memória, colocada em acção
e nutrida pelos museus contemporâneo no seu sentido mais amplo, o olhar museístico
expande todo os espaços da cultura da amnésia reduzindo no presente (real) e programa
a obediência e o fluxo eterno de informações sincrónicas, o ―hiperespaço‖ das
informações da próxima era.‖ (pag. 54). Informacionais, da rapidez e circularidade da
informação, os espaços dos museus tornam-se espaços de reflexão e dialogo sobre essa
modernidade. ―A popularidade do museu, acredito, é o sintoma cultural principal da
crise da fé ocidental na modernização enquanto panaceia‖.
E a partir destas reflexões lança um conjunto de pistas para investigação. Por exemplo,
determinar de que forma os museus podem ajudar a superar, no espaço e no tempo, a
―ideologia insidiosa da superioridade duma cultura sobre a outra‖ (ib idem), de que
maneira ao museu se abre para outras representações, de como ele é capaz de lidar com
os problemas da narrativa das memórias dos seus projectos. Indubitavelmente, neste
modelo os museus assumem-se como locais de negociação, de busca e partilha de
identidades e projectos. ―Um espaço para transmitir, para hibridizar para viver junto sob
o olhar e a memória do espectador‖. (pag.54)
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3.9 Pierre Mayrland e a Altermuseologia
3.9.1 Síntese Biobibliográfica
Pierre Mayrland é um dos pensadores da Nova museologia. Acompanhou e contribuiu
para os debates de renovação da abordagem museológica. É membro do MINOM e
fundador dos Ecomuseus no Canadá. Actualmente vive na Carrapateira, Aljezur, onde
desenvolve actividade museológica comunitária. Desenvolveu trabalhos de investigação
na Universidade de Vitória em British Columbia, Canadá
O seu seminário decorreu no dia 22 de Maio de 2009 e foi distribuído, plano do curso
textos de apoio do Autor
O plano do curso procurou discutir a evolução conceptual da sociomuseologia, nova
museologia, eco museologia e museologia social, as suas manifestações no mundo
lusófono. O trabalho desenvolvido foi interactivo e recorreu-se a vários exemplos
práticos.
O roteiro procurou responder a um conjunto de questões previamente distribuídas.
Textos distribuídos:
―La transgression comme fontion sociale du musée: considerations liminares,
in‖coloque sur la Fontion Sociale du Musée, Cáceres Decembre 2008
Faire le point sur la muséologie social: provocation, Agosto 2008
Manuel del proceder del ecomuseo, Puntagorda-Canarias, ediciones alternativas
2009
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3.9.2 Roteiro dos Seminários
A renovação da museologia.
Pierre Mayrand defende que não há uma ―nova museologia2 mas sim um movimento de
renovação do pensamento museológico. Esse movimento inicia-se com George Henri
Riviere e prolonga-se com o seu discípulo André de Vallé. Riviere vai defender, nos
cursos de Verão que realiza em Santander, que a ―museologia é um diálogo‖
A criação do MINOM resulta da emergência do social a partir da interrogação sobre o
que é que é um museu e qual é a sua função 116
. É importante o museólogo dominar a
matriz do pensamento de renovação porque:
Permite entender a linha do pensamento museológico e a sua influência na
matriz da organização museológico;
Permite pensar o museu como local onde decorrem várias estratégia delta pelo
poder,
O movimento que conduz à criação do MINOM, encontra a sua génese na Declaração
de Santiago do Chile (ICOM/UNESCO). A declaração constitutiva é aprovada no
Quebec em 1984. Em Portugal, Francisco Nabais, introduz em 1984, no Seixal a
organização do MINOM em Portugal (Ecomuseu do Seixal). O ICOM constitui-se
como uma corrente organizada que actua dentro do ICOM. Na Unesco convivem
diversas organizações, o ICOFON ep CEAC (Comité Executivo de Acção Cultural). A
emergência do MINOM está associado a alterações sociais e alteração de valores. Isso
permitiu conceber os museus de arte como locais de mudança
O primeiro congresso internacional de museus realizou-se em 1927. Em 1948 a
UNESCO organiza o ICOM. É aprovado um código de Ética. Os grandes lobby do
ICOM são ingleses, franceses e EEUU. O MINOM procura contrabalançar as pressões
dominantes e fazer ouvir a voz dos pequenos museus de comunidade, dos ecomuseus,
do museus com preocupações sociais de desenvolvimento e cidadania.
E uma reacção que se deu nos anos oitenta, por parte dos museólogos críticos, contra a
criação de grandes museus em nome de grandes causas. Foi uma reacção à
espetacularização do museus. O MINOM procurou recuperar, para o contexto europeu,
algumas da reflexões que os museus em África, na década de 70,117
tinham concretizado
em nome do desenvolvimento da comunidade.
Nos anos 90 o MINOM têm-se posicionado contra a organização empresarial dos
museus, de museus concebidos como fábricas, locais de produção e locais de consumo.
Em síntese, a evolução da Nova Museologia é marcadas
Década de 50 – REFORMISMO - movimento reformista construtivista
116
Cadernos de sociomuseologia nº 28 faz definição de conceitos 117
Mali, Senegal Tanzânia
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172 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Década de 70 – Nova Museologia.
o Museologia empresarial na América e Capitalização do museu.
o Europa. Museologia Social e comunitária –França
Década de 80 – MINO -Minização dos museus: Ecomuseu e desenvolvimento
local
Década de 90 – Museologia Social – emergência da participação da comunidade
e do território. Palavra-chave : acção comunitária
Dois Mil – Altermuseologia ou a reformulação de Pierre Mayrland do ―Mundo
dos Outros‖ de Hugues de Varine.
A Altermuseologia é a proposta de renovação de Pierre Mayrland. É uma proposta para
ma museologia alternativa, adequada um mundo multipolar. Os pressupostos de
intervenção colocam-se que é necessário criar um mundo alternativo, um mundo que se
regule por bases diferentes das actuais. Assim se justifica a participação, por exemplo,
no Fórum Social Mundial.
Hugues de Varine costumava dizer que:‖Não há uma nova museologia. Há uma boa e
uma má museologia‖.
A museologia tem que estar aberta à vida, ao mundo. Tem que contemplar os ritmos da
sociedade. Por exemplo, o museus tem que ser um local de festa para a comunidade. O
museus é uma celebração.
Um ecomuseus, não é um museu diferente, é um museu com uma filosofia de ligação ao
território.
A museologia na cidade é uma museologia aberta à comunidade, ao mundo urbano.
Como tal têm que haver discussão, tensão, movimento. Têm que se sentir o pulsar e os
ritmos da cidade. O diferente é heterónimo.
Triangulação pensamento eco museológico
iterpretação
criação
sensibilzação
territórioecomuseu
retroacção espaço
identiário
desenvolvimento local
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O ecomuseu como desafio de representação do território
O ecomuseu como desafio de uma sociologia da mudança.
Um ecomuseu é um símbolo da comunidade mas actua como catalisador do
desenvolvimento
Transmuseolgia. Qual é o papel da existência.
O Património material está ligado á posse dos objectos. É um acto que favorece
a comemoração.
O património imaterial é comunicativo. Têm a energia do universo.118
O museu é uma forma de universalização. A comunicação está em diferente locais e em
diferentes formas. Não existe um processo de comunicação. Existem processos de
comunicação que os indivíduos escolhem. O desafio da museologia é conseguir fazer
com que os indivíduos escolham livremente.
A árvore do pensamento em museologia é uma árvore de reflexão. A reflexão é um
ritual de operações mentais.
O exemplo do museu da carrapateira, no Cachopo. Qual é a missão do museu. Fazer doa
missão do museu uma exposição temporária. Em Portugal não há muito
desenvolvimento da questão da missão do museu. Qual é o papel do museu na vida
local?
118
cadernos de sociomuseologia nº 24
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3.9.3 BIBLIOGRAFIA COMENTADA
L ‟Ecomusée dans ses raports avec la Nouvelle museologie, Dactilografado, 6
p. in (sumário de documentos de museologia, nº 7 ULHT)
Nos anos 60, os novos museus, distinguem-se dos museus convencionais pelo objecto e
pelas práticas. São os teóricos deste movimento George Henry Rivière e Huges de
Varine e suas posições no ICOM. Nova museologia, museologia social, museu integral,
ecomuseu, museus de território, são conceitos que têm origem neste movimento. A nova
museologia e a experimentação social (também à experimentação técnica) é outra
importante aquisição da museologia. Por exemplo quais são as relações entre o
Território, o Património e População. Como é que isso se relaciona com
desenvolvimento individual, o desenvolvimento colectivo e o desenvolvimento sócio-
cultural.
O ecomuseu é uma actividade planeada. Os seus conceitos e escolhas fundamentais
devem-se traduzir numa utilização mensurável, num conjunto de ferramentas de
progressão no tempo e no espaço. Deverá ter em linha de conta a estrutura (a estrutura
de representação) os objectivos e as aspirações da comunidade. O população não deve
estar mobilizada ao acaso, não se devem prosseguir motivações momentâneas. Deve-se
ter em atenção os ciclos da evolução da comunidade. O progresso deve ser
contratualizado. ―contrato social‖.
Proposta de operacionalidade do ecomuseu: Operação de observação e interpretação
regional. Composição por interpretarão do território.
Tese. O centro deixa de ser o objecto e passa a ser a pessoa.
Enssaio de uma rede de intrepretação das novas museologias
de conhecimento
e de identidade de criação de massa
de
desenvolvimento de combatepré-museologia museologia para-museologia post-museologia trans-museologia
museografia convencional
participaçõe Vs
resistencia provocação vs reacção
sensibilização vs
banalização
responsabilização vs
tarefismo
acção de risco vs
abandono
etnologia/História/
Educação Arte/Cenografia
Comunicação e Ciencias
do Ambiente
Economia/Ciencia de
Gestão
Antropologia/sociologia
Animação
ecomosue na versão
tradicional , museu de
comunidade
aproximações instalações
artísitca e experimentais
e de ambiente
muse temático de
civilização, de cienci e
técncica de eco-sistemas
e parques
ecomuseu de
desenvolvimento,
ecomuseu ecomuseu militante
museografia criativa museografia integradas
desenvolvimento + pessoal desenvolimento + colectivo
funções mais críticasfunções mais sedutoras
convencional radical
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175 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
―La transgression comme fontion sociale du musée: considerations liminares, in
‖coloque sur la Fontion Sociale du Musée, Cáceres Decembre 2008
A transgressão como função social do museu é uma pequena provocação, no sentido de
estímulo ao pensamento, sobre a necessidade de se quebrarem algumas fronteiras na
museologia. Essa necessidade está apoiada por uma pratica museológica, com cerca de
50 anos, no Canadá e noutros pontos do continente americano.
Diz Pierre Maryland “ La transgression (aller au delá de, outrepasser la norme), étan
l’un dês thémes favoris de a nouvelle mouseologie, qu’elle soit entreprenariale ou
communitaire, nous pensons que las pratiques de reseauification proximal ou éntendue,
lorsque gerées associativement et democratiquement, dans un esprit de cooperation et
de solidarité, peuvent être considérées comme l’amorce de fontions sociales et de prises
de conscience collective par tout musée. ―
Para isto o colectivo do museu deve realizar a ultrapassagem das barreiras disciplinares,
os serviços à comunidade, um permanente esforço de actualização de colecções e
exposições, a sua abordagem crítica, partilhar os bens e serviços que produzem uma
consciência produtiva.
De seguida fala dos exemplo das prática no Quebéc, em Haut-Beauce
Faire le point sur la muséologie social: provocation, Agosto 2008
Na sua provocação sobre um Balanço da Museologia Social, Pierre Mayrland afirma
que o contexto da afirmação da Museologia Social foi efectuado num contexto
sociopolítico de práticas revolucionárias, com forte pendor associativo e comunitário. É
neste contexto que se insere a proposta (feita em 2007) de desenvolver uma
altermuseologia. Os seus princípios estão inscritos dentro do movimento teórico, que se
caracteriza por ser questionador, prepositivo, de influenciar a evolução e produzir
mudança. Os seus princípios de acção estão ligados aos da educação popular e da acção
comunitária, da animação cultural e da intervenção política.
Pelo facto da museologia ser uma pratica e de na sua praxis procurar redes (formais e
informais) de desenvolvimento local, que apoiam o Fórum Social Mundial, e de que o
MINOM é um movimento que têm acolhido a expressão teórica e prática da nova
museologia, fará sentido continuar a considerar este movimento como o local exclusivo
da nova museologia. Fará sentido continuar a confundir o ecomuseus como a nova
museologia. A variedade de ecomuseus que têm surgido não são um exemplo de
necessidade de redefinir o conceito de museologia social e reivindicar um ―Nova
Museologia Social‖
Manual del proceder del ecomuseo, Puntagorda-Canarias, ediciones alternativas
2009, 45 p.
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176 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Este pequeno manual prático é elaborado para quem quer orientações profissionais para
um uso correcto das ferramentas dos ecomuseus. É um livro de boas práticas e de
referências sobre terminologia, processos, alternativas de analise. Diga-se que o autor
repetidamente defende a existência duma eco museologia.
Estrutura-se em torno de 8 capítulos e cinco anexos. A história dos ecomuseus e os seus
princípios base constituem os dois primeiros capítulos, antes de se fazer uma definição
de ―Ecomuseu‖ (capítulo 3) Os quatro capítulos seguintes abordam o processo de
conceptualização com a sistematização, a territorialização e a reedificação e criação da
marca (identidade do museu). O último capítulo aborda a questão das opções sobre a
criação da organização. É um conjunto de pontos que prepara o processo, digamos um
diagnóstico prospectivo. Dado que o ecomuseu é um processo colectivo, uma
organização aberta e participada, o processo de formação decorre dos passos seguintes,
em função das vontades expressas pela comunidade. Não existe um receituário técnico,
mas uma listagem de acções possíveis de efectuar para atingir os objectivos
Os anexos tratam da precisão conceitual, bibliografia básica, e um conjunto de chek-list
para acompanhar a implementação do processo.
―Naver Again‖ Intervervenção em Seminário (2004), 6p p.
Este texto, que acompanha a postura activa e comprometida de Pierre Mayrand, levante
um conjunto de questões sobre a Função social dos Museus e o seu papel nas sociedades
contemporâneas. É um texto polémico mas que permite reflectir sobre alguns limites da
instituição museológica e da acção do museólogo.
O texto inicia-se por uma interrogação sobre a possibilidade dos museus serem ―locais
de reconciliação‖, locais de acção política cultural onde ocorre um diálogo propiciador
duma síntese de compromisso que alavanque novas premissas de acção. O museu como
espaço de negociação implica que cada parceiro o veja, e se implique, como espaço de
igualdade onde existe um ―compensação suficiente‖. Avança mesmo com a
possibilidade, do museu ser o local adequado para o desenvolvimento de ―terapias
sociais‖ para ultrapassar conflitos prolongados. Nele podem ocorrer processos de
revalorização das relações interpessoais e intergrupais e, através dele, desenvolver
processos de reconstrução de novas identidades. Para que isso possa ocorrer, defende
Pierre Mayrand, deverão ser priorizadas as vias da aprendizagem119
sobre a diferença.
As metodologia de trabalho social, da Educação Política, o posicionamento crítico sobre
a ―comunicação‖ e a compreensão dos sistemas de regulação do ―jogo do poder‖,
inscrita nas praticas libertarias (resolução não violenta de conflitos, metodologia de
desenvolvimento do dialogo inter pessoal e intergrupal) permitirão ao
119
Apprentissage – Questão central no âmbito das Ciências da Educação. A aprendizagem
corresponde ao processo de modificação estável dos comportamentos e das atitudes dos sujeitos
verificáveis pela sua experiencia. A Aprendizagem é essencial para a espécie humana, porque é
o veiculo onde se inscreve a sua relação com o mundo exterior e com os outros estabelecendo os
laço de coesão social, de ruptura e de conservação. A psicologia cognitiva, iniciada com Piaget,
desenvolveu um intenso trabalho de investigação neste domínio.
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mediador/museólogo intervir na comunidade como interlocutor válido, e juntamente
com a comunidade procurar ultrapassar os conflitos.
« Une fois le consensus rompu de façon violente, de profonds trauma s'étant
installés, nécessitant un temps de guérison plus ou moins long, selon la gravité de
la blessure reçue ou donnée, la présence d'intermédiaires ou de médiateurs
deviendra une nécessité dans le processus de revalorisation des rapports, de
réappropriations des liens, de construction d'une nouvelle identité partagée,
forcément trans-territoriale. Une solution heureuse dépendra de la renaissance de
volontés, individuelles comme collectives, désireuses non pas tant de passer
l'éponge sur des faits historiques qui doivent servir d'exemple, mais de conférer la
priorité à la vie par l'apprentissage du respect, comprenant la différence. Enfin,
l'éducation politique, celle de la critique des médias d'information et des
politiques partisanes, de la compréhension des systèmes qui régissent les jeux de
pouvoirs, seront, à l'instar des méthodologies de pratique de la liberté , parmi les
conditions d'accompagnement des processus réconciliateurs, les plus
indispensables. Pour ce faire, le médiateur lui-même devra représenter un
interlocuteur valable, ayant résolu ses propres conflits, possédant une maîtrise du
sujet.
Para justificar as suas premissas Pierre Mayrand propõe depois três questões para
reflexão. A primeira, sendo a instituição museal uma instituição universalmente
reconhecida e aceitos (percepção de alto valor social), mesmo quando muitas vezes
representa uma visão dominante duma cultura ou dum poder, não poderá, no quadro das
transformação que estão a ocorrer no seu interior para adequação ao mundo
contemporâneo, tornar-se numa instituição mediadora e ―facilitadora‖ de cultura. E cita
propósito o caso do Canadá.
L'institution muséale, porteuse d'une mission culturelle reconnue par tous les
états, même dépourvus ou fragmentés en multiethnies, pourrait-elle, au stade
actuel de son évolution et des transformations qui la secouent, se poser comme
médiatrice dans le cadre d'un processus de réconciliation? Cela pose deux
problèmes, le premier étant qu'elle ne s'est jamais présentée, jusqu'à présent,
dans ce rôle, sinon comme «conciliatrice» des cultures, investie par l'État d'une
mission intégrative des peuples ou des groupes de population, tout en affirmant le
droit à la différence, comme c'est le cas, par exemple, au Canada » (pag .1)
E prossegue com uma reflexão sobre estes trabalhos, que na maioria dos casos são
direccionados para os jovens, onde ocorrem processos de trabalho ―amigáveis‖, que
favorecem a partilha e o diálogo. Uma outra reflexão que ocorrem nestes museus, é
sobre as grandes questões da civilização da cultura, o que permite relativizar o universal
e o particular
A segunda questão que coloca, é sobre o papel do museólogo, no âmbito destes
trabalhos. Este envolvimento da instituição museal, implica o desenvolvimento de uma
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178 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
implicação sócio política e um compromisso com a acção. Ser mediador não significa
ser não participante. Ele tem que se implicar como cidadão solidário. A sua contribuição
para a mediação tem que resultar dum processo de tomada de consciência, desenvolvida
no interior da comunidade.
« Le muséologue, se considérant en premier lieu comme un citoyen solidaire, a-t-
il acquis la conviction qu'il lui faut également, dans l'accomplissement de ses
tâches, se préoccuper de la mission sociale de son institution par des
engagements concrets? La mission de médiateur ne pouvant émerger que d'une
prise de conscience existante dans la communauté muséale, et non seulement
d'une technicité à laquelle on réduit trop souvent certaines missions
internationales de sauvegarde ou de coopération »(pag.2)
Assim sendo, a mediação do museólogo seria uma mediação substâncialmente superior
às negociações ou mediações de conflitos, uma vez que o seu objecto, que trabalha
sobre as identidades e sobre as memórias, seria bastante mais profundo.
Finalmente a terceira questão, relaciona-se com a questão da relação da função social
dos museus, durante muito tempo dissociada da função cultural e científica. Na maioria
das vezes, quando se fala e se expõe sobre a sua função social, atribui-se ao museu a
missão de desenvolver acções de educação, de melhoria dos níveis culturais da
comunidade, de valorização de certa praticas sociais da comunidade, de melhoria das
condições ambientais. Poucas vezes se viu exposições sobre a ―ancoragem social do
museu‖. Pierre Mayrand pergunta se essa não será a actividade mais óbvia dos museus.
Ou seja considerar os sujeitos da comunidade como a principal função do museu. Ou
seja em vez de falar para os outros, falar-se de si próprio. Os outros não querem ouvir
uma história, mais ou menos fantasiada sobre a comunidade. Querem conhecer a
comunidade. Querem conhecer o território tal como ele é vivido e tal como ele é
percepcionado pelos seus habitantes, e os modos como ele se mobilizam para construir
o seu futuro. Interroga-se aqui se a ―lógica da sedução‖ do ―espectáculo‖ e dos jogos de
poder político e do orçamente não constituem um bloqueio ao desenvolvimento do
compromisso destes museus.
«N'y aurait-il donc pas, par conséquent, une méprise sur la notion du
«social», de ses corollaires le «changement», l'«évolution», dans leur
acceptation sociologique et anthropologique, entretenant sciemment, telle est
parfois notre impression, les imprécisions et ambiguïtés qui maintiennent le
système de valeurs dominantes et traditionnelles de l'institution muséale?
(pag 3)
Para concluir o texto, Pierre Mayrand coloca a questão de que é necessário que « nunca
mais aconteça » os genocídios e as guerras, as violências contra os povos e contra os
outros. Malgrado os grandes museus, as grandes exposições universais, Que apesar de
tudo isso continua a acontecer. Mas paralelamente, há um conjunto de museus
comunitários, que em rede se vão relacionando e tomando consciência da necessidade
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Julho de 2009
179 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
dos cidadãos se organizarem, estimularem os debates sobre a solidariedade.
Ultrapassando esta utopia de inscrever a instituição museal no cerne da construção dum
novo mundo, Pierre Mayrand coloca quatro caminhos para o desenvolvimento das
instituições museais poderem operar como instituições de ―reconciliação‖. A primeira, o
desenvolvimento da formação dos profissionais. A assumpção por parte do ICOM, da
importância do trabalho sociopolítico dos museus. E a terceira a necessidade dos
museus poderem ser abordados na óptica de ―laboratórios de experimentação social‖,
articulados em redes através do mundo para mobilizar os recursos necessários para a
actuação do museus como instituição de mediação. E em quarto lugar a criação de redes
de cooperação para a criação de exposições sistemáticas sobre a agenda política e
grandes debates.
Para além das questões sobre o engajamento político da actividade museológico, que o
texto defende com bastante ardor, salienta-se a interessante abordagem à função dos
museus como mediador, como construtor de diálogos entre culturas. Essa importante
função dos museus poderá constituir um caminho de investigação da museologia
enquanto instrumento de desenvolvimento das comunidades, sobretudo em contexto de
acelerada mutação cultural.
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180 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
4 Memórias de Viagens Museológicas - Leituras
Complementares
4.1 Os museus paulistas
Entre 23 e 28 de Março de2009 realizamos uma ―viagem museológica‖, organizada pela
Universidade Lusófona, com apoio de Cristina Bruno da Universidade de São Paulo,
aos museus da metrópole brasileira. Participaram da viagem os alunos da museologia
(mestrado e doutoramento) de urbanismo e arquitectura e teve como objectivo
fundamental o contacto com as realidades e as dinâmicas museológicas da cidade.
Foi neste viagem que nos confrontamos com a ideia apresentada por Cristina Bruno
sobre a importância da viagem120
como elemento catalisador dos processos
museológicos121.
Tínhamos sido
surpreendidos por uma forte chuvada no
mercado de rua que havíamos visitado à
hora de almoço. A maioria dos colegas
tinha entrado nos vários restaurantes de
parrilhadas que ladeavam a Praça.
Tinha-me afastado entretido pela
observação daqueles objectos, daquelas
velharias que procuravam uma vida
nova… Todas as cidades têm as suas
―Feiras de Ladra‖ onde se fazem as
reciclagens das memórias. Regra geral,
apenas o aspecto material é reciclado. O objectivo da troca é essencialmente monetário.
Nem o vendedor nem o comprador se preocupa com as memórias. Apenas a
materialidade, a superficialidade do objecto. Se nos calarmos um bocadinho, se
conseguirmos fazer silêncio e interrogarmos os objectos nesses locais, quase
conseguimos ouvir esses lamentos dessas memórias perdidas. Energia dispersa em roda
livre. Um caos de memórias
120
BRUNO, Cristina (2004), ―As expedições no Cenário Museal‖, in São Paulo 450 anos, São
Paulo, Museu da Cidade de são Paul, pp, 36-47. 121
―As expedições têm um singular comprometimento com a construção dos elos de sentidos
patrimoniais valorizados e preservados pelos museus, ao longo dos tempos e nos mais diferentes
territórios‖ (op.cit, 36)
Ilustração 1 – Esquiso da Viagem para o Museu de São Paulo
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181 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Sabemos hoje que muitos dos objectos que povoam os nossos museus estiveram,
noutros locais, nessas feiras122
. Mas regressemos a São Paulo. Nas minhas
deambulações pela feira centrara especial atenção, como normalmente faço, ao livro.
