Adriano Toledo Paiva CoordinadoresUniversidad Libre Cali. Colombia. Magister. Wilson Sánchez...

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    Adriano Toledo Paiva

    Caroline Marci Fagundes Coutinho

    Sheyla Borges Martins

    Coordinadores

    EDUCAÇÃO E DIVERSIDADES: POLÍTICAS PÚBLICAS, PRÁTICAS DE

    ENSINO E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

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    Servicios Académicos Intercontinentales S.L.

    Málaga, España, 2020.

    © Todos los derechos reservados. Servicios Académicos Intercontinentales S.L., 2020.

    © Adriano Toledo Paiva, Caroline Marci Fagundes Coutinho e Sheyla Borges Martins.

    Ninguna parte de esta publicación, incluido el diseño gráfico, puede ser reproducida, almacena o trasmitida en manera alguna ni por ningún medio, ya sea eléctrico, químico, mecánico, óptico, de grabación o de fotocopia, sin permiso previo del editor o de los autores.

    Las ideas contenidas en este libro y la revisión de los artículos son responsabilidad de sus autores.

    Educação e diversidades: Políticas Públicas, práticas de ensino e

    representações sociais / Adriano Toledo Paiva, Caroline Marci Fagundes

    Coutinho e Sheyla Borges Martins. (Coordinadores) – 1ª ed. Servicios

    Académicos Intercontinentales S.L., 2020. Málaga (España), 2020. 200

    paginas. Incluye referencias bibliográficas. (Historia, Teoría política y ciencia

    política) ISBN-

    ISBN-

    Adriano Toledo Paiva Caroline Marci Fagundes Coutinho Sheyla Borges Martins. Coordinadores del Proyecto de elaboración Adriano Toledo Paiva Investigación, selección y adaptación de textos Adriano Toledo Paiva

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    Diseño de Portada y Ilustración Lisette Villamizar Moreno Gestora de contenidos, Málaga, España.

    © 2019 Todos los derechos reservados. Servicios Académicos Intercontinentales S.L.

    Comité editorial y científico Miembros Director: Dr. Ramon Rivera Espinosa. Universidad Autónoma Chapingo, México. [email protected] Fundador y Director Emérito: Juan Carlos Martínez Coll. Jubildado por la Universidad de Málaga. Dr. Jorge Alberto Lera Mejia. Universidad Autónoma de Tamaulipas. Dra. Dulce María Quintero Romero. Universidad Autónoma de Guerrero. PSIC. Arely Ramírez Cortés. Facultad de Estudios Superiores Zaragoza. UNAM. Dra. Gloria Yaneth Flórez-Yepes. Universidad Católica de Manizales, Colombia. Mtra. Laura Catalina Ossa Carrasquilla. Grupo de Investigación Aliados con el planeta. Facultad de Ingeniería. Universidad de Antioquia. Dr. Reinaldo Giraldo Diaz. Universidad Nacional Abierta y a Distancia y Universidad Libre Cali. Colombia. Magister. Wilson Sánchez Jiménez. Universidad Nacional Abierta y a Distancia. Dra. Martha Isabel Cabrera Otaola. Universidad Nacional Abierta y a Distancia. Colombia Dr. Germán Salazar Mendívil. Universidad Autónoma de Tamaulipas. México Mtro. Rigoberto Lárraga Lara. Universidad Autónoma de San Luis Potosí, UASLP. Profesor José Alberto Martínez González. Universidad de La Laguna, España. Profesor Isaías Covarrubias Marquina. Universidad Centro Occidental Lisandro Alvarado, Venezuela. Catedrático Xochitl Tamez Martínez. Universidad Autónoma de Tamaulipas, México. CDBA. Jorge E. Chaparro Medina. Profesor Investigador Asociado Colciencias, Colombia. Lcdo. Axcel Etchart. Universidad Nacional Experimental de Los LLanos Occidentales "Ezequiel Zamora", Venezuela. Lcda. Elis Villamizar. Universidad Nacional Experimental de Los LLanos Occidentales "Ezequiel Zamora", Venezuela. Dr. Aldrin Jefferson Calle García. Docente Titular Principal de la Facultad de Ciencias Económicas de la Universidad Estatal del Sur de Manabí, Ecuador. Lisette Villamizar Moreno, Gestora de contenidos de Eumed.net, España. eumed.net, Universidad de Málaga, España.

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    Resumen: En este libro analizamos algunas políticas públicas creadas para el contexto brasileño y sus impactos en el área de la educación. Creemos que las políticas públicas deben responder a las necesidades humanas más urgentes para promover la emancipación, la liberación y un importante espacio de debate y difusión del conocimiento. Los autores emplean enfoques interdisciplinarios y transdisciplinarios como recurso para analizar la diversidad impresa en textos de leyes, planes de estudio escolares, procesos y prácticas educativas. Según esta perspectiva, la educación, los gerentes públicos y los docentes deben descolonizarse, expandir sus campos analíticos, valorando diferentes experiencias, trayectorias y culturas. Actualmente, los diferentes grupos conocen y estudian sus derechos legales, solicitan justicia para asegurar sus propios intereses, crean espacios para la intermediación, la negociación y la lucha política frente a un escenario de conflicto. Los textos de este volumen logran analizar los impactos de las discusiones académicas y universitarias en las sociedades contemporáneas. Resumo: Neste livro analisamos algumas políticas públicas criadas para o contexto Brasileiro e seus impactos na área da educação. Nós acreditamos que as políticas públicas devem responder às necessidades humanas mais pungentes para promover a emancipação, libertação e importante arena de debate e difusão dos conhecimentos. Os autores empregam abordagens interdisciplinares e transdisciplinares como recurso para analisar a diversidade impressa nos textos de lei, nos currículos, nos processos e nas práticas educacionais. Segundo essa perspectiva, a educação, os gestores públicos e os professores precisam descolonizar-se, ampliando seus campos analíticos, valorizando diferentes experiências, trajetórias e culturas. Atualmente, os diferentes grupos conhecem e estudam seus direitos legais, acionam a justiça para assegurar seus próprios interesses, criam espaços para intermediação, negociação e luta política diante de um cenário de conflitos. Os textos da coletânea ainda conseguem analisar os impactos do ambiente acadêmico e da universidade nas sociedades contemporâneas. Abstract: In this book we analyze some public policies created for the Brazilian context and their impacts in the area of education. We believe that public policies must respond to the most important human needs in order to promote emancipation, liberation and an important arena for debate and dissemination of knowledge. The authors employ interdisciplinary and transdisciplinary approaches as a resource to analyze the diversity present in law texts, curricula, processes and educational practices. In this perspective, education, public managers and teachers need to decolonize, expanding their analytical perspectives, valuing different experiences, trajectories and cultures. Currently, the different groups know and study their legal rights, bring justice to ensure their own interests, create spaces for intermediation, negotiation and political struggle in the face of a conflict scenario. The texts in this volume analyze the impacts of academic and university discussions on contemporary societies.

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    EDUCAÇÃO E DIVERSIDADES: POLÍTICAS PÚBLICAS, PRÁTICAS DE ENSINO E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

    SUMÁRIO

    PARTE I – POLÍTICAS PÚBLICAS, EDUCAÇÃO E SOCIEDADE 7

    O POVO INDÍGENA PUYANAWA: UMA HISTÓRIA EM TRÊS TEMPOS, ACRE – BRASIL

    Kely Costa de Lima

    8

    DESENVOLVIMENTO E FEDERALISMO NO BRASIL: OS PLANOS PLURIANUAIS E A ATUAÇÃO MUNICIPAL

    Caroline Marci Fagundes Coutinho Sheyla Borges Martins

    28

    MATRÍCULAS DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA EM ESCOLAS INDÍGENAS: UMA ANÁLISE DO CENSO ESCOLAR DA EDUCAÇÃO BÁSICA (2007-2013)

    Michele Aparecida de Sá

    53

    POLÍTICAS PÚBLICAS FEDERAIS DE PROTEÇÃO E PROMOÇÃO DOS DIREITOS DOS POVOS INDÍGENAS: UM ESTUDO DAS METAS DESTINADAS AOS POVOS INDÍGENAS DO PLANO PLURIANUAL FEDERAL (PPA) DE 2012/2015

    Tayson Ribeiro Teles

    73

    PARTE II - AS POLÍTICAS, OS CONTEXTOS E AS DIVERSIDADES

    91

    AS EXPECTATIVAS DE PROGRESSO DO POLÍTICO AFFONSO PENNA: REPERTÓRIOS DE DISCURSOS SOBRE A ORGANIZAÇÃO DA INSTRUÇÃO PÚBLICA E PROFISSIONAL (1874-1906)

    Bárbara Braga Penido Lima

    92

    A UNIVERSIDADE E A QUESTÃO DO CONHECIMENTO: INTEGRANDO SABERES PARA COMPLEXIDADE

    Ludmila de Almeida Freire

    131

    CULTURAS E IDENTIDADES NO VALE DO JEQUITINHONHA – MINAS GERAIS, BRASIL

    Geralda Chaves Soares

    145

    OS LIVROS DIDÁTICOS E AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS: UMA ABORDAGEM DOS PROCESS OS EDUCATIVOS DAS ESCOLAS DE ENSINO FUNDAMENTAL I DE ESCOLAS DE BELO HORIZONTE, BRASIL.

