SUPERFICIE REFLEXIVA
Por
ANGELO LOURIVAL RICCHETTI
Original de Angelo Lourival Ricchetti para Roteiro para
cinema em sexta versão
TÍTULO DO FILME E APRESENTAÇÃO
SUPERFICIE REFLEXIVA
Apresentação dos créditos, etc
INT. CAVERNA - DIA
Valdo tenta puxar uma caixa pesada da prateleira para um
carrinho embaixo.
VALDO
Me ajude aqui.
HOMEM PÓS CIRURGIA
Não ajudo. Você não está seguindo
as regras!
VALDO
Venha ajudar! Você é um HOMEM PÓS
CIRURGIA, tem de obedecer!
HOMEM PÓS CIRURGIA
Só obedeço o manual. Se eu fosse
você faria a mesma coisa.
Valdo derruba a pesada caixa que vai ao solo, com um
grande estrondo, poeira. A tampa se abre, um dos
documentos, enrolado, como se fosse um papiro egípcio,
salta fora da caixa e se destaca, deixando ver a imagem de
uma jovem sorrindo.
HOMEM PÓS CIRURGIA (...cont.)
Tanto trabalho para arrolar o
material, encaixotar ... Pega
aquele rolo dali do chão!
Valdo apanha o rolo semi aberto, observa a imagem e atira
o rolo de novo ao solo. O colega apanha o rolo.
HOMEM PÓS CIRURGIA (...cont.)
Ah! É uma imagem... de uma jovem
em atitude interessante...
Joga o rolo no chão rapidamente.
HOMEM PÓS CIRURGIA (...cont.)
É melhor você não ver isso! A Lei
não permite!
VALDO
E a sua bunda eu posso olhar?
Posso? Por que posso sua bunda e
não o seu rosto? Quer saber? Vou
forçar você olhar meu rosto!
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 2.
Valdo tenta aproximar seu rosto do Pós Cirúrgico mas este
o empurra violentamente.
HOMEM PÓS CIRURGIA
Pare com isso! Você é um fraco!
Quer que eu denuncie você?
VALDO
Ei! Calma! Pronto, não estou
olhando... Vou guardar o rolo.
Valdo enrola o documento e percebe que o colega está
saindo.
VALDO (...cont.)
Espera ai! Onde você vai?
HOMEM PÓS CIRURGIA
Falar com a Supervisora Leda.
VALDO
Então vai me denunciar?
HOMEM PÓS CIRURGIA
Ainda não.
Ele se retira. Valdo resolve pegar o rolo e olhar o rosto
da moça na imagem. Desenha com dos dedos o contorno
daquele rosto, os lábios, os olhos...
VALDO
Você tem olhos verdes! Que cor
serão os meus?
Valdo escuta passos e vozes vindo de uma das alas da
caverna.
LEDA
(em off)
Esse Valdo não sabe seguir
instruções? Onde está ele?
HOMEM PÓS CIRURGIA
(também em off)
Ali, a esquerda...
Valdo, rapidamente, enrola a imagem em seu torso debaixo
do macacão. Entra Leda junto com o colega de Valdo. Ela
observa a caixa.
LEDA
Vá buscar uma nova caixa.
VALDO
É pra já, Supervisora!
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (3) 3.
LEDA
(para Valdo)
Você não, você fica!
O colega sai e Leda se aproxima de Valdo. Tenta abraçá-lo,
por trás. Valdo se afasta dela.
VALDO
Agora não dá! Estou todo
empoeirado...
LEDA
Não me importo com isso.
VALDO
Supervisora, estou sentindo um
pouco de tontura. Doze horas
trabalhando aqui. Posso ir para o
meu quarto me deitar um pouco?
LEDA
Tudo bem. Pode ir, mas me espere
lá.
Valdo sai e entra o seu colega com uma caixa nova.
HOMEM PÓS CIRURGIA
Tem uns jornalistas querendo
informações.
LEDA
Ah! Que hora imprópria...
Entram dois repórteres e um operador com sua câmera de TV.
REPÓRTER UM
Operador, comece então a gravar a
Supervisora falando...
LEDA
Vire essa câmara para lá! Se
gravar meu rosto, sabe o que vai
acontecer com você, senhor
Operador?
REPÓRTER DOIS
Mas quem vai vai querer ver seu
rosto, Supervisora?
LEDA
Senhor jornalista, quem lhe
informou destes objetos?
REPÓRTER DOIS
Nossas fontes são confidenciais.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (4) 4.
REPÓRTER UM
Esses achados são de interesse de
todos!
LEDA
Eu resolvo o que é de interesse
de todos.
O operador, com a intenção de gravar, se aproxima da caixa
sem a tampa na qual o HOMEM PÓS CIRURGIA retira os
documentos para colocar na nova caixa.
LEDA
Sai de perto dessa caixa! Tire a
câmara dai!
KAYO
Mas preciso mostrar esses objetos
para o público...
LEDA
Não precisa. Ainda vão ser
analisados no Planeta Terra! Mas
quero saber quem foi a fonte!
REPÓRTER DOIS
São dos pioneiros! Interessam a
todos nós!
LEDA
Foi isso que a fonte disse? Quero
saber quem é essa fonte!
O operador Kayo tenta de novo registrar o documento.
LEDA (...cont.)
Tire essa camara dai! Quer que eu
vá pegar de você?
REPÓRTER UM
Não faça isso, Supervisora, é
parte do trabalho dele.
LEDA
Esperem um pouco. Vou fazer uma
surpresa para vocês.
Ela sai os repórteres começam a mexer nos documentos.
HOMEM PÓS CIRURGIA
Não podem mexer nos documentos!
HOMEM PÓS CIRURGIA tenta impedir os jornalistas mas
Repórter Um impede e o segura, enquanto Repórter Dois
folheia alguns livros.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (5) 5.
REPÓRTER DOIS
Interessante! Livros do Século
Vinte! Kayo grava aqui as capas
dos livros.
Kayo grava as capas e também alguns objetos da caixa.
HOMEM PÓS CIRURGIA escapa do Repórter Um e avança sobre
Kayo que se livra dele e se retira rápido. Os repórteres
continuam a mexer nos livros e objetos. Distraídos não
percebem a chegada de Leda, Sônia e um soldado.
LEDA
Oficial Sônia, prenda esses
jornalistas! Estão mexendo no que
não devem!
REPÓRTER DOIS
Calma, Supervisora, não pegamos
nada daqui. E a surpresa?
LEDA
A Oficial Sônia é a minha
surpresa! Ninguém pode saber
destes documentos e objetos!
Oficial, que está esperando?
Prenda esses jornalistas!
Sônia de modo rude coloca algemas rapidamente no Repórter
UM e o soldado no outro.
LEDA (...cont.)
Está faltando um deles. Onde está
o operador da câmera?
Os dois jornalistas não dizem nada. Ela se enfurece.
LEDA (...cont.)
Preferem falar debaixo de
tortura? Pra mim, tudo bem!
Ela avança sobre os dois jornalistas. Fica nas costas do
Repórter Dois e o suspende pelos braços presos nas
algemas, forçando a espinha dorsal dele se curvar para
trás. O rapaz grita de dor. O outro jornalista, resolver
falar.
REPÓRTER UM
Pare com isso, por favor, Leda.
LEDA
Então me diga!
REPÓRTER UM
Ele saiu com as imagens gravadas
dos objetos.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (6) 6.
LEDA
Foi para onde?
REPÓRTER DOIS
(fala com dificuldade por
causa da posição que é
mantido por Leda)
Deve ter levado para o estúdio da
TV.
LEDA
E quem é a fonte das informações?
REPÓRTER UM
Não podemos informar!
Leda solta o Repórter Dois e ele vai ao chão. Avança sobre
o Repórter Um e o agarra por trás. Ele sente muita dor e
implora com voz abafada.
REPÓRTER UM
(fala com dificuldade por
causa da posição que Leda o
mantém)
Por favor, me solta. Eu digo...
Foi o operador da TV mas não sei
quem disse a ele...
Leda larga o Repórter Um que cai ao chão se contorcendo de
dor.
LEDA
Oficial, mande alguém à TV pegar
esse moço da camara.
OFICIAL SÔNIA
Mas não ví o jovem.
LEDA
Um dos dois vai indicar para você
sobre o operador e sobre o
informante. Sabe como fazer. Leve
esses jornalistas!
A Oficial e o soldado arrastam os dois pelas algemas para
fora.
HOMEM PÓS CIRURGIA
Supervisora, está faltando o
rolo?
LEDA
Que rolo?
HOMEM PÓS CIRURGIA
Aquele com a imagem da moça ...
Acho que um dos jornalistas sumiu
(MAIS...)
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (7) 7.
HOMEM PÓS CIRURGIA (...cont.)com ele. Ou foi o operador da
câmera que estava mais perto de
mim o tempo todo.
LEDA
E você deixou isso acontecer? Que
dia! Tudo de ruim está
acontecendo comigo.
LEDA (...cont.)
(pelo celular)
Sônia, veja se os jornalistas
pegaram algum documento. Pode ter
sido o operador. Cuide disso e
depois me informe.
Sônia guarda o celular.
HOMEM PÓS CIRURGIA
Supervisora, não é melhor fazer a
conferência de todas as peças?
Vai que levaram outras coisas...
LEDA
Vamos lá então. Me dá o relação
dos documentos e objetos.
Ele passa para ela o rol.
INT. NO QUARTO DE VALDO - DIA
Valdo está nu deitado na cama, com o rolo aberto olhando a
imagem da moça sorrindo e falando com ela.
VALDO
Não posso olhar sua imagem? Claro
que posso! Moça, você é
lindíssima! Mas, o que significa
esses lábios abertos? Por que
mostra os dentes?
Ele olha no verso do documento.
VALDO (...cont.)
2082! nossa... duzentos anos
atrás!
Valdo traça com os dedos os contornos do rosto da imagem e
depois traça com os dedos o contorno do seu rosto mesmo. E
vai detalhando, ora na imagem, ora em si, os lábios, os
olhos, o nariz da moça e de si... até que, cansado, ele
adormece, segurando a foto, que cai na cama.
8.
INT. CAVERNA - DIA
HOMEM PÓS CIRURGIA coloca a última peça dentro da caixa
nova.
HOMEM PÓS CIRURGIA
Pronto! todas as peças estão
dentro da caixa nova!
LEDA
Todas? Mas falta a imagem
enrolada e a da pequena
superfície reflexiva!
LEDA (...cont.)
(pelo celular)
Oficial Sônia. Veja se os
jornalistas estão com uma pequena
superfície reflexiva!
Leda guarda o celular no bolso do macacão e se volta para
o HOMEM PÓS CIRURGIA.
LEDA (...cont.)
Feche a caixa para não pegar
umidade.
HOMEM PÓS CIRURGIA
Peço para o pessoal do transporte
levar a caixa até nave?
LEDA
Claro que não! Precisamos
recuperar as peças antes.
Ela desliga o celular e sai apressada.
INT. NO QUARTO DE VALDO - DIA
Valdo está dormindo e acorda com batidas na porta do
quarto.
LEDA
(em off, do lado de fora)
Valdo! Valdo, abre essa porta!
Acorda, dorminhoco. Quero entrar!
VALDO
Já vai, espera. Vou colocar
o uniforme...
Rapidamente Valdo esconde o rolo debaixo da cama. Na
pressa,uma parte do rolo fica aparecendo, mas ele não
percebe.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 9.
LEDA
(em off, ainda no corredor)
Não coloque nada. Eu também vou
tirar meu macacão. Abre já, senão
eu chuto essa porta!
Valdo corre a abrir a porta e Leda entra tirando toda a
roupa e o coturno. Empurra Valdo para a cama e deita sobre
ele, sussurrando no ouvido dele.
LEDA (...cont.)
Estou precisando de sexo. Vamos,
Valdo, rápido!
VALDO
Calma, Leda, preciso antes que me
diga uma coisa.
LEDA
Fale!
VALDO
Por que não posso ver seu rosto?
LEDA
Ai, ai, ai... de novo essa
conversa? Quantas vezes tenho de
dizer que a Lei proíbe? Você é
tão burro! Não aprende nada!
VALDO
Mas preciso saber o por que, mais
nada...
LEDA
Vamos fazer o seguinte: Eu sou a
Lei! Certo?
VALDO
Certo.
LEDA
Então mando você calar a boca!
Vamos trepar!
Ela arruma o sexo dele com a mão para entrar em seu sexo.
Valdo tenta com uma das suas mãos levantar o rosto dela
para poder vê-la. Ela apanha a mãos dele com as suas,
levanta até a cabeceira da cama e torce, sem olhar para
ele.
LEDA
Pare com isso! Se tentar me
olhar, mais uma vez, mando você
para a cirurgia!
Ele geme pela dor que está sentindo e suplica para ela
parar.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (3) 10.
VALDO
Por favor, Leda, largue minhas
mãos.
LEDA
Já sabe! Mais uma vez e fica
igual o HOMEM PÓS CIRURGIA.
Ela liberta as mãos dele.
VALDO
Não, não, por favor, prometo que
não farei mais isso! Apenas o que
você desejar!
Ela faz os movimentos do coito cada vez mais de forma
violenta. Valdo, debaixo do corpo dela, deixa-se levar e
logo chega ao ponto de ejaculação. Leda não o permite. Ele
acaba esporrando nas pernas dela. Valdo sofre o desmaio
típico do macho humano após o coito. Leda não percebe e
continua falando com ele.
LEDA
Ah! muito bom! Você é um completo
idiota mas no sexo vale a pena.
Muito bom...
Como ele não responde, para de falar. Levanta-se e começa
a se vestir. Quando vai colocar o coturno repara na parte
do rolo que não ficou embaixo da cama.Leda apanha o rolo
debaixo da cama e abre. Observa a imagem da jovem
sorrindo. Apanha o celular enquanto calça o coturno.
LEDA
(pelo celular)
Sônia, não torture mais os
jornalistas.
Ela joga o rolo de volta embaixo da cama e sai.
INT. CORREDOR QUE DÁ PARA O QUARTO DE VALDO
Saindo do quarto, para o corredor, fecha a porta com
cuidado e continua a falar no celular no corredor.
LEDA
(pelo celular)
O rolo está com o Valdo. Deve ter
pego para se masturbar. Venha já
pra cá. Pegue o rolo e o Valdo!
Mas deixa que eu cuido dele
depois. Vou tomar um banho agora,
me liga no meu escritório,
depois. Estou fedendo.