Numa das bancas encontrara a publicação ―Expedição São
Paulo 450 anos‖, que sabia de edição limitada e que
imediatamente comprara. Aí nessa altura uma carga de água
abatera-se sobre a feira, obrigando-me a refugiar no primeiro
espaço que encontrar. Chamava-se ―Espaço Alberico Mendes‖ e
era um bar, livraria, galeria de arte123
. O Alberico é um editor,
tanto quanto me apercebi, com edição de trabalhos sem grande
interesse. As suas obras de arte nas paredes, também me
pareceram de qualidade mediana: A livraria tinha um interesse
limitado, abundando alguma literatura exotérica, e a oferta
alimentar era essencialmente vegetariana com uma qualidade
aceitável. No conjunto era um espaço coerente, harmonioso, onde se podia, se não
chovesse, beber um sumo na esplanada. Enfim, foi neste espaço, entre goladas de sumo
e dentadas em beringelas que me lancei na leitura da publicação. No final, perante o
entusiasmo dos colegas, que tinham degustado uma cozinha mais tradicional, acabei por
dar o meu tempo por muito bem aproveitado. Tinha encontrado uma solução para o
trabalho da tese. A viagem. Afinal eu projectava fazer uma viagem. Uma viagem
interior, da criação de ciência, onde ia mobilizar todas as minhas experiencias, duma
viagem com os outros, onde pretendia procurar criar um processo museológico com
eles. Essa era a chave que eu necessitava.
Diga-se igualmente em abono da verdade, que a consciência desse facto, a viagem como
experiencia museológica, foi desencadeado com a leitura do texto de Cristina Bruno. No
entanto, sem a viagem em que me vi envolvido, sem a participação de todos os que nela
participaram, sobretudo dos museólogos brasileiros que partilharam a sua arte connosco
não teria tido as condições necessárias para criar esta síntese. Mais ainda, no último dia
122
Por exemplo, nas viagens de José Leite de Vasconcelos, na primeira década do século XX
efectuou uma viagem ao Egipto. Numa exposição realizada no primeiro semestre de2009, no
MNAA, foram expostos os objectos integrados no MNALV, bem com as várias notas sobre as
compras que efectuou nos mercadores de antiguidades do Cairo despesas e relatos do
arqueólogo sobre as circunstâncias da sua compra. 123
No âmbito da renovação de espaços de acesso ao livro em espaço urbano, verifica-se hoje a
busca da multifuncionalidade. A ideia é integrar uma oferta de vários serviços, de forma a
potenciar a sustentabilidade do negócio. Este objectivo esteve presente na nossa actividade no
Louzal. Aliás a nossa chegada ao Louzal, efectua-se através do trabalho no ―Espaço Garrett‖ em
Grândola, que se constitui como um Restaurante, Espaço Gurmet regional, Galeria de Arte,
Livraria (especializada em poesia, gastronomia e vinhos) e garrafeira. Este espaço era um
espaço de cultura, de celebração da vida no mediterrâneo. O convite para ir para o Louzal
provocou uma readaptação do conceito na Aldeia Mineira. Infelizmente a miopia dos
promotores imobiliários impediu o desenvolvimento de estruturas multifuncionais adaptadas a
contextos culturais, insistindo em lógicas imobiliárias mono funcionais. Estamos convictos que
esse tempo urbano está ultrapassado. Aqui salienta-se a importância dos trabalhos de Mário
Moutinho em relação aos ―Museus como Prestadores de Serviços‖
Ilustração 2 – Capa do Livro Expedição São Paulo, 2004
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182 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
de viagem, já com as malas feitas, sentados nas escadarias exteriores do Hampton Park
Hotel, quando esperávamos o ônibus para o aeroporto de Guarulhos, e em jeito de
balanço na conversa com Cristina Bruno, falamos desse conceito de viagem como
experiencia museológica. E refiro esta consciência da viagem como elemento chave
dum processo museológico. Foram 20 minutos de conversa. Vinte minutos em que
Cristina Bruno, museóloga nos fala da poesia dos museus, de como que em cada museu
há uma gota de sangue. De como que em Mário Chagas, Mário Moutinho, Judite,
Marcelo, Célia, Pierre, Regina se pode retirar uma harmonia de pensamento. De como a
ciência museológica é uma acção. Um processo em que nos vemos envolvidos para criar
um mundo melhor. Como mobilizamos a memória para partilhar com os outros e com
os outros fazermos essas viagens. Não uma viagem turística, que nos leva para sítios
sem memórias e nos põe a fotografar patrimónios que se não entendeu sem ser o facto
de que têm uma casca a que alguém colocou um rótulo. A viagem museológica é uma
viagem permanente, do nosso pensamento, das nossas memórias, da nossa relação com
o mundo, do nosso contributo para a memória colectiva. Do nosso compromisso perante
a vida e perante a comunidade.
Tive pena de ter as malas arrumada e o gravador encaixotado. Teria sido bom rever o
que fora dito. Mas ficou a memória do que disse. Não sei o que eu acrescentei. Mas os
objectos museológicos são assim mesmo, com plurisignificados que cada observador
acrescenta e manuseia (manipula) em função dos seus anseios e aspirações. É também
assim que os museólogos trabalham. Deixando atrás de si lastros, sementes que
germinam e se multiplicam. Que se vão hibridizando, tomando sempre novas
qualidades. Fica aqui expresso o tributo a Cristina Bruno.
Voltando à viagem a são Paulo e aos seus objectivos. Como vimos acima a busca de
experiências, de modos de trabalhar, de avaliação de trabalhos, de contactos e conversas
sobre experiências, de partilha das experiencias foram alcançados ao longo de uma
semana. Uma semana em que foram visitados vários museus. Pessoalmente, tinha
definido como objectivo pessoal, como objectivo de trabalho para a tese, a observação
dos modos de trabalho museológico com o outro.
As premissas destes objectivos eram os seguintes. Sendo o Brasil um país multicultural,
onde sobre a cultura ameríndia se implantou uma colónia europeia, essencialmente
portuguesa, que importou mão-de-obra escrava, ao longo de três séculos, para satisfazer
as necessidades de economias de monoproduto (cana do açúcar, algodão. Café, ouro,
borracha etc.). Que essa colónia se independentizou há duzentos anos criando um
Estado. Como é que, esta era a questão, o discurso museológico trabalhou com a
diversidade cultural, como é que a partir dela construiu narrativas. Sobretudo
interessava-nos, como estudo de caso, analisar os processos museológicos brasileiros
contemporâneos.
Os objectivos eram naturalmente demasiados ambiciosos em relação à realidade. Por
um lado são Paulo não é o Brasil. Embora sendo Brasil, a realidade brasileira é muito
diversificada, como também o é a realidade museológica brasileira. Por outro lado São
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183 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Paulo é uma metrópole, com questões urbanas muito específicas, com as quais nunca
nos tínhamos confrontado, nomeadamente o gigantismo dos fenómenos. Para quem
parte de realidades museológicas micro comunitárias, o gigantismo paulistano é uma
outra realidade. Ou seja mesmo que estivéssemos um período de tempo mais dilatado, a
realidade museológica seria sempre superior à observada. Tal facto, no entanto, devido
ao trabalho dos nossos anfitriões, tal não impediu de sentirmos o ―pulsar da cidade‖. De
aqui e ali, através da museologia, termos sido capazes de sentir ―fragmentos de vida‖
incrustados no ritmo urbano. Esse foi um sentimento partilhado pelo grupo.
E tal como sentimos o pulsar da cidade, penso que também senti o pulsar da museologia
em relação ao que me motivava. E é a leitura dessa viagem que a seguir se apresenta em
síntese. Apresentamo-la sob a forma diário de viagem, de notas de leitura dos discursos
e dos objectos em função das nossas questões.
4.1.1 Museu de Arqueologia e Etnologia da USP (23MAR)
Integrado no Campus Universitário este museu fundado nos finais do Século XIX, foi
reformado em 1989 de forma a integrar todas as
colecções etnográficas recolhidas. Desenvolve
actualmente, nas instalações do museu, três
projectos: Educação Indígena, Acção Cultural e
Integração Comunitária. No seminário de
apresentação estiveram presentes Camilo
Unicordel, Sandra Lacerda, Gilbertoni Carneira e
Francisca. Cada um dos projectos foi apresentado
pelos seus responsáveis.
O programa de difusão Cultural (Camilo) desenvolve-se no Parque de Arqueologia e
Etnografia, a partir do acervo Afro-brasileiro e do acervo de arqueologia clássica.
Desenvolvem acções de formação de professores (educação patrimonial com a duração
de 4 horas) onde procuram criar situações de diálogo com o património. Desenvolve
igualmente um Programa de Produção de Recursos Pedagógicos e Museográficos, que
envolve a produção e concepção de materiais
pedagógicos, (Kit pedagógico e Maleta Pedagógica).
Os Kit contêm objectos indígenas 8brinquedos,
músicas em CD, vídeos sobre formas de socialização
da comunidade indígena. Estas Maletas pedagógicas
podem ser cedidas gratuitamente aos professores
durante 15 dias, para trabalhos em salas de aula, e são
devolvidas.
O Programa de Projectos Especiais (Carla Carneiro) trabalha com públicos
diferenciados: idosos, a comunidade de são Reno/ Projecto Girassol, públicos com
necessidade especiais. Durante mês de Junho desenvolvem campos de trabalho de
Ilustração 3 – Museu de Arqueologia e Etnologia
Ilustração 4 – Reservas do MAE
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arqueologia. Pela sua relevância foi detalhado o Projecto Girassol, uma comunidade de
tipo favela, que habita ao lado do campus, e que antes dos trabalhos de reabilitação do
museu usava alguns dos terrenos entretanto ocupados pelo MAE. Esta comunidade não
interagia com o museu. O projecto desenvolveu uma actividade de trabalho com a
comunidade a propósito da memória do território. No final de um ano foram efectuadas
exposições sobre a comunidade que a aproximou do espólio do museu. O sentimento da
perda do território passou a uma admiração pelo consciência do território e da riqueza
do museu A partir do primeiro ano foram desenvolvidos projectos específicos com
escola e com a 3ª idade. Com as escolas são aprofundadas as noções de colecção (livros,
bonecas), sai iniciados ao sistema de catalogação (depois passam para a colecção do
museu). Desenvolvem projectos específicos sobre Museus e Alimentação, Oficina de
Instrumentos Musicais, Oficina de Arqueologia, Oficina de Máscaras.
O Programa de Educação Ambiental (Carla Carneiro) desenvolve-se na Amazónia
Central e tem como objectivo o levantamento arqueológico e em paralelo desenvolve
trabalho de educação patrimonial para as comunidades indígenas. No âmbito da
arqueologia efectuam-se as tarefas de levantamento, registo de sitos arqueológicos,
classificação do material encontrado, conservação dos objectos e comunicação dos
resultados á comunidade. O programa de educação patrimonial desenvolve-se como um
curso de extensão universitária (para professores e agentes comunitários), Produz guias
sobre os territórios do Amazonas e vende réplicas de material arqueológico. Os
objectivos do programa é trabalhar o conceito de continuidade cultural (a comunidade
não valoriza o seu património), despertar na comunidade a responsabilidade da
conservação do património e despertar o interesse para a conservação.
No terceiro projecto ―Educação Escolar Indígena‖
(Sandra Lacerda), que de desenvolve desde 1988 a
partir dum novo paradigma cultural e educacional, onde
emerge a questão da interculturalidade, e relacionado
com esse conceito o Direito à Educação Indígena
(Educação Multicultural). No projecto são trabalhadas
as questões de pertença ao território em 5 etnias de
índios (Guarani-Tupi). No âmbito do projecto
promoveu-se a formação de professores indígenas, a
formação intercultural de agentes. ―O curso superior
executa uma relação ensinar/aprender nova, reflexiva,
crítica, ao mesmo tempo que intercultural e bilingue‖
(Valdimice Vaiti – aluna.). A partir deste projecto foi criado o projecto ―outros
diálogos‖ onde se procura apresentar o museu como método de pesquisa, olhar o outro
como forma de olharmos para nós próprios, e a preservação da memória. O MAE
produziu um Kit educacional ―olhar o outro – olharmos o mesmo ―. Este projecto deu
apoio ao Museu Nuria Porto, em que dentro da tendência da comunidade ser objecto do
museu a estruturação do museu foi feita com a participação da comunidade.
Ilustração 5 – Capa do Kit de Formação de Professores MAE
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185 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
4.1.2 Pinacoteca de São Paulo (directora Arminda Tojal) 24 Mar09
Instalada num edifício do Arq. Ramo de Azevedo (arquitecto de vários edifícios
públicos em são Paulo, entre os quais o Teatro e o Mercado com uma concepção de
modularização da cidade) construído em 1890, para escola de Artes e Ofícios, jamais foi
concluído. Em 1980 foi efectuada uma reforma que
melhorou as acessibilidades, a climatização e a
cobertura (Arq. Paulo Mendes da Costa). O Museu
foi criado em 1905 como um Museu de Arte Visual
Brasileira. Actualmente é um museu de Arte e
desenvolve vários projectos com a comunidade. A
responsável pela área educativa é Mila Cavaco que
nos apresentou o projecto Pisco – um projecto de fusão
sociocultural. Em 2006 foi reformulado o modelo de
gestão do Estado de São Paulo. As estruturas públicas de cultura, educação e sociais
passaram a ser consideradas ―Organizações Sociais de Interesse Público‖ OSIP. A
organização passa por um processo de credenciação, onde a organização assina um
contrato de gestão. No caso deste museu, a Associação de Amigos do Museu constitui-
se como parceira e tornou-se a entidade gestora do equipamento. A propriedade
continua a ser do Estado de são Paulo, sendo a gestão da responsabilidade da
Associação. A gestão tem objectivos estabelecidos para satisfação dos seus contratos
com o Estado. Orçamento actual é comparticipado em 60 % pelo Estado de São Paulo,
10 % com receitas de Bilheteira e 30 % com
patrocínios. Este tipo de organização permite uma
maior agilidade na programação de actividades.
Em relação aos objectivos do Programa de
Educação de Grupos com necessidades sociais,
criado em 2001, é permitir o usufruto do espaço e
adequar o programa de visita às necessidades do
grupo. As visitas educativas são organizadas como
espaços de diálogo, com o monitor a desenvolver
actividades de apoio e desencadear propostas práticas de experiencias cognitivas ou
com determinadas componentes técnicas. Procura-se
desenvolver um processo com base em experiencias
concretas e que passa pelo convívio.
Desenvolve igualmente um programa para professores,
que efectua um programa para públicos especiais e
cursos de formação de educadores para processos de
inclusão em Arte.
O objectivo do sector educativo é que todos construam a
exposição e a utilização do património como processo
Ilustração 7 – Exposição da Pinacoteca para
Ilustração 6 – Exposição temporárica do Programa Convivência
Ilustração 8 – Capa do Catálogo do Programa
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de inclusão. Desenvolvem a ―Consciência Funcional‖ onde procuram identificar o papel
de cada um na construção do museu. Têm uma concepção de público em aberto, em que
é o público que constrói o museu. O museu como trabalho de comunicação. Existe um
trabalho de elaboração de folders para a autonomia do público. Trata-se dum folder
educativo, diferente do folder institucional, em que o museu é trabalhado a partir de um
conjunto de propostas. ―Esta é uma bela imagem para um professor: alguém que anda
para além de si mesmo‖ (Jorge Lanosa).
O conceito de ―educação compartilhada‖ em vigor no museu nas suas relações com a
comunidade é definido como um processo de planeamento de actividades em ONG (em
função das responsabilidades dos trabalhos da organização e da adaptação de cada
actividade. Um processo de construção conjunta com a organização. O museu é visto
como um processo de desenvolvimento da comunidade. O designer não trabalha com o
artesão para produzir um modelo. O modelo é construído pela comunidade em função
da necessidade da comunidade. Com esta política efectuam-se cerca de 40 exposições
temporárias ao ano (cerca de 5 a 8 exposições em simultâneo)
4.1.3 Empresa Municipal de Urbanização (EMURB -24MAR09)
Sector da prefeitura de São Paulo responsável pelas operações urbanas (OU), a EMURB
data de 1971. Actualmente trabalham com base num modelo de gestão de compromisso
com a sociedade civil organizada. É uma empresa pública de direito privado que tem
como objectivo dar continuidade à renovação urbana de áreas em transformação. No
âmbito do seu trabalho, também desenvolve trabalhos de requalificação de edifícios
públicos. Por exemplo, efectuou a requalificação da Biblioteca Mário de Andrade.
Trabalha com três áreas (Cidade Velha,
Área Central e Plo…). Em 2002 o
plano estratégico defina a figura de
Operações Urbana Consociadas, em
que se permite uma gestão
compartilhada entre o público e o
privado.
Um dos programas que desenvolveu foi o
programa‖ Monumenta São Paulo‖ um
programa aplicado a imóveis privados tombados. É um programa que é desenvolvido
em conjunto com o IPHAM (Preservação do Património Histórico do Brasil) com
financiamento do BID (Banco Americano de Desenvolvimento. Em São Paulo o
investimento é cerca de $R9 milhões de reais. Desenvolve 3 linhas de actividade: a)
Recuperação do património histórico imóvel público (envolvendo a conservação e
restauro) e obriga a um dever de conservação durante vinte anos; b) qualificação de
mão-de-obra; e C) Financiamento para recuperação de imóveis em mau estado de
conservação ou desocupados.
Ilustração 9 – Vista de São Paulo
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Desenvolvem também um programa de ―Parques Lineares‖ onde procedem à
recuperação de linhas de água, praças públicas (Praça da Republica, Sé). O objectivo é
recuperar as linhas de água para reconstituir a permeabilidades dos solos. O projecto
―Cidade Limpa ― permitiu a limpeza comercial da imagem da cidade através da
contenção da publicidade exterior. O tamanho do anúncio é efectuado em função do
tamanho da frente loja. Finalmente o último programa desenvolvido é o ―Patrocínio de
Sinalização‖ que procura um reordenamento da sinalização para tornar a cidade mais
amigável. A ideia é sinalizar com base nas cores da empresa, de forma a obter benefício
público e patrocínios, ao mesmo tempo que a mensagem publicitária é passada de forma
mais amigável.
4.1.4 Museu Paulista da USP (25MAR09) Director Paulo Garcez de Melo
É um museu de referência na história da museologia brasileira. Como museu
universitário desenvolve igualmente actividades de ensino, investigação e actividades de
extensão.
É também conhecido como o Museu do Ipiranga, devido á identidade do local. Trata-se
dum museu de identidade nacional, sendo o 2º museu mais visitado, com cerca de
400.000 visitantes ao ano, sendo que metade é
alunos das escolas.
Foi inaugurado em 1895, sendo que a Republica
tinha sido implantada em 1889. A intenção foi criar
um museu de História Nacional. ―É um museu de
memória num edifício monárquico‖. Nele são
incluídas as colecções de arqueologia e etnologia de
Herman Forcier. A partir de 1917 o director Afonso
Escragnolle Saunay (director entre1917-1946)
reforça o carácter paulista do museu, valorizando o
papel de São Paulo na História do Brasil e o valor da sua sociedade colonial. A partir de
1938 a sua colecção é tombada (prédio e colecção). O museu representa o processo de
urbanização e da cultura material de São Paulo. A partir de 1989 o eixo de actuação do
museu paulista centra-se na cidade de são
Paulo e nos seus 45 anos de história.
Trabalham os temas dos Jesuítas, dos
Africanos e da fase do Café, e dos índios.
Outra área de trabalho é o surto de
industrialização dos anos 20, o crescimento
da economia do café e ritmo de crescimento
demográfico: (1872, 31.385; 1900, 240.000;
1950, 2.200.000; 1960 3.800.000).
O carácter de resistência em relação ao poder
central é também abordado pelo museu. O espaço urbano como contra-poder. O
crescimento urbano faz-se por bolhas (trigo, açúcar, café, industria). A urbanização é
Ilustração 10 – Vista do Ipiranga
Ilustração 11- Entrada do Museu Paulista
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contínua e balizada por interesses privados. No campo da influência da arquitectura, a
influência portuguesa é substituída pela influência francesa a partir de 1910. O padrão
de especialização social de São Paulo apresenta um conjunto de características muito
próprias. ―A elite é particularmente destruidora da paisagem. Recorda-se mas não se
vê‖. A cidade de são Paulo ―é a cidade do estuque‖. De pedra e cal, devido à presença
dos italianos, mestres nesta técnica de construção que a transportam consigo da terra
mãe para o novo mundo. As grandes construções públicas do início do século XX são
de pedra e cal: Museu Paulista, Teatro, Pinacoteca etc.
Outro tema de exposição é o hibridismo urbanístico. A partir dos imigrantes procura-se
analisar a forma de como as influências culturais se integram na paisagem e nas áreas
residenciais. São Paulo não tem um centro. Há uma multiplicidade de centros por uma
fragilidade do poder público. ―Conhecer a cidade é conhecer fragmentos‖, não existe
uma imagem urbana. De uma maneira geral existe uma dificuldade de romper com a
―fragmentação patrimonial‖ no espaço urbano. A produção do espaço urbano no século
XX é um grande negócio. A favela apresenta-se hoje como um desafio social de
integração. São espaços que saem da esfera dos poderes públicos.
As linhas de investigação do Museu Paulista são: A Urbanização de São Paulo; Do
memorial da Independência ao Museu de História Natural (1917-1922); Do Museu de
História Natural ao Museu de História (a história brasileira como documento da história
paulista ―janela para o passado‖); e Da Identidade Nacional às novas prática sociais,
onde se trabalham as histórias do imaginário, do quotidiano e do universo do trabalho.
O objectivo é tematizar a função social do museu. Dialogo da arte com o narrador e com
a política que constrói o passado. O Objecto museológico como identidade nacional.
4.1.5 Museu de Zoologia (parte do Museu de História Natural)
O edifício é construído entre 1939 e 1941, para albergar as colecções zoológicas do
museu paulista. Christiano Stockler das Neves foi o principal responsável pelo seu
acervo. Em 1945, o museu tinha sido colocado no Campus universitário, mas o processo
não é aceite o museu mantêm-se no mesmo local.
Actualmente o museu tem como função a
pesquisa e a instrução pública.
Os serviços educativos do museu organizam
visitas orientadas à exposição, efectuam
formação de professores, folhetos explicativos
para visitas individuais e organizam visitas às
reservas (colecção de peixes da amazónia e de
insectos). Os conceitos dos serviços educativos
baseiam-se na formulação da democratização da
cultura (direito à cultura). Esse direito é garantido pela divulgação científica que têm
por objectivo encurtar a distância entre a alta qualidade do ensino universitário e a baixa
qualidade do ensino básico. O Brasil, mercê da sua biodiversidade (têm 20 % da
Ilustração 12 – Entrada do Museu de Zoologia
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biodiversidade do planeta), detêm uma excelência no conhecimento da taxonomia e na
sistemática. Isto permite o Brasil apresentar-se com um ―hot-spot‖ neste domínio e
representa uma grande responsabilidade social e um desafio ao exercício da cidadania.
4.1.6 Museu do Futebol (26Mar09)
Museu construído no interior do Estádio Municipal Machado de Carvalho tem sido um
caso de sucesso em são Paulo. Recebe cera de 1.200 visitantes por dia. Os serviços
educativos exploram as componentes didácticas do jogo e aprofundam os temas da
saúde e das regras socais. Promove também eventos específicos, como o Dia do Negro e
o dia do Brasil.
O espaço museológico está dividido em duas
componentes, com a primeira parte a seduzir o
visitante pelo lado espectacular da tecnologia, que
mostra emoções, musica e movimento; e a segunda
parte a apresentar uma colecção de factos sociais
económicos e culturais contextualizando o futebol e
as regras do jogo. A duração da visita é de cerca de
2,5 horas em circuito.
―O museu comemora a
palavra e o futebol é o campo da palavra‖. É um
museu que gera muitas emoções porque a maioria das
pessoas veste a camisola do ―team‖ quando visita o
museu. É um museu que atinge várias gerações. Foi
um trabalho de documentação difícil de se fazer. A
execução do museu implicou a resolução dum problema
tecnológico. O desfio era colocar a tecnologia ao serviço
do visitante para que fosse esta a interpretar com os
sentidos. A tecnologia devia ajudar a descobrir e a sentir.
Importava igualmente mostrar a importância do colectivo
no jogo.