    Adriano Toledo Paiva Ilda da Conceição Azevedo

    159

    O ENSINO MÉDIO NO BRASIL NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA: REFLEXÕES ACERCA DAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS

    Ronaldo de Sousa Almeida – (UFCE) Brasil

    180

    TECNOLOGIAS DIGITAIS E FORMAÇÃO DOCENTE - ALGUNS APONTAMENTOS

    Antonia Lis de Maria Martins Torres Dina Mara Pinheiro Dantas

    Maria Izabel Gaspar Martins

    190

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    PARTE I

    POLÍTICAS PÚBLICAS, EDUCAÇÃO E SOCIEDADE

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    O POVO INDÍGENA PUYANAWA: UMA HISTÓRIA EM TRÊS TEMPOS,

    ACRE – BRASIL

    Kely Costa de Lima Especialista Gestão de Políticas Públicas com ênfase em gênero e relações

    étnico-raciais UFOP Mestranda - UFAC

    Introdução

    Nesse artigo pretendemos analisar os processos de reconstrução e

    reformulação cultural das populações indígenas denominadas por Puyanawa,

    especialmente as aldeias Barão e Ipiranga, na unidade federativa do Acre

    (Brasil). A Gestão Territorial e Ambiental da terra indígena Puyanawa é uma

    ferramenta indispensável para a manutenção da qualidade de vida na reserva.

    Este trabalho aborda pontos da história do povo que configuraram a identidade

    e resgate cultura dos indígenas (passado), assim como enfoca o olhar para o

    futuro, com os procedimentos do povo para o cuidado do território. Não

    pretendemos com este texto propor soluções imediatas para a gestão das

    terras, ou ainda a configuração de políticas públicas, mas desejamos abordar

    os procedimentos coletivos de construção política do povo Puyanawa.

    Avaliaremos como os indígenas escolhem juntos os rumos para cuidar, gerir e

    manter a sustentabilidade e qualidade de sua vida.

    Conhecendo a terra e o povo indígena: o presente

    O povo Puyanawa, que significa “gente do sapo grande”, assim

    denominados pelos dawa1, pertence à família linguística Pano. Esse

    agrupamento reside atualmente na Terra Indígena Puyanawa, localizada na

    margem direita do Rio Moa, a 18 km da sede municipal de Mâncio Lima, estado

    do Acre, Brasil. A principal de via de acesso é a estrada que liga o município à

    Terra Indígena, e outra opção é através do Rio Moa, ou seja, pelo acesso

    fluvial. O território indígena perfaz uma área de 24.499 hectares de terra, sendo

    demarcada no dia 17 de maio do ano de 2000. O grupo subdivide-se em duas

    aldeias: Barão e Ipiranga, com uma população estimada de 568 pessoas,

    1 Dawa é um termo empregado pelos nativos para designar os sujeitos não indígenas da região.

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    segundo dados apresentados pela Fundação Nacional de Saúde e Instituto

    Socioambiental (ISA) – Polo Base de Mâncio Lima /AC. (FUNASA. FEM, 2010)

    Quadro I: Terra Indígena Puyanawa Categoria Terra Indígena (TI) Povos 1 População 568 Área Oficial (ha.) 24K Situação jurídica atual Homologada. REG CRI E SPU. Jurisdição legal Amazônia Legal Região "povos indígenas no Brasil" Acre Unidade da federação AC Área oficial 24.499 ha. Área 24.736 ha. Presença de isolados Não Faixa de fronteira Sim Fonte: Dados do ISA. http://ti.socioambiental.org/pt-br/#!/pt-br/terras-indigenas/3831 Acessado em: 06 de abril de 2016.

    As aldeias estão estruturadas da seguinte forma: posto de saúde, escola

    indígena de ensino fundamental e médio, escola infantil, sistema de

    saneamento básico e abastecimento de água, sede da Associação

    Agroextrativista Puyanawa Barão e Ipiranga (AAPBI), ponto de cultura, arena,

    energia elétrica em todas as residências, campos de futebol, quadra

    poliesportiva de areia, açudes, casas de farinha, igrejas, quintais e áreas

    reflorestadas, pequenas criações de animais, e roçados. O agrupamento possui

    líderes maiores e são regidos por normas internas da própria comunidade

    indígena. Vamos analisar alguns aspectos organizacionais da etnia ao

    abordarmos a gestão territorial da população indígena (presente e futuro).

    Ser Puyanawa e a construção de uma identidade: o passado

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    Nesta seção do artigo apresentaremos uma análise histórica e da

    terminologia Puyanawa no intuito de desconstruirmos alguns preconceitos

    arraigados no imaginário sobre o povo indígena, tais como as propaladas

    imagens de sua incivilidade, indolência, preguiça e destituição de sua cultura

    no mundo contemporâneo. Segundo a antropóloga Manuela Carneiro da

    Cunha, a atenção dispensada aos índios na “formação da História do Brasil”,

    especialmente no “período colonial”, incide na subordinação destes aos

    interesses e vontade dos conquistadores, assim como na eliminação paulatina

    de suas narrativas históricas e memórias. (CUNHA, 1992, p. 9-24) A resistência

    para os aborígines não se vincula estritamente no apego às “tradições pré-

    Cabralinas”, tampouco, em conflito aberto com os colonizadores; mas

    perpassava intrinsecamente os processos de adaptação e renovação perante

    as situações de contato, subordinação e dominação. (GRUZINSKI, 1986, p.

    411-433)

    John Manuel Monteiro, ao analisar a produção historiográfica sobre a

    história indígena no Brasil, no enfoque da década de oitenta, século XX,

    salientou a presença de estudos centrados especialmente no emprego do índio

    como mão-de-obra. (MONTEIRO, 1995, p. 221-228) Monteiro sinalizou nesta

    seara duas vertentes: uma essencialmente calcada nos aparos sócio-jurídicos

    da política indigenista, reduzindo o índio ao papel de vítima dos encontros

    coloniais, como um ser imóvel, “engessado” em meio aos aportes e aspectos

    legais; e a outra que aborda os indígenas nos processos coloniais dentro de

    outra perspectiva, valorizando-os como sujeitos históricos. Com o objetivo de

    questionar o papel do nativo como simples subjugado durante o período

    colonial e circunscrevê-lo ao papel de sujeito ativo nos processos históricos, os

    atuais pesquisadores investiram no estudo das reconfigurações de sua

    identidade no período da conquista, abandonando os conceitos de aculturação,

    genocídio e etnocídio2.

    Ao longo de sua história, o povo Puyanawa passou por um processo de

    aculturação. A terminologia significa uma imposição ou necessidade de

    2 O termo genocídio refere-se ao extermínio físico de determinado agrupamento indígena. Enquanto o etnocídio designa a desagregação de aspectos culturais de determinados indivíduos. (Cf. CLASTRES, 2004, p. 82-83)

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    mudanças nas culturas com as quais se convive, propondo uma adequação,

    geralmente sob a perspectiva do dominador ou da cultura que se arroga

    hegemônica. Ademais, os conquistadores, “considerados civilizados”,

    desejavam que os indígenas se inserissem em suas concepções de poder e

    ordenamento político e cultural. (CLASTRES, 2004, p. 82-83)

    Conforme poucos trabalhos realizados sobre o povo Puyanawa, o

    mesmo é tradicionalmente oriundo do Alto Juruá. No entanto, com a chegada

    dos primeiros exploradores, por volta de 1857, os Puyanawa migraram para

    uma região situada entre o Paraná dos Mouras e o Rio Moa. Nesta região, os

    Puyanawa permaneceram até 1910, quando foram “amansados”3 pelo coronel

    Mâncio Agostinho de Lima, aliado com Antônio de Bastos, que se passando por

    índio, pois falava a língua Puyanawa, foi aceito pela comunidade, para servirem

    de mão de obra escrava no seringal Barão do Rio Branco. Alguns documentos

    fotográficos do Arquivo Nacional, disponibilizados pelo Instituto Socioambiental,

    são fontes importantes sobre a história do povo neste período. Uma imagem

    retrata indígenas do Alto Rio Juruá, sendo descritas por “Mulheres da tribu

    Poianáuas, localizadas na Villa Rondon, no Rio Môa, depois de haverem

    recebido vestidos e brindes”. Em outra imagem podemos notar homens

    descritos pela legenda: “Alto Rio Juruá – índios da tribo Poianáuas, localizadas

    na Villa Rondon, no Rio Môa, depois de haverem recebido roupas, chapéus e

    brindes – 1913”. 4

    Afinal, o que podemos afirmar é que, segundo relatos dos mais antigos,

    houve muita resistência a este brutal processo de “amansamento” e

    escravização, onde os Puyanawa utilizavam-se de muitas artimanhas para

    enganar os opressores. Em estudo monográfico Nayara Fernades Souza

    (2009) analisa aspectos deste período histórico:

    Quanto ao povo Puyanawa, há alguns registros sobre o número de pessoas, principalmente daqueles que eram apreendidos e submetidos ao trabalho forçado nas empresas seringalistas. Por exemplo, daqueles que foram levados para o Seringal Barão do Rio Branco, de propriedade do Cel. Mâncio Agostinho Rodrigues Lima,

    3 Termo empregado pelos não indígenas para caracterizar a inserção de nativos em comunidades urbanas e propriedades rurais. 4BRASIL. Tribunal Especial. Publicada em 1931, Vol. 4, pg. 30. Acervo: Arquivo Nacional. http://img.socioambiental.org/v/publico/puyanawa/puyanawa_6.jpg.html; http://img.socioambiental.org/v/publico/puyanawa/puyanawa_7.jpg.html; Acessado em: 04/03/2016.

