“CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana...

229
ACTAS DE BIOQUÍMICA VOLUME 1 “CONTRACTILIDADE MUSCULAR” Editores J. Martins e Silva Carlos Ribeiro 1989

Transcript of “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana...

Page 1: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ACTAS DE BIOQUÍMICA VOLUME 1

“CONTRACTILIDADE MUSCULAR”

Editores

J. Martins e Silva

Carlos Ribeiro

1989

Page 2: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ii

ACTAS DE BIOQUÍMICA VOLUME 1 1989

As actas do Instituto de Bioquímica destinam-se fundamentalmente à

publicação dos textos completos, lições, conferências e outros trabalhos

apresentados em Cursos Avançados de Pós-Graduação ou Simpósios

Científicos organizados, no todo ou em parte, pelo Instituto de Bioquímica da

Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.

Adicionalmente, poderão incluir artigos originais ou de revisão, fichas

técnicas ou outras contribuições científicas na área da Bioquímica básica ou

patológica.

FICHA TÉCNICA

Director

Prof. Douitor J. Martins e Silva

Director-adjunto

Profª. Doutora Carlota Saldanha

Coordenador Editorial

Dr. J. Rodrigues Loureiro

Propriedade, Redacção e Administração

Instituto de Bioquímica

Faculdade de Medicina de Lisboa

Av. Prof. Egas Moniz 1600 LISBOA – PORTUGAL

Endereço Administrativo

Apartado 4098-1502 LISBOA CODEX

Page 3: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

iii

1º CURSO AVANÇADO DE BIOQUÍMICA APLICADA À

MEDICINA

“CONTRACTILIDADE MUSCULAR”

Lisboa, 15 e 16 de Dezembro de 1986

Page 4: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

iv

ACTAS DE BIOQUÍMICA VOLUME 1 1989

Agradecimento:

Os editores destacam e agradecem o trabalho do Secretariado encarregado

desta publicação, em particular a colaboração de Emília Alves, na preparação

dos textos e da edição final.

As posições científicas e os textos publicados neste volume pelos conferencistas

que participaram no referido curso são da exclusiva responsabilidade dos mesmos.

(C) INSTITUTO DE BIOQUÍMICA DA F.M.L., 1986

Não é permitida a reprodução total ou parcial desta publicação sem a autorização prévia dos

editores.

Page 5: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

v

ACTAS DE BIOQUÍMICA VOLUME 1 1989

1º CURSO AVANÇADO

DE BIOQUÍMICA APLICADA À MEDICINA

CONTRACTILIDADE MUSCULAR

Organização

Instituto de Bioquímica da Faculdade de Medicina de Lisboa

(dir.: Prof. Doutor J. Martins e Silva)

UTIC-Arsénio Cordeiro do Hospital de Santa Maria

(dir.: Prof. Doutor Carlos Ribeiro)

Secretariado

Dr. Lúcio Botas (secretário-geral)

Dr. António Pedro Machado

Dr. Daniel Ferreira

Drª. Ana Isabel Santos (tesoureira)

Dr. João Paulo Guimarães

Dr. J. Rodrigues Loureiro

Apoio administrativo

Maria Honorina Correia

Emília Alves

Ana Magalhães

Patrocínio científico

Faculdade de Medicina de Lisboa

Instituto Nacional de Investigação Científica

Reitoria da Universidade de Lisboa

Secretaria de Estado do Ensino Superior

Sociedade Portuguesa de Bioquímica

Sociedade Portuguesa de Cardiologia

Page 6: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

vi

ACTAS DE BIOQUÍMICA VOLUME 1 1989

CONTRACTILIDADE MUSCULAR

Textos das lições proferidas no 1º Curso Avançado de Bioquímica Aplicada à Medicina,

realizado em Lisboa, nos dias 15 e 16 de Dezembro de 1986, organizado pelo Instituto de

Bioquímica da F.M.L.e UTIC-Arsénio Cordeiro do H.S.M.

Editores

J. Martins e Silva

Carlos Ribeiro

Publicado por

Instituto de Bioquímica

Faculdade de Medicina

Universidade de Lisboa

1987

Page 7: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

vii

ACTAS DE BIOQUÍMICA VOLUME 1 1989

ÍNDICE

Aspectos microscópicos do tecido muscular esquelético ....................................................... 1

Trindade dos Anjos, R.

Aspectos funcionais das proteínas contrácteis - actina, miosina, tropomiosina

e troponina .............................................................................................................................. 7

Silva Carvalho, L.

Calmodulina e ATPase do cálcio .......................................................................................... 15

Saldanha, C.

Energética do músculo esquelético ...................................................................................... 27

Martins e Silva, J.

Adaptação do músculo ao esforço - hipertrofia e atrofia ...................................................... 45

Gomes Pinto, B.

Adaptação metabólica ao exercício físico .............................................................................. 57

Martins e Silva, J.

Bases fisiopatológicas da fadiga muscular no homem .......................................................... 109

Botas, L.

Anatomia, fisiologia e patologia da placa motora .................................................................. 125

Morgado, F.

Binómio excitação-contracção ............................................................................................... 131

Silva Carvalho, J.

Fisiofarmacologia dos inibidores da entrada de cálcio e perspectivas terapêuticas ........... 143

Polónia, J.; Guimarães, S.

Regulação purinérgica da contractilidade muscular ............................................................. 151

Ribeiro, J. A.

Aspectos microscópicos do tecido muscular liso .................................................................. 157

Trindade dos Anjos, R.

Page 8: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

viii

ACTAS DE BIOQUÍMICA VOLUME 1 1989

Particularidades da electrofisiologia do músculo liso - potenciais de membrana,

potenciais de acção e junção neuro-muscular ...................................................................... 161

Silva Carvalho, L.

Aspectos microscópicos do tecido muscular cardíaco .......................................................... 173

Trindade dos Anjos, R.

Períodos refractários ............................................................................................................. 179

Longo, A.

Binómio excitação/contracção - particularidades da acção do cálcio e de outros iões........ 189

Bastos Machado, H.

Fisiopatologia da contracção do miocárdio isquémico ......................................................... 195

Ferreira, R.

Bases energéticas da contracção muscular cardíaca ............................................................. 207

Botas, L.

Registos da electrogénese cardíaca ....................................................................................... 221

Ribeiro, C.

Conclusões e encerramento do curso .................................................................................... 231

Martins e Silva, J.

Page 9: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:1-5 1

ASPECTOS MICROSCÓPICOS DO TECIDO MUSCULAR ESQUELÉTICO

R. Trindade dos Anjos

Departamento de Histologia e Embriologia da Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa;

Universidade Nova de Lisboa

SUMÁRIO

O tecido muscular esquelético é constituído por células musculares estriadas,

envolvidas por tecido conjuntivo. As células ou fibras musculares são

alongadas, com diâmetro entre 10 e 100 m e de comprimento muito variável,

multinucleadas (várias centenas de núcleos por célula), com Os núcleos

localizados na periferia do citoplasma, sob a membrana celular ou sarcolema. O

citoplasma (sarcoplasma) e caracterizado pela existência de miofibrilhas

formadas sobretudo por miofilamentos de actina (finos) e miosina (espessos). O

padrão de “estriação” transversal da célula muscular esquelética reflecte a

organização estrutural das miofibrilhas. A disposição dos filamentos de actina e

miosina determina a formação de bandas alternadas claras (banda A) e escuras

(bandas I). No centro de cada banda I existe uma estrutura linear (linha Z); a

unidade funcional da miofibrilha - o sarcómero - é delimitada pelas linhas Z.

No sarcoplasma há a realçar a existência de numerosas mitocôndrias, com

disposição característica (aos pares) e a presença de um complexo sistema

rnembranoso, o retículo sarcoplasmático, que envolve cada uma das

miofibrilhas. O retículo está intimamente relacionado com outras estruturas

membranosas de disposição transversal. O sistema tubular T, que é continuo

com o sarcolema. No homem, como na maioria dos mamíferos, há uma grande

heterogeneidade do sistema muscular esquelético (células de contracção lenta,

contracção rápida e tipos intermédios). Cada um destes tipos celulares possui

características ultra-estruturais e propriedades citoquímicas particulares, que

serão analisadas.

Palavras-chave: Músculo, miofibrilha, filamentos, organelos celulares.

Page 10: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

TRINDADE DOS ANJOS R.

2

O tecido muscular esquelético (ou estriado) é constituído por células ou fibras

alongadas, cilíndricas, de comprimento variável e diâmetro compreendido entre 10 e l00 m.

As suas dimensões estão dependentes, entre outros factores, do tipo citoquímico de fibra e do

grau de trabalho a que o músculo é submetido (1, 2).

O citoplasma da célula muscular estriada é caracterizado pela presença de

miofibrilhas, de 0,2 a 2 m. de diâmetro, dispostas longitudinalmente e constituídas por feixes

de filamentos finos (actina) e espessos (miosina). O padrão típico da estriação destas células

reflecte a organização estrutural das miofibrilhas em unidades regulares - os sarcómeros. Cada

sarcómero é delimitado pelas linhas Z e apresenta uma zona mediana densa, a banda A, e duas

zonas mais claras, as bandas I. A linha Z constitui o local onde os filamentos finos (de actina)

se inserem e interdigitam, unidos entre si por estruturas lineares que correm obliquamente,

criando um aspecto em zigzag (3). Em secções transversais das miofibrilhas ao nível da linha

Z, os filamentos finos apresentam uma disposição em quadrado, e as pontes que os reúnem

mostram padrões complexos (4). As bandas I, que ocupam as porções laterais do sarcómero,

devem o seu nome ao aspecto Isotrópico ou monorrefringente em microscopia de luz

polarizada. Em microscopia electrónica apresentam-se como zonas pouco densas, constituídas

exclusivamente por filamentos finos de actina que partindo da linha Z atravessam esta região

para penetrar na banda electrono-densa adjacente. A zona conhecida como banda A

(Anisotrópica ou birrefringente) é constituída por filamentos espessos e finos. Estes últimos

não alcançam a porção central do sarcómero, que é exclusivamente formada por filamentos

espessos, e esta zona mediada, menos densa do que a restante porção da banda A, é designada

por banda H. A linha M, na sua porção central, resulta da união dos filamentos espessos.

FIGURA I

Secção longitudinal de músculo estriado esquelético. Observam-se várias

miofibrilhas sobrepostas. Estão assinalados os vários componentes de um

sarcómero (X 17000)

Em secção transversal, os filamentos apresentam a nível da banda A um arranjo

particular, com os filamentos espessos colocados Segundo um padrão triangular. Na porção

mais externa daquela banda os filamentos finos apresentam um padrão hexagonal, de modo

que seis filamentos finos envolvem um filamento espesso (5). Observam-se ainda projecções

Page 11: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MICROSCOPIA DO MÚSCULO ESQUELÉTICO

Actas Bioq. 1989; 1:1-5

3

laterais que partem dos miofilamentos espessos na direcção dos miofilamentos finos a

intervalos regulares (6).

Os filamentos finos são constituídos essencialmente por actina, mas também por

outras moléculas como a tropomiosina, a troponina, e a actinina. Os filamentos espessos, para

além da miosina, possuem em pequena percentagem proteína M.

Nas células musculares normais as mitocôndrias estão localizadas aos pares de cada

lado das linhas Z, no sarcoplasma. Em certos tipos de fibras dispõem-se longitudinalmente,

formando filas entre as miofibrilhas, podendo ainda localizar-se junto à membrana plasmática

ou aos pólos nucleares. O número de mitocôndrias é habitualmente elevado nas células

musculares esqueléticas, mas varia de acordo com o tipo de músculo (7).

O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que correm

perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção A-I. Por vezes, pequenas

estruturas tubulares longitudinais estabelecem anastomoses entre túbulos T pertencentes ao

mesmo sarcómero (8,9). O interior dos túbulos T comunica directamente com o espaço extra-

celular, e esta relação estrutural facilita o mecanismo de condução dos impulsos que levam à

contracção muscular.

Cada miofibrilha está envolvida por um complexo sistema de membranas, formado

por túbulos e sáculos, que constituem o retículo sarcoplasmático. As porções tubulares

orientam-se ao longo das miofibrilhas, anastomosando-se entre si ao nível da banda. H, para

formar cisternas fenestradas (10); ao nível da junção entre a banda A e a banda I os túbulos

reúnem-se para formar grandes cisternas terminais, ou de junção, com material finamente

granular electrono-denso no seu interior. Em regra, um túbulo I fica localizado entre duas

cisternas terminais, sendo o conjunto desta estrutura designado “tríade”. A membrana de cada

cisterna invagina-se ao longo da superfície que se relaciona com o túbulo T, e entre os pontos

de invaginação fica apenas um espaço muito apertado, de 10 m, a separar as duas estruturas

(11). Neste espaço observam-se alternadamente zonas electrono-densas e zonas mais claras, o

que lhe confere urna aparência reticulada (12).

FIGUIRA II

Esquema de uma célula muscular esquelética, mostrando l- cisternas

terminais; 2- cisternas fenestradas; 3- mitocôndrias; 4-túbulo T; 5-junção A-

I; 6- linha Z.

Page 12: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

TRINDADE DOS ANJOS R.

4

O aparelho de Golgi está muito pouco desenvolvido nas células musculares, e é

constituído por alguns sáculos localizados nos pólos nucleares. Os lisossomas, também raros,

ocupam a mesma área citoplasmática.

Ribossomas e retículo endoplasmático rugoso são encontrados sobretudo em células

em crescimento ou regeneração, mas são escassos nas células musculares adultas normais.

No citoplasma, ou sarcoplasma, localizam-se ainda grânulos de glicogénio sob a forma

de partículas B que preenchem a maior parte da região entre as miofibrilhas. Também existem

gotículas lipídicas abundantes junto das mitocôndrias. O g1icogénio e os lípidos constituem

os materiais energéticos necessários para o mecanismo da contracção muscular.

Os núcleos da célula muscular estriada são em número de várias centenas, encontram-

se localizados na zona adjacente à membrana plasmática e têm forma ovóide ou cilíndrica.

Pode apresentar indentações, em especial quando a célula está contraída (13). O invólucro

nuclear apresenta duas membranas, uma interna e outra externa, separadas por urna zona

pouco densa e interrompidas por inúmeros orifícios, os poros nucleares.

A membrana celular ou sarcolema é revestida externamente por uma lâmina basal

continua formada por lipoproteínas e associada a fibras de colagéneo e de elastina.

Adjacentes a algumas fibras musculares existem células mononucleadas designadas

células satélite. Os dois tipos celulares partilham urna lârnina basal comum. São células

fusiformes, com citoplasma escasso, pobres de organelos celulares. O seu número varia com a

idade, diminuindo rapidamente nos primeiros anos de vida. As células satélite são

consideradas precursores das células musculares estriadas, com um papel importante no

crescimento e na regeneração do tecido muscular esquelético.

Com base em diferenças citoquímicas e ultraestruturais, a que correspondem

propriedades fisiológicas distintas, existem vários tipos de células musculares que se associam

em percentagens variáveis no músculo esque1ético (14). As células do tipo I, pobres em

actividade ATP-ásica, são ricas em sarcoplasma, mitocôndrias, e gotículas lipídicas, e os

sarcómeros apresentam linhas Z caracteristicamente espessas. Contêm valores elevados de

enzimas oxidativos e mioglobina e são designadas por células vermelhas ou de contracção

lenta, estando envolvidas predominantemente nas reacções tónico-posturais. As células do

tipo II, ricas em actividade ATP-ásica, apresentam um retículo sarcoplasmático mais

desenvolvido e maiores quantidades de glicogénio. Estas células são chamadas células

brancas ou de contracção rápida e participam sobretudo em movimentos de curta duração (1,

15, 16). As fibras do tipo II são ainda subdivididas em tipo II A (actividade oxidativa

predominante) e tipo II B (actividade glicolítica mais importante). Algumas células

musculares modificadas constituem os elementos celulares dos fusos neuro-musculares. Estas

células intra-fusais apresentam características ultraestruturais e citoquímicas próprias e

possuem inervação sensitiva e motora. Estão descritos dois tipos distintos destas células, que

se agrupam em número de 4 a 12, e são envolvidas por uma cápsula de tecido conjuntivo. Os

fusos neuro-musculares encontram-se dispersos no músculo e participam na regulação da

contracção muscular, através das suas vias nervosas aferentes (17).

No tecido muscular, as céu1as estão separadas por tecido conjuntivo laxo, com alguns

fibroblastos e fibras de colagéneo. O tecido conjuntivo que envolve as fibras individuais é

denominado endomísio; o perimísio circunda grupos de fibras musculares e o epimísio

envolve o músculo.

Na junção mio-tendinosa os feixes de fibras colagéneas que constituem o tendão vão

inserir-se profundamente em invaginações membranosas da porção terminal da cé1ula

muscular. As fibras colagéneas estabelecem contacto íntimo com a lâmina basal. Nas céu1as

Page 13: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MICROSCOPIA DO MÚSCULO ESQUELÉTICO

Actas Bioq. 1989; 1:1-5

5

há zonas filamentares densas, semelhantes a linha Z, que constituem locais de união entre os

sarcómeros terminais e a membrana plasmática adjacente a junção mio-tendinosa.

BIBLIOGRAFIA

1. FARDEAU M and TOME FMS. In Electron Microscopy in Human Medicine.

Johannessen J (editor). Mc Graw-Hill, 1981,Vol 4, pp 257-292.

2. HENRIKSON-LARSEN K, et al. Distribution of fibre sizes in human skeletal muscle.

Acta Physiol Scand 123(2): 171-177,1985.

3. KELLY DE and CAHILL MA. Filamentous and matrix components of skeletal muscle Z

discs. Anat Rec 172:623-642,1972.

4. FRANZINI-ARMSTRONG C. The structure of a simple Z line. J Cell Biol 58:630,1973.

5. LEESON CR and LEESON TS. HISTOLOGY SAUNDERS Company, Philadelphia,

1976.

6. RAYNS DG. Miofilaments and cross bridges as demonstrated by freeze-fracturing and

etching. J Ultrast Rese 40:103,1972.

7. KIRKWOOD SP, et al. Mitochondrial reticulum in urn skeletal muscle. Am J Physiol

251:395-402,1986.

8. ADAL MN. The transverse tubular system of eat muscle fibers. Cell Tissue Res

244:197-202,1986.

9. DUSTIN P. Microtubules. Scient Am 243:58-68,1980.

10. CROWE LM and BASKIN RJ. Sterological analysis of developing sarcoplasmic tubular

membranes. J Ultrast Res 58, 10-21,1977.

11. SOMLYD AU. Bridging structures spanning the junctional gap at the triad of skeletal

muscle. J Cell Biol. 80:743,1979.

12. ANDREW DP et al. Specialized contacts between sarcolemma and sarcoplasmic

reticulum at the ends of muscle fibers in the diaphragm of the rat. Cell Tissue Res

243:415-20,1986.

13. WALTON JN (ed.) Disorders of Voluntary Muscle. Churchill-Livingstone, London,

1981.

14. BROOKE MM and ENGEL WK. The histographic analysis of human muscle biopsies

with regard to fiber types. Neurology. 19:221,1969.

15. EDGERTON VR. Morphology and histochemistry of solens muscle from normam and

exercides rats. Am J Anat 127:81-88,1970.

16. FARDEAU M. Caracteristiques cytochimiques et ultrastructurales des differents types de

fibres rnusculaires squelettiques extra-fusales. Ann Anat Path 18:7,1973.

17. BUTLER R. „A new grouping of intrafusal muscle fibers based on developmental

studies of muscle spindles in the cat. Am J Anat 156:115,1979.

Page 14: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:7-15 7

ASPECTOS FUNCIONAIS DAS PROTEÍNAS CONTRÁCTEIS - ACTINA, MIOSINA,

TROPOMIOSINA E TROPONINA

L. Silva Carvalho

Instituto de Fisiologia da Faculdade de Medicina de Lisboa

RESUMO

As proteínas intra-celulares são classificadas em estruturais, contrácteis e

reguladoras. Assim são apresentadas, de forma esquemática, as estruturas

moleculares da miosina, actina, tropomiosina e troponina, com referência

especial à organização dos miofilamentos (grossos e finos), bem como à

actividade ATPásica da miosina. A contracção muscular é interpretada 'a luz da

teoria do filamento deslizante de Huxley e são apresentadas algumas

experiências que a contrariam parcialmente. O mecanismo de contracção do

músculo liso é comparado com o do músculo esquelético, sendo dado especial

relevo à regulação da interacção actina/miosina.

INTRODUÇÃO

Podemos considerar o músculo como uma máquina biológica de conversão de energia

química em mecânica. A sua compreensão envolve, por um lado, a análise dos processes

energéticos desta conversão, e por outro, o dos aspectos mecânicos. É desta última parte que se

ocupa esta breve revisão, ou seja, do modo como o movimento no músculo se dá a nível

molecular.

As proteínas intracelulares do músculo esquelético podem-se dividir (1) em solúveis em

água, ou miogénio, as quais representam 20 a 25% do total proteico; e em insolúveis, também

chamadas filamentosas. Estas últimas são as proteínas contrácteis, as quais podem ser

subdivididas em proteínas contrácteis propriamente ditas (miosina e actina), e proteínas

reguladoras (tropomiosina e troponina). Abordaremos sucessivamente: I - Miosina; II - Actina,

tropomiosina, troponina; III - Teoria do filamento deslizante; IV - Proteínas contrácteis no

músculo liso.

Palavras-chave: Contractilidade muscular, proteínas contrácteis, actina, miosina, tropomiosina,

troponina

Page 15: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

8

I – Miosina

A miosina é o componente principal dos filamentos grossos do músculo esquelético.

Trata-se de uma molécula comprida e assimétrica (Fig. I), que tem uma cabeça globular. Cada

molécula é formada por duas cadeias polipeptídicas pesadas, cada uma com cerca de 1800

resíduos de aminoácidos. Cada cadeia pesada tem uma conformação helicoidal. As duas

cadeias estão enroladas entre si. Ao nível da cabeça globular, as cadeias encontram-se

pregueadas. Assim, as cabeças globulares de miosina são formadas por pregueamentos das

cadeias polipeptídicas pesadas. Além destes pregueamentos das cadeias pesadas, as cabeças

globulares contém 4 cadeias leves. Duas são idênticas e tem um peso de 18000, e as outras

duas são diferentes, uma com peso de 16000 e outra com o peso de 21000.

FIGURA I

Representação esquemática da molécula de miosina. (segundo Lehninger)

Page 16: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

PROTEÍNAS CONTRÁCTEIS

Actas Bioq. 1989: 1:7-15

9

A molécula de miosina pode ser separada em fragmentos. A exposição da molécula à

tripsina (2) ou à quimiotripsina (3) provoca a sua divisão em dois fragmentos: a meromiosina

leve (F 3) e a meromiosina pesada (F 1 + IP 2). A papaína (4), divide a molécula em dois

segmentos provenientes da cabeça (SF 1) e um longo fragmento constituído por (F 2 + F 3).

Verificou-se já há muito tempo (5), que as preparações de miosina tinham capacidade

de hidrolizar o grupo fosfato terminal do ATP, e que esta propriedade reside num dos

segmentos SF 1 (1). Cada segmento SF 1 contém dois grupos sulfohidrilo diferentes. O

bloqueio de um desses grupos aumenta a actividade ATPásica; o bloqueio do outro impede-o.

Existem assim, em cada segmento SF 1, dois grupos sulfohidrilo, um inibidor e outro

catalizador. É também nos segmentos SF 1 que reside a capacidade de união à actina.

Como atrás referimos, a miosina é o constituinte principal dos miofilamentos grossos.

Cada filamento grosso tem cerca de 1500 nm. de comprimento e cerca de 10 nm. de diâmetro.

É constituído por moléculas de miosina (cada uma com 160 nm. de comprimento) dispostas

paralelamente e com as cabeças dirigidas para fora do centro do filamento (Fig. II). De cada

lado da zona central a orientação de todas as cabeças de miosina é idêntica e oposta às do

outro lado. Deste modo em cada hemi-sarcómero todas as cabeças de miosina estão orientadas

no mesmo sentido e este é oposto entre os dois hemi-sarcómeros.

FIGURA II

Representação esquemática da disposição das moléculas de miosina nos

filamentos grossos (segundo Best y Taylor)

Um corte transversal dos filamentos revela-nos que em cada filamento grosso as

cabeças se projectam formando 6 pontes transversais. Estas cabeças de miosina têm a

capacidade de unirem a sítios sensíveis da molécula de actina.

Nos filamentos grossos além de miosina existem outras proteínas: a proteína M e a

proteína C, a quem têm sido atribuídas, respectivamente, as funções de manter unidas as

moléculas de miosina a nível da linha M, e a de manter a posição relativa das moléculas de

miosina.

II - Actina. Tropomiosina e Troponina.

A molécula de actina apresenta-se sob a forma de duas fitas de actina F (fibrosa), que

é um polímero de actina globular (G) (6), que se enrolam uma na outra para constituírem um

filamento fino. Esta hé1ice tem um diâmetro de cerca de 6 nm. Associadas à actina existem as

Page 17: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

10

proteínas reguladoras, a tropomiosina e a troponina. A tropomiosina é uma molécula

comprida com cerca de 40 nm. de comprimento e dispõe-se ao longo da actina. Cada

molécula de tropomiosina está em contacto com uma única fita de actina F Fig. III). Cada

molécula de tropomiosina estende-se ao longo de sete monómeros G. A outra proteína

reguladora importante presente nos filamentos finos a troponina.

FIGURA III

Disposição das moléculas de tropomiosina e troponina nos filamentos finos e sua

relação com as cabeças de miosina.

Nesta molécula existem 3 subunidade: T, C e I. A subunidade T fixa-se à

tropomiosina, a C tem a capacidade de fixar cálcio e a I (inibidora tem a capacidade de inibir

a interacção entre a actina e a miosina. A subunidade C quando fixa cálcio modifica a

conformação da molécula de troponina. Esta modificação leva a tropomiosina a "destapar" os

sítios de actina sensíveis a miosina.

III - Teoria do filamento deslizante (Huxley)

Os filamentos finos e grossos dispõem-se regularmente no sarcómero (Fig. IV). As

faixas I têm apenas actina, as A actina e miosina, e as H apenas miosina. O tamanho da faixa I

c H varia com o comprimento do sarcómero, enquanto a faixa A se mantém inalterada. Assim,

para os maiores afastamentos das linhas Z observam-se os maiores tamanhos da faixa I,

enquanto que para os menores as faixas I quase desaparecem. A contracção do músculo dá-se

em cada sarcómero pela aproximação das linhas Z, o que acontece por deslizamento dos

Page 18: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

PROTEÍNAS CONTRÁCTEIS

Actas Bioq. 1989: 1:7-15

11

filamentos finos sobre os filamentos grossos. Huxley sintetizou o processo numa teoria,

conhecida actualmente por teoria do filamento deslizante de Huxley (7). Segundo esta, o

músculo contrai-se porque a miosina se une e separa ciclicamente a sítios sensíveis da actina

puxando-os para o centro do sarcómero e aproximando as duas linhas Z. O modo como

decorre este processo está esquematizado na Figura V. Nesta, vemos (à esquerda em cima)

um filamento fino de actina e uma ponte de miosina leve. Nesta situação o músculo está

relaxado. Quando se dá a excitação do músculo liberta-se cálcio, o qual se une à subunidade C

da troponina. As modificações de conformação subsequentes levam a tropomiosina a

"destapar" os sítios sensíveis da actina. Nestas condições, a cabeça de miosina projecta-se e

prende-se ao sítio sensível da actina (à esquerda em baixo e à direita em cima). Segue-se uma

rotação da cabeça de miosina (à direita em baixo) a qual "puxa" o filamento fino no sentido

indicado pela seta. Após esse movimento a cabeça de miosina separa-se da actina. A cabeça

de miosina retoma a sua orientação primitiva e "encaixa" noutro sitio sensível da actina. O

processo repete-se sucessivamente e o filamento fino, num movimento análogo ao verificado

numa cremalheira, aproxima-se do centro do sarcómero. Em cada ligação e rotura da miosina

e da actina há gasto de energia sob a forma de ATP. Todas as cabeças de miosina de um

hemi-sarcómero (Figura II) puxam o filamento fino para o centro do sarcómero. As cabeças

da miosina do hemi-sarcómero esquerdo puxam os filamentos finos da esquerda para a direita

e as do hemi-sarcómero da direita para a esquerda. Há assim aproximação das linhas Z e um

encurtamento do sarcómero. Tem sido proposta uma pequena modificação desta teoria: além

do movimento de rotação da cabeça de miosina, existiria um deslizamento de uma metade da

cabeça globular sobre a outra metade, o que aumentaria a eficácia do movimento de rotação.

FIGURA IV

Diagrama da disposição dos filamentos finos e grossos no sarcómero e da

sua contribuição para a constituição das faixas I, A e H.

Page 19: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

12

FIGURA V

Esquema de dois mecanismos possíveis para a produção do movimento de deslizamento dos

filamentos de actina sobre os de miosina (segundo Huxley)

A teoria do filamento deslizante, hoje bastante difundida, deve, apesar de tudo, ser

encarada de forma crítica. Ela sugere que para a contracção e fundamental a disposição

especial relativa da actina e miosina. Experiências realizadas por Oplatka e col. parecem

indicar que essa relação aumenta a eficácia e o rendimento da contracção, mas não é essencial

para ela se processar (8).

Oplatka e col. removeram o citoplasma de células musculares expondo-as a uma

solução de glicerol a 50%. Estas fibras continham apenas proteínas estruturais e contrácteis.

Esta preparação contrai-se na presença de ATP. Em seguida extraíram a miosina. As fibras

não apresentavam filamentos grossos e não se contraíam. Estes investigadores incubaram em

seguida estas células num meio contendo meromiosina pesada. O músculo continuava a não

apresentar filamentos grossos, mas recuperava a capacidade de se contrair com força superior

a 1/3 da força de contracção da fibra íntegra. A estrutura filamentosa parece, segundo estes

resultados, não ser indispensável à contracção, embora aumente a sua eficácia.

IV - Proteínas contrácteis no músculo liso

No músculo liso podem ser encontradas miosina, actina, tropomiosina, mas não tem

sido identificada troponina (9).

A miosina é semelhante à encontrada no músculo esquelético, verificando-se

diferenças apenas a nível das cadeias leves. Apresenta actividade ATPásica a nível da cabeça

globular. A actina é muito semelhante à encontrada no músculo esquelético e no músculo

cardíaco, o mesmo acontecendo à tropomiosina.

Page 20: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

PROTEÍNAS CONTRÁCTEIS

Actas Bioq. 1989: 1:7-15

13

Não existindo troponina, a regulação da interacção actina/miosina é diferente no

músculo liso. Na verdade, a miosina só pode ser activada pela actina depois de sofrer uma

modificação (Figura VI). O enzima quinase das cadeias leves de miosina transfere um grupo

de fosfato do ATP para um resíduo de uma cadeia leve da miosina, transformando a miosina

em miosina activável por actina. A referida quinase, para manifestar a actividade necessita da

presença de cálcio e da proteína ligadora de cálcio - a calmodulina. A actividade ATPásica do

complexo actina/miosina do músculo liso é inferior à do músculo esquelético.

FIGURA VI

Diagrama da molécula de miosina ilustrando a fosforilação das cadeias leves de miosina

(segundo Adelstein).