Leda desliga o celular mas liga de novo.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 11.
LEDA (...cont.)
(pelo celular)
Sônia, tem mais uma coisa. Demos
falta ainda de uma pequena
superfície reflexiva. Está com os
jornalistas? Não? Veja se acha
aqui no quarto do Valdo. Não se
esqueça da gravação que está com
o operador.
Leda desliga o celular e sai.
INT. NA SALA DE AULA - DIA
Vera está sentada na cadeira de sua mesa de professora,
corrigindo provas de alunos. Ao fundo, ao lado do quadro
negro está a porta de que dá para o local aberto do
recreio. Entre sua mesa e o quadro negro estão os alunos,
de cinco e seis anos, sentados em suas cadeiras,
escrevendo. Os alunos ficam de costas, uns para os outros
e todos para a professora.
ALFREDO
Professora, o João está me
incomodando!
VERA
João! pare! Cochichando outra vez
no ouvido do Alfredo?
ALFREDO
Ele não está cochichando. Está me
forçando a olhar o rosto dele!
VERA
João,já de castigo!
João se levanta e vai se postar em canto da sala de costas
para todos. Toca um sinal. Todos se levantam e saem da
sala, em silêncio, de modo ordenado.
JOÃO
(de costas)
Posso ir também, Professora?
VERA
Pode ir mas depois do lanche
volte para o seu castigo.
Ele sai. Ela continua lendo os trabalhos dos alunos
12.
INT. NO QUARTO DE VALDO - DIA
Valdo desperta com batidas na porta do seu quarto. Procura
por Leda. Vai até a porta do banheiro. Ela não está. Valdo
se veste e apanha o rolo debaixo da cama.
VALDO
Quem está ai?
HOMEM PÓS CIRURGIA
(em off, no corredor)
Sou eu. Venha trabalhar! Não
posso fazer tudo sozinho lá na
caverna.
VALDO
Espera um pouco, vou me vestir
HOMEM PÓS CIRURGIA
Ande logo! Tem muito serviço lá
ainda.
Valdo se veste e apanha o rolo debaixo da cama. Olha a
imagem da moça.Enrola a imagem em torno do corpo e sai do
quarto.
EXT. NA PRAÇA EM FRENTE À ESCOLA INFANTIL - DIA
Homem pós cirurgia e Valdo atravessam a praça. Valdo para
em frente da porta da escola.
VALDO
Lembrei de uma coisa. Tenho um
recado para a Professora Vera.
Vai na frente. Logo alcanço você!
HOMEM PÓS CIRURGIA
Não! Vou junto! Não vai me
enganar e fugir do serviço lá.
Estou cansado de fazer tudo
sozinho!
VALDO
Tudo sozinho? Sempre ajudei você!
HOMEM PÓS CIRURGIA
Esqueceu de quando você ficava
lendo aqueles livros? Enquanto
isso, olha eu lá, trabalhando...
VALDO
Está certo. Mas pode ir. Eu não
demoro.
A contra gosto o HOMEM PÓS CIRURGIA aceita a situação e
segue em frente. Valdo entra na escola infantil.
13.
INT. CORREDOR QUE DÁ NO QUARTO DE VALDO - DIA
Sônia se aproxima da porta do quarto de Valdo
OFICIAL SÔNIA
Valdo, abra a porta! Valdo, não
vai abrir? Vou entrar de qualquer
modo. Tenho ordens!
Ela chuta a porta que se abre e entra. Procura por Valdo.
Tira o celular do bolso do uniforme.
OFICIAL SÔNIA
(pelo celular)
Supervisora! é a Oficial Sônia.
Valdo não está aqui no quarto
dele. O que eu faço? Entendi.
Ela procura por baixo da cama.
OFICIAL SÔNIA (...cont.)
(pelo celular)
Não está aqui. O que eu faço?
Sim, sim...Entendi.
Oficial Sônia desliga o celular e sai.
INT. ANTE SALA DA ESCOLA - DIA
Entra Valdo, com o rolo da imagem embaixo da camisa ainda.
Percebe que a Auxiliar está atenta nos informativos da TV,
O locutor, de costas para a câmara, veicula notícias.
Valdo aguarda um pouco. A moça não dá atenção a ele. Então
faz barulho para chamar a atenção dela.
VALDO
Preciso falar com a professora
Vera.
AUXILIAR
Não é possível. Está em aula.
VALDO
Não está! Agora é hora do
recreio.
AUXILIAR
Vou ver. Como é mesmo o seu nome?
VALDO
Valdo Will, trabalho com a
Supervisora!
Ela se levanta e sai da ante sala. Valdo tira o rolo com a
imagem debaixo da camisa e fica vendo a TV. O locutor, de
costas para a câmara, fala e coloca música.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 14.
LOCUTOR
(pelo aparelho de TV)
Vamos atrasar o noticiário das
onze horas devido a uma falha
técnica. Vamos ouvir música
eletrônica...
INT. NA SALA DE AULA - DIA
Vera ouve batidas na porta.
VERA
Entre!
A auxiliar da escola entra.
AUXILIAR
Professora, tem um ex aluno seu.
Deixo entrar?
VERA
Quem é?
AUXILIAR
Valdo, que trabalha com a
Supervisora Leda.
VERA
Quando era aluno nunca me
procurava, veja só...
AUXILIAR
Acho ele estranho...
VERA
Ele é inofensivo, não precisa ter
medo. Apenas é muito curioso. Uma
vez houve um problema na rede de
água. Não tinham posto o corante
para a água não ficar
transparente. Sabe o laguinho
aqui na frente da escola?
AUXILIAR
Sei sim.
VERA
Quem primeiro descobriu que a
água estava transparente?
AUXILIAR
Esse moço que acho estranho?
VERA
Exatamente. Eu já havia avisado a
Central de Água, quando percebi
(MAIS...)
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 15.
VERA (...cont.)que as crianças estavam lá e
corri até eles...
EXT. PEQUENO LAGO NA FRENTE DA ESCOLA - DIA
Surge Valdo com cinco anos acompanhado por duas meninas e
um menino, olhando a água sem corante.As crianças estão lá
quando surge Vera correndo até eles. Mas não dá tempo.
Valdo está se vendo no reflexo da água, feliz da vida. Dá
um salto e se joga rumo à sua imagem. Leda se joga, com
roupa e tudo para salvar ele.
INT. NA SALA DE AULA - DIA
Auxiliar escuta o relato de Vera, atentamente.
VERA
Com esforço, conseguí retirar o
menino da água, mas ele ficou
reclamando, chorava, esperneava.
AUXILIAR
Um menino maluco!
VERA
Pois é. Ficou bravo comigo.
Queria ficar com a imagem dele lá
embaixo da água.
Vera fica pensativa.
AUXILIAR
Dispenso ele ?
VERA
Não! Mande ele entrar.
A Auxiliar sai. Ela continua a corrigir o trabalho
escolar. Valdo entra com a foto enrolada debaixo do braço.
Não fecha a porta. Fica de pé atrás da cadeira que Vera se
senta.
VALDO
Preciso de sua ajuda. Estou em
uma encrenca danada!
VERA
Que novidade! Sempre você está.
Valdo joga o rolo sobre a mesa de Vera.
VERA (...cont.)
Que rolo é esse?
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 16.
VALDO
Esse rolo é a encrenca! Estava
arrolado nos achados da
caverna...
VERA
Que achados? Não sei de nada.
VALDO
Ninguém sabe. Proibido falar. São
objetos trazidos pelos pioneiros.
Vera vai abrir o rolo mas para.
VERA
Se é proibido não quero ver.Por
que você está com ele?
VALDO
Não resisti e levei comigo...
VERA
Isso é grave! E agora como vai
ser? Espere, você deixou a porta
aberta.
Ela se levanta e vai até a porta, fecha e volta e fica de
pé nas costas dele.
VERA (...cont.)
Por que você foi fazer isso? Você
continua uma criança, não
amadurece!
VALDO
Mas é uma imagem de uma jovem...
com os lábios entreabertos, os
dentes aparecendo... Eu não
entendo...
Pela janela aberta do lado esquerdo da sala, de frente
para a lousa, vem um ruído crescente de crianças brigando
e outras torcendo pela briga.
VERA
Espere um pouco. Muito barulho no
recreio das crianças.
INT. PÁTIO DO RECREIO DA ESCOLA - DIA
Ela vai até o recreio onde João e Alfredo brigam enquanto
os colegas fazem uma roda, torcendo aos gritos, conforme
ouvem os gritos de dor de cada colega. Vera grita com eles
e dá instruções, conforme percebe pelos sons o que eles
fazem.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 17.
VERA
Meninos,meninas, parem com isso!
Vamos brincar de trem. Alfredo,
você é a máquina. João, você é o
último vagão. Estendam as mãos
nos ombros dos colegas. Todos vão
repetindo o que a máquina cantar.
Eles estendem as mãos como ela orienta. Eles se arrumam,
conforme orientação. Cada um olha a nuca do outro.
VERA (...cont.)
Começa, Alfredo! E vai puxando
todos pelo páteo.
ALFREDO
Queixo pra cima, eu falo!
VERA
Os vagões agora cantam. Vamos lá!
TODOS OS DEMAIS
Queixo pra baixo, nós escutamos!
VERA
Agora você, João, último vagão!
JOÃO
Queixo pra cima, eu falo!
VERA
Todos agora!
TODOS OS DEMAIS
Queixo pra baixo, nós escutamos!
VERA
Isso mesmo! Continuem assim!
Circulem por todo o recreio até
eu mandar parar!
Os alunos, na formação e com a entoação dada pela
professora dão algumas voltas pelo pátio do recreio.
INT. SALA DE AULA - DIA
Enquanto se ouve os alunos fazendo o que a Vera manda, ela
volta à sala de aula e vai até a janela.
VERA
Veja! Eles são obedientes! Não é
como um certo rapaz chamado
Valdo.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 18.
VALDO
Professora,eu sou obediente mas
sou curioso. Apenas isso. E você
é a professora. Sabe das coisas!
VERA
Claro que sei muitas coisas mas
não tudo!
VALDO
Quem sabe tudo?
VERA
Alguem muito velho...
Valdo se aproxima dela por trás,com o rolo na mão e tenta
mostrar de novo para ela.
VALDO
Mas, Professora, deve ser uma
coisa simples, Por favor, só me
explique o que significa este
rosto!
VERA
Não vou olhar ! Não quero ver
rosto nenhum! Tira esse rolo da
minha frente!
VALDO
Por favor, Professora, não
agüento mais! Preciso saber o por
que! Minha cabeça está cheia de
perguntas sem resposta. É um
tormento...
VERA
Valdo, como você pode olhar o
rosto dela? Você sabe que isso é
pior do que roubar? É muito mais
grave!
Ela apanha a foto enrolada da mão dele e coloca no beiral
da janela.
VERA
Vamos ter que pensar como vamos
devolver isso.
VALDO
Mas por que devolver?
VERA
Você já cometeu dois crimes,
roubar um objeto de
responsabilidade da Supervisora!
E o outro, pior ainda, olhar o
rosto da imagem! O que mais quer?
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (3) 19.
Ela se dirige à sua mesa e Valdo segue atrás mas para em
uma das mesas dos alunos.
VALDO
Sabe de uma coisa ? Quantas
vezes, sentado aqui neste lugar,
olhando as nucas dos meus
colegas, eu sentia o seu olhar na
minha própria nuca, como se fosse
uma faca, abrindo meu cérebro,
uma chama queimando, uma luz...
VERA
Para com isso! Não vai me comover
com essas frases românticas!
Valdo vai em direção a ela, ficando de frente para ela.
Ele tenta erguer o rosto dela para o rosto dele. Ela se
solta, levanta-se e afasta dele.
VERA (...cont.)
Me larga! Por que fui àquele
banco de esperma buscar você!
VALDO
Ah... Então você foi minha
geratriz? Tem certeza? Como sabe?
VERA
Eu sei que é proibido mas ví
quando a enfermeira colocou a
pulseira em você com o seu número
de código... E´o mesmo que está
na sua ficha escolar.
Valdo se aproxima dela de novo, mas agora pelas costas
dela.
VALDO
Se você foi minha geratriz é mais
um motivo para me ajudar!
Ouve-se de novo a algazarra dos alunos lá no recreio.
VERA
(gritando)
Valdo, o rolo não está mais na
janela!
Os dois correm até a janela e olham para fora.
20.
INT. PÁTIO DO RECREIO DA ESCOLA - DIA
João está com o rolo aberto rindo e mostrando aos outros a
foto da jovem. Todos se amontoam para olhar a foto mas vem
Alfredo e arranca a foto da mão de João para ver de perto.
Vera vem correndo para o recreio. Ela tenta tirar a foto
das mãos dos alunos. A foto acaba sendo retalhada em
muitos pedaços nas mãos de muitos alunos.Ela fica com um
pedaço da foto nas mãos.
INT. SALA DE AULA - DIA
Valdo fica olhando a cena pela janela, sem ação. Entra a
Auxiliar . Vai até a janela e se assusta.
AUXILIAR
Que absurdo! Vou chamar os
soldados para acabar com essa
bagunça!
Ela tira o celular e vai se comunicar. Mas ele a agarra e
impede.
VALDO
Espere! A professora já está
resolvendo isso. Por favor!
AUXILIAR
Me solte!
Ela se solta dele e tenta se comunica pelo celular. Valdo
tira o celular da mão dela. A Auxiliar sai depressa da
sala.Vera cruza com ela ao entrar. A gritaria das crianças
continua lá no recreio.
INT. ANTE SALA DA ESCOLA - DIA
A Auxiliar pega o telefone de sua mesa de trabalho.
AUXILIAR
(pelo telefone)
Polícia! Por favor, venham
rápido, crianças aqui na escola
estão se olhando! Rápido!
Obrigada.
Ela torna a discar.
AUXILIAR
(pelo telefone)
Alô, é da TV? Está havendo algo
anormal com as crianças. Se
puder, envie um repórter. Já
comuniquei à Polícia. Obrigada.
21.
INT. SALA DE AULA - DIA
Vera vai até Valdo. A gritaria das crianças continua lá no
recreio.
VERA
Valdo, veja o que você fez com as
crianças.
Vera dá a Valdo o pedaço que sobrou.
VERA
Aqui está o pedaço que sobrou do
rolo !
VALDO
Não posso devolver esse pedaço!