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    para o trabalho escravo, recebendo como pagamento alimentos e roupas. Ou ainda, conforme dados de 1920 e 1927, do Dr. João Braulino de Carvalho, informando da existência de 125 Poyanawa catequizados no Seringal Barão. Por sua vez, Kietzman informa que em 1908 havia 50 sobreviventes num seringal no rio Moa. (SOUZA, 2009:14)

    Terezinha de Jesus Machado Maher (2010) coletou importante registro

    da Professora Railda Manaitá, tia da autora do artigo, uma das últimas três

    falantes da língua Puyanawa, acerca da história do povo e das proibições de

    uso da língua:

    Quem catequizou os índios foi o coronel de barranco - como chama o povo aqui do norte. Foi o proprietário fazendeiro, o veio Mâncio, que botava os outros no cativeiro... Amarrava e açoitava... E pegou os Poyanawa, catequizou os índios Poyanawa e amedrontou eles prá não falarem mais a língua... Prá desmoralizar, ele chamou a língua de "gíria". Gíria é uma coisa que não vale nada, né? E o povo todo se habituou a chamar a língua poyanawa só de "gíria". [...] A minha mãe foi a única pessoa que nunca desistiu da língua... A minha mãe foi a única pessoa que nunca temeu o véio Mâncio... Ela falava NA FRENTE DELE... Ela dizia que ele falava "Cumadre, deixa dessa cunversa... cunversa feia!"... "Cunversa feia, coisa nenhuma, eu num 'tou conversando porcaria! Cunversa feia é conversar uma palavra pesada..." ela falava. "Fia de uma égua, filha da puta, isso aí é que é palavra feia." Ele levava na risada. E ela nunca apanhou dele, não! [...] Meu tio foi que me contou que minha mãe era uma índia muito bonita... Ele sempre dizia que se ela fosse índia veia, feia, ah... ela não ia poder me ensinar, não, porque ele arrancava o couro dela, acabava com a raça dela... E foi assim como eu aprendi [a falar poyanawa], a única filha... (MAHER, 2010: 34)

    A pesquisadora Nietta Lindenberg Monte (1984) realizou um estudo

    interessante sobre esse contato dos povos indígenas com a sociedade

    nacional:

    A inserção dos diferentes grupos indígenas (Kaxináwa, Katukina, Poyanáwa, Nukini, Kulina, Apurinã, Yamináwa, Yanáwa, Mantineri, Kampa e Kaxarari) na classe trabalhadora do extrativismo acreano é uma realidade incontestável. A grande maioria desses grupos está vinculada direta ou indiretamente a um patrão regional, seja um seringalista tradicional ou um gerente-administrador dos seringais adquiridos recentemente por grupos agropecuários do sul do país. A forma monopolista do comércio exercido pelos seringalistas e/ou agropecuaristas mantém os índios atrelados através do endividamento, justificando as suas demandas de trabalho compulsório e não remunerado. (MONTE, 1984, 31-32)

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    Desta forma, a “correria” é a designação empregada na região para um

    momento em que houve a descaracterização e destruição de muitos povos

    indígenas do Acre. No caso do povo Puyanawa, grande parte da população

    sofreu separação física, outra parte foi unificada à sociedade envolvente.5 De

    fato, até o ano de 1983, os índios Puyanawa moravam nas comunidades Barão

    do Rio Branco e Ipiranga, sem saber que aquela terra pertencia a eles por

    direito.

    Em outros termos, a terminologia aculturação refere-se à substituição ou

    destituição cultural dos grupos conquistados (indígenas) e traz em seu bojo a

    concepção da supremacia da cultura de matriz européia (ocidental). Dessa

    maneira, a difusão de padrões de conduta, um aparelho sofisticado de

    autocontrole, as prescrições rígidas para o palco da vida comunal e o “controle

    de terceiros” pelos Estados e seus órgãos caracterizam a concepção de

    civilização, que foi difundida e empreendida pelos conquistadores. (cf. ELIAS,

    1993, v. II.)

    Essa noção de civilização foi empregada como parâmetro comparativo

    na análise das sociedades indígenas, que por sua vez destoavam

    completamente deste protótipo, portanto, sendo classificadas como “bárbaras”

    e “incivilizadas”. Quando interpretamos a história indígena empregando os

    conceitos de “aculturação imposta” e a “aculturação espontânea”, incorremos

    na análise de processos de integração, assimilação, sincretismo e disjunção

    dessa cultura. Assim, o processo de dominação direta coincide com a crise das

    culturas indígenas, ou seja, elas são interpretadas de maneira evolucionista e

    etnocêntrica, ou seja, pelo viés da integração forçada à assimilação. A

    “aculturação espontânea” é um processo que se caracteriza pela incorporação

    de elementos externos somados aos esquemas indígenas. A assimilação

    remete à inclusão de valores europeus, caracterizados como civilizados, e a

    eliminação das antigas tradições nativas. Entretanto, a Etno-história abandonou

    5 Segundo Monte: “De fato, tanto os brasileiros como os peruanos moveram uma perseguição implacável aos índios dessa região banhada pelas bacias dos altos rios Juruá/Purus. Uma grande parte dos grupos indígenas, quando não era aniquilada à bala, se via escorraçada para os divisores de águas, longe das margens dos rios, ou era obrigada a refugiar-se no interior da selva peruana, onde se defrontava com as balas dos caucheiros. As ' conseqüências dessas "correrias" foram trágicas para todos os grupos indígenas existentes no Acre e suas repercussões sentidas até os dias de hoje”. (MONTE, 1984, 31).

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    os conceitos de resistência e aculturação para investir nos fenômenos de

    “etnogênese”, “identidade”, “etnificação” e “mestiçagem”. Segundo Boccara, as

    reformulações identitárias e culturais não seriam mais abordadas como

    contaminações condutoras da desagregação do ser indígena, ou ainda, sob a

    forma de uma suposta cultura pura ou original. (BOCCARA, 2005, p. 21-52) Os

    procedimentos de classificação da população indígena, designada pelos

    estudiosos sob a terminologia “etnificação”, envolvem os conceitos “tribos”,

    “comunidades” e “etnia”. Conforme Boccara, a preocupação da imposição de

    identidades fixas aos índios sob a forma de “nações”, no “período colonial”, e

    etnias, no “período republicano”, revela a vontade das autoridades de

    circunscrevê-los no espaço e tempo específicos, em categorias sociopolíticas,

    entidades concebidas como culturalmente homogêneas (BOCCARA, 2005).

    Oscar Calávia Sáez (2002), estudando grupos Pano, avalia um “número

    virtualmente infinito de etnônimos, e a combinações de identidades

    praticamente individualizadas”. Segundo o estudioso:

    Este tipo de precisão referida a si mesmos pode-se aplicar também a outros. Assim, dizem os Yaminawa que aqueles conhecidos pelos brancos como Kaxinawá não são verdadeiros Kaxinawá, mas Sainawa, sendo que os verdadeiros Kaxinawá, um pequeno grupo de índios brabos, foram assimilados por eles decênios atrás. Se no plano do cotidiano os nomes nem sempre têm alguma correspondência com características perceptíveis do povo que designam, em mãos dos eruditos eles se apresentam carregados de informação, e são um suporte considerável de etnohistória: assim, os Ushunawa receberam esse nome porque andavam sempre de noite ou porque eram muito brancos; os Marinawa porque roubavam mandioca das roças alheias; e os Yaminawa pelo seu apaixonado interesse pelos objetos de metal dos brancos. Unindo o útil ao agradável, os nawa se divertem bastante com os nomes, chamando os Sharanahua (gente boa) de Saranahua (gente abelha, "abelhudos"), ou carimbando como Poianawa (gente bosta) um povo que comentaristas mais austeros identificam como Pêianawa (segundo o nome de um pássaro). (SAEZ, 2002, 39) (grifos nossos)

    Ao caracterizar as populações nativas da região Juruá-Purús, Sáez

    avalia que “os grupos indígenas são pequenos e numerosos, mudam de lugar e

    de nome com frequência; inseridos num quadro étnico e linguístico variegado

    (pelo lado indígena e pelo lado branco, já que as fronteiras Brasil/Peru/Bolívia

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    cruzam a região)”. O autor avalia que cada grupo guarda na memória algum

    nome anterior, surgem inovações e variações de uso oral, adoção de nomes

    pelos contatos e apropriações culturais. Esses argumentos demonstram a

    riqueza sociocultural da região estudada e das suas dinâmicas históricas. Por

    exemplo, a escrita da palavra Puyanawa só foi convencionada pela etnia desta

    forma a partir de 1995, após a elaboração do 1º livro Puyanawa, chamado de

    “Cartilha” pela comunidade. Neste livro, o alfabeto Puyanawa passou a ser

    usado em sala de aula e foi avalizado pela etnia. Os registros documentais

    mais antigos mostram a escrita das seguintes formas: poianawa, poyanawa,

    poyanáwa e recentemente puyanawa. Na língua Puyanawa não existe a vogal

    “o”, por esse motivo, prefere-se empregar o nome grafado com “u” para o grupo

    étnico. (SAEZ, 2002, 39) Ademais, a escola e as práticas educativas tiveram

    função importante na difusão e registro escrito da língua indígena.