SUMARY

The intracellular proteins are classified as structural, contractile and

regulatory. The two last ones are identified with those involved in muscle

contractility. Structures of myosin (with a particular reference to its ATPase

activity and molecular organization of thick filaments), actin tropomyosin

and troponin (with reference to organization of thin myofilaments) are

presented. Muscle contractility is a result of interaction of thin and thick

filaments (Huxley). Some experiments contradicting that theory are

refereed. Contractile proteins of smooth muscle are compared with those of

skeletal muscle. Emphasis is put on mechanism of regulation of the actin-

myosin interaction.

BIBLIOGRAFIA

(l) LEHNINGER, AL - Bioquimica. Ed. Omega, Barcelona 1981

Page 21: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

14

(2) MIHALJE, E e SZENT-GYORGJE, AG - Tripsin digestion of muscle proteins. I -

Ultracentrifugal analysis of the process - J. Biol. Chem. 201:189-198, 1953

(3) GERGELY, J; GOUVEA, MA e KARIBIAN, P Fragmentation of myosin by

chymotripsine - J. Biol. Chem. 212:165-177, 1955

(4) KOMINZ, DR; MITCHELL, ER; NIHEY, T e KAY, CM - The papain digestion of

skeletal myosin - Biochemistry 4:2373-2382, 1965

(5) ENGELHARDT, WA e LJUBIMOWA, MN - Myosin and adenosine-triphosphatase -

Nature 144:663-673, 1938

(6) HUXLEY, HE - The mechanism of muscular contraction - Science 164:1356-1365, 1969

(7) HUXLEY, HE e HANSON, J - The molecular basis of contraction in cross-striated

muscles. In: The structure and function of muscle. Ed. G.H. BOURNE, New York:

Academic Press, 1960, Vol. I, Cap. 7 Pg. 183-227

(8) OPLATKA, A; GADASI, H e BORELFO, J - The contraction of "ghost" myofibriles and

glycerinated muscle fibers irrigated with heavy meromyosine sub-fragment I - Biochem.

Biophys. Res. Commun. 58: 905-909, 1974

(9) ADELSTEIN, RS - Biochemical mechanism of contractility. In: Hypertension;

Physiopathology and treatment. Cap. 34. Ed. Genest, Kuchel, Hamet e Cantin. 24 Edição,

Mc Graw-Hill Book Co.

Page 22: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:15-25 15

CALMODULINA E ATP-ase DO CÁLCIO

Carlota Saldanha

Instituto de Bioquímica da Faculdade de Medicina de Lisboa

RESUMO

O processo de contracção do músculo esquelético inicia-se com a libertação de cálcio

existente no retículo sarcoplásmico despolarizado, após excitação nervosa. Os iões

cálcio ligam-se à troponina C e as alterações conformacionais ocorridas no complexo

resultante transmitem-se às moléculas de tropomiosina e actina, possibilitando a

interacção actina-miosina conducente à contracção muscular. O relaxamento muscular

ocorre por repolarização da membrana do retículo sarcoplásmico, acompanhada de

influxo de Ca2+

mediado pela bomba de Ca2+

(actividade ATPase). A calmodulina

(CaM) é uma proteína receptora de Ca2+

para o qual possui alta afinidade (Kd 10-6

M) e

especificidade, que intervém na contracção e relaxamento musculares de modos directo

e indirecto, respectivamente. O primeiro processo refere-se à interacção miosina-actina,

que é facilitada pela fosforilação das cadeias leves de miosina na presença da proteína-

cinase (da cadeia leve da miosina) dependente de Ca2+

e calmodulina. A fosforilação da

cadeia leve da miosina (extremidade globular) induz alterações conformacionais nesta

("cabeça"), favoráveis à ligação com a actina. A acção indirecta da calmodulina

manifesta-se pela calsequestrina (proteína da membrana interna do retículo

sarcoplásmico) que apresenta propriedades de proteína-cinase dependente da

calmodulina, e está envolvida na regulação da actividade enzimática da ATPase

Ca2+

Mg2+

. As alterações conformacionais existentes na ATPase Ca2+

Mg2+

(que ocorrem

na interconversão da enzima entre dois estados) e nas proteínas tropomiosina e actina,

estão associadas às funções biológicas de relaxamento e contracção musculares.

Palavras-chave: Conformação proteica, calmodulina, calsequestrina, ATPase Ca2+

Mg2+

,

fosforilação

Page 23: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

CALMODULINA E ATPase DO CÁLCIO

Actas Bioq. 1989; 1:15-25

16

ABERTURA DOS CANAIS DE CÁLCIO POR ESTIMULAÇÃO NERVOSA

A propagação do impulso nervoso na placa motora induz despolarização na membrana

externa da fibra muscular. A passagem do potencial de acção resultante para o interior da fibra

muscular é mediada pelos túbulos T que transmitem um sinal A cisterna terminal, com

consequente abertura dos canais de Ca e saída do ião para o espaço mioplásmico (ou

sarcoplasma). Eizenberg (1) confirmou o mecanismo molecular explicativo da natureza do sinal

proposto por Fransini-Armstrong e Nunzi (2) e Shneider e Chandler (3), que consiste na indução

de alterações conformacionais numa enzima localizada na cisterna terminal com prolongamento

pelo túbulo T, (proteína juncional) pelos factores variação do potencial de membrana e

movimento de carga ocorrentes na membrana do túbulo T (Fig. 1). O produto resultante da acção

catalítica da enzima é um efector actuante nos canais de saída de cálcio, situados na cisterna

terminal.

FIGURA 1

a) Esquema estrutural de junções intracelulares constituídas entre regiões de cisterna terminal do

retículo sarcoplásmico que ladeiam um túbulo transverso T no músculo esquelético. b)

Ampliação de uma junção celular: aquando da despolarização do túbulo transverso T ocorrem

alterações conformacionais nos receptores localizados na membrana deste as quais são

transmitidas à proteína funcional com subsequente abertura dos canais de cálcio.

Outros mecanismos têm sido sugeridos, baseados no aumento da concentração de

Ca2+

citoplásmico como indutor da abertura dos canais (4).

ACÇÃO BIOLÓGICA DO Ca2+

INTRACELULAR

O aumento da concentração, de cálcio no sarcoplasma esta associado A contracção

muscular por estimulação de processes sequenciais, que envolvem (i) interacções do ião cálcio

com moléculas de troponina C com consequente alteração conformacional desta proteína, (ii)

Page 24: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SALDANHA C.

17

que é transmitida às moléculas de tropomiosina e actina, (iii) facilitando a posterior ligação à

actina da molécula de miosina (com actividade ATPásica), e inicio de contracção muscular (Fig.

2).

Segue-se o relaxamento muscular, por repolarização da membrana do retículo

sarcoplásmico e reposição dos níveis de Ca2+

no interior da cisterna terminal, à custa de um

processo activo mediado pela bomba de cálcio do retículo sarcoplásmico (caracterizado por

actividade ATPásica). Adicionalmente, a calsequestrina localizada na membrana externa do

lúmen da cisterna terminal contribui para a manutenção dos níveis normais de cálcio dentro do

retículo sarcoplásmico.

FIGURA 2

O processo de contracção do músculo esquelético induzido por estimulação nervosa

consiste no movimento dos filamentos finos (I) e grossos (A) resultante da ocorrência de

alterações conformacionais das proteínas (miosina, actina, tropomiosina e troponina) induzidas

pelo ião cálcio.

O processo bioquímico de contracção/relaxamento musculares requer a participação do

ião cálcio nas etapas de transporte passivo (canais de Ca2+

) e activo (ATPase Ca2+

) e da

interacção com as proteínas troponina e calsequestrina.

O ião cálcio intracelular ocorre em baixas concentrações (10-7

M a 10-8

M) e apresenta

propriedades atómicas (raio iónico e número de coordenação) que contribuem para o exercício

da função biológica de segundo mensageiro com características de universal, mercurial,

sincrónico e cominatório (5).

A concentração de cálcio intracelular pode ser alterada em alguns tecidos por um

processo dependente da renovação metabó1ica dos fosfoacilinositois, que são desdobrados pela

Page 25: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

CALMODULINA E ATPase DO CÁLCIO

Actas Bioq. 1989; 1:15-25

18

acção da fosfolipase C em inositol trifosfato (IP3) e diacilglicerol (DG) (6). O IP3 induz a

mobilização do Ca2+

dos organelos intracelulares para o citoplasma e estimula as proteínas-

cinases dependentes da calmodulina; o diacilglicerol activa a proteína-cinase C (6). Assim, as

proteínas cinases activadas intervêm em reacções de fosforilação de proteínas intracelulares que

consequentemente participam nos processes conducentes à resposta celular - imediata

(dependente de IP3) e/ou sustida (dependente do DG) - ao estímulo inicial.

O grau de fosforilação das cadeias leves de miosina aumenta proporcionalmente à

frequência de contracção do músculo esquelético (7). No entanto, há discordância quanto ao

envolvimento do inositol-trifosfato na regulação da contracção do músculo esquelético (8, 9, 10).

Meyer (11) sugeriu que o ião cálcio, para exercer a acção de segundo mensageiro,

necessita da presença de proteínas ligantes. A primeira calciproteína a ser descoberta foi a

troponina C (12), seguida da calmodulina, cuja origem e composição da palavra estão ligadas a

Sheung e Kakinchi (13).

CARACTERIZAÇÃO DA MOLÉCULA DE CALMODULINA

A calmodulina (CaM) regula a concentração intracelular do cálcio em vários tecidos e

medeia múltiplas funções do ião actuando em enzimas-chave de sistemas de transporte e

sequências metabó1icas (proteína-cinases e fosfatases) (14-17). O Quadro 1 apresenta exemplos

de cé1ulas e/ou tecidos onde se localiza e actua a calmodulina (5, 16, 17).

QUADRO 1

EXEMPLOS DE ALGUNS PROCESSOS BIOLOGICOS MEDIADOS PELA

CALMODULINA

________________________________________________________________

LOCALIZAÇÃO PROCESSOS BIOLOGICOS

________________________________________________________________

Membranas pós-sinápticas Libertação de neurotransmissores

Espermatozóides Fertilização do óvulo

Células epiteliais do intestino Contractilidade muscular

Metabolismo do glicogénio

Fígado Metabolismo do glicogénio

Pâncreas Secreção da insulina

Coração, Cérebro Metabolismo dos nucleótidos

Cromossomas Mitose-polimerização e despolimerização dos

microtúbulos

________________________________________________________________

A calmodulina apresenta características acídias, estrutura terciária (18) com quatro locais

de ligação ao cálcio (19), cujo preenchimento pode ser parcial e/ou total (5) (Fig. 3).

Page 26: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SALDANHA C.

19

FIGURA 3

Representação esquemática do preenchimento dos quatro locais de ligação existentes na

molécula monomérica de calmodulina (CaM) pelos iões cálcio e consequentemente alteração

conformacional para a forma de monómero activo (Ca CaM).

Apesar do elevado número de estudos experimentais efectuados, para esclarecer o

processo de ligação cálcio/calmodulina, mantêm-se a controvérsia entre dois modelos que

propõem a existência na molécula de calmodulina de quatro centros de ligação, com afinidade

semelhantes ou dois pares de centros com afinidade distinta.

Os resultados obtidos com ensaios microcalorimétricos (20) e de antagonismo Ca2+

/H+

(21) apontam a presença de quatro centros de ligação independentes na calmodulina, com

valores de constantes de afinidade semelhantes para o cálcio.

Pelo contrário, a interpretação dos dados obtidos com estudos de ressonância magnética

nuclear (22) e de cinética rápida (23), suporta o modelo de dois pares de locais de ligação

orientados nas extremidades amina e carboxilo que apresentam relativamente ao cálcio valores

distintos de constantes de afinidade.

A calmodulina tem outros seis centros de ligação passíveis de serem ocupados por outro

ião que eventualmente module a ligação Ca2+

/calmodulina (24).

A ligação do ião à calmodulina induz nesta alterações conformacionais traduzidas pelo

aumento do conteúdo da estrutura , hé1ice e maior exposição à superfície de segmentos

hidrofóbicos, os quais constituem zonas de ligação a proteínas-alvo (5). Contudo, estas são

activadas pela calmodulina se, pelo menos, três centros de ligação estiverem ocupados pelo ião

cálcio (24).

A ligação entre o complexo Ca2+

calmodulina e as enzimas-alvo pode ser inibida por uma

variedade de compostos exógenos de natureza hidrofóbica (fenotiazinas (25),

naftalenosulfonamidas (26), antagonistas do cálcio (27) e macromoléculas endógenas (proteínas

de baixo peso molecular (28) e polipéptidos (29).

As proteínas-alvo que são activadas pela calmodulina não apresentam domínios

específicos comuns para a ligação; podem ser classificados com base nos locais de ligação

existentes na molécula de calmodulina que intervém no processo (30). Assim, existem três

classes consoante são activadas (i) pelo fragmento C-terminal e pelo complexo CAPP-

Page 27: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

CALMODULINA E ATPase DO CÁLCIO

Actas Bioq. 1989; 1:15-25

20

calmodulina (calmodulina covalentemente ligada a um derivado de fenotiazina), (ii) pelo

complexo CAPP-calmodulina e interacção sem activação pela extremidade C-terminal, (iii) por

ligação a dois locais que não são os referidos (30).

A utilização de efectores em estudos experimentais contribui para o conhecimento do

mecanismo molecular de contracção muscular, em geral, e em particular da acção exercida pela

molécula de calmodulina.

Até à data, no que respeita aos túbulos T do músculo esquelético, não foi identificada

nenhuma proteína de características semelhantes à calmodulina em associação com o canal de

cálcio. Hidalge e colaboradores (31) isolaram e caracterizaram a partir de preparações de túbulos

T de músculo esquelético de coelho uma proteína que apresenta propriedades similares às

reveladas pela Ca2+

-Mg2+

-ATPase associada à bomba de cálcio, isto é, estimulada e inibida,

respectivamente, pela calmodulina e ortovanadato.

Meissner (32) e Plank e col (33) demonstraram in vitro que adições de calmodulina

exógena a preparações de vesículas da cisterna terminal do túbulo T regulam a libertação de

cálcio pelos canais de cálcio. Assim, Meissner (32) sugere que a repressão de saída de cálcio

exercida pela calmodulina impede a remoção total do ião do espaço mioplásmico durante a

actividade muscular prolongada.

No entanto não é controverso que a nível de cadeia leve de miosina (MLC)1

a

fosforilação que ocorre na zona designada por "cabeça", depende da presença do complexo Ca-

calmodulina (Ca-CaM) (Fig. 4). A ligação entre a cinase de cadeia leve da miosina (MLCK)1

(proteína-alvo) e o complexo Ca-CaM conduz ao aparecimento de alterações conformacionais

nas moléculas de calmodulina e de MLCK (34) e o grupo de Tokunaga (35) localizou

recentemente na molécula de miosina a disposição tridimensional dos locais de ligação para as

moléculas de actina e ATP e Ca-CaM.

FIGURA 4

Esquema da fosforilação da cadeia leve da molécula de miosina (MLC) (zona globular A) que

apresenta actividade hidrolítica (ATPasica) e é Ca2+

e calmodulina (CaM) dependente.

1 Siglas de nomenclatura anglo saxónica

Page 28: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SALDANHA C.

21

CARACTERIZAÇÃO DA ENZIMA Ca2+

ATPase NO RETÍCULO SARCOPLÁSMICO

A membrana do músculo esquelético dos túbulos transversos não contêm Ca2+

ATPase

dependente de calmodulina (36). No que respeita à membrana do retículo sarcoplásmico (RS), os

resultados dos estudos efectuados com inibidores de calmodulina sugerem que a fosforilação da

ATPase Ca2+

não é influenciada directamente pela calmodulina (5). A actividade cinase da

calsequestrina, estimulada pela calmodulina, está envolvida na regulação da Ca2+

ATPase (acção

indirecta da calmodulina) (37). A ATPase Ca2+

do RS pode existir nas formas mono (PM

110.000) e dimérica, prevalecendo a ocorrência de dímeros na presença de agente quelante do

ião cálcio (38). A estrutura proposta para a enzima é descrita por um modelo sequencial que

consiste em três domínios que correspondem, nomeadamente, aos locais de fosforilação, ligação

ao cálcio e zona transmembrana (39, 40). Este modelo permite explicar o "ciclo" de reacções que

ocorrem na translocação do ião cálcio do sarcoplasma para o lúmen por cada mole de ATP

hidrolisado, (Fig. 5).

Figura 5

Esquema em "ciclo" da reacção hidrolítica catalisada pela enzima Ca2+

ATPase (40; 41). A

ligação do ião Ca2+

à enzima (E), facilita a ocorrência de fosforilação pelo ATP da enzima (na

subcamada da membrana voltada para o citoplasma) (E1 P.Ca2+

). Subsequentemente a libertação

do ião cálcio no lúmen ocorre por conversão da enzima à forma E2 P.Ca2+

. Posteriormente há

hidrólise de fosfoenzima originando a forma E2 a que se segue isomerização para a forma E1.

No processo de transducção de energia, a enzima adopta dois estados conformacionais, El

e E2. O primeiro tem dois centros de alta afinidade para o ião cálcio, situados na face

citoplásmica da membrana do retículo sarcoplásmico, e o segundo apresenta dois locais de

menor afinidade situados no lúmen. A translocação do ião cálcio dos centros de maior para os de

menor afinidade ocorre em simultâneo com os processes de fosforilação e alteração

conformacional, que são acompanhados por movimentos estruturais no domínio de ligação ao

cálcio (rotação nas hé1ices) (42). A cedência do ião cálcio pela forma E2 é rápida e favorecida

pela presença dos iões amónio.

O proteolípido acídico, fosfolambano, existe na membrana do retículo sarcoplásmico em

igual proporção estequiométrica à da Ca2+

ATPase e é um efector da enzima (43). A forma

Page 29: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

CALMODULINA E ATPase DO CÁLCIO

Actas Bioq. 1989; 1:15-25

22

fosforilada do fosfolambano induz alterações conformacionais na enzima, activa a hidrólise do

ATP e a translocação do ião cálcio a ela associado (44).

A diminuição de concentração do ião cálcio no sarcoplasma, resultante da acção da Ca2+

ATPase, induz a dissociação entre o ião e as moléculas de troponina C, ocasionando o

relaxamento. Assim, a energia na forma de ATP é necessária nos processos de contracção e

relaxamento muscular.

SUMMARY

Releasing of calcium ions from the sarcoplasmic reticulum after nervous

stimulation initiates the process of skeletal muscle contraction. Calcium ions

bind to troponin C and conformational alterations occur in the resulting

complexes that are transmitted to tropomyosin and actin molecules, leading to

muscle contraction. Relaxation occurs after repolarization of the sarcoplasmic

reticulum membrane, and is accompanied by calcium influx, which is mediated

by the calcium pump (ATPase activity). Calmodulin is a calcium binding

protein with great affinity (kd 10-6

M) and specificity. It is involved in muscle

contraction and relaxation respectively in a direct and indirect way. The former

process is related to myosin-action interaction, which is facilitated by myosin

light-chain phosphorilation in the presence of a calcium-dependent myosin

light chain protein kinase and calmodulin. Phosphorylation of myosin light

chain (globular extremity) induces conformational alterations on this "head",

which favour its binding to actin. The indirect action of calmodulin is

manifested by calsequestrin (a protein of the inner membrane of sarcoplasmic

reticulum), which presents calmodulin dependent protein kinase properties and

is involve in the regulation of Ca2+

Mg2+ ATP enzymatic activity. The

conformational alterations in Ca2+

Mg2+

ATPase (occurring in the

interconversion between the two states of the enzyme) and in the proteins

tropomyosin and actin proteins are related to the biologic function of relaxation

and muscle contraction.

BIBLIOGRAFIA

1 - EISENBERG R.S. Membranes, calcium and coupling. Can. J. of Phys. and

Pharmacol.65:656-690,1987.

2 - FRANZINI-ARMSTRONG C. and NUNZI G. Junctional feet and particles in the triads of a

fast twitch muscle fibre. J. Muscle Res. Cell Motil. 4:233-252,1983.

3 - SCHNEIDER M.F. and CHANDLER W.K. Voltage dependent charge movement in

skeletal muscle: a possible step in excitation contraction coupling. Nature 242:244-

246,1973

4 - FABIATO A. Simulated calcium current can both cause calcium loading in a trigger

calcium release from the sarcoplasmic reticulum of a skinned canine cardiac Purkinje cell.

J. Gen. Physiol. 85:291-321,1985.

5·- STOCLET J.C., GERARD D., KILHOFFER M.C., LUGNIER C., MILLER R. and

SCHAEFFER P. Calmodulin and its role in intracellular calcium regulation. Prog. in

Neurob. 29:321-364,1987.

Page 30: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SALDANHA C.

23

6 - RASMUSSEN H. The calcium messenger system. N. Engl. J. of Medicine 314:1094-

1101,1986.

7 - BARSOTTI R.J. and BUTLER T.M. Chemical energy usage and myosin light chain

phosphorylation in nammalion skeletal muscle. J. Muscle Res. Cell Motil. 5:45-64,1984.

8 - NOSEK T.M:, WILLIAMS M.F., ZEIGLER S.T. and GODT R.E. Inositol triphosphate

enhances calcium release in skinned cardiac and skeletal muscle. Am. J. Phys. 250:C807-

C811,1986.

9 - TENNES K.A. and ROBERTS M.L. The role of calcium in agonist stimulated hydrolysis of

phosphatidylinositol in mouse pancreas. Biochim. Biophys. Acta 719:238-243,1982.

10 - WALKER J.W., SONLYO A.V., GOLDMAN Y.E., SONLYO A.P. and TRENTHAM

D.R. Kinetics of smooth and skeletal muscle activation by laser pulse photolysis of caged

inositol 1-4-5 triphosphate. Nature 327:249-252,1987.

11 - MEYER W.L., FISCHER E.H. and KREBS E.G. Activation of skeletal muscle

phosphorylase B kinase by calcium. Biochem. 3:1033-1039,1964.

12 - EBASHI S., ENDO M. and OKTSUKI. Control of muscle contration. Qt. Res. Biophys.

2:351-384,1969.

13 - APPLEMAN M.M., RALL T.W. and DEDMAN Y.R, The discovery of calmodulim - An

historical perspective. Dedicated to the memory of Shiro Kakiuchi (1929-1984) a quit

leader in calcium research. J. Cyclic Nucleot Prot. Phosph Res. 10:417-421,1985.

14 - CARAFOLI E . Calmodulim in the membrane transport of Ca2+

. Cell Calcium 2:353-

363,1981.

15 - BILLINGSLEY M.L., VELLETRI P.A., ROTH R.H. and DELORENZO R.Y.

Carboxymethylation of calmodulim inhibis calmodulim-dependent phosphorylation in rat

membranes and cytosol. J. Biol. Chem. 258:5352-5357,1983'

16 - BROSTROM C.O. and WOLF D. Properties and function of calmodulim. Biochem. Pharm.

3O:1395-14O5,1981.

17 - MEANS; A.R. and DEDMAN Y.R. Calmodulin-an intracellular calcium receptor. Nature

285:73-77,1980.

18 - CHEUNG W.Y. Cyclic 3'5' nucleotide phosphodiesterase. Evidence and properties of a

protein activator. J. Biol. Chem. 246:2859-2869,1971

19 - LIU Y.M., LIU Y.P. and CHEUNG W.Y. Cyclic 3'5' nucleotide phosphodiesterase.

Purification characterization and active form of the protein activator from bovine brain. J.

Biol. Chem. 249:4943-4954,1971.

20 - BURGER D., COX J.A., COMTE M. and STEIN E.A. Sequential conformational changes

in calmodulim upon binding of calcium. Biochem. 23:1966-1971,1984.

21 - HAIECH J., KLEE C.B. and DEMAILLE J.G. Effects of cations on affinity of calmodulin

for calcium: ordered binding of calcium ions allows the specific activation of calmodulin -

stimulated enzymes. Biochem. 20:3890-3898,1981.

22 - ANDERSON DRAKENBERG T., FORSEN S. and TRULIN E. Characterization of the

Ca2+

binding sites of calmodulin from bovine testis using 43

Ca and 113

Cd NMR. Eur.

Biochem. 126:501-505,1982.

23 - MARTIN S.R, TELEMAN A.A., BAYLER P.M., DRAKENBERG T. and FORSEN S.

Kinetics of calcium dissociation from calmodulin and its tryptic fragments. A stopped flow

fluorescence study using quin 2 reveals a two domain structure. Eur. J. Biochem.151:543-

550,1985.

Page 31: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

CALMODULINA E ATPase DO CÁLCIO

Actas Bioq. 1989; 1:15-25

24

24 - COX J.A. Review Article. Interactive properties of calmodulin. Biochem. J. 249:621-

629,1988.

25 - WEISS B., PROZIALECK W.C. and WALLACE T.L. Interaction of drugs with

calmodulin. Biochemical pharmacological and clinical implications. Biochem. Pharmac.

31:2217-2226,1982.

26 - HIDAKA H., YAMAKI T., TOTSUKA, T. and ASANO M. Selective inhibition of Ca2+

binding modulator of phosphodiesterase produce vascular relaxation and inhibit actin-

miosin. Molec. Pharmac. 15:49-59,1979.

27 - LUGNIER C., FOLLENIUS A., GERARD D. and STOCLET J.C. Bepridil and flunarizine

as calmodulin inhibitors. Eur. J. Pharmac. 98:157-158,1984.

28 - YANG S.D., TALLANT E.A. and CHEUNG W.P. Calcineurin is a calmodulin dependent

protein phosphatase. Biochem. Biophys. Res. Commun. 106:1419-1425,1982.

29 - SELLINGER-BARNETTE M. and WEISS B. Interactions of endorphin and other opioid

peptides with calmodulin. Molec. Pharmac. 21:86-91,1982.

30 - KLEE C.B., NEWTON D.L., NI W.C. and HAIECH Y. Regulation of the calcium signal by

calmodulin. In Calcium and the Cell. Willey Chichester (ed) (Ciba Foundation Symposium

122), 1986 p 16P-170.

31 - HIDALGO C., GONZALEZ M.E. and GARCIA A.M. Calcium transport in transverse

tubules isolated from rabbit skeletal muscle. Biochem. Biophys. Acta 854:279-286,1986.

32 - MEISSNER G. Evidence of a role for calmodulin in the regulation of calcium release from

skeletal muscle sarcoplasmic reticulum. Biochemistry 25:244-251, 1986.

33 - PLANK B., WYSKOUSKY W., HOHENEGGER M., HELLMANN G. and SUKO J.

Inhibition of calcium release from skeletal muscle sarcoplasmic reticulum by calmodulin.

Biochim. Biophys. Acta 938:79-88,1988.

34 KLEVIT R.E., BLUMENTHAL D.K., WEMMER D.E. and KREBS E.G. Interaction of

calmodulin and a calmodulin binding peptide from myosin light chain kinase. Major

spectral changes in both occur as the result of complex formation. Biochemistry 24:8152-

8157,1985.

35 - TOKUNAGA M., SELTOH K., TOYOSIHMA C. and WAKABAYASHI T. Location of

the ATPase site of myosin determined by three dimensional electron microscopy. Nature

329:635-639,1987.

36 - MICHALAK M., FAMULSKI K. and CARAFOLI E. The Ca2+

pumping ATPase in

skeletal muscle sarcolema calmodulin dependence regulation by CAMP-dependent

phosphorylation and purification. J. Biol. Chem. 259:15540-15542,1984.

37 - HORL W.H. and HEILMEYER L.M.G. Evidence for the participation of Ca2+

- dependent

protein quinase and protein phosphatase in the regulation of the Ca2+

transport ATPase of

the sarcoplasmic reticulum. 2 - Effect of phosphorylase kinase and phosphorylase

phosphatase. Biochemistry 17:766-772,1978.

38 - DUX L.,TAYLOR K.A., PINIG TING-BEAEL H. and MARTONOSI A. Crystallization of

the Ca2+

ATPase of sarcoplasmic reticulum by calcium and lanthanid ions. J. Biol. Chem.

260:11730-11745,1985. 2+

39 - COLL T.Y: and MURPHY A.Y. Inhibition of the sarcoplasmic reticulum Ca2+

- ATPase by

reactive red 120. Biochim Biophys Acta 904:227-238,1987.

40 - GREEN N.M. , TAYLOR W., BRANDL C., KARCZAK B. and MACLENNAN D.H.

Structural and mechanistic implications of the amino acid sequence of calcium transporting

Page 32: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SALDANHA C.

25

ATPase. In Calcium and the Cell, Willey Chichester (ed) (Ciba Foundation Symposium

122), 1986 p 93-114.

41 - WAKABAYASHI S. and SLIGEKAWA M. Effect of metal bound to the substrate site on

calcium release from the phosphoenzime intermediate of sarcoplasmic reticulum ATPase. J.

Biol Chem. 262:11524-11531,1987.

42 - BRANDL C- GREEN N.M., KORAZAK B. and MACLENNAN D.H. Two Ca2+

ATPase

genes: homologies and mechanistic implications of the deduced amino acid sequences. Cell

44:597-607,1986.

43 - LE PENCH C.J., HARIECH J. and DEMAILLE J.G. Concerted regulation of cardiac

sarcoplasmic reticulum calcium transport by cylic adenosine monophosphate dependent and

calcium calmodulin - dependent phosphorylations. Biochemistry 18:5150 -5157,1979.

44 - INUI M., CHANBERLAIN B.K., SAITO A. and FLEISCHER J. The nature of the

modulation of Ca2+

transport as studied by reconstrituion of cardiac sarcoplasmic calcium.

J. Biol. Chem. 261:1794-1780,1986.

Page 33: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:27-44 27

ENERGÉTICA DO MÚSCULO ESQUELÉTICO

J. Martins e Silva

Instituto de Bioquímica, Faculdade de Medicina de Lisboa

SUMÁRIO

A contracção do músculo esquelético assenta num sistema de proteínas

filamentosas (particularmente, a actina e a miosina) que deslizam entre si em plano

paralelo. O processo ocorre na dependência de um mecanismo complexo, iniciado

por um impulso nervoso que, ao ser transmitido ao retículo sarcoplásmico, induz o

efluxo de iões cálcio para o sarcoplasma de cada célula muscular (miocito). Na

sequência, é desencadeado o ciclo de interacções da actina com a miosina que subjaz

à contracção muscular, o qual requer o consumo de energia química, por hidrólise do

ATP.

O ATP é indispensável à contracção e, também, ao relaxamento muscular. Os

níveis de ATP intracelular são assegurados, principalmente, pela oxidação completa

da glicose e ácidos gordos e também pelo que provém da fosfocreatina, a qual existe

nos miocitos em concentração cerca de cinco a seis vezes superior à daquele

nucleótido.

A contribuição relativa da glicólise e da fosforilação oxidativa na regeneração

do ATP varia com o tipo de fibras musculares. Enquanto a respiração celular

prevalece nas fibras vermelhas, de contracção mais lenta, a glicólise é fundamental

nas fibras brancas, de contracção rápida. A produção de ATP é controlada,

essencialmente, pelo estado energético celular, regulado pelo ATP e nucleótidos

derivados. Esta acção é exercida nas principais enzimas reguladoras das vias

metabólicas envolvidas no processo, com reflexo no consumo de oxigénio pelos

miocitos.