O museu é um projecto formado de conteúdos em
permanente construção. Os monitores e a equipa têm que
estar em permanente desassossego. Outro aspecto que é
tratado neste museu é a fotografia como objecto
museográfico. A
solução para a sua
apresentação foi
trabalhar com a sua grandeza, ―sem acrescentar mais
banalidade‖. As fotografias são apresentadas em
estruturas tubulares em cubos que mostram 4 faces
de fotografias diferentes
Ilustração 14 – Entrada do Museu de Futebol
Ilustração 13 – Pormenor de Exposição
Ilustração 15- Pormenro de Exposição
Ilustração 16 - Pormenor de Exposição
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de cada tempo cronológico. Cada visitante reconstrói a sua exposição manuseando a
foto. ―Deus está nos detalhes‖. O detalhe do museu é considera-lo como local de
desinquietação, o museu como espaço de excelência, como espaço das artes.
O museu parte da ideia de musealizar um conceito. É um debate doa anos oitenta. O
futebol é um conceito. O processo de musealização não parte do objecto, mas sim do
conceito. ―Hoje é preciso musealizar os conceitos amor/ódio cidade‖.
4.1.7 SESC SP Pompeia (26 Mar09)
Os SESC são unidades socioculturais desenvolvidas pelas
entidades oficiais que se inserem em áreas urbanas
deprimidas. Oferecem vários serviços à comunidade, desde
restauração, biblioteca e exposições, desporto, lazer e oficinas
profissionais. Dirigido por Danilo
Santos de Miranda, desenvolve
uma actividade intensa. É uma
interessante forma de reabilitação
de antigos espaços industriais, ligando a componente cultura
com a actividade económica. Em Lisboa existe, com algumas
semelhanças o Espaço Alcântara.
4.1.8 EXPOMUS – Linhas de intervenção
A Expomus é uma empresa privada que actua no âmbito da museologia, na gestão do
património e na elaboração de exposições. O
núcleo base partiu das experiencias de Waldisa
Russio e tem como Directora Maria Ignez
Franco124
No âmbito da museologia (Daniela Vidal)
oferece serviços que vão desde o ante-
projecto, o projecto e a implementação. No
diagnóstico procuram um conceito gerador,
definem as linhas programáticas e elaboram as recomendações técnicas (nomeadamente
o programa de educação e segurança). Elabora o projecto com o detalhe de execução e
124
Doutoranda na Universidade Lusófona, prestes a apresentar a sua tese.
Ilustração 18 – Folheto de Exposição de Arte SESCSP
Ilustração 17 – Vista geral da Biblioteca do SESC SP
Ilustração 19 – Pormenor da Recepção na Expomus
Ilustração 20 – Aspecto da sala de trabalhos na EXPOMUS
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acompanham a coordenação do projecto em função das necessidades do cliente. Como
premissas têm o trabalho em grupo, regula a partilha de ideias e as abordagens
institucionais. A discussão em grupo permite a criação duma visão do projecto e a
criação de motivação. A discussão orienta-se para a discussão dos seguintes pontos: O
que é que queremos dos museus. Quem vão seres os beneficiários, qual é o âmbito de
actuação e quais são os valores institucionais. A partir destas respostas definem e
missão do museu e efectuam uma análise estratégica, o que implica a escolha dum
coordenador de acção. Na apresentação de casos práticos da empresa apresentaram a
experiência em museus de ciência e tecnologia no Brasil. As linhas temáticas de
intervenção é o Planeta e vida, homem sociedade e ambiente, super-morada,
conhecimento e linguagem. Outro projecto ―Bioma‖ aborda a compatibilização entre no
ecossistema. No âmbito dos programas educativos, produzem planos anuais, planos de
capacitação de educadores e produção de material pedagógico
No âmbito dos projectos de exposição (Daniela) as actividades/serviços possíveis vão
desde a formação do conceito, a arquitectura o desenho e a investigação. Trabalham a
linha editorial, a identidade visual, a linguagem expográfica e a comunicação visual.
Efectuam ainda a coordenação do projecto expográfico em relação com a conformidade
técnica.
Como exemplo de exposição apresentaram a exposição ―o Japão em cada um de nós‖, a
propósito dos 100 anos da emigração japonesa para o Brasil. A exposição procura
responder à questão de qual é o papel dos Japoneses no Brasil e lançam o desafio ―Qual
é o Japão que existe dentro de você? ― Portal da Memória‖ foi uma exposição que
identificou os imigrantes japoneses que chegaram.
Na área da gestão do Património efectuam gestão de colecções, criação e manutenção de
acervos e projectos complementares.
Apresentaram ainda o projecto ―Museu
Cidade de São Paulo – 450 anos‖ para a
Secretaria da Cultura. A Expomus de
Maria Ignez Franco em colaboração com
Cristina Bruno efectuou a coordenação do
Projecto. A viagem procurou criar um
conceito para o Museu da Cidade. Foi um
passeio por 450 anos de história,
envolvendo recolha de depoimentos e
fotografias, recolha de objectos e de
contemplação do espaço. È um conceito
que têm uma linha de tempo interactiva. Foi
organizada uma exposição temporária sobre os 450 anos de São Paulo. O território foi
trabalhado em termos de História da Cidade, diversidade, modos de vida, metrópole,
sustentabilidade. No espaço Fórum foram debatidos discussões públicas, foram
efectuados eventos, e foi montado um auditório multiuso. Foram efectuadas exposições
Ilustração 21 – Homenagem de Maria Célia a Mário Moutinho
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temáticas, projectado cinema sob cidade e debates sobre a cidade. O projecto educativo
envolvia o desafio de explorar são Paulo. Foram elaborados questionários, foram
propostas acções de estímulo da percepção, de descobri, de participar e apoio
pedagógico. Foram ainda desenvolvidas relações com a comunidade e foi distribuída
informação e documentação. No final foi criado um museu virtual e um laboratório de
história oral125
.
―A lua anda devagar mas vai a todo o lado‖. A expedição é uma das características de
São Paulo. Começaram com Mário de Andrade. A questão desta proposta de museu é a
seguinte: Que plataforma de comunicação pode ser alocada ao processo. Documentos/
Jornalistas, Vídeo documentários, Fotografias. Quem é alocado Antropólogos,
Arquivistas, Psicólogos Museólogos? A perspectiva da autora é a da Museologia como
campo de inovação. ―A contemporaneidade sonhada de 5 em 5 anos‖.
4.1.9 Memorial da Resistência (27mar09) Katia Fillipini
O edifício onde está instalado o Museu era um
edifício de escritórios, antigo edifício e prisão da
polícia política. O projecto foi desenvolvido por
Cristina Bruno e o fórum Permanente de Ex-presos
Políticos, concebido como um museu de memórias. A
construção do museu é feita a partir das memórias de
quem recusa a voz da opressão e que dá voz à
resistência. A visita foi acompanhada por três antigos
presos Ivan, Elza e Alípio Freire. A questão que se
colocava na
execução do museu era como trabalhar a emoção
sem recorrer à emoção. O memorial da Resistência
trabalha a emoção com racionalidade.
Não é um museu
muito grande. Uma
sala de entrada,
três celas e um
corredor são o espaço
do museu. Dispõe ainda duma galeria de exposições
temporárias e auditório. Foi uma visita cheia de
emoção e que mostra como com simplicidade, sem
recursos a tecnologia, se podem trabalhar emoções de
forma muito intensa. Dois momentos marcaram
emocionalmente a visita. O corredor do ―recreio‖, o
sombrio espaço para olhar o céu, que os prisioneiros
125
Esta experiencia, constitui o corpo experimental da tese de doutoramento de Ignez Franco.
Ilustração 23 – Pormenor da sala de Exposição
Ilustração 22 – Pormenor de Expositor de enquadramento
Ilustração 24 – Capa de folheto de divulgação
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tinham num curto período diário, com um simples espelho ao fundo, permite ao
visitante ver-se a si própria nessa tenebrosa situação. Outro momento muito forte, foro
da cela. O significado do cravo é dado pelos auscultadores que permitem ao visitante
ouvir as memórias dos antigos prisioneiros. Fragmento da liberdade que não pode ser
encarcerado.
O museu apresenta ao visitante uma pequena história da resistência do Brasil aos vários
momentos de ditadura que viveu ao longo do século XX. Na sala de exposição
temporária apresenta as memórias da comunidade japonesa, perseguida durante o 2º
Guerra mundial pela sua condição de raça.
4.1.10 Museu da Língua Portuguesa (27Mar09)
Instalado no edifício da Estação, o Museu da Língua Portuguesa é um projecto de
museologia clássica, à qual adicionaram muita tecnologia. ―Muita parra para pouca uva‖
como se diz entre o povo. Composto por três
núcleos, o da ―História da Língua‖ onde aborda a
formação da linguagem durante cerca de 20 ‗. No
final o ecrã abre para uma Praça da Poesia, onde
com a sala obscurecida, são lidos vários poemas ao
mesmo tempo que são projectadas estrofes no chão
e nas paredes. No final é permitido passear sobre a
poesia. No terceiro e último núcleo faz-se a história
da língua portuguesa, a sua formação, as suas viagens as suas curiosidades e as suas
particularidades. No final apresentam um jogo que convida á formação das palavras.
Trata-se de um projecto tecnicamente bem feito, mas sem emoção. Não têm rosto.
4.1.11 Museu Afro Brasileiro (28Mar09)
Instalado num edifício de Óscar Nymaier no Parque da
cidade, foi um museu reformado em 2004. O seu director
Manuel de Araújo é um artista plástico e coleccionador de
arte que procurou a presença da mãe negra no Brasil. O
seu espólio pessoal está instalado no 1º andar. É um
museu de arte, barroco na sua apresentação, onde o
espaço expositivo é trabalhado
como uma escultura. Têm um
conceito da cultura africana
como procura do belo. Está
organizada em 6 núcleos
temáticos que se interpenetram como se propostas de fusões
entre objectos de ―famílias‖ diferentes, e a partir daí criar a
unidade de conceito: 1, África; 2- Trabalho escravo; 3
religião (afro-brasileira); 4-Festas; 5: História e Memorial; 6_
Arte dos séculos XVIII, XIX e XX. Têm também espaços
Ilustração 25 – entrada do Museu de Lingua portuguesa
Ilustração 26 – Guia para visita educacional
Ilustração 27 – Guia para visitas especiais
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para exposições temporárias (preconceito).
O conceito Estético do Museu tem como ponto de partida ―a gente aprende com o belo‖.
O museólogo que quer compreender o Brasil não precisas de se transformar em poeta‖,
é uma pequena picardia com Mário de Andrade e Chagas, do director que quer valorizar
a herança negra e a herança mulata (esta mais tímida porque também mais tardia) O
museólogo, na sua interpretação, está ―Entre o homem e os Deuses‖.
O serviço educativo do museu tem como objectivo servir de mediadores entre as
colecções e o público. Trabalham vários temas como ―A força da palavra em África‖, A
Importância da Oralidade na Cidade, A narração das estórias. A questão das histórias
tem-se revelado como um canal de comunicação entre gerações. Para grupos de
estudantes o serviço educativo prepara ―quebra-cabeças‖.
É um museu muito visitado, com cerca de 12.000 a 15.000 visitantes mês. Em Outubro
chegam a ter uma afluência de 30.000 visitantes. Pelas características da sua colecção e
do seu tema é muito procurado pela população negra, ainda com diferenças sociais
assinaláveis.
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4.2 Fragmentos das Imagens de África nos museus de Lisboa A viagem pelos museus da velha capital do Império que ora se apresenta têm como
objectivo testar exercícios de leitura das narrativas sobre o outro africano e sobre o
modo como na actualidade se expressam na instituição museológica. Não têm como
objectivo efectuar um estudo exaustivo da narrativa africana, que em si constituiria um
tema de tese, nem sobre a história dos museus de Lisboa
Foi pensado como uma viagem pela cidade, pelos seus ritmos
com pontos de paragem em museus e em sítios públicos. A
viagem também não é cronológica nem sequencial. Foi
constituída por fragmentos de tempo, partilhados com os filhos,
umas vezes em tempo de lazer, outras com intenções de análise,
mas sempre com alguma informalidade. Repito o objectivo era
construir e testar uma grelha de analise sobre a presença do e
não ver se o outro e como o outro está representado. As
conclusões serão portanto, também fragmentos de memórias.
A intencionalidade desta viagem foi-se formando no espírito lentamente ao longo de
vários meses. Só no momento da escrita, este processo narrativo tomou esta forma.
Também por isso o seu carácter fragmentário. Ela no entanto é indubitavelmente
marcada pela experiencia paulista, e pela leitura da cidade e
dos seus museus, formalizada pelos trabalhos de Cristina
Bruno e Maria Ignez Franco. Mais do que um quadro completo
são esboços preliminares dum quadro que poderá ser pintado
no futuro126
.
A herança africana é um assunto mal resolvido pela cultura
portuguesa. Quando viajamos pela cidade, por exemplo, do
escavacado Cais das Colunas, há mais duma década isolado do
Rio127
, deparamos, sobretudo aos Domingos, com uma cidade
colorida. Gente Africana há muito radicada circula de forma
intensa. Visíveis uns pela cor da pele, mais hibridizados outros,
126
A propósito do Centenário da Republica, por exemplo, pensamos poder completar este
quadro. 127
Nesta viagem recordei momentos de criança, em que nos domingueiros passeios de
Primavera as famílias lisboetas comiam um sorvete no Rossio e desciam pela Rua Augusta,
olhando as montras das novidades, para as mães as modas, para os pais as livrarias e as lojas de
licores. Com ela notei que a minha filha de 12 anos nunca tinha visto o Cais das colunas, nem
nunca tinha descido a rua da moda. Essa cidade tinha-se multiplicado por múltiplos centros
urbanos.
Ilustração 28-Largo de São Domingos em Lisboa
Ilustração 29- Cartaz de Festival Musical integrados nas Festas de Lisboa (2006)
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apenas visíveis se soubermos os sítios de encontro128
. Vive a cidade. Frequenta os
restaurantes. Concentra-se no Rossio. O Palácio da Independência é de manhã uma
cidade africana, tal é a cor o linguajar, as roupas e o comércio. Curiosamente o largo de
São Domingos africano foi há poucos anos colocada uma lápide de ―mea culpa‖ da
cidade de Lisboa aos Judeus supliciados pela Inquisição,
cujo paço prisão se encontrava nesse local. É curioso
como nestas euforias de contrição rememorativa do
passado, ainda ninguém se tenha lembrado de
simbolicamente pedir desculpa aos africanos que os
portugueses traficaram. Um esquecimento que significa
que o assunto ainda não está resolvido na consciência
nacional?
Coloquemos o problema preliminar. Ao viajarmos na
cidade, no seu centro e nas suas periferias, Lisboa é, e
sempre foi uma cidade colorida. Cidade de acolhimento,
cidade mãe. Olhamos para os africanos e interrogamo-los.
Onde trabalham. Profissões menos qualificadas. Há
excepções é claro. Empregados no McDonalds, nas
Bombas de Gasolina. São os clientes matinais dos
autocarros que afluem aos centros de escritórios e
empresas que necessitam de limpezas, na construção das
casas que habitamos ou nas estradas que viajamos. Gente
indispensável, tão indispensável que agora reparei no caos
da minha casa, onde a Fátima não vem há um mês, tudo
porque o pai do marido faleceu, e a moça aproveitou o dever
para com os mortos e juntou as férias em Cabo Verde onde só
vai de 5 em 5 anos. Como tínhamos visto com Marcelo
Cunha, no museu da cidade, a herança africana não estava
presente. A questão era pois saber se nos outros museus, de
arte, de história, de arqueologia a herança africana estava
presente, seja nos objectos, seja através das suas actividades.
Por exemplo, em Setúbal no Museu do Trabalho, sabemos
que nos seus trabalhos com a comunidade são trabalhadas as
heranças africanas.
Isabel de Castro Henriques129
necessitou a trabalhar na longa duração a herança ou as
heranças africanas em Portugal. Afirma a propósito desta presença ausência: ― Esta
lógica do corpo (da cor) se permite que os africanos organizem as suas vidas, não deixa
128 Por exemplo em Lisboa, o Restaurante João do Grão, na Ruas dos Douradores, é um ponto
habitual de almoço da comunidade de angolanos. Em 2003 fizemos uma viagem com o autor
angolano Pepetela. Fomos a vários pontos do país, numa viagem ao longo de 3 semanas. Nessa
viagem entramos nestes mundos, em que gentes dos trópicos se encontram em locais para
celebrarem as vidas e ouvirem as histórias de lá. 129
HENRIQUES, Isabel de Castro (2008) A herança Africana em Portugal, Lisboa CTT
Ilustração 32 – Presença no Espaço Publico
Ilustração 31- Gentes das Áfricas no Espaço Publico
Ilustração 30 – Capa do Livro de Isabel Castro Henriques
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197 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
por isso de constituir um obstáculo à sua plena integração na sociedade dos homens‖
(op.cit, 233). E prossegue: ―Estes preconceitos pertencem à
criação duma leitura polémica e negativa aplicada durante
séculos aos africanos e reactualizada pela dominação da
guerra colonial do século XX (…)―, para concluir mais à
frente ―A espessura da cor parece asfixiar as probabilidades
do acesso ao conhecimento e, por isso, os africanos estão
impedidos de entrar nessa área específica, que permite a
organização de sociedades harmónicas‖ (op.cit .234). A
leitura de Isabel Castro Henriques permite revelar que a memória portuguesa também é
negra, e que essa negritude está bem presente em todos os domínios da nossa vida. ―O
inventário da herança permite hoje, mais do que ontem, identificar a maneira consistente
como os africanos souberam e quiseram integrar-se na sociedade portuguesa, tornando-
se inteiramente portugueses e participando na renovação do imaginário e na construção
do facto nacional‖ (op.cit, 235).
Folheando o excelente livro onde estas palavras foram escritas, verificamos que, a
maioria dos objectos deste inventário, são hoje objectos de museus, de arquivos ou
bibliotecas. Estão inscritos em património. São objectos do quotidiano. O que
procuramos fazer foi procurar a narrativa destes objectos nos museus da cidade para
procurar a forma como a cidade está dentro do museu. Olhar para o museu com olhar
museológico. Saber se a comunidade, esta comunidade cultural, e esta território que
também é o deles, está dentro do museu. De alguns museus. E mais afoitamente se há
africanos no museu. Escolhemos alguns museus, apresentamo-los de seguida
individualmente, para mais a frente fazermos uma leitura de síntese.
4.2.1 Museu do Carmo
O Museu Arqueológico do Carmo está instalado nas Ruínas do Convento do Carmo
desde 1864. É um exemplo da visão romântica do património,
a preservação e exposição de objectos de outros tempos em
locais com as marcas do tempo. Possidónio da Silva, o seu
impulsionador instala aí a Real Associação dos Architectos
Civís e Archeologos Portugueses.
Para o aproveitamento do espaço do Convento de Nossa
Senhora do Monte do Carmo foram realizadas obras de
adaptação, com aproveitamento das capelas para instalação de
exposição de artefactos (peças miúdas). Na em 1900, o director
Conde de Januário instala na sala do capítulo uma livraria
(biblioteca), dentro dos princípios defendidos por Frei Manuel
Ilustração 33 – Sabores de Africa nas mesas de Lisboa
Ilustração 34 capa de Livro sobre Obra de Possidónio da Silv
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198 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
do Cenáculo130
para a Biblioteca Publica de Évora em 1805. Estes princípios reunir as
colecções e livros num mesmo espaço. . As reuniões da Associação realizavam-se no
interior do museu.
Silva Leal (sob o pseudónimo de Sá Villele) escrevia em 1876 ―Os museus são hoje
tidos, mais do que nunca, como um dos melhores e mais importantes recursos, para o
estudo das sciencias e das bellas-artes e da industria. As nações mais civilizadas,
disvellam-se na propagação e no enrequicimento d’estes templos da illustração (...)
Mas entre todos os museus, os que ultimamente vão atraindo mais
atenção, e as diligências dos sábios de todos os paízes, são os
museus archeologicos, espacialmente o de archeologia pré-
historica” 131
A sua colecção é constituída por arcas tumulares medievais,
provenientes de vários conventos de Lisboa, a Pia baptismal da
Ajuda, armas frontispícios e janelas, portas, pesos e medidas. Uma
sala com as colecções de material lítico, e metais. Em 1900, por
influência do Conde Januário chegam vários objectos exóticos, por
ele incorporadas no museu e provenientes das suas viagens. Entre
estas preciosidades encontram-se as célebres múmias peruanas e
instrumentos musicais chineses, e armas africanas. No início do
século são também incorporados nos museus animais empalhados,
sementes desconhecidas em Portugal, criando-se um ―gabinete de
antiguidades‖ fora de época, mas ao gosto dos visitantes do tempo.
Após a implantação da Republica estes elementos estranhos
são expurgados, regressando o museu à sua vocação
arqueológica.
Em 1946 teve obras de beneficiação através da Direcção Geral
dos Edifícios e Monumentos Nacionais, que duraram 2 anos,
reabrindo ao público em 1948. Nessa altura a adaptação do
museu foi feita a partir do edifício. Os objectos foram
distribuídos em função do espaço disponível, incluindo
paredes, como se duma decoração se tratasse. Não se verificou
130
Frei Manuel do Cenáculo Vilas Boas, (1724-1814). Doutor em Teologia pela Universidade
de Coimbra. Bispo de Beja e Arcebispo de Évora. Admirados de Luís António Verney e das
políticas do Marquês de Pombal. Foi um impulsionador da criação de bibliotecas, como a
Biblioteca Nacional, que é criada com o espólio da biblioteca da Real Mesa Censória (que assim
se torna publica), da Biblioteca da Academia das Ciências, criada com a biblioteca do Convento
de Jesus. Em Évora cria a biblioteca e o museu. 131
LEAL, Silva (1878) As Ruínas do Carmo, Lisboa tipografia Universal, pag 14.
Ilustração 35 –Mumia peruana no Museu do Carmo
Ilustração 36 – Capa do Catálogo sobre as colecções do musue e história do museu
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199 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
um plano cronológico, como na época era considerado necessário para uma narrativa
pedagógica, optando-se por se manter as linhas de equilíbrio do edifício.
A partir dessa época a sua evolução estagnou. As obras que recentemente foram
realizadas no espaço do museu mantiveram a concepção inicial, introduzindo melhorias
no espaço público. Como museu romântico não têm nada de África no seu interior. É
um museu que continua a ter uma linguagem doutro tempo e a falar de realidades
também elas já fora das preocupações dos museólogos.
4.2.2 Museu Nacional de Arte Antiga
O Museu Nacional de Arte Antiga 132
procura apresentar um acervo de seiscentos anos
da história portuguesa europeia no âmbito da pintura, escultura
e arte ornamental (cerâmica, ourivesaria, mobiliário) de que
possui um rico espólio distribuído por várias colecções de que
destacamos: pintura portuguesa e das escolas espanhola,
italiana, alemã, holandesa e flamenga; escultura; ourivesaria;
cerâmica e tapeçaria.
O museu localiza-se actualmente na Rua das Janelas Verdes
em Lisboa, ocupando os edifícios do Palácio dos condes de
Alvor e o antigo convento de Santo Alberto.133
. A origem da
instituição verifica-se em 1884, a partir dum espólio de obras
de arte apresentados em 1882 no Palácio dos Marqueses de
Alvor numa ―Exposição Retrospectiva de Arte Ornamental Portuguesa e Hespanhola‖
que reuniu um conjunto de obras depositadas na Academia de Belas-Artes, na altura
instalada no Convento de São Francisco. Mais um conjunto de colecções particulares e
outros objectos recolhidos um pouco por todo o país. A exposição teve como curador
Conde de Almedina.
132
Elaborado a partir de PEREIRA, Maria LEVASS, (1973) O Museu Arqueológico do Algarve
(1880-1881), subsídios para o estudo da museologia em Portugal, Dissertação apresentada ao
curso de conservador de museu, Lisboa, Separata dos Anais do Município de Faro, 1981, com
SANTOS, Maria Alcina Ribeiro Correia Afonso (1970), Aspectos da Museologia em Portugal
no Século XIX, - Lisboa, Lisboa, Dissertação Apresentada no exame fina do Curso de
Conservador de Museu, Direcção Geral do ensino superior e das Belas Artes, 139 p 133
O Palácio Alvor foi mandado construir em 1690 por D. Francisco de Távora, conde de
Alvor; o filho vendeu-o a Matias Aires da Silva de Eça, provedor da Casa da Moeda;
posteriormente, ainda, foi adquirido por Paulo Carvalho de Mendonça, irmão do Marquês de
Pombal, a quem acabará por pertencer, através de herança. Tendo permanecido na família do
Marquês, foi por diversas vezes alugado, primeiro a Gabriel Gildemester, cônsul holandês em
Lisboa e, por último, ao Estado que aí acaba por realizar a Exposição de Arte Ornamental. Ao
longo de todo este período, o edifício sofreu várias campanhas de obras que desvirtuaram a sua
traça original.