    Afinal, os etnônimos, designações dos agrupamentos indígenas por

    “nações” e “etnias”, não podem ser pensados de maneira estática, pois foram

    elaborados na trajetória da sociedade e nomearam culturas em constante

    transformação. Dessa forma, é preciso estar atento: quando avaliamos os

    termos “nação”, “aldeias” e “comunidades” nos documentos de época, livros ou

    manuais didáticos, não parece correto, portanto, aceitar a concepção de uma

    delimitação precisa desses agrupamentos, como se configurassem unidades

    políticas e territoriais; nem tampouco podemos cogitar o seu isolamento e

    autossuficiência. Os termos “tribo” e “aldeia” trazem em seu bojo elementos da

    ação colonial, pois decorrem dos processos de reunião dos indígenas em

    nações. Os colonizadores acentuavam a coerência cultural das concepções

    sociopolíticas dos grupos nativos. Todavia, os indígenas não se reconheciam

    como indivíduos pertencentes a uma determinada nação, apenas se

    identificavam como um entre outros integrantes de suas respectivas aldeias.

    Segundo o antropólogo João Pacheco de Oliveira (OLIVEIRA FILHO, 1998, p.

    54-55), a atribuição de uma base territorial delimitada aos indígenas, as terras

    de um aldeamento, por exemplo, afetaram profundamente estas sociedades,

    modificando suas instituições e os significados de suas manifestações culturais.

    Este processo de territorialização transforma os indígenas em uma coletividade

    organizada, configurando uma identidade própria, instituindo mecanismos de

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    tomada de decisão e de representação política, e reestruturando as suas

    vivências (OLIVEIRA FILHO, 1998, p. 56).

    Nos diferentes períodos de nossa história, as mais diversas etnias

    nativas criaram uma nova identidade sociocultural. Segundo John Manuel

    Monteiro, quando observamos a análise de grupos étnicos enquanto tipos

    organizacionais, junto aos quais as sociedades acionavam determinadas

    diferenças culturais para configurar sua individualidade, deparamo-nos com um

    cotidiano e uma história que urdiram processos de interações sociais

    permanentes. (MONTEIRO, 2001, p. 142) De forma corriqueira, mapeamos nos

    discursos dos nossos discentes certo tom de surpresa e admiração quando

    mencionam os indígenas usando camisas de times e os “shortinhos” de futebol,

    maquinando e operando câmeras digitais, computadores, celulares e outros

    “instrumentos de última geração”, estudando em universidades, fazendo cursos

    de aperfeiçoamento e capacitação à distância, acompanhando novidades do

    mundo pela Internet, por televisores, sinais digitais e redes sociais em suas

    aldeias. Infelizmente, em nossos espaços escolares ainda permanece a

    imagem de um indígena relegado ao passado, a uma ancestralidade, um índio

    amorfo, isolado culturalmente e fadado à extinção devido ao apego aos

    “antigos costumes ancestrais”.

    Todavia, ainda continuamos a considerar a cultura e trajetória dos

    nativos como destoantes dos modelos nacionais e contemporâneos, o que

    sugere uma suposta incapacidade de sobrevivência deles no mundo colonial

    e/ou nacional. Ao procedermos com reflexões em torno dos conceitos citados,

    não tivemos a pretensão de mapear todas as abordagens historiográficas sobre

    o tema, mas frisamos a necessidade de se estudar e ensinar história

    problematizando as múltiplas relações entre os indígenas e o Estado, nas

    diferentes temporalidades. Deste modo, os processos históricos de

    autoidentificação e territorialização dos Puyanawa revelam a historicidade, as

    dinâmicas e alterações de uma cultura.

    O território e a organização interna povo Puyanawa: o futuro

  • 17

    Atualmente, o povo vive em seu território demarcado e não passa mais

    por episódios que marcaram a sua história e quase os extinguiram. Segundo

    relatos e histórias dos mais antigos da aldeia, houve muita resistência ao

    processo brutal de “amansamento”, assim designado pelos dawa, no qual

    transcorreu muita violência brutal, mortes e escravização. Segundo relatos da

    tia da autora, a professora Railda Manaitá, ela só conseguiu aprender a falar a

    língua indígena devido a sua teimosia e graças ao fato de não temer aos

    castigos que não foram poucos. Destarte, esta personagem representa para o

    povo estudado um exemplo de coragem. Como afirma em depoimento Maria

    Evanizia dos Santos Puyanawa (FEM, 2010):

    Mesmo diante de todos os percalços pelos quais passou ao longo do último século, o povo Puyanawa segue firme no seu projeto de vida: na defesa de seus direitos, interesses e no cumprimento de seus deveres, nas suas relações políticas e econômicas com a sociedade envolvente, lutando pela proteção de seu território, pelo desenvolvimento de atividades econômicas sustentáveis, mas, principalmente, pelo fortalecimento e pela valorização de sua cultura. (FEM, 2010)

    Ademais, o Brasil é um país de diversidades, uma delas é a diversidade

    étnica. Historicamente, a situação dos índios variou entre quadros de completo

    abandono, perseguição e miséria. Contudo, ainda é lamentável, que, em pleno

    século XXI, ainda existam tantas premissas em relação aos povos indígenas,

    como por exemplo, afirmativas de que são preguiçosos, usurpadores,

    embriagados, entre outros. Os indígenas também são cidadãos brasileiros e

    merecem igualdade perante todos, conforme o estabelecido na Constituição

    (CFB) de 1988.

    Até 1983, os índios Puyanawa moravam nas comunidades Barão do Rio

    Branco e Ipiranga, sem saber que a terra pertencia a eles por direito. Como

    legado histórico das opressões e mazelas nos restaram o processo de

    aculturação, com fortes traços de miscigenação racial, pois o Puyanawa era

    obrigado a casar com o não indígena. Todavia, esta tentativa de destruição

    total, não foi o suficiente para abolir a origem dos Puyanawa.

    Segundo Souza (2009),

    Hoje, os Puyanawa passam por um processo de revitalização cultural, pois na época do “cativeiro” foram proibidos de falar na sua

  • 18

    língua materna. Para fugir da dominação, se espalharam pela região. Quando a FUNAI deu início aos seus trabalhos no Acre, já na década de 70, a maioria voltou para o seu local de origem. Cultivam banana, mamão, milho e macaxeira para sua alimentação, já que a caça e a pesca predatória na região fez com que estas atividades se tornassem secundárias frente à agricultura e ao extrativismo que representam uma fonte de renda para as famílias Poyanawa. (SOUZA, 2009, 13)

    Neste processo de revitalização cultural, a escola tem como objetivo

    desenvolver no estudante suas capacidades afetivas e cognitivas para agir com

    perseverança na busca de conhecimento e no exercício da cidadania,

    respeitando as diferenças e a diversidade garantindo seus direitos e apontando

    seus deveres. (BITTENCOURT, 1994, 106) Segundo Medeiros:

    A maioria dos povos indígenas hoje vê a escola como uma aliada: para aprender os códigos do ‘mundo dos brancos’ (tendo como principal exemplo a aquisição da língua portuguesa), de modo a se instrumentalizar para as lutas indígenas; e também para tentar reverter o processo de ocidentalização e desestruturação cultural que sofreram até então, fortalecendo suas culturas. (MEDEIROS, 2012, 83)

    Deste modo, o fortalecimento e a valorização da cultura do povo

    Puyanawa em um contexto geral, levando em conta tudo que este povo já

    passou e viveu, tem um espaço relevante quando falamos de gestão territorial

    e ambiental da terra indígena Puyanawa.

    De acordo com o depoimento de José de Lima Yube Kaxinawa, o plano

    de gestão de uma terra indígena serve para ajudar o povo a cuidar e a

    continuar manejando e conservando a biodiversidade existente nas terras

    indígenas, para garantir a sobrevivência do povo e das gerações vindouras.

    Nesta perspectiva, o indígena Kaxinawa aborda ainda a questão do entorno

    das terras indígenas, que vem se tornando um grande problema não só para a

    Terra indígena Puyanawa, mas também para as demais terras do território do

    estado do Acre.

    A necessidade e a importância de nosso estudo se justificam pelo fato

    de termos poucos estudos acerca do tema gestão territorial e ambiental na

    terra Puyanawa e o uso do território. Considerando ainda, que este artigo não é

    apenas mais um trabalho acadêmico, pelo contrário, pois será de fundamental

  • 19

    importância dentro da referida terra, servindo tanto para AAPBI, comunidade,

    quanto para ser utilizado como material didático para a escola estadual

    indígena Ixubay Rabui Puyanawa. Esta publicação, por sua vez, será ainda um

    registro escrito para os indígenas Puyanawa e também para gerações

    vindouras.