INTRODUÇÃO

Numa perspectiva global, poderá afirmar-se que qualquer tipo de músculo (esquelético,

liso e cardíaco) é um transdutor de energia química/potencial em energia cinética/mecânica

(Fig.1). Como tal, são indispensáveis vários componentes, em que se incluem os seguintes: (i)

sistema activador do processo, representado por estímulos emanados do sistema nervoso; (ii)

Estrutura com capacidade contráctil, constituída por fibras musculares, cada uma quais contém

Palavras-chave: ATP, fosfocreatina, oxidações metabólicas

Page 34: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

28

feixes de miofibrilhas com capacidade contráctil e capacidade de recuperação do estado original

(relaxamento muscular); (iii) Sistema fornecedor de energia química; (iv) Sistema regulador da

actividade muscular (força, rapidez e duração).

FIGURA 1

Factores intervenientes na transdução energética da actividade contráctil do músculo

esquelético.

Atendendo a que o desenvolvimento das alíneas (i), (ii), e (iv) faz parte das lições de outros

prelectores deste Curso, os respectivos temas serão aqui referidos muito resumidamente, como

base para se analisar o assunto central do presente trabalho (iii). Esta abordagem será circunscrita

ao músculo esquelético, ainda que os restantes tipos de músculo existentes no homem e restantes

vertebrados se lhe assemelhem, em parte, no aspecto estrutural e funcional.

ESTRUTURA E ACTIVIDADE CONTRÁCTIL

O conjunto de músculos esqueléticos do organismo humano perfaz cerca de 40% do peso

corporal. Cada músculo esquelético é constituído por inúmeras células multinucleadas,

fusiformes e longas (miocitos ou fibras musculares), em grande parte extensivas a todo o

comprimento do músculo e revestidas por uma membrana plasmática (sarcolema). Esta

membrana, electricamente excitável, apresenta na face interna minúsculos recortes, através das

quais são transportados (por pinocitose) nutrientes para as fibras musculares. Exceptuando cerca

de 2% das fibras, cada uma das restantes é inervada somente por uma extremidade nervosa que

entra em contacto (formando a placa motriz) sensivelmente ao meio de cada fibra (1,2).

Cada fibra contém um feixe de numerosos (centenas ou milhares) filamentos

(miofibrilhas), com cerca de 1000 nm de diâmetro, dispostos paralelamente ao eixo longitudinal

do músculo e envolvidos pelo citoplasma (designado por sarcoplasma). Este meio intracelular é

rico em glicogénio, fosfocreatina, ATP, enzimas glicolíticas, triacilglicerois, mioglobina,

mioalbumina, iões (em particular magnésio, fosfato e potássio), entre outras substâncias com

acção metabólica. Além de ter muitos núcleos, o músculo esquelético possui também número

muito abundante de mitocôndrias (dispostas entre e paralelamente às miofibrilhas), um aparelho

de Golgi e um retículo endoplásmico com funções mais específicas, designado por retículo

Energia potencial

(energia química)

MÚSCULO ESQUELÉTICO

Energia cinética

(energia mecânica)

Fornecedor Operador Regulador

Page 35: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA MUSCULAR

Actas Bioq. 1989; 1:27-44

29

sarcoplásmico (3, 4). Esta formação é constituída por um sistema de túbulos fechados, disposto

ao longo do sarcoplasma de modo a envolver as proteínas contrácteis de cada miofibrilha, com

dilatações terminais (cisternas) a intervalos regulares, próximas das extremidades de cada

sarcómero (5).

As miofibrilhas incluem dois tipos de filamentos, espessos (cerca de 1500, cada um

com16 nm de diâmetro) e finos (cerca de 3000, com 6nm de diâmetro aproximado), constituídos

por centenas de moléculas. Estes filamentos, também dispostos longitudinalmente e alinhados

entre, si em paralelo, contêm as principais proteínas musculares com função contráctil ou

reguladora da contracção; os filamentos espessos são constituídos, principalmente, pela miosina,

enquanto nos filamentos finos sobressaem a actina, a tropomiosina e a troponina (Fig.2).

FIGURA 2

Constituição estrutural e molecular de uma fibra de músculo esquelético.

A miosina (do tipo II) é uma das proteínas motoras dependentes do ATP (nucleótido

adenosinotrifosfato), com actividade enzimática própria das fosfatases, neste caso, as ATPases

(6); perfaz cerca de 60-70% das proteínas musculares, enquanto a actina participa com cerca de

20-25% do total proteico muscular. Na forma estável, in vitro, a actina apresenta-se como

monómero (forma G), polimerizando (forma F) em meio salino e de catiões bivalentes, em

particular. O ATP, associado à actina como grupo funcional, é essencial para a polimerização da

actina (7).

A actina (na forma F, polimerizada), a miosina e a tropomiosina estão presentes em todos

os músculos e estruturas equivalentes, enquanto a troponina é restrita aos músculos esqueléticos.

A troponina é constituída, na realidade por um complexo de três polipéptidos: troponina T (liga-

se à tropomiosina), troponina I (inibe a interacção entre actina e miosina e a actividade da

enzima ATPase) e troponina C (cada molécula fixa quatro catiões Ca2+

).

As fibras estão alinhadas entre si em paralelo e no sentido longitudinal. O elevado nível de

organização estrutural destes filamentos confere a cada fibra (do músculo esquelético e também

do cardíaco) um aspecto estriado, de zonas alternadamente escuras e claras no sentido

longitudinal (devido a cada fibra conter muitas miofibrilhas) e transversal (pela variação regular

do conteúdo de cada miofibrilha). Por observação ultramicroscópica e luz polarizada das

Fibras (miocitos)

Miofibrilhas

Filamentos Espessos:

Miosina

Filamentos Finos: Actina (G e F) Tropomiosina Troponina (T, I, C)

Page 36: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

30

miofibrilhas foi verificado que as zonas mais escuras (anisotrópicas) representam as bandas A,

enquanto as zonas claras adjacentes (designadas por bandas I) são isotrópicas (isto é, não são

alteradas pela luz polarizada) (8). Deste modo, cada banda escura está ladeada por duas bandas

mais claras, seccionadas a meio por uma linha muito densa e escura, constituída por matéria

amorfa (linha Z) onde, através das moléculas proteicas da α-actinina, está ligada a actina. As

linhas Z delimitam, a intervalos regulares ao longo das miofibrilhas, segmentos contíguos com

cerca de 2000- 2200 nm de extensão no músculo em repouso, com estrutura e composição

idênticas (sarcómeros), cada um dos quais equivale a uma unidade funcional do músculo (9). No

centro de cada banda A existe uma zona mais clara, designada por zona H.(Fig3).

FIGURA 3

Representação da constituição de um sarcómero e estrutura de uma miofibrilha. Os

filamentos horizontais e paralelos mais finos no interior do sarcómero representam

filamentos de actina F. Os mais espessos, centrais, indicam os filamentos de miosina.

Os sarcómeros são envolvidos por uma membrana intracelular excitável (sistema tubular

T). Este sistema, originado por invaginação do sarcolema, é constituído por um conjunto de

túbulos transversos (de que deriva a designação T) localizada sobretudo junto da linha Z e, por

vezes também, nas proximidades das junções A-I; nestes pontos, o sistema T contacta com as

cisternas do retículo sarcoplásmico, embora permanecendo separados por sarcoplasma; é através

do sistema T que a despolarização eléctrica, iniciada por impulso nervoso, desencadeia a

contracção voluntária (no músculo esquelético) e involuntária (nos músculo liso e cardíaco).

A presença ou ausência de anisotropia depende do tipo (propriedades intrínsecas) de

filamentos existentes em cada banda. Enquanto os filamentos espessos estão localizados na

banda A, os mais finos existem na banda I de cada sarcómero (10). Por conseguinte, as bandas H

e I contêm somente filamentos espessos (miosina) ou finos (actina), respectivamente, enquanto a

banda A possui ambos os tipos (11).

Por observação ultramicroscópica de uma fibra muscular em corte transversal, verifica-se

que cada filamento espesso está como que rodeado por seis filamentos finos, ao passo que cada

Sarcómero (anterior) Sarcómero observado Sarcómero (seguinte)

Linha Z

Banda I Banda A

Zona H

Banda I

Linha Z

Page 37: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA MUSCULAR

Actas Bioq. 1989; 1:27-44

31

um destes fica envolvido por três filamentos espessos. A actina e a miosina apresentam

direccionalidade oposta; enquanto a actina está orientada da linha Z para o centro do sarcómero,

a miosina parte do centro para a periferia; desta disposição resulta que a parte mais interna dos

filamentos de actina intercala-se, simetricamente, com o segmento externo (extremidade S1) dos

filamentos de miosina (excepto na zona H). A zona central do sarcómero (H) contém somente os

segmentos de meromiosina sem a extremidade globular, dirigidos para a periferia do sarcómero,

ao encontro dos centros onde se une à actina. Por via desta interacção (12), ambos os tipos de

filamentos podem ligar-se entre si, do que resulta o encurtamento dos sarcómeros durante a

contracção muscular, sucedendo o inverso no período de relaxamento, com a dissociação dos

pontos de ligação (Fig.4).

FIGURA 4

Modelo de contracção e relaxamento muscular por “deslizamento dos filamentos”. A

contracção do músculo esquelético origina a diminuição de cada sarcómero no

sentido do eixo longitudinal (conversão de A em B). Este encurtamento resulta da

deslocação dos filamentos de miosina ao longo dos filamentos de actina adjacentes,

que são puxados até à zona H através das pontes de interacção estabelecidas entre

ambos. No relaxamento muscular sucede o oposto, pelo que aumenta o comprimento

dos sarcómeros à medida que os filamentos de actina se dissociam da miosina.

No decurso destas fases, o comprimento dos filamentos (finos e espesso) mantém-se

inalterável à custa do encurtamento das zonas H e I durante a contracção e ao seu aumento no

Contracção

(A)

(B)

Relaxamento

Page 38: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

32

relaxamento. De acordo com o modelo estabelecido para a contracção muscular (13-15), cada

uma das pontes cruzadas formadas entre os filamentos de miosina e actina resultam da união

transitória da extremidade livre flexível (cabeça) de cada filamento de miosina a centros de união

(intervalados entre si cerca de14 nm) dos filamentos de actina adjacentes. Esta disposição foi

visualizada por microscopia electrónica (16); à medida que a contracção prossegue, os

filamentos de miosina deslizam ao longo dos filamentos de actina adjacentes, onde se fixam, de

um ponto de união para o seguinte mais distante (a intervalos aproximados de 14 nm),

provocando o encurtamento de cada sarcómero (entre 2200e 1600 nm) e a subsequente

contracção de todo o músculo. Durante a contracção, altera-se o ângulo da cabeça da miosina

unida à actina (17). Por conseguinte, a contracção muscular resulta da fixação e destacamento

cíclicos da cabeça (segmento S-1) de cada filamento de miosina, relativamente aos seus pontos

de união nos filamentos de actina adjacentes (Fig.5). A tensão muscular gerada e mantida

durante a contracção (tensão activa) é proporcional à sobreposição de filamentos e ao total de

pontes formadas entre filamentos de miosina e actina. Por conseguinte, quanto maior for o

número de pontes, maior será a força de contracção.

FIGURA 5

Representação esquemática da interacção cíclica de filamentos de miosina com os de

actina. A contracção do músculo esquelético resulta da interacção dos filamentos de

miosina com as de actina que lhe estão adjacentes. A união da miosina com a actina

requer o dispêndio de ATP, hidrolisado pela ATPase existente nas duas extremidades

globulares (S1) de cada filamento de miosina. A força da contracção faz rodar a

cabeça da miosina, relativamente ao filamento fino, de modo a fixá-la num dos

pontos de união da actina (de a a g), puxando-a no espaço de interdigitação. Segue-se

o destacamento do subfragmento S1 do local onde se uniu com a actina, mediante a

utilização de uma molécula de ATP, e assim sucessivamente, até ser completado o

encurtamento muscular.

Um dos locais que a

molécula de actina

disponibiliza para as

extremidades S-1 da

miosina

g f e d a b c

Sentido da união da extremidade S-1 da

molécula de miosina a sucessivos pontos de

ligação da actina

Filamento de actina e centros de união para a miosina

Page 39: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA MUSCULAR

Actas Bioq. 1989; 1:27-44

33

A miosina exerce múltiplas funções, designadamente: formação de filamentos, actividade

catalítica (ATPase) e apetência para se combinar com a actina (18). Por cada vez que um

filamento de miosina se une a outro de actina é formado um complexo de actomiosina (actina-

miosina). Esta união potencia, em cerca de 100 a 200 vezes, a actividade catalítica da miosina,

localizada na extremidade flexível (S1) de um dos seus componentes estruturais, a meromiosina

pesada (19). Na presença de ATP, a actomiosina dissocia-se nos componentes originais e

produtos da hidrólise daquele nucleótido (ADP e Pi) dando reinício a nova união e formação de

actomiosina (20); caso contrário, se não houver ATP disponível no meio celular, a actomiosina

não se dissocia, originando a rigidez muscular característica do rigor mortis .

CICLO DE CONTRACÇÃO E RELAXAMENTO MUSCULARES

Durante a contracção muscular são identificáveis vários estados do ATP e ADP (21) e de

interacção dos filamentos de miosina e actina (15), enquanto a interdigitação destes filamentos

proteicos progride em ciclos sucessivos de aproximação dos filamentos de actina do centro dos

sarcómeros (15, 22).

No decurso do ciclo de contracção e relaxamento muscular são identificáveis quatro

principais etapas, nas quais o ATP e o catião Ca 2+

são essenciais (Fig.6):

1ª Etapa- Relaxamento muscular, após a hidrólise do ATP pela ATPase da miosina, de

que resulta a formação de um complexo de alta energia, constituído pela miosina, ADP e Pi. Os

centros de união para a miosina que existem nos filamentos de actina estão revestidos por

complexos de troponina C- filamentos de tropomiosina que impedem a formação de pontes

cruzadas.

2ª Etapa - Início da contracção muscular, potencial, após a estimulação nervosa do

músculo. Nesta fase, o efluxo do Ca2+

do retículo para o sarcoplasma fixa-se à troponina C (até

quatro catiões por molécula), induzindo a deslocação dos complexos troponina C- filamentos de

tropomiosina (que cobriam, em repouso, os centros de união existentes na actina). A união dos

complexos de miosina-ADP-Pi aos pontos de união acessíveis nos filamentos de actina, origina a

formação de complexos de actomiosina-ADP-Pi.

3ª Etapa – Segue-se a dissociação do ADP e Pi da actomiosina, ficando esta num estado

de energia mais baixo; esta alteração induz a flexão das cabeças dos filamentos de miosina em

relação às de actina, de que resulta algum arrastamento destas para o centro dos sarcómeros.

4ª Uma nova molécula de ATP liga-se à actomiosina, originando o complexo

actomiosina-ATP; segue-se a dissociação da actina, restando os complexos de miosina-ATP que

precedem o reinício do ciclo. Embora a actina tenha elevada afinidade para o complexo miosina-

ADP-Pi, passa a ter baixa afinidade para o complexo miosina – ATP.

A energia resultante da hidrólise do ATP é essencial para a dissociação da actomiosina e

para aumentar o potencial energético da miosina . Quanto maior for o trabalho muscular mais

elevada será a quantidade despendida de ATP e de energia libertada (efeito Fenn) (23). Por

conseguinte, o aumento da velocidade de hidrólise do ATP é proporcional à rapidez do ciclo de

formação e dissociação das pontes entrecruzadas (16, 24)). Este mecanismo requer também a

participação das proteínas reguladoras que coexistem nos filamentos finos, a tropomiosina e a

troponina. Os filamentos da tropomiosina (organizados em par e dupla hélice), localizados na

goteira formada dupla hélice em que se dispõem os filamentos de actina, asseguram que os

pontos de união potencialmente acessíveis para a fixação das cabeças de miosina permaneçam

inacessíveis á miosina, na ausência de Ca2+

e ATP.

Page 40: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

34

FIGURA 6

Ciclo de associação e dissociação da actina e miosina, dinamizado pelo ATP.

O anião cálcio é um regulador essencial da contracção muscular (25). No músculo

esquelético (e também no cardíaco), actua em associação com a actina, sendo os seus níveis

intracelulares dependentes do retículo sarcoplásmico (26) Em repouso, a concentração (entre 10-8

e 10-7

M) do cálcio presente no sarcoplasma é muito baixa; estes níveis são assegurados por um

mecanismo de transporte activo dependente da Ca2+

-ATPase da membrana do retículo

sarcoplásmico, através da qual os excedentes daquele anião são imediatamente removidos para

seu interior (27), onde se ligam a moléculas proteicas específicas (calsequestrina); os complexos

calsequestrina- Ca2+

armazenam o catião junto da face interna da membrana do retículo

sarcoplásmico até ser requerida a sua mobilização para o sarcoplasma (28). Este efluxo é

desencadeado por uma onda de despolarização, encaminhada através do sistema T, de que resulta

um rápido aumento da concentração de Ca2+

no sarcoplasma, até cerca de 10-5

M (ou pelo menos

10 vezes a concentração em repouso). No citosol, iões Ca2+

ligam-se à troponina C , de que

resulta a interacção desta com as moléculas de troponina T e I (29,30), as quais induzem uma

alteração alostérica na conformação da actina que torna acessíveis os seus pontos de união à

miosina, dando assim início à contracção muscular (31-33). A contracção prossegue enquanto a

concentração de Ca2+

se mantiver elevada no líquido sarcoplásmico (Fig.7).

(Estimulação da contracção)

Actina

ATP

Actina

Actina-Miosina Miosina-ADP-Pi

Miosina-ADP-Pi

Actina

ADP+Pi

(Contracção)

Miosina-ATP

H2O

(Relaxamento muscular) (Fim da contracção)

Page 41: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA MUSCULAR

Actas Bioq. 1989; 1:27-44

35

FIGURA 7

FIGURA 7

Sequência de etapas que conduzem à contracção muscular após um impulso nervoso.

O processo inverte-se com a interrupção do influxo nervoso e a repolarização do sarcolema

e túbulos transversos; segue-se uma rápida diminuição da concentração do Ca2+

no sarcoplasma

para valores iguais ou inferiores a 10-7

M (34); na sequência da substituição do anterior efluxo

pela recaptação ião Ca2+

pela Ca2+

-ATPase, do sarcoplasma para o retículo endoplásmico; a falta

do ião Ca2+

no sarcoplasma para a torna inacessíveis os pontos de união necessários à formação

da actomiosina; havendo ATP são igualmente interrompidas as pontes entre os filamentos de

actina e miosina (Fig.8).

Por fim, a carência de ATP em situações de dispêndio excessivo ou menor regeneração

metabólica exerce um efeito duplo duas no ciclo de contracção e relaxamento muscular: (i)

Redução da actividade da Ca2+

-ATPase da membrana do retículo sarcoplásmico, de que resulta a

acumulação de iões no sarcoplasma e indução de ligações da miosina à actina; (ii) Ausência de

separação das cabeças de miosina das ligações a actina, com manutenção do complexo da

actomiosina e subsequente rigidez muscular, como sucede, em caso extremo, após a morte.

EXCITAÇÃO- CONTRACÇÃO MUSCULAR

Impulso nervoso- placa motriz

(Acetilcolina)

Despolarização do sarcolema e difusão a

toda a fibra, pelo sistema T

Efluxo de iões Ca 2+ do retículo sarcoplásmico

para o sarcoplasma

Fixação dos iões Ca 2+ ao componente TpC da troponina,

originando alterações de conformação local

Deslocação da tropomiosina relativamente à actina, de modo

a permitir, em ciclos sucessivos, a fixação da extremidade S1

de uma molécula miosina aos centros de união da actina

Page 42: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

36

FIGURA 8

Sequência de etapas que conduzem ao relaxamento muscular após a interrupção do

impulso nervoso.

PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS METABÓLICAS DAS FIBRAS MUSCULARES

Existem, pelo menos, dois tipos de fibras nos músculos esqueléticos que, de acordo com

o seu aspecto e cor, se designam por fibras vermelhas ou fibras brancas. As primeiras são

habitualmente associadas a contracções mais lentas, sendo as segundas de contracção rápida

(35). Porém, na generalidade, todos os músculos esqueléticos têm ambos os tipos de fibras

musculares, ainda que em proporção variável, dependendo de características genéticas função

realizada, localização anatómica e treino físico (36-38).

A designação das fibras vermelhas advém do seu elevado conteúdo em mioglobina, ao

contrário do que sucede nas fibras brancas. Adicionalmente, as fibras vermelhas possuem maior

sarcoplasma mais abundância de triacilglicerol em suspensão, mais núcleos celulares,

mitocôndrias e citocromos mitocondriais do que as fibras brancas. Este tipo de estrutura justifica

a existência de características metabólicas mais comuns em determinado tipo de fibras do que

RELAXAMENTO

Interrupção do impulso nervoso

Repolarização do sarcolema

Remoção do Ca2+ que se encontrava

associado à TpC, permitindo a esta molécula

ligar-se à tropomiosina,

Diminuição da concentração de Ca2+ no

sarcoplasma abaixo de 10-7M, após o

respectivo transporte (activo) para o retículo

sarcoplásmico

As cabeças de miosina separam-se dos centros

em que estavam unidos nas moléculas de

actina e são impedidas novas uniões entre

aquelas moléculas miosina à actina

Page 43: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA MUSCULAR

Actas Bioq. 1989; 1:27-44

37

em outra (39). De facto, as fibras vermelhas (tipo I) apresentam maior capacidade respiratória e

reserva de oxigénio do que as brancas, mais adequado a um metabolismo oxidativo aeróbio,

sendo, por isso, preferencialmente utilizadas em contracções mais lentas e sustentadas. As fibras

brancas (Tipo IIb) privilegiam as contracções mais rápidas e de curta duração, dependentes da

activação glicolítica (40). Foi individualizado um terceiro tipo, o das fibras vermelhas de

contracção rápida (tipo IIa), caracterizado por uma mistura de características fisiológicas e

metabólicas daqueles outros dois tipos (Quadro I).

NUTRIENTES METABÓLICOS E ORIGEM DA ENERGIA QUÍMICA

A energética muscular deverá ser analisada sob duas perspectivas. Por um lado reflecte a

energia química (representada pelo ATP) consumida pelo sistema contráctil durante as fases de

contracção e relaxamento muscular. Por outro, engloba o conjunto de reacções metabólicas que,

em aerobiose ou anaerobiose, conduzem à recuperação da energia química utilizada nas

anteriores actividades. Em condições de equilíbrio, a quantidade de energia gasta equivale à

obtida.

Ainda que a maior parte (cerca de 70%) do ATP muscular seja consumido na formação

de pontes cruzadas entre a actina e a miosina, a restante quantidade é essencial para outras três

actividades dos miocitos: transporte activo do Ca2+

do sarcoplasma para o retículo

sarcoplásmico, actividade da Na+, K

+ -ATPase do sarcolema (que assegura o efluxo de K

+ por

troca com o Na+ através do sarcolema, possibilitando a repolarização e, portanto, as condições

iónicas adequadas nova propagação do potencial eléctrico) e todas as reacções metabólicas

comuns do metabolismo celular (41).

QUADRO I

MÚSCULO ESQUELÉTICO

Principais características metabólicas e fisiológicas das fibras constituintes

Características

metabólicas

Fibras vermelhas de

contracção lenta

(Tipo I)

Fibras vermelhas de

contracção rápida

(Tipo IIA)

Fibras brancas de

contracção rápida

(Tipo IIB)

Respiração celular Aumentada Aumentada Diminuída

Glicogenólise Diminuída Aumentada Aumentada

Mioglobina Aumentada Aumentada Diminuída

Actividade da

ATPase-miosina

Diminuída Aumentada Aumentada

Para que a actividade muscular seja preservada, o nível de ATP hidrolisado durante os

anteriores processos tem de ser reposto imediatamente, recorrendo a quatro proveniências e

mecanismos principais (Fig.): (i) Fosfocreatina; (ii) Duas moléculas de ADP; (iii) Glicólise, da

glicose (e outras hexoses) e ou do glicogénio muscular; (iv) Fosforilação oxidativa (dos resíduos

derivados de glícidos, lípidos e proteínas) (Fig. 9).

Page 44: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

38

A quantidade de ATP no músculo esquelético humano varia com o tipo de músculo

considerado, sendo mais elevada nos de contracção rápida do que nos de contracção

preferencialmente oxidativa; em média é, aproximadamente, igual a 8mM, ou seja, cerca de 10 a

concentração de ADP e 100 vezes a de AMP (42). Na quantidade descrita, o ATP muscular

sustém a actividade contráctil durante menos de um segundo, pelo que é indispensável preservar

um nível constante da sua regeneração em períodos mais prolongados de contracção muscular.

No músculo esquelético, em geral, a concentração de ATP e restantes nucleótidos adenílicos

permanece virtualmente constante durante o exercício sub-máximo, diminuindo 10 a 30%

durante um esforço intenso (43, 44). Em determinadas actividades mais intensas e sincopadas, o

gasto de energia pode variar cerca de 100 vezes ou mais, enquanto em outras o dispêndio é mais

contínuo.

A velocidade de renovação do ATP muscular depende de vários factores,

designadamente, intensidade do exercício, tipo de fibras musculares, temperatura, fadiga e

eficiência mecânica muscular. Quanto ao tipo do exercício realizado, a renovação do ATP é mais

rápida durante o encurtamento activo do que em contracção estática (45). Aquela renovação do

ATP durante a contracção máxima pode elevar-se centenas de vezes em relação aos valores em

repouso, enquanto a concentração daquele nucleótido permanece virtualmente constante. O valor

de renovação do ATP em cada músculo também depende da proporção das fibras (tipo) que o

compõem. O valor máximo atingido é cerca de três a quatro vezes mais elevado nas fibras do

tipo IIA e IIB do que nas de tipo I, correspondente a maior força e rapidez de contracção e

relaxamento (46).

FIGURA 9

A contracção e relaxamento musculares são assegurados por níveis constantes de

ATP proveniente de quatro origens: fosfocreatina, pares de moléculas de ADP e

oxidação metabólica em anaerobiose (dos glícidos) ou aerobiose (dos glícidos,

lípidos ou proteínas).

Em qualquer dos casos, e independente do valor da velocidade de renovação, é essencial

a reposição do ATP consumido. Para tal, a refosforilação do ATP de subprodutos da sua

hidrólise (sobretudo o ADP mas, ainda, em menor concentração, o AMP) pode ser imediata

(baseada em grupos fosfato da alta energia em reserva celular) ou mais lenta (por oxidação

metabólica) (47).

Fosfocreatina

2ADP Respiração

celular

Glicólise

anaeróbia

ATP muscular

Page 45: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA MUSCULAR

Actas Bioq. 1989; 1:27-44

39

O mecanismo de actuação imediata depende de uma reserva de grupos fosfato de alta

energia (fosfagénio) de utilização prioritária, constituída por moléculas de fosfocreatina. O

potencial de transferência de energia livre da fosfocreatina (-10,3 Kcal/mole, a pH 7) é

substancialmente superior ao do ATP (-7,3 Kcal/mole), o que favorece a refosforilação do ADP

em ATP, catalisada pela fosfocreatina cinase:

A localização daquela enzima no citosol e associada às miofibrilhas, sarcolema e retículo

sarcoplásmico é importante para o controlo metabólico estabelecido pela relação [ATP] / [ADP].

No músculo em repouso, a concentração de fosfocreatina é três a seis vezes superior à de ATP

mas, no seu conjunto, também não assegura mais do que cerca de dez segundos de contracção

muscular intensa. No músculo activo, a concentração de ATP diminui assim que se esgotam as

reservas de fosfocreatina. Até que tal suceda, a fosfocreatina total tende a manter os níveis de

ATP muscular. Explica-se assim, p. ex., que a fosfocreatina total diminua até cerca de 90%

durante a contracção muscular enquanto o ATP celular consumido não ultrapassa os 10% (48).

Na realidade, a redução de fosfocreatina varia com as necessidades energéticas e com a

intensidade e velocidade do trabalho executado. No exercício sub-máximo, a fosfocreatina

diminui até determinado nível, depois mantido ao longo da actividade, sendo a concentração de

ADP o principal estímulo para desfosforilação da fosfocreatina e, também, para a fosforilação

oxidativa. Esta interdependência explica como o nível de fosfocreatina varia inversamente com a

intensidade do exercício (49)

Quando o exercício termina e o ATP recupera os níveis habituais, a fosfocreatina é

rapidamente regenerada, em cerca de um minuto (50); o equilíbrio da reacção (reversível,

também catalisada pela fosfocreatina cinase) desloca-se no sentido da fosfocreatina, a partir do

substrato não fosforilado (creatina), permitindo que a respectiva concentração celular seja

recuperada durante o relaxamento muscular e período de repouso:

A continuidade do exercício muscular depende, também, da regeneração dos níveis de

ATP a partir de moléculas de ADP (resultantes da hidrólise do ATP) e da oxidação metabólica

dos principais nutrientes celulares (glícidos e lípidos e, em situações de carência crítica, também

das proteínas). No músculo, quase todo o ATP e cerca de 50% do ADP formam quelatos com o

catião Mg 2+, sendo nesta forma que interactuam com as enzimas. Pelo contrário, o ADP

restante e, virtualmente, todo AMP estão ligados a proteínas (sobretudo a actina e a miosina), o

que limita a sua participação, em estado livre, nas reacções químicas dos miocitos (51). A

formação de uma molécula de ATP e outra de AMP por acção da enzima adenilato cinase

(existente em grande actividade no músculo esquelético) sobre duas moléculas de ADP (no

estado livre), consiste na transferência de um grupo fosfato de uma destas moléculas de substrato

Fosfocreatina + ADP

Creatina + ATP

(fosfocreatina

cinase) (Fosfocreatina cinase)

ATP + Creatina Fosfocreatina +ADP

(Fosfocreatina cinase)

Page 46: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

40

(ADP) para o seu par, deste modo fosforilado, enquanto a molécula que cedeu o grupo fosfato se

transforma no nucleótido AMP:

Ainda que não exista especificidade directa, esta reacção (reversível) pode ser

particularmente útil em associação com a hidrólise do ATP pela ATPase da miosina, durante a

contracção muscular. Relativamente à reacção catalisada pela creatina fosfocinase, a velocidade

de formação de ATP pela adenilato cinase é de cerca de um terço. A irreversibilidade da

remoção do AMP (catalisada pela AMP desaminase, activada pela acidose intracelular)

desequilibra a reacção para a direita, favorecendo a obtenção de ATP (52).

Uma parte substancial da energia contida nos alimentos e reservas metabólicas corporais

(em caso de necessidade suplementar) é, igualmente, utilizada na regeneração do ATP. Neste

aspecto prevalecem os glícidos (sobretudo a glicose e o seu polímero, o glicogénio), como

principais fornecedores de energia química. Além desta função predominante, os glícidos

participam, secundariamente, na constituição do esqueleto carbonado de aminoácidos e outras

biomoléculas importantes ao organismo. Contudo, relativamente ao músculo, o tipo de

biomoléculas preferencialmente consumidas varia com estado de repouso ou de exercício,

situação alimentar (em jejum ou em período pós-prandial) em anóxia ou na contracção tetânica.