Contíguo ao Palácio, a oeste, ficava o Convento de Stº. Alberto, também conhecido por
Convento das Albertas, de freiras carmelitas descalças, fundado em 1584 pelo arquiduque
Alberto, de cujo interior apenas se conservou a capela, integrada no museu como um excelente
exemplo de decoração de azulejos e talha dourada, típicos em Portugal entre os séculos XVII e
XVIII.
Ilustração 37- Capa do Catálogo da Exposição Portugal e o Mundo
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200 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
A questão da criação dum museu com o espólio das obras depositadas na Academia de
Belas Artes já tinha vindo a ser discutida deste o início do século XIX. À abolição das
ordens religiosas em 1834, por decreto de 28 de Maio, provocou a incorporação dos
bens pertencentes aos conventos no erário público. Em 1835 é
nomeada um Comissão para Estudar a estudar, classificar e
organizar todos os objectos recolhidos dos conventos. A criação da
Academia de Belas Artes de Lisboa em 25 de Outubro de 1836 vai
assumir esta função. Aí surgirá ―Galeria Nacional de Pintura‖ com
funções, para além da conservação do espólio, organizar
exposições públicas de Belas-Artes e de formar artistas e artesãos.
O Convento de S. Francisco depressa se revelou impróprio para tão
intensa actividade e as colecções de arte não tiveram o tratamento
museísitico de relevo. A academia transforma-se essencialmente
numa instituição formadora, onde professores como Tomás da
Anunciação e Francisco Metrass ensinam. Em 1860 a Academia é
reformada com base na crítica ``a reprodução acrítica de modelos e
apontava para a necessidade de a escola dispor de galeria de estudo
para os alunos pudessem observar obras de arte e explorar uma
obra de arte. Surge assim uma necessidade de criar uma ―galeria de pintura‖. Em 1875
com a reforma do ensino de Belas-Artes do Marques de Sousa Holdstein a questão dos
museus de arte é referida como uma necessidade educativa essencial. Eram os
argumentos na altura ―auxiliar de ensino, elemento civilizador ―, ―instrução do povo‖,
―distracção‖, ―embelezamento e enriquecimento da capital‖, ―recolha das riquezas
dispersas‖ e que deveriam ser criados em Lisboa e outras terras da província. Neste caso
propõe-se a criação de museus de etnologia com objectos das colónias.
Ainda no Ano de 1875, um vogal anónimo desta comissão, faz publicar uma brochura
―observações sobre o actual estado de ensino da arte em Portugal, a organização dos
museus e o serviço de monumentos Históricos e de Arqueologia, oferecido à Comissão
nomeada por Decreto de 10 de Novembro de 1875‖134
No entanto, a ideia da criação de um museu que expusesse a colecção aí armazenada só
encontrará resposta em 1882 no decurso da Exposição de Arte Ornamental, no Palácio
dos Condes de Alvor. A exposição foi inaugurada pelos reis D. Luís de Portugal e D.
Afonso XII de Espanha. A mostra apresentava ao público português as peças que
haviam figurado numa exposição de arte da Península Ibérica realizada no ano anterior
em Londres. O êxito que conheceu, o elevado número de visitantes que teve e a
polémica que suscitou foram elementos determinantes para que se começasse a
considerar o palácio como uma hipótese viável para a concretização desse espaço em
museu. Dois anos depois, o Estado comprou o edifício das Janelas Verdes que lhe
estivera alugado e determinou que para lá fossem transferidas as colecções que se
encontravam sob a responsabilidade da Academia. Durante toda a década de 70 a
134
Lisboa, Imprensa Nacional , 58 p
Ilustração 38 - Estatueta em Madeira do Congo
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201 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
discussão sobre a organização museológica das artes é uma constante. A questão da
criação do museu de Belas Artes transparece das folhas de despesa da Academia, como
intenção de investimento. A Exposição de 1882 e a sua transformação em museu resulta
portanto duma reflexão desenvolvida no âmbito da comunidade e a exposição de 182 é
uma oportunidade que dá visibilidade pública, a partir da qual a constituição do museu
foi possível.
Uma discussão sobre o papel da Academia de Ciência, a Academia de Belas Artes (na
Época Academia de Lisboa)
O Museu de Belas Artes e Arqueologia abriu ao público a 12 de
Junho de 1884. A colecção foi enriquecida com doações (espólio de
peças de pertencentes à rainha D. Carlota Joaquina, entretanto
vendidas em hasta pública, após a derrota miguelista); colecções
legadas ou adquiridas com verbas oferecidas para esse fim por
diversas personalidades entre as quais poderemos destacar os reis D.
Fernando II e D. Luís, o conde de Carvalhido, o visconde de Valmor,
o conde dos Olivais e Penha Longa, entre outros; e, por fim, peças
adquiridas pela própria Academia a particulares ou em leilões. São
directores deste museu, António Tomás da Fonseca (1884-1895),
António José Nunes (1895-1900). Manuel de Macedo (1901-1911)
Em 1895 foi realizada uma Exposição de Arte Sacra Ornamental135
A Implantação da República em 1910, e a publicação da Lei da Separação da Igreja e do
Estado leva à incorporação de bens dos Palácios, Sés e demais edifícios episcopais cria
um novo fluxo de objectos. O Decreto de 26 de Maio de 1911 vai desdobrar o Museu de
Belas Artes e Arqueologia em duas instituições museológicas distintas: o Museu
Nacional de Arte Antiga, que continua na Rua das Janelas Verdes e engloba todas as
colecções anteriores a 1850. As colecções adquiridas a partir desta data são
reconduzidas ao antigo convento de S. Francisco, dando origem ao novo Museu
Nacional de Arte Contemporânea.
O novo conservador José de Figueiredo impõe uma dinâmica nova no museu,
constituindo-o como um centro de investigação e crítica de arte, nem sempre bem vista
o pela intelectualidade do tempo. Criou um Grupo dos Amigos do Museu que, entre
outras actividades de carácter cultural, foi agente activo da aquisição de novas peças
para a colecção (acervo), e levou a cabo uma importante campanha imprensa, para
sensibilizar a opinião pública para a remodelação das instalações. Só em 1940, com as
comemorações dos centenários, e a inauguração da Exposição ―Os primitivos
Portugueses‖ foi aproveitado o espaço do convento das Albertas, contíguo ao Palácio
Alvor e que fora entretanto derrubado, como um Anexo ao Museu.
Após a exposição o edifício sofreu obras de remodelação tendo sido abertas novas salas,
criadas instalações para bibliotecas, zonas de exposição, o gabinete de estampas e um
auditório. Ainda durante os anos 50, o Grupo de Amigos do Museu, de forma
135
Descrita em GONÇAVES, António Manuel (1965), As origens do museu nacional de Belas-
artes, Lisboa, Museu Nacional de Belas Artes.
Ilustração 39- Saleiro em Marfim da Costa do Marfim
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202 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
voluntária, iniciaram as acções educativas com Madalena Cabral136
. Era nessa época
director do museu João Couto, que havia sucedido a Reinaldo dos Santos.
Em 1982 com a XVII Exposição do Conselho da Europa,
realizaram-se importantes obras no anexo, com a criação
duma nova entrada criou-se um amplo salão para
exposições temporárias. Nesta entrada foi instalado uma
loja e um bar.
Actualmente o Museu Nacional de Arte Antiga oferece-
nos três grandes núcleos museológicos: arte portuguesa
que engloba pintura, escultura, pintura luso-flamenga;
influência da África e Ásia através de objectos de origem
africana, chinesa, arte nanbam e arte indo-portuguesa; e
arte estrangeira na qual encontramos pintura europeia do
séc. XIV ao XIX, artes ornamentais, ourivesaria e têxteis.
Da exposição temporária, Portugal e o Mundo, falaremos a
seguir. Os objectos de África reduzem-se à cadeira do Rei
do Congo. Há, na abordagem mobiliário do século XVI, uma nítida influência de
formas ornamentais mais próximas do mediterrâneo. Todavia o museu não apresenta
nenhuma leitura dessa especificidade, preferindo integrar a pintura, as artes decorativas
na linha da ―integração europeia‖, na sua afiliação a uma história de arte como expoente
duma civilização, como expressão duma nação. Nessa viagem esquece aquilo que agora
procura mostrar com exposições temporárias. Interessante esquecimento.
4.2.3 Museu do Chiado
O Museu nacional de Arte contemporânea, no Chiado é fundado pelo Decreto de 26 de
Maio de 1911, instalado provisoriamente no antigo Convento de são Francisco, onde já
se encontrava instalada a Academia Nacional de Belas Arte, A Biblioteca Nacional e o
Governo Civil. Integra as colecções de arte incluídas no Museu de Bellas Artes e
Arqueologia posteriores a 1940. Trata-se portanto de um museu pós-romantismo.
Carlos Reis foi o seu primeiro director (1911-1914) que instala o museu, sendo
sucedido por Columbano Bordalo Pinheiro até 1929. Durante esse período, da
afirmação do modernismo, o espaço do museu é alvo dum projecto de remodelação do
Arquitecto Luís Monteiro, sendo o espaço museográfico organizado em torno de oito
salas que mostravam o movimento romântico, o naturalismo e algumas manifestações
da arte moderna. O período do terceiro directo Adriano de Sousa Lopes, pintor
moderno, amplia as instalações e envolve-se num diálogo entre o modernismo e o
academismo, que na época dominava o ensino em Belas Artes. A partir de 1944 até
1959, com Diogo de Macedo, também modernista, a acção do museu vai ampliar-se. Na
época a ―política do espírito‖ de António Ferro ditava orientações para a estética
nacional. As exposições de Belas Artes eram vividas emotivamente pelos intelectuais
lisboetas. O director sobre aproveitar o momento para abrir o museu à comunidade e
dialogar com a modernidade. Foram não só incorporados novos artistas, como o espaço
136
Ilustração 40 - Reprodução do quadro de Criado (proprietario holandês)
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203 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
dos museus e as suas exposições eram frequentadas pelos estudantes de Belas Artes. O
museu incorpora muitos jovens pintores em início de carreira, como Júlio Pomar,
Vespeira Resende, etc. A partir de 1945 o museu passa a dispor de uma entrada
autónoma (da do Largo da Biblioteca Pública) e constitui-se o Grupo de Amigos do
Museu Também sob o seu impulso, publica um conjunto de
monografias sobre os artistas representados nas colecções e
impulsionou a participação do museu em importantes bienais de
arte (Veneza, São Paulo) que contribuíram para criar um prestígio
internacional do museu.
A sua morte em 1959, com a substituição pelo pintor Eduardo
Malta conduz o museu para um momento ―negro‖ da sua história,
iniciando-se uma feroz perseguição à arte moderna e uma
valorização do naturalismo. Na época verificou-se um amplo
movimento de contestação desta nomeação por parte dos
intelectuais lisboetas. Macedo havia enviado para estagiar nos EEUU Carlos Azevedo
para preparar a sua sucessão. A nomeação de Malta leva ao abandono de Azevedo que
passa a colaborar com a entretanto recém-formada Fundação Gulbenkian.
O consulado dos Malta no Museu de Arte Contemporânea foi um período de paralisação
do movimento de acompanhamento das artes e da sua comunicação com o público. Em
1970, Maria de Lourdes Bertholo inicia um movimento de modernização,
desenvolvendo vários projectos em parceria com galerias de Lisboa para aquisição e
exposição de obras de pintores. Várias obras de melhoramento foram efectuadas durante
este período. Por exemplo, a electrificação do museu só foi concluída em 1977. Apesar
dos esforços desenvolvidos o museu havia perdido a sua ligação com a comunidade e
não conseguiu recuperar o protagonismo. A política de aquisição também não se
mostrou adequada, tendo sido adquiridas muitas obras irrelevantes, que representam um
esforço de conservação muito elevado, para uma mostra das rupturas da arte
contemporânea e das suas vanguardas. Em 1987 o museu foi encerrado para
reinstalação das reservas, consideradas então como estando em risco de deterioração,
sem que a cidade tivesse dado pela falta deste museu.
O Incêndio do Chiado em 1988 e o apoio de mecenas foi criada a
―Association pour le Chiado‖ e desenvolvido um projecto de Jean
Michel Wilmotte para renovação do espaço museal. Em 1994 o
Museu do Chiado abre ao público tendo como directora Raquel
Henriques com novos espaços. No espaço de entrada do museu
foi criado um pátio onde foram dispostas esculturas e um
pequeno jardim que pode ser usufruído com o Bar. Dispõe de
uma ampla sala de exposições e duma loja no primeiro piso. No
corpo do edifício foram mantidos elementos que registam a
memória histórica, nomeadamente a presença dos fornos de cozedura do pão.
Ilustração 41 - Capa de Almada Negreiros para exposição em 1934
Ilustração 42 – Busto em Madeira da exposição
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204 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Actual director Pedro Lapa desenvolve uma política de exposições ode procura mostrar
diálogos entre as várias escolas de pintura, os momentos de ruptura. Não têm uma
exposição permanente, sendo que as exposições vão-se sucedendo no espaço ao longo
do tempo.
O Museu dispõe de um serviço educativo, que conta com a colaboração de Catarina
Moura 137
que desenvolve várias actividades com público e com a comunidade. Os
públicos do museu são classificados em três tipos: Escolas do ensino básico e
secundário, universitários e grupos com visita marcada. Para cada um dos grupos são
desenvolvidos trabalhos específicos de busca duma relação com o acervo. O objectivo e
inter-relacionar o visitante com uma experiencia de interrogação com a obra. Durante o
fim-de-semana são também oferecidas a possibilidade de integração de visitantes
espontâneos em ―workshops‖
Por exemplo com as escolas desenvolve o
projecto ― O Visível e o Invisível‖ onde
procura desvendar as técnicas de pintura, de
ruptura com a geometria clássica e de
reconstrução da dimensão estética, do uso
das cores. O objectivo da presença do
museólogo é desencadear um processo de
leitura, uma técnica, que depois é incentivada
a ser utilizada pelo visitante na construção
dos seus próprios percursos.
O trabalho com a comunidade envolve, para além do desenvolvimento de protocolos
com as escolas da área de inserção dos museus (Madragoa, Bairro Alto) para utilização
do espaço do museu como espaço de aprendizagens, são ainda desenvolvidos trabalhos
com comunidades específicas em cooperação com o sistema de saúde.138
Em 1934, no âmbito do Congresso Colonial é feita uma exposição denominada ―Arte
Indígena Africana, com uma selecção de obras de Luiz de Montalvor e Textos do Diogo
de Macedo.139
que a seguir falaremos. Não encontramos África neste museu, mas
encontramos uma abertura e uma sensibilidade à comunidade.
137
Os serviços educativos surgem nos anos 50 no Museu de Arte Antiga com Madalena Cabral
e Madalena Cagigal do Museu Nacional dos Coches. Era na época grupo de ―senhoras
beneméritas‖ (voluntarias do Grupo de Amigos do Museu) que organizavam as visitas de
grupos escolares. A fundação Gulbenkian é o primeiro museu a dispor de serviços educativos
autónomos. Com Manuela Guedes. A introdução dos serviços educativos na organização dos
museus do Estado data de 1980 e a sua legislação é de 1981 138
Por impossibilidade de tempo não pudemos participar numa desta iniciativa, que serão
retomadas em Setembro. 139
Lisboa, Edição Ática, 1934
Ilustração 43 – Mascaras de Moçambique na Exposição
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4.2.4 Museu da Sociedade de Geografia
A questão dos museus etnológicos portugueses encontra-se bem trabalhada na tese de
Maria Manuel Cantinho Pereira em 140
―O museu etnográfico da
Sociedade de Geografia de Lisboa‖. A questão do olhar sobre o
outro africano está presente, pelo menos, desde o século XV. Do
outro humano e do outro natural, já que essa componente de
exploração é igualmente interessante para entender a confrontação
com o diferente e a diversidade. Dos documentos de Valentim
Alexandre e da Carta de Pêro Vaz de Caminha, até à historiografia
mais recente muito se tem reflectido sobre o contacto e as trocas
culturais. A tese de Maria Manuel tem a vantagem de fazer uma
leitura actualizada sobro o processo de formação de processos
museológicos com base nos objectos provenientes de outras áreas
culturais, como enquadramento do surgimento da Sociedade de Geografia de Lisboa,
uma instituição privada, mas que será determinante para a concretização do ―projecto
colonial/imperial africano no século XIX‖.
Estes objectos chegam essencialmente como curiosidades. Até ao século XVIII existem
notícias sobre as suas existências mas não temos imagens nem descrições que permitam
efectuar uma análise de conteúdo. A partir desse século, verifica-se que o espírito
científico de recolha e sistematização duma colecção, aquilo a que pudemos chamar de
um museu se verifica por via da Academia das Ciências, por determinação da coroa e
por via das Instituições de Ensino. Mesmo assim, apenas no início do século XIX se
conhecem as primeiras pesquisas sistemáticas nas ―Nações Ultramarinas‖ (op.cit.65).
As primeiras referências concretas a objectos encontram-se no ―Diário‖ manuscrito da
viagem que o Arcediago de valência fez a Portugal em 1872, D. Francisco Perez Bayer,
que indicava o museu do Marquês de Anjeja , onde se viam armas de los índios de
madera, instrumentos para cortar arboles e labrar‖ (citado por OLIVEIRA, 1971, 24).
Mais tarde, o celebre Museus Mayanese do padre José Mayne terá objectos que
poderemos classificar de etnográficos, e que vão integrar o Museu da Academia das
Ciências. (ibidem) Ainda segundo Veiga de Oliveira, estes dois museus atestam a
relação entre a etnologia e a história colonial.
Aliás será a Academia das Ciência que em 1797 remete instruções aos seus associados
no ultramar, para remeterem para o Museu objectos desses países. Na maioria dos casos,
terão sido enviados objectos de história natural.
A Associação marítima colonial, criada em 1838, constituída ela ala radical dos
Setembristas, e com sede no Arsenal do Alfeite, terá sido, como diz Manuela Cantinho,
o grupo responsável pela afirmação da necessidade da exploração africana e da
140
CAENTIBHO, Maria Manuel Cantinho (2005) O Museu Etnográfico da Sociedade de
Geografia, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian. Tese de Doutoramento em Antropologia
Cultural no ISCTE
Ilustração 44 – Capa de Livro sobre o Museu da Sociedade de Geografia
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206 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
necessidade dum ―muzeu‖ em Lisboa para apresentar as potencialidades do comércio
com as colónias. Esse museu abre em 1844 com objectos coloniais. Esta função de
colecções de produtos coloniais transporta uma componente de acção prática que
procura o que existe, mostra para poder utilizar. Estamos portanto perante uma atitude
de olhar o muzeu como um instrumento de desenvolvimento.
Curiosamente, Cantinho faz publicar uma Portaria de Sá da
Bandeira, de 19 de Julho de 1838, em que, em nome da Rainha,
manda o governador da província de Moçambique, formar uma
biblioteca, num edifício publico adequado e ―convidando os
moradores para concorrerem para a sua formação‖ . Da parte do
reino serão enviados livros pertencentes os extintos conventos das
ordens religiosas. Alem disso, acrescenta ―sua Magestade
recomenda a creação dum museu, destinado principalmente á
colleção dos productos mais raros de África; e ultimamente, a de
um Jardim Botanico, que contenha as mais interessantes plantas africanas e sirva para
aclimatar as de outras partes do globo. (op.cit , 73). Ao lermos esta parte aprecemo-nos
que essa biblioteca ainda sobrevive na Ilha de Moçambique, que como se sabe era na
época a cidade capital da colónia.
Voltando à colecção colonial, sabemos que em 1870 o Ministério da Marinha criou o
Museu Colonial, na direcção Geral do Ultramar, reuniu colecções e exposição de
produtos coloniais. Instalado no Arsenal do Alfeite, não está clara a sua distinção em
relação ao museu de marinha. Em 1892 o museu foi extinto e o seu espólio integrado na
Sociedade de Geografia de Lisboa. Faziam parte do seu espólio os padrões de pedra de
Angra do Ilhéu, De Bartolomeu dias, do Cabo de Santa Maria, de Diogo Cão, de são
Jorge do Congo Mina, o sarcófago com as relíquias de Afonso de Albuquerque, o
telescópio a cadeira de Levigstone, dois globos de Cornelli, um vitral com o retrato de
Fernão de Magalhães, portulanos e espécies e curiosidades exóticos (madeiras, tecidos,
plantas). Na época existiam réplicas de africanos das colónias com os respectivos trajes
regionais. Existia igualmente uma colecção em barro, com a s figuras regionais
coloniais.
Este museu integra-se na lógica da participação nos eventos Congressos Internacionais,
feiras internacionais, comemorações que a partir da segunda metade do século XIX
abundavam em Portugal. Serviam fundamentalmente para depósito entre eventos,
disponibilizando os acervos.
Quando em 10 de Novembro de 1875 é criada a Comissão Central Permanente de
Geografia, na sequência da participação de José Júlio Rodrigues no Congresso
Internacional de Ciências Geográficas, inicia-se uma frutuosa cooperação com outros
países, na troca de produtos, mapas e publicações de carácter geográfico. Entre os vários
objectivos desta sociedade encontrava-se a troca de produtos coloniais. Nomeados os
vogais pelo Estado instalado no Ministério da Marinha a sociedade organiza um museu
etnográfico.
Ilustração 45- Reprodução de Catálogo de colecção
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207 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Ora o conjunto de personalidade que se reúnem na Sociedade de Geografia de Lisboa
(nome pelo qual passa a ser conhecida a partir de 1876, vão iniciar um esforço de
conhecimento dos territórios africanos, e asiáticos. As expedições trazem sempre os
seus espólios, de objectos recolhidos nas campanhas, que alimentam a colecção de
etnologia. Ou seja, como diz Maria Manuel Cantinho, (op.cit, 114) o paradigma
comercial é substituído pelo paradigma cientifico. Os objectos são incorporados pelo
seu valor cientifico, de conhecimento, em prejuízo dos valores comercias, que
continuam a existir ao nível dos grandes certames internacionais. Esta emergência do
cientismo está ligada à emergência do positivismo (método) à vida cultural lisboeta, às
conferências do casino, ao grupo dos Estudos Superiores de Letras. Um conjunto de
factores que vão fazer evolucionar os museus para espaços de
cultura. E será durante estas viagens que se reunirão os principais
acervos etnológicos nos vários museus, nomeadamente o do
Museu da Sociedade de Geografia de Lisboa. Manuela Cantinho
marca a institucionalização do museu em 1892, com a
incorporação do espólio do Museu Colonial e com a criação da
identidade de Museu Etnográfico e Colonial. O percurso seguido
pelo museu até aí é bastante difuso, inclui diversas integrações,
sem uma estratégia específica. A partir de 1892, o projecto
museológico assume-se e a organização interna do museu passa a
mostrar colecções. Esta colecções são variadas passam por
objectos do quotidiano, objectos sagrados (estatuária),
fotografias, memórias e livros de homens da ciência e da
missionação.
O desenvolvimento do museu e das suas colecções encontra-se muito bem referenciado
por Maria Manuel Cantinho. Resta salientar que o actual edifício ocupado pela
Sociedade de Geografia, na central Rua das Portas de Santo Antão na Baixa lisboeta é
construído de raiz pela instituição em 1897.
O modelo de organização do espaço manteve-se até à actualidade. A sociedade
desenvolve um conjunto de actividades, através das suas várias secções, mantêm uma
importante biblioteca com milhares de títulos (foi-nos
referido 300.000) sobre temas coloniais, cartas geográficas
e dispõe cerca de 50.000iamgens digitalizadas. Publica
ainda o Boletim desde 1875. O museu encontra-se instalado
no Salão Portugal (há uma sala Gil Eanes com o espólio do
antigo museu colonial) que segue uma organização de
espaço comum no final do século XIX para galerias de
Estudo, com um amplo espaço central desafogado, para
conferências ou exposições temporárias, e com um
conjunto de2 pisos de galerias com armários a forrar as
Ilustração 46 – Estatuetas em Madeira dos Bijagós
Ilustração 47 – Banco em madeira de Moçambique
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paredes. Nesses armários, ainda visíveis nos dias de hoje, os objectos eram depositados
para estudo. A inauguração da sala Portugal é efectuada juntamente com as
comemorações do 3ª centenário da chegada de Vasco da Gama à Índia.
Este museu do final do século XIX demonstrou alguma vitalidade durante os primeiros
anos da sua existência. Gradualmente, a partir da emergência do Estado Novo com o
crescente distanciamento entre a posição da Sociedade de Geografia e a política
colonial, o museu perdeu dinâmica de intervenção. A sua intervenção no congresso
colonial de 1934 (Porto) é diminuta. Quando se pensa na fundação dum museu do
colonial português (ver museu de etnologia) o museu da sociedade de geografia está
praticamente esquecido.
Este museu continua a poder ser visitado por marcação. Em cerca de 1, 5 horas efectua-
se uma visita com guia ao museu que se encontra numa fase de transição. Estão em
curso trabalhos de conservação. Actualmente o conceito expositivo da colecção de
etnologia é o agrupamento por temas. Armas, instrumentos de música, mascaras,
instrumentos de trabalho. Actualmente o museus dá espacial destaque às peças do
oriente (China e Japão), devido ao maior número de visitantes que procuram estes
temas.