    Quanto à sua organização política e social, o povo Puyanawa não se

    organiza mais nos modelos de antigamente. Contemporaneamente, a

    organização social desta geração destaca-se a AAPBI, como uma instância

    administrativa dentro da Terra indígena. Esta associação, por sua vez, foi

    criada em 1988. Com a comunidade indígena mais organizada decidiu-se criar

    este organismo com o objetivo de ter força jurídica na defesa dos interesses

    indígenas, melhorando a organização da produção, a captação de recursos e

    buscando parcerias com instituições governamentais e não governamentais.

    Em contrapartida, também foi construída uma sede para a AAPBI na aldeia

    Ipiranga, local no qual são realizadas as reuniões mensais, com os

    representantes da comunidade, equipe gestora e todos os membros da AAPBI.

    Diante deste contexto, temos a certeza que a associação se tornou uma

    ferramenta indispensável na caminhada e na busca de melhorias para o

    território e para seus habitantes.

    A autora considera a realização deste artigo como uma forma de

    contribuir para com o seu povo, que como Puyanawa também se preocupa com

    o futuro deste território, do seu povo, com a qualidade de sua vida e

    sustentabilidade. Na contemporaneidade, vivemos no chamado “tempo dos

    direitos”, o povo Puyanawa tem a posse da sua terra, porém faz-se necessário

    o cuidado com a gestão do território. Vamos inserir alguns fragmentos do artigo

    231 da Constituição Federal Brasileira (1988), que asseguram os direitos

    originários sobre a terra:

    Artigo 231 - São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. 1. São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

  • 20

    2. As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios, dos lagos nelas existentes. (BRASIL, CFB, 1988)

    Conforme o artigo 231, aos povos indígenas brasileiros são conferidos e

    assegurados direitos individuais e direitos coletivos. E dentre os direitos

    coletivos o mais importante é justamente a possibilidade de ter uma terra

    demarcada. Sendo assim, o país deveria ser obrigado a reconhecer este

    direito, e consequentemente a demarcar as reservas.

    Ademais, tendo em vista que qualidade de vida não é apenas ter acesso

    fácil ao poder monetário, mas sim ao “viver bem”, ter uma vida saudável e um

    território equilibrado. Para o povo Puyanawa, a floresta é um ser supremo, que

    tudo dá sem pedir nada em troca, portanto, deve-se trabalhar com alternativas

    sustentáveis.

    Nesta perspectiva, o plano de gestão da terra indígena Puyanawa é uma

    ferramenta importantíssima para o manejo dos recursos naturais, ou seja,

    assegura a relação equilibrada de viver e conviver em comunidade. Outro

    problema alarmante e preocupante é a questão do entorno, vigilância e

    fiscalização da terra, que se agrava a cada dia. Segundo os dados da última

    operação de vigilância e fiscalização da associação foram detectadas áreas

    devastadas, indício de caçadas e pescas predatórias por parte dos não

    indígenas.

    A terra indígena Puyanawa possui seu próprio Plano de Gestão

    Territorial e Ambiental (PGTA) que foi elaborado e discutido coletivamente pelo

    próprio povo, percebendo a necessidade de ações e atitudes para cuidar

    melhor do seu território. O mesmo foi elaborado em parceria com a AAPBI,

    como maior instância administrativa, Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-AC),

    Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais do Acre (AMAIAC), tendo

    a participação constante das lideranças e os indígenas Puyanawa. O PGTA é

    um documento reconhecido pela comunidade e também legalmente, ou seja,

    conforme as leis da sociedade brasileira (não indígena). Neste documento

    estão as normativas internas da comunidade, as quais visam a qualidade de

    vida, buscando atender as necessidades da população indígena e cuidar do

    território indígena, assim como de suas inúmeras formas de vida. O PGTA

  • 21

    dispõe sobre: recursos florestais, caça, pesca, roçados, plantios agroflorestais,

    criação de animais domésticos e silvestres, saúde ambiental, beneficiamento,

    vigilância e fiscalização da terra indígena, revitalização cultural e planejamento

    comunitário.

    Considerações finais

    Ademais, ter o território demarcado e reconhecido pelo Estado não é o

    suficiente. Cabe ao governo brasileiro também dar suporte e total apoio aos

    povos indígenas para que possam ter condições e apoio no monitoramento

    ambiental e territorial de suas terras. Em um contexto global, os povos

    indígenas, possuem direitos assegurados por leis, que lhes garantem direito à

    terra demarcada, a educação escolar indígena diferenciada etc. Porém,

    infelizmente, estes direitos assegurados por lei nem sempre estão em pleno

    exercício, pois os povos enfrentam problemas relacionados ao território, a

    explorações de seu entorno, invasões e também problemas internos.

    Ao analisarmos os desafios e problemas vivenciados pelo povo

    Puyanawa, em todo o estado do Acre (Brasil), é importante salientar que as

    raízes e a ideologia de muitos problemas sociais podem ser desvendadas na

    análise das políticas colonialistas. As políticas públicas, por sua vez, são

    ferramentas indispensáveis para nos auxiliar na busca do pleno exercício de

    nossa cidadania, dos direitos e deveres. Desta maneira, viver em um território

    limitado é um desafio para os povos indígenas. Nesta perspectiva, promover a

    gestão territorial e ambiental das terras indígenas em todo o território nacional

    ultrapassa o conceito de cuidado territorial, porque se transforma em uma

    questão de sobrevivência, manutenção e difusão cultural.

    REFERÊNCIAS

  • 22

    Documentos de lei

    BRASIL, Artigo de Lei que inclui a obrigatoriedade do Ensino da Cultura e História Indígena nas Instituições de Ensino: Lei Nº 11.645, 10 de março de 2008. BRASIL, Ministério da educação, Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio. Brasília: Ministério da Educação, 1999. BRASIL, RESOLUÇÃO CEB Nº 3, de 10 de novembro de 1999. Diário Oficial da União, Brasília, 17 de novembro de 1999. BRASIL. “Programa de Apoio à Formação Superior e Licenciaturas Interculturais (PROLIND) – Educação Indígena”, disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=15944:programas-do-mec-voltados-a-formacao-de-professores Acesso em: 11/04/2016. BRASIL. Constituição Federal. Brasília: Senado Federal, 1988. BRASIL. Políticas públicas para a educação dos povos indígenas – MEC-Secadi, disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12315:educacao-indigena&catid=282:educacao-indigena&Itemid=635 (MEC-Secad. Acesso em: 09/04/2016.) BRASIL. Tribunal Especial. Publicada em 1931, Vol. 4, pg. 30. Acervo: Arquivo Nacional. http://img.socioambiental.org/v/publico/puyanawa/puyanawa_6.jpg.html; http://img.socioambiental.org/v/publico/puyanawa/puyanawa_7.jpg.html; Acessado em: 04/03/2016. Bibliografia ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Índios mestiços e selvagens civilizados de Debret reflexões sobre relações interétnicas e mestiçagens, Varia História. Belo Horizonte, vol. 25, nº 41, pp.85-106, jan/jun 2009. ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Metamorfoses Indígenas: identidade e cultura nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Editora Arquivo Nacional, 2003. ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Os índios na história do Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2010. BARTH, Fredrik. O guru, o iniciador e outras variações antropológicas. Tradução de John Cunha Comerford. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, 2000.

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  • 28

    DESENVOLVIMENTO E FEDERALISMO NO BRASIL: OS PLANOS

    PLURIANUAIS E A ATUAÇÃO MUNICIPAL

    Caroline Marci Fagundes Coutinho

    Mestre em Desenvolvimento Social – PPGDS/Unimontes

    Sheyla Borges Martins Doutoranda em Desenvolvimento Social – PPGDS/Unimontes

    Professora do Departamento de Política e Ciências Sociais – Unimontes

    Introdução

    Os mecanismos, propostas e ações para a promoção do

    desenvolvimento são organizados a partir da mediação entre escolhas políticas

    e econômicas. O desenvolvimento em si é estruturado por diretrizes

    econômicas. Contudo, esse mesmo desenvolvimento é uma escolha política.

    Em uma reflexão sobre a relação entre economia e política, somos levados a

    pensar, pelo o que está posto em nossa cultura, que a economia detém todo

    poder, inclusive de manipulação da política. Entretanto, é possível considerar

    um novo olhar, onde os interesses políticos são os direcionadores dos

    caminhos econômicos. Portanto, é preciso compreender como a política

    organiza o desenvolvimento.

    Partindo do princípio de que não há desenvolvimento se não houver

    melhoria de condições de vida em geral, este se apresenta como um conceito

    autoexplicativo. Adjetivações que o acompanham em debates atuais sobre o

    tema são direcionadores para enfatizar os aspectos valorizados por correntes e

    abordagens diferenciadas, e não uma “nova” proposta para um

    desenvolvimento já pensado a priori.

    Quando há uma crítica ao “desenvolvimento econômico”, esta se dá

    pelo fato de se pensar que a econômica exclui o social. Os próprios

    economistas afirmam que, se existe economia é porque há uma sociedade. As

    adjetivações como sustentável, social, regional, endógeno, local, entre outras

    que possivelmente existam, são características direcionadoras tanto na teoria

    como na prática. Tomando como ponto de partida a perspectiva de

    desenvolvimento iniciada pelo processo de promoção do crescimento

    econômico.