Assim, a glicose captada da circulação é o principal nutriente utilizado pelo músculo após as

refeições (53), enquanto no exercício sub-máximo prolongado (54,55), na anóxia (56) e na

contracção tetânica (57) a glicose provém da activação da glicogenólise muscular, sendo esta

cerca de duas vezes mais pronunciada nas fibras do tipo II do que nas do tipo I (58); após a

depleção do glicogénio muscular, a actividade muscular sub-máximo ou o exercício prolongado

prossegue à custa da glicose e ácidos gordos livres provenientes da circulação, em particular no

período final, após depleção das reservas de glícidos musculares (59). Em repouso e em jejum é

dada preferência aos ácidos gordos livres; se o jejum for de curta duração podem também ser

utilizados os aminoácidos ramificados (valina, leucina e isoleucina), também parcialmente

oxidados após as refeições (60); no jejum mais prolongado, aumenta o consumo de ácidos

gordos livres e corpos cetónicos (acetoacetato e β-hidroxibutirato), ainda que o trabalho

muscular desenvolvido seja de baixa intensidade (59, 61); mesmo na presença de cetonemia

elevada, a quantidade de corpos cetónicos oxidados no músculo não contribui em mais do que

7% do metabolismo muscular, em exercício ou em repouso (62).

As principais características e mecanismos de controlo das vias metabólicas que

contribuem para o potencial energético do músculo esqueleto, assim como as adaptações mais

relevantes em período de exercício físico, serão abordados em outro artigo deste volume

(Adaptação Enzimática ao Exercício).

SUMMARY

The contraction of skeletal muscle is based on a system of filamentous proteins

(particularly actin and myosin) to slide between them in a parallel plane. The process

is dependent on a complex mechanism, initiated by a nerve impulse which, when

transmitted to the sarcoplasmic reticulum, induces the efflux of calcium ions into the

sarcoplasm of each muscle cell (myocyte). Following is triggered the cycle of

2 ADP ATP+ AMP

(Adenilato cinase)

Page 47: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA MUSCULAR

Actas Bioq. 1989; 1:27-44

41

interactions of actin with myosin that underlies muscle contraction, which requires

the consumption of chemical energy by ATP hydrolysis.

ATP is essential for contraction, and also to muscle relaxation. The levels of

intracellular ATP are provided mainly by the complete oxidation of glucose and fatty

acids and also from phosphocreatine, which is, in the myocytes, in a concentration

about five times higher than that nucleotide.

The relative contribution of glycolysis and oxidative phosphorylation in the

regeneration of ATP varies with the type of muscle fibers. While cellular respiration

prevails in red fibers of slower contraction, glycolysis is central in the white fibers of

rapid contraction. ATP production is controlled mainly by the cellular energy state,

regulated by ATP and nucleotide derivatives on the main regulatory enzymes of

metabolic pathways involved in the process, which reflects on oxygen consumption

by myocytes.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Emília Alves o apoio de secretariado concedido a este trabalho.

BIBLIOGRAFIA

1. Altamirano M, Coates CW, Grundfest H. Mechanisms of direct and neural excitability in

electroplaques of electric eel. J Gen Physiol. 1955;38(3): 319-360.

2. Hodes R. The innervation of skeletal muscle. Annu Rev Physiol. 1953; 15:139-164.

3. Perry SV, Horne RW. The intracellular components of skeletal muscle. Biochim Biophys

Acta 1952, 8:483-498.

4. Stromer MH, Goll DE, Young RB, Robson RM, Parrish FC Jr. J Anim Sci.

Ultrastructural features of skeletal muscle differentiation and development. 1974;

38:1111-1141.

5. Page S. Structure of the sarcoplasmic reticulum in vertebrate muscle. Br Med Bull. 1968;

24:170-173.

6. Engelhardt VA, Lyubimova MN. Myosin and adenosine triphosphatase. Nature 1939;

144: 668-669.

7. Straub FB, Feuer G. adenosine triphosphate the functional group of actin. Biochim

Biophys Acta 1950; 4: 455-470.

8. Hanson J, Huxley HE. Structural basis of cross-striations in muscle. Nature 1953; 172:

530-532.

9. Huxley HE. X-ray analysis and the problem of muscle. Proc R Soc Lond B Biol Sci

1953; 141: 59-61.

10. Huxley HE. Electron microscope studies of the organization of the filaments in striated

muscle. Biochim Biophys Acta 1953; 12: 387-394.

11. Huxley HE, Hanson J. Changes in the cross-striations of muscle during contraction and

stretch and their structural interpretations. Nature 1954; 173: 979-988.

12. Huxley HE. The double array of filaments in cross-striated muscle. J Biophys Biochem

Cyt 1957; 3: 631-648.

13. Huxley AF, Niedergerke R. Structural changes in muscle during contraction.

Interference microscopy of living muscle fibers. Nature 1954; 173: 971-978.

Page 48: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

42

14. Huxley HE, Hanson J. Changes in the cross-striations of muscle during contraction and

stretch and their structural interpretations. Nature 1954; 173: 979-988.

15. Huxley HE. Electron microscope studies on the structure of natural and synthetic protein

filaments from striated muscle. J Mol Biol 1963; 7: 281-308.

16. Huxley AF. Muscle structure and theories of contraction. Prog Biophys Biophys Chem

1957; 7:255-318.

17. Huxley HE. The mechanism of muscular contraction. Science 164: 1356-1365, 1969.

18. Mihályi E, Szent- Györgyi AG. Trypsin digestion of muscle proteins. I. Ultracentrifugal

analysis of the process. J Biol Chem 1953; 201: 189-196.

19. Lowey SL, Goldstein C, Cohen C, Luck SM. Proteolytic degradation of myosin and the

meromyosin by a water-insoluble polyanionic derivative f trypsin. J Mol Biol 1967; 23:

287-304.

20. Szent-Gyorgyi A. Free energy relations and contraction of actomyosin. Biol Bull 1949;

96: 140-161.

21. Bagshaw CR, Trentham DR. The characterization of myosin-product complexes and of

product-release steps during the magnesium ion-dependent adenosine triphosphatase

reaction. Biochem J 1974; 141: 331-349.

22. Lymn RW, Taylor EW. Mechanism of adenosine triphosphate hydrolysis by actomyosin.

Biochemistry 1971; 10: 4617-4624.

23. Fenn WO. A quantitative comparison between the energy liberated and the work

performed by the isolated Sartorius muscle of the frog.J. Physiol 1923; 58: 175-203.

24. Huxley AF, Simmons RM. Proposed mechanism of force generation in striated muscle.

Nature 1971; 233: 533-538.

25. Fozzard HA, Gibbons WR. Electrical aspects of excitation-contraction coupling. Recent

Adv Stud Cardiac Struct Metab 1976; 11:3-10.

26. Ebashi S, Lipmann F. Adenosine triphosphate-linked concentration of calcium ions in a

particular fraction of rabbit muscle. J Cell Biol 1962; 14:389-400.

27. Martonosi AN. Mechanisms of Ca2+

release from sarcoplasmic reticulum of skeletal

muscle. Physiol Rev 1984; 64:1240-1320.

28. MacLennan DH, Wong PT. Isolation of a calcium-sequestering protein from

sarcoplasmic reticulum. Proc Natl Acad Sci U S A. 1971; 68(6):1231-1235.

29. Bremel RD, Weber A. Cooperation within actin filaments in vertebrate skeletal muscle.

Nature New Biol 1972; 238: 97-101.

30. Greaser ML, Gergely J. Reconstitution of troponina activity from three protein

components. J Biol Chem 1971; 246: 4226-4233.

31. Parry D, Squire JM. Structural role of tropomyosin in muscle regulation: analysis of the

X-ray patterns from relaxed and contracting muscles.J Mol Biol 1973; 75:33-55.

32. el-Saleh SC, Warber KD, Potter JD. The role of tropomyosin-troponin in the regulation

of skeletal muscle contraction.J Muscle Res Cell Motil 7:387-404, 1986.

33. Johansson B. Calcium and regulation of contraction: a short review. J Cardiovasc

Pharmacol 10 Suppl 1:S9-S13, 1987.

34. Katz AM, Shigekawa M, Repke DI, Hasselbach W. Calcium transport and release by the

sarcoplasmic reticulum. Recent Adv Stud Cardiac Struct Metab 1976; 11:205-212.

35. McComas AJ, Thomas HC. Fast and slow twitch muscles in man. J Neurol Sci 1968;

7:301-307.

Page 49: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA MUSCULAR

Actas Bioq. 1989; 1:27-44

43

36. Bylund AC, Bjurö T, Cederblad G, Holm J, Lundholm K, Sjöstroöm M, Angquist KA,

Scherstén T. Physical training in man. Skeletal muscle metabolism in relation to muscle

morphology and running ability. Eur J Appl Physiol Occup Physiol 1977; 15; 36:151-

169.

37. Gollnick PD, Matoba H. The muscle fiber composition of skeletal muscle as a predictor

of athletic success. An overview. Am J Sports Med 1984; 12:212-217.

38. Komi PV, Karlsson J. Skeletal muscle fibre types, enzyme activities and physical

performance in young males and females. Acta Physiol Scand. 1978;103:210-218.

39. Eberstein A, Goodgold J. Slow and fast twitch fibers in human skeletal muscle. Am J

Physiol 215(3):535-541,1968.

40. Pette D, Spamer C. Metabolic properties of muscle fibers. Fed Proc 1986; 45:2910-2904.

41. Smith ICH. Energetics of activation in frog and toad muscle. J Physiol 1972; 220: 583-

599.

42. Edstrom l, Hultman E, Sahlin K, Sjoholm H. The contents of high-energy phosphates in

different fiber types in skeletal muscles of rat, guinea-pigs and man. J Physiol 1982;

332:47-58.

43. Sahlim K, Plamskog G, Hultman E. Adenine nucleotide and IMP contents of the

quadriceps muscle in man after exercise. Pflügers Arch 1978; 374: 193-198

44. Norman B, Sollevi A, Kaijser L, Jansson E. ATP breakdown products in human skeletal

muscle during prolonged exercise to exhaustion. Clin Physiol 1987; 7: 503-510.

45. Hultman E, Sjoholm H. Energy metabolism and contraction force of human skeletal

muscle in situ during electric stimulation. J Physiol 1983; 345: 525-532.

46. Essén B. Intramuscular substrate utilization during prolonged exercise. Ann N Y Acad

Sci 301:30-44, 1977.

47. Kushmerick MJ. Energetic of muscle contraction. In: Handbook of Physiology, sect 10

(Skeletal Muscle), LD Peachey, RH Adrian, SR Geiger (Eds). Bethesda Amer Physiol

Society, 1983, pp.189-236.

48. Hultman E, Sjoholm H. Substrate availabiklity. In: Biochemistry of Exercise, HG

Knuttgen, JA Vogel, J Pootmans (Eds), Champaign: Human Kinetics, 1983; pp.63-75.

49. Meyer RA. A linear model of muscle respiration explains monoexponential

phosphocreatine changes. Am J Physiol 1988; 254: C548-C553.

50. Harris RC,Edwards RC, Hultman E, Nordesjo LO, Nylind B, Sahlin K. The time course

of phosphorylcreatine resyntesis during recovery of the quadriceps muscle in man,

Pflügers Arch 1976; 367: 137-142.

51. McGilvery RW, Murray TW. Calculated equilibria of phosphocreatine and adenosine

phosphates during utilization of high energy phosphate by muscle. J Biol Chem 1974;

249: 5845-5850.

52. Terjung RL, Dudley GA, Meyer RA. Metabolic and circulatory limitations to muscular

performance at the organ level. J Exp Biol 1985; 11: 307-318.

53. Elia M, Folmer P, Schlatmann A, Goren A, Austin S. Carbohydrate, fat, and protein

metabolism in muscle and in the whole body after mixed meal ingestion. Metabolism.

1988 Jun; 37:542-551.

54. Bergström J, Hermansen L, Hultman E, Saltin B. diet, muscle glycogen and physical

performance. Acta Physiol Scand 1967; 71: 140-150.

Page 50: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

44

55. Hultman E. Studies on muscle metabolism of glycogen and active phosphate in man

with special reference to exercise and diet. Scand J Clin Lab Invest 1967; 19 (supl 94).1-

63.

56. Katz A, Sahlin K. Effect of hypoxia on glucose metabolism in human skeletal muscle

during exercise. Acta Physiol Scand. 1989; 136(3):377-82.

57. Hultman E, Spriet LL Skeletal muscle metabolism, contraction force and glycogen

utilization during prolonged electrical stimulation in humans. J Physiol. 1986 May;

374:493-501.

58. Harris, RC, essen B, Hultman E. Glycogen phosphorylase in biopsy samples and single

muscle fibers of musculus quadriceps femoris of man at rest.Scand J Clin Lab Invest

1976; 36:521-526.

59. Pernow B, Saltin B. Availability of substrates and capacity for prolonged heavy exercise

in man. J Appl Physiol 1971; 31: 416-422.

60. Harper AE, Miller RH, Block KP. Branched-chain aminoacid metaboilism. Ann Rev

Nutr 1984; 4:409-454.

61. Sestoft L, Trap-Jensen J, Lyngsooe J, Clausen JP, Holst JJ, Nielsen Sl, Rehfeld JF,

Schaffalitzky de Muckadell OS. Regulation of gluconeogenesis and ketogenesis during

rest and exercise in diabetic subjects and normal men. Clin Sci Mol Med 1977; 53: 411-

418

62. Hagenfeldt L. Metabolism of free fatty acids and ketone bodies during exercise in

mormal and diabetic man. Diabetes 1979; 28 (supl 1): 66-70.

Page 51: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:45-56 45

ASPECTOS MICROSCÓPICOS DO TECIDO MUSCULAR ESQUELÉTICO

ADAPTAÇÃO DO MÚSCULO AO ESFORÇO - HIPERTROFIA E ATROFIA

B. Gomes Pinto

Instituto de Fisiologia da Faculdade de Medicina de Lisboa; Serviço de Cardiologia dos

Hospitais Civis de Lisboa, Portugal

SUMÁRIO

O Autor começa por recordar factos demonstrativos da relação entre a

actividade física e o grau de desenvolvimento das massas musculares, bem

como os conceitos de Hipertrofia a Atrofia do músculo. A respeito destes

processos, indica os métodos de estudo e critica os protocolos usados nas

investigações. De seguida, o A. refere modificações histológicas e fisiológicas

envolvidas na Hipertrofia e Atrofia muscular. Aponta para a diferenciação do

tipo e doutras características da fibra muscular consoante a modalidade de

exercício ou de treino (inactividade, postura, "endurance", força/velocidade ou

mixto) e correlaciona os dados estruturais com os do diagrama

força/comprimento/velocidade. Por último, o Autor debruça-se sobre o

significado fisiológico e fisiopatológico dos processos de Hipertrofia e Atrofia

muscular, considerando sucessivamente a adaptabilidade ao desempenho

funcional, em regra dependente do estado inotrópico, a reversibilidade das

situações e a predisposição para a inviabilidade celular.

INTRODUÇÃO

Desde a Antiguidade que é bem conhecida no Homem (e noutros seres vivos) a existência

de uma relação entre a actividade física e o desenvolvimento das massas musculares

esqueléticas. O facto torna-se sobretudo evidente em indivíduos com determinadas profissões ou

práticas desportivas.

Embora o miocárdio não constitua o objectivo principal da presente exposição, também

em relação a este músculo a influência da actividade física é flagrante, como nós próprios

recentemente demonstrámos (TELES MARTINS e GOMES PINTO; in "Aspectos

Palavras-chave: Músculo, Hipertrofia, Atrofia, Fisiologia muscular

Page 52: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

GOMES PINTO B.

46

anatomo-funcionais do coração de indivíduos jovens adultos, saudáveis induzidos pelo

sedentarismo, treino físico ligeiro e programado e alta competição"' em publicação).

As modificações do tamanho dos músculos ligadas ao exercício físico atribuem-se a

processos ocorridos a nível estrutural. A Hipertrofia consiste num aumento de volume das fibras

a daí maior tamanho do órgão, enquanto a Atrofia resulta da diminuição de volume das fibras por

perda da substância celular. Hipertrofia e Atrofia distinguem-se assim de outras situações que

podem igualmente alterar o volume da massa muscular (por exemplo displasias, tumores,

quistos, edema, hematoma a miopatias) (1) (2) (3) (4) e possuem certas características inerentes à

estrutura e à função, que procuraremos analisar na presente revisão.

MATERIAL E MÉTODOS

A Hipertrofia a Atrofia muscular têm sido estudadas pelo recurso às mais variadas

técnicas: de observação clínica, morfométricas, radiológicas a ultrassonográficas, bioquímicas a

imunológicas, ultra estruturais, fisiológicas a biofísicas, isotópicas e a aplicação de Rmn e Laser.

Além das dificuldades próprias destas investigações, as diferenças nos protocolos utilizados

levam a resultados nem sempre comparáveis. É notória a heterogeneidade no tocante às técnicas

de estudo, ao animal utilizado (espécie, idade, sexo, dieta, etc.) e no modo de indução do

aumento ou redução da actividade muscular (por exemplo intervenção neuronal directa,

tenotomia isolada de sinergistas ou antagonistas, fixação esquelética, bloqueio do receptor ou do

efector do arco reflexo, acamamento, anulação da força da gravidade e, em especial, variável

duração, frequência e força/velocidade dos exercicios).

No entanto, considerável número de trabalhos leva a aceitar a interdependência entre o

tipo de actividade física e modificações ocorridas a nível muscular.

RESULTADOS

As principais particularidades morfo-funcionais observadas no músculo estriado a longo

prazo em consequência da (in) actividade física foram por nós condensadas no Quadro I. Assim,

(começando por considerar as fibras musculares) o treino físico ou a inactividade, embora não

comprometam a distribuição das fibras dentro do músculo, afectam o seu número. Com efeito,

no treino de força/velocidade, aumentam todos os tipos de fibras, mas sobretudo as do tipo II B.

Por sue vez, o treino de "endurance" e exercício de "postura" levam ao aumento do número de

fibras de tipo I. Pelo contrário, na atrofia por inactividade, estas aparecem reduzidas. Por isso, a

relação entre as fibras tipo II/tipo I diminui após o treino de "endurance", mas eleva-se tanto com

o treino de força como com a inactividade. Os exercícios ditos mixtos-aeróbicos a anaeróbicos

aumentam sobretudo as fibras de tipo II C (intermédias) (5) (6) (7) (8) (9) (10).

Page 53: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

HIPERTROFIA E ATROFIA MUSCULAR

Actas Bioq.1989; 1:45-56

47

QUADRO I

O diâmetro (ou a área de secção transversal) das fibras, bem como os dados com este

directamente correlacionados, isto é, o número de miofibrilhas e de sarcómeros em paralelo, o

Page 54: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

GOMES PINTO B.

48

volume a peso do músculo e a força muscular mostram: - aumento significativo após treino de

"força"; - diminuição com a inactividade; - falta de alteração apreciável após treino de

"endurance". De modo análogo, o comprimento da fibra muscular (e do músculo) e vários

factores com este(s) em estreita relação, e designadamente o número de sarcómeros em série, o

ângulo de mobilização articular, a amplitude do movimento e a força isométrica máxima,

aumentam com o treino de "potência", diminuem após a inactividade prolongada e não variam

nitidamente após treino de "endurance". Modificações ocorridas no mesmo sentido e induzidas

pelos mesmos tipos de actividade foram descritas relativamente ao sarcolema (superfície e

núcleos) a ao volume do sarcoplasma a do retículo sarcoplasmático (11) (12) (13).

Contrariamente ao que se observa na atrofia por inactividade, o volume e a densidade

mitocondrial (bem como o conteúdo em glicogénio e em mioglobina) aumentam com o treino de

"endurance".

Os núcleos celulares diminuem nitidamente com a inactividade, mas parecem

desenvolver-se com o treino de "força", como voltaremos a referir adiante (10) (12) (13) (14).

O fenómeno de crescimento capilar (aumento de densidade, isto é, do número de

capilares por fibra), tem sido evidenciado após o treino, quer de "força", quer de "endurance",

como também veremos posteriormente (15) (16) (17).

Foram referidas modificações da trama conjuntiva do músculo após treino de

"endurance" especialmente à custa do endo e do perimísio que conferem maior resistência à,

tracção a aos traumatismos (10) (12) (18) (19).

O aumento do número de fibras por motoneurónio e o maior recrutamento de unidades

motrizes foram apontados em relação com o treino de "força". Após inactividade, observa-se o

contrário (7) (9) (10) (13) (20).

Como é sabido, a intervenção do motoneurónio é fundamental no comportamento

estrutural, bioquímico e funcional das fibras musculares. Assim, como é sabido, consideram-se

três tipos de unidades motrizes: 1 - unidades possuidoras de fibras de tipo II B - inervadas por

motoneurónios , com elevado número de fibras por motoneurónio, resposta contráctil rápida e de

grande amplitude, mas com notável vulnerabilidade à fadiga; 2 - unidades com fibras de tipo I -

motoneurónio de menor dimensão, número de fibras por unidade motriz geralmente menor,

abalos prolongados e de baixa amplitude e grande resistência à fadiga; 3 - unidades com fibras

de tipo II A - características intermédias em relação às que acabámos de indicar.

A importância decisiva do neurónio motor na diferenciação das fibras musculares tem

sido bem demonstrada em experiências de desnervação e reinervação cruzada do músculo.

Nestas condições, a fibra muscular modifica o seu comportamento estrutural, bioquímico e

funcional, de acordo com as características da, sua inervação (10) (21) (22) (23).

A possível variabilidade do número de fibras por motoneurónio em função do treino tem

sido bastante investigada. Diversos dados sugerem que ao fim de algumas semanas de treino, são

aparentes fenómenos de hipertrofia das fibras e multiplicação das células mononucleadas

satélites ao miocito. Várias hipóteses têm sido aventadas para explicar estes factos. Assim, por

um lado, e contrariamente às ideias clássicas (de Morpurgo) (24), há defensores da existência

duma hiperplasia. ou multiplicação do miocito (7) (8) (10) (20). Outros autores, mais cépticos,

atribuem os resultados daquelas observações a artefactos da, técnica (25). Segundo uma corrente

de opinião (26) estaria em causa um fenómeno de fissuração, cujo desencadeamento seria mais

fácil numa fibra hipertrofiada e com maior susceptibilidade à clivagem. Em corte transversal a

fissuração daria a impressão do aparecimento de novas fibras (Fig. 1). Por outro lado, certos

investigadores (25) admitem que uma célula mononucleada, em geral após fusão com uma fibra

Page 55: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

HIPERTROFIA E ATROFIA MUSCULAR

Actas Bioq.1989; 1:45-56

49

muscular, divide-se em várias fibras filhas (Fig. 2) que seriam possuidoras de potencial

miogénico. Da fusão destas células ou fibras filhas resultaria uma fibra contráctil.

Fig. 1 Fig. 2

Fig. 3

O aumento do número de núcleos no miocito tem sido explicado por alguns autores do

seguinte modo: uma célula satélite serie activada com posterior divisão mitótica. Uma das

células filhas seria englobada na fibra muscular adjacente e o fenómeno repetir-se-ia (Fig. 3)

(segundo Monod a cols). Quanto à densidade capilar (D) (número de capilares/fibra), sabe-se que

esta: 1 - varia consoante o tipo de fibras (é maior no tipo I); 2 - correlaciona-se directamente

Page 56: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

GOMES PINTO B.

50

com: a) o diâmetro do músculo, b) a concentração mitocondrial, c) a superfície das trocas entre

sangue e fibras, d) o treino físico (Fig. 4)

Fig. 4

Os parâmetros fisiológicos utilizados no estudo da contractilidade muscular 1 sofrem

modificações na atrofia a hipertrofia, conforme indicamos no Quadro II. Tais modificações

processam-se em regra em sentido oposto. Assim, o músculo hipertrofiado torna-se capaz de

desenvolver mais força e trabalho. Além disso, a hipertrofia muscular acompanha-se dum

aumento de potência, velocidade, rendimento e resistência à fadiga. Na atrofia todos estes

parâmetros se reduzem (4) (5) (8) (9) (10) (27).

Pelo que respeita às bases estruturais implicadas no ganho ou perch de força muscular,

tem-se demonstrado que as características histológicas do tecido muscular condicionam a força

do músculo. Entre as diversas ultra estruturas responsáveis encontram-se o tipo de fibras (ou de

unidades motrizes), a área de secção transversal e o comprimento do miocito e do músculo, o

número de miofibrilhas, de sarcómeros em série a em paralelo, de fibras por motoneurónio,

densidade capilar, etc. Como vimos, ao invés do que sucede na atrofia, na hipertrofia observa-se

desenvolvimento de todos aqueles elementos (1-5) (6) (8) (10) (12) (13) (19) (21) (28).

1 Não nos ocuparemos dos problemas ligados aos potenciais de acção a correntes catiónicas.

Page 57: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

HIPERTROFIA E ATROFIA MUSCULAR

Actas Bioq.1989; 1:45-56

51

QUADRO II

O papel do comprimento muscular como gerador de força está exemplificado na Figura 5.

A força isométrica máxima (Fo) desenvolve-se a um determinado comprimento, o chamado

comprimento de repouso. Será o ponto óptimo para a conjugação de forças elásticas e

musculares dos músculos agonistas e antagonistas (cit. 10).

Fig. 5

A diferença entre músculos rápidos e lentos é apreciável nas curvas força/velocidade. Os

primeiros apresentam a curva relativamente desviada para cima a para a direita (Fig. 6).

Os valores da força e da velocidade condicionam por seu turno os valores da potência, como se

indica na Figure 7, de PERTUZON (cit. 10)

Page 58: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

GOMES PINTO B.

52

Fig. 6

Fig. 7

DISCUSSÃO

Os dados atrás apontados levam-nos a uma reflexão sobre o significado fisiológico a

fisiopatológico da Hipertrofia a da Atrofia muscular

Assim, com base nos dados clínicos e experimentais, pode considerar-se a Hipertrofia e a

Atrofia como processos adaptativos ao desempenho funcional. Na Hipertrofia. há ganho de força

ou de "resistência", enquanto na Atrofia sucede o contrário. Seguindo um conceito finalista,

haveria, perante uma ou outra daquelas situações, uma necessidade de se gerar mais ou menos

força (ou resistência), que seria satisfeita fundamentalmente através duma variação do "estado

inotrópico".

Page 59: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

HIPERTROFIA E ATROFIA MUSCULAR

Actas Bioq.1989; 1:45-56

53

Sabe-se que modificando a actividade é possível a reversibilidade dos dois processos (9)

(29) (30) (31). Todavia em certas observações, detectaram-se na evolução do processo atrófico,

lesões de necrose (1) (2) (3). Por outro lado, na hipertrofia, devido ao crescimento da massa

muscular é exigido maior débito circulatório local. Deste modo (tal como no músculo cardíaco),

o músculo esquelético hipertrofïado apresenta maior predisposição para a isquémia e

consequente inviabilidade celular (15) (32) (33) (34). O facto do débito circulatório local

diminuir no músculo atrofiado poderá por sua vez constituir um mecanismo circulatório

adaptativo benéfico face a uma dada diminuição do débito cardíaco geral como a verificada em

certas afecções, na idade avançada, no acamamento e sedentarismo prolongados etc. (29) (30)

(31). Recordemos que normalmente o débito muscular já representa cerca de 80% do débito

cardíaco total (Figure 8) (4) (5) (7) (9) (10) (15) (16).

Os factores subjacentes aos processos de Hipertrofia e Atrofia têm certamente relação

com o crescimento muscular. É assunto que interessa aos estudiosos da cultura física e da

problemática, da regeneração muscular (35) após necrose, quer do músculo esquelético, quer do

miocárdio.

Fig. 8

A complexidade do tema é muito grande tal como pretendemos representar no esquema

junto (Figure 9). O exercício físico está longe de ser o único factor implicado (1) (2) (3) (4).

Com efeito, não obstante o trabalho (carga ou tensão) muscular ser importante indutor da

actividade metabólica do miocito e da síntese proteica, de membranas e de miofilamentos,

devemos ter em conta as múltiplas influências nervosas, nutritivas, metabólicas, hormonais,

circulatórias, térmicas, genéticas ou outras eventualmente ainda desconhecidas. Estas estão

sempre envolvidas e intimamente ligadas entre si, constituindo por isso uma teia de abordagem

naturalmente difícil. Minuciosos estudos têm vindo progressivamente a esclarecer esta matéria e

futuras investigações continuarão por certo a revelar novos dados

Page 60: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

GOMES PINTO B.

54

Fig. 9

SUMMARY

The A. starts to review some facts demonstrating the interrelationship between physical

activity and muscular mass development, as well as the concepts of muscle hypertrophy and

atrophy. Afterwards he refers the techniques of study and protocols used in these investigations.

The histological and physiological changes involved in hypertrophy and atrophy are equally

mentioned. The differentiation of the type and other muscle fiber characteristics according to the

exercise or training modality - endurance, strength, inactivity (or combined) and the correlation

between structural data and the strength/length/velocity diagram are explained. The A. discuss

also the physiological and physiopathological significance of Hypertrophy and Atrophy,

considering: a) the adaptability to the functional requirements related in rule to the "isotropy

status"; b) the reversibility of the two situations and c) the predisposition for the cellular

inviability.

BIBLIOGRAFIA

1. ROBBINS, S, COTRAN, R e KUMAR, V - Patologia estrutural a funcional. Ed.

Interamericana, 1986

2. BAYRON, A e KAKULAS, A - Diseases of Muscle - Pathological Foundation of Clinical

Myology . Harper and Row, Publis., Philadelphia,1985

3. CARPENTER, S e KARPATI, G - Pathology of skeletal muscle. Churchill Livingstone,

New York, 1984

4. GOLLNICK, PD a SEMBROWICH, WL - Adaptations in Human Skeletal Muscle as a

Result of Training. in AMSTERDAM, EA, WILMORE, JH, DEMARIA, A - Exercise in

Health and Disease, pg. 71-94. New York Books Med. Publ. 1977 , New York

Page 61: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

HIPERTROFIA E ATROFIA MUSCULAR

Actas Bioq.1989; 1:45-56

55

5. HOLLOSZY, J - Adaptation of muscular tissue to training - Prog.,Cardiovasc. Dis. 18:445-

458, 1976

6. IANUZZO, CD, GOLLNICK, PD, ARMSTRONG, RB - Compensatory adaptation of

skeletal muscle fiber types to a long term functional overload- Life Sci. 9:1517-1524, 1976

7. GONYEA, WJ - Role of exercise in inducing increases in skeletal muscle fiber number - J.

App1. Physiol.: Respiration. Environ Exercise Physiol. 48(3):421-426, 1980

8. SWYNGHEDAUW, B - Developmental and functional adaptation of contractile proteins in

cardiac and skeletal muscles - Physiol. Rev. 66(3): 710-771, 1986

9. SALTIN, B e ROWELL, LB - Functional adaptation to physical activity or inactivity - Fed.

Proc. 39:1506-1513, 1980

10. MONOD, H, VANDEWALLE, H, KAHN, JP, KAPITANIAK, B e SANCHEZ, J - Effets à

long terme de la pratique sportive. In: Sports et Medicine. Tome 3. Ed. Med. Fournier

Frères, Pharmuka, 1982

11. IKAI, MF, FUKUNAGA, T - A study of training effect on strength per unit cross-sectional

area of muscle by means of ultrasonic measurement - Int. Z. Angen Physiol. 28:173-180,

1970

12. MAC DOUGALL, D, SALE, G, ELDER, G e SUTTON, JR - Ultrastructural proper ties of

human skeletal muscle following heavy resistance training and immobilization (abstract) -

Med. Sci. Sports 6:72,1976

13. JENNEKENS, FGI, TOMLINSON, BE, WALTON, JN - The sizes of the two main

hystochemical fibers types in five limb muscles in man - J. Neurol. Sci. 13:281-292, 1971

14. KIESSLING, KH, PILSTROM, L e KARLSSON, J - Mitochondrial volume in ske letal

muscle from young and old physically untrained and trained healthy men and from

alcoholics - Clin. Sci. 44:547-554,1973

15. TESCH, PA, THORSSON, A e KAISER, P - Muscle capillary supply and fiber type

characteristics in weight and power lifters - J. Appl. Phy siol. 50(1)35435, 1984

16. HADLICKE, O - Growth of capillaries in skeletal and cardiac muscle - Circ. Res. 50:451-

461, 1982

17. HERMANSEN, L e WACHTLOVA, M - Capillary density of skeletal muscle in well-

trained and untrained men - J. App. Physiol. 30:860-863, 1971

18. FLECK, SJ a FALKEL, JE - Value of resistance training for the reduction of sports injuries

- Sports Med. 3(1):61-68, 1986

19. HENNEMAN, E e OLSON, C - Relations between structure and function in the design of

skeletal muscle - J. Neurophysiol. 28:481-498,1965

20. SOLA, OM, CHRISTENSEN, DL a MARTIN, AW - Hypertrophy and hyperplasia of adult

chicken without denervation - Exp. Neurol. 41:76-100, 1973

21. BURKE, RE a EDGERTON, VR - "Motor Unit Properties and Slective Involvement in

Movement" in Wilmore, J. Ed.: Exercise and Sport Sciences Reviews pp. 3L1-81, New

York Academic Press, 1975

22. EDSTRÖM, L e KUGELBERG, E - Hystochemical composition, distribution of fibers and

fatiguability of single motor units - J. Neurol. Neurosurg. Psychiat. 31:415-423, 1968

23. BARNARD, RJ, EDGERTON, VR a FURUKAWA, T - Histochemical, biochemical and

contractile properties of red, white and intermediate fibers - Amer. J. Physiol. 220:410-414,

1971

24. MORPURGO, D - Uber Aktivitats, Hypertrophie der willkürlichen Muskeln - Virchow

Arch. 150:522-524, 1897

Page 62: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

GOMES PINTO B.