4.2.5 Museu Nacional de Arqueologia Dr. Leite de
Vasconcelos
Fundado em 1893 com o nome de Museu Etnográfico
Português e instalado então numa sala dos serviços
geológicos, foi uma iniciativa de José Leite de Vasconcelos,
apoiada por Bernardino Machado141
(então ministro das
obras públicas, comércio e industria) Leite de Vasconcelos,
médico, dedicava-se aos estudos de filologia e etnologia
desde 1893. A etnologia era para Leite de Vasconcelos a
ciência maior, a ciência e a Influência de Frei Manuel do
Cenáculo142
são uma inspiração.
141
Bernardino Machado (1851-1944) nasceu no Rio de Janeiro. Lente de Matemática e Física na
Universidade de Coimbra, Maçom desde 1874 (da qual foi Grão-mestre entre 1895-1899). Foi
Ministro no governo de Hintze Ribeiro. Foi uma figura muito activa na área da divulgação da
ciência e defensor da escola, bibliotecas e museus. Cria na Universidade de Coimbra o Museu.
Foi duas vezes presidente da Republica, nunca completando o mandato (1917 e 1926). Viveu
exilado até 1940. 142
Veja-se VASCONCELOS, José Leite de (1898) O Museu de Cenáculo em Beja em 1791:
Notícia extraída de um manuscrito, Lisboa, Imprensa Nacional,,p. 7 Vasconcelos Trata-se
duma leitura do discurso de Frei Manuel do Cenáculo sobre a inauguração da colecção do
museu do cenáculo em 15 de Março de 1791,em Beja. Era um manuscrito que se encontrava na
biblioteca do Visconde da Esperança, na quinta da Manisolam ― Catalogo dos principais
manuscritos, da livraria editado em Évora em 1897. O museu era constituído pela colecção de
arqueologia, feita por André de Resende, patriarca da arqueologia portuguesa, no século XVI.O
manuscrito ―feito á pena de Frei José Lourenço do Valle, e reportam è descrição (inventário) do
museu criado em Beja por Frei Manuel do cenáculo, quando Bispo de Beja continha produtos
Ilustração 48 - Capa de publicação sobre Leite de Vasconcelo
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Com Leite de Vasconcelos afirma-se o projecto museológico, a instalação do museu nos
Jerónimos (1902), uma dotação orçamental própria. A constituição deste museu é
influenciada pelo espírito da época : -Em 1959, o então director do MNAA, António
Manuel Gonçalves, em homenagem ao Museólogo Leite de Vasconcelos143
afirmava
que este interesse pela arqueologia havia
começado em 1857, com a criação da Comissão
Geológica, onde participaram nomes da ciência
geológica tais como Geólogos Pereira da Costa,
Carlos Ribeiro e Nery Delgado. Nesta altura,
paralelamente aos trabalhos de Possidónio da
Silva, os arqueólogos Augusto Filipe Simões
Borges de Figueiredo e Martins Sarmento vão
efectuar os primeiros trabalhos de arqueologia e
organizar, em Lisboa o I congresso de
Antropologia e Arqueologia Pré-história em 1880.
Neste congresso participam Gabriel Pereira, Santos Rocha, Estácio da Veiga, Pereira
Botto, Martins Capela e Leite de Vasconcelos, que irão dar continuidade aos trabalhos
em vários pontos do país.
A criação do primeiro núcleo museológico de arqueologia é feita nas instalações da
Comissão Geológica,144
à Academia das Ciência. Como já vimos a Associação dos
Arquitectos Civis Portugueses, ao tomar posse do Convento do Carmo, instala aí o
Museu Arqueológico em 1864. Em Coimbra o Museu de Antiguidades é instalado em
1873. Em Santarém, em 1876 é cria o primeiro museu regional, ao qual sucede o de
Elvas em 1880 e o Museu Martins Sarmento (Arqueológico) de Guimarães em 1884.
Nesse mesmo ano abre o Museu Nacional de Belas Artes e Arqueologia, no palácio das
Janelas Verdes, mas onde a arqueologia não têm galeria. A proposta de Leite de
Vasconcelos visa suprir a ausência desse museu em Lisboa ―uma galeria nacional de
arqueologia que emparceira-se com as outras capitais europeias‖ p. 46. Havia aqui
uma nítida vontade de abordar o museu como uma instituição científica de investigação
e comunicação, distinguindo-se assim do museu ―romântico do Carmo‖ que não se
de ethnografia selvagem e moderna, e produtos de história natural. ―Disto restam ainda algumas
coisas no Museu de Évora‖ Leite de Vasconcelos exalta exaltação a abertura deste museu ao
público, que terá sido, em Beja o primeiro museu público.
143 GONÇALVES, António Manuel (1959) ― O Arqueólogo Leite de Vasconcelos‖ in Separata
do I volume das Actas e Memórias do I congresso Nacional de Arqueologia,,Lisboa , tipografia
portuguesa, pp45-60
144 A Comissão Geológica Nacional é criada em 1857, com a missão de proceder aos
levantamentos geológicos existentes em Portugal. Recorde-se que pelo menos desde 1840,
Claude Deschamps, um francês ao Serviço da Companhia de Mineração Transtagana, havia
procedido aos levantamentos geológicos de áreas de mineração. As riquezas minerais eram a
riqueza procurada como fonte de matéria-prima para as industrias (nessa época os minerais
metálicos de cobre e magnésio). É os trabalhos desta comissão, que procede aos primeiros
levantamentos arqueológicos e etnográficos.
Ilustração 49 – Aspecto de sala de exposições do MNAE à época de leite vasconcelos
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orientava para a comunicação e comprovação duma ideia, que era a ideia de filiação
genética do povo português numa antiguidade anterior à formação da Nação. Recorde-
se que Leite de Vasconcelos participou activamente no Centenário de Camões, em
1880, e foi director da Biblioteca Nacional (188=) onde criou um pequeno Museu de
antigualhas (mais tarde são transferidas para o Museu de Arqueologia) e Editou a
Revista Lusitânia, onde publica inúmeros estudos sobre filologia. Nesta revista
colaboram grandes nomes das letras.
Durante toda a década de oitenta, na sua correspondência abundam a referência à
necessidade e anseio da criação de um Museu de Etnologia. Com a sua criação pelo
decreto de 20 de Dezembro de 1893. Leite de Vasconcelos é nomeado seu primeiro
director. A colecção base é a colecção de Estácio da Veiga145
, depositada na Academia
de Belas Artes, tendo sido então adquirido aos herdeiros destes, a restante colecção146
.
Também a colecção de Leite de Vasconcelos é integrada. Ocupando duas salas dos
Serviços Geológicos, no Convento de Jesus à Academia das Ciências. O museu deveria
servir de fundamento ao museu de antropologia integrado nessa Comissão dos Serviços
Geológicos. Entre 1894 e 1897 funcionaram duas
secções Arqueologia antigas e modernas. Ainda nesse
ano Leite de Vasconcelos funda a revista o Arqueólogo
Português147
, cujo primeiro Numero sai em Janeiro de
1895, onde serão publicados os resultados dos trabalhos
de investigação que Leite de Vasconcelos lança por
145
MOITA, Irisalva ( 1959) ―O Plano do Museu Etnológico do Dr. Leite de Vasconcelos‖, in
Separata da Revista Municipal, nº 78, 1959, 39 p. Este trabalho foi desenvolvido a partir a
dissertação da autora no concurso para conservadora adjunta dos Museus, Palácios, e
Monumentos Nacionais. Em 4 de Agosto de 1955. Nele apresenta-se uma leitura sobre o
projecto de Leite de Vasconcelos para o Museu Etnográfico. O museu representa uma ideia da
atribuição duma unidade estrutural ao povo português. É o projecto de Leite de Vasconcelos de
atribuir uma especificidade. É igualmente apresentado o percurso legislativo, é feita uma análise
do percurso Ideográfico e expositivo e efectuada uma proposta de actualização. Não será
concretizada pelo directo da época e Irisalva Moita, bolseira do IAC efectuará vários trabalhos
no ME, sento nomeada conservadora do Museu da Cidade em 1974.
146 LEITE DE VASCOCELOS (1915), História do Museu Etnológico Português (1893-1914),
Lisboa, Imprensa Nacional, pag 2 147
A publicação do Arqueólogo Português é iniciada em 1895, após a entrada em
funcionamento do Museu Etnográfico. Foi autorizado pelo Prof. Severiano Augusto da Fonseca,
director da Repartição dos Serviços Técnicos de Minas e Industrias. Foi uma publicação regular
entre 1895 e 1934, publicada em fascículos mensais. O último é publicado em 1941, pelo
Museu Etnográfico. Agregada em anuários que deu origem aos 30 volumes (29+1) que foram
posteriormente republicados pela INCM (1983) . Destinava a dar conta das noticias das
descobertas arqueológicas em todo o país. O nº 1 contém o programa editorial, que corresponde,
grosso modo ao programa de investigação de Leite de Vasconcelos no seu Museu. Percorrendo
todas as épocas da arqueologia, as notícias dão conta dos achados do programa.
Ilustração 50- exposição etnográfica
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211 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
todo o país, desenvolvendo basta correspondência com as elites locais148
O espólio
cresce por via das doações e do trabalho de excursões do director-fundador.
Vejamos qual era a visão deste museu “Este museu procura reunir elementos materiais
que concorrem para o conhecimento total da vida do homem do nosso solo desde o
alvorecer da idade da pedra até ao presente, tipos físicos, trajos, indústrias, costumes,
crenças, habitações, arranjo doméstico, gosto artístico, folganças; a sobreposição da
civilização pré-romana, romana, visigótica, arábica e posteriores; tudo o que define o
nosso povo‖ 149
Em 1897 a Academia das Ciência cede o espaço do claustro do Convento de Jesus, onde
passa a integrar a colecção lapidar, e ainda nesse mesmo ano o nome Museu Etnológico
é substituído por Museu Etnográfico. O objectivo é evitar a confusão com o Museu
Etnológico Colonial, da Sociedade de Geografia. A sua missão era ―contribuir, pela
exposição permanente dos objectos, respeitantes a todas as épocas da nossa
civilização, desde as mais remotas, para o conhecimento das
nossas origens, vidas e caracteres do povo português‖ 150
―O Museu Ethnográphico Português, com sede provisória no
Edifício da Academia Real das Sciencias de Lisboa, onde estão
instalados outros estabelecimentos scientíficos, passou por
decreto de 26 de Junho de 1897, a denominar-se Museu
Ethologico Português, denominação que melhor corresponde
ao seu actual, embora modesto e vagaroso, desenvolvimento.
Este Museu tem por fim contribuir, pela exposição permanente
dos objectos respectivos a todas as epochas da nossa
civilização, desde as mais remotas, para o conhecimento das
origens, vida e caracteres do povo português.
Com quanto se procure dar aos objectos certa disposição artística, e haja de se
attender a diversas condições materiais de installação, o que pois principalmente se
deve buscar no Museu é o methodo scientifico de classificação e do arrumo, de modo a
que os objectos fallem, por assim dizer, mais à intelligencia do visitante do que aos
olhos. Não se estanhe por isso se, ao lado de um bello instrumento de sílex, de osso ou
de marfim, se vir um caco, ou ao pé de uma estátua de mármore estiver uma inscripção
partida: é que às vezes só um caco, pela natureza da sua pasta, pela sua superfície
alisada ou tosca, pelo seu bordo, pela sua ornamentação, pode determinar-se uma data
e uma filiação histórica; e só pelo fragmento de uma epigraphe póde resolver se um
148148
Por exemplo, em 1915, após vários anos de correspondência com Manuel Mendes, Leite
de Vasconcelos efectua uma ―Excursão à Estremadura Transtagana‖, onde analisa as varias
antigualhas. No Louzal identifica o Castelo Velho do Louzal, ma estrutura defensiva na rota dos
minérios. 149
in ―Revista Lusitana‖ Vol III, p 193 150
LEITE DE VASCONCELOS (1915): História do Museu Etnológico Português (1893-1914),
Lisboa, Imprensa Nacional, pag 91
Ilustração 51- fotografias de tipos africanos utilizado por Leite de Vasconcelos
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212 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
problema importante, a situação de um oppidum, a decifração dum texto littertario
obscuro, a restituição duma palavra, ou mesmo duma língua antiga.” P. 1-2
(…)“
“Como o Museu conta ainda com muito pouco tempo de existência, e eu trabalho nisto
gratuitamente, não posso, por causa de outros trabalhos officiais, e de da falta de
pessoal que me ajude, a consagrar-me a elle senão nos dias feriados, - as colecções que
o constituem, apesar de nelas terem sido incluídas as que o benemérito Estácio da
Veiga com suprema dedicação e magnifico êxito organizou no Reino do Algarve, não
são por ora tão grandes como eu desejaria. Ainda assim estão já representadas no
Museu Ethnologico Português as seguintes colecções:
A) Antropologia, em relação ao sul
a. Crânios prehistoricos
b. Crânios luso-romanos
c. Crânios luso-wisigothicos
B) Ethnographia, em relação mais ou menos, a todo o país:
a. Prehistorica (muito bem representada)
b. Protohistorica;
c. Luso-romana (muito bem representada)
d. Luso-arabe
e. Portuguesa (antiga e moderna)
Quem quiser estudar, por exemplo, a evolução da cerâmica, pode
fazê-lo, a partir de tempos antiquíssimos, pois o Museu possue muito
vasilhame do período prehistorica, romano, árabe, sem falar de
innumeros fragmentos prehistoricos com a mais variada
ornamentação, e em diversos exemplares do período wisigothico e
português propriamente dito.” (p. 2-3)
De seguida dá conta de outras colecções Elementos de Estudo, como
lhe chama, como ephigraphia, as estelas funerárias ao deus lusitano
Endovellicus, inscrições em língua ibérica em latim, em grego e em árabe.
Ilustração 52 . Mulher africana com trajes rituais
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213 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
“Como órgão do Museu Ethnológico publica-se ora mensalmente, ora bimensalmente,
desde 1895, o Arqueólogo Português (com estampas) que conta já com dois volumes
completos” p. 2-3)151
Este livro é efectuado a propósito de necessidade de transferência do museu. Não está
nesta altura determinado para onde. Falava-se do Arsenal ou das Cortes (São Bento), a
propósito das comemorações do centenário da Índia (1898).“Logo que os trabalhos de
installação do Museu Ethnológico Português o permittam, esta abrir-se-há ao publico.
(…) cooperando assim o museu, pela sua parte, nesta grande festa nacional e
patriótica. (p. 4)
Em 1894 o pano do museu contempla as secções de Arqueologia (dividida em tempos
pré-históricos, Tempos proto-históricos e tempos históricos). Recorde-se que na época a
história era caracterizada pela existência de escrita. A segunda
Divisão, que incluía os Celtas, os Fenícios e os Lusitanos, admitia a
existência de algumas ―notícias escritas‖, quer em inscrições quer
em autores antigos. O espólio desta Divisão ―D‖ iniciava-se com a
fabricação dos metais (bronze, cobre e ferro). A última divisão ―J‖
abarcava toda a arqueologia desde a fundação da até ao século
XVIII. A II secção de ―Ethonografia‖incluíam os objectos de uso
comum, decorativo, de uso religioso, instrumentos de trabalho,
incluindo uma reprodução duma sala alentejana. Por motivos de
ordem museológica (leia-se segurança) foram criadas duas secções
autónomas Numismática (colecção de moedas antigas, gregas,
ibéricas, romanas, visigótica e árabes) e colecção de jóias.
Em 1899, a orgânica do museu deixa a Comissão dos Serviços Geológicos e passa a ser
tutelada pelo Conselho Superior dos Monumentos Nacionais. As duas secções passaram
a três. Com a criação da secção antropologia antiga e moderna., com uma divisão de
Etnografias Colonial Portuguesa (a) e Arqueologia Estrangeira (pré-história europeia e
colecção egípcia) e por falta de espaços impunha-se a transferência do edifício dos
Serviços Geológicos . O Museu imaginado como espelho duma nação deve conter nele
todos os elementos que o compõem, Por isso as três secções correspondem a esse
objectivo, ―são partes dum corpo‖ um projecto ideal da Nação para além do Estado, pela
ligação do presente aos homens do passado, e através do conhecimento dos habitantes
do território pretende criar um forte consciência nacional.
“O Museu é destinado a representar a parte material da vida do povo português, isto é,
tudo a que esse respeito etnicamente nos caracteriza”. 152
151
in VASCONCELOS, José Leite de, (1897) O Museu Ethnológico Português (1883-1897) ,
Lisboa, Imprensa Nacional, . 4 pag.
152 in o Arqueólogo Português Vol XXXIX, p 210
Ilustração 53 – Africano a transportar água
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214 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Em 21 de Novembro de 1900 é autorizada a transferência para o Mosteiro dos
Jerónimos. É instalado na ala onde estivera o Museu Agrícola. A transferência é
conduzida em 1903. No entanto, a partir de 1901 é autorizada a criação duma biblioteca,
um gabinete fotográfico, um gabinete de desenho e uma oficina de restauro. Fica
dependente da Direcção Geral das Obras Públicas e Minas e o museu continua a crescer
com a incorporação de novos artefactos provenientes de todo a país e das viagens de
Leite de Vasconcelos. A instalação nos Jerónimos é acompanhada por Leite de
Vasconcelos e Félix Alves Pereira, seu colaborador, com uma reformulação do projecto
expositivo segundo uma linha cronológica e etnográfica (I secção) e Geográfico e
temático (II secção). A III secção apresentará (antropologia) será apresentada uma
ordem geográfica (antropologia antiga) e cronológica (antropologia moderna)
Com a implantação da Republica em 1910 passa a depender do Ministério do Interior,
juntamente com os outros museus nacionais, do seu conselho de Arte e Arqueologia.
Nessa época levanta-se uma polémica no parlamento (deputado Eduardo de Almeida). É
nesse período que é organizada uma sindicância à administração de Leite de
Vasconcelos. A publicação da história dos Museus
Etnológico Português é a resposta a esta sindicância153
. O
motivo terá sido uma longa viagem que o director havia
feitos ao Egipto e Médio Oriente, onde tinha feito a
aquisição de vários artefactos. Entretanto em 7 de Junho de
1913 o Museu passa a depender do Conselho de Arte e
Arqueologia, agregado à Faculdade de Letras onde
Vasconcelos era lente desde 1911. Em 1914 são efectuadas
obras de melhoramento no espaço do museu, com ampliação das instalações e em Julho
é publicado o regulamento do Museu onde Leite de Vasconcelos expressa os seus
princípios de museologia
1. Incorporação. Recolha por todo o país de acordo com um plano
a. Critério de Classificação ―Ao discernimento e bom senso das pessoas que
superintendem nesses museus deve no entanto ficar a decidir, em caso de
dúvida, para qual dos museus deve ir um objectos‖ (p. 53) referindo-se à
escolha museu etnografia, arte ou industrias
2. Conservação e Exposição ―il est un laboratoire e il est un thèatre‖ p
53.Museu como livro de estudo
3. Documentação. Leite de Vasconcelos como homem enciclopédico expressa-
se através das publicações. As suas Notas de viagens e notas de estudo é
publicado, as aquisições são noticiadas ―jamais coloques no museu um
objecto sem rótulo‖, afirma Leite de Vasconcelos.
153
Decorrente da legislação republicana proibiu-se igualmente a acumulação de empregos
públicos (Vasconcelos era igualmente Conservador da Biblioteca Nacional)
Ilustração 54 -Aldeia africana
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215 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Em 1920 Leite de Vasconcelos inicia a publicação do Boletim de Etnografia,
Publicação do Museu Etnológico Português, por ele dirigida. Saem 5 números154
. No
seu primeiro numero escreve Leite de Vasconcelos ―Constando o Museu Ethnologico de
duas secções principais, Arqueologia e etnografia, e tendo, já desde 1895, como órgão
d’aquela o Acheologo Português, terá agora como órgão da segunda secção o presente
boletim, que porém não se circunscreverá nas cousas possuídas pelo museu, mas
tomará mais largo âmbito, como o archeologo faz.‖ (advertência preliminar),
prosseguindo “O boletim estudará os objectos etnográficos (ergografia e
ergologia155
)‖. Assim considera a arqueologia como a etnologia do passado, e o estudo
dos objectos materiais que provêm da tradição, é, por assim dizer, arqueologia do
presente.
Em 1929, no nº 4, (pp. 21-31) publica artigo sobre etnografia colonial. Há beira da
reforma era regente da cadeira de arqueologia na Faculdade de Letras e usava o método
de analogia de objectos para explicar os povos pré-históricos associados aos povos
primitivos. Neste artigo tem um referência ao objecto de madeira Sado pelos Macondes
que habitavam no Norte (Niassa).
Em 1922 Leite de Vasconcelos inicia a reformulação do programa, para a integração das
quatro alas do convento, previstas no projecto original de
reconstrução dos Jerónimos. Esse espaço tinha previsto a
ocupação pelo Secção etnológica e para a abertura dum espaço
dedicado à expansão marítima e dos descobrimentos, mais tarde
ocupado pelo Museu de Marinha156
e que não foi concretizado
Em 1929 o programa do museu tinha sido cumprido. As secções
de arqueologia e Etnografia eram as melhores do país, embora a
3ª secção estivesse apenas esboçada. Nesse ano Leite de
Vasconcelos é nomeado director honorário titula que matem até
ao seu falecimento em 1941 e o museu passou a chamar-se
Museu Etnográfico Leite de Vasconcelos157
.
154
nº 1 ,(1920)Lisboa, Imprensa Nacional, 52 p; nº 2 (1923, 60 . p ; nº 3 (1924), 47 p.; nº4,
(1929) 58 p.; nº 5 Lisboa, 1938, 103 paginas, com índice alfabético dos vol 1 a 5. 155
Ergologia e Ergografia - estudo das técnicas de trabalho e descrição das técnicas do trabalho 156
O Museu de Marinha havia sido criado em 1836, pelo rei d. Luíz na dependência da
Secretaria de Estado de Negócios da Marinha, com base nas colecções de produtos exóticos
enviados para Lisboa pelos oficiais cirurgiões da armada. Funcionaria na Sala do Risco. Durante
o século XIX foram reunidos vários elementos considerados exóticos. Em 1863, é anexo à
Escola Naval (no Arsenal). Nessa época foram integrados no espólio vários modelos de navios,
reunidos pela armada desde o século XVIII. Em 1916 foi destruído pelo incêndio que lavrou no
arsenal. Em 1934 é decidida a sua transferência para no edifício dos Jerónimos que só será
concretizada em 1962 (Agosto) Em 1947 é integrada a colecção de miniatura de embarcações e
o museu está instalado no Palácio do Conde Farrobo. Em 1965 o museu abre ao publico
Planetário Calouste Gulbenkian. 157
Como síntese, embora Leite de Vasconcelos tenha tido múltipla actividade, é possível
verificar que as funções de museólogo estavam incluídas na sua prática. Veja-se a propósito
Ilustração 55 - Africano com instrumentos de trabalho
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216 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Foi nomeado director interino Manuel Heleno. Manuel Heleno reforma o plano do
museu. Mantiveram-se as várias secções do museu (biblioteca, oficina de restauro,
gabinete de fotografia, gabinete de desenho. Manuel Heleno inicia no museu um
ambicioso plano de escavações arqueológicas, cujos espólios são enviados para o
museu, criando, na década seguinte um problema de espaço. Daqui resultou igualmente
uma valorização da sua componente arqueológica, que em 1932 é reforçada com a
competência exclusiva para a condução de escavações arqueológicas no país. O objecto
de interesse da arqueologia continuou a incidir nas origens arcaicas do povo português.
A etnologia mercê duma visão sem objectivos ficou secundarizada na actividade do
museu.
Em 1955 Manuel Heleno defendeu a criação duma 4ª secção fundamental através do
desdobramento da secção colonial. Defendia a transformação do ―museu do povo
português em museu do mundo português‖, conforme refere Irisalva Moita (op.cit
pag.12 )158
. Segundo Irisalva esta descaracterização do museu levaria à integração de
duas correntes culturais distintas e independentes. (a colecção indígena não apresenta
influências europeias), defendendo a manutenção da colecção com as características
dada por Leite de Vasconcelos, ―dando porém, grande desenvolvimento, dentro da
secção português os objectivos, às profundas alterações produzidas na raça, costumes e
mentalidades do povo português pelas influências das correntes exóticas, a partir do
século XVI, não esquecendo, porém, que os objectivos ali apresentados devem reflectir
a presença de duas raças em conjugação cultural. As restantes colecções de arte e
etnografia indígena, puras da influência portuguesa, devem estar presentes, no plano,
apenas como secção complementar‖ (op.cit, pag. 13). Essa ideia será posteriormente
desenvolvida. De acordo com a necessidade de actualizar o discurso museográfico e
museológico. Com uma secção denominada ― Originalidade e Continuidade da Cultura
Portuguesa‖.