Ela se senta em uma das cadeiras de aluno e põe a cabeça
entre seus braços. Ele fica de pé, ao lado dela, coloca
sua mão no ombro dela.
VERA
Tire a mão de mim! Tanto tempo
ensinando a essas crianças a não
fazer isso!
VALDO
Elas serão punidas?
VERA
Claro que sim! Eu também! Você
também, com sua curiosidade!
VALDO
Me ajude! Preciso fugir! Para
onde eu vou?
VERA
Suma de perto de mim!
INT. NA ANTE SALA DA ESCOLA - DIA
Entra Kayo com a camara a tiracolo e fala com a Auxiliar.
KAYO
Sou da TV. Posso filmar ai
dentro?
AUXILIAR
Não pode. A polícia ainda não
chegou. Espere.
Ela sai para a porta para esperar a polícia. Kayo vai
entrar na sala de aula mas escuta seu colega locutor pela
TV ligada.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 22.
LOCUTOR
Agora nosso boletim de
informações. Na Escola Infantil
estão ocorrendo distúrbios,
conforme telefonemas recebidos da
auxiliar, repassados à polícia.
Algo anormal acontece lá e logo
que soubermos mais detalhes,
informaremos. Voltamos a escutar
músicas eletrônicas.
A Auxiliar entra de novo da sala e fala para Kayo.
AUXILIAR
A polícia já vai chegar!
Kayo corre para a porta de saída.
AUXILIAR
Por ai não! A outra porta é que
dá para a sala de aula!
Mas Kayo sai mesmo da escola.
AUXILIAR (...cont.)
Estão todos loucos!
INT. SALA DE AULA - DIA
A gritaria da criançada não para. Vera vai até a janela
tentar acalmar as crianças enlouquecidas lá no recreio.
VERA
Parem com isso! Vamos! Todos em
fila indiana, um atrás do outro!
Vamos!
Vera se debruça no parapeito da janela e fecha os olhos,
falando com ela mesma.
VERA (...cont.)
As crianças não me respeitam.
Estão na minha responsabilidade.
Eu falhei.
INT. CAVERNA - DIA
OFICIAL SÔNIA
(pelo celular)
Supervisora, Valdo não devolveu
os objetos. Não apareceu aqui na
caverna. Tumulto na escola
infantil? Tudo bem. Estou indo
pra lá.
23.
INT. NA SALA DE AULA - DIA
Continua a gritaria da criançada no recreio. Vera está
desconsolada, junto à janela, com o rosto escondido pelos
braços. Valdo se aproxima dela mas sem a tocar.
VALDO
Talvez tenha uma brecha na Lei
que possa nos livrar.
Ela levanta a cabeça.Ela se levanta e olha na direção de
Valdo.
VERA
Ninguém nos denunciou!
VALDO
A Auxiliar vai denunciar.
VERA
Não importa! Suma daqui!
VALDO
Mas onde vou? E você não vai
fugir?
VERA
Não adianta mais eu querer fugir.
Ele vai sair mas nesse instante entra a Oficial Sônia, com
dois soldados e logo atrás a Supervisora Leda.
LEDA
Valdo! Até que enfim, encontro
você! Que barulho é esse?
Leda se volta para a Professora Vera.
LEDA (...cont.)
Professora Vera, o que está
acontecendo com seus alunos? Essa
gritaria...
Leda se volta para Sônia.
LEDA (...cont.)
Oficial , vá lá fora e veja o que
está acontecendo!
Valdo tenta sair mas um dos soldados o impede e o segura
por trás.
VERA
Eu posso explicar. Por favor
tenha calma.
Oficial Sônia aparece pela janela.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 24.
OFICIAL SÔNIA
Veja pela janela, rápido!
Leda vai até a janela.
LEDA
Oficial, pare com isso!
VERA
Eu posso explicar...
Leda se volta para a direção de Vera.
LEDA
Soldado! Detenha a professora!
VALDO
Ela não teve culpa. Eu fui o
responsável!
LEDA
Você também será punido!
VALDO
Mas eu ia devolver o rolo com a
imagem!
LEDA
Cadê a imagem?
VALDO
As crianças rasgaram a imagem.
LEDA
E a superfície reflexiva? Cadê?
VALDO
Não sei disso. Nem sei o que é.
Oficial Sônia entra na sala de aula
OFICIAL SÔNIA
Soldados! Venham me ajudar a
conter a criançada!
VERA
Não ponham as mãos nas crianças!
Vera tenta impedir o soldado de sair. O soldado a empurra
e sai. O soldado que segura Valdo sai também. Valdo corre
para levantar Vera do chão. Vera se levanta e grita para
Valdo.
VERA (...cont.)
Valdo, fuja!
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (3) 25.
Quando Valdo vai sair da sala, Leda tenta impedí-lo. Vera
se atira sobre ela. As duas lutam. Mas Vera é mais fraca e
está sendo dominada. Valdo foge. Leda corre para a janela,
gritando.
LEDA
Oficial, depressa, voltem aqui.
Valdo está fugindo!
Leda corre para a porta mas Vera a cerca, fica frente a
frente com Leda. Agarra o rosto de Leda com as duas mãos.
VERA
Veja meu rosto!
LEDA
Nunca!
Leda esmurra Vera no rosto. Depois a chuta no ventre. Leda
corre para a porta.
INT. NA ANTE SALA DA ESCOLA - DIA
Leda encontra a Oficial e quatro soldados.
LEDA
Oficial, chame reforços e prenda
a professora e os alunos!
Soldado, venha comigo. Vamos
atrás dele, não deve estar longe!
Saem soldado e Leda para fora da Escola. Sônia e os três
soldados voltam para o páteo da escola. A Auxiliar vai
para a sala de aula.
INT.SALA DE AULA - DIA
Na sala de aula, Vera está desmaiada no chão. A Assistente
entra na sala e se depara com Vera no chão. Põe as mãos na
cabeça, assustada.
INT. ANTE SALA DA CASA DO SÁBIO MUTT - DIA
Iris, sentada em um sofá, lê um livro.A TV está ligada e
transmite música e notícias, em som bem baixo. Ouve-se
alguem bater palmas para chamar a atenção.
SÁBIO MUTT
(em off)
Iris, veja quem é.
IRIS
Por que você mesmo não vai ver?
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 26.
SÁBIO MUTT
(em off)
Atenda essa porta!
Iris marca a página que parou e deixa o livro de lado. Ela
vai até a TV e desliga. Vai até a porta mas não abre.
IRIS
O que deseja?
VALDO
(em off, do lado de fora)
O Sábio Mutt está? Preciso falar
com ele. É urgente!
IRIS
Qual é o seu nome?
VALDO
(em off, do lado de
fora,falando alto)
Mas, por que deseja saber meu
nome?
IRIS
Preciso saber!Não vai dizer? Não
entra!
VALDO
Calma! Sou Valdo Will. Mas ... "
O que é um nome? Não será mão,
nem pé..."
Iris abre a porta rapidamente e Valdo entra. Olha Iris com
o canto dos olhos. Sorri.
VALDO (...cont.)
" Não será mão, nem pé, nem braço
ou rosto, nem parte alguma que
pertença ao corpo."
Ela olha Valdo com o canto dos olhos e sorri. Recita a
continuação do que ele começou.
IRIS
"Meu inimigo é apenas o teu nome.
Continuarias sendo o que és, se
acaso Montecchio tu não fosses.
Que é Montecchio?"
VALDO
"Que há num simples nome? O que
chamamos rosa, sob uma outra
designação teria igual perfume."
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (3) 27.
IRIS
Onde leu Shakespeare?
VALDO
Isso não interessa. E você onde
leu?
IRIS
Isso também não lhe interessa. O
que deseja com o sábio?
VALDO
Quero perguntar sobre um objeto
que encontrei na caverna.
IRIS
Cadê o objeto?
VALDO
Vou mostrar só para o Sábio Mutt.
Nem sei quem é você...
IRIS
Não está vendo que sou a auxiliar
dele, a Iris ? Ah, sim, você não
pode ver, Desculpe...
VALDO
Posso e não posso, depende...
IRIS
Também posso... Mas com uma
condição.
VALDO
Qual condição?
IRIS
Você não me denuncia e também não
o denuncio!
VALDO
Combinado.
IRIS
Eu estou vendo você nesse
instante...
Eles estão lado a lado, olhando para a frente, seus ombos
quase se encostam. Ela sorri, divertida.
VALDO
Ah! Você está me espiando com o
canto do olho!
Ele dá uma risada alta.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (4) 28.
IRIS
Psiu! Fala baixo! Então você está
me espiando também!
VALDO
Você é bem esperta. Será que a
Lei permite esse modo de ver?
IRIS
Não permite. E o objeto ?
VALDO
Vou mostrar apenas para o Sábio
Mutt, já falei!
IRIS
Mas fui eu quem examinei todos os
objetos da caverna. Mutt é
cego...
VALDO
Ah, objetos da caverna! Então é
por isso que leu Shakespeare...
IRIS
Eu posso mas você não podia!
VALDO
Posso! Eu trabalho na caverna. Lí
todos os livros dos pioneiros!
Você leu só Romeu e Julieta?
IRIS
Lí todos. E então vai me mostrar
o objeto ou não?
VALDO
Mas eu tenho perguntas a fazer a
ele. Você não tem as respostas...
IRIS
Claro que tenho. Mais até que do
que o Mutt.
VALDO
Quero saber uma coisa...
IRIS
O que?
VALDO
Seus cabelos estão arrumados!
Como consegue se pentear?
IRIS
Porque eu me vejo.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (5) 29.
VALDO
Ah! Você está caçoando de mim.
Iris rapidamente arranca o que ele esconde. Pego de
surpresa, ele não resiste. Ela olha o fragmento da foto.
IRIS
A imagem está rasgada...O que
houve?
VALDO
As crianças da escola rasgaram...
Agora estão me caçando...
IRIS
Quem está caçando você?
VALDO
A Supervisora Leda...
Ela tapa a boca dele.
IRIS
Quieto!
SÁBIO MUTT
(em off)
Iris, quem está aí como você?
IRIS
É um jovem que trabalha na
caverna.
Ele tira a mão dela de sua boca, com força.Entra um velho
mas bem disposto, mal encarado.
SÁBIO MUTT
Cansei de dizer que não quero
você andando por aí acompanhada!
E esse, ainda por cima, é muito
jovem !
VALDO
Como sabe que sou jovem ? Você
está me olhando ?
SÁBIO MUTT
Eu posso até olhar, mas não vejo.
Sou cego, olho e não vejo.
VALDO
Então não dá para saber que sou
jovem...
SÁBIO MUTT
Eu escuto muito bem. E essa voz é
de alguém muito jovem.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (6) 30.
Ela o puxa pelo braço para a porta da ante sala.
IRIS
Até mais, Valdo!
VALDO
Iris, não estou de saida!
Valdo se desvencilha dela e encara o Mutt.
VALDO (...cont.)
Por que é chamado de Sábio ?
SÁBIO MUTT
Boa pergunta! Sou Sábio porque
sei tudo a respeito das regras,
da Lei.
VALDO
Mas então sabe que se a Lei for
injusta, deve ser mudada, não é?
SÁBIO MUTT
Não se muda a lei! Ela é a
garantia do conhecimento e o que
se conhece não muda nunca!
VALDO
Não é justo não se poder olhar
outra pessoa! E se o olhar for
por acaso?
SÁBIO MUTT
Por acaso você está "vendo" e não
"olhando". No olhar você está
vendo mas com alguma intenção.
Esse é o mal.
VALDO
Por que é o mal?
SÁBIO MUTT
Porque as pessoas não devem ser
incomodadas, não devem sentir
emoções, como antigamente no
Planeta Terra.
VALDO
Nós somos humanos, sentimos
emoções. A Lei deve ser mudada!
SÁBIO MUTT
A Lei mantém a ordem, a razão,
como tudo deve ser sempre. Nada
pode mudar. Seria o caos. A
barbárie!
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (7) 31.
VALDO
Ao menos a Lei prevê as
injustiças que podem ser
cometidas em nome dela?
SÁBIO MUTT
Não há injustiças. Tudo está
previsto nos mínimos detalhes.
Mutt vai até a estante de livros e apanha um deles bem
groso. Abre em uma página e lê.
SÁBIO MUTT (...cont.)
Artigo 170. Se alguém forçar
outro alguém a olhar em seus
olhos é crime com a punição de
sofrer a cirurgia de retenção dos
músculos do pescoço.
VALDO
A cirurgia! Mas precisa ter
denuncia? Se não houver não é
crime...
O Sábio Mutt dá uma gargalhada!
SÁBIO MUTT
Por suas perguntas deve estar com
problemas quanto a Lei... Vai me
contar?
O Mutt para de gargalhar. Percebe que Valdo se aproxima
dele, com a mão levantada pronto para dar um tapa nele.
IRIS
Valdo, o que vai fazer?
SÁBIO MUTT
Vai me bater ? Tente !
Mutt levanta o livro grosso e ameaça Valdo com ele! Valdo
abaixa a mão.
VALDO
Não posso bater porque não "vejo"
seu rosto. Mas o senhor "ouviu" a
minha mão ?
O sábio abaixa o livro grosso.
VALDO (...cont.)
Quanto a Iris...
IRIS
Por favor, Valdo, não fale de mim
!
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (8) 32.
SÁBIO MUTT
O quem tem minha auxiliar?
VALDO
Duvido que seja apenas sua
auxiliar!
IRIS
Pare com isso, Valdo. É verdade,
eu sou protegida pelo senhor
MUTT. Aprendo muito com ele.
VALDO
Aprende o que? A ser falsa como
ele é?
SÁBIO MUTT
Chega! Foi muito longe nas suas
ofensas a mim. Retire-se já da
minha casa!
IRIS
Valdo, é melhor você sair. Depois
nos falamos...
SÁBIO MUTT
Não vou permitir,Iris!
IRIS
Tudo bem! Nossa relação azedou
mesmo e não é de hoje.
Saia,Valdo.
Valdo sai da casa rapidamente. Sábio Mutt segura Iris pelo
braço.
SÁBIO MUTT
Não vai sair com ele! Não agüento
mais o que você faz com esses
moços!
IRIS
Quer saber de uma coisa? Eu é que
não aguento mais essa opressão,
esses ciumes! Chega!
Iris se desvencilha dele.
SÁBIO MUTT
Iris, vou procurar a Leda.