56

25. TAYLOR, NA a WILKINSON, JG - Exercise-induced skeletal muscle growth.

Hypertrophy or Hyperplasia ? - Sports Med. 3(3):190-200, .1986

26. HALL-CRAGGS, ECB - The longitudinal division of fibers in overloaded rat skeletal

muscle - J. Anat. 107:459-470, 1970

27. MILNER-BROWN, HS, MELLENTHIN, M e MILLER, RG - Quantifying human muscle

strength, endurance and fatigue - Arch. Phys. Med. Rehabil. 67: 530-535, 1986

28. GILLIS, JM - Le controle intracellulaire de la contraction musculaire - La Recherche 6:840-

849, 1975

29. GREENLEAF, JE - Physiological responses to prolonged bed rest and fluid immersion in

humans - J. Appl. Pyhysiol. 5:619-633,1984

30. BAR-OR, O - Pathophysiological factors which limit the exercise capacity of the sick child

- Med. Sci. Sports Exerc. 18(3):276-282, 1986

31. ANIANSSON, A e ZETTERBERG, C, HEDBERG, M e HENRIKSSON, KG - Impaired

muscle function with aging. A background factor in the incidence of fractures of the

proximal end of the femur - Clin. Orthop. 191:193-201, 1984

32. CLAUSEN, JP a TRAP-JENSEN, J - Effect of training on muscular blood flow during

exercise - Acta Physiol. Scand. 94 :C 18, 1968

33. GORLIN, R - Dynamic vascular factors in the genesis of myocardial ischemia - J. Ann.

Cell. Cardiol. 1(3):897-906, 1983

34. SUGISHITA, Y, MATSUDA, M, IIDA, K, KOSHINAGA, J e:, UENO, M - Sudden

cardiac death at exertion - Jap. Circ. J. 47(5):562-572, 1983

35. COOPER, RG - Alteration during immobilization and regeneration of skeletal muscle in

cats - J. Bone Joint Surg. 54:919-953. 1972

36. WEISS, LN, CURETON, KJ, THOMPSON, FN - Comparison of serum testosterone and

androstenedione responses to weight lifting in men and women - Eur. J. Appl. Physiol.

50(3):413-419, 1983

Page 63: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989, 1:57-107 57

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

J. Martins e Silva

Instituto de Bioquímica, Faculdade de Medicina de Lisboa

SUMÁRIO

Este trabalho inclui duas vertentes. A primeira refere as vias metabólicas e

principais factores de regulação que intervêm na oxidação dos principais nutrientes

consumidos pelo músculo esquelético. Na segunda parte é revista a resposta

metabólica ao exercício físico.

São revistos os principais intermediários e etapas enzimáticas da glicólise (em

aerobiose e anaerobiose) e do metabolismo do glicogénio. Segue-se a análise da

formação e oxidação do acetil-CoA, que inclui o ciclo de Krebs e a fosforilação

oxidativa mitocondrial. Este processo, que faz parte da respiração celular e depende do

consumo de oxigénio, é também partilhado pelos resíduos provenientes da oxidação de

aminoácidos e ácidos gordos. É destacada a proveniência dos ácidos gordos livres

(alimentar. reservas do tecido adiposo ou do próprio tecido muscular), mecanismos de

transporte pelo sangue, captação transmembranar, transporte intracelular e utilização

metabólica (regeneração de depósitos de triacilglicerol ou oxidação). São focados os

principais intermediários e etapas enzimáticas da β-oxidação, cetogénese hepática e

consumo dos corpos cetónicos e respectiva intervenção na geração de ATP pelo

músculo. É revista a proveniência (digestão alimentar ou de outros tecidos) dos

aminoácidos captados do sangue pelos miocitos, destacada a importância da renovação

proteica e das etapas de conversão enzimática essenciais (transaminação e

desaminação oxidativa) na degradação dos aminoácidos, síntese proteica e ou

formação de derivados azotados dos aminoácidos. É abordada a origem e destino dos

grupos aminados removidos dos aminoácidos, quer para a geração de aminoácidos

diferentes ou a serem eliminados, após conversão em amoníaco e ureia. É focada a

utilização dos cetoácidos como precursores da glicose e glicogénio, através da

gliconeogénese.

O tipo de contracção e movimento produzidos dependem, em grande parte, da

estrutura e capacidade metabólica dos músculos esqueléticos envolvidos; enquanto

Palavras-chave: Exercício físico, metabolismo aeróbio e anaeróbio dos glícidos,

oxidação metabólica dos ácidos gordos e aminoácidos

Page 64: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

58

um esforço continuado, baseado nas fibras vermelhas musculares, requer constante de

energia obtida, preferencialmente, em aerobiose, as variações bruscas de actividade

que se baseiam na contractilidade das fibras brancas utilizam energia imediatamente

disponível, sob a forma de fosfocreatina e ATP pré-existentes e ou com recurso à

glicólise anaeróbia. Verifica-se que o tipo de nutrientes mais utilizados pelo músculo

esquelético para a obtenção energia total requerida depende de diversos factores, com

destaque para a intensidade e duração do exercício físico, e as características

morfológicas e composição em fibras musculares. Os glícidos são o material

energético mais consumido em todos os tipos de actividade física, sobretudo durante o

exercício moderado e intenso, enquanto os lípidos (ácidos gordos e corpos cetónicos),

utilizados pelo músculo esquelético e outros tecidos em períodos de repouso, são

primordiais no esforço de resistência. A adaptação do músculo esquelético ao esforço

assenta em modificações na actividade metabólica, induzidas por moduladores

alostéricos e hormonais, que tendem a reverter ao nível basal após um período de

inactividade. É referida a importância do glicogénio para o esforço físico continuado.

Em condições normais, o glicogénio hepático (em grande parte formado a partir de

precursores gliconeogénicos) assegura o fornecimento da glicose requerida pelo

músculo esquelético, sendo modificado pelas condições e dieta alimentar. Nos

músculos em fase de recuperação do esforço físico, o lactato pode ser consumido

como material energético e, em menor proporção, na gliconeogénese. A lactatemia,

aumentada durante o esforço, diminui no período de repouso subsequente,

particularmente se este incluir algum exercício. Admite-se que a redução acentuada do

pH intramuscular, resultante da acumulação de lactato no músculo durante o exercício

intenso, contribua para o desenvolvimento da fadiga e menor rendimento físico. O

consumo de ácidos gordos pelo músculo esquelético depende da intensidade do

esforço físico, do treino existente e da dieta. Cerca de metade dos AGL oxidados

durante o exercício moderado e prolongado resulta da fracção captada do sangue,

sendo a restante derivada da lipólise das reservas de triacilglicerol muscular. O treino

físico aumenta a capacidade de utilização dos corpos cetónicos pelos miocitos. O

exercício prolongado tende a induzir o aumento da proteólise (corporal e muscular)

aumentando o efluxo de aminoácidos para o plasma (que reverte ao normal no período

de recuperação, a par com a redução da síntese proteica). Alguns dos aminoácidos

naturais (alanina, aspartato, glutamato e glutamina) têm particular envolvimento

durante as fases de exercício e repouso muscular, enquanto os aminoácidos

ramificados (valina, leucina e isoleucina) são importantes fornecedores de energia

química nos períodos de actividade prolongada. Deste tipo de consumo resulta o

aumento do amoníaco e da ureia, em conjunto com o reaproveitamento dos cetoácidos

pela gliconeogénese.

INTRODUÇÃO

O trabalho muscular é uma função especializada, executada por células com

características morfológicas e funcionais adequadas, no contexto de um organismo em que

prevalece a diferenciação estrutural, funcional e metabólica. As células musculares possuem vias

Page 65: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

59

metabólicas e mecanismos de regulação com aspectos comuns aos dos restantes tecidos

corporais, embora evidenciem algumas particularidades específicas.

Numa perspectiva global, a actividade muscular não é um acto isolado, pois que depende,

funcional e metabolicamente, com maior ou menor relevância, dos nutrientes recebidos e da

participação dos restantes tecidos e órgãos, de modo integrado e coordenado por mecanismos de

acção global, designadamente endócrinos e do sistema nervoso. Assim, para citar alguns

exemplos desse conjunto cooperativo, enquanto o músculo promove o movimento, o fígado tem

um desempenho central no armazenamento e distribuição de nutrientes e produtos do

metabolismo pelos restantes tecidos, o tecido adiposo contém reservas energéticas para todo

organismo e o cérebro (e restante sistema nervoso) induz a formação e distribuição de estímulos

sinais eléctricos.

A composição estrutural e estado energético do músculo esquelético, assim como a

origem e importância da excitação nervosa para a contracção muscular, foram referidas

anteriormente neste trabalho.

Recorde-se que os nutrientes preferencialmente utilizados no metabolismo muscular

variam em função do estado alimentar do indivíduo (pós-prandial ou em jejum), em anoxia,

tetania e exercício. Esta diferenciação será particularizada no decorrer do texto.

Importa agora dar realce às particularidades metabólicas dos tecidos, em geral, e às do

músculo esquelético, em particular, quanto ao processo de obtenção de energia química, em

grande parte sob a forma de ATP. A contribuição integrada do metabolismo hepático e adiposo

será mencionada a propósito da adaptação do organismo ao exercício físico e necessidades

energéticas do músculo.

METABOLISMO OXIDATIVO DOS PRINCIPAIS NUTRIENTES

No músculo esquelético (assim como na generalidade dos tecidos corporais), a oxidação

metabólica final dos glícidos (sob a forma de monossacáridos) ocorre em anaerobiose (glicólise

anaeróbia, Fig.1a) e ou em aerobiose (pelo mecanismo mitocondrial de respiração celular

(Fig.1b), sendo este último processo comum para a oxidação final dos constituintes de lípidos

(ácidos gordos) e proteínas (aminoácidos). Em alguns tecidos (p. ex., retina, eritrocitos), a via

glicolítica é o único processo de obtenção de energia química necessária à sua sobrevivência e

funcionalidade.

A glicose é o nutriente privilegiado de todas as células corporais no período pós-prandial,

a partir do qual obtêm ATP por oxidação. Exceptuando menos de 2% da glicose metabolizada

pela via das fosfopentoses, a quase totalidade é consumida exclusivamente através da glicólise

anaeróbia ou, em condições de boa oxigenação, pela glicólise e fosforilação oxidativa. A

quantidade de ATP gerada em aerobiose pela oxidação de glícidos, lípidos e proteínas (de

origem alimentar ou reservas corporais) é de cerca de 95 % do total (1,2); a fracção energética

(ATP) restante provém da oxidação anaeróbia dos monossacáridos (de origem alimentar ou em

depósito sob a forma de glicogénio) através da glicólise. Esta via existe em todas as células

humanas, tendo como principal vantagem a rapidez (cerca de 2,5 vezes a das oxidações aeróbias)

com que extrai a energia química da glicose (e, indirectamente, de outras hexoses e pentoses) na

ausência de oxigénio, através da qual são formadas moléculas de ATP. Por via deste atributo, a

glicólise é particularmente útil em muitos tecidos, em particular nas situações que requeiram

grande rapidez de acção e ou haja limitação crítica de oxigénio tecidual (2-5). É o que sucede,

Page 66: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

60

p.ex., durante a actividade contráctil, dependente de músculos em que prevalecem as fibras

brancas de contracção rápida (6).

De momento, interessa focar a utilização metabólica da glicose, preferencialmente

utilizado pelo músculo como fonte energética em período pós-prandial, assim como as condições

em que aquela opção dá lugar ao consumo privilegiado de ácidos gordos, corpos cetónicos e

aminoácidos.

(Desaminação oxidativa)

(β-

Oxidação)

2H

O2

MITOCÔNDRIA (1b)

Cadeia respiratória n2H

H2O

Acetil-CoA

Ciclo de Krebs

Piruvato

Glicose 6-fosfato Glicos

e

Glicogénio

Lactato

Ácidos gordos Aminoácidos Monossacáridos

ADP ATP

CITOSOL (1a)

Glicose

Page 67: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

61

FIGURA 1

Representação esquemática da utilização metabólica da glicose (proveniente do

plasma) pelas células. 1ª: A glicose presente no citosol, depois de fosforilada na

posição 6, contribui para a formação da reserva de glicogénio celular (quando não é

utilizada) ou é oxidada pela via glicolítica para a formação imediata de ATP; dessa

oxidação resulta o piruvato que, na ausência de oxigénio, é reduzido em lactato; 1b:

Oxidação aeróbia, intramitocondrial, dos principais nutrientes energéticos celulares,

designadamente, o piruvato (proveniente da oxidação dos glícidos em aerobiose),

ácidos gordos e aminoácidos, com recurso ao ciclo do ácido cítrico e à cadeia

respiratória mitocondrial. Da oxidação em aerobiose pela glicólise e ciclo do ácido

cítrico resultam equivalentes redutores (2H+), transportados pela cadeia respiratória

até ao seu aceitador final (o oxigénio molecular), originando a formação de

moléculas de ATP por fosforilação oxidativa.

METABOLISMO DO GLICOGÉNIO E OXIDAÇÃO DA GLICOSE

Relativamente ao metabolismo glicídico, o músculo apresenta três características

próprias: (i) O glicogénio, assim como a glicose, são para uso próprio, (ii) A quantidade de ATP

requerido varia substancialmente entre a fase de repouso e o exercício máximo; (iii) A

gliconeogénese muscular é pouco relevante, pelo que a maior parte da glicose indispensável para

consumo metabólico do músculo provém da circulação ou das reservas de glicogénio do próprio

músculo.

Influxo celular da glicose - A captação da glicose em circulação no sangue pelo músculo

depende da presença de insulina, a qual activa um transportador específico da glicose (GLUT-4)

a nível do sarcolema. A insulina é secretada pelas células β dos ilhéus de Langerhans

pancreáticos à medida que aumenta a glicemia no território da veia porta. Esta evolução justifica

que a glicemia e a insulinemia aumentem quase a para após a ingestão alimentar (7,8). A insulina

também estimula a captação de ácidos gordos pelo músculo esquelético, ainda que aquela acção

exiga a presença de glicose (9).

Para que a glicose proveniente do compartimento extra-celular seja metabolizada pela

célula tem de ser previamente fosforilada pelo ATP em glicose 6-fosfato; esta etapa, catalisada

pela hexocinase dá que início à glicólise. Porém, após a sua formação, a glicose 6-fosfato, tem

como opções metabólicas não só a glicólise mas também a sua polimerização em glicogénio

(glicogénese) (10).

Síntese e degradação do glicogénio- O glicogénio é um polímero que funciona como

depósito transitório da glicose, designadamente no músculo e fígado. A concentração de

glicogénio hepático (cerca de 5%, do peso tecidual) supera a que existe no músculo (inferior a

1%). Porém, o facto de a massa muscular (cerca de 50% do peso corporal) ser muito superior à

daquele órgão, justifica que nos músculos exista cerca do triplo da quantidade de glicogénio

hepática (11). Tal como no músculo, a síntese de glicogénio hepático aumenta no período pós-

prandial (12).

Ainda que a captação da glicose pelos hepatocitos seja independente da insulina, esta

hormona estimula a glicogénese e inibe a glicogenólise em ambos os tipos celulares (13). A

Page 68: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

62

baixa actividade enzimática da glicose 6-fosfatase no músculo (excepto em jejum, em que

aumenta substancialmente) explica que a glicose seja aqui encaminhada exclusivamente para as

vias de oxidação intracelular (14). Pelo contrário, os depósitos intra-hepáticos de glicogénio são

utilizados essencialmente para assegurar a manutenção da glicemia, na sequência da estimulação

da glicogenólise e efluxo da glicose desfosforilada para a corrente sanguínea (15,16).

O glicogénio disponibiliza quantidades extra de glicose aos miocitos quando as

exigências energéticas excedem os níveis captados do sangue pelos miocitos, como sucede no

exercício ou em jejum (17).

O facto de o glicogénio ser uma molécula muito ramificada reflecte-se nos múltiplos

pontos da molécula em que a glicogenólise tem início, simultaneamente; segue-se uma rápida

libertação de muitas moléculas de glicose 1-fosfato, o que é particularmente útil para suprir as

exigências energéticas da actividade muscular, sobretudo em situações de emergência (18)

(Fig.2). Pelo contrário, a glicogénese muscular processa-se mais lentamente do que a

glicogenólise. Estas duas vias partilham substratos e algumas enzimas mas têm regulação distinta

e finalidades opostas (19).

Glicogénio

Glicose -1- fosfato

Glicose -6- fosfato

Glicogénio fosforilase

Enzima desramificante

Glicano-transferase

Enzima ramificante

Glicogénio sintase

UDP glicose pirofosforilase

Fosfoglicomutase

FIGURA 2

Representação da glicogénese e glicogenólise

A glicogenólise é regulada, sobretudo ao nível da etapa catalisada pela fosforilase do

glicogénio, por dois tipos de mecanismos, alostérico e hormonal. Aquela enzima induz a

clivagem de ligações α- [1-4] nos segmentos periféricos da molécula de glicogénio, de que

resulta a remoção de sucessivos resíduos de glicose 1-fosfato (20). O processo requer duas

Page 69: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

63

enzimas auxiliares: a glicano transferase, que transfere unidades de trissacárido de um ramo para

outro, expondo as ligações α- [1-6], hidrolisadas pela enzima desramificante. A abertura destas

ramificações permite a continuação da fosforólise das ligações α- [1-4] de um novo segmento,

até faltarem cerca de 4 resíduos de glicose para outra ligação α- [1-6],onde intervêm novamente

a glicano transferase e a enzima desramificante, e assim sucessivamente, até à degradação

(quase) completa do glicogénio existente. Os resíduos de glicose 1- fosfato resultantes são, por

acção da fosfoglicomutase, convertidos no substrato iniciador da glicólise, a glicose 6-fosfato.

O controlo da glicogenólise no músculo difere do que se passa a nível do fígado, embora

haja alguns aspectos comuns. Assim, a glicogenólise muscular é inibida ao nível da fosforilase

(a) do glicogénio pelo ATP e pela glicose 6-fosfato pré-existentes. Acresce que a fosforilase do

glicogénio muscular, ao contrário da sua isoenzima hepática, disponibiliza um centro de fixação

para o AMP (resultante da reacção catalisada pela adenilato cinase ou da hidrólise do ATP), o

qual actua como activador da forma inactiva (b) da fosforilase. Durante a contracção muscular

intensa, o AMP, cuja concentração intracelular aumenta em resultado da hidrólise de ATP, liga-

se e activa a fosforilase do glicogénio, induzindo a dissociação sequencial de moléculas de

glicose 1-fosfato, imediatamente convertidas em glicose 6-fosfato para oxidação intra-celular.

Deste modo, a concentração de AMP sinaliza o estado energético celular, ao indicar a

necessidade de maior formação de ATP (20). Quando o músculo entra repouso, o aumento

imediato da concentração de ATP nos miocitos, induz a inibição do sítio alostérico para o AMP

nas moléculas de fosforilase do glicogénio, em simultâneo com a remoção dos grupos fosforilo

da fosforilase (a), inactivando-a.

A glicogenólise muscular pode ser também activada por outro processo, dependente do

aumento da concentração de Ca2+

no sarcoplasma e síncrono com o início da contracção

muscular (21,22). A fixação de 4 iões unidos na molécula de calmodulina na subunidade δ da

fosforilase cinase induz a conversão (activação) da fosforilase (b) do glicogénio em fosforilase

(a) (22), provocando um aumento rápido da quantidade de substrato indispensável a um ritmo

glicolítico centenas de vezes superior, próprio da contracção muscular (23).

Enquanto a fosforilação da fosforilase (b) origina uma enzima activa (a), sucede o inverso

com a sintase do glicogénio, cuja forma activa (a) é desfosforilada. Esta particularidade justifica

que aquelas duas enzimas, fundamentais na regulação da glicogenólise e glicogénese, dependam

de efeitos recíprocos, em que a activação de uma das vias decorre a par da inactivação da outra, e

vice-versa. Nesta regulação é crucial a concentração de AMPc intracelular (24, 25), na mediação

de acção hormonal em tecidos–alvo (26). Quando o AMPc aumenta no músculo, p.ex., por acção

da epinefrina, promove a activação de uma proteína cinase específica, de resulta a activação da

fosforilase cinase (b) em (a) e, desta, a fosforilação da forma (b) da fosforilase do glicogénio em

forma (a), que desencadeia a glicogenólise (27). Em simultâneo, a glicogénese permanece

inibida enquanto os níveis de AMPc estiverem elevados, devido à fosforilação da glicogénio

sintetase (a) em (b). Inversamente, a desfosforilação das enzimas mencionadas pela fosfoproteína

fosfatase -1 (por diminuição do AMPc) conduz ao aumento da glicogénese e inibição da

glicogenólise (28). Esta regulação é reforçada pela insulina, com acção contrária à induzida pelo

AMPc, que, ao activar fosfoproteína fosfatase e inactivar a fosforilação da sintase do glicogénio,

provoca a inibição da fosforilase do glicogénio, (29,30).

Adicionalmente, a insulina, ao aumentar a captação de glicose no miocito e a respectiva

conversão em glicose 6-fosfato, reforça, por acção alostérica deste intermediário metabólico, a

inibição da activação da fosforilase (b) (31,32). Deste modo, a insulina estimula a actividade da

Page 70: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

64

sintetase do glicogénio (que promove a glicogénese) e, simultaneamente, inibe a fosforilase do

glicogénio (anulando a glicogenólise), o que, em conjunto, favorece a glicogénese muscular.

Glicólise - A glicólise evolui através de onze etapas enzimáticas que, no total,

correspondem a uma sequência oxidativa sob regulação metabólica (Fig. 3). Cada reacção evolui

com determinado diferencial energético relativamente à que a antecede e à que se lhe segue (33).

1, 3-bisfosfoglicerato (C3)

Frutose 6-fosfato (C6)

Frutose 1, 6- bisfosfato(C6)

Glicose 6-fosfato (C6)

1, 3-bisfosfoglicerato (C3)

3-fosfoglicerato (C3)

2-fosfoglicerato (C3)

Fosfoenolpiruvato (C3)

Piruvato

Lactato

Gliceraldeído 3-fosfato (C3) Diidroxiacetona-fosfato (C3)

(Fosfofrutocinase -1) ATP

ADP

(Fosfoglicose isomerase) ATP

ADP

(Fosfoglicerato cinase)

(Fosfoglicerato mutase)

(Enolase)

ADP

ATP

(Piruvato cinase)

(Lactato desidrogenase) NADH+H+

NAD+

(Aldolase)

(Triose fosfato isomerase)

(Gliceraldeído 3-fosfato desidrogenase)

NAD+

NADH+H+

Page 71: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

65

FIGURA 3

Diagrama da glicólise. Todas as etapas enzimáticas decorrem no citosol, em duas

fases. Na primeira fase são requeridas duas moléculas de ATP por cada molécula de

glicose 6-fosfato inicial, de modo a elevar a energia livre dos intermediários

metabólicos imediatos e provocar a clivagem em duas trioses fosfato. Na segunda

fase da glicólise, que termina no piruvato (em aerobiose) ou lactato (em

anaerobiose), são recuperadas quatro moléculas de ATP por cada molécula de

glicose 6-fosfato oxidada.

No conjunto da via, são geradas quatro moléculas de ATP em duas das etapas em que é

maior a libertação de energia livre (34, 35).

Como já referido, a glicólise é iniciada após a fosforilação da glicose livre em glicose 6-

fosfato e subsequente conversão em frutose 6-fosfato, com gasto de uma molécula de ATP; na

etapa seguinte, a frutose 6-fosfato é fosforilada, por nova molécula de ATP, em frutose 1,6-

bisfosfato. No total, na primeira parte da glicólise são consumidos duas moléculas de ATP por

cada molécula de glicose oxidada (Fig. 4):

FIGURA 4

Esquema das reacções de fosforilação na 1ª parte da glicólise

Na segunda parte daquela via ocorre a clivagem de cada hexose-fosfato em duas

moléculas de triose-fosfato, interconversíveis (36).

Todavia, para que a glicólise possa prosseguir, a diidroxicetona-fosfato tem de ser

convertida em gliceraldeído 3-fosfato (37). Por conseguinte, a partir desta fase, a oxidação incide

em duas moléculas de gliceraldeído 3-fosfato por cada molécula de glicose 6-fosfato iniciadora

da via (Fig. 5)

A terceira parte inclui reacções de oxidação-redução e a síntese do ATP. A sequência

recomeça com a oxidação do gliceraldeído 3-fosfato, catalisada por uma desidrogenase

específica, de que resulta a remoção de um protão (H+) e um electrão (e

-) do substrato da reacção

e a formação do seu produto, 1,3-bisfosfoglicerato (38). Estes equivalentes redutores são

captados pela coenzima nucleótido nicotinamida adenina difosfato (NAD), gerando a sua forma

reduzida (NADH). Pelos motivos atrás apresentados, cada molécula de glicose oxidada na via

origina duas de NADH (39).

Frutose 6-fosfato + ATP Frutose 1,6-bisfosfato +ADP

ATP (Fosfrutocinase)

Glicose + ATP Glicose 6-fosfato + ADP (Hexocinase)

Page 72: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

66

FIGURA 5

Clivagem de uma hexose-fosfato (frutose 1,6- bisfosfato) em duas trioses- fosfato

(gliceraldeído 3-fosfato e diidroxiacetona-fosfato), por acção da aldolase. A triose-

fosfato isomerase interconverte, reversivelmente, ambas a trioses-fosfato. Na

glicólise, a reacção desequilibra-se no sentido da formação do gliceraldeído 3-

fosfato, que é o único substrato aceite na sua oxidação pela gliceraldeído 3-fosfato

desidrogenase.

Na glicólise, o ATP é formado em duas das etapas exergónicas com o maior diferencial

energético de toda a via, n um total de quatro moléculas daquele nucleótido (Fig.6).

FIGURA 6

Etapas exergónicas da glicólise

Considerando que há um dispêndio de duas moléculas de ATP na primeira parte da

glicólise e a formação de quatro moléculas de ATP na segunda parte, o rendimento da via é de

duas moléculas de ATP por mole de glicose oxidada.

As moléculas de NADH geradas na glicólise têm duas finalidades optativas. Na glicose

anaeróbia (e nas células sem mitocôndrias), intervêm na redução do penúltimo metabolito da

glicólise (piruvato) no produto final da via (lactato), na reacção (reversível) catalisada por uma

desidrogenase específica; a reoxidação do NADH possibilita a continuidade da glicólise em

anaerobiose, atendendo a que o NAD+ existe em quantidade limitada no citosol (Fig. 7) (39).

Gliceraldeído 3-fosfato

(Aldolase) (Isomerase)

Diidroxiacetona-fosfato

Frutose, 1,6-bisfosfato

(Fosfoglicerato cinase)

2(3-Bisfosfoglicerato+ATP) 2 (1,3-Bisfosfoglicerato+ADP)

(Piruvato cinase)

2(Fosfoenolpiruvato +ADP) 2(Piruvato +ATP)

Page 73: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

67

FIGURA 7

Reutilização dos equivalentes redutores (transferidos como NADH+H+) da glicólise

aeróbia.

Observa-se este resultado metabólico quando a quantidade de trabalho produzido pelo

músculo esquelético (em particular, pelas fibras brancas) excede a capacidade de oxigenação

tecidual e, consequentemente, os níveis de ATP gerados pela respiração celular; a contracção

muscular em hipoxia relativa passa a depender, como recurso de pouca duração, da glicólise

anaeróbia, que conduz ao aumento à acumulação de lactato no tecido muscular e aumento da

lactatemia (40,41). Neste último caso, o lactato, ao reduzir o pH intracelular, tem o

inconveniente de limitar a actividade glicolítica, e, consequentemente, a contracção máxima

além de um minuto, ao actuar (sobretudo) a nível da sua principal enzima reguladora, a

fosfofrutocinase (42).

Formação do acetil-CoA e respiração celular - Em aerobiose, a oxidação glicídica não

termina no lactato, antes prossegue com o precursor imediato, o piruvato. Este metabolito, depois

de atravessar as duas membranas mitocondriais, é convertido em acetil-CoA, também o produto

final da β-oxidação dos ácidos gordos (43, 44). A formação do acetil-CoA inicia as etapas finais

da oxidação aeróbia das principais biomoléculas, que inclui o ciclo de Krebs, do ácido cítrico ou

do citrato e a fosforilação oxidativa mitocondrial (Fig 1). O conjunto destas transformações

oxidativas, em que o oxigénio molecular participa como aceitador final dos electrões

provenientes das moléculas oxidadas e veiculados através da cadeia respiratória mitocondrial,

recebe a designação de respiração celular (45).

O acetil-CoA e alguns dos intermediários do ciclo de Krebs são, igualmente, produtos

finais da oxidação dos aminoácidos (44.) Aqueles e outros dos constituintes do ciclo do citrato

têm a particularidade de serem, também, o ponto de partida da biossíntese dos hidratos de

carbono, lípidos e proteínas corporais. O facto de participar em actividades catabólicas ou

anabólicas, caracteriza o ciclo de Krebs como um processo anafibólico. Esta característica é

estreitamente regulada por sinais metabólicos que, através de enzimas reguladoras das vias

anabólicas ou catabólicas, assinalam a existência ou ausência de energia química ou dos

produtos finais essenciais à manutenção e renovação da actividade e estrutura celulares.