Voltando à proposta de Irisalva Moita de 1959, e as seu discurso de actualização do
plano do museu propõe agora integrar as originalidades da cultura portuguesa reveladas
pela arqueologia ―nos últimos 50 anos‖. Segundo Irisalva, que durante a década de 50 se
dedicara ao estudo das cultura pré-históricas, Vasconcelos limitar-se a procurar as
(GONÇALVES, 1954, 55-57). Incorporação, a sua prática de aquisição e compra tornou o seu
museus no maior do país, fora de situ, Conservação e Exposição, a sua política de museu como
um livro que apresenta um discurso sobre a lusitanidade. Em termos expositivos o edifício dos
Jerónimos apresentava diversas dificuldade, nomeadamente as suas amplas janelas por onde
entrava uma luz intensa, dificultava a apresentação das peças. O segundo piso, esconso e com
pouca iluminação também não era mais favorável. ―Com tal condicionalismo e estribado no
critério científico e didáctico de apresentação, pode dizer-se que sempre o Museu Etnológico
expos em satisfatórias condições: -um mostruário monumental, pouco atraente pela sobriedade
claustral, nunca espectacular, mas reconfortante para o estudioso da antiguidade lusíada.(op
cit 55). A componente documentação (investigação) fez com que o museu fosse reflexo da
personalidade. Tudo com as devidas anotações, referências. Contudo, aponta-se a crítica da falta
de capacidade de síntese (Orlando Ribeiro . Finalmente a divulgação, feita através das revistas. 158
A mesma observação foi efectuada durante as provas públicas de fim de curso para
conservadores Abril 1958
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217 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
influências castrejas. Havia que recuar nas colecções, com a integração das culturas
lacustres do vale do Guadiana e as suas evoluções na costa portuguesa, reveladas por
Zbyszewsky a partir de 1940 nos terraços fluviais do Tejo. Integração das influências do
paleolítico superior159
. Em relação ao neolítico, defende a introdução do neo eneolítico
da do estudo das influências megalíticas do sudoeste peninsular. (surgiram assim as
classificações de Dólmenes com câmara rectangular, Dólmenes de câmara poligonal e
sem corredor desenvolvido, Dólmenes de câmara poligonal e corredor desenvolvido,
Galerias cobertas, Monumentos campaniformes do tipo alcacerense, Cistas megalíticas,
procurando um discurso expográfico que defende a continuidade cultural destas
manifestações através da idade do ferro. Perante o desconhecimento sobre as
manifestações sobre o calcolítico, tece algumas considerações sobre a chegas das
influências célticas (século IV) e o florescimento da cultura castreja (século III).
Defende ainda a representação de três zonas. Norte do Tejo e Sul do Tejo, com uma
divisão entre Norte do Douro (casas de planta arredondada) e sul do douro (casas de
planta rectangular), os Castro do Centro Litoral, como representantes da influência
Ibero-mediterrânica. Alem disto defendia também a, dentro e espírito da representação
da originalidade do povo português, a inclusão das representações pictóricas, fenómenos
artísticos à época pouco conhecidos.
Depois o plano prossegue, com a defesa da representação forte dos lusitanos, enquanto
elemento base da formação étnica dos portugueses, província pouco romanizada. Os
vestígios germânicos e árabes são pouco representativos no plano, pois a autora
considera que foram rapidamente absorvidos pela população residente, mais numerosa e
com características culturais mais fortes. Segue com uma leitura da história medieval.
Em relação ao contacto com os ―povos exóticos‖ refere :
“No século XVI, porém, um novo abalo vem ferir profundamente a continuidade
antropológica e cultural do povo português. Os descobrimentos, pondo-nos em
contacto com povos, raças, credos e costumes diferentes, deram origem a uma dupla
influência: a que exercemos sobre populações indígenas, levando-lhes a nossa língua e
a nossa religião e a que recebemos em troca, com a entrada de elementos exóticos que
vieram enriquecer e abastardar o património nacional. Além da miscigenação étnica
processada, não só como meio de adaptação dos portugueses às regiões tropicais, mas
também como única forma de manter o equilíbrio populacional na própria Metrópole,
onde a população diminuía assustadoramente sacrificada nas viagens, a influência na
cultura e na mentalidade portuguesa, principalmente nos meios urbanos, foi sem
dúvida, das mais profundas da nossa história.
Os contactos com os povos do Oriente - persas, Hindus e chinas, habituados a luxos
desconhecidos dos ocidentais, altera profundamente as nossas tradições e modos de
vida. A alimentação é enriquecida com elementos exóticos e tornadas acessíveis as
159
Note-se que a questão dolménica se prende com a especificidade da cultura portuguesa.
Vários autores procuraram alicerçar nestas culturas a origem mítica da nacionalidade (António
Quadros). Outros alicerçaram nesta cultura a vocação de terra de cruzamentos (terra híbrida)
entre o Norte Atlântico e o Sul Mediterrânico (Orlando Ribeiro)
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218 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
especiarias, entram no uso comum; a mesma sumptuosidade reflecte-se no vestuário
onde além de ricos veludos, lhamas e cetins que comprávamos na Flandres e na Itália
com dinheiro das especiarias, banalizavam-se as seda e os brocados orientais, a
população torna-se exigente e rodeia-se de conforto e grande aparato, tornando-se
vulgares nos interiores portugueses do século XVI, os tapetes persas, as colchas da
índia e louças da china.
Depressa os elementos exóticos são assimilados pelos naturais que, por sua vez,
impõem os seus gostos aos artífices indígenas. Desta fusão notável, principalmente no
domínio das Artes, nasce essa interessante corrente artística denominada Arte Indo-
portuguesa, ricamente documentada nas nossas artes decorativas dos séculos XVII e
XVIII (cerâmica, mobiliário, bordados, ourivesaria, etc.) A Influência cultural do Brasil
e da África Negra, devido ao atraso em que se encontravam essas populações, não foi
tão notória, sendo porém profunda a miscigenação racial com elementos das duas
origens. Entretanto, já não referindo as interessantes esculturas, tão representativas da
nossa presença na África Equatorial, no capítulo dos costumes, alguma coisa
aproveitamos do seu contacto: influências na alimentação, certos costumem (uso das
redes de descanso, o costume de trazer para cãs pássaros engaiolados, etc.
A partir do século XVI não mais deixou de se fazer sentir na cultura portuguesa a
influência dos povos que contactamos ou que colonizamos e lentamente algumas das
suas manifestações foram-se introduzindo, arreigando nos costumes, acabando por se
tornar profundamente nacionais; tal como
aconteceu, por exemplo com as colchas de Castelo
Branco, e os tapetes de Arraiolos, estes últimos de
inspiração nítida dos sumptuosos tapetes persas.
(op. cit pag, 28-29)
Nos parágrafos seguintes reflecte sobre a influência
do século XIX, onde segundo a autora as influência
francesas e a cópia do que se faz lá fora se sobrepõe à tradição portuguesas. E termina o
capítulo afirmando “ Não quero chegar ao ponto absurdo de defender o desprezo pelo
que as nações mais civilizadas do que nós têm criado. O progresso não se faz dentro de
muros fechados, mas nasce no entrechoque de várias influências. O valor de cada povo
estará, porém, no modo e força de reagir a essas influências, sabendo adapta-las à sua
sensibilidade, marcando-as com o cunho da sua personalidade, tornando enfim próprio
o que era alheio, sem se deixar arrastar por uma simples imitação passiva” (op.cit,
pag. 30)
De seguida apresenta o plano para a reforma e actualização da linguagem museológica
segundo os critérios das secções de dentro destas segundo um critério cronológico
evolutivo. A novidade é a inclusão do século XVI, com a proposta de introdução da
―corrente exótica‖ constituídos pelos objectos que transformaram os modos de vida,
tipo tapetes, bordados, cerâmica chinesa, e pela corrente indo-portuguesa e afro-
Ilustração 56 - Aldeia Africana
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portuguesa, mobiliário, baús, cerâmica da companhia das índias, estuaria ou produção
nacional com influências doutros povos (tapetes de Arraiolos, colchas)
A secção de etnografia não apresenta alteração em relação ao proposto por Leite de
Vasconcelos, tanto mais que entre a arqueologia e a etnografia a separação dos campos
são pouco nítidos. Em relação à última secção, antropologia antiga e moderna, propõe a
representação das ossadas e a explicação das transformações étnicas observada.
Manuel Heleno160
sucede a Leite de Vasconcelos como director em 1929. Ai
permanecerá até 1964. No museu de arqueologia desenvolveu várias actividades de
escavações. Foi uma personalidade polémica no âmbito da arqueologia, gerindo com
muitas cautelas a sua investigação. Apenas os seus alunos tinham conhecimento das
informações científicas de realizava e ficou conhecido por manter as reservas do museu
fora da investigação pública. Não deixou grandes marcas.
Em 1954 quando se realiza o ―I congresso Nacional de Arqueologia161
, em Dezembro
de 1958, organização patrocinada pelo Instituto de Alta Cultura, e pela Junta de
Educação Nacional, é realizado, em homenagem a Leite de Vasconcelos, Mendes
Correia, na Conferência de abertura salienta o
contributo de ―Leite de Vasconcelos, fautor da
consciência nacional‖. O congresso foi
presidido por Prof. Pereira Dias da Junta de
Educação, a Comissão de Honra é constituída
por Manuel Heleno, da Faculdade de Letras e
director do Museu Etnológico, o Eng. António
Castelo Branco, Director da comissão dos
Serviços Geológicos, e a sua I secção é
dedicada à ―Homenagem ao museólogo Leite
de Vasconcelos‖ e é dirigia por António Manuel Gonçalves do MNAA.
Curiosamente nos trabalhos da V secção dedicada a ―Pré-historia do Ultramar‖, foi
Considerando que Leite de Vasconcelos tinha sido o pioneiro da arqueologia
ultramarina. Nessa secção foram apresentados trabalhos de J.R. Santos Júnior,
Arqueologia de Moçambique: o que está feito e o que falta fazer‖, Manuel Simões
Alberto com Riqueza Arqueológica da Região Sul do Save – Inventários das Estações
Arqueológicas, Lereno Antunes Barradas ―Arqueologia de Manica e Sofala‖ que
identifica a região como corredor de penetração no continente, Octávio Rosa Oliveira
160
Manuel Domingues Heleno Júnior, (1894-1970). Doutorado em Letras, foi Director do
Museu de Arqueologia, professor de arqueologia da Faculdade de Letra, de que foi director:
Fundou o Instituto de Arqueologia, história e Etnologia, integrado no Instituto de alta Cultura,
Foi vogal da Junta Nacional de Educação, do Conselho Nacional dos Museus, académico de
número da Academia Portuguesa de História e do Centro de Estudos Históricos Ultramarinos. 161
MOITA, Irisalva (1959) ―-I Congresso Nacional de Arqueologia‖ in Separata da Revista
Ocidente, Vol LVI pp218-232
Ilustração 57 - Grupo familiar em Africa
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220 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
Achado arqueológico de Raro Valor no território de Manica e Sofala, onde documenta
uma figura em bronze, representando um crocodilo, encontrado junto dos montes
Siluwe, junto da presumível estradas das palmeiras que ligava as Minas de Manica ao
Egipto . Havia ainda uma Secção X dedicada à Museologia, dirigida por João Couto
director do curso de Conservadores, que funcionava nos três museus nacionais (Arte
Antiga, Arte Contemporânea e Etnologia)
Em 1964 Manuel Heleno é substituído por Fernando Almeida que se mantém director
até 1974. Curiosamente é ainda Manuel Heleno que assina o programa de Instalação do
Museu na Cidade Universitária em Lisboa, que não será construído. Nessa altura
funcionavam nas suas instalações as aulas de arqueologia, os institutos de Arqueologia e
Etnografia e o estágio de conservadores de museus do Instituto de Alta Cultura.. Nesse
programa enumeram-se as salas e secções do museus, que mantêm a estrutura.
O edifício, a construir, englobava cinco salas de entrada, onde seria criado um ―prólogo
do museu‖ com uma explicação da síntese da vida material e psíquica do povo
português (evolução da caça, pesca, pastorícia, agricultura, industrias, transportes
habitação, vida intelectual e artística e religião), depois 4 salas para a Idade da Pedra ( 4
salas), 6 para a idade dos metais, 7 salas para o período lusitano e romano, sala para a
paleo-cristãos e visigodo, sala arábica, sala medieval, e 4 salas para arqueologia
comparada. A secção de Ourivesaria e numismática previa 3 salas. A Etnografia
dispunha de sala para 12 temas , mais duas salas para etnografia insular e ultramarina.
Previa ainda depósitos, colecções de estudo, sala de exposições temporárias, serviços
administrativos, biblioteca e arquivo e serviços técnicos. Um plano que mantêm o
projecto de Leite de Vasconcelos.
Em 1965, o Museu passa a Chamar-se Museu Nacional de Arqueologia e Etnologia, em
virtude da publicação do Regulamento Geral dos Museus de Arte. História e
Arqueologia. Em 1965 havia sido criado o Museu de Etnologia do Ultramar, que
parcialmente sobrepunha as áreas museográficas. Fernando Almeida adopta as linhas de
pensamento museológico de Leite de Vasconcelos, reajustando a maior pendor
arqueológico de Heleno. É nesta época que são concretizadas algumas incursões do
museu no exterior, conforme o espírito das ―concepções nórdicas‖, como na época se
chamava aos museus de ar livre. E as peças de etnografia eram as que
melhor se adaptavam a este conceito. Durante este período que foram
introduzidas algumas modernizações nos processos expositivos, no
sentido de conferir alguma interactividade com as colecções e foram
criados os serviços educativos. Fernando de almeida era partidário da
apresentação das peças de arqueologia no seu próprio ambiente,
naquilo que se poderá chamar ―princípio da redução ecológica‖
(GOUVEIA, 1997: II-90). O assunto da reformulação do museu foi
amplamente discutido na Junta Nacional de Educação, nunca se
Ilustração 58 -Desenho de Estatua Maconde em Madeira
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221 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
tendo concluído, sobretudo na discussão relativa ao modelo do museu. Universitário ou
Nacional).
De 1974 a 1980 o museu entra numa fase de letargia, que é ultrapassada com
reformulação d espaço museológico. A maioria das peças são retiradas para reservas e
as salas passam a ser ocupadas essencialmente por exposições permanentes. A grande
exposição ―Portugal, das origens à época romana‖ marca o início deste ciclo. Note-se
que em 1979 a Faculdade de Letras deixa de ser responsável por este museu passando a
ser tutelado pela Secretaria de Estado da Cultura. A partir de 1989 o museu passa a
representar apenas as colecções de arqueologia. Actualmente Luís Raposo mantêm esta
filosofia de actuação e modernização.
4.2.6 Museu Nacional de Etnologia
Foi fundado em 1965, com o nome de Museu Etnológico do
Ultramar, sendo seu director Jorge Dias (1907- 1973). Este museu
é criado como consequência da acção do seu Director e seus
colaboradores162
. Em 1947, em Coimbra, é criado o Centro de
Estudos de Etnologia onde se desenvolvem os estudos pioneiros
de antropologia cultural163
. A morte de Leite de Vasconcelos
1941 havia tinha constituído o fim dum ciclo de estudos sobre a
etnografia do povo português, que se iniciara com a geração
romântica a partir de 1824, com nomes como Almeida Garrett,
João Pedro Ribeiro e Alexandre Herculano), se prolongara com
Teófilo Braga (1843-1924), Adolfo Coelho (1847-
1919),Consiglieri Pedroso (1851-1910) e Carolina Michaelis de
Vasconcelos (1951-1925). Tinha sido uma geração que havia
162
Entre os quais se salientam, Ernesto Veiga de Oliveira (1910- 198 ) Nasceu no Porto e
formou-se em Direito (1932) e Histórico-filosóficas (1944) na Universidade de Coimbra. Em
1932 encontra-se com Jorge Dias e inicia uma colaboração que dura uma vida. Foi subdirector
do Museu de Etnologia entre 1965 e 1973, e seu director entre 1973 a 1980. Desenvolveu vários
trabalhos, nomeadamente ―Apontamentos sobre museologia: museus etnológicos lições dadas
no museu de etnologia do Ultramar, Lisboa, JIU, 1971.
Jorge Galhano e Margot Dias, Benjamim Pereira. 163163
Em Bosquejos Históricos da Etnografia Portuguesa, Coimbra, Casa do Castelo Editora,
1952, Jorge Dias descreve o contexto da apresentação da proposta de museu. Depois de
descrever a questão do contacto cultural pela gesta marítima, escreve ―A influência das culturas
exóticas sobre os portugueses, as maneiras como conseguiram adaptar-se a situações novas e
as suas relações com povos além-mar com quem travaram relações – tudo isto oferece ao
antropólogo um campo de investigação extraordinário. Neste conjunto serve a cultura de
Portugal, por assim dizer, como constante, enquanto que os meios físicos diferentes e as
culturas indígenas, ao tratar-se da adaptabilidade e estabilidade da cultura portuguesa entre
1500 e 1950, servem de variável‖.(op cit 26)
Ilustração 59 – Capa do folheto do MN Etonologia
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222 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
sobretudo efectuado a recolha de tradições da cultura popular164
. E dentro desta geração,
Leite Vasconcelos tinha sido o que havia convertido o projecto de recolha da tradição
num discurso museológico.
Em termos de museologia do discurso etnográfico, Jorge Dias no Bosquejo de História
da Etnografia Portuguesa, faz o balanço das instituições museológicas existentes.
Aborda o Museu de Etnologia de Belém, dirigido por Manuel Heleno, que mal grado o
excelente trabalho de recolha etnográfica, não consegue representar condignamente.
Depois aborda o Museu de Arte Popular, ligado ao Secretariado de Propaganda
Nacional165
, que não tinha propósitos científicos na sua fundação.
A criação do Centro Estudos de Etnologia Peninsular em 1945, tendo como director
Mendes Correia inseria-se numa tentativa de integrar os estudos no âmbito da
internacionalização e ultrapassar a questão nacional. Recorde-se que em Coimbra havia
sido criada uma secção de Antropologia no Museu de Etnografia e História da
Universidade de Coimbra. O livro onde Jorge Dias relata esta situação apresenta várias
fotografias dos espaços museológicos, onde se pode observar os principais objectos
expostos, dentro duma tradição clássica. Note-se, que a maioria dos objectos era oriunda
do Continente português Aliás o texto apresenta um
resumo alargado de todos os museus regionais, de
componente etnográfica, que segundo Jorge Dias se
devem ao labor incasável de Leite de Vasconcelos como
divulgador da êtnos lusitana. Nesta época ainda a
questão da museologia de objectos coloniais não era
referenciada. É provável, que a partir da crescente
visibilidade do tema nas questões da UNESCO, e se
tivesse iniciado as reflexões sobre esses assuntos.
Sabemos que em 1956 Jorge Dias é convidado pelo
Instituto de Estudos Ultramarinos, para ir para Lisboa, integrar a Missão de Estudos das
Minorias Étnicas no Ultramar Português. Jorge Dias mantêm-se nesta comissão durante
cinco anos, durante a qual chefia a missão que irá elaborar o estudo antropológico ―Os
Macondes de Moçambique‖166
. Entre 1957 e 1962 foi professor de Antropologia
Cultural na Faculdade de Letras de Lisboa, e em 1965 conclui o seu Doutoramento em
Etnologia, o primeiro dessa especialidade.
Entretanto em 1963 havia é criado o Centro de Estudos de Antropologia Cultural, em
Lisboa onde conduz com os seus colaboradores m conjunto de intervenções, estudos e
trabalhos que levaram a criação da recolha de várias colecções de objectos africanos,
então localizados na sede do Centro de Estudos ao Príncipe Real, em Lisboa.
Paralelamente com esta colecção havia igualmente outras colecções reunidas desde
meados dos anos 40, na então Junta de Missões Geográficas de Investigações Coloniais,
164
Dias distingue aqui o campo da etnologia como espaço da cultura popular, que emerge no
romantismo como reacção à cultura erudita do Aufklarüng (iluminismo) 165
Ver Tese de Mestrado na Lusófona. 166
Juntamente com Margot Dias e Manuel Viegas Guerreiro.
Ilustração 60 - Plano do Museu
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223 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
que tinha por objectivo viram a integrar um futuro museu167
. Estas duas colecções vão
constituir o espólio inicial do Museu de Etnologia, criado em 1965.
Os objectos recolhidos por Jorge Dias e sua Mulher durante a sua missão em
Moçambique são publicamente apresentados em Lisboa em 1963. Essa exposição
constituiu o programa do museu, ao qual se juntam posteriormente outros elementos.
Note-se que aqui a questão da etnologia africana não era a questão essencial. Na época
discutia-se muito a questão de se fazer um museu do Império. Um museu que mostrasse
a grandeza da Portugalidade. Esta tensão que conduziu à formação do museu, tensão
entre a visão antropológica da cultura e a visão política da portugalidade levou a que a
vocação do museus, durante bastante tempo ficasse associado à política colonial do
Estado Novo, malgrado, outras visões menos colonialistas, nomeadamente as de Veiga
de Oliveira, que conviviam no Museu. Aliás Veiga de Oliveira, sempre privilegiou nos
seus estudos a antropologia cultural do povo português.
Note-se que aqui Jorge Dias terá aproveitado uma vontade política para concretizar um
museu, que na época, mal grado a questão da sua ideologia, transportava, em termos de
museologia alguma inovação. Jorge Dias tinha uma concepção de MUSEU como
laboratório de trabalho. Lá deveriam estar instalados a biblioteca, o arquivo, tudo o que
era necessário ao seu mister. Na concepção do Museu reivindicou, e conseguiu, uma
grande centralidade para o espaço de exposições temporárias, que na sua estratégia
inicial deu grande visibilidade ao museu, tendo sido um dos
pioneiros em Portugal da prática regular de exposições
temporárias. Em 1968, num artigo no diário de Lisboa ―um
museu sem prateleiras‖ (7MAR1968) Jorge Dias comenta
uma exposição organizada em França por Georges Henri
Riviere ―objects domestiques dês provinces de France‖ onde
comenta a impressão que lhe causou a apresentação de
objectos em que se conciliava a vertente científica (ordenação
por funções das estruturas sociais e dos géneros de vida‖ com
o aspecto estéticos, com os objectos dispostos em quadros
funcionais dentro de amplas prateleiras, sem vitrinas,
iluminadas de mofo a produzirem-se ―efeitos curiosos de luz
e sombra que muito os valorizam‖. Este modo de expor que
seria ―importado‖ e continua a ser uma das características do processo expositivo do
Museu. Aliás, em 1957, quando o ICOM apresenta a ideia de criação de museus ao ar
livre, Jorge Dias verá aí uma oportunidade para a criação dum museu. Uma ideia que se
manterá ao longo dos anos.
Em 1967 realizou-se uma exposição sobre a alfaia agrícola portuguesa, que levou a uma
profunda reformulação dos processos expositivos no Museu, que foi amplamente
discutida com Veiga de Oliveira . Jorge Dias em 1969 fez uma viagem durante um ano
167
(GOUVEIA, op.cit, 103)
Ilustração 61 -Capa de Livro de Jorge Dias
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224 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
à Amazónia, onde recolhe a colecção de objectos da vida material que ainda pode ser
visitada. Com as constantes ausências do director, as questões museológica são
essencialmente tratadas por Veiga de Oliveira.
Veiga de Oliveira em ―Apontamento sobre a Museologia‖ (OLIVEiRA,1971) apresenta
o manual de formação para museólogos antropólogos. Depois duma descrição sobre a
museologia e de uma explicação sobre o surgimento dos museus etnográficos no mundo
―por outro lado essa industrialização e expansão colonialista destroem as culturas locais
tradicionais, nacionais ou exóticas (…) estas circunstâncias estão na base da formação
dos primeiros museus e secções de etnografia‖ (op.cit. 22).
De seguida Veiga de Oliveira descreve o surgimento das colecções etnográfica em
Portugal, onde descreve as várias colecções que há notícia até á criação da Sociedade de
Geografia e do Museu de Leite de Vasconcelos, ―o museu do Povo Português‖, que
segundo o autor alargavas o objecto da etnografia ao povo português e não se limitava
aos objectos exóticos. Depois é descrita a concepção museológica de Jorge Dias, em
que o Museu de Etnologia é considerado como um museu de cultura geral, aberto à
―representação de todas as culturas‖.