IRIS
Ah vai? E eu com isso?
SÁBIO MUTT
Sei que ela não vai gostar do que
vou dizer de você e de seus
amiguinhos.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (9) 33.
Iris fica parada. Ele vai até a estante e guarda o livro
grosso.
IRIS
Não, não, espere! Vamos
conversar.
Ela corre até ele, o abraça pelas costas e começa a fazer
carinho nele.
IRIS
Estava nervosa. Por favor,
fique! Você não vai querer ficar
sem minha ajuda.
Mutt se solta dela violentamente.
SÁBIO MUTT
Não dá mais! Seu comportamento me
prejudica.
Ele se encaminha para a porta, esquecendo sua cegueira.
Iris corre atrás dele, aflita.
IRIS
Espere!
Ele sai e bate a porta violentamente. Ela para junto a
porta.
EXT.LADO DE FORA DA CASA DO SÁBIO MUTT
O velho passa por um arbusto. Valdo está escondido atrás
desse arbusto. Vê o Mutt se afastar. Valdo aguarda um
pouco, sai detrás do arbusto e vai para a entrada da casa.
Grita o nome de Iris.
VALDO
Iris, Iris, abre logo!
INT. ANTE SALA DA CASA DO SÁBIO MUTT - DIA
Iris abre a porta e Valdo entra.
IRIS
Por que não foi embora?
VALDO
Não posso voltar para meu quarto.
IRIS
Ela mostra a ele um pequeno circulo de metal.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 34.
IRIS (...cont.)
Sabe o que é isso?
VALDO
Um pequeno círculo de metal com
um suporte para segurar...
IRIS
Mas veja o que acontece agora...
Ela vira o outro lado e ele se vê refletido! Balança a
cabeça, assustado, mas logo abre um sorriso e enxerga o
seu sorriso refletido. Para, espantando, de sorrir.
VALDO
Faço igual ao que a moça fazia na
imagem do rolo!
IRIS
Ela sorria. Olhe seu reflexo na
superfície.
VALDO
Ah, então esta que é a superfície
reflexiva. Mas... já deram falta
dela, Iris.
IRIS
Quem deu falta?
VALDO
A Supervisora. Alguem mais sabe
desta superfície?
IRIS
O Mutt e por isso estou aflita.
VALDO
Não gosto disso. Ele sabe muito
de você...
IRIS
Valdo, eu sou... Eu
era, auxiliar desse velho.
Queria aprender os segredos dele.
VALDO
Você era auxiliar dele? Não é
mais?
IRIS
Foi me denunciar agora para a
Leda. Ela sabe muito coisa de mim
que não devia...
Iris se assusta com batidas fortes na porta. Ela guarda
rapidamente a pequena superfície no seu bolso.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (3) 35.
IRIS (...cont.)
Não pode ser a Leda!
KAYO
(em off, batendo na porta)
Abra logo Iris, sou eu, o Kayo.
Iris respira aliviada, sorrindo vai abrir a porta. Valdo
se põe na frente dela.
VALDO
Espere! Quem é ?
IRIS
Sossega! É da minha turma.
Ela abre a porta e Kayo entra. Ele percebe que tem outra
pessoa na ante sala.
KAYO
Desculpe, Iris, não sabia que
estava com outra pessoa.
IRIS
Fique! Este aqui é o Valdo. Está
do nosso lado!
Ela se volta para Valdo. Valdo hesita.
IRIS
Valdo, o Kayo e outros jovens,
nós, estamos todos juntos. O Kayo
é o operador da TV.
KAYO
Eu vejo as pessoas por meio da
objetiva da camara, sem que elas
percebam. Quer ver?
VALDO
Não! Assim não! Quero ver o rosto
de alguem de frente.
IRIS
Nós temos outro plano.
KAYO
Precisamos ir embora! O outro
lado está vindo pra cá!
IRIS
Valdo, você está do nosso lado?
VALDO
Não tenho para onde ir!
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (4) 36.
KAYO
Vai com a gente. Vamos logo! Eles
estão atrás de mim também.
IRIS
Esperem, vou pegar umas roupas.
Ela sai da ante sala.
VALDO
Mas onde vamos?
KAYO
No alto da montanha.
VALDO
Perto do reator nuclear? Não é
perigoso lá?
KAYO
E daí se for?
Iris entra com uma mochila com roupas.
IRIS
Pronto. Vamos rápido!
Eles se retiram rapidamente.
EXT. ALTO DA MONTANHA - DIA
Alguns jovens estão reunidos fabricando pequenas
superfícies reflexivas.
JUVENAL
Quantos já fizemos?
ABELARDO
Contei 225. Olha aí.
Uma, duas, vinte, cem, duzentas pequenas superfícies
reflexiva estão dispostas em fila. Kyan se aproxima dos
dois jovens.
KYAN
Já chega!
JUVENAL
Não chega não. Temos que fazer
mais! Pare de ser preguiçoso,
Kyan.
KYAN
Não sou preguiçoso. Precisamos
economizar areia e o material
químico.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 37.
ABELARDO
Juvenal, já dá para distribuir o
que fizemos para os jovens.
KYAN
Então ao descanso. Essa química
machuca, sabiam? Vejam!
Kyan mostra as mãos machucadas para os dois. Eles se
deitam na relva e ficam olhando para o céu. Acima do céu,
uma imensa abóboda reveste tudo. Ao fundo, o reator
nuclear funciona a pleno vapor.
EXT. ANTE SALA DA CASA DO SÁBIO MUTT - DIA
Entram o Mutt, Leda, Oficial Sônia e dois soldados.
LEDA
Mutt, não tem ninguém aqui.
Oficial veja nos outros cômodos.
Sônia e os soldados saem para os outros cômodos da casa.
SÁBIO MUTT
Demorei muito para achar onde
você estava, Supervisora.
LEDA
Não devem estar longe. Onde ela
costuma se esconder?
SÁBIO MUTT
Eu não sei.
LEDA
Não sabe? Está me escondendo
muita coisa.
SÁBIO MUTT
Não estou. Já lhe contei tudo que
sei dela e de seus amigos.
Entra a Oficial com os dois soltados.
OFICIAL SÔNIA
Já fugiram Supervisora!
LEDA
Sônia, algeme o velho.
SÁBIO MUTT
Mas por que?
LEDA
Cometeu crimes, sabe disso.
Um dos soldados coloca algemas nele.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 38.
SÁBIO MUTT
Isso é injusto!
LEDA
Você passou muito tempo nos
traindo com essa cientista. Só
agora nos avisou. Vamos embora.
OFICIAL SÔNIA
Supervisora, vamos precisar de
reforços. Não temos tantos
soldados para vigiar todos os
cantos. Não temos pista.
LEDA
Não se preocupe. Leve o Mutt para
o Doutor e depois vá para o meu
escritório.
Todos saem.
EXT. ALTO DA MONTANHA - DIA
Kyan, Abelardo e Juvenal estão deitados de costas na relva
olhando o céu.
Protegida por rochas, Júlia grita para os colegas,
embaixo.
JÚLIA
Vem vindo gente! Se escondam!
Os moços rapidamente sobem pela encosta e se juntam à
Júlia.Todos ficam olhando para baixo, ao longe.
JÚLIA (...cont.)
Lá embaixo, estão vendo? Sabem
quem são?
ABELARDO
Estão muito distantes. Não dá pra
saber.
KYAN
Temos que esconder a produção
feita!
JUVENAL
Agora não dá mais tempo. Talvez
nem venham na nossa direção.
KYAN
Se vierem, estamos perdidos!
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 39.
JÚLIA
Calma! Estou reconhecendo a Iris.
São eles!
KYAN
Tem certeza?
Júlia se levanta e acena para os que vem chegando.Ela
corre para se encontrar com os que sobem até lá. Juvenal e
Abelardo também vão ao encontro deles.
EXT. NA SUBIDA DA MONTANHA - DIA
Todos se encontram e se abraçam.
IRIS
Não podemos mais voltar. Fomos
descobertos.
JUVENAL
Mas eu e o Abelardo vamos ter de
levar as pequenas superfícies
reflexivas para os outros jovens
lá embaixo.
KYAN
Quem é esse ai? Um espião, Iris?
IRIS
Oh Kyan, por que eu haveria de
trazer um espião?
Todos se agrupam e se sentam no chão perto dos rochedos.
VALDO
Vocês produziram objetos igual
que a Iris tem?
ABELARDO
Isso mesmo. Tem mais de duzentos
feitos.
JÚLIA
Nós ainda vamos nos ver! Logo que
secarem... Venha Valdo, vamos ver
nossa produção.
Júlia pega Valdo pelo braço e o leva até onde estão os
pequenos pedaços de superfície reflexiva. Abelardo e Kayo
vão juntos.
KAYO
Vou registrar com a camara isso.
Ficam sentados Kyan, Juvenal e Iris.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 40.
KYAN
Iris! Podemos confiar nesse moço?
Ele me parece um pouco ... sei
lá...
IRIS
Esquisito? Ele é sim. Discutiu
com o Mutt.
JUVENAL
Mas então ele vai nos atrapalhar
aqui!
IRIS
Pode confiar em mim. Vou cuidar
bem dele.
KYAN
Sei não...
Chegam Kayo, Júlia, Valdo e Abelardo e se sentam na
rodinha de amigos.
VALDO
Fiquei impressionado! Uma
produção e tanto! Que horas
estarão prontas para uso?
KYAN
Por que quer saber?
VALDO
Acho que vai demorar...
Ele se levanta e fica olhando para o alto da montanha,
pensando...
VALDO (...cont.)
Acho que podemos fazer outra
coisa sem a ajuda desses
pedacinhos reflexivos...
KYAN
Está querendo dizer que tudo que
fizemos é inútil? Ah vá à merda!
Eu disse que ...
IRIS
Quieto, Kyan! Fale Valdo.
VALDO
Não, não, não acho inútil mas
enquanto não ficam prontos,
devemos nos olhar!
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (3) 41.
JÚLIA
Nos olhar? Nossa...
Todos ficam chocados com a ideia. Ficam quietos. Aquele
silêncio ...
ABELARDO
Continue... explique melhor.
VALDO
Acho legal a gente poder se ver
refletido. Mas aposto que todos
vocês tem vontade de ver os
outros...
Iris se levanta e se aproxima de Valdo. Os dois se
enxergam com o rabo dos olhos. Ela fala direto com Valdo.
IRIS
Uma coisa é se ver... outra coisa
é se olhar. Quantas vezes vemos
sem perceber o que vemos...
Júlia se levanta e fica ao lado de Iris.
JÚLIA
Como assim? Não compreendi...
IRIS
Aprendi como Sábio Mutt que o
olhar exige um olhar da outra
pessoa olhada. Olhar não é
neutro. carrega uma intenção, uma
vontade, um desejo...
JÚLIA
Que desejo?
IRIS
Quem olha deseja ser olhado...
que a outra pessoa também deseje
olhar para quem olha pra ela.
VALDO
Sou afogado por esses desejos!
Todos vão se levantando e ficando ao lado de Valdo, Iris e
Júlia. Todos vão se interessando... Todos estão de pé,
menos Kyan.
JÚLIA
Quer dizer que podemos, cada um
de nós, aqui e agora...nos olhar
uma ao outro ?
Kyan se levanta e se afasta do grupo gritando.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (4) 42.
KYAN
Vocês estão doidos! Esse moço é
um maluco. Está inventando essas
coisas! Estou fora! Quero ver
quem vai ter coragem de olhar
primeiro alguem aqui!
Todos ficam em silêncio, olhando o chão, esperando que
alguém fale alguma coisa.
KYAN (...cont.)
Estão vendo só... e o que
fizemos, o que vamos fazer com as
pequenas superfícies? Tanto
trabalho, tanto estudo pra que?
IRIS
Eu tenho coragem de olhar!
KYAN
E quem vai aceitar que seja
olhado?
VALDO
Vou olhar você, Iris! Você vai me
olhar e eu vou olhar você !
Todos, menos Kyan, aplaudem, gritam.
VALDO (...cont.)
Kyan! a produção que fizeram não
é perdida. Vamos distribuir para
nós mesmo e para os outros!
KAYO
Eu quero registar com a camara
vocês dois se olhando! Vou ligar
aqui.
VALDO
Iris! Está pronta?
IRIS
Estou pronta! Kayo, começa ai a
gravar!
JÚLIA
Não aguento de emoção. Estou
muito nervosa,
ABELARDO
Não é ainda sua vez, Júlia.
Calma!
Todos ficam em silêncio. Iris segura as mãos de Valdo.
Estão ambos, Iris e Valdo, frente a frente, tensos,
nervosos, os olhos fitando o chão. Os demais também estão
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (5) 43.
fitando o chão, menos Kyan que olha para cima mas sem
dizer nada. Menos Kayo, que olha aos dois que vão se
olhar, por meio da objetiva da camara. No silêncio, só se
ouve o ruído do motor da camara funcionando. Pouco a
pouco, muito devagar, ao mesmo tempo, Iris e Valdo vão
erguendo seus olhos, vendo partes do corpo de cada um, os
pés, as pernas, as coxas, a cintura, o peito, o pescoço...
Param nesse ponto, um pouco e então, de repente se olham.
Olhos nos olhos, piscam, fecham os olhos, se perturbam,
abrem devagar os olhos de novo, estão sorrindo, Iris ergue
sua mão e com as pontas dos dedos traçam as linhas dos
lábios de Valdo, e Valdo levanta sua mão e acaricia os
cabelos dela, abre seus lábios e beija os dedos de Iris
que chora, lágrimas escorrendo pelo seu rosto, Valdo beija
essas lágrimas, as mãos dela acariciam os cabelos de
Valdo, ambos aproximam os lábios e encostam lábios nos
lábios do outro. De repente Kayo dá um grito!
KAYO
Parem!
Kayo para de gravar. Todos se assustam.Iris e Valdo param,
assustados e olham para Kayo. Ambos estão olhando
diretamente para Kayo.
JÚLIA
O que houve?
KYAN
Eu avisei! Não quiseram me ouvir!
JUVENAL
Por favor! Me digam o que
aconteceu.
IRIS
Kayo! O que está acontecendo?
KAYO
Não pude continuar gravando...
VALDO
Por que não?
KAYO
Não deu pra continuar gravando...
JUVENAL
Acabou a bateria?
KAYO
Nada disso! As lágrimas me
impediram.
ABELARDO
Lágrimas?