Em aerobiose, os equivalentes redutores (2H+ e 2e

-) provenientes do par NADH são

transferidos para a matriz (citosol) das mitocôndrias através de um duplo sistema de vaivém

transmembranar, específico e irreversível, o do glicerol-fosfato (Fig.8) e o do malato-aspartato

(46) (Fig.9). Os equivalentes redutores transferidos da glicólise em aerobiose contribuem, assim,

D-Gliceraldeído 3-fosfato + NAD+ +Pi 1,3-Bisfosfoglicerato +NADH +H+

(Gliceraldeído 3-fosfato desidrogenase)

Piruvato + NADH +

H+

L-Lactato + NAD+

(Lactato desidrogenase)

Page 74: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

68

para a formação de ATP pela fosforilação oxidativa mitocondrial (47). Nesta situação, a glicólise

termina, virtualmente, no piruvato que, após atravessar a membrana interna mitocondrial, origina

o acetil-CoA por descarboxilação oxidativa (Fig 1). No músculo esquelético, bem como no

cérebro, prevalece o sistema de transferência do malato-aspartato.

FIGURA 8

Sistema de transferência do glicerol-fosfato. Cada par de átomos de hidrogénio do

NADH, ao ser captado por uma molécula de diidroxiacetona-fosfato, origina uma

molécula de glicerol 3-fosfato e outra de NAD+. A reacção é catalisada por uma

desidrogenase do glicerol-fosfato presente no citosol, sendo os dois equivalentes

redutores transportados até à face externa da membrana interna mitocondrial pelo

glicerol-fosfato (o qual não entra na mitocôndria). Neste ponto, a isoenzima

mitocondrial da desidrogenase do glicerol 3-fosfato regenera a diidroxiacetona-

fosfato, ao ceder os equivalentes redutores para uma molécula de FAD e, desta, para

a ubiquinona, com entrada na cadeia respiratória.

ATP

MITOCÔNDRIA

Cadeia respiratória

Glicólise

NADH + H+

NAD+

Diidroxiacetona fosfato

Glicerol 3-fosfato

CITOSOL

Membrana interna mitocondrial

FADH2

FAD

(Glicerol 3-fosfato desidrogenase) (Glicerol 3-fosfato desidrogenase)

Page 75: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

69

FIGURA 9

Sistema de transferência do malato-aspartato, operacional na maioria dos tecidos,

principalmente no miocárdio, fígado e rim. Os equivalentes redutores são

transportados do citosol para a matriz mitocondrial pelo NADH, onde são aceites

pelo oxaloacetato (Oxal), de que resulta a formação do malato (Mal), por acção da

desidrogenase do malato (D). O malato é, seguidamente, transportado para a matriz

mitocondrial por troca com o α-cetoglutarato, por um transportador (1) comum. Os

equivalentes redutores são, na matriz, transferidos (por uma reacção inversa à

verificada no compartimento anterior, catalisada pela malato desidrogenase

mitocondrial) do malato para o NAD+, do que resulta a formação de oxaloacetato e

NADH, sendo este oxidado pela cadeia respiratória. Para voltar ao citosol e dar

continuidade ao sistema, o oxaloacetato, para atravessar a membrana interna, é

transformado noutro intermediário, o aspartato, numa reacção de transaminação (T,

pela aspartato aminotransferase), com recurso a um grupo amina do glutamato. Ao

ser desaminado, o glutamato é transformado em α-cetoglutarato, por sua vez

transferido para o citosol pelo transportador 1. A saída do aspartato para o citosol

ocorre através do transportador glutamato-aspartato (2), por troca com o glutamato,

que segue o sentido inverso. Ao ceder no citosol o seu grupo aminado ao α-

cetoglutarato, o aspartato (por acção da aspartato aminotransferase do citosol)

transforma-se em oxaloacetato e origina glutamato, numa reacção de sentido

contrário à verificada na matriz mitocondrial. A formação do oxaloacetato citosólico

possibilita a continuidade deste sistema de transferência de equivalentes redutores,

transportados das reacções oxidativas pelo NADH.

(T) (T)

CITOSOL/ESPAÇO INTERMEMBRANAR MATRIZ MITOCONDRIAL

(Membrana interna mitocondrial)

(D)

Mal

Oxal

Asp Glut

α-Cet

NAD+

NADH

+H+

+ H+

NAD+

NADH

+H+

Oxal

Mal

α-Cet

Asp Glut

(D)

H+ H+

1

2

Page 76: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

70

Na célula muscular, a glicólise é regulada por modulação alostérica, principalmente a

nível de três das suas enzimas: hexocinase, fosfofrutocinase e piruvato cinase. A actividade da

hexocinase depende da presença de ATP, sendo inibida pela acumulação do seu produto final, a

glicose 6-fosfato. A fosfofrutocinase é estimulada por níveis elevados de AMP e frutose 2,6-

bisfosfato, e inibida pelo ATP, pH ácido, citrato, entre outros produtos formadas na via oxidativa

a jusante. A piruvato cinase é activada pela frutose 1,6 bisfosfato e inibida pelo ATP e alanina.

Um outro ponto de regulação está localizada na etapa catalisada pela desidrogenase do

gliceraldeído 3-fosfato, estimulada quando a relação [NAD+] / [NADH] é superior a 1, e inibida

quando <1 (33; 39).

Em aerobiose, cada molécula de piruvato (anião) utiliza o gradiente de H+

transmembranar para entrar nas mitocôndrias, através de um sistema simporta (1 piruvato- +1H

+)

localizado na membrana interna mitocondrial. A oxidação descarboxilativa (irreversível) do

piruvato em acetil-CoA decorre na matriz mitocondrial, por acção do complexo enzimático da

piruvato desidrogenase. No músculo, esta etapa é regulada por mecanismo alostérico e

modulação covalente, sendo estimulada por níveis elevados de piruvato, NAD e CoA e inibida

pelo ATP, acetil-CoA e NADH (39,48).

Formação e oxidação do acetil-CoA - O acetil-CoA produto comum do catabolismo dos

glícidos (piruvato), lípidos (ácidos gordos e corpos cetónicos) e proteínas (alguns aminoácidos) -

é oxidado pelo ciclo de Krebs (ou do ácido cítrico/citrato). Deste modo, o ciclo de Krebs

constitui a parte final de um processo oxidativo comum das principais moléculas nutrientes,

decorrente em aerobiose (Fig.10). Para que o ciclo funcione, o acetil-CoA conjuga-se com o

metabolito final do ciclo (o oxalacetato) numa reacção irreversível catalisada por uma enzima

limitativa (citrato sintase) que forma o citrato, molécula com 6 carbonos e três grupos

carboxílicos. Nas nove reacções subsequentes (catalisadas por enzimas livres ou aderentes à

membrana interna mitocondrial) obtém-se a regeneração do oxalacetato, são removidas duas

moléculas de CO2 (nas etapas da isocitrato desidrogenase e complexo da α-cetoglutarato

desidrogenase) e oito equivalentes redutores (nas duas etapas anteriores e em outras duas, estas

sob a acção catalítica da succinato desidrogenase e da malato desidrogenase) e é formada uma

molécula de ATP (por fosforilação associada ao substrato, pela enzima succinil-CoA sintetase)

(49).

Na conversão do piruvato em acetil-CoA e oxidação deste metabolito pelo ciclo de Krebs

há a redução de coenzimas intervenientes (designadamente, NAD+ e FAD), depois re-oxidados

no processo de formação do ATP por fosforilação oxidativa (50). Neste processo, genericamente

designado por respiração celular, é essencial a presença de oxigénio molecular, utilizado como

aceitador final de electrões e oxidante das coenzimas reduzidas. No conjunto das etapas de

oxidação envolvidas por cada molécula de piruvato inicial (tomando em conta a síntese do acetil-

CoA, uma volta do ciclo e a reoxidação do NADH e FADH2 associada à cadeia respiratória) são

formadas cerca de doze moléculas de ATP (51,52).

Poderá concluir-se que, à semelhança das vias oxidativas referidas anteriormente, o ciclo

de Krebs depende, em grande parte e em cada momento, dos níveis existentes de NAD+

(para a

captação de equivalentes redutores) e de ADP (para a formação de ATP, à custa da energia livre

obtida no processo oxidativo) (53). Neste conjunto, sobressaem, como enzimas reguladoras, a

desidrogenase do piruvato, a citrato sintase e a desidrogenase do α-cetoglutarato. A enzima

citrato sintase é activada pelos seus substratos (acetil-CoA e oxaloacetato) e inibida

alostericamente pelo ATP e cadeias longas de acil-gordo CoA (proveniente da β-oxidação dos

ácidos gordos). A isocitrato desidrogenase é activada pelo ADP e inibida pelo ATP e NADH. O

Page 77: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

71

complexo da α-cetoglutarato desidrogenase tem regulação semelhante à da piruvato

desidrogenase. A succinato desidrogenase é inibida pelo oxalacetato, enquanto a enzima malato

desidrogenase é estimulada pelo NAD+ (

54,55). Adicionalmente, no músculo, algumas das

enzimas oxidativas referidas são também activadas pelo aumento da concentração de Ca2+

na

fase de contracção (56,57).

OXALOACETATO

ACETIL-CoA

PIRUVATO

CITRATO

ISOCITRATO

α-CETOGLUTARATO

SUCCINIL-CoA SUCCINATO

MALATO

FUMARATO

CICLO DE

KREBS

FADH

2

NADH+H+

½ O2

O2

ATP

Page 78: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

72

FIGURA 10

Diagrama da respiração celular, que inclui o ciclo de Krebs e a fosforilação

oxidativa. O acetil-CoA, após conjugar-se com o oxaloacetato, origina a formação de

um composto de 6 carbonos, o citrato, primeiro intermediário de um ciclo de

transformações oxidativas de que resulta a perda de duas moléculas de CO2 e de 4

moléculas de H2. A oxidação destes equivalentes redutores pelo oxigénio, no

extremo final da cadeia de transporte de electrões, promove a fosforilação de

moléculas de ADP em ATP.

METABOLISMO OXIDATIVO DOS ÁCIDOS GORDOS

Origem, transporte e captação - Os ácidos gordos livres (AGL), ou ácidos gordos não

esterificados, constituem uma das mais importantes fontes energéticas do organismo, quer em

repouso quer durante o exercício (58). Cerca de 80% da quantidade energética necessária às

actividades do fígado e coração provém da oxidação local de ácidos gordos de cadeia extensa em

acetil-CoA e do subsequente consumo pelo ciclo de Krebs, em associação com a cadeia

respiratória.

No músculo, à semelhança de outras células corporais, os AGL derivam da hidrólise de

moléculas de triacilglicerol de origem alimentar ou das reservas lipídicas (existentes no próprio

tecido e, sobretudo, do tecido adiposo) (59,60). Devido à sua baixa insolubilidade no plasma, o

transporte de AGL e de outros lípidos pela circulação requer que se associem a proteínas

solubilizantes, originando complexos de AGL-albumina ou lipoproteínas.

Os AGL em circulação associados à albumina (cerca de 10 AGL por molécula proteica),

embora representem somente cerca de 4% dos lípidos plasmáticos, são a sua forma

metabolicamente mais activa; provêm da lipólise do triacilglicerol depositado no tecido adiposo

e, ainda, da acção lipolítica da lipoproteína lipase sobre o triacilglicerol transportado pelos

quilomicra aos tecidos-alvo (adiposo, glândula mamária, músculo esquelético e miocárdio)

(61,62).

No endotélio dos capilares que irrigam aqueles tecidos é detectada uma abundância de

moléculas da enzima lipoproteína lipase; da sua acção catalítica resulta a remoção progressiva

dos ácidos gordos das moléculas originais de triacilglicerol, até à obtenção final de AGL e

glicerol, captados rapidamente pelas células adjacentes (63). Exceptuando uma fracção dos AGL

que refluem para a circulação sanguínea, a maior parte é, na continuidade, oxidada para obtenção

de energia (sobretudo no músculo) ou formar ésteres de glicerol, com regeneração de

triacilglicerol (particularmente no tecido adiposo) (64). A captação de AGL pelas células

depende directamente da concentração presente no plasma; este valor aumenta em jejum, sendo

em grande parte determinado pelo grau de actividade lipolítica do tecido adiposo. Por seu lado, o

jejum, assim como o exercício físico, são factores determinantes no aumento da oxidação dos

AGL provenientes das lipoproteínas ou das reservas de triacilglicerol existentes em outros

tecidos, designadamente, nos músculos, esquelético e cardíaco (65). O aumento da concentração

plasmática de AGL, particularmente depois do exercício físico, induz uma redução acentuada do

consumo de glicogénio hepático e muscular, sugerindo que a oxidação lipídica minimiza a da

glicose (66). Este efeito será potenciado pela inibição exercida pelos ácidos gordos e corpos

cetónicos sobre a captação e acumulação da glicose nos miocitos (67).

Page 79: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

73

A entrada dos AGL nas células-alvo é precedida pela sua dissociação da albumina

(61,68), de modo a ligarem-se a outra proteína membranar, num processo de co-transporte com

Na+ que conduz os AGL ao citosol, onde se fixam a outra proteína que viabiliza o seu transporte

intracelular (69).

Ainda que lipoproteína lipase não esteja activa a nível do fígado, cerca de 20% dos AGL

provenientes dos quilomicra (na composição do triacilglicerol) são recebidos pelos hepatocitos

(70), na sequência da endocitose hepática dos quilomicra remanescentes (71). O resto de

triacilglicerol ainda existente nos quilomicra remanescentes, recebido pelos hepatocitos depois

de clivado nos seus constituintes, viabiliza a obtenção de energia através da oxidação de ácidos

gordos, originando ainda precursores de corpos cetónicos; em alternativa, se os ácidos gordos

excederem a quantidade necessária para o seu consumo imediato, são re-esterificados em novas

moléculas de triacilglicerol (64,72). Seguidamente, estas moléculas (formadas com ácidos

gordos provenientes do plasma ou sintetizados nos hepatocitos a partir do acetil-CoA) são

exportadas pelas lipoproteínas endógenas de muito baixa densidade (VLDL) para o tecido

adiposo e músculo, nos quais, à semelhança do processo da captação referido para os quilomicra,

a lipoproteína lipase promove a hidrólise de triacilglicerol, com subsequente captação dos seus

constituintes, designadamente os ácidos gordos (73,74). Estes são metabolizados na formação de

triacilglicerol pelos adipocitos (75), enquanto no músculo, pelo contrário, são preferencialmente

oxidados para o fornecimento de energia à actividade contráctil (60,67).

Oxidação dos ácidos gordos – A utilização metabólica dos ácidos gordos de cadeia

extensa como fonte energética do músculo segue um mecanismo semelhante (designado como β-

oxidação) ao de todos os tipos celulares onde ocorre, integrado num sistema mitocondrial

comum ao de outras biomoléculas (77,78). As cadeias longas de hidrocarboneto dos ácidos

gordos são estruturas com grau elevado de hidrogenação, pelo que, ao serem completamente

oxidadas, libertam mais do dobro da energia de oxidação das moléculas glicídicas ou proteicas

com peso equivalente (78). A oxidação dos ácidos gordos termina com a formação de moléculas

de acetil-CoA1, também obtidas pela oxidação da glicose e de alguns aminoácidos (Fig.1). Tal

como na oxidação dos glícidos, a oxidação progressiva dos ácidos gordos em acetil-CoA, depois

oxidado pelo ciclo de Krebs, produz equivalentes redutores e utiliza o mesmo tipo de nucleótidos

(NAD+ e FAD) para os transportar até à cadeia de transporte de electrões para a obtenção de

ATP (79,80). A oxidação dos ácidos gordos tem, porém, algumas particularidades. Assim, o

consumo de ácidos gordos como fonte energética varia (por vezes muito) de tecido para tecido e

é influenciado pelo estado metabólico, alimentar e actividade física do organismo. Enquanto a

oxidação de ácidos gordos pelo tecido nervoso é irrelevante, a sua utilidade para a actividade

muscular é muito acentuada. Adicionalmente, o acetil-CoA oxidado não conduz exclusivamente

à formação directa de ATP, pois que, a nível do fígado, é precursor da cetogénese (81,82).

A β-oxidação dos ácidos gordos processa-se na matriz mitocondrial, o que requer a

passagem daqueles lípidos do citosol para as mitocôndrias através da dupla membrana destas

estruturas (83). Os ácidos gordos com 12 ou menos átomos de carbono atravessam directamente

a membrana mitocondrial, mas a maioria, com cadeia mais extensa, são pré-activados (por acil-

sintetases) para que o seu transporte seja possível através de um sistema de vaivém, que inclui

uma molécula proteica transportadora, particularmente abundante no músculo (a carnitina) e

1 A oxidação completa dos ácidos gordos com número par de carbonos termina com duas moléculas de aceti-CoA

Cada uma com 2 átomos de carbono), enquanto os de número ímpar originam uma molécula de acetil-CoA e outra

de propionil-CoA (com 3 carbonos).

Page 80: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

74

duas isoenzimas (carnitina aciltransferase I e II) (Fig. 11) (84-87). A activação dos AG consiste

na sua união (por uma ligação tioéster) a uma molécula de coenzima A, com consumo de ATP e

formação de um composto de alta energia (acil gordo-CoA). Este intermediário metabólico tem

dois destinos principais: participa na formação dos lípidos membranares ou, o que é mais comum

no músculo, atravessa a barreira mitocondrial para ser convertido em acetil-CoA e contribuir

para a formação de ATP.

A oxidação das moléculas de acil-gordo-CoA derivadas de ácidos gordos saturados

decorre em três fases (83,88). Na primeira (β-oxidação), o composto inicial é submetido a ciclos

repetidos de reacções enzimáticas (com a intervenção de quatro enzimas diferentes, em

sequência: acil-CoA desidrogenase, enoil-CoA hidratase, β-hidroacil-CoA desidrogenase e acil-

CoA acetiltransferase); no termo de cada ciclo é removida uma molécula de acetil-CoA (Fig.

12).

Acil gordo-CoA

Acil gordo - carnitina Carnitina

CoA

Acil gordo - carnitina

CAT II T

MATRIZ

CAT I

Ácido gordo Acil gordo-CoA

ATP+CoA AMP+PPi

AS CITOSOL

Acil gordo-CoA

Acil gordo - carnitina Carnitina

CoA

M.I.M.

M.E.M.

Page 81: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

75

FIGURA 11

A passagem dos ácidos gordos para a matriz mitocondrial é precedida pela sua

activação, pelo ATP, num composto da alta energia, o acil gordo-CoA. A reacção,

catalisada por acil-CoA sintetases (ACS) específicas, requer a clivagem do ATP em

AMP e PPi. Cada uma das moléculas de acil-gordo atravessa sem dificuldade a

membrana externa mitocondrial (M.E.M.) após o que se associa a molécula de

carnitina. Desta reacção, catalisada pela carnitina-acil transferase I (CAT I), resulta a

formação de uma molécula de acil gordo-carnitina e a dissociação do CoA. A

membrana interna mitocondrial M.I.M.) permite a passagem moléculas de acil

gordo-carnitina para a matriz, por acção de uma translocase (T).Na matriz, as

moléculas de acil gordo-carnitina reagem com o CoA intramitocondrial, originando,

por acção da carnitina-acil transferase II (CAT II), a regeneração do acil-gordo-CoA

e a dissociação da carnitina, seguidamente devolvida ao espaço intermembranar pela

anterior translocase, dando possibilidade à endocitose de outras moléculas de acil-

gordo.

Recorrendo ao exemplo de AG mais comum (ácido palmítico, com 16 carbonos), a β-

oxidação requer 7 ciclos de sequência oxidativa, com a formação final, aproximada, de oito

moléculas de acetil-CoA e a remoção de 14 H2 (7 como NADH+H+

e 7 FADH2). Na segunda

fase, cada molécula de acetil-CoA, oxidada pelo ciclo de Krebs, origina 4 H2 (removidos por 3

moléculas de NAD+ e 1 de FAD). Na terceira fase, estes equivalentes redutores (a que acrescem

os produzidos na primeira fase) são transferidos para a cadeia respiratória, através da qual a

reoxidação de cada molécula de NADH e de FADH2 origina, respectivamente, cerca de 3 e 2

ATP.

A oxidação de ácidos gordos insaturados ou com nº ímpar de carbonos apresenta algumas

particularidades (88). No primeiro caso, são requeridas duas reacções adicionais (catalisadas por

uma isomerase e outra redutase), enquanto no segundo, a última etapa da β–oxidação gera uma

molécula de acetil-CoA e outra com 3 carbonos, o propionil-CoA, cuja oxidação final termina na

formação de um dos intermediários do ciclo de Krebs, o succinil-CoA.

Cetogénese – Em condições de jejum, fome ou consumo exagerado de ATP (p. ex., no

exercício físico prolongado), assim como na diabetes mellitus, verifica-se um acentuado

incremento da β-oxidação dos ácidos gordos no fígado, de que resulta grande quantidade de

acetil-CoA e, simultaneamente, de NADH (89-91). Na sequência do aumento da relação

[NADH]/[NAD+] intramitocondrial, o ciclo de Krebs tende a ser inibido, limitando a oxidação

do acetil-CoA (92). Quando este intermediário metabólico excede a quantidade de oxalacetato

disponível (para a formação de citrato e subsequente oxidação pelo ciclo de Krebs), aumenta

substancialmente a concentração intramitocondrial de acetoacetil-CoA, convertido em corpos

cetónicos (acetoacetato, β-hidroxibutirato e acetona) (93-95) (Fig. 13).

Aparte a acetona (derivada da descarboxilação do acetoacetato e eliminada do sangue sob a

forma de gás), os dois outros compostos, transportados pela circulação sanguínea, representam

uma fonte energética importante aos tecidos extra-hepáticos (em alternativa à glicose,

designadamente, no músculo esquelético e miocárdio) (96). Nas células- alvo, o acetoacetato e o

β-hidroxibutirato são reconvertidos em acetil-CoA e, desta forma, oxidados pelo ciclo de Krebs.

A conversão do β-hidroxibutirato em acetoacetato é o inverso da reacção da cetogénese,

catalisada pela mesma enzima, a 3-hidroxibutirato desidrogenase. Na etapa seguinte, é requerida

Page 82: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

76

a activação do acetoacetado em acetoacetil-CoA, à custa do CoA transferido do succinil-CoA

por uma transferase específica. Desta reacção resulta o succinato, outro dos intermediários do

ciclo de Krebs. Segue-se a dissociação do acetoacetil-CoA em duas moléculas de acetil-CoA

(por acção da tiolase) e a respectiva oxidação pelo ciclo de Krebs (97,98) (Fig.14).

FIGURA 12

Diagrama da β–oxidação dos ácidos gordos saturados e com número par de

carbonos, neste caso o palmitato (16 carbonos). Em cada etapa, catalisada por um

conjunto comum de quatro enzimas sequenciais, um resíduo com dois carbonos

(acetilo) é removido da extremidade carboxílica do palmitoil-CoA- CoA, sob a forma

de acetil-CoA.

Acil gordo-CoA (C16)

Acil-CoA desidrogenase

Enoil. CoA hidratase

β-Hidroxiacil-CoA desidrogenase

Acil-CoA aciltransferase

Acetil-CoA+ FADH2+NADH+H+

Acil gordo-CoA (C14)

Acil gordo-CoA (C12)

Acil gordo-CoA (C10)

Acil gordo-CoA (C8)

Acetil -CoA (C2)

Acil gordo-CoA (C6)

Acil gordo-CoA (C4)

Acetil-CoA+ FADH2+NADH+H+

Acetil-CoA+ FADH2+NADH+H+

Acetil-CoA+ FADH2+NADH+H+

Acetil-CoA+ FADH2+NADH+H+

Acetil-CoA+ FADH2+NADH+H+

Acetil-CoA+ FADH2+NADH+H+

Page 83: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

77

FIGURA 13

Formação de corpos cetónicos, a partir de duas moléculas de acetil-CoA e ou de uma

molécula de acetoacetil-CoA. Todas as enzimas da cetogénese existem e actuam nas

mitocôndrias hepáticas: (1) tiolase; (2) 3-hidroxi-3-metilglutaril-CoA sintase; (3) 3-

hidroxi-3-metilglutaril-CoA liase; (4) 3-hidroxibutirato desidrogenase. A acetona é

formada por descarboxilação espontânea.

METABOLISMO OXIDATIVO DOS AMINOÁCIDOS E GLICONEOGÉNESE

Origem e aproveitamento metabólico dos aminoácidos – Os miocitos, assim como a

generalidade das células, recebem (pelo sangue) aminoácidos (essenciais e não essenciais)

provenientes da digestão alimentar ou de outros tecidos corporais (99). Os aminoácidos são

transportados através da membrana plasmática por moléculas específicas de natureza proteica,

quer do meio extracelular para o intracelular, ou o reverso (2). Quando, devido a ingestão

proteica excessiva, os aminoácidos em circulação excedem a capacidade de utilização utilização

metabólica na formação de proteínas celulares ou compostos azotados e, adicionalmente, não

podem ser armazenados nem excretados, são aproveitados pelas células receptoras de dois

modos: oxidação ou transformação em glícidos e lípidos (99,100).

Etapas finais da β-Oxidação

CoA

Acetoacetil-CoA

2 Acetil-CoA

Acetil-CoA

(1) CoA

( 2)

β- Hidroxibutirato

Acetil-CoA

β-Hidroxi- β-metilglutaril-CoA

Acetoacetato

Acetona

(3)

CO2 NADH+H+

NAD+

(4)

Page 84: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

78

Além do músculo esquelético, também o fígado e os intestinos são particularmente

importantes no aproveitamento dos aminoácidos em excesso.

FIGURA 14

Consumo de corpos cetónicos por uma célula muscular. Genericamente, as

transformações conducentes à regeneração do acetil-CoA seguem um sentido inverso

ao da cetogénese, catalisadas pelas mesmas enzimas. Exceptua-se a etapa de

activação do acetilacetato por uma molécula de CoA, transferida do succinil-CoA

pela succinil-CoA-acetoacetato-CoA transferase (2).

O músculo esquelético contém cerca de 80% dos aminoácidos livres do total corporal,

enquanto o plasma, pelo contrário contém somente entre 0,2 a 6% (7,8). Entre os aminoácidos

essenciais livres existentes mo músculo, aproximadamente 80% são representados pelo

glutamato, glutamina e alanina; os dois últimos são, também, os principais transportadores de

grupos amina entre os diversos órgãos (101,102). Os aminoácidos ramificados (valina, leucina e

isoleucina) da alimentação são utilizados preferencialmente no músculo, em particular como

fonte energética (13).

β-Hidroxibutirato

Acetoacetato

NAD+

NADH

Acetoacetil-CoA

Succinil-CoA

Succinato

Citrato

Oxaloacetato

2 Acetil-CoA

(1)

(2)

(3)

CICLO DE KREBS

Page 85: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

79

Os aminoácidos exógenos e os intra-celulares (sintetizados de precursores, ou resultantes

da proteólise local) partilham opções metabólicas diversificadas: síntese proteica, formação de

derivados azotados e ou degradação oxidativa. Por conseguinte, a energia química pode ser

obtida pela oxidação dos aminoácidos das proteínas alimentares e das que constituem as

estruturas celulares; neste último caso, os aminoácidos utilizados como fonte energética provêm

de uma contínua renovação proteica e ou de um aumento excessivo da sua degradação em

condições especiais, fisiológicas ou patológicas (99, 103).

A renovação proteica caracteriza-se por um equilíbrio dinâmico entre a quantidade

degradada e a que é sintetizada diariamente (cerca de 1 a 2% do total proteico do organismo

humano) (104), ainda que em proporção variável de tecido para tecido, quer devido a diferenças

na vida média proteica ou da massa corporal (105). O músculo esquelético, ao totalizar cerca de

metade da massa corporal, representa um dos mais importantes sectores em que decorre a

renovação proteica (106,107). Em condições normais, cerca de 75% dos aminoácidos resultantes

da proteólise são reutilizados pelas mesmas células ou por células e tecidos diferentes, quer na

síntese de novas proteínas e derivados proteicos ou, ainda, como material energético. Quando em

excesso (e por não formarem depósitos), os aminoácidos tendem a ser rapidamente

transformados em outros produtos ou intermediários metabólicos com destinos distintos (108).

Também atendendo à fracção ponderal que representa, o músculo esquelético é

(potencialmente) a principal fonte energética não lipídica do organismo humano adulto. Esta

particularidade assume particular importância em situações de desnutrição prolongada ou

patológica (diabetes mellitus), ao possibilitar a oxidação preferencial dos aminoácidos nas

situações em que escasseiam ou existem deficiências na utilização metabólica de outros

nutrientes energéticos (108).

Os aminoácidos provenientes da alimentação são transportados para o fígado, onde

decorre a maior parte da sua metabolização (109). Neste processamento sobressaem dois tipos

essenciais de reacção: transaminação e desaminação. Pelo facto de as enzimas respectivas

(aminotransferases e desidrogenases) catalisarem reacções em equilíbrio relativo, podem

promover a degradação ou a síntese de aminoácidos em circunstâncias bem definidas. Nas

transaminações, a transferência do grupo amina de um aminoácido para um aceitador cetoácido

(geralmente o α- cetoglutarato), possibilita que este se transforme noutro aminoácido

(glutamato), enquanto o composto dador ( outro tipo de aminoácido) adquire a estrutura de

cetoácido (110). Na desaminação, o grupo amina dissocia-se do aminoácido, originando um

resíduo de 3 ou 4 carbonos com um grupo funcional cetona (cetoácido) (111). Os cetoácidos

derivados de qualquer daqueles tipos de reacções podem ser reutilizados (a) na regeneração de

aminoácidos, (b) intermediários das vias oxidativas, gerando energia química ou, havendo ATP

suficiente disponível, (c) na regeneração da glicose e glicogénio pela gliconeogénese. Interessa

para o presente texto analisar as duas últimas opções metabólicas.

Aproveitamento metabólico dos grupos amina -Os grupos aminados, depois de removidos

dos aminoácidos (e de se converterem em amoníaco, NH3), podem ser reciclados em diversas

reacções metabólicas ou, quando em excesso, excretados do organismo como ureia ou ião

amónio (NH4+) (109, 112- 114). Neste processo, o glutamato e a glutamina contribuem, em

particular, para a captação de grupos aminados, enquanto a glutamina, em conjunto com a

alanina (em apenas 1/10 do total), promovem o seu transporte entre os diversos órgãos, para

aproveitamento local.

No fígado, os grupos aminados são transferidos (no citosol) para o α- cetoglutarato (por

acção da glutamato aminotransferase), gerando glutamato. Enquanto a maior parte deste

Page 86: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

80

aminoácido intervém na síntese de outros aminoácidos (designadamente, o aspartato) ou em

outras funções metabólicas, uma fracção menor, depois de entrar nas mitocôndrias, é desaminada

(pelo glutamato desidrogenase); desta reacção resulta o grupo NH4+ para a síntese da ureia e um

resíduo de α-cetoglutarato, a ser consumido como material energético ou na gliconeogénese. O

ião amónio formado no intestino e rim é igualmente veiculado para o fígado e, no caso do rim

(na acidose metabólica), também eliminado pela urina. No fígado, o amoníaco/ião amónio

proveniente de todas as origens contribui para a síntese da ureia.

Nos tecidos que utilizam os aminoácidos com fonte energética por oxidação do

respectivo cetoácido, os grupos aminados são preferencialmente utilizados na formação de

glutamato e, deste, em glutamina, que os transporta até ao fígado (102,115). O músculo

esquelético tem ainda a particularidade de os grupos aminados excedentes serem transportados

para o fígado pela alanina, formada a partir do piruvato (pela alanina amino transferase)

(116,117).