  • 29

    O desenvolvimento é um fenômeno que tem a influência de múltiplos

    fatores como aspectos geográficos, sociais, educacionais, culturais, entre

    outros. O estudo aqui proposto será focado na questão política institucional. É

    claro que não se defende que esta, seja mais importante em detrimento de

    outras, o intuito aqui é direcionar uma pesquisa para instigar novas reflexões

    sobre a promoção do desenvolvimento.

    Pelo crivo político institucional, este ainda possui uma amplitude de

    debates a serem considerados. Diante desta complexidade, a análise aqui

    proposta terá a realidade brasileira como base para a pesquisa. Poderiam ser

    citadas outras tantas justificativas do porque pesquisar o Brasil, como a sua

    atual situação de potência econômica mundial, sua influência em questões

    políticas internacionais, a sua mudança social dos últimos anos, a participação

    em grupos econômicos como BRICS6 e G207; mas é suficiente afirmar que a

    sociedade brasileira é complexa, enquanto nação, temos períodos com ótimos

    índices de crescimento econômico e Produto Interno Bruto (PIB)8. Porém, ao

    olharmos para a escala micro, sejam as regiões, estados ou municípios, nossas

    disparidades sociais ainda são altas. Logo, o nosso desenvolvimento ao ser

    analisado pela média é ótimo, mas, ao fracioná-lo percebemos nitidamente as

    desigualdades econômicas, sociais, regionais e locais.

    As primeiras ações planejadas para a promoção do desenvolvimento

    aconteceram na antiga União Soviética, em 1929, e logo depois o modelo foi

    incorporado pelos países capitalistas. No Brasil houve várias tentativas para a

    organização do desenvolvimento do país, alguns planos com características

    estritamente econômicas, outros para setores específicos, até serem adotadas

    propostas mais generalizadas, os chamados “Planos Integrados”, com a junção

    de atuação em todos os setores prioritários da gestão pública.

    Em 1950 é implantado, no Governo de Dutra, o Plano Salte, que

    elencou cinco setores como prioritários: saúde, alimentação, transporte e

    energia. Por Juscelino Kubistchek, em 1956, foi apresentado o Plano de Metas

    que propunha ações para o desenvolvimento do país, mas também áreas

    prioritárias: energia, agricultura e alimentação, transporte e indústrias de base.

    6 Grupo econômico formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. 7 Grupo econômico formando pelas 19 maiores economias do mundo mais a União Europeia. 8 O PIB é a soma do resultado da produção de bens e serviços divididos por um período de tempo, que pode ser mensal, trimestral, anual, etc.

  • 30

    No Governo de João Goulart foi instituído o Plano Trienal, que tinha como

    objetivo resolver os problemas da estrutura econômica e social do país, o

    controle da inflação, e sobretudo a redução das desigualdades sociais,

    trazendo em seu bojo o conceito de Desenvolvimento Social.

    O Golpe Militar traz o foco para as questões econômicas. O Programa

    de Ação Econômica do Governo (PAEG) do presidente Castelo Branco

    priorizava mais a organização econômica, como incentivo ao desenvolvimento

    econômico e controle da inflação. Entre 1968 e 1970, no Governo Costa e

    Silva, foi lançado o Programa Estratégico do Desenvolvimento, com

    características semelhantes ao PAEG, mas colocando o desenvolvimento como

    incentivador do progresso social, sobretudo com o aumento da oferta de

    emprego e renda. Com o Plano Nacional de Desenvolvimento I (PND I) é que

    se inicia o ciclo de promoção do desenvolvimento da nação, englobando de

    forma mais abrangente os setores da sociedade, bem como com ações para

    médio e longo prazo.

    Com a retomada da democracia com a Constituição Cidadã de 1988,

    foi incorporado como dever governamental o planejamento do desenvolvimento

    da nação, que seria instrumentalizado pelos Planos Plurianuais (PPA). Para

    fins desta pesquisa, é preciso ressaltar que conforme afirma Oliveira (2013) “o

    primeiro Plano Plurianual foi o PPA 1991-1995, elaborado pelo Governo Collor

    de Mello com o fim precípuo de cumprir determinação constitucional, e tinha a

    mesma estrutura do orçamento da época” (p. 04), e diante do objetivo de

    investigar a promoção do desenvolvimento, foram analisados os PPAs 1996-

    1999 e 2000-2003, que foram elaborados para a organização do

    desenvolvimento nacional. A definição dos planos contemplados neste estudo

    também se deu diante das transformações das estratégias para o

    desenvolvimento do país, que inicialmente “conviveu com estratégias

    desenvolvimentistas, amplamente divulgadas na literatura econômica. Contudo,

    a partir do final da década de 70, a política macroeconômica concentrou seus

    esforços nos objetivos de estabilidade econômica”. (MATOS, 2002, p. 21).

    Para estudar os planos foram utilizadas as orientações do método de

    análise documental. Conforme afirma Cerllard (2008), com esse método é

    possível eliminar uma eventual influência da previa percepção do pesquisador

    com relação aos dados pesquisados. Para realizar uma análise documental é

  • 31

    preciso considerar algumas particularidades deste método, sobretudo diante da

    complexidade em se analisar um documento que não é totalmente dominado

    pelo pesquisador; a sua característica estática, pois “o documento permanece

    surdo” (p. 296); e a necessidade “aceitá-lo como ele se apresenta, tão

    incompleto, parcial ou impreciso que seja.” (p. 299).

    Como orientação para a pesquisa pela análise documental, Cerllard

    (2008) sugere que seja, inicialmente, realizada uma avaliação crítica geral dos

    documentos, bem como suas fontes. Em seguida é preciso considerar o

    contexto social do documento, tanto na sua elaboração quanto à época da

    realização da pesquisa; certo conhecimento dos autores, pois “não se pode

    pensar em interpretar um texto, sem ter previamente uma boa ideia da

    identidade da pessoa que se expressa, de seus interesses e motivos que a

    levaram a escrever.” (p. 300).

    Também é preciso assegurar a autenticidade e a confiabilidade do

    texto, pois são fundamentais para ter o respaldo da qualidade das informações;

    e identificar os conceitos-chave e a lógica do texto, visto que

    Delimitar adequadamente o sentido das palavras e dos conceitos é, alias, uma precaução totalmente pertinente no caso de documentos mais recentes nos quais, por exemplo, utiliza-se um “jargão” profissional específico, ou nos que contêm regionalismos, gíria própria a meios particulares, linguagem popular, etc. Deve-se também prestar atenção aos conceitos-chave presentes em um texto e avaliar sua importância e seu sentido, segundo o contexto preciso em que eles são empregados. Finalmente, é útil examinar a lógica interna, o esquema ou plano do texto: Como um argumento se desenvolveu? Quais são as partes principais da argumentação? Etc. essa contextualização pode ser, efetivamente, um precioso apoio, quando, por exemplo, comparam-se vários documentos da mesma natureza. (CERLLARD, 2008, p. 303).

    Como para esta pesquisa foram analisados documentos escritos em

    diferentes contextos históricos e sociais, o cuidado com a interpretação dos

    sentidos das palavras e conceitos tornou-se fundamental para a melhor

    compreensão das informações coletadas.

    Após o desenvolvimento deste estudo, foi possível verificar que, apesar

    de o país está organizado politicamente como uma federação, a atuação dos

    entes federados na promoção do desenvolvimento não ocorre conforme é

    estabelecido neste tipo de pacto. As decisões estão centralizadas na atuação

    da União, com alguma participação dos Estados, e aos municípios cabe a

    função de executador das as demandas repassadas.

  • 32

    Plano plurianual

    Apesar de ter sido instituído na promulgação da Constituição Cidadã

    em 1988, o primeiro PPA, apresentado no governo de Fernando Collor, não foi

    concebido conforme a orientação da Carta Magna. O primeiro PPA

    apresentado ao país tinha características de organização orçamentária,

    conforme afirma

    O primeiro Plano Plurianual (1991-1995) tinha como principais objetivos o controle das contas públicas e um projeto de desestatização e abertura comercial. Esse primeiro PPA não foi reconhecido como instrumento derivado de um exercício de planejamento. Foi encaminhado ao Congresso Nacional de forma burocrática e aprovado sem maiores debates, de forma a cumprir a formalidade da previsão constitucional. (PAULO, 2010, p. 03).

    Diante do distanciamento do objeto deste estudo, acreditou-se que a

    análise do PPA 1991-1995 era dispensável, tendo informações relevantes para

    outras linhas de pesquisa.

    Plano Plurianual 1996-19999

    Após um momento de busca de estabilização da inflação, o Plano

    Plurianual 1996/99 tinha como objetivo básico a consolidação da estabilidade

    de preços, visto que “a retomada dos investimentos produtivos e a deflagração

    de uma nova fase sustentada de desenvolvimento são consequências da

    estabilidade e, ao mesmo tempo, condição para a sua consolidação”. (PPA,

    1996-1999, p 10, 1999). As ações pautadas no PPA 1996/99 representavam o

    momento de reconstrução econômica do país, que nos anos da alta da inflação

    influenciaram nos investimentos para o crescimento e desenvolvimento do

    Brasil. Com isso, o Governo buscou atuar na construção de um Estado

    Moderno e Eficiente, na redução das desigualdades espaciais e sociais e na

    modernização produtiva da Economia Brasileira.