Valdo volta seu olhar para os olhos de Iris.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (6) 44.
VALDO
As lágrimas de Iris são salgadas!
KAYO
Não! As lágrimas dela não, as
minhas! Molharam a objetiva...
Todos dão risadas e isso ajuda a dissipar a emoção. Menos
Kyan que continua ressabiado. Abelardo se volta na direção
de Iris.
ABELARDO
Iris! Você está bem?
IRIS
Estou ótima! Um pouco tonta mas
muito feliz!
Júlia se volta para onde deve estar Valdo.
JÚLIA
Valdo! e você como está?
VALDO
Bem tonto! Estou voando... virei
um pássaro!
JÚLIA
Será que posso olhar você?
Valdo não responde de imediato para Júlia. Olha para Iris
e depois se volta para o grupo todo.
VALDO
Tenho outra proposta! De mãos
dadas, todos, façam um círculo.
KYAN
Eu não!
ABELARDO
Mas para que fazer isso?
VALDO
Iris e eu vamos ficar aqui no
meio e precisamos que vocês todos
nos olhem! Vamos fazer uma coisa
incrível!
JÚLIA
Fazer o que? Ai, você me mata de
curiosidade! Me diga logo!
VALDO
Vocês segurem uns as mãos dos
outros para se apoiarem e poderem
olhar a mim e a Iris, aqui no
centro da roda.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (7) 45.
JUVENAL
Por que temos que nos dar as
mãos?
VALDO
Para se sentirem seguros na hora
da tontura.
Todos, menos Kyan e Kayo, de pé, se dão as mãos formando
um círculo em torno de Valdo e Iris, de olhos fechados.
IRIS
Isso mesmo! Quando eu falar Já
vocês abram os olhos e olhem para
mim e para o Valdo!
VALDO
Menos o Kyan que não quer...azar
dele
KAYO
Menos eu também...
JUVENAL
Você também não quer?
KAYO
Eu quero! Mas vou ficar
gravando...
IRIS
Valdo, vamos fazer a mesma coisa?
VALDO
Se voce quizer!
IRIS
Quero muito!
Todos, na espectativa de Iris. No centro da roda, Iris e
Valdo se olhando, sorridentes.
VALDO
Atenção todos! Iris vai dizer
"já" e vocês abram os olhos!
IRIS
Um, dois, três... JÁ !
Todos abrem os olhos e olham para o casal no centro. Iris
e Valdo, olhos nos olhos, aproximam seus rostos, cada vez
mais até que seus lábios se encostam! Os dois ficam
surpresos e se afastam... Os do círculo estão paralisados,
olhando isso acontecer sem saber o que fazer, ainda no
choque do olhar. Iris, de novo, se aproxima de Valdo.
Ambos, se olhando, aproximam seus lábios e se beijam.
Todos em volta deles saem do espanto. Júlia começa e
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (8) 46.
depois todos a seguem, batendo palmas, gritando e
assobiando. Valdo e Iris param de se beijar. Estão
sorrindo e passam a sorrir para os demais. Valdo, olha
Iris mais uma vez e depois pede calma para todos.
VALDO
Calma! Agora vamos continuar!
Cada um de vocês olhe o outro que
está no seu lado, olho no olho!
Como Iris e eu fizemos! Certo?
Iris vai contar!
IRIS
Coragem! Vale a pena! Se olhem!
Atenção! Vou contar, um, dois,
JÁ!
E cada um vai olhando o outro a seu lado, com medo,
chocado, se abraçando... Kayo, registrando tudo com sua
camara. Valdo e Iris, olhando todos fazerem o que eles
dois fizeram. Kyan, pouco a pouco olhando o grupo,
extasiado...
JÚLIA
Nossa... Que maravilha!
Todos vão se abraçando e se sentando, exaustos pela
emoção.
JÚLIA
É isso! É a emoção! Também me
sinto um pássaro, me sinto livre!
Vão se deitando de costas sobre a relva, olhando o céu.
(a partir deste momento,
todos deste grupo passam a
se olhar, olhando uns aos
outros nos olhos)
ESCRITÓRIO DE LEDA - DIA
Leda, sentada à frente do aparelho de rádio comunicação,
tendo ao lado de pé, a Oficial.
LEDA
(falando pelo microfone do
rádio)
Mas chefe! Estamos em guerra!
Falou mesmo com o General?
CHEFE
(em off, pelo auto falante
do rádio, voz com
interferência)
Nada feito, Leda. Temos problemas
em todos as colonias e não
(MAIS...)
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 47.
CHEFE (...cont.)
somente nessa ai. O General não
tem mais contingente para enviar
pra você.
Leda, aflita, apanha o microfone e se levanta.
LEDA
Escute aqui! Fui mandada em
missão para acabar com a
indisciplina. Vocês me deram 20
soldados e uma oficial. Acha que
com isso vou conseguir alguma
coisa?
OFICIAL SÔNIA
Vinte e três !
LEDA
(pelo microfone)
Vinte e três, que seja. Sabe
quantas pessoas vivem aqui? Sônia
me passa os números.
Ela passa a pirâmide etária. Conforme ela fala, a imagem
da pirâmide é mostrada.
LEDA (...cont.)
(pelo microfone)
São 66 crianças, 255
adolescentes, 329 adultos, 15
idosos.
CHEFE
(pelo auto falante do rádio)
665 pessoas, mais você, a Oficial
e 23 soldados, total de 690,
dividido por 24 soldados dá cerca
de 28 pessoas por um militar. É
uma média superior a todos os
outros lugares. Não tem do que
reclamar Leda!
LEDA
(pelo microfone)
Mas nós temos 10 alojamentos
coletivos, masculinos, femininos,
crianças e de jovens,dois quartos
individuais, 10 refeitórios
coletivos, duas minas de extração
de minerais, duas escolas, uma
infantil, uma para jovens, 3
fábricas de trato dos minérios,
fora os prédios
administrativos... duas casas
individuais.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (3) 48.
CHEFE
(pelo auto falante do rádio)
Vou desligar. Você é mestra de
estratégia, psicóloga e
administradora. Vai cuidar de
tudo ai, tenho certeza. Até mais.
O som do auto falante fica mudo. Leda joga o microfone
contra o rádio. O cabo se desconecta.
LEDA
Malditos!
Leda se volta para Sônia.
LEDA (...cont.)
Sônia, trate de achar os cabeças
disso. Saia e vá resolver logo
essa encrenca!
OFICIAL SÔNIA
Você não falou do médico. Só ele
não dá conta de fazer a cirurgia
em todos que estão presos...
LEDA
Saia! Já disse!
OFICIAL SÔNIA
São vinte crianças, a Professora,
dois jornalistas, o Mutt...
LEDA
Saia!
Sônia se sente ofendida. Fala rispidamente.
OFICIAL SÔNIA
Quer mesmo que eu saia ? Tem
certeza?
LEDA
Espera... estou muito nervosa,
desculpe. Vamos pensar...
Desculpe! Quem sabe colocar dois
soldados em cada ponto
estratégico, na televisão, nas
fábricas, nas minas...? Você faz
isso, por favor?
OFICIAL SÔNIA
Deixe comigo. Afinal eu sou
apenas um soldado! Mas sei
trabalhar...
A Oficial sai. Leda pega o microfone do chão e conecta o
cabo novamente no rádio.
49.
EXT. ALTO DA MONTANHA - DIA
Kyan está distribuindo uma pequena superfície reflexiva
para cada um dos colegas que passam a se olhar nela.
ABELARDO
Até que sou bem bonito, com essa
enorme barba!
JÚLIA
Nossa... estou muito feia,
preciso cortar esse cabelo, me
arrumar...
JUVENAL
Que nada! você está linda!
Precisa só ajeitar seu cabelo.
JÚLIA
Me arrume com suas mãos.
Juvenal faz um penteado com os cabelos de Júlia. Valdo
aproxima-se de Kyan.
VALDO
Oi, Kyan, por que não me deu um?
KYAN
você já se viu antes, não
precisa.
IRIS
Kyan, deixa disso. Dê um para ele
também.
Kyan entrega de cara virada. Kayo grava tudo que acontece.
Está entusiasmado.
KAYO
Valdo, está ótima essa gravação.
Merecia mostrar pra todo mundo,
sabia?
Ele mostra umas partes da gravação para Valdo.
VALDO
Está muito bom mesmo. Você tem
razão. Ei pessoal!
Todos param o que estão fazendo e se viram para Valdo.
VALDO (...cont.)
A gravação do Kayo está perfeita
para mostrarmos para todos lá
embaixo.
Todos ficam em silêncio.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 50.
VALDO (...cont.)
O que foi? Não gostaram da idéia?
KYAN
O nosso plano não é esse e sim
distribuir as superfícies para os
mais jovens se verem...
JÚLIA
É verdade. Mesmo distribuir eu
acho que ainda não é hora.
IRIS
E quando vai ser essa hora? Desse
jeito sabe quando vai ser? Nunca!
Júlia se levanta e avança sobre Iris, fica frente a frente
com ela.
JÚLIA
Só você quer ter a ultima palavra
sempre! Estou cheia disso!
IRIS
Nossa... que olhar de ódio. Estou
chocada.
KYAN
Eu avisei... Era para cada um se
olhar e não olhar os outros...
vai dar encrenca.
Valdo se levanta e vai até Júlia e desvia o rosto dela com
carinho para ele.
VALDO
Júlia, calma. Eu gosto muito de
você, calma.
Júlia sorri para Valdo e se aproxima... Mas Iris se coloca
entre os dois e fica de frente com Valdo, furiosa.
IRIS
O que é isso? Gosta dela é? E eu?
VALDO
Seus olhos soltam fogo, Iris.
Então só devo gostar de você?
Iris e Valdo estão frente a frente. Abelardo vai rápido
até eles e empurra cada um para um canto com violência.
ABELARDO
Então é para isso que olhamos uns
para os outros? Para despejar
raiva, ódio?
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (3) 51.
KYAN
Avisei... era melhor não ter nos
olhado...
Juvenal avança em cima de Kyan e o derruba.
JUVENAL
Olhado? você é um covarde. Não
olhou ninguém!
Kyan se levanta e se atraca com Juvenal. Rolam no chão, se
esmurrando. Sai sangue da boca de Kyan. Valdo corre até
eles e com dificuldade separa os dois. Kayo para de
gravar, tira um lenço do bolso, ajeita a cabeça de Kyan no
seu colo e começa a limpar o sangue da boca dele. Juvenal
se aproxima dos dois.
JUVENAL
Desculpe Kyan. Não devia ter
perdido a calma. Você tem razão.
Ninguém está pronto para se
olhar.
KYAN
Tudo bem, Juvenal. Mas temos que
distribuir o que produzimos.
JÚLIA
Vamos dar um tempo. Vamos nos
acostumar com esse negócio de nos
olhar para depois, talvez,
distribuir a produção.
VALDO
Não é justo a gente ter esse
privilégio. Tudo o que passamos
hoje precisa ser mostrado para os
outros.
ABELARDO
Melhor sentar e discutir isso.
Todos sentam formando uma roda.
ABELARDO
Vamos votar. Quem for a favor de
não fazermos nada, levanta a mão.
Apenas Júlia levanta a mão.
ABELARDO (...cont.)
Quem for a pela distribuição das
superfícies, levanta a mão.
Todos, menos Júlia, levantam a mão, inclusive Kyan muito
sorridente.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (4) 52.
ABELARDO (...cont.)
Júlia, se voce não quer, nós não
vamos distribuir.
JÚLIA
Vamos distribuir sim. Não quero
ser do contra.
Todos batem palmas e já vão se levantar, mas param, quando
ouvem a voz de Valdo.
VALDO
Não se levantem. Vamos continuar.
Quem for a favor de mostrar as
imagens, levanta a mão.
Ninguém levanta a mão. Todos olham para Kayo, se
entreolham. Kayo levanta a mão, depois Iris, Valdo, Júlia
mas ela pára e fala.
JÚLIA
Espera! Antes de votar, como vai
ser feito isso?
KAYO
Eu conheço tudo na estação de
transmissão da TV. Posso ir à
noite e colocar no ar o vídeo que
fiz.
JUVENAL
Mas deve ter soldados lá tomando
conta e vão prender você!
VALDO
A menos que vamos juntos e assim
não deixamos isso acontecer.
ABELARDO
Como não deixamos acontecer? Não
podemos nos arriscar a ser
presos. Depois disso todos vão
saber quem somos! Vamos ter que
viver na clandestinidade.
JÚLIA
Por isso é melhor não nos mostrar
na tv.
IRIS
Mas não podemos mais voltar para
nossas casas! E aqui não dá para
sobreviver. Não tem comida e
vamos ter que ir até lá embaixo
roubar...
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (5) 53.
JUVENAL
Podemos fazer uma plantação
aqui... Ah, verdade, não temos
agua... Estamos sem saída.
Todos ficam calados, olhando o chão. Mas Kyan dá um grito
e todos olham para ele assustados.
KYAN
Ei ! E se fizermos uma superfície
gigante?
IRIS
Isso mesmo! Uma bem grande que
levamos na frente.
VALDO
Quando os soldados nos atacarem
terão de se olhar na superfície
JÚLIA
Isso mesmo! A superfície reflete
a cara do soldado e ele não pode
se ver! Gostei!
KAYO
Enquanto isso eu ponho no ar a
gravação. Tem de ser depois das
18 horas, quando todos já saíram
do trabalho e estão nos
dormitórios e refeitórios!
IRIS
Podemos aproveitar e distribuir
as pequenas superfícies para as
pessoas?
KYAN
Mas tem que ser bem rápido e logo
em seguida fugir para cá de novo.
VALDO
Vamos votar então? Quem...
Valdo para de falar. Todos já estão com as mãos levantadas
e dão muita risada. Levantam-se eufóricos e se abraçam.
Mais do que depressa, Kayo tira a camara a tiracolo e
recomeça a gravar. Porém Kyan dá outro enorme berro.
KYAN
Parem!
Todos param, assustados!
ABELARDO
Vai dizer que está contra? Você
também levantou a mão.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (6) 54.
KYAN
Não estou contra. Mas temos de
começar a fazer já essa
superfície gigante. Leva um certo
tempo, sabem?
IRIS E JÚLIA
Vamos fazer já!
Ambas se percebem falando ao mesmo tempo, dão risadas e se
abraçam. Todos, muito excitados, seguem Kyan junto ao
reator nuclear para produzir o objeto.