FIGURA 15

Intermediários do ciclo de Krebs que derivam do esqueleto de carbono de

aminoácidos.

OXALOACETATO

ACETIL-CoA

PIRUVATO

CITRATO

ISOCITRATO

α-CETOGLUTARATO

SUCCINIL-CoA SUCCINATO

MALATO

FUMARATO

Alanina

Cisteína

Glicina

Hidroxiprolina

Serina

Treonina

Isoleucina

Leucina

Triptofano

ACETOACETIL-CoA

Leucina

Lisina

Fenilalanina

Triptofano

Tirosina

Asparagina

Aspartato

Tirosina

Fenilalanina

Isoleucina

Metionina

Valina

Arginina

Histidina

Glutamina

Prolina

Glutamato

Page 87: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

81

Esta via alternativa é particularmente importante nos períodos de exercício muscular

intenso em anaerobiose, em que são produzidas grandes quantidades de piruvato e lactato, a que

acresce o amoníaco resultante da proteólise (118). A par da formação da alanina e da glutamina

(119,120), aqueles produtos finais da glicólise são transportados para o fígado e aqui

reaproveitados para formar glicose (pela gliconeogénese), por seu lado reencaminhada para os

músculos e outros tecidos, completando-se assim uma sequência de transformações designadas

como ciclos da glicose-alanina (121,122) e da glicose - lactato e piruvato (ciclo de Cori)

(123,124).

Oxidação dos aminoácidos e gliconeogénese – Em condições fisiológicas, somente 10 a

15% da energia produzida pelo organismo provém da degradação de aminoácidos. Por seu lado,

o contributo de cada aminoácido naquela transformação depende de vários factores: composição,

utilização em biossínteses e disponibilidade.

Os aminoácidos cuja degradação termina em piruvato (alanina, cisteína, glicina, serina,

treonina e triptofano), α-cetoglutarato (glutamato, glutamina, arginina, histidina, prolina),

succinil-CoA (isoleucina, metionina, treonina, valina), fumarato (fenilalanina, tirosina) e ou

oxaloacetato (asparagina, aspartato) podem formar, a partir destes intermediários metabólicos, a

glicose e ou glicogénio pela via da gliconeogénese. Outros aminoácidos (fenilalanina, tirosina,

leucina, isoleucina, triptofano, lisina e treonina) que, ao serem degradados no fígado, originam

acetil-CoA e ou acetoacetil-CoA como produtos finais, são, a partir destes compostos,

convertidos em corpos cetónicos, sobretudo em situações de fome ou na diabetes descontrolada.

Alguns dos aminoácidos mencionados (fenilalanina, tirosina, triptofano, isoleucina e treonina)

são simultaneamente cetogénicos e glicogénicos (109,127,128). No conjunto, a sequência

catabólica específica para os vinte aminoácidos naturais termina em seis compostos que, directa

ou indirectamente, são oxidados pelo ciclo de Krebs, contribuindo para a formação de ATP

(109,113; 125-127).

Além dos aminoácidos glicogénicos (através dos respectivos cetoácidos), também o

lactato, glicerol e propionato são precursores da síntese de novo da glicose e glicogénio, que

ocorre, sobretudo, no fígado e (cerca de 1/10) no córtex renal. A gliconeogénese tem a

particularidade de partilhar muitas das enzimas da glicólise, ainda que actuando em sentido

inverso quando as reservas corporais de glicose e glicogénio ficam aquém do necessário; oferece

ainda a vantagem de reutilizar alguns dos produtos finais do catabolismo dos aminoácidos,

lipólise e glicólise, e assegurar os níveis adequados de intermediários do ciclo de Krebs. É o caso

oxaloacetato, p. ex., proveniente por desaminação do glutamato, ou por carboxilação oxidativa

do piruvato, é essencial para a oxidação das quantidades excessivas de acetil-CoA produzido em

situações de acentuada lipólise (126, 129).

RESPOSTA METABÓLICA AO EXERCÍCIO DINÂMICO

Fibras musculares, ATP e exercício físico - O sistema muscular encontra-se em

permanente actividade, em resposta a estímulos de intensidade e duração variáveis. Sendo o tipo

de contracção e movimento produzidos dependentes, em grande parte, da estrutura e capacidade

metabólica dos músculos esqueléticos envolvidos. Explica-se assim que um esforço continuado,

baseado nas fibras vermelhas musculares, requeira um fornecimento constante de energia,

enquanto as variações bruscas de actividade utilizam energia imediatamente disponível, utilizada

preferencialmente pelas fibras brancas (130).

Page 88: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

82

FIGURA 16

Via da gliconeogénese, em que se salientam os ciclos da glicose-alanina e de Cori. O

lactato (e também o piruvato), produzidos pela glicólise do músculo em exercício

intenso anaeróbio, é veiculado para o fígado. No fígado, aqueles produtos, bem como

outros metabolitos precursores da glicose/glicogénio, são convertidos em

fosfoenolpiruvato. A conversão do piruvato em fosfoenolpiruvato não é directa.

Primeiro, o piruvato, após entrar nas mitocôndrias é carboxilado em oxaloacetato

pela piruvato carboxilase; segue-se a redução do oxaloacetato em malato pela

respectiva desidrogenase (invertendo o sentido de oxidação do ciclo de Krebs);

depois de passar a membrana mitocondrial para o citosol, o malato é reconvertido,

por oxidação, em oxaloacetato pela isoenzima local, seguindo-se a descarboxilação

deste metabolito em fosfoenolpiruvato pela respectiva carboxicinase. Nas situações

em que há aumento da proteólise muscular, os grupos aminados resultantes da

degradação dos aminoácidos são transferidos para o piruvato, com formação de

alanina, transportada pela circulação para o fígado. Neste órgão, a alanina dissocia-se

em piruvato e grupos amina; enquanto estes são eliminados na ureia, o piruvato,

junto com outros precursores da glicose, são metabolizados pela gliconeogénese.

Glicose

Alanina

-NH2

Ureia

Pi

Glicogénio

Glicose 6-fosfato

Piruvato

Lactato

Fosfoenolpiruvato

Oxaloacetato

Reacções de

transaminação e

desaminação

Glicose 6-fosfato

Piruvato

Lactato

Alanina

-NH2

Page 89: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

83

A distribuição e proporção do tipo de fibras em cada músculo varia em função da actividade

desenvolvida, de acordo com observações em atletas e indivíduos sujeitos a determinado tipo de

actividade repetida (131). Acresce que características metabólicas e estruturais de cada tipo de

fibras musculares podem ser modificadas pela duração, intensidade e tipo de exercício e treino

físico mais intenso (132). O mesmo sucede com o alargamento das fibras, dependente da

intensidade do exercício, e subsequente aumento de volume dos grupos musculares envolvidos,

nos treinos de resistência ou força (133,134). Pelo contrário, a imobilização temporária ou

interrupção do treino físico revertem aquelas modificações ao estado inicial (135,136),

culminando na atrofia e na distribuição alterada das fibras musculares, como sucede em

situações de imobilidade prolongada ou definitiva (135) e, também, no envelhecimento (137).

A actividade metabólica das fibras brancas, em que escasseiam as mitocôndrias, depende

quase integralmente do ATP formado na glicólise, enquanto nas fibras vermelhas, ricas em

mitocôndrias, a glicose é completamente oxidada, originando, in vivo, cerca de 13 vezes mais

quantidade de ATP (138).

A concentração de ATP no músculo esquelético (cerca de 8mM) é, aproximadamente, 10

vezes superior à de ADP e 100 vezes à de AMP. Estes níveis mantém-se virtualmente constantes

durante o exercício sub-máximo, embora tendam a diminuir com a fadiga (139,140). Por seu

lado, a concentração de fosfocreatina é cerca de 3 vezes superior à de ATP, sendo 20% mais

elevada nas fibras do tipo II do que nas de tipo I (141). Porém, enquanto os níveis de ATP

permanecem constantes, a concentração da fosfocreatina diminui proporcionalmente ao esforço

físico desenvolvido, até a um valor constante; este nível é inversamente proporcional à

intensidade do exercício e, também, ao da VO2. Na origem desta interrelação está a concentração

de ADP, que não só estimula o consumo de fosfocreatina (para formar ATP) como aumenta a

fosforilação oxidativa mitocondrial e, consequentemente, o valor o consumo total de oxigénio

(VO2) (142). A situação é revertida pela interrupção do exercício, com a rapidíssima recuperação

dos níveis iniciais da fosfocreatina muscular (143).

A oxidação metabólica em aerobiose que predomina nos músculos vermelhos - ricos em

oxigénio (associado às moléculas de mioglobina), indispensável à fosforilação oxidativa

mitocondrial - possibilita a manutenção da contracção muscular durante horas; este tipo de

exercício utiliza cerca de 1/4 do ATP (por unidade de tempo) do que é dispendido no exercício

muscular máximo em anaerobiose, e consome cerca de 100 vezes mais nutrientes do que em

repouso, ainda que a concentração plasmática daquelas substâncias permaneça virtualmente

inalterada. Por seu lado, o exercício físico vigoroso e rápido, desenvolvido em anaerobiose,

aumenta a renovação do ATP muscular cerca de 1000vezes, ainda que a sua concentração

tecidual quase não varia. Numa posição intermédia, p.ex., em corridas de meia distância

desenvolvida no máximo da capacidade física, o ATP consumido provém, em partes iguais, do

metabolismo anaeróbio e aeróbio; à medida que aumenta a distância é também maior a

proporção de energia produzida em aerobiose. Em repouso, a glicólise e o ciclo de Krebs actuam

a cerca de 10%, ou menos, da respectiva capacidade máxima, com produção mínima de lactato,

ao passo que, durante a actividade física normal, o consumo de glicose e de oxigénio tende a

aumentar cerca de 20 vezes (144,145).

Em condições de equilíbrio dinâmico, o ATP é essencialmente formado por fosforilação

oxidativa, sendo a renovação do seu total corporal determinada directamente pelo valor da VO2.

Enquanto em repouso o consumo máximo de oxigénio varia entre 0,2-0,3 l/min, no esforço

máximo pode aumentar cerca de 20 vezes, de modo a possibilitar a síntese de ATP necessário

(146.).

Page 90: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

84

De facto, no músculo, ao contrário do que sucede na generalidade dos tecidos, verifica-se

grande variação das exigências energéticas em função do tipo de actividade desenvolvida. A

intensidade do exercício físico é o principal determinante da renovação do ATP, entre outros

factores, tais como a composição (em fibras musculares), eficiência mecânica, temperatura e

fadiga muscular. No exercício intenso de curta duração (p.ex., uma corrida de 100 metros), a

renovação do ATP corporal aumenta cerca de 3 vezes relativamente ao valor verificado durante

uma corrida de maratona e cerca de 50 vezes superior ao de repouso. Todavia, em outro tipo de

exercício, p.ex, contracção isométrica de curta duração, a renovação de ATP é cerca de 2/3 da

que se observa após pedalar vigorosamente durante 10 s, a que correspondem valores entre 300 e

400 vezes superiores aos de repouso (145). Estas diferenças na renovação do ATP foram

confirmadas em fibras musculares humanas isoladas, sujeitas a modos contrácteis distintos;

p.ex., a renovação de ATP das fibras musculares do tipo II é 3 a 4 vezes superior ao das fibras do

tipo I (147).

A concentração de ATP muscular, habitualmente constante e que raramente diminui mais

do que 30% no nível inicial durante actividades contrácteis mais exigentes, não parece ser um

factor determinante da fadiga muscular. Esta tem sido associada, entre outros factores

presumíveis, à desaminação dos nucleótidos adenílicos musculares. A desaminação do AMP em

IMP aumenta com a redução dos níveis de fosfocreatina e pH (148,149) e da capacidade

contráctil (144,150). Este tipo de situação verifica-se quando o exercício decorre em isquemia ou

hipoxia, de que resulta a diminuição dos níveis de fosfocreatina, maior formação de IMP (149), e

maior susceptibilidade à fadiga (151). A concentração de IMP aumenta com esforços energéticos

de curta duração ou mais prolongados de intensidade moderada, aparentemente associada à

redução do nível de glicogénio muscular e desenvolvimento da fadiga (151).

Nutrientes, formação de ATP e características do exercício físico - Diversos factores

influenciam o tipo de nutrientes mais utilizados pelo músculo esquelético para a obtenção

energia total requerida; entre outros, destacam-se a intensidade e duração do exercício físico, as

características morfológicas e composição em fibras musculares, o estado de ansiedade e

nutricional de cada indivíduo, e o ambiente em a actividade decorre).

Os glícidos são o material energético mais consumido em todos os tipos de actividade

física, sobretudo durante o exercício moderado e intenso, enquanto os lípidos (ácidos gordos e

corpos cetónicos), utilizados pelo músculo esquelético e outros tecidos em períodos de repouso,

são primordiais no esforço de resistência. Em qualquer dos casos, a utilização daqueles

nutrientes é determinada pelas características e funcionalidade das vias metabólicas

intervenientes na formação máxima de ATP. Numa perspectiva geral, e como termo de

comparação (por não pertencer à categoria de nutriente), verifica-se que o valor máximo

(mmol.s-1

.kg-1

) de formação do ATP no quadricípede crural em exercício dinâmico (152) provém

da degradação da fosfocreatina, em que o contributo deste composto é cerca do dobro do obtido

na glicogenólise e glicólise anaeróbia (152), 5 vezes o da oxidação completa do glicogénio

muscular (153) e, aproximadamente, 10 vezes o da oxidação aeróbia da glicose proveniente do

glicogénio hepático ou glicose obtida da alimentação (154) e dos ácidos gordos recebidos do

tecido adiposo (155). A oxidação conjunta glicose e ácidos gordos transportados pelo sangue ao

músculo é particularmente importante no período final do exercício prolongado (após serem

consumidas as reservas glicídicas endógenas), quase totalizando a quantidade de ATP formado a

partir o glicogénio muscular (Fig.17).

Page 91: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

85

FIGURA 17

Contributo relativo dos principais nutrientes, em termos de consumo de oxigénio,

durante o exercício físico prolongado até à exaustão. As reservas de glicogénio

muscular preenchem grande parte das exigências metabólicas durante a 1ª hora, a par

com um aumento da gradual do consumo de glicose e dos AGL em circulação. A

partir desse período e nas duas horas seguintes, virtualmente esgotadas as reservas de

glicogénio muscular, os AGL e a glicose (regenerada por gliconeogénese e resultante

da glicogenólise hepática) partilham o fornecimento de nutrientes indispensáveis à

continuidade do esforço físico. O período final é possibilitado, em grande parte, pela

oxidação dos AGL. Esquema adaptado de Fox EL ( 156).

Ainda que os ácidos gordos constituam o substrato energético preferencial do músculo

em repouso ou em actividade ligeira, as limitações impostas pela lipólise e transporte dos ácidos

gordos até ao músculo explicam (pelo menos inicialmente) que haja também algum consumo de

glicose. À medida que aumenta o esforço desenvolvido, é gradualmente maior o contributo da

oxidação glicídica. No seguimento da depleção das reservas de glicogénio muscular continuam a

Duração da actividade física (h)

100

50

0 4 2 3 1

Contributo de nutrientes

comuns para o VO2 (%)

Glicogénio muscular

Ácidos gordos livres

Glicose

Page 92: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

86

ser utilizados a glicose e ácidos gordos provenientes da circulação. Este último recurso não evita,

porém, que o rendimento físico diminua rapidamente à medida que se esgota a glicose, pois que

os ácidos gordos dão seguimento somente a actividade pouco intensa. Por seu lado, o consumo

da fosfocreatina e a glicólise anaeróbia são reservados para esforços físicos enérgicos (156).

Adaptação muscular ao exercício – O músculo esquelético reage ao esforço através de

modificações na actividade metabólica, induzidas por moduladores alostéricos e hormonais.

Estas alterações têm sido confirmadas por biopsia muscular em diversos tipos de exercício físico.

Verificou-se que o treino repetido e prolongado de exercício isométrico aumenta a

oxidação aeróbia de glícidos e lípidos, originando uma maior produção da ATP mitocondrial, a

par com o aumento da densidade capilar e do conteúdo de mioglobina muscular. Estas alterações

revertem ao estado inicial após algumas semanas de inactividade (157; 158). Por seu lado, o tipo

de nutriente utilizado é determinado pelo intensidade e duração do exercício físico, Assim, no

exercício intenso em que o consumo de oxigénio é superior a 70%, são consumidos quase só

glícidos, enquanto no exercício prolongado de intensidade moderada, a percentagem de energia

resultante da oxidação dos ácidos gordos a supera progressivamente a da glicose (159).

A adaptação do metabolismo glicídico ao esforço físico parece resultar de uma maior

capacidade oxidativa do ciclo de Krebs e da cadeia respiratória, em resposta ao aumento da

concentração de ADP e Pi resultantes da hidrólise do ATP consumido durante o exercício. O

ciclo de Krebs seria regulado pela actividade da α-cetoglutarato desidrogenase, cerca de 40% ou

90% mais elevada, respectivamente, no quadricípede crural de atletas treinados, com preparação

média ou boa. Nos mesmos indivíduos, acrescia um aumento 20 ou 50%. da capacidade de

captação de oxigénio muscular. Desta adaptação resultou um aumento substancial da produção

de ATP com o treino (18), que se reflectiria em menor actividade da glicólise (160-162) e da

glicogenólise (163,164) muscular, compensada por maior contributo (simultâneo) da β–oxidação

dos ácidos gordos (80,81) e da capacidade de utilização do triacilglicerol (165). O ATP e a

fosfocreatina diminuíam menos como o exercício após 3 e 7 meses de treino, enquanto se

registava um menor aumento de lactatemia (166).

A adaptação metabólica ao exercício máximo de curta duração segue um padrão distinto,

devido a uma necessidade imediata de energia, a níveis que excedem o valor máximo de

formação de ATP em aerobiose e, por consequência, induzem a intervenção do ATP sintetizado

pela glicólise anaeróbia e da fosfocreatina. Este tipo de adaptação, com aumento relevante da

concentração de ATP e fosfocreatina (166-168), bem como da actividade da miosina ATPase,

miocinase, fosfocreatina cinase (169) e enzimas reguladoras a glicólise (167,170), acentua-se

após um período de treino máximo, com substancial melhoria da capacidade física e resultados

subsequentes. Adicionalmente, o treino repetido de exercício máximo de curta duração parece

aumentar capacidade de adaptação à acidose muscular subsequente à acumulação de ácido

láctico (171).

Importância do glicogénio hepático para o exercício físico – Em condições normais, o

glicogénio hepático existente assegura o fornecimento da glicose requerida pelos tecidos

corporais, designadamente o músculo esquelético; cerca de 40% da glicose disponibilizada

provém de precursores gliconeogénicos. (172). Esta proporção aumenta gradualmente durante o

jejum, sendo quase total ao fim de 30 horas de privação alimentar (173). Entretanto, a quantidade

de glicogénio acumulado no fígado depende da proporção de glícidos ingeridos na refeição

anterior e da que é gerada por gliconeogénese, sendo virtualmente nula após 1 dia de jejum ou

em estado de privação alimentar total (172,174). A ingestão de dieta sem glícidos ou jejuns

repetidos diminuem substancialmente as reservas de glicogénio hepático, bem como e glicose em

Page 93: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

87

circulação. Pelo contrário, a substituição da anterior dieta por outra rica em glícidos, ainda que

com idêntico valor calórico, eleva o depósito de glicogénio para níveis superiores aos resultantes

de uma alimentação mista (174,175).

O exercício físico é também uma das causas de espoliação do glicogénio hepático (176),

sobretudo quando executado em jejum ou após uma dieta pobre em glícidos. (176). Nestas

condições, o rendimento físico e a glicemia diminuem, podendo a carência de glicose impedir a

continuidade do exercício (178,179). As reservas de glicogénio podem ser inteiramente

consumidas ao fim de 1 a 3h de esforço físico excessivo, sendo por isso aconselhável a ingestão

prévia de uma dieta rica em glícidos. Pelo contrário, se a alimentação for pobre em glícidos, a

recuperação do glicogénio fica aquém do que deveria, originando hipoglicemia durante o

exercício e reduzindo o respectivo rendimento (180). A quantidade de glicogénio hepático

regenerado pós-exercício varia, ainda, com o tipo de glícido administrado, além de influenciar

também o rendimento físico.

A glicose fornecida pelo fígado ao músculo esquelético aumenta com a carga de esforço

físico sendo também proporcional ao valor de VO2 (181-183). Esta variação seria desencadeada

pelo início da contracção muscular e respectiva intensidade, a que associaria a diminuição da

glicemia durante o exercício, com estimulação directa (pela glicose) e ou intervenção hormonal

(catecolaminas, glicagina e insulina) da respectiva fosforilase (184). Todavia, o esforço ligeiro

não altera, virtualmente, a glicemia habitual em repouso (183). No exercício desenvolvido em

jejum aumenta a participação da oxidação lipídica e a concentração de epinefrina em circulação,

enquanto diminui a insulinemia; este mecanismo como que compensa a hipoglicemia e a menor

disponibilidade de glicose para consumo muscular (179,185).

Variações do glicogénio muscular com a dieta e exercício - A quantidade de glicogénio

muscular, à semelhança do hepático, depende da actividade física e da qualidade da alimentação;

nos indivíduos sedentários com dieta normal mista, o conteúdo de glicogénio muscular

praticamente não se altera. Todavia, após 4 dias de jejum ou com uma alimentação pobre em

glícidos, a quantidade de glicogénio pode ser, respectivamente, 40 % ou 30% inferior; estes

depósitos pouco variam, também, se a alimentação for rica em glícidos e mantiver o

sedentarismo (186).

A situação modifica-se quando as alterações alimentares se associam ao exercício. Assim,

o glicogénio muscular dispendido durante o exercício pode ser regenerado lentamente durante o

jejum mas, se for administrada uma dieta rica em glícidos, a quantidade de glicogénio sintetizado

não só aumenta rapidamente no período de recuperação como atinge valores muito superiores

aos de repouso (187). Esta particularidade tem sido atribuída a diversos mecanismos,

intervenientes no transporte transmembranar da glicose e ou na activação da glicogénese

muscular (186).

A concentração de glicogénio muscular condiciona a capacidade para executar o

exercício físico. A execução intermitente (em períodos de 15 minutos) de um esforço sub-

máximo até à exaustão, intercalado por períodos de igual duração para repouso, induzia a

redução do valor de glicogénio do quadricípede crural até quase a zero ao fim de pouco mais de

uma hora de exercício, causando ainda incapacidade para a sua repetição (153). Porém, a

duração do esforço poderia duplicar ou triplicar se, durante 3 a 7 dias antes de um exercício sub-

máximo prolongado, os indivíduos estudados recebessem alimentação rica em glícidos

(178,186). Dietas de composição diferente mas valor calórico idêntico influenciavam, também, a

concentração de glicogénio muscular, repercutindo-se na duração de esforço até ao esgotamento

físico, em que este coincidia com a depleção total do glicogénio (186). A administração de uma

Page 94: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

88

dieta rica em glícidos durante um período de repouso de 3 dias possibilitava a recuperação rápida

dos níveis de glicogénio muscular, sobretudo em indivíduos com treino físico (186).

No músculo em repouso, a fosforilase (a) do glicogénio perfaz somente cerca e 5 a 10%

do total daquela enzima, maioritariamente na forma inactiva, (b) (188). Ainda que ambas as

formas de fosforilase tenham igual capacidade glicogenolítica, a forma activa, ao contrário da

(b), responde directamente a diversos estímulos associados à contracção muscular. Acresce que a

sensibilidade da fosforilase (a) aos principais moduladores (ADP, AMP, IMP, Pi) é muito

superior à da forma (b). O facto de a fosforilase fazer parte de um complexo com o glicogénio,

retículo sarcoplásmico e outras enzimas (cinase e fosfatase da fosforilase), justifica a eficácia do

Ca2+

que, ao passar daquele compartimento subcelular para o citosol, induz a activação da

fosforilase, desencadeando a glicogenólise em conjunto com a contracção muscular (22,189). A

estimulação dos receptores β-adrenérgicos pela epinefrina induz o aumento do AMPc e a

subsequente cascada de activação, que termina na conversão da forma (b) em forma (a) da

fosforilase pela respectiva cinase (22, 189).

A activação da fosforilase (b) em (a), ainda que decisiva para o início da glicogenólise

não é, porém, suficiente. Aparentemente, o aumento da concentração do Pi, resultante da

hidrólise do ATP e da fosfocreatina durante o exercício muscular, é essencial para desencadear a

degradação do glicogénio (22,188, 189) A continuação do exercício muscular tende a reverter a

fosforilase (a) em (b), o que poderá ser devido à redução do pH, ao inibir a fosforilase cinase

(190).

Formação e remoção do lactato muscular – O lactato tende a acumular-se no músculo

esquelético (e daí passar para o sangue venoso periférico) sujeito a exercício intenso, em

resultado de duas causas principais: (a) início rápido da glicólise com o exercício dinâmico e (b)

grande incremento da glicólise anaeróbia, que atinge níveis muito superiores aos da fosforilação

oxidativa. Esta, por seu lado, é limitada pela quantidade de oxigénio fornecido ao músculo em

contracção intensa, podendo ser insuficiente para dar continuidade ao metabolismo aeróbio. No

fim do período deste tipo de exercício muscular, a concentração de lactato pode exceder 30

mmole.kg-1 nos músculos utilizados e mais de 20 mM no sangue (191,192).

O lactato produzido pode ter dois destinos metabólicos: (a) gliconeogénese e (b) oxidação

nos tecidos periféricos (incluindo os músculos em repouso). Nos músculos em fase de

recuperação do esforço físico, o lactato pode ser consumido como material energético e, em

menor proporção, na gliconeogénese.

A gliconeogénese ocorre no fígado (a maior proporção), no rim (cerca de 1/10 do valor

anterior) e, também, no músculo esquelético. Em músculos de rato (193-195) e homem (\96),

menos de 20 % do lactato muscular produzido em exercício máximo era convertido em

glicogénio no período de recuperação, sendo o restante re-oxidado pelos miocitos. Nos

mamíferos, a gliconeogénese muscular prevalece nas fibras de tipo II, enquanto nas de tipo I

predomina a oxidação do lactato (176, 197). Outros estudos mostraram que a regeneração do

glicogénio muscular aumentava a par com o aumento do lactato produzido e acumulado naquele

tecido. Concentrações de lactatemia superior a 13 mM (com correspondente redução do pH

sanguíneo) tendem a limitar o efluxo do lactato, repercutindo-se na sua acumulação prolongada

no músculo no período de recuperação do exercício (198); adicionalmente, limitam a glicólise

(por inibição da fosfofrutocinase) e favorecem a regeneração do glicogénio (199), em particular

nas fibras do tipo II. Se a deposição de lactato no músculo for baixa não há regeneração do

glicogénio, ainda que este tenha sido espoliado pelo exercício (200).

Page 95: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

89

Ao contrário do que se pensava anteriormente (201), menos de 20% do lactato é

veiculado pelo ciclo de Cori para o fígado, convertendo-se em glicogénio, sendo a maior parte

consumida perifericamente por oxidação (195,202).

Entretanto, o excesso de lactato em circulação, bem como a fracção acumulada no

músculo após um exercício intenso, diminuem mais rapidamente se o período de recuperação

incluir algum exercício (196,189). Esta particularidade deve-se ao aumento do fluxo sanguíneo,

que induz uma maior remoção do lactato para a regeneração de glicogénio no fígado ou para

oxidação em outros tecidos.

A redução acentuada do pH intramuscular, resultante da acumulação de lactato no

músculo durante o exercício intenso (203, 204) seria uma das causas do desenvolvimento da

fadiga e menor rendimento físico ainda a requerer confirmação.

A lactatemia aumenta durante o exercício sub-máximo, primeiro gradualmente e depois

de modo mais acentuado à medida que o exercício se intensifica (205). Este tipo de variação

resultará de uma combinação de processos que influenciam a síntese e efluxo do lactato

muscular para o sangue e a sua remoção pelos tecidos que o reutilizam. No inicio do esforço, a

produção de lactato excede um pouco a sua remoção do sangue mas, quando a intensidade do

exercício aumenta, a formação do lactato torna-se marcadamente excedentária. Em

consequência, aumenta a concentração de lactato nos músculos em actividade e no sangue e,

progressivamente, também nos restantes músculos inactivos e outros tecidos (101,206).

Admitiu-se que o aumento da lactatemia durante o exercício intenso resultaria de um

desequilíbrio entre o oxigénio disponível e o requerido pelos músculos em actividade (207),

Contudo este mecanismo foi posto em causa por resultados contraditórios (208,209). O lactato

produzido não seria somente um desperdício metabólico a eliminar em condições de exercício

mais intenso e ou hipoxia. Em alternativa, afigura-se como produto metabolicamente útil

permutado entre compartimento e tecidos diversos. A atestar a hipótese de “vaivém do lactato”

invoca-se o facto do fluxo metabólico do lactato ser, em determinadas condições (p. ex., no

esforço físico, moderado ou mais intenso, e em altitude) superior ao da glicose (206). O músculo

esquelético, pela grande proporção da sua massa corporal e tipo de actividade desenvolvida, seria

o principal tecido interveniente naquele sistema, não só pela vertente da produção mas também

como principal consumidor metabólico do lactato durante os períodos de repouso, actividade ou

recuperação do exercício (210,221). A captação e consumo de lactato da circulação sanguínea

pelo músculo esquelético, cardíaco ou fígado são influenciados por diversos factores,

nomeadamente: actividade metabólica do tecido recipiente, gradientes de lactato e pH

(tecido/sangue e líquido intersticial envolvente), fluxo sanguíneo e treino físico.

A captação pelo músculo esquelético verifica-se já em repouso (ainda que pouco

relevante), aumentando no período de recuperação do exercício intenso e durante o exercício

(ligeiro, moderado ou prolongado). Esta captação ocorre nos músculos em repouso ou em

actividade, nos quais o lactato, captado do sangue ou acumulado, é oxidado (212). A fracção

restante do lactato eliminado para a circulação é utilizada na gliconeogénese hepática (213) ou

muscular (em algumas fibras glicolíticas em repouso) (176,189) ou é oxidada pelo miocárdio

(214) e fibras oxidativas do tipo I do músculo esquelético em repouso (176). No miocárdio, o

consumo de lactato pode perfazer até 40% das necessidades energéticas em repouso, aumentando

até cerca de 60% (como substrato preferencial em substituição da glicose) quando o fluxo

sanguíneo e a captação de oxigénio também se elevam (215).

Contributo dos lípidos para a actividade muscular – Parte da energia requerida pelos

diversos tipos de exercício dinâmico provém dos lípidos, primariamente como ácidos gordos

Page 96: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

90

livres (216,217) e, em fracção mínima, como corpos cetónicos (218,219). A contribuição dos

lípidos para as exigências energéticas do exercício é particularmente relevante quanto este

decorre ao longo de várias horas. Na actividade física de intensidade moderada, o consumo dos

lípidos aumenta entre cerca de 46% em repouso até quase 90% ao fim de 4 horas de esforço

físico, a par com uma diminuição gradual da fracção de glícidos utilizados no metabolismo

oxidativo, entre cerca de 80% e pouco mais de 10% no mesmo período (159). As fibras

musculares de contracção lenta são as principais consumidoras dos ácidos gordos oxidados

durante o exercício moderado e prolongado (220). Eventualmente, a concentração elevada de

AGL registada neste tipo de actividade inibe a glicogenólise e a oxidação da glicose (221,22);

em alternativa, a existência de concentração elevada de glicogénio no músculo inibiria a

oxidação dos ácidos gordos não esterificados. Este mecanismo explicaria que o aumento dos

AGL em circulação durante o exercício físico prolongado fosse menor depois de uma refeição

rica em hidratos (223), do mesmo modo que a ingestão de glicose durante aquele tipo de

exercício diminui a lipólise (224).