Em relação ao tratamento da Arte e estilos Africanos, entre as paginas 70 e 91, Veiga de
Oliveira faz uma resenha da emergência da sua interpretação pela cultura ocidental:
―logo que acordou o interesse pelas culturas chamada primitivas e que se iniciou o
estudo do homem a quem elas correspondem, surgiu o problema do significado e
natureza do fenómeno artístico nessas culturas – a arte primitiva (ou mesmo arte Negra,
como de entrada se lhe chamou‖ (op.cit ,70). E prossegue mais adiante: ―O problema da
arte primitiva pode ser abordado de dois pontos de vista principais: o do etnógrafo, que
explica e se interessa pelos objectos na medida em que eles estão em relação com a
sociedade donde provêm, e para quem portanto a arte é um elemento dum conjunto
cultural e o do artista ou amador de arte, que aprecia as qualidades artísticas do objecto
em si mesmas, e encara este como a obra única de um génio humano; o objecto
proporciona-lhe uma emoção ou estímulo estético que, para ele constitui o seu
significado verdadeira e fundamental, abstraindo deliberadamente ou ignorando mesmo
totalmente o contexto cultural onde esse objecto foi criado e donde emana‖ (op.cit. 71).
Depois desta distinção considera que, do seu ponto de vista, os povos africanos não
utilizam a arte for razões estéticas (segundo grupo) a arte, e essencialmente pensa-se nas
mascaras em madeira, vale pelo seu significado ritual e é produzida em função de
códigos culturais muito específicos dentro do contexto da reprodução cultural da
comunidade. Mas há outras formas de arte, não matérias: a música, os adornos
corporais, as pinturas rupestres, os objectos de adorno pessoal. Se a escultura em
madeira é a forma mais expressiva da arte africana é fundamentalmente pela sua função
de representação social. Depois refere outro tipos de objectos, que podem surgir em
diversas áreas culturais, objectos de pedra e metálicos. Aborda ainda a questão da
tradição oral, ―África é uma tradição feita sistema, o pulsar duma sociedade, mais do
que um indivíduo, a expressão dum drama colectivo, uma linguagem sagrada, um ritual
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225 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
plástico, formulas mágico-religiosas para se viver e sobreviver, utensílios do
sobrenatural; a sua função é a de valor utensílio, um instrumento de magia, de
organização social, de memorial de uma cosmogonia africana‖ (op.cit , 74)
Reflecte depois sobre a forma de organização social das comunidades africanas , dos
ritos e das formas, das danças e das cerimónias , dos tipos de materiais que se
encontram, das personagens, dos curandeiros e dos xamãs, das iniciações e da morte.
Sobre os aspectos da composição da estatuária, refere também algumas técnicas de
trabalho: ―os escultores negros tê aparentemente sempre presente o espírito da
composição total da obra, trabalham o conjunto inteiro ao mesmo tempo por estádios
sucessivos‖ (op.cit, 88) A estética africana não é visual ou proporcional, mas de
significado ou de forma (op.cit 89). Por outro lado, a estatuária têm, regra geral um
elevado grau de estaticismo. O objecto contempla os seres vivos. ―A arte africana é
estática. Ignora a realidade‖, e têm como propósito reafirmar a ordem criada por Deus,
para quem essa realidade só tem sentido na medida em que se conforma com essa
realidade‖.A representação do fragmento de vida que foge, o sopro dos deuses, do
minuto irrepetível não tem lugar na arte africana. Portanto a arte em África não é um
deleite. A margem de invenção do artista é baixa. Ou seja, concluindo, Veiga de
Oliveira reafirma que em África a Arte nada têm de primitivo. É uma arte de elevada
capacidade conceptual, ―perfeitamente laborada em plena posse dos seus meios, que
exprime o mundo mental complexo dos seus autores‖ (op.cit 91). Termina com a
conclusão que a sua representação museus deve ser encarada como ―toda a pureza na
fundura dos sentimentos que traduz, e que vai ao encontro dos valores espirituais do
Homem. ―A mensagem da arte negra é afinal, mais uma vez, a mensagem do Homem.‖
(op.cit 91)
Após a morte de Jorge Dias e em plena Direcção de Veiga de Oliveira e com a
democratização do país, e consequente descolonização, O Museu ultrapassa o seu
estigma ―colonial‖ e centra-se na sua especialidade de antropologia cultural168
.
O seu espólio africano, nomeadamente a sua
colecção de mascaras (recolhidas por Jorge Dias),
tornam-se um importante activo expográfico. Já
dentro duma museologia pós-colonial são
apresentadas várias mostras no Museu (1977), na
Fundação Gulbenkian (1983). Com a direcção de
Veiga de Oliveira o museu conheceu um período
de algum dinamismo, essencialmente foi uma
escola de museologia para antropólogos, que
168
Em 1973 é feita A Exposição Povos e Culturas no Museu de Etnologia do Ultramar,
Separata da Revista de Etnologia Nº 31 – Museu de Etnografia e História, Junta Distrital do
Porto, exposição essa que é reposta em 1979
Ilustração 62 - Aspecto da exposição de mascaras africanas
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226 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
entretanto começam a ser formados nas universidades portuguesas. Ainda em 1973, o
Museu passa a depender do Instituto Superior de Trabalho e Empresas.
A direcção de Margot Dias, viúva de Jorge Dias, não apresentou novidades de relvo.
Depois de durante alguns anos o acervo africano ter sido permanente, está hoje nas
reservas. Actualmente é seu director Pais de Brito.
Na nossa visita solicitamos acesso á colecção de Arte africana, o que por razões
burocráticas não foi possível. Do conjunto expositivo, visitamos com guia a colecção da
amazónia, constituído por um conjunto de objectos da cultura material recolhidos por
Jorge Dias. A colecção está conservada em ambiente controlado (humidade,
temperatura, e luz). É uma colecção interessante que com a ajuda da guia, especializada,
é passível de descodificação. Todas as colecções expostas no 1º piso (salas de
exposição) são temporárias. Observamos uma colecção de peças de cerâmica com o
temo da ―construção do inventário‖ com indicações sobre as formas de elaboração dum
inventário comparativo duma colecção de cerâmica, e uma sala com uma exposição
sobre a ―mulher no oriente‖ a partir de representações pictóricas em tecidos (saris e
tapeçaria). A exposição resultou dum estudo feito no ISCTE sobre o tema e combinava
objectos com instalações visuais e sons.
Globalmente verifica-se que este museu é um museu agarrado à produção antropológica
universitária. Situado numa zona nobre da cidade mas com pouca visibilidade e não
verificamos nenhuma interacção com o território envolvente.
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227 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
5 Análise Crítica e Transversal dos Temas Abordados
5.1 Os trajectos dos museus paulista Em ―A musealização em São Paulo: os caminhos interpretativos da cidade
169‖ Cristina
Bruno faz uma reflexão sobre o processo de constituição dos museus paulistas. Começa
assim Cristina Bruno ―os processos museológicos desenvolvidos na cidade de São
Paulo têm percorrido uma longa trajectória. Evidenciam diferentes percepções sobre o
nosso passado, articulam a memória local com a nacional, encontram-se partilhados
em diversas instituições e estabelecem distintas reciprocidades com os problemas
contemporâneos enfrentado pala população desta megalópole. ― (op cit :24). Constata
por um lado a historicidade do processo, enquanto por outro realça a diversidade
conceptual inscrita na matriz de cada processo, bem como a fértil combinação de
soluções que cada uma das instituições encontra na sua relação com o seu contexto e
com as outras instituições.
O seu olhar analítico incide fundamentalmente sobre contemporaneidade, sobre os
problemas da população. É essa preocupação que motiva a sua análise. Por isso
prossegue ― Uma observação mais detalhada sobre este panorama pode encontrar
muitos elos de sentido entre o perfil das instituições museológicas e os diferentes
movimentos socioculturais que, em alguns momentos, têm pautado as mudanças, e, em
outros assegurado as tradições.‖ (ib idem). A comunidade enquanto destinatário e actor
da acção museológica, como sabemos, emerge na reflexão museológica no pós-guerra.
A Declaração de sobre os ―Princípios Base do Museu Integral‖ da mesa-redonda de
Santiago do Chile em 1972170
estabelece e recomenda que ―o museu é uma instituição a
serviço da sociedade, da qual é parte integrante e que possui nele mesmo os elementos
que lhe permitem participar na formação da consciência das comunidades que ele
serve; que ele pode contribuir para o engajamento destas comunidades na acção,
situando suas actividades em um quadro histórico que permita esclarecer os problemas
actuais, isto é, ligando o passado ao presente, engajando-se nas mudanças de estrutura
em curso e provocando outras mudanças no interior de suas respectivas realidades
nacionais “ (op.cit: 106-107)
Trata-se de um manifesto que apela a que o museu desempenhe uma papel social
relevante na sociedade enquanto agente propiciador de mudança ‖consideraram que a
tomada de consciência pelos museus, da situação actual, e das diferentes soluções' que
se podem. Vislumbrar, para melhorá-la, é uma condição essencial para sua integração
à vida da sociedade. Desta maneira, consideraram que os museus podem e devem
desempenhar um papel decisivo na educação da comunidade” (op.cit: 105)
É com este olhar que Cristina Bruno vai reflectir sobre um século de museologia em
São Paulo, entre a fundação do Museu paulista em 1895, até a elaboração da proposta
para o museu da cidade que a obra onde este artigo se insere reflecte; museu que acaba
por não ser implementado por razões de política municipal.
169169
Expedição São Paulo 450 anos: Museu da Cidade de são Paulo, São Paulo 2004 170
Veja-se PRIMO, Judite S. (1999),‖ Museologia e Património: Documentos Fundamentais‖,
in Cadernos de Sociomuseologia nº 15 , Lisboa, ULHT, pp 105 -115
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228 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
São Paulo é uma cidade complexa do ponto de vista cultural. Uma das maiores
metrópoles do mundo, com 12 milhões de habitantes, centro industrial do Brasil e em
acentuada transformação para uma cidade de serviços. Fundada há 450 anos pelos
Jesuítas, numa planície fértil a 80 km do oceano, transforma-se no final do século XIX
na capital da economia cafeeira, iniciando um crescimento vertiginoso durante a última
centena de anos.
E é essa realidade que a museologia paulista acaba por representar. As várias
instituições foram surgindo para responder a questões de cada um dos tempos, as
colecções foram crescendo ao mesmo tempo ―que vários projectos que tentam
descodificar as suas entranhas culturais, as suas razões patrimoniais, e, especialmente
os seus caminhos interpretativas ―(ibidem). O projecto que o livro representa é
assumido como mais um exercício de interpretação, contemporâneo.
Balizando os vários projectos museológicos, como expressões culturais de uma
memória social, realizada historicamente, é também assumir que esses projectos foram,
no tempo comprometidos. Procuraram criar a identidade do território a partir do seu
património. Reflectiram as tensões do tempo, as forças de afirmação da cidade, do
Estado nacional, das influências e modas museológicas importadas.
Com base nesta base conceptual, Cristina Bruno desenvolve uma abordagem à
historicidade das várias instituições museológicas, os seus caminhos específicos, em
relação com a história da cidade. Desenha com isso um freso do desenvolvimento da
museologia paulista, integrando cada unidade museológica no contexto de
desenvolvimento da cidade, dos seus protagonistas, dos seus poderes.
Neste âmbito, durante o século XIX a afirmação da organização museus surge no
cruzamento de dois vectores independentes. ―Por um lado o coleccionismo praticado
por algumas famílias e as expedições de reconhecimento do território foram
responsáveis pela organização de colecções, e por outro, as intenções de comemorar a
independência resultaram em iniciativas para a construção dum monumento que
marcasse o sítio do Ipiranga.‖ (opcit:25).
Trata-se dum momento museológico executado em diálogo com a cidade. Com as suas
grandes preocupações do momento, sendo que essas preocupações eram vinculadas por
discursos de poder. Eles são visíveis nos processos de construção dos discursos
museológicos, que passam desde a criação de comissões promotoras por parte das elites,
pelas interrupções derivadas das oscilações e tensões das políticas administrativas, as
tensões sociais entre a elite paulista.
Essas mesmas marcas são visíveis durante a década de 20-30 do século XX, em que São
Paulo deixa de ser a cidade comercial do tempo esclavagista e assume-se como uma
―cidade/vanguarda‖ com uma forte especialização industrial. Diz Bruno ―esta transição
foi multidimensional.: mudaram enredos, palcos, personagens‖. Dos vários pontos de
alteração possíveis de abordar, a cidade, o desenho do seu território é uma dessas
possibilidades. ― Do ponto de vista patrimonial, o elenco de personagens é
profundamente alterado em função dos processos imigratórios e migratórios que
permitem encontros e negociações culturais muito expressivos, gerando cenários onde
a diversidade e o deslocamento pelo território são as chaves para a compreensão dos
novos enredos socioculturais”. (pag 27). Como diz Bruno, esses enredos ultrapassam a
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229 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
rivalidade entre várzeas e colinas, que caracterizava a tensão anterior, e por via da
expansão do território, da afluência de novas gentes, multiplicam os patrimónios e os
territórios. Dá-se uma complexificação do tecido sócio-urbano.
Perante a noção de transformação do território, de grande debate cultural, esse tempo é
também o tempo das grandes movimentações culturais171
e políticas diferentes
estratégias de afirmação dos poderes. É um período onde se realizam pequenas
expedições pelo território a procurar as sobrevivências dos tempo coloniais e as
reportagens fotográficas para registo das alterações urbanas.
Este período, segundo Bruno consolidam-se os três factores estruturantes da explicação
da cidade: A busca do momento fundador, o cenário de génese, a busca da
especificidade cultural paulistana, face a diversidade cultural dos seus habitantes, e
finalmente a procura da acção de preservação patrimonial como forma de diminuir as
distâncias sociais. Esta reinvenção da cidade marca o percurso da política cultural da
municipalidade. É dentro desse espírito que os trabalhos desenvolvidos pela prefeitura
se enquadram, embora os museus da cidade não se tivesse concretizado Nos anos
seguintes o debate patrimonial arrefece para ser retomado na década de 50 , a propósito
das comemorações dos 400 anos da cidade.
Nessas comemorações foram realizados um variado conjunto de iniciativas que
produziu um interesse reforçado pelas questões patrimoniais. Datam dessa época a
musealização de vários edifícios dentro dum espírito mítico originário, onde
bandeirantes sobressaiam como figuras tutelares, bem como os objectos a eles afectos.
Foi um momento em que a memória da cidade ficou agarrada ao mito gerador, e a
cidade e os seus habitantes desaparecem como elementos da narrativa expográfica.
Na década de setenta crescem os museus em São Paulo. A institucionalização da
Secretaria da Cultura na municipalidade leva ao reforço da intervenção cultural e da
visibilidade dos museus de iniciativa pública. Nesta data, utiliza-se a iconografia
(fotografia) na rua, como elemento de ligação das exposições ao público, e
desenvolvendo-se as acções nos bairros. Nos anos oitenta, um novo projecto para o
museu da cidade, propõe uma estrutura dialógica, poli-nucleada na cidade, dentro das
novas tendências dos museus comunitários e dentro das tendências políticas do tempo
(democratização). Foi uma época em que se alargou a noção de património e se
alicerçaram muitas intervenções. Nessa época foi inclusive proposta a criação duma
―casa da memória‖ como metodologia de tratamento de vários patrimónios até aí
amarrados aos princípios museológicos de conservação. Depois de uma relativo
apagamento da actividade museológica, em 2003 ressurge a ideia do Museu da Cidade,
com base num programa museológico inovador.
Este programa deve representar um recomeço a partir de estratégias inéditas, vinculadas
à compreensão da cidade como a megalópole de múltiplos cenários patrimoniais. Uma
consciência dum programa museológico, uma estratégia metodológica para a
estruturação do museu.
171
Recorde-se que é o tempo de Mário de Andrade
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Percorrido que foi a história da cidade e dos seus museus em São Paulo há que realçar
uma dimensão da museologia que transparece nestes escritos de Cristina Bruno. A
dimensão da viagem, como elemento fundador do museu.
A viagem está profundamente amarrada à génese da museologia. Recorde-se que as
colecções de curiosidade e exotismos tinham como característica comum assumirem
como objectos de outras culturas, outras paragens, outras estéticas. Os museus de
ciência, de arqueologia e história, constituíram-se com base nas recolhas sistemáticas e
programada. Noutros casos, as viagens eram guerras. A arte e os objectos dos museus
eram peças de saque, que durante centenas de anos acompanhavam as oscilações dos
poderes e das forças nos vários territórios ao sabor dos novos senhores.
A museologia como viagem é uma proposta da actualidade uma vez que o discurso
museológico é um discurso eminentemente activo, motivador de acção. A museologia
sempre teve as suas causas. A erupção das comunidades e dos territórios, a acoplagem
da participação cidadã, é ela própria uma proposta de viagem. Duma viagem pela
memória, alocando os patrimónios para transformar socialmente e culturalmente a
paisagem num contexto de grande dinamismo.
5.2 O lugar da herança africana nos museus
lisboetas
Expo 98 a marca dum tempo da reconstrução duma cidade. Uma
cidade transformada em Parque dito das Nações. A nossa viagem
pela cidade continua. Onde está a memória de África nesta cidade
reconstruída. Há flora nos Jardins Garcia da Orta, (deveria ser
escrito Horta, pois os seus conterrâneos deveriam vê-lo
diligentemente em volta da dita a ponto de lhe darem o cognome).
Há réplicas de girafas e elefantes por entre as Palmeiras da zona
Sul. No Largo das Bicas, em calçada portuguesa ―Kanimambo‖, e
um pedestal em cimento, vazio. E uma cidade nova sem museu. É certo que esteve aqui
para ser reinstalado o Museu dos Coches, cuja
instalação falhou porque o restauro indispensável não se
compadecia com os tempos apressados do planeamento.
Kanimambo. Há um museu, de noto tipo, chamado
Pavilhão do Conhecimento. Ciência interactiva e
tecnologia. Há o oceanário. Segundo a lista de definição
da Unesco entra na classe dos museus, embora o cartão
do ICOM não dê desconto. A exposição era para
celebrar os oceanos. A ligação da humanidade. O
mundo global. Kanimambo.
A viagem é o processo que liga. No século XVIII as gentes endinheiradas faziam o seu
―grand tour‖. Itália era o destino. A busca das ruínas da civilização clássica. O ideal
clássico da imagem única, perfeita na forma, intemporal. Sem espaço e sem tempo. Essa
Ilustração 63 –Girafa no Passeio de Ulisses
Ilustração 64- Inscrição no Largo das Bicas – Parque das Nações
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narrativa no entanto confronta-se com o maravilhoso, com o outro. Com a descoberta da
diversidade. Das gentes, dos rostos, das comidas, das vestes, dos lugares. Quem vai
relata, descreve. Quanto mais exótico mais êxito têm. O desejo de viajar no tempo e no
espaço instala-se. A procura de chinesices, de móveis lacados, de outros gostos.
Kanimambo!
A busca da diversidade, da consciência da
diferença abala a racionalidade organizada das
teologias. No norte da Europa mais abertas, do
que no sul, mais teatrais e mais ritualizadas. O
Iluminismo, a luz é uma revelação sobre novos
princípios de organização social. Fora da
teologia, porque o homem naturalizara-se. Era
necessária uma nova filosofia natural para
estabelecer as bases dum novo ordenamento. As
viagens que traziam a diferença também
serviam para os enciclopedistas integrarem e
racionalizarem os novos conhecimentos. Não se pense que este discurso sobre a viagem
seja para justificar as causas da evolução do pensamento. Recordemo-nos que falamos
da viagem como um processo de descoberta museológico. Um processo de
comunicação. Um indivíduo sai do ponto A para o ponto B, e quando regressa o ponto é
já um A‘, porque A contém também B. Por sua vez, B passou a ser B‘, porque também
contem A. Kanimambo!
Ou seja como diz o poeta172
, o que nos interessa é o processo de como um corpo adquire
sempre novas qualidades. O movimento de A para B, o confronto com B, o processo de
transformação quando (A e B) se juntam, e a memória de quando se separam (A‘ e B‘).
A museologia concebida como um processo de comunicação, comprometida com a
comunidade, agarra este processo de formação
de memória para a partir dele projectar o
futuro. Tem consciência do ponto de partida,
que é ele próprio chegada de outros pontos,
procura clarificar a narrativa do processo, para
na consciência do presente alavancar a
construção do futuro. Enquanto ciência de
acção mobiliza a memória para a reconstruir,
conscientemente. Memória activa portanto,
metodologia crítica como instrumento.
A viagem pelos museus e pelas memórias de
África em Lisboa, alocando as leituras da museologia paulista serviu-nos para quê e
172
―Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,/ muda-se o ser, muda-se a confiança; /todo o
mundo é composto de mudança/ tomando sempre novas qualidades ―(Luís Vaz da Camões
(Líricas )Lisboa, Sá da Costa, 1979, pag 49
Ilustração 65 - Base para peça escultórica
Ilustração 66 - Conjunto escultórico incompleto: Estétua, Mesa e Parque infantis
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parque o que é que isto nos é útil para a construção da nossa tese. Com referimos atrás o
objectivo é fazer uma leitura a partir duma grelha de análise. Essa grelha que
construímos, sem ser exaustiva permitiu-nos algumas reflexões críticas.
Kanimambo significa encontro/amizade em Swaheli (ou Suaíli) . Ora isto levanta-nos,
por analogia à nossa pesquisa as seguintes questões. A questão para além de não haver
estátua no pedestal, (não há objectos) o encontro amizade celebra o quê? A nós
europeus por os termos ―civilizado‖, a eles africanos; de nós europeus para eles
africanos ―por se terem deixado colonizar ou por nos terem trazido a africanidade. Sem
o objecto, a estátua não podemos interpretar. Só questionar.
Embora Afro esteja na moda. Músicas do Mundo são
festivais de boa música. Não dão enchente, mas é um
negócio seguro. Sines fá-lo vinte anos. Lisboa, nas festas da
cidade em 1992, introduziu o tema num dos palcos, salvo
erro o do campo das cebolas simbolicamente à frente da
Casa dos Bicos. África está nas comidas. O Frango da Guia
emigrou de Angola, merchandificou-se em qualquer centro
comercial. O som de África é quente e sedutor para as
noites lisboetas. Organizam-se Jogos da Lusofonia,
Festivais Universitários de Lusofonia. Mas onde está África
nos Museus?
Por exemplo, na recentemente inaugurada exposição ―Portugal e o Mundo‖ (16 de
Julho de 2009) no Museu Nacional de Arte Antiga, percorremo-la a observar onde e
como estava representada África e os Africanos. Encontramos objectos: os saleiros em
marfim da Costa do Marfim, as estátuas de madeira do Benim, o escudo de madeira do
Congo. No catálogo mais algumas referências. Exposição espectáculo para encher o
olho e para mostrar o pioneirismo da globalização.
Uma leitura, descontextualizada. Sem pessoas, sem
sentimentos, sem vida mais largado que aqueles
objectos, órfãos mostram. A guia, aborrecida e
insensível às twiners bocejantes em férias, abordava
cada peça detalhando um profundo saber. Uma hora
sobre o painel de Nuno Gonçalves. A admiração por
uma geração. Compreende-se. Mas o quadro tem
pouco do mundo que os portugueses fizeram. É um retrato duma geração, estranha
representação. Então porquê uma hora aborrecer pessoas. Quando ler o livro de visitas,
há-de ter o desgosto de verificar que as primeiras observações serão das jovens que
perpetuaram o seu desassossego em palavras de protesto.173
É certo que o catálogo
173
Confesso a minha mediação no processo. As jovens eram colegas da minha filha, que me
auxiliou na visita. E enquanto nós voamos através da exposição numa hora, as moças olhavam
angustiadas a nossa liberdade, amarradas que estavam ao objecto e ao saber. Duvido que tenham
Ilustração 67 - Cartaz de Discoteca africana
Ilustração 68 - Imagens dos Africanos
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expressa a vergonhosa aventura negreira. Mas na exposição não está lá nada. E teria
sido fácil construir um espectacular espaço com grilhetas e correntes. Não houve
intenção de mostrar. É uma opção justificável, tanto quarto de significativo. Foi uma
aventura branda, sem conflitos, que nos trouxe prosperidade. Antes era-se mais altruísta
e justificava-se que tínhamos uma missão de civilizar. Agora nota-se todo o nosso
egoísmo societário.
Conclusão desta questão, África está presente, subliminarmente. Politicamente correcta
nos catálogos, rudimentarmente nos objectos, na intenção dos objectos. A cronologia do
tempo é uma viagem que parte do século XV em África e termina no século XVII, no
Oriente, sem esquecer o exotismo das plumas e das madeiras do Brasil. Revela a
descoberta dum outro, excêntrico, e não como é que o outro interagiu. É uma exposição
clássica sem rostos e sem emoções. É certo que a
exposição é comissariada por uma equipa vasta, na
maioria anglo-saxões. Mas parece-nos que o conceito
gerador é integrar a cultura portuguesa no mundo dos
ricos, A tese do pioneirismo histórico continua a
marcar o pensamento. Num mundo global nós fomos
os primeiros. Nós somos globais há mais séculos.
Mas será que isso corresponde a uma tendência geral
dos museus da capital.