INT. ESCRITÓRIO DA SUPERVISORA LEDA - DIA
Leda na sua mesa. O aparelho de TV está ligado mas toca
apenas música, sem informações. Entra Sônia.
LEDA
Nada ainda?
OFICIAL SÔNIA
Nada. Tudo continua calmo.
LEDA
Essa calmaria me deixa mais
nervosa. Algo está pra acontecer.
OFICIAL SÔNIA
Fiz a troca de turno dos soldados
em cada ponto. Agora tem um em
cada local.
LEDA
Não devia ter feito isso. Já são
tão poucos.
OFICIAL SÔNIA
Tenho de fazer! Metade precisa
descansar para o turno da noite!
LEDA
Sonia, recebi novo comunicado do
General. Disse que não pode ceder
munição.
OFICIAL SÔNIA
Só faltava isso! Temos armas
inúteis e apenas algemas!
LEDA
É o que temos. Mas os soldados
estão treinados em lutas. Lembre
também que todos daqui da
cirurgia. E também conto com a
apatia dos adultos.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 55.
OFICIAL SÔNIA
Esqueceu o seu poder de sedução e
de persuasão, Supervisora?
LEDA
Pare de me elogiar! Notícias
sobre o operador? Ele não pode
colocar no ar as imagens dos
objetos dos pioneiros!
OFICIAL SÔNIA
Não apareceu por lá. O pessoal da
TV está preocupado. Estão sem
pessoas para tocar a programação.
LEDA
Por isso que só se escuta música.
Desliga então essa TV.
Sônia vai até a TV e desliga.
EXT. ALTO DA MONTANHA - DIA
Todos se preparam para descer para a cidade. Valdo carrega
o espelho de quase um metro e meio quadrado com a face
espelhada voltando para a frente. Usa luvas
KYAN
Cuidado com isso!
VALDO
Pode deixar, Kyan.
Iris ajeita a ordem da fila que vai descer a montanha.
IRIS
Atrás do Valdo vai você Kayo com
o tape. Depois eu e a Júlia.
ABELARDO
O Juvenal e o Kyan vem atrás de
mim com as pequenas superfícies
para entregar para o povo.
JUVENAL
Nada disso!
ABELARDO
Como assim?
JUVENAL
Não vamos entregar lá na TV!
KYAN
É isso mesmo. Vamos entregar em
outro local. Kayo orienta onde.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 56.
IRIS
Tudo certo? Alguem tem alguma
dúvida? Valdo?
Ela se aproxima dele. Valdo a olha bem nos olhos.
VALDO
Iris, está tudo bem? Sabe que não
tem volta... Vamos ficar
conhecidos por todos que olharem
a gravação...
IRIS
Não há outra saída. Não podemos
ficar aqui pra sempre.
Iris o beija nos lábios. Passa a mão pelos cabelos dele,
sempre olhando nos seus olhos.
ABELARDO
Vamos parar com essa beijação?
Isto aqui está pesado!
Abelardo mostra o saco com as pequenas superfícies. Kian e
Juvenal fazem o mesmo. Cada um tem um saco com cerca de 80
delas. Colocam nas costas, prontos para a descida.
KYAN
Se está... Anda logo!
IRIS
Vamos lá! Descendo a montanha! Se
houver alguma luta com os
soldados, se dividam, não fiquem
juntos. Assim é mais difícil para
eles nos pegar. Boa sorte a todos
e a mim também!
A fila desce animada!
INT. ESCRITÓRIO DA SUPERVISORA LEDA - NOITE
Leda, de repente, salta da cadeira!
LEDA
Nossa! Esquecemos um local sem
soldado!
OFICIAL SÔNIA
Qual?
LEDA
O reator no alto da montanha!
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 57.
OFICIAL SÔNIA
O reator de energia atômica? Mas
quem iria mexer lá?
LEDA
Você viu quem são os
desaparecidos? São quase todos
adolescentes. São capazes de
fazer qualquer besteira.
OFICIAL SÔNIA
Mesmo assim! Não são malucos a
ponto de correr riscos de
desligar o reator.
LEDA
Não quero pontos fracos. Mande ao
menos um soldado lá.
OFICIAL SÔNIA
Se eu mandar o soldado do prédio
da TV...
LEDA
Dai não! Lembre que o operador da
TV também está desaparecido.
Mande o soldado daqui. Nós
sabemos nos defender.
Sônia sai da sala para falar com o soldado.
EXT. FRENTE DO PRÉDIO DA ESTAÇÃO DA TV - NOITE
Escureceu. As luzes na calçada iluminam ao redor do
prédio. Está tudo silencioso. O vigia, sentado, conversa
com o soldado.
VIGIA
Eu não preciso de ninguém para
vigiar o prédio.
SOLDADO
São ordens!
VIGIA
Que ordens?
SOLDADO
Não sei.
VIGIA
Quem deu essas ordens?
SOLDADO
A Oficial Sônia. Tá fazendo muita
pergunta...
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 58.
VIGIA
Então ela dá as ordens e não
explica por que?
SOLDADO
Não sou maluco de perguntar.
VIGIA
Pode pegar uma cadeira e
descanse. Eu vigio pra você.
SOLDADO
Quieto! Não me atrapalhe!
EXT. PARTE BAIXA DA MONTANHA - NOITE
O soldado do escritório está subindo a ladeira para ir a
montanha. Os jovens vem descendo.
VALDO
Atenção! Parem! Vem vindo alguém!
Ele fala sussurrando e logo todos em silêncio se escondem
atrás de um arbusto. O soldado passa por eles sem os ver.
Eles esperam ele subir. Depois se erguem e continuam a
descer.
INT. ESCRITÓRIO DA SUPERVISORA LEDA - NOITE
Leda está observando a praça da janela do seu escritório.
Tudo está muito calmo. Leda grita para Sonia na outra
sala.
LEDA
O que você está fazendo, Sônia?
Sônia entra na sala.
OFICIAL SÔNIA
Ligando para cada soldado. Por
enquanto tudo normal.
LEDA
Cansada dessa espera...
OFICIAL SÔNIA
Descanse. Está tudo calmo. O
pessoal das minas e das fábricas
já voltaram e estão nos
alojamentos tomando banho, tem
outros nos refeitórios coletivos.
Todos tranquilos assistindo TV.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 59.
LEDA
Não vou descansar. Conheço a
Iris. O Valdo é um tonto e ela
manipula ele. Tem ainda o
operador da TV. Não sei porque
sumiu com as gravações.
OFICIAL SÔNIA
(pelo celular)
Pronto! quem é ?
EXT. NA FRENTE DO PRÉDIO DA TV - NOITE
Chegam na esquina da praça em frente à Estação de TV,
Valdo, Iris, Júlia, Kyan, Juvenal, Abelardo e Kayo. Do
lado da porta, está o soldado, perto do vigia. Júlia vai
ao encontro do vigia e Iris do soldado. Este sai do lado
do vigia e vai para longe, sempre falando ao telefone.
SOLDADO
(pelo celular)
Veio um grupo de jovens, mas
pararam na esquina. Só elas duas
se aproximam daqui... Uma delas
vem vindo falar comigo. O que eu
faço? Ir para a outra esquina?
Fazer o que? Não entendi. Ah sim,
sim. Certo!
Soldado guarda o celular e se afasta do local.
INT. ESCRITÓRIO DE LEDA - NOITE
Leda está ouvindo a conversa pelo telefone entre Sônia e o
soldado. Sônia desliga o celular.
LEDA
Mandou ele sair do posto? Está
maluca?
OFICIAL SÔNIA
Invasão eminente, Leda. Sei o que
estão fazendo essas moças.
Cobertura para os outros!
LEDA
Nossa! Começou então! Vá para o
rádio e avise todos os soldados!
Sônia sai da sala. Leda torna a ligar o aparelho de TV.
60.
EXT. FRENTE DO PRÉDIO DA ESTAÇÃO DA TV - NOITE
Júlia está caminhando para o vigia. Iris caminha na
direção do soldado. Mas o soldado se afasta dela. Júlia
começa a seduzir o vigia. Do outro lado da praça, Kyan,
Abelardo e Juvenal saem com os sacos nas costas. Valdo,
com o grande espelho e Kayo, aguardam.
JÚLIA
Você é um rapaz bonito! Eu posso
olhar você e perceber isso. Não
quer me olhar e ver se sou
bonita?
VIGIA
Ah, não brinca comigo, moça. Sabe
que não se pode fazer isso.
Ela senta no colo do vigia que está sem saber o que fazer.
Iris chega perto dos dois. Faz sinal para Valdo e Kayo se
aproximarem. Eles se aproximam do vigia.
JÚLIA
Não tenha medo. Olhe para meu
rosto. Você vai gostar!
Júlia tenta mover o rosto do vigia em direção ao rosto
dela. Ele reage e segura as mãos dela. Valdo, carregando a
superfície e Kayo, com a camara a tiracolo entram no
prédio. Vigia percebe os vultos e grita.
VIGIA
Quem são vocês? Moça, me larga!
Ele se levanta e Júlia cai ao chão mas logo se levanta. O
vigia vai em direção a Valdo que vira o espelho para o
vigia. Ele para, se vendo no espelho. Fica sem saber o que
fazer. Enquanto isso Kayo entra no prédio. O vigia se
recupera e corre atrás de Kayo. Iris, Júlia e Valdo correm
atrás do vigia. Na outra esquina, o soldado acompanha tudo
que acontece e fala ao celular.
SOLDADO
(pelo celular)
Oficial, entraram no prédio, duas
moças e dois rapazes. Um deles
com um objeto estanho.
INT. SALA DE TRANSMISSÃO DA TV - NOITE
Valdo e as moças não deixam o vigia entrar, enquanto Kayo
coloca o tape das gravações dos objetos da caverna e do
que aconteceu na montanha, no aparelho transmissor. O
colega dele no estúdio se surpreende.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 61.
COLEGA
Kayo! Você por aqui?
KAYO
Colega, tenho um material inédito
gravado. Pare de tocar música.
Vou transmitir e fazer a
reportagem.
COLEGA
Todo mundo atrás de você e
ninguém sabia onde estava...
KAYO
Depois eu explico. Pega a câmera
e foca em mim, como de costume.
COLEGA
É pra já!
Ele vai até a câmera, liga o equipamento e foca em Kayo,
de costas para a objetiva. Kayo maneja os botões e coloca
no ar as imagens que colheu.
KAYO
(em off, pelo microfone do
estúdio)
Caros amigos de nossa TV!
Apresentamos em primeira mão
material inédito gravado hoje.
Prestem atenção!
Kayo solta o botão e a gravação vai ao ar para mais de 200
pessoas. O aparelho de TV do estúdio mostra as imagens
gravadas por Kayio. As imagens começam a aparecer nos
vídeos em vários locais.
INT. VÁRIOS LOCAIS - DORMITÓRIO, REFEITÓRIO, AMBOS
COLETIVOS - NOITE
Pessoas jantando, olhando a TV. De repente surgem as
imagens gravadas na montanha. Algumas pessoas olham e logo
afastam o rosto da tela. Outros olham e não conseguem
deixar de olhar. De repente alguns começam a olhar o rosto
do colega ao lado.
Pessoas deitadas nas camas vendo TV. Surgem as imagens e
ficam vendo sem entender o que está acontecendo. De
repente, alguns começam a olhar o colega do lado.
62.
INT. ESCRITÓRIO DA SUPERVISORA LEDA - NOITE
Leda está com o aparelho de TV ligado e vê as imagens.
Desvia o olhar e dá um murro no aparelho de TV. Pega o
celular.
LEDA
(pelo celular)
Depressa! Estão transmitindo
imagens de pessoas se olhando!
INT. DO PRÉDIO DA TELEVISÃO - NOITE
Sônia e soldados invadem o prédio, derrubam o vigia que
desmaia, avançam em cima de Júlia e de Iris. Valdo se
interpõe entre eles e ergue a superfície reflexiva. Sônia
e soldados ficam paralisados vendo suas imagens. Depois
baixam os olhos e avançam, sem ver para onde vão. Valdo e
as moças conseguem evitar o choque com eles. Sônia fala ao
celular. Sônia vai ao encontro da superfície, fecha os
olhos e dá um pontapé violento contra ela. Nada acontece.
Valdo apara os golpes.
OFICIAL SÔNIA
Soldados! Aqui! Chutem com força!
Todos juntos chutam e a superfície se quebra. A Oficial
fica assistindo tudo. Um dos soldados agarra Valdo por
trás.
VALDO
Corram. Fujam!
Valdo tenta se libertar mas outro soldado o agarra também.
O terceiro soldado cata um caco de vidro e fica se
olhando.
IRIS
Valdo, não vamos fugir.
Júlia e Iris se atiram contra os soldados para libertar
Valdo. Lutam com eles, mordem eles, usam chutes e socos,
até que libertam Valdo.
IRIS (...cont.)
Valdo! Fuja! Vá ajudar os outros!
VALDO
Corra você! Vou cercar esses
soldados.
JÚLIA
Valdo, corra! Nós duas cuidamos
deles.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 63.
IRIS
Júlia vá! Cada um corre em uma
direção!
VALDO
Como combinado! Vamos!
Valdo sai para fora do prédio. Júlia também. Mas Iris não
consegue.Iris luta contra os dois soldados. Mas não
consegue dar conta dos dois. Um deles a joga no chão. O
outro aproveita e a algema com os braços pelas costas.
Sônia chama o terceiro soldado.
OFICIAL SÔNIA
Larga esse pedaço e venha comigo!
O soldado solta o caco de espelho no chão e segue Sônia
para dentro da sala de transmissão.
SALA DE TRANSMISSÃO DA TV - NOITE
Kayo ouve o barulho que vem de fora da sala e se esconde
rápido atrás de um cenário. O colega, sem saber do que se
trata, tenta fugir mas é detido pelo soldado e algemado.
OFICIAL SÔNIA
(pelo celular)
Leda! Missão cumprida! Prendemos
Iris e o moço da TV. Supervisora,
escaparam Valdo e uma das moças.
INT. CONSULTÓRIO DO DOUTOR - NOITE
Iris chega ao consultório algemada, um soldado a conduz.
DOUTOR
Mais uma para a cirurgia do
pescoço?
OFICIAL SÔNIA
Não. A Supervisora ainda vai
falar com ela. Soldado,cuide da
moça.
O soldado obriga Iris a se deitar na maca e a prende com
as algemas.