    Aprovado em maio de 1996, no governo de Fernando Henrique

    Cardoso, o PPA 1996/99 foi estruturado conforme era estabelecido na

    Constituição de 1988. Organizado para contemplar as diretrizes, objetivos e

    metas, o plano foi dividido em duas partes, e elas em tópicos. A primeira parte

    discorria sobre as diretrizes da ação governamental, com suas estratégias e

    9 Plano Plurianual 1996/99 na integra em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9276.htm

  • 33

    formas de alocação dos recursos. Na segunda parte foi descrito os objetivos de

    metas, especificando as ações nos setores por áreas temáticas de

    infraestrutura econômica; recursos hídricos; agricultura; indústria e comercio

    exterior; turismo; ciência e tecnologia; meio ambiente; desenvolvimento social;

    cultura, justiça, segurança e cidadania; Estado e administração pública; e

    defesa nacional.

    O PPA 1996/99 tinha suas metas e ações permeadas por um caráter

    social incontestável. As prioridades de investimentos seriam nos setores de

    infraestrutura econômica e capacitação de recursos humanos, sobretudo em

    regiões com bases econômicas mais frágeis. As prioridades foram

    categorizadas a partir das ações que receberiam, bem como os objetivos que

    iriam influenciar. Assim, para a redução dos desequilíbrios espaciais seriam

    destinados recursos nas áreas de saneamento básico, educação e ciências e

    tecnologia. Também seria incentivada a desconcentração geográfica da

    produção industrial, apoiando as micros e pequenas empresas, e a alocação

    dos recursos hídricos para regiões com déficit de abastecimentos humano e

    que seria uma barreira para o desenvolvimento agropecuário. Para minimizar

    as disparidades sociais, na área de desenvolvimento social, seriam aplicados

    recursos nas regiões mais carentes do país – estes seriam distribuídos a partir

    dos estudos realizados pelo IPEA. Na área da agricultura, seriam incentivas

    pesquisas aplicadas, ações para a reforma agrária, capacitação dos produtores

    rurais, formas de associativismo, cadeias integradas de agroindústrias.

    Objetivos do PPA 1996-1999

    No PPA 1996/99 os objetivos são descritos juntamente com as metas,

    que algumas vezes possuem especificações por regiões. Divididas por áreas

    temáticas, delimitam as ações e projetos que seriam desenvolvimentos, bem

    como uma justificativa para tais escolhas. Na infraestrutura econômica, a

    prioridade era a recuperação da infraestrutura básica, que com os anos sem

    investimentos foi deteriorada. A ação básica para isso era a alocação de

    recursos da União nas áreas de transportes, energia e comunicações,

    principalmente nas regiões de bases econômicas mais frágeis.

  • 34

    Para reverter o processo de deterioração da infraestrutura básica, o Governo tem como prioridade a reestruturação das formas de gestão e financiamento do setor. Isso exige reformas de caráter institucional e legal necessárias à operação, recuperação e expansão da infraestrutura, que descentralizem a atribuições para outros níveis de governo e setor privado via parcerias, concessões e privatizações. (PPA 1996-1996, 1996, p. xx).

    As ações com relação à superação dos problemas dos recursos

    hídricos estavam pautadas no objetivo de melhorias na estrutura para o

    abastecimento humano e a promoção do desenvolvimento agropecuário. Para

    isso, eram necessária a implantação de um novo modelo de gerenciamento dos

    recursos hídricos com o intuito de coibir a poluição de mananciais e promover o

    seu uso de forma adequada. Ainda, com empreendimentos de irrigação e

    armazenamento de água seriam realizados, principalmente no semiárido

    brasileiro. Também seriam incentivadas formas alternativas de financiamento e

    gestão das obras hídricas, agregando Estados, Municípios e iniciativa privada

    para atuarem de forma expressiva.

    Na agricultura, a proposta era a adoção de uma política

    descentralizada com maior participação de Estados, Municípios, organizações

    não-governamentais e da iniciativa privada com o objetivo de superar os

    desequilíbrios espaciais e sociais do setor. Os recursos seriam destinados à

    pesquisa aplicada, reforma agrária, capacitação dos produtores rurais, apoio à

    gestão das formas associativas de produção e integração das cadeias

    agroindustriais. Estas prioridades foram determinadas a partir da compreensão

    do contexto do funcionamento do setor agropecuário na época, que possuía

    grande importância

    A agricultura brasileira vem atendendo adequadamente ao mercado interno, além de expandir a receita cambial, gerar empregos e contribuir para a estabilização econômica do País. No entanto, o setor é marcado por desequilíbrios espaciais e sociais, centrados na convivência entre uma agricultura comercial, plenamente integrada no mercado, e outra de subsistência, marginalizada do processo de desenvolvimento e pouca capacitada, técnica e economicamente. (PPA 1996-1999, 1996).

    O setor de Indústria e Comércio Exterior seria reestruturado. Para isso,

    a ação do Governo seria destinada ao fortalecimento dos estímulos do

    mercado, sobretudo na orientação das estratégias de decisões empresarias.

    Seria incentivada a desconcentração geográfica da produção industrial, as

    micros e pequenas empresas e a elevação da qualidade da produção. Já para

    o incentivo ao setor de Turismo, os incentivos seriam destinados para o

  • 35

    aproveitamento das potencialidades turísticas, tornando-a um produto

    competitivo em nível internacional. Com uma cooperação entre órgãos públicos

    e inciativa privada, seriam desenvolvidos programas de integração regional,

    que também influenciariam na geração de divisas, criação de empregos e

    geração de renda. Com relação as ações do Governo para o Meio Ambiente,

    as estratégias estariam centradas na organização de urso dos recursos

    naturais, novos modelos de gestão ambiental e planejamento baseado no

    ordenamento do territorial, a partir das diretrizes da sustentabilidade.

    No setor de Ciência e Tecnologia, os incentivos estariam voltados para

    ações que resultassem na redução dos desequilíbrios espaciais. A situação do

    setor no país neste período era a compreensão da existência de potencial para

    o seu desenvolvimento, mas este ainda era inferior com relação a realidade dos

    países desenvolvidos

    O Brasil possui capacidade técnico-cientifico e organização institucional de ciências e tecnologia importante e diversificada, embora muito aquém daquela disponível nos países desenvolvidos. O esforço brasileiro na área estará voltado à inserção das duas atividades no processo de desenvolvimento socioeconômico, mediante reorientação da política cientifica e tecnológica para a difusão e introdução de inovações tecnológicas nas cadeias produtivas. (PPA 1996-1999, 1996).

    Para a promoção do desenvolvimento social, as ações partiriam da

    necessidade de redução das desigualdades sociais. Seriam adotas medidas

    para garantir a eficiência, eficácia e equidade em relação a alocação dos

    recursos públicos nos programas de seguridade; educação; saneamento

    básico, habitação, desenvolvimento urbano e trabalho. De forma

    descentralizada e com a participação da sociedade

    As ações a serem implementadas nas áreas relacionadas ao desenvolvimento social devem ser orientadas preferencialmente para as ações das quais resulte a redução dos desequilíbrios espaciais e devem observar na eleição dos critérios alocativos os diagnósticos contidos no trabalho “O Mapa da Fome: Subsídios à Formulação de uma Política de Segurança Alimentar – 1994-IPEA” e no relatório da Comissão Mista do Congresso Nacional que tratou do desequilíbrio inter-regional brasileiro”. (PPA 1996-1999, 1996, p. xx).

    Para resgatar os direitos de cidadania e justiça, no setor de Cultura,

    Justiça, Segurança e Cidadania, seriam adotadas ações coordenadas entre os

    órgãos de justiça, segurança pública, desporto e cultura. O objetivo das ações

  • 36

    seria o resgate da população brasileira marginalizada, pois a sua integração

    social era fundamental para a efetivação de uma sociedade mais justa,

    moderna e pluralista. No setor da Defesa Nacional, o objetivo era evitar os

    riscos de obsolescência operacional. Assim, um processo de modernização

    continua, tanto das Forças Armadas, quanto do reaparelhamento bélico seria

    incentivado.

    Com relação à organização do Estado e da Administração Pública,

    seria realizada uma capacitação da administração federal, com bases

    modernas e eficientes, para promover a eficiência da gestão publica. O papel e

    competência do Estado seriam redefinidos, compartilhando duas

    responsabilidades com as demais esferas de governo, promovendo a

    descentralização entre gestores governamentais e não governamentais.

    Modelo Econômico de Mercado e Estratégias de Desenvolvimento

    O modelo econômico que orientava a organização brasileira durante o

    PPA 1996/99 era a consolidação do controle da inflação, ações para a

    promoção de superávits primários e câmbio flutuante. Com a implantação do

    Plano Real10 e com a condução da política nacional baseada nos princípios do

    neoliberalismo, seriam estimuladas as privatizações de empresas estatais e a

    entrada de capital externo, para influenciar na arrecadação do Estado e

    modernizar a produção industrial.