Vimos os casos dos vários museus, da arqueologia, de arte e etnologia. São museus
herdeiros da tradição clássica do Museu como espaço da Nação. Assim África é
etnologia. Mesmo quando se pensava no museu do Império a herança africana é ainda o
exótico. Nunca é uma reflexão interna daquilo que somos. Mais ainda 35 anos após a
descolonização, o discurso não interiorizou a herança africana174
.
Bem, ao escrever deste modo ate parece que há uma obrigação do discurso identitário
assumir a herança africana. Não existe essa obrigação. Os museus nacionais que
visitamos são gerados noutros tempos. Noutras eras que projectavam a nação num
passado romântico-medieval de Possidónio da Silva, Lusitano da Leite de Vasconcelos,
Antropológico comparativo de Jorge Dias e de Veiga de Oliveira. Na sociedade de
Geografia, o heroísmo e o exotismo conviviam na gesta da descoberta do outro, do
saudades. A minha filha adorou. Continua a fazer perguntas sobre aquele mundo fascinante que
descobriu. Exótico. A viagem dela continuou para além do momento. As amigas não viajaram. 174
A Biblioteca -Museu Republica e Resistência têm promovido algumas iniciativas neste
domínio. Muito marcadas pela memória da guerra. Por exemplo, os retornados, os espoliados,
as gentes que apanhadas nas armadilhas da história saíram, apressadamente dos territórios
africanos e regressaram ao continente, que a maioria não conhecia sequer, só agora começam a
escrever as suas memórias. Foram, tanto quanto se sabe 500.000 cidadãos. Em lado nenhum se
falou dessa memória. É chato que este discurso seja de direita. Mas essa gente têm memórias e a
sua vinda de África foi uma lufada de ar fresco na cinzenta sociedade caetanista. Mesmo que em
euforia revolucionária de cravo ao peito e cooperativa formada e comissão de moradores
reivindicativa. Não há memória institucionalizada. Será um sinal do afastamento do museu da
realidade? Ou será que a realidade não cabe no museu?
Ilustração 69 - Casa de Moçambique no Portugal dos Pequeninos em Coimbra
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território do outro e dos objectos do outro. Não era o outro que era revelado. Nas artes
nacionais África eram as madeiras no museu de arte antiga. É certo que o termo ―arte‖
para objectos africanos era recusado. A arte, tal como era concebida na época, era um
elemento da civilização. Selvagens não têm expressão artística.
Vai ser necessário esperar pelo modernismo português, nos diálogos culturais com as
vanguardas França e da Europa para a arte africana emergir como objecto de expressão
estética. Por isso é significativa a Exposição de Arte Indígena Portuguesa, realizada no
Museu do Chiado em 1934175
.
A questão da exigência duma Arte Negra era então colocada
por Diogo de Macedo: ―Acreditam numa arte negra – passe
o barbarismo linguístico – no senso plástico e na
espontaneidade criadora de uma arte gentílica‖176
. Macedo
reconhece que ela representa uma visão do africano, do seu
cosmos. Não se filia na herança clássica, mas reconhece que
é arte. Há no entanto uma valoração quando diz ―ela vive
ainda na idade pura da alma humana‖ (op cit 2) Este estatuto
de primitividade no entanto prevê que ela cresça. ―assistirão
ainda os vindouros – no movimento sucessivo do progresso
desta arte, na acção transformadora do seu fundo religioso –
ao nascimento da futura Vénus Equatorial, surgindo da
policromada concha, cinzelada do mundo dos silêncios da
alma negra, sob o doce embalo do rumor de pétalas de flores
exóticas, na madrugada de ébano do tormentoso continente negro? ―(op cit).
São sem dúvidas baseada em juízos de
valor que não reconhece a plenitude do
objecto. Ao estabelecer a classificação de
primitiva e ao considerar que a sua
evolução natural, permitirá, no quadro da
civilização (que naturalmente os
europeus lhe levarão) ascender a um
estatuto de maioridade. ―Cumpre, aos
homens de pensamento e de cultura,
incitá-la, ajuda-la, observando-a, estudando-a por um elevado e imparcial critério de
arte.‖ (op cit ,3) .
175
Não pretendemos com isto afirmar que este é um momento fundador. Não fizemos nenhuma
pesquisa que nos permita afirmar que a partir daqui as coisas foram diferentes. O que nós
colocamos é que nesta exposição o objecto africano á apresentado de forma racional, e não
como exótico. Não sabemos quando isso aconteceu. O que afirmamos apenas é que este modo
de apresentação é diferente do que se fazia até ao momento. E ao revelar a arte revela-se
também a humanidade. 176
MONTALVOR, Diogo de Macedo (1934): Arte Indígena Portuguesa,, Lisboa, Museu
Nacional de Arte Contemporânea, pag, 1
Ilustração 70 - Caspa de Almada Negreiros em 1934
Ilustração 71- Paça de escultura da exposição de 1934
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O objectivo da exposição, ao recolher várias peças que se encontravam dispersas por
várias colecções, publica e privadas, era mostrar os méritos plásticos177
das colecções.
Ao revelar a arte indígena, ao revelar a capacidade de criação das populações dos
territórios estavam, no pensamento do autor, a revelar a afirmação dos povos ―sob a
égide lusitana‖ que forma um vasto e rico património. É portanto um discurso motivado
por um pensamento colonial. Mas dele emerge a individualidade. É certo que ao colocar
a paternidade na lusitanidade entra em contradição com a valoração primitiva que antes
lhe havia atribuído. Mas apesar de tudo, ao abordar a sua identidade está a assumir a
consciência estética, portanto a conferir autonomia, que nos museus de etnologia não
tinham.
A curiosidade do discurso está também nas influências da sua inspiração. Ao longo do
texto surgem bastas referências à crítica de arte francesa. A autores que em França se
dedicam ao estudo da arte africana. A influência pela análise estética vem portanto
destas leituras do universo da arte, sobre o qual é colocado o
discurso colonial e nacionalista. Por exemplo, ao abordar as críticas
de André Damaison178
que afirmava, a propósito das máscaras dos
pescadores das ilhas Bijagós179
que esta influencia teria sido para lá
levada pelos marinheiros portugueses, e que isso seria uma
reelaboração das imagens fantásticas das proas dos navios e dos
objectos trazidos do Oriente. Sobre isto afirma Diogo de Macedo:
“ Mas que essa arte de cá tenha sido levada é um erro: primeiro
porque todos os povos têm os dons instintivos de arte, e os de África
tanto ou mais dos que os outros. Depois se algumas reminiscências
têm, são do Egipto, trazidas pelas emigrações árabes, que bateram
parte da Costa Ocidental; além disso pouco espírito das civilizações
orientais se topa nas populações da Senagâmbia, embora apareça
noutras províncias africanas; e acresce ainda, que as resoluções
técnicas da composição são contrárias à nossa arte de velhas eras,
em que a singeleza, embora barbara de aspecto, era profundamente espiritual, o que
não se vislumbra na escultura de ali.” (op.cit ,8)
Esta análise, para além de exaustiva e rigorosa, porque se preocupa com várias níveis de
argumentação desmontando-os com sapiência, mobilizando a racionalidade, não deixa
de reflectir um debata que se fazia, ao tempo na sociedade. O de conferir a capacidade
artística às culturas africanas. Recorde-se a propósito que nos antigos debates que
legitimavam a escravatura, era precisamente a identificação, por parte da igreja, se os
povos africanos tinham alma. O estatuto de alma era o conferia a direito da humanidade.
A sua não existência aproximava-os da animalidade, legitimando portanto a condição de
177
A exposição terá decorrido após um conjunto de artigos sobre arte africana que Domingos de
Macedo publicou, na época no boletim ―O Mundo Português‖. 178
Crítico de Arte. O autor não refere a fonte. 179
No museu Afro-Brasil existe uma colecção destas máscaras
Ilustração 72 - Paça Escultura africana
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escravo180
. Ora o reconhecimento da capacidade das culturas africanas, dos africanos
indígenas produzirem arte, uma arte que brota da sua essência, significa o
reconhecimento duma identidade. Uma identidade que a ideologia colonial recusa,
porque a legitimação do seu domínio sobre o outro se baseia na recusa do seu
reconhecimento e na afirmação do acto civilizador, o acto de fazer elevar o homem à
sua condição de membro da humanidade. Se ele tiver arte, porquê a necessidade de o
civilizar?
Voltando ao trabalho de Diogo de Macedo, para justificar plenamente a exposição,
depois de ter desmontado os argumentos sobre ―a condição artística‖ remata,
socorrendo-se mais uma vez do crítico de arte francês: ―l‘ art africain possède dês
qualitès plastiques, ornamentales et picturales justifian pour lui un
range apurés dês arts universeles‖ (op cit, 9)181
. E com estas
palavras remata ―Só por si, esta afirmativa saída da pena de tão
sábia competência justifica a publicação do presente volume, visto
nós, em Portugal, ainda o não termos reconhecido claramente,
apesar de possuirmos magníficas colecções, mas às quais ainda não
pudemos dar a sua devida importância, organizando-as num
ordenado Museu, para que os incrédulos abdiquem do seu
negativismo doentio.‖ (op cit).
O autor prossegue o seu ensaio com varias reflexões sobre a
estética da ―arte primitiva‖, a sua grandiosidade devido à sua
simplicidade, á sua proximidade em relação à emoção mais
simples, desprovida de intenções comerciais. Por exemplo a certa
altura escreve sobre as condições de produção dos vários objectos.
Por exemplo, em relação à
colecção de mascaras
revela o seu contexto de uso e significado, que
demonstra uma capacidade de leitura do objecto
e do seu contexto de produção com um ―olhar
antropológico‖. Refere igualmente os debates
entre os pintores de vanguarda, sobre a
identidade da arte negra.182
, o modo de como os
objectos africanos passaram de exóticos a
objectos de arte. Explora ainda a diversidade
regional dos objectos. Por exemplo a propósito
dos Macondes de Moçambique diz: ― Os
Macondes, que furam os beiços e as narina para lhe introduzirem rodelas ou angreis de
180
Vejam-se os trabalhos de Isabel Castro Henriques, Pássaro de Mel, Lisboa, Edições Colibri,
2003 181
Mais uma vez a citação não apresenta a fonte. 182
Recorde-se que Picasso, Matisse e Modigliani exploraram a estética africana no âmbito dos
seus estudos e trabalhos pictóricos
Ilustração 73Escultura africana
Ilustração 74 -Representação de Moçambique na Exposição colonial em 1934
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madeira, assim como os Macuas do Niassa e de Inhambane, tatuados a fogo, da nuca até
ao umbigo, fatalmente produzem uma arte mais vigorosa e inculta do que os negros de
Lourenço Marques, onde a civilização lhes simplificou o gosto, tornando mais
decorativas todas as suas concepções‖ (op cit 22).
Mais à frente, a propósito dos objectos de Moçambique vai reconhecer outras
influências culturais que marca a produção de objectos, acabando por reconhecer
implicitamente que a arte não é só‖primitiva‖. ―Antes de ali chegar a civilização
portuguesa (…) também a Ásia lá levou as suas fortes
influências, em vários períodos de invasão, deixando
hábitos nos negros e amostras de gosto exuberante, que
explicam certos costumes que aos europeus tanto
pasmos ainda causam. ―(in idem) E depois explica o
maravilhoso deste contacto. Até aí, a sua reflexão tinha-
se cingido aos objectos de madeira ―A arte gentílica de
que até aqui nos têm ocupado, (…) pode dizer-se que
pertence à idade da madeira. A sua catedral A sua
razão, a sua oficina e é a floresta‖.(op. cit 23). Reconhece que em certas condições são
utilizados outros materiais. N país dos Gibini o bronze (saliente-se a importância do
trabalho com os metais que implica domínio tecnológico). Das estatuetas de Marfim do
Benim (que o autor salienta a influencia portuguesa por via da Índia), a propósito dos
altos-relevos da Nigéria diz a certa altura ―Em Portugal só conhecemos os da sociedade
de Geografia que o Estado devia adquirir para expos no museu das Janela
Verdes.‖(op.cit. 23)
Não vamos prosseguir análise desde discurso, não que não tenha interesse, mas apenas
porque no âmbito deste nosso pequeno exercício, já dispomos dos
elementos que necessitamos para concluir. Para lá das questões e
preconceitos sobre a ―arte negra‖, é indubitável que aqui se opera
uma transformação no modo de apresentação do objecto africano.
Até aqui ele surge em contexto duma museologia etnológica, como
um exemplo de curiosidade sobre povos primitivos e exóticos. Uma
memória dum passado também idêntico ao nosso, estando implícito
que existe uma linha evolucionista da primitivo para a civilização.
Para além disso, todos os objectos são colocados museu como
troféus, como saque, como memórias de viagens por europeus. Os
produtores desses objectos não são chamados à musealização183
. A
sua entrada nos museus de arte representa uma autonomia em
183
Eu sei que ainda não havia ―nova museologia‖, e provavelmente os objectos etnológicos das
culturas camponesas europeias arcaicas, nos museus da época, também não são mediados pela
comunidade. No entanto não me parece incorrecta esta observação, na medida em que ele retrata
um modo de expor, em que o que é relevante é a diferença e não a identidade do objecto. Não há
a preocupação de incorporar o contexto social e cultural. Essa ―técnica‖ é uma aquisição
consciente da museologia contemporânea
Ilustração 75 - "Pretas da Guiné" com seios descobertos, Exposição Colonial 1934
Ilustração 76 - Fotografia de Mãe africana, apresentasda por Leite de Vasconcelos
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relação ao exótico que permite que o objecto possa ser admirado como expressão da
criação. Por outro lado, esse objecto, enquanto objecto de arte, num museu permite
também que ele se constitua como uma Janela para o contexto cultural da comunidade
que o produziu, por uma operação de contextualização.
É essa operação que irá permitir a modernização do discurso expográfico
no museu de Etnologia anos mais tarde. É essa consciência do outro que
permite Veiga de Oliveira expressar a busca da estética e da representação
dessa estética.
De Leite de Vasconcelos e da sua secção colonial no Museu Nacional de
Etnologia, que como vimos acima nunca foi desenvolvida, em 1929
escrevia seguintes palavras no Boletim de Etnografia. “Quando Regi, na
Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, a cadeira de Arqueologia,
costumava às vezes, para explicar objectos pré-históricos ou proto-
históricos, mostrar objectos similares usados por selvagens, ou
reproduções: método etnográfico. Adiante se publicam algumas destas‖
(Boletim de Etnografia, nº 4, 1929, p 21),
Trinta anos Depois Jorge Dias e Veiga de Oliveira organizam no então Museu de
Etnologia do Ultramar, uma exposição sobre os Macondes (1959). Objectos esses que
em 1968 integrarão a Exposição de Escultura Africana 184
, mais tarde, já em 1985
rotulada ―Escultura Africana em Portugal‖ 185
. E ainda
mais tarde, em 1992 a Exposição África coordenada por
Jill Dias e patrocinada pela Comissão Nacional dos
Descobrimentos Portugueses186
, são os mesmos objectos
que viajam no tempo.
São olhares e discursos expográficos ainda herdeiros do
objecto e da sua condição colonial. Há sem dúvida uma
modernização do processo expositivo. Há sem dúvida uma
intenção reforçada de contextualizar os objectos. A
tentativa de abordar os objectos com novos olhares. Mas
será que esses objectos são apresentados como nossos,
apropriados pela comunidade, ou ainda são objectos dos
outros.
Mas parece-nos que a museologia da cidade ainda não produziu um processo
museológico sobre a sua herança africana. Nem no campo da arte, nem no campo da
história, nem no campo da antropologia. A Existe uma incapacidade dos museólogos de
184
Escultura Africana no Museu de Etnologia do Ultramar Lisboa, Junta de Investigação do
Ultramar, 1968. 185
Escultura Africana em Portugal, Lisboa, Museus e Etnologia do Instituto de Investigação
Científica Tropical, 1985 186
África – Exposição no Museu Nacional de Etnologia, Lisboa, Comissão Nacional para as
Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1992
Ilustração 77 - Icone Maconde em desenho de Leite de Vasconcelos
Ilustração 78 - Escultura Maconde em Madeira do Museu de Etnologia, recolhida por Jorge Dias
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incorporarem a diferença. Não estamos a reconhecer a herança africana, não estamos a
mobilizar essa herança para o desenvolvimento da nossa cidade. E aqui, pensamos, que
a museologia, a sociomuseologia tem um campo para trabalhar em ambiente urbano.
Cegados aqui, mesmo perante as insuficiências do discurso demonstrativo, porque este
não é o objectivo do trabalho, somos obrigados a
concluir que, sendo a museologia uma ciência de
acção, sendo um museólogo um mediador de
processos de desenvolvimento da comunidade, não
poderia deixar de concluir que esta constatação, da não
resolução da herança africana se deveria desenvolver
como um processo museológico em contexto urbano.
Que nele deveriam ser mobilizadas as comunidades
africanas, as memórias africanas. As memórias dos
africanos e dos europeus. Não como uma exposição exuberante, que poderia também
ser, mas um museu ao serviço da comunidade, alocando essa memória para desenvolver
a herança e satisfazer as necessidades da comunidade urbana. Essa seriam um tema para
outro trabalho.
Ilustração 79 - Imagens dos Africanos pelos Portugueses, publicado por Alfredo Margarido
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6 Resultados Provisórios do Roteiro
Aqui chegados importa concluir provisoriamente este roteiro. Passamos em revista os
vários módulos. Digitalizamos os nossos apontamentos, incorporamos os vários
materiais distribuídos ao longo dos seminários e trabalhamos sobre a bibliografia
distribuída. Fizemo-lo em relação a cada módulo atribuindo a cada professor uma
individualidade. Não que essa organização modular tenha algum significado específico,
mas porque nos parece relevante trabalhar cada um dos professores a partir do seu
contributo para a museologia. Sabemos que isso não esgota a teoria museológica, nem a
sua diversidade. Parece-nos contudo que foi um exercício necessário para interiorizar
um conjunto de conceitos operatórios que irão ser mobilizados para o nosso trabalho.
Temos consciência que não fizemos nesse capítulo a síntese. Foi mais uma análise que
nos serviu para alavancar a síntese juntamente com as leituras
complementares. Temos consciência da nossa subversão à
estrutura do relatório. Mas como é um relatório curricular,
consideramos que era importante mostrar este nosso percurso.
De seguida mobilizamos as memórias das nossas viagens e
fizemos uma síntese dos utensílios metodológicos e conceptuais
aplicados. Considerando a museologia como uma ciência aplicada,
penso que a reflexão teórica tem que ser exercida em diálogo sobre
os processos museológicos. Assim procuramos construir uma
grelha de análise da presença do outro no âmbito de dois conjuntos
de processos museológicos. Um sobre os museus paulistas, outro
sobre os museus de Lisboa.
Não foi um processo de análise pela análise, mas sim um exercício de interrogação com
os olhos postos na nossa tese, a questionar como observamos o ―lugar do outro no
museu‖. As leituras que procuramos imprimir foram a de uma dinâmica de viagem,
onde à medida que vamos criando registos vamos fazendo as suas leituras. Estas leituras
são dialógicas, poderíamos dizer mesmo trialógicas. Registamos (a partir da
interrogação inicial), Reflectimos (mobilizamos a teoria e dialogamos com os teóricos)
e Relemos (re-interrogamos –como mobilizamos isto para criar cultura juntamente com
os outros ?) Essa vai constituir a nota da acção metodológica que vamos imprimir na
nossa tese. Isto é um relatório dum processo que terminamos a perguntar onde está a
herança africana nos museus de Lisboa.
Voltando às conclusões deste trabalho, não procuramos tanto fazer a história de cada
instituição, mas sim tentar compreender, dentro da cada instituição o lugar da herança
africana, o contexto da sua produção, os modos de incorporação dos objectos, o
inventário desses objectos. Paralelamente visitamos os sítios, falamos com pessoas, uns
responsáveis, outros funcionários. Viajamos umas vezes sozinhos, outras vezes
acompanhados. Umas vezes com adultos, outras com os meus filhos. Vale a pena aqui
Ilustração 80 - Capa de Publicação da CML em 2009- Peças da colecção doo Escultor José de Guimarães
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241 UNIVERSIDADE LUSOFONA DE HUMANIDADES E TECNOLOGIAS-DOUTORAMENTO EM MUSEOLOGIA
prestar tributo a Mário Chagas e ao Chapeuzinho Negro da formatura do seu filho. Este
olhar do outro que na sua simplicidade nos ajuda a entender o essencial do ―outro como
heterónimo‖.
Este exercício sobre os museus da cidade foi sendo construído ao longo deste processo.
Temos que prestar aqui tributo a Marcelo Cunha e ao exercício prático que propôs e que
nos fez interrogar o Museu da Cidade. Já prestamos tributo a Cristina Bruno e as suas
propostas de viagens museológica. E já agora a Mário Moutinho e à sua preocupação
coma Função Social e ao Museu como entidade prestadora de serviços. Essa Leitura
permitiu equacionar a interrogação sobre o serviço destes nossos museus urbanos á
comunidade. Maria Célia, e às suas propostas de educação
museológica como processos de comunicação e participação
comunitária levou-os a interrogar os serviços educativos, as
suas propostas e a reflectir sobre que possibilidades existem
de desenvolver acções em cada local em função de cada
comunidade. A Regina Abreu e Pierre Maryland ficamos
também tributários dos seus trabalhos sobre a sistematização
da construção da identidade e sobre a subversão como atitude
crítica.
Por fim a contribuição de Judite Primo com as suas análises
sobre as políticas culturais, emerge também o contributo para
uma reflexão sobre o local dou outro em contexto museológico, na desmontagem dos
discursos e na formulação duma metodologia activa de busca das identidades a partir da
comunidade. Mas essa é uma linha de reflexão mais conclusiva, a partir da qual se irá
construir um percurso teórico e conceptual na nossa tese, e por isso lá voltaremos, com
a consciência de que aqui ainda não chegamos lá. Mas o que fizemos, com o contributo
dessa abordagem serviu-nos para efectuar a análise crítica e transversal dos temas
abordados.
Essa viagem levou-nos a algumas constatações sobre a forma de evolução do lugar da
herança africana na narrativa museológica dos museus que visitamos. Não procuramos
com isso construir uma tese, mas sim instrumentos de trabalho. Os dados que
apresentamos não são por isso dados conclusivos, embora me parecem legítimos,
porque resultaram duma metodologia científica, rudimentar é certo, mas dentro dessa
rudeza do trabalho permite vislumbrar uma realidade e uma janela de oportunidade para
a acção museológica. A nossa proposta não é naturalmente para levar a sério, pelo
menos sem que o exercício científico seja efectuado de forma mais rigorosa e exaustiva.
Mas para os nossos objectivos, de criação duma grelha de análise pensamos que
resultou.
Paramos onde devíamos estar a começar. A partir daqui é necessário reformular a nossa
problemática e repensar as nossas metodologias. O trabalho que se segue é portanto
reformular o roteiro metodológico. Reconstrui-lo para partir.
Ilustração 81 - Capa da publicação de Isabel Castro Henriques, 2009
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Esta nossa viagem, neste momento é uma viagem experimental. O objecto de análise e
projecto museológico não são realizados sobre estes objectos. Nem tão pouco estes
serão os das metodologias. Mas é a partir de aqui que as vamos construir. Aqui
procuramos apenas testar instrumentos de análise da presença do outro numa cultura, e
de que forma essa cultura os incorporou. A tese vai trabalhar sobre contextos e
comunidades diferentes.
Portanto com outros instrumentos e outras
contribuições. A abordagem teórica terá que ser
reconstruída em função disso. No terreno, confrontando
a teoria com o real, olhando os museus africanos,
interrogando-os sobre a sua função social, olhando nos
rostos das gentes, perguntando-lhes pelas suas
memórias, olhando para as suas heranças, para os
modos de sociabilidade, procurando perceber como se
foram hibridizando. PERGUNTANDO-LHES SE ME
ACEITAM COMO MEDIADOR DUM PROCESSO
MUSEOLÓGICO E TRABALHANDO COM ELES PARA CONSTRIR UM FUTURO
DELES E MEU. Para isso terei que fazer outras viagens e mobilizar mais leituras,
outros saberes e mais técnicas.
Ilustração 82 - Kanimbanbo- um encontro por consciencializar na cultura portuguesa
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7. BIBLIOGRAFIA COMENTADA PARA APARTE CURRICULAR
Optamos por incluir a bibliografia comentada na síntese de cada módulo. Inicialmente
tivemos a intenção de incluir neste capítulo algumas leituras que ficaram por fazer
quando apresentamos o Roteiro Metodológico. A construção da narrativa deste trabalho
todavia levanto-nos um conjunto de interrogações que nos obrigam a reler algumas das
questões em função disso.
Decidimos por isso apresenta-las na nossa reformulação do Roteiro Metodológico que
nos irá acompanhar como documento orientador da investigação
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8 DOCUMENTOS COMPLEMENTARES
Não apresentamos documentos complementares
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