DOUTOR
Diga para a Leda se apressar.
Ainda tenho vários para esse
procedimento.
Ela não responde. Confere se Iris está bem imobilizada e
sai com o soldado.
64.
INT. CONSULTÓRIO DO DOUTOR - NOITE
Iris procura ganhar tempo. Deitada na maca, tenta envolver
o médico.
IRIS
Doutor! Estou com medo. Como é
essa cirurgia?
DOUTOR
Procedimento simples, sem dor.
Não se preocupe.
IRIS
Mas e depois?
DOUTOR
Você não vai conseguir manter a
cabeça ereta.Vou mostrar.
Empurra a cabeça de Iris junto ao peito dela. Depois puxa
cabeça dela para trás, quase encostando na parte de trás
das costas de Iris. Ela geme com a dor que os movimentos
causam.
DOUTOR
Ou sua cabeça encosta no peito ou
encosta nas costas!
Ele se diverte e dá uma gargalhada do que ele mesmo falou
DOUTOR (...cont.)
Dúvido que você nunca viu um pós
cirurgia. Espertinha, está
querendo ganhar tempo?
Entra Leda. Ela se aproxima de Iris. Não olha para ela,
apenas a toca com suas mãos.
LEDA
Então caçaram a amante do meu
fugitivo, o Valdo? Vamos ver se
está tudo no lugar... Se não
tiraram nada de você.
Ela passa a mão pelo corpo todo da moça, fazendo algumas
massagens junto ao sexo dela, ainda por cima do uniforme.
LEDA (...cont.)
Vejo que ainda está com o
essencial. Mas eu posso tirar,
entende? Doutor, tire o uniforme
dela e coloque a roupa da
cirurgia!
O médico sorri de modo obsceno. Chama a enfermeira e ambos
despem Iris com dificuldade pois ela reage. A enfermeira
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 65.
aplica uma injeção sedativa. Ela deixa de se debater e
facilita o procedimento de troca de roupa e de
imobilização. Leda coloca luvas cirúrgicas e se aproxima
de Iris na maca. Levanta a roupa e introduz sua mão
enluvada na vagina de Iris. Embora esteja sedada ainda não
sente o efeito. Se contorce.
IRIS
Por favor, Leda, pare! vamos
conversar.
LEDA
Esse é o meu interesse. Fale onde
eles estão escondidos e você
permanece inteira.
IRIS
Não posso! Não sei onde estão.
Não combinamos nada.
LEDA
Vai precisar fazer um esforço e
logo. Estou com pressa.
Ela aperta algumas partes da vagina, acaricia e aperta.
Acaricia e aperta. Iris geme. Depois sobe para o seios de
Iris e aperta e acaricia. O médico fica excitado. A
enfermeira está enojada e vira o rosto.
IRIS
Pare, por favor. Sinto ânsias...
O que deseja saber?
LEDA
Você fez amor com Valdo? Onde
estão seus amiguinhos? Quem são?
Quantos são? Tem armas?
IRIS
Não fizemos amor. Não deu tempo
ainda. Só nos beijamos. Você nem
sabe o que é beijar.
LEDA
Nem quero saber. Já fiz muito
sexo com ele. Valdo é muito bom.
Mas você nunca vai saber como é.
Ele vai voltar a seu meu. Esqueça
dele!
IRIS
Nós nos beijamos. Você nem sabe o
que é isso? Ele nunca mais vai
querer você!
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (3) 66.
LEDA
Isso nós veremos! Mas está me
fazendo perder tempo. Se é sua
jogada, vai se arrepender.
Quantas são as pessoas do seu
grupo?
IRIS
Se eu falar você me liberta?
LEDA
Claro que sim! Fale!
IRIS
Somos apenas seis pessoas e não
temos armas. Não precisa ter medo
de nós!
LEDA
Medo de vocês? Ah, sim, não temos
medo de vocês! Onde estão
escondidos?
IRIS
Já disse! Não sei. Você não vai
me libertar?
LEDA
Não falou tudo que sabe.
IRIS
Já falei. Por que não acredita em
mim?
LEDA
Como vou acreditar? Você era da
minha confiança? Chega de
conversa. Estou com pressa. Vai
dizer ou não?
IRIS
Não fizemos nada errado.
DOUTOR
Supervisora, a moça está ganhando
tempo. Vamos já fazer a cirurgia
nela e pronto, resolvemos tudo!
Tem muitas cirurgias ainda...
LEDA
Cala a boca! Preciso de
informações, não percebe?
Toca o celular dela. Atende de modo ríspido.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (4) 67.
LEDA (...cont.)
(pelo celular)
Pedi pra não me interromper. O
que foi?
INT. CAVERNA - NOITE
OFICIAL SÔNIA
(pelo celular)
Pegamos o moço errado! O operador
da TV é outro. Ele está
transmitindo agora! Está
mostrando a face dele. Diz para
todos irem para a Praça dos
Pioneiros! Não informou mais
nada. Já parou a transmissão e
colocou música.
INT. SALA DA CIRURGIA - NOITE
LEDA
(pelo celular)
Já estou acabando aqui. Chego
logo ai.
Leda desliga o celular e se volta para Iris.
LEDA (...cont.)
Quero saber qual é o plano do seu
grupo. Fale!
IRIS
Não temos planos. Esqueça meu
grupo. Eu sou a líder. Eles fazem
o que eu mandar!
LEDA
Você é a líder? Uma jovem
enfraquecida pelos sentimentos.
Agora não serve pra nada.
Ela vai até a porta, abre, para.
LEDA (...cont.)
Doutor, faça a cirurgia nela!
Ela sai rapidamente.
IRIS
Doutor me dá uma chance!
DOUTOR
Quieto! Não gaste suas forças.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 68.
IRIS
Doutor, por favor, me desamarre.
Meus amigos já vão chegar aqui e
me libertar. Por favor.
DOUTOR
Não posso. Eu cumpro ordens.
Ele sinaliza para a enfermeira empurrar a maca para a sala
de cirurgia.
EXT. PRAÇA COM UMA PLATAFORMA AO CENTRO E NELA UMA ESTÁTUA
DE UM HOMEM. - NOITE
Umas poucas pessoas estão chegando na praça. Conversam
como sempre fizeram,sem se olharem.
INT. ESCRITÓRIO DA SUPERVISORA LEDA - NOITE
Leda entra na sala. Sônia sai de perto da janela.
LEDA
Tem pouca gente. Eu disse que o
povo daqui é acomodado. Talvez
não tenhamos que fazer nada.
Ela vai até a janela olhar para a praça.
OFICIAL SÔNIA
De qualquer modo, já postei os
soldados nos cantos da praça.
LEDA
Prendeu o operador?
OFICIAL SÔNIA
Quando o soldado chegou lá ele
não estava mais. Fique tranquila,
ninguém vai transmitir mais nada.
Iris falou alguma coisa?
LEDA
Se julga esperta. Mas eu sei que
são seis pessoas. Damos conta
delas.
OFICIAL SÔNIA
Claro que sim. Estou com mais de
10 soldados aqui na praça. Eles
que venham! E Valdo está com
eles?
LEDA
Deve estar. Ele é medroso. Pode
estar escondido. Traz um chá,
(MAIS...)
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 69.
LEDA (...cont.)
Sônia? Preciso relaxar. Estou
chateada.
OFICIAL SÔNIA
Vou buscar. Mas por que está
chateada?
Leda se senta em sua cadeira.
LEDA
O Valdo... coitado! A Iris deve
ter seduzido ele. Ah! Mas pra mim
tudo bem. Vai continuar sendo um
ótimo empregado e outras coisas
mais, depois disso tudo... Vá
buscar logo esse chá...Ah... por
favor.
Sônia sai.
EXT. PRAÇA COM UMA PLATAFORMA AO CENTRO E NELA UMA ESTÁTUA
DE UM HOMEM. - NOITE
Mais pessoas chegando e estas se olham, sorriem. Estão
ansiosas. De uma rua lateral surgem Abelardo, Kyan e
Juvenal, cada um com o saco carregado de pequenas
superfícies reflexivas. Vão entregando para as pessoas na
praça esses objetos.
Pelo outro canto da praça, mais pessoas chegando.
Ainda de outro canto, uma pequena multidão se forma.
Cada um recebe o pequeno objeto, se olha, leva um susto,
depois sorri, passa a mão pelo seu rosto e mostra para o
colega do lado. Alguns recusam olhar. Outros, sem o
objeto, procuram quem tenha para saber o que é.
Alguns soldados recebem o pequeno objeto também.
Um deles pega o objeto, percebe o que é, joga no chão e
tenta prender Kyan. Ele se solta, olhando o soldado no
rosto. O soldado joga Kyan no chão e pega seu celular.
SOLDADO
(pelo celular)
Oficial! Oficial Sônia! Atenda
depressa! Um deles me deu uma
pequena superfície reflexiva.
Sim, entendi... jogar no chão e
pisar em cima! Fazendo...
Enquanto o soldado pisa no pequeno espelho, Kyan aproveita
e foge dele.
70.
INT. ESCRITÓRIO DA SUPERVISORA LEDA -NOITE
Sônia corre para a janela ainda com o celular na mão e
olha para fora.
OFICIAL SÔNIA
Leda, depressa venha até aqui!
Leda larga a chicara de chá, levanta-se e vai rapidamente
até a janela.
LEDA
O que é isso? De onde veio tanta
gente?
OFICIAL SÔNIA
E tem mais! Alguns estão
distribuindo pequenas superfícies
reflexivas! Temos que agir
rápido. Vou descer!
LEDA
Vamos!
Ambas saem do escritório.
INT. SALA DA CIRURGIA - NOITE
Enfermeira aplica anestesia em Iris, deitada de bruço.
Prepara o campo cirúrgico, deixando a mostra parte da
nunca e parte do pescoço. O médico entra com roupa própria
na sala e pede para a auxiliar lhe passar bisturi, por
meio de gestos. Ele faz o corte na pele de Iris.
EXT. UM DOS CANTOS DA PRAÇA - NOITE
Valdo e Júlia se encontram na praça. Estão entusiasmados
com a multidão que se formou. Muitas pessoas, animadas
conversando, alguns até se olhando, mas disfarçadamente.
JÚLIA
Tem mais de trezentas pessoas!
VALDO
Veja os jovens dançando!
Enquanto algumas moças e rapazes, se olham, formando uma
roda e dançando, outros, porém, tapam os olhos e saem
correndo da praça. Alguns estão imoveis, de olhos postados
no chão.
71.
EXT. NO CENTRO DA PRAÇA, AO LADO DA ESTATUA - NOITE
O soldado escolta a Supervisora e Sônia até o centro da
praça, onde se encontra a plataforma. No centro tem a
estatua de um pioneiro, sem rosto. Leda sobe para a
plataforma. Sônia um degrau abaixo.
EXT. UM DOS CANTOS DA PRAÇA - NOITE
Valdo olha para todos os lados da praça.
VALDO
Não vejo Iris!
JÚLIA
Precisamos soltar Iris!
VALDO
Ela foi presa?
JÚLIA
Ví quando os soldados a levaram.
Não pude fazer nada.
VALDO
Onde ficam as pessoas presas?
JÚLIA
Ouvi dizer que é ao lado do
centro cirúrgico.
VALDO
Vamos lá então!
Os dois caminham com dificuldade por entre as pessoas.
Ouvem a voz de Leda e param. Olham para o centro da praça.
EXT. NO CENTRO DA PRAÇA, AO LADO DA ESTATUA - NOITE
Leda,em cima da plataforma junto à estátua do pioneiro,
grita para o povo ao redor.
LEDA
Por favor, fiquem em silêncio.
Silêncio, vou falar! Silêncio
As pessoas olham para cima e percebem Leda e vão se
acalmando. Ficam em silêncio. Júlia e Valdo vão para o
centro da praça. Kayo chega junto deles. Sônia sobe mais
um mais um degrau e fica mais próxima de Leda. Abaixo fica
um soldado.
LEDA (...cont.)
Preciso que escutem com atenção!
Pessoas mal intencionadas
(MAIS...)
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 72.
LEDA (...cont.)
convocaram vocês até aqui.
Destruam o que eles entregaram
para vocês! Não se olhem. Essas
pessoas de índole má serão
presas...
Júlia, em baixo, não se contém e grita para Leda.
JÚLIA
Índole má é você! Mantém o povo
na ignorância!
Logo um soldado se aproxima dela e tenta segurar Júlia.
Algumas pessoas, além de Kayo e Valdo, seguram o soldado.
As outras pessoas acompanham com atenção o que acontece.
Leda aguarda que a situação seja controlada.
KAYO
Onde está Iris?
VALDO
Precisamos libertar Iris! Vou
falar com Leda.
JÚLIA
Os soldados não vão deixar!
VALDO
Preciso saber de Iris.
Ele sobe os degraus ajudado pelas pessoas e chega ao alto
da plataforma, passando por Sônia, que o segura. Ele se
solta dela e continua até ficar de frente com com Leda.
Algumas pessoas embaixo reconhecem Valdo das gravações e
batem palmas e gritam, entusiasmadas. São bem jovens.
LEDA
Esta é uma dessas pessoas!
Oficial, prenda este moço!
VALDO
Antes de me prender, me diga
sobre Iris!
LEDA
Oficial, suba aqui e prenda
Valdo.
Sônia e o soldado não conseguem se movimentar. Alguns
jovens sobem esse degrau e seguram Sônia e o soldado.
LEDA (...cont.)
Não desrespeitem a Lei. Larguem
os soldados!
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (3) 73.
VALDO
Quem desrespeita a Lei é você,
Leda. Onde está Iris?
LEDA
Esqueça dela!
VALDO
Sei que está presa! Solte ela!
IRIS
Não dá mais!
VALDO
Por que não dá?
IRIS
Já está sendo procedida a
cirurgia!
VALDO
Mande parar já!
IRIS
Quem você pensa que é para me
dar ordens? E como posso dar
ordens daqui com essa confusão
que voce arrumou? Agora é tarde!
Leda deixa Valdo de lado e se dirige a todos em baixo.
LEDA
Peço a todos manterem a calma e
voltarem para seus dormitórios.
Eu vou cuidar dos que despresam a
Lei. Esvasiem a praça!
As pessoas estão sem saber o que fazer. Valdo fica
perturbado. Por um instante não sabe o que faz. Então
avança para o centro da plataforma, eleva a voz e fala
para as pessoas na praça. Leda tenta impedir mas ele não
deixa.