    As estratégias para as ações do Governo no período entre 1996 a 1999

    foram pautadas a partir das preocupações que iriam orientar as ações do

    Governo, assim, quanto à construção de um Estado Moderno e Eficiente,

    seriam as estratégias de

    i) consolidação do processo de saneamento das fianças públicas; ii) descentralização das políticas públicas para Estados e municípios, setor privado e organizações não governamentais; iii) aumento da eficiência do gasto público, com ênfase na redução dos desperdícios e no aumento da qualidade e da produtividade dos serviços públicos; iv) aprofundamento do programa de desestatização; v) modernização das Forças Armadas e de seus níveis operacionais; vi) modernização da Justiça e dos sistemas de Segurança e Defesa Nacional;

    10 Ver mais em: http://www.fazenda.gov.br/divulgacao/publicacoes/plano-real/7_anos_portugues.pdf

  • 37

    vii) reformulação e fortalecimento da ação reguladora do Estado, inclusive nos serviços públicos privatizados; viii) reformulação e fortalecimento dos organismos de fomento regional; ix) modernização dos Sistemas de Previdência Social. (PPA 1996-1999, 1996, p. xx).

    Desde o I PND as questões sociais começaram a ganhar importância

    nas ações para o desenvolvimento do Brasil. Contudo, devido ao histórico de

    concentração de renda do país, foi necessário criar estratégias para a redução

    dos desequilíbrios espaciais e sociais, que eram

    i) criação de novas oportunidades de ocupação da força de trabalho; ii) redução dos custos de produtos de primeira necessidade; iii) aproveitamento das potencialidades regionais, com uso racional e sustentável dos recursos; iv) fortalecimento da base de infraestrutura das regiões menos desenvolvidas; v) fortalecimento da política de desconcentração industrial; vi) redução da mortalidade infantil; vii) ampliação do acesso da população aos serviços básicos de saúde; viii) melhoria das condições de vida, trabalho e produtividade do pequeno produtor e do trabalhador rural; ix) melhoria das condições de vida nas aglomerações urbanas críticas (segurança pública, saneamento, habitação, transporte coletivo, serviços urbanos, desporto, e cultura e meio ambiente); x) mobilização da sociedade e comprometimento de todo o governo para a erradicação da miséria e da fome; xi) fortalecimento da cidadania e preservação dos valores nacionais. (PPA 1996-1999, 1996, p. xx).

    Para alavancar o desenvolvimento do país, era necessário investir no

    crescimento da produção. Para isso, foram propostas ações objetivas para a

    modernização produtiva

    i) modernização e ampliação da infraestrutura; ii) aumento da participação do setor privado em investimentos para o desenvolvimento; iii) fortalecimento de setores com potencial de inserção internacional e estímulo à inovação tecnológica e à restruturação produtiva; iv) melhoria educacional, com ênfase na educação básica; e v) modernização das relações trabalhistas. (PPA 1996-1999, 1996, p. xx).

    A premissa básica que orientava o PPA 1996/99 era o controle da

    inflação, pois assim seria possível a retomada dos investimentos na produção e

    promoção do desenvolvimento.

  • 38

    O município no PPA 1996/99

    No PPA 1996/99 a Constituição de 1988 já influenciara na

    descentralização política, principalmente na gestão das políticas pública.

    Assim, o município recebia responsabilidades e funções para a promoção do

    desenvolvimento nacional, afirmando o seu papel de ente federado.

    O município aparece em diferentes pontos do PPA 1996/99. Nas ações

    para a área dos recursos hídricos, tem a responsabilidade, juntamente com

    Estados e iniciativa privada, de viabilizar formas alternativas de financiamento e

    gestão de obras hídricas. Na agricultura recebe responsabilidades de

    formulação e implementação da política agrícola nacional, sobretudo na

    efetivação dos projetos de assentamento, que teria sua organização baseada

    na descentralização de responsabilidades. No Nordeste, os municípios,

    juntamente com os governos estaduais e federal, seriam apoiadores da

    implantação e ampliação da fruticultura irrigada e dos polos agroindustriais.

    Na organização da saúde pública nacional, a descentralização do

    Sistema Único de Saúde (SUS) incorporaria os municípios na gestão do

    sistema, sendo 10 % dos municípios com gestão semiplena e 60% com gestão

    parcial. O objetivo desta ação era recuperar a rede pública de serviços,

    implantando novos modelos de gestão e organização, e incentivando a

    capacidade gerencial dos municípios. Na área da cultura, o município seria o

    responsável, juntamente com os Estados e iniciativa privada, apoiar a

    capacitação de recursos humanos das áreas culturais. Na educação, apoiaria a

    criação de bibliotecas municipais. Na área de habitação teria importante papel

    com ações para estimulo da participação do setor privado e da sociedade na

    promoção das políticas de acesso à moradia. Caberia, também, ao munícipio e

    aos Estados aumentarem a contrapartida ao poder público federal no

    financiamento do setor.

    O município, mesmo que não citado de forma direta, é colocado como

    atuante nas ações do PPA 1996/99. Para a efetivação da descentralização, é

    colocado como responsável por ações coordenadas com os governos federal e

    estadual. De forma autônoma e isolada, não é deliberado a ele nenhuma

    função.

  • 39

    Plano Plurianual 2000/2003

    O Plano Plurianual para o período de 2000 a 2003 foi apresentado pelo

    então presidente Fernando Henrique Cardoso. Com a inflação controlada, o

    país retomava o objetivo de crescer. O cenário da economia do país era

    construído em bases sólidas, com um câmbio que assegurava a

    competitividade externa dos produtos nacionais; com baixas taxas de juros,

    controle da importação e reformas estruturais para o controle das contas

    públicas.

    O objetivo do PPA 2000/2003, ou Plano Avança Brasil, era a promoção

    do crescimento econômico do país, que possibilitaria a geração de empregos,

    sustentando assim um bom padrão de vida para os brasileiros. Para isso

    seriam realizados mais investimentos por parte do poder público e da iniciativa

    privada e a busca da melhoria e eficiência da produção. A ideia era criar um

    comportamento empreendedor no país, tanto na esfera privada quanto nas

    próprias empresas e ações do Estado. Como é afirmado na mensagem do

    presidente FHC na apresentação do plano, era preciso construir um “Estado

    mais ágil e mais preparado para responder as demandas da sociedade”, que

    seria possível a partir de uma “verdadeira revolução gerencial”.

    A estrutura textual do PPA 2000/2003 é formada por cinco capítulos.

    No primeiro é apresentada uma análise do contexto brasileiro e os horizontes

    para o futuro, nomeado por “Estabilidade, Desenvolvimento, Justiça Social:

    Novos horizontes para o Brasil”. O segundo capítulo “Brasil Integrado” são

    colocados as ações que seriam desenvolvidas ao longo dos quatro anos,

    divididos a partir dos objetivos específicos do plano: Brasil Mais Justo, Brasil

    Mais Forte, Brasil Mais Competitivo e Brasil Preservado. No terceiro capítulo é

    tratado da mudança na administração pública do país; “Brasil Avançado” é

    detalhado como seria implantado o novo modelo de gestão, com controle e

    organização do orçamento. O quarto capítulo trata das diretrizes estratégicas e

    objetivos do PPA: Crescer com Firmeza; Trabalho, Desenvolvimento e

    Prosperidade; Justiça Social e Qualidade de Vida; e Democracia, Liberdade e

    Cidadania. Já no último capítulo são apresentados os orçamentos e valores

  • 40

    dos investimentos. Segundo é afirmado por FHC em sua mensagem, a

    alocação dos recursos foi priorizada de acordo com a ótica da sociedade.

    No PPA 2000/2003 o desenvolvimento é proposto a partir da lógica

    sustentável, com investimentos na consolidação da infraestrutura econômica

    com direcionamentos de interesses nacionais nas áreas social e ambiental,

    com a integração das regiões e difusão da informação e do conhecimento. As

    ações tinham como pano de fundo “a redução das desigualdades sociais, a

    diminuição das disparidades regionais, a integração do País com ele próprio,

    com os países vizinhos e com a economia internacional”.

    Os objetivos do PPA 2000/2003

    A estruturação do PPA 2000/2003 direcionava a construção de um

    novo desenvolvimento no país, priorizando o atendimento das necessidades

    básicas do cidadão e a sua participação nos ganhos do crescimento econômico

    do país. As diretrizes estratégicas que possibilitariam atingir esta meta eram:

    Consolidar a estabilidade econômica com crescimento sustentado; Promover o

    desenvolvimento sustentável voltado para a geração e oportunidades de renda;

    Combater a pobreza e promover a cidadania e a inclusão social; Consolidar a

    democracia e a defesa dos direitos humanos; Reduzir as desigualdades inter-

    regionais; e Promover os direitos de minorias vítimas de preconceito e

    discriminação.

    A partir destas diretrizes, os objetivos foram dispostos por setores de

    atuação, como exemplo a “melhoria da saúde, da educação, da habitação e do

    saneamento, combate à fome, redução da violência, desenvolvimento integrado

    do campo;