VALDO
A lei, como está sendo seguida,
impede os sentimentos de cada um
de nós.
Algumas pessoas, embaixo, começam a aplaudir quando ele
fala. Reconhecem ele do vídeo e falam para a pessoa do
lado. Leda tentar impedir e ele a empurra. Valdo se
entusiasma e se dirige a todos embaixo com mais veemência.
VALDO (...cont.)
Quero que me escutem e digam se
tenho ou não razão!
Leda fica aflita e grita para Sônia.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (4) 74.
LEDA
Oficial! Suba aqui e prenda esse
jovem!
UMA MULHER NA MULTIDÃO
Não prenda minguem! Deixa ele
falar!
UM HOMEM NA MULTIDÃO
Que ele fale!
Muitos batem palmas e assobiam. Sônia tenta subir mas as
pessoas junto dela não deixam. Os soldados estão longe e
não podem fazer nada. Tem muita gente. Muitos olhando para
o alto. Valdo continua.
VALDO
Quantos já se olharam? Levantem a
mão!
Muitas mãos se levantam! Alguns gritam quando erguem a
mão. Uma das crianças ergue as duas mãos, sorrindo. Um
velho chora enquanto ergue a mão. Alguns ficam olhando
para o chão. Alguns que ergueram a mão, olham para o lado
e abaixam rapidamente, assustados.
VALDO (...cont.)
Agora, quem já viu o rosto de
alguem, levante a mão!
Menos mãos são levantadas, alguns tentam levantar mas
abaixam, olhando para o chão. Leda fala na direção de
Valdo.
LEDA
Quero ver até onde isso vai, mas
você não me escapa, Valdo.
Valdo nem olha para o lado dela e continua, cada vez com
mais entusiamo.
VALDO
Atenção! Quantos aqui já se viram
uns aos outros? Levantem a mão!
Menos ainda levantam a mão. Leda assume a frente de Valdo
e grita para o povo.
LEDA
Quem acha que a Lei tem que ser
respeitada, levante a mão.
Muitos poucos esboçam algum gesto.
LEDA (...cont.)
Sem a Lei vamos todos virar
selvagens. A Lei é necessária.
(MAIS...)
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (5) 75.
LEDA (...cont.)Não deixem que esses jovens
coloquem falsas verdades pra
vocês!
Valdo afasta Leda e assume a frente de novo.
VALDO
A Lei é mantida pela força. Usam
cirurgias pra quem quer ser livre
e sentir a vida!
Valdo observa que muitos se manifestam. Gritam, aplaudem.
Leda tenta empurrar Valdo mas ele toma a frente de novo.
VALDO (...cont.)
Não desejam que as pessoas se
olhem e deixe surgir seus
sentimentos! Essa Lei é aplicada
sem critérios!
Leda tenta tomar a frente dele mas Valdo não permite.
VALDO (...cont.)
Quem mantém a Lei tem medo dos
sentimentos que as pessoas
possuem! Querem evitar que nos
abracemos, que nos olhemos olhos
nos olhos!
Leda com brutalidade empurra Valdo.
LEDA
Os sentimentos só servem para as
pessoas perderem a razão.
Atrapalham o raciocínio, impedem
os cálculos! Trazem o ódio de
volta, a raiva, as brigas!
Alguns poucos aplaudem fracamente.
LEDA (...cont.)
Quem criou a lei foram os
pioneiros! E com razão. Ninguem
iria sobreviver se não fosse a
lei.
Leda aponta para a estátua do pioneiro. A estátua, vista
por ela e pelo povo parece gigantesca, desproporcional.
LEDA (...cont.)
As emoções atrapalhavam viver
situações adversas. Precisava de
sangue frio, uso racional. Como é
até agora! Quem acha que eu tenho
razão, levantem a mão!
Ninguém levanta a mão. Fica um silêncio muito grande!
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (6) 76.
LEDA (...cont.)
Vamos! Não tenham medo! Levantem
a mão. Estou mandando!
Ela olha para baixo e apenas alguns poucos levantam a mão,
mas olhando para o chão. Ela se volta para onde deve estar
a Oficial. Não pode ver Sônia balançar a cabeça, sem ação.
Leda não sabe o que fazer. Leda está perturbada. Olha para
as pessoas abaixo. Valdo se aproveita, toma a frente de
Leda e se dirige às pessoas.
VALDO
Não concordo com a Lei. Nós somos
humanos, todos vocês sabem que
tem sentimentos e que não podem
esconder seus sentimentos. Nós
somos livres para usar a razão.
Mas também somos livres para
sentir!
Muitos se entusiasmam. Muitos estão se abraçando e
sorrindo, se olham. Valdo sorri, mas logo fica sério.
VALDO (...cont.)
Eu peço uma oportunidade. Deixe
todos nós experimentarmos os
sentimentos, mais nada.
Leda se desespera! Grita a plenos pulmões para o povo que
se assusta e para de se manisfestar.
LEDA
Eu sou o Estado! Tenho a
responsabilidade sobre todos. O
que esse moço pede é que cada um
assuma a sua própria
responsabilidade. Percebem o que
isso significa?
Muitos agora ficam sérios e se entreolham.
LEDA (...cont.)
Cada um de vocês aceita assumir
sua própria responsabilidade por
seus sentimento e atos? Pensem
bem antes de decidir.
Leda fica esperando a reação do povo embaixo.
LEDA (...cont.)
Vocês tem dormitórios,
refeitórios, empregos, saúde,
educação... Tudo dado pelo
governo. Estão dispostos a correr
riscos?
Ficam todos em silêncio. Valdo olha para todos embaixo,
apreensivo.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (7) 77.
VALDO
Quem aceita assumir a
responsabilidade por si próprio,
levante a mão!
Júlia levanta a mão e grita!
JÚLIA
Queremos ter nossos amigos e
nossa vida pessoal!
JUVENAL
Todos precisam de nós!
KYAN
Até a Lei e o governo precisam de
nós!
UMA JOVEM GRÁVIDA
Queremos formar famílias! Chega
de dormitório coletivo!
Um moço ergue sua picareta do trabalho na mina. Ainda tem
seu capacete com a luz acesa.
UM JOVEM MINEIRO
Vamos derrubar essa Lei !
Outros colegas dele erguem também suas picaretas de
trabalho e iluminam com a luz de seus capacetes o pequeno
palco improvisado sob a estátua, gritando! E, de repente,
muitos levantam a mão. Aos poucos,primeiro alguns
receosos, depois mais e mais e ao final são muitos
sorrindo, gritando, se abraçando... Leda grita e pede
silêncio!
LEDA
Silencio! Deixem eu falar !É
assim assim que desejam?
Alguns pedem silencio para os demais. Aos poucos vai se
fazendo um silêncio. Leda se volta na direção de Valdo.
LEDA
Sem ordem todos vamos perder!
Vamos negociar!
VALDO
Agora é tarde demais! Veja se
convence eles. Eu duvido!
Leda aproveita o momento e fala ao povo.
LEDA
Entendo o que vocês estão
dizendo. Mas tenho uma pergunta
ainda a fazer. Então, daqui pra
(MAIS...)
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (8) 78.
LEDA (...cont.)frente, cada um assume que vai
ter que respeitar o outro? Por
favor, levantem a mão os que não
concordam.
Leda para e fica esperando alguma reação das pessoas. Elas
continuam mudas por um momento mas logo alguns poucos
batem palmas e gritam, apoiando a proposta. A maioria
protesta. Começa um início de tumulto. Os soldados são
poucos e não conseguem fazer nada. Valdo toma a frente e
grita para todos.
VALDO
Parem! Violência não! Chega a
violência das cirurgias! Vamos
nos organizar sem violência!
As pessoas se acalmam e batem palmas. Leda se aproveita e
fala a todos.
LEDA
Se houver alguma denuncia de que
alguém forçou o outro para ser
visto, eu mando prender e aplicar
a cirurgia!
Muitos batem palmas, comovidos! Outros ficam em silêncio,
tensos. Um dos pós cirurgia grita, olhando para o alto.
UM PÓS CIRURGIA
Sem novas cirurgias sem haver
julgamento!
UM RAPAZ MUITO JOVEM
Precisamos ter um colegiado de
cidadãos !
UM VELHO
Um conselho de anciãos !
UM OUTRO BEM MAIS VELHO
Como o que havia na Terra!
UMA MULHER NA MULTIDÃO
Não só de velhos mas formado por
diferentes pessoas.
UMA JOVEM NA MULTIDÃO
Isso mesmo! Um grupo para julgar
quem deva ir para a cirurgia!
LEDA
Mas sou eu quem julga! Não
preciso de conselho nenhum !
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (9) 79.
UM HOMEM NA MULTIDÃO
O Conselho decide e você executa!
O Conselho é melhor que uma
pessoa só julgando.
VALDO
Vamos fazer uma eleição para
escolher os que serão do
Conselho?
Muitos aplaudem e gritam. Valdo pede calma. Vira-se para
Leda.
VALDO (...cont.)
Precisa aceitar a decisão da
maioria. Acha que pode resistir e
fazer cirurgia em todos?
Sem olhar para Valdo, ela assume a frente da plataforma,
de modo solene.
LEDA
Os que estão a favor do Conselho
levantem as mãos.
Uns poucos levantam a mão olhando para os outros. Depois
pouco a pouco, alguns vão levantando a mão e num crescendo
todos acabam levantando a mão. Valdo levanta a mão, de
modo solene. Kian, Júlia, Kayo, Juvenal, Abelardo levantam
a mão sorrindo. E continua a distribuir os pequenos
espelhos.
LEDA (...cont.)
Que assim seja! Vou preparar as
regras para eleição dos
conselheiro. Estão todos
dispensados! Podem se retirar!
Mas ninguem respeita o que Leda diz. Então começa uma
festa com todos na praça. Uns dançam, outros riem sem
parar. Muitos se olham. Moças e rapazes se beijam. Sônia
desce, também Leda. E se olham. Valdo desce também. Cerca
Leda.
VALDO
E Iris? Quando vai libertar Iris?
LEDA
Você me ajude e tudo vai dar
certo...
VALDO
Pode contar comigo mas quero
estar logo com ela.
Leda faz que sim com a cabeça mas sem olhar para ele e se
afasta de Valdo. Vai até Sônia.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (10) 80.
LEDA
O que você achou? Não temos força
suficiente ainda...
OFICIAL SÔNIA
Melhor perder alguma coisa agora
para não perder tudo!
LEDA
Ainda vamos ganhar. Não estou
derrotada. Vamos para o
escritório.
Ambas saem. Embaixo, ainda algumas pessoas se abraçam. Uns
poucos ficam lá sem saber o que fazer, atônitos, no meio
da festa! Muitos chegam até Valdo e, olhando para ele,
sorrindo, o abraçam. São muito jovens, alguns velhos,
muitas moças. Kyan, Juvenal e Abelardo se aproximam,
sorrindo, de Júlia e Valdo.
JUVENAL
Parabéns, Valdo. Foi uma vitória!
VALDO
Obrigado. Mas me diz:
distribuíram todas as pequenas
superfícies?
KYAN
Foi tudo entregue. Nosso plano
deu certo.
VALDO
Não deu tudo certo. Em parte,
ficou como estava. Ainda
continuam as cirurgias.
ABELARDO
Em parte deu certo. Vamos ter o
conselho julgando...
JUVENAL
E nós também nos tornamos
conhecidos.
KYAN
Se alguém quiser fazer mal para
um de nós, temos muita gente do
nosso lado pra nos defender.
JÚLIA
Talvez tenhamos ganho apenas uma
batalha... Mas ainda vamos ganhar
a guerra.
Aproxima-se Kayo.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (11) 81.
VALDO
Gravou tudo aqui?
KAYO
Tudo registrado, documentado. Faz
parte de nossa memoria e de nosso
povo agora.
JÚLIA
Precisamos ficar atentos para a
eleição do Conselho.
KYAN
Valdo! e Iris?
VALDO
Está presa...Pior que isso.
JÚLIA
Pior como?
VALDO
Fizeram a cirurgia nela!
Kyan, Júlia, Abelardo, Valdo e Juvenal abaixam a cabeça.
Estão muito tristes. Kyan não se aguenta!
KYAN
Malditos! Vamos acabar com eles!
VALDO
Calma! Agora é tarde! Precisamos
conviver com a nova situação.
Valdo abraça Kyan. Depois olha bem no rosto de cada um do
grupo e vai abraçando um por um. O último é Kayo. O rosto
dele revela ódio, tristeza, morde os lábios, olhando
fixamente para o rosto de Valdo.
INT. CASA DO SÁBIO MUTT - DIA
O rosto de Kayo feliz, sorridente, surge na tela da TV, de
frente para as câmaras.
KAYO
Após uma semana do grande
encontro na Praça dos Pioneiros,
acontece a posse do Conselho,
hoje a noite. É um momento muito
aguardado por todos nós!
Surgem gravações com Kayo conversando com pessoas que
olham no rosto dele e comentam sobre a votação, sorrindo.
(CONTINUA...)
...CONTINUANDO: (2) 82.
KAYO
Essas entrevistas eu fiz domingo
passado durante a votação para os
conselheiros.
Iris está sentada, assistindo a televisão. Apoia sua
cabeça no encosto do sofá.Enquanto a tela da TV mostra as
imagens, ouve-se batidas na porta. Iris se levanta e vai
abrir, com sua cabeça apoiada no queixo, com algum
esforço. Valdo entra, sorridente! Ergue a cabeça de Iris.
IRIS
Valdo, o que faz aqui? Precisa se
preparar para a sua posse no
Conselho.
VALDO
Vim ver você, Iris.
IRIS
Não sei por que ! Agora estou
aleijada. Não sou mais tão
atraente...
Ele a abraça e mantém o rosto dela olhando o seu. Os dois
se olham e se beijam. Ele a ergue nos braços e a leva até
o sofá. Deitam-se.
VALDO
Iris, vamos investir na reversão
dessas cirurgias.
IRIS
Quero o seu amor, Valdo. E fazer
sexo com você. Mas sexo com amor!
VALDO
Amo você, Iris.
Então ela o vai desnudando, sem pressa, e ele também tira
as roupas dela, sempre se beijando, devagar, olhando e
sorrindo um para o outro. Ele sustenta a cabeça da moça,
com uma de suas mãos para que ela o possa olhar de frente.
FIM
Créditos, etc.
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