A principal fracção dos AGL deriva da lipólise no tecido adiposo, constantemente

estimulada desde o início do exercício dinâmico prolongado (159,225,226). Desta acção resulta

um aumento rápido de AGL em circulação na primeira hora e mais discreto até à sua conclusão.

O exercício desencadeia a lipólise local na sequência da activação (fosforilação pela

proteína cinase A) da lipase hormono-dependente, pelo aumento das catecolaminas em

circulação e respectiva união aos receptores β-adrenérgicos da superfície membranar dos

adipocitos (227). O efeito lipolítico anterior é contrariado pela insulina, que, ao unir-se aos

receptores α- adrenérgicos dos adipocitos, induz a desfosforilação da referida lipase (228. Deste

modo, a lipólise pode variar em função de efeitos hormonais opostos, na dependência de

estímulos distintos, tais como o estado de actividade física e o estado de repouso em determinado

momento. Por seu lado, a quantidade de ácidos gordos postos em circulação pelos adipocitos

reflecte um balanço entre a actividade lipolítica e a capacidade de remoção dos AGL pelo sangue

de perfusão local, em contraponto à sua reesterificação, com regeneração de triacilglicerol

(225,229). O aumento da perfusão sanguínea do tecido adiposo que acompanha o exercício

prolongado (230.) promove a remoção dos AGL da lipólise local (231). Porém, um factor

determinante da mobilização dos AGL do tecido adiposo será a sua utilização pelo músculo

durante o exercício (232). Pelo contrário, no período pós-exercício parece aumentar

substancialmente a retenção e reesterificação dos AGL no tecido adiposo (233).

O treino prolongado tende a diminuir a resposta catecolaminérgica (234) assim como a

insulinemia (225), o que não obsta a que os AGL sejam mais utilizados pelos indivíduos

treinados do que pelos sedentários submetidos a esforço físico equivalente (234,236). Este efeito

parece resultar de uma maior capacidade lipolítica induzida pelo treino físico (237), que atinge o

seu máximo ao fim de alguns meses de exercício regular (238), na dependência de uma maior

sensibilidade dos receptores β- adrenérgicos dos adipocitos e eventual aumento da actividade da

lipase hormono-dependente (239,240). Ao fim de alguns dias de inactividade física, a capacidade

lipolítica tende a reverter ao nível inicial (241).

Os ácidos gordos transportados pelas lipoproteínas ao músculo esquelético, provenientes

da dieta (pelos quilomicra) ou do fígado (veiculados pelas VLDL) são captados, sobretudo pelas

fibras do tipo I, após a lipólise do triacilglicerol pela lipoproteína lipase membranar. A

actividade desta enzima é modulada por diversos factores, designadamente pelas exigências

metabólicas do momento que determinam o destino dos ácidos gordos para consumo energético

ou formação de depósitos de triacilglicerol (242). A regulação do triacilglicerol muscular e

Page 97: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

91

subsequente obtenção de ácidos gordos parece depender de uma lipoproteína lipase intracelular,

estimulável pelas catecolaminas (243). O contributo das lipoproteínas circulantes para o

fornecimento de ácidos gordos ao músculo é pouco relevante, ainda que seja evidente durante o

exercício intenso prolongado (244). Esta variação seria apoiada pelo aumento de actividade da

lipoproteína lipase muscular (duplica) e do tecido adiposo (cerca de 20 vezes mais) no exercício

físico com duração superior a uma hora (245), também constatada nos indivíduos treinados,

relativamente aos sedentários (246).

O consumo de ácidos gordos pelo músculo esquelético depende da intensidade do esforço

físico, do treino existente e da dieta. A captação dos ácidos gordos exógenos é um processo

rápido, independente de energia química e, em parte, dependente da concentração transportada

no sangue pela albumina; deste modo, a quantidade de ácidos gordos captados seria afectada

pelo mecanismo que regula a lipólise do tecido adiposo e, ainda pela capacidade da sua

utilização metabólica pelos miocitos (247).

Cerca de metade dos AGL oxidados durante o exercício moderado e prolongado é

proveniente da fracção transportada pela circulação sanguínea, sendo o resto derivado da lipólise

muscular. A actividade lipolítica dependeria de uma lipase intracelular activada pelas

catecolaminas e pela contracção muscular (243)., o que justificaria a redução do nível de

triacilglicerol intramuscular durante o exercício (248,249) e a recuperação dos valores iniciais

horas ou dias depois da sua interrupção (250,251).

Relativamente aos ácidos gordos, a oxidação dos corpos cetónicos muscular perfaz no

máximo, cerca de 7% da energia requerida. Em animais de laboratório e humanos constatou-se

que o treino físico aumentava a capacidade de utilização de corpos cetónicos (e ácidos gordos),

pelo que os indivíduos treinados beneficiavam mais da cetose associada ao exercício do que os

não treinados (252,253).

Utilização metabólica de aminoácidos e proteínas durante o exercício físico – Ao

contrário do que se pensava, o exercício físico promove alterações no balanço do azoto e do

metabolismo proteico em humanos, das quais resulta que a proteína degradada contribui para 3 a

10% do total energético consumido em esforços com duração superior a 1 hora. O exercício

prolongado tende a induzir o aumento da proteólise (corporal e muscular) e, por consequência,

maior efluxo de aminoácidos para o plasma (254- 256), o qual reverte ao normal no período de

recuperação (257). Por seu lado, a síntese proteica no músculo esquelético diminui com a

actividade contráctil (256-259), em particular no exercício exaustivo (256), normalizando após

seu termo (259).

No exercício de curta duração, a concentração plasmática de alanina, aspartato, glutamato

e glutamina aumenta na sequência das reacções( nos miocitos) de transaminação e da sintase da

glutamina (260,261, enquanto a dos aminoácidos ramificados permanece inalterada. Todavia, a

oxidação dos aminoácidos mantém-se praticamente inalterada naquele tipo exercício (254,255,

262).

O efluxo de alanina do músculo para a circulação sanguínea aumenta em proporção com

a intensidade do exercício (263). Parte daquela alanina (cerca de 10%) existe no estado livre,

sendo a restante formada por aminação do piruvato (264), à custa do grupo aminado resultante

do catabolismo de outros aminoácidos presentes no músculo, designadamente os ramificados

(116), mas sem exclusão de outros (265). O aumento da síntese da alanina muscular, permite que

os grupos amina em excesso que dela derivam sejam transportados pelo sangue ao fígado sob

uma forma não tóxica. A subsequente formação da glicose pela gliconeogénese a partir da

alanina recebida do músculo completa o ciclo da glicose-alanina (263), pelo qual a glicemia pode

Page 98: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

92

ser estabilizada enquanto a glicose transportada ao músculo melhora um pouco a sua

funcionalidade durante o exercício e em período de recuperação (264,266).

O glutamato, abundante no músculo, intervém na formação de amoníaco e da glutamina.

A concentração plasmática deste aminoácido, bem como a do aspartato, também aumenta com a

carga de esforço físico (256,267), diminuindo até cerca de 25% do valor após 1hora de exercício.

Durante o exercício sub-máximo, a concentração de glutamina muscular aumenta a par com a

redução do nível de glutamato, confirmando-se assim a intervenção da glutamina como aceitador

e transportador de amoníaco do músculo para outros órgãos (268). Porém, o aumento de

glutamina ocorre durante a primeira hora de exercício prolongado (de intensidade moderada ou

mais intenso), diminuindo no período seguinte até valores inferiores aos basais de acordo com

uma redução da sua síntese muscular (254,256,269).

A concentração plasmática de aminoácidos ramificados mantém-se relativamente estável

durante os primeiros 90 minutos de exercício prolongado, diminuindo até 40% no período

seguinte, o que estaria de acordo com sua participação na síntese da glutamina, sendo os

respectivos cetoácidos encaminhados para oxidação pelo ciclo de Krebs (254,269).

Entretanto, a quantidade de amoníaco produzido pelo músculo esquelético aumenta

proporcionalmente ao esforço realizado (267,270), em associação com a produção de lactato

(270,271). No exercício intenso, em que a quantidade de ATP utilizado pelo músculo tende a

exceder a da sua formação, o ADP acumulado (por acção da miocinase) participa na regeneração

de quantidades suplementares de ATP, junto com a acumulação de AMP. A desaminação deste

nucleótido, que ocorre rapidamente nas fibras musculares do tipo II (mas não nas de tipo I)

(272), não só assegura a continuidade de acção da miocinase como, indirectamente, contribui

para a regulação da glicólise e glicogenólise através da relação ATP/ADP (267). Deste modo, a

desaminação do AMP é a origem imediata do amoníaco (148,270), particularmente durante o

exercício intenso. O processo é revertido no período de recuperação do esforço pela reaminação

do IMP, com recurso aos grupos aminados de moléculas de aspartato (148). A evolução é

diferente no exercício prolongado de intensidade moderada, em que a quantidade de amoníaco

produzido, muito superior à que derivaria da desaminação do AMP, provém essencialmente da

desaminação de aminoácidos (273).

A ureia plasmática não é alterada pelo esforço intenso e breve, mas aumenta no exercício

de intensidade moderada com duração superior a 1hora (254,255,262,273). O aumento da

produção de ureia poderá confirmar o incremento da oxidação de aminoácidos como

compensação parcial do custo energético da actividade física e ou da gliconeogénese.

Aparentemente, níveis baixos de glicogénio muscular (p.ex. no jejum) associam-se a uma maior

degradação dos aminoácidos (273). Por si, a oxidação dos aminoácidos parece ser o mecanismo

determinante no controlo da reserva corporal de aminoácidos.

SUMMARY

This work includes two aspects. The first concerns the metabolic pathways and

key regulatory factors involved in the oxidation of key nutrients consumed by

skeletal muscle. In the second part is included the metabolic response to exercise.

We review the main intermediates and enzymatic steps of glycolysis (aerobically and

anaerobically) and glycogen metabolism. The following is the analysis of the

formation and oxidation of acetyl-CoA, which includes the Krebs cycle and

mitochondrial oxidative phosphorylation. This process, which is part of cellular

Page 99: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

93

respiration and depends on the oxygen consumption, is also shared by the oxidation

of amino acids and fatty acids. It is highlighted the origin of free fatty acids (from

alimentary digestion, reserves of adipose tissue or from muscle tissue itself), the

blood transport mechanisms, transmembrane uptake, intracellular transport and

metabolic utilization (regeneration of triacylglycerol deposits or oxidation). The

main intermediates and enzymatic steps of β-oxidation, ketogenesis and hepatic

consumption of ketone bodies and their intervention in the generation of ATP by the

muscle are focused. We review the origin (digested food or other tissues) of blood

amino acids obtained by myocytes, the importance of renewal of protein and

essential enzymatic conversion steps (oxidative deamination and transamination) in

the degradation of amino acids, protein synthesis and or nitrogen products derived

from amino acids. It addressed the origin and destination of the amino groups of

amino acids removed, either for the generation of different amino acids or to be

removed after conversion to ammonia and urea. It is focused on the use of ketoacids

as precursors of glucose and glycogen by gluconeogenesis.

The type of contraction and movement produced depend largely on the

structure and metabolic capacity of skeletal muscles involved, while a continuing

effort, based on red muscle fibers, requires constant energy obtained preferably under

aerobic conditions. Abrupt changes in activity which are based on contractility of

white fibers use energy immediately available, under the form of phosphocreatine

and ATP , either pre-existing or from anaerobic glycolysis. It appears that the type of

nutrients most used by skeletal muscle to obtain the total energy required depends on

several factors, especially the intensity and duration of exercise, and the

morphological characteristics and muscle fiber composition. Carbohydrates are the

most energetic material consumed in all types of physical activity, especially during

moderate and intense exercise, while lipids (fatty acids and ketone bodies), used by

skeletal muscle and other tissues are crucial in the effort of resistance. Adaptation of

skeletal muscle to the effort is based on changes in metabolic activity, induced by

hormonal and allosteric modulators, which tend to revert to baseline after a period of

inactivity. It referred to the importance of glycogen for continued physical effort.

Under normal conditions, the liver glycogen (a large part formed from gluconeogenic

precursors) ensures the required supply of glucose required for skeletal muscle, being

modified by the conditions and diet. In muscles recovering from exertion, lactate can

be consumed as energy and material, to a lesser extent in gluconeogenesis. The

lactatemia, increased during exercise, decreases in the subsequent rest period,

particularly if it includes some exercise. It is assumed that the sharp drop in

intramuscular pH, resulting from the accumulation of lactate in muscle during

intense exercise contribute to the development of fatigue and reduced physical

performance. Consumption of fatty acids by skeletal muscle depends on the intensity

of physical effort, the existing training and diet. About half of FFA oxidation during

moderate exercise and prolonged is a fraction captured from blood, the rest being

derived from the reserves of triacylglycerol lipolysis in muscle. Physical training

increases the capacity of utilization of ketone bodies by myocytes. The prolonged

exercise tends to lead to increased proteolysis (body and muscle) increased efflux of

amino acids into the plasma (which reverts to normal during the recovery period,

coupled with the reduction of protein synthesis). Some of the natural amino acids

Page 100: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

94

(alanine, aspartate, glutamate and glutamine) have particular involvement in the

stages of muscular exercise and rest, while the branched amino acids (valine, leucine

and isoleucine) are a major supplier of chemical energy during periods of prolonged

activity. This type of consumption results in increased ammonia and urea, together

with the reuse of ketoacids by gluconeogenesis.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Emília Alves o apoio de secretariado concedido a este trabalho.

BIBLIOGRAFIA 2

1. Ohta M, Jarrett RJ, Field JB. Measurement of ATP in tissues with the use of C14-O2

production from glucose-1-C14. J Lab Clin Med. 1966;67:1013-1024.

2. Spriet LL, Söderlund K, Bergström M, Hultman E. Anaerobic energy release in skeletal

muscle during electrical stimulation in men. J Appl Physiol. 1987;62:611-615.

3. Anundi I, de Groot H. Hypoxic liver cell death: critical PO2 and dependence of viability on

glycolysis. Am J Physiol. 1989;257(1Pt 1):G58-64.

4. Penney DG, Cascarano J. Anaerobic rat heart. Effects of glucose and tricarboxylic acid-

cycle metabolites on metabolism and physiological performance. Biochem J. 1970;118:221-

227.

5. Harris K, Walker PM, Mickle DA, Harding R, Gatley R, Wilson GJ, Kuzon B, McKee N,

Romaschin AD Metabolic response of skeletal muscle to ischemia. Am J Physiol.

1986;250:H213-220.

6. Edström L, Hultman E, Sahlin K, Sjöholm H. The contents of high-energy phosphates in

different fibre types in skeletal muscles from rat, guinea-pig and man. J Physiol. 1982

;332:47-58.

7. Berger M, Hagg SA, Goodman MN, Ruderman NB. Glucose metabolism in perfused

skeletal muscle. Effects of starvation, diabetes, fatty acids, acetoacetate, insulin and

exercise on glucose uptake and disposition. Biochem J. 1976;158: 191-202.

8. Klip A, Pâquet MR. Glucose transport and glucose transporters in muscle and their

metabolic regulation. Diabetes Care. 1990;13:228-243.

9. Reimer F, Löffler G, Hennig G, Wieland OH. The influence of insulin on glucose and fatty

acid metabolism in the isolated perfused rat hind quarter. Hoppe Seylers Z Physiol Chem.

1975;356:1055-1066.

10. Randle PJ, Newsholme EA, Garland PB. Regulation of glucose uptake by muscle. 8.

Effects of fatty acids, ketone bodies and pyruvate, and of alloxan-diabetes and starvation,

on the uptake and metabolic fate of glucose in rat heart and diaphragm muscles. Biochem J.

1964 ;93:652-665.

11. Brzezińska Z, Kobryń A. Liver and muscle glycogen content after glucose infusion in dogs.

Acta Physiol Pol. 1978;29:443-449.

12. Hers HG. The control of glycogen metabolism in the liver. Annu Rev Biochem.

1976;45:167-189.

13. Ozand P, Narahara HT. Regulation of glycolysis in muscle. 3. influence of insulin,

epinephrine, and contraction on phosphofructokinase activity in frog skeletal muscle. J Biol

Chem. 1964;239:3246-3252.

Page 101: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

95

14. Hirose K, Watanabe J, Kanamura S, Tokunaga H, Ogawa R. Significance of the increase in

glucose 6-phosphatase activity in skeletal muscle cells of the mouse by starvation. Anat

Rec. 1986;216:133-138.

15. Weber G. Study and evaluation of regulation of enzyme activity and synthesis in

mammalian liver. Adv Enzyme Regul. 1963;1:1-35.

16. Marrack D. Regulation of glycogen metabolism in man. Am J Clin Pathol. 1968;50:12-19.

17. Conlee RK, Rennie MJ, Winder WW. Skeletal muscle glycogen content: diurnal variation

and effects of fasting. Am J Physiol. 1976;231:614-618.

18. Brown DH, Gordon RB, Brown BI. Studies on the structure and mechanism of action of the

glycogen debranching enzymes of muscle and liver. Ann N Y Acad Sci. 1973 Feb

9;210:238-253.

19. Toews CJ, Ward GR, Leveille R, Sutton JR, Jones NL. Regulation of glycogenolysis and

pyruvate oxidation in human skeletal muscle in vivo. Diabetes. 1979;28, Suppl 1:100-102.

20. Barford D, Hu SH, Johnson LN. Structural mechanism for glycogen phosphorylase control

by phosphorylation and AMP. J Mol Biol. 1991;218:233-60.

21. Cohen P. Molecular mechanisms involved in the control of glycogenolysis in skeletal

muscle by calcium ions and cyclic AMP. Biochem Soc Trans. 1987;15:999-1001.

22. Hargreaves M, Richter EA. Regulation of skeletal muscle glycogenolysis during exercise.

Can J Sport Sci. 1988 ;13:197-203.

23. Tate CA, Hyek MF, Taffet GE. The role of calcium in the energetics of contracting skeletal

muscle. Sports Med. 1991;12:208-217.

24. Sutherland EW, Robison GA. The role of cyclic AMP in the control of carbohydrate

metabolism. Diabetes. 1969;18:797-819.

25. Walsh DA, Brostrom CO, Brostrom MA, Chen L, Corbin JD, Reimann E, Soderling TR,

Krebs EG. Cyclic AMP-dependent protein kinases from skeletal muscle and liver. Adv

Cyclic Nucleotide Res. 1972;1:33-45.

26. Liddle GW, Hardman JG. Cyclic adenosine monophosphate as a mediator of hormone

action. N Engl J Med. 1971;285:560-566.

27. Fell RD, McLane JA, Winder WW, Holloszy JO. Preferential resynthesis of muscle

glycogen in fasting rats after exhausting exercise. Am J Physiol. 1980;238:R328-332.

28. Lee EY, Silberman SR, Ganapathi MK, Petrović S, Paris H. The phosphoprotein

phosphatases: properties of the enzymes involved in the regulation of glycogen metabolism.

Adv Cyclic Nucleotide Res. 1980;13:95-131.

29. Cohen P, Nimmo HG, Proud CG. How does insulin stimulate glycogen synthesis? Biochem

Soc Symp. 1978;43:69-95.

30. Kruszynska YT, Home PD, Alberti KG. In vivo regulation of liver and skeletal muscle

glycogen synthase activity by glucose and insulin. Diabetes. 1986;35:662-667.

31. Danforth WH, Helmreich E. Regulation of glycolysis in muscle. I. The conversion of

phosphorylase beta to phosphorylase alpha in frog sartorius muscle. J Biol Chem. 1964

;239:3133-3138.

32. Hudson JW, Golding GB, Crerar MM. Evolution of allosteric control in glycogen

phosphorylase. J Mol Biol. 1993;234:700-721.

33. Ramaiah A. Regulation of glycolysis in skeletal muscle. Life Sci. 1976;19: 455-465.

34. Hess B, Boiteux A, Krüger J. Cooperation of glycolytic enzymes. Adv Enzyme Regul.

1969;7:149-167.

Page 102: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

96

35. Boiteux A, Hess B. Design of glycolysis. Philos Trans R Soc Lond B Biol Sci. 1981;293:5-

22.

36. Burton PM, Waley SG. The active centre of triose phosphate isomerase. Biochem J.

1966;100:702-710.

37. Orosz F, Ovádi J. A simple approach to identify the mechanism of intermediate transfer:

enzyme system related to triose phosphate metabolism. Biochim Biophys Acta.

1987;915:53-59.

38. Weber JP, Bernhard SA. Transfer of 1,3-diphosphoglycerate between glyceraldehyde-3-

phosphate dehydrogenase and 3-phosphoglycerate kinase via an enzyme-substrate-enzyme

complex. Biochemistry. 1982;21:4189-4194.

39. Kaplan NO. The role of pyridine nucleotides in regulating cellular metabolism. Curr Top

Cell Regul. 1985;26:371-381.

40. Pette D, Spamer C. Metabolic properties of muscle fibers. Fed Proc. 1986;45:2910-2914.

41. Sahlin K, Katz A, Henriksson J. Redox state and lactate accumulation in human skeletal

muscle during dynamic exercise. Biochem J. 1987;245:551-556.

42. Ui M. A role of phosphofructokinase in pH-dependent regulation of glycolysis. Biochim

Biophys Acta. 1966; 124: 310-322.

43. Behal RH, Buxton DB, Robertson JG, Olson MS. Regulation of the pyruvate

dehydrogenase multienzyme complex. Annu Rev Nutr. 1993;13:497-520.

44. Lee SH, Davis EJ. Carboxylation and decarboxylation reactions. Anaplerotic flux and

removal of citrate cycle intermediates in skeletal muscle. J Biol Chem. 1979;254:420-430.

45. Wikström M, Babcock GT. Cell respiration. Catalytic intermediates. Nature. 1990;348:16-

17.

46. Sánchez-Jiménez F, Martínez P, Núñez de Castro I, Olavarría JS. The function of redox

shuttles during aerobic glycolysis in two strains of Ehrlich ascites tumor cells. Biochimie.

1985;67:259-264.

47. Bookelman H, Trijbels JM, Sengers RC, Janssen AJ, Veerkamp JH, Stadhouders AM.

Reconstitution of malate-aspartate and alpha-glycerophosphate shuttle activity in rat

skeletal muscle mitochondria. Int J Biochem. 1979;10:411-414.

48. Randle PJ, England PJ, Denton RM. Control of the tricarboxylate cycle and its interactions

with glycolysis during acetate utilization in rat heart. Biochem J. 1970;117: 677-695.

49. Ochoa S.Enzymic mechanisms in the citric acid cycle. Adv Enzymol Relat Subj Biochem.

1954;15: 183-270.

50. Hansford RG. The control of tricarboxylate-cycle oxidations in blowfly flight muscle. The

oxidized and reduced nicotinamide-adenine dinucleotide content of flight muscle and

isolated mitochondria, the adenosine triphosphate and adenosine diphosphate content of

mitochondria, and the energy status of the mitochondria during controlled respiration.

Biochem J. 1975;146:537-547.

51. Mitchell P. Keilin's respiratory chain concept and its chemiosmotic consequences. Science

1979;206:1148-1159.

52. Brand MD, Murphy MP. Control of electron flux through the respiratory chain in

mitochondria and cells. Biol Rev Camb Philos Soc. 1987;62:141-193.

53. Kohen E, Kohen C, Hirschberg JG, Wouters AW, Thorell B, Westerhoff HV, Charyulu

KK. Metabolic control and compartmentation in single living cells. Cell Biochem Funct.

1983 ;1:3-16.

Page 103: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

97

54. Atkinson DE. Citrate and the citrate cycle in the regulation of energy metabolism. Biochem

Soc Symp. 1968;27:23-40.

55. Williamson JR, Cooper RH. Regulation of the citric acid cycle in mammalian systems.

FEBS Lett. 1980;117 Suppl:K73-85.

56. Denton RM, Rutter GA, Midgley PJ, McCormack JG. Effects of Ca2+ on the activities of

the calcium-sensitive dehydrogenases within the mitochondria of mammalian tissues. J

Cardiovasc Pharmacol. 1988;12 Suppl 5:S69-72.

57. Lawrence JC Jr, Salsgiver WJ. Levels of enzymes of energy metabolism are controlled by

activity of cultured rat myotubes. Am J Physiol. 1983;244:C348-355.

58. Keul J, Doll E, Keppler D. The substrate supply of the human skeletal muscle at rest, during

and after work. Experientia. 1967; 15;23):974-979.

59. Wertheimer E, Ben-Tor V. Fat utilization by muscle. Biochem J. 1952;50:573-576.

60. Spitzer JJ, Gold M. Free fatty acid metabolism by skeletal muscle. Am J Physiol.

1964;206:159-164.

61. Hagenfeldt L, Wahren J, Pernow B, Räf L. Uptake of individual free fatty acids by skeletal

muscle and liver in man. J Clin Invest. 1972;51:2324-2330.

62. Scow RO, Hamosh M, Blanchette-Mackie EJ, Evans AJ. Uptake of blood triglyceride by

various tissues. Lipids. 1972;7:497-505.

63. Olivecrona T, Hernell O, Egelrud T. Lipoprotein lipase. Adv Exp Med Biol. 1975;52:269-

279.

64. Bickerstaffe R, Annison EF. Lipid metabolism in the perfused chicken liver. The uptake

and metabolism of oleic acid, elaidic acid, cis-vaccenic acid, trans-vaccenic acid and stearic

acid. Biochem J. 1970;118:433-442.

65. Gollnick PD. Free fatty acid turnover and the availability of substrates as a limiting factor

in prolonged exercise. Ann N Y Acad Sci. 1977;301:64-71.

66. Rennie MJ, Winder WW, Holloszy JO. A sparing effect of increased plasma fatty acids on

muscle and liver glycogen content in the exercising rat. Biochem J. 1976;156:647-655.

67. Randle PJ, Newsholme EA, Garland PB. Regulation of glucose uptake by muscle. 8.

Effects of fatty acids, ketone bodies and pyruvate, and of alloxan-diabetes and starvation,

on the uptake and metabolic fate of glucose in rat heart and diaphragm muscles. Biochem J.

1964;93:652-665.

68. Blanchette-Mackie EJ, Scow RO. Effects of lipoprotein lipase on the structure of

chylomicrons. J Cell Biol. 1973;58:689-708.

69. Ockner RK, Manning JA. Fatty acid-binding protein in small intestine. Identification,

isolation, and evidence for its role in cellular fatty acid transport. J Clin Invest.

1974;54:326-338.

70. Dunn GD, Wilcox HG, Heimberg M. Temporal relationships between dietary, plasma,

hepatic, and adipose tissue lipids after short-term feeding of safflower oil to rats. J Lab Clin

Med. 1975 ;86:369-377.

71. Mahley RW, Hui DY, Innerarity TL, Beisiegel U. Chylomicron remnant metabolism. Role

of hepatic lipoprotein receptors in mediating uptake. Arteriosclerosis. 1989;9(1 Suppl):I14-

18.

72. Ide T, Sugano M. Oxidation and esterification of cis- and trans-isomers of octadecenoic and

octadecadienoic acids in isolated rat liver. Biochim Biophys Acta. 1984;794:281-291.

73. Robinson DS. The clearing factor lipase and its action in the transport of fatty acids

between the blood and tissues. Adv Lipid Res. 1963;1:133-182.

Page 104: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

98

74. Seidel D. Advances in lipoprotein research. Biochemical and clinical aspects. Nutr Metab.

1973;15:9-16.

75. Ball EG. Regulation of fatty acid synthesis in adipose tissue. Adv Enzyme Regul. 1966;4:3-

18.

76. Lehninger AL. The oxidation of higher fatty acids in heart muscle suspensions. J Biol

Chem. 1946;165:131-145.

77. Fritz IB, Davis DG, Holtrop RH, Dundee H. Fatty acid oxidation by skeletal muscle during

rest and activity. Am J Physiol. 1958;194:379-386.

78. Lindsay DB. Fatty acids as energy sources. Proc Nutr Soc. 1975;34:241-248.

79. Lehninger AL. Fatty acid oxidation and the Krebs tricarboxylic acid cycle. J Biol Chem.

1945;161:413.

80. Kennedy EP, Lehninger AL. Activation of fatty acid oxidation by

dihydrodiphosphopyridine nucleotide. J Biol Chem. 1951;190:361-368.

81. Stumpf PK. Metabolism of fatty acids. Annu Rev Biochem. 1969;38:159-212.

82. Greville GD, Tubbs PK. The catabolism of long chain fatty acids in mammalian tissues.

Essays Biochem. 1968;4:155-212.

83. Mahler HR, Wakil SJ, Bock RM. Studies on fatty acid oxidation. I. Enzymatic activation of

fatty acids. J Biol Chem. 1953;204:453-68.

84. Fritz IB, Marquis NR. The role of acylcarnitine esters and carnitine palmityltransferase in

the transport of fatty acyl groups across mitochondrial membranes. Proc Natl Acad Sci U S

A. 1965;54:1226-1233.

85. Trevisan C, DiMauro S. Activation of free fatty acids in subcellular fractions of human

skeletal muscle. Neurochem Res. 1983;8:551-561.

86. Bremer J. Carnitine--metabolism and functions. Physiol Rev. 1983;63:1420-1480.

87. Ramsay RR, Arduini A. The carnitine acyltransferases and their role in modulating acyl-

CoA pools. Arch Biochem Biophys. 1993;302:307-314.

88. McGarry JD, Foster DW. Regulation of hepatic fatty acid oxidation and ketone body

production. Ann Rev Biochem. 1980;49:395-420.

89. Havel RJ, Naimark A, Borchgrevink CF. Turnover rate and oxidation of free fatty acids of

blood plasma in man during exercise: studies during continuous infusion of palmitate-1-

C14. J Clin Invest. 1963;42:1054-1063.

90. Foster DW. Studies in the ketosis of fasting. J Clin Invest. 1967;4:1283-1296.

91. Witters LA, Trasko CS Regulation of hepatic free fatty acid metabolism by glucagon and

insulin. Am J Physiol. 1979;237:E23-29.

92. Williamson JR, Olson MS, Browning ET. Control of citrate formation in rat liver by the

nicotinamide-adenine dinucleotide redox state. Biochem J. 1967;104:45P-46P.

93. Krebs HA. The regulation of the release of ketone bodies by the liver. Adv Enzyme Regul.

1966;4:339-354.

94. Krebs HA, Wallace PG, Hems R, Freedland RA. Rates of ketone-body formation in the

perfused rat liver. Biochem J. 1969;112:595-600.

95. Krebs HA, Hems R. Fatty acid metabolism in the perfused rat liver. Biochem J.

1970;119:525-533.

96. Scholz R, Schwabe U, Soboll S. Influence of fatty acids on energy metabolism. 1.

Stimulation of oxygen consumption, ketogenesis and CO2 production following addition of

octanoate and oleate in perfused rat liver. Eur J Biochem. 1984;141:223-230.

Page 105: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

99

97. Page MA, Williamson DH. Enzymes of ketone-body utilisation in human brain. Lancet.

1971;2:66-68.

98. Beis A, Zammit VA, Newsholme EA. Activities of 3-hydroxybutyrate dehydrogenase, 3-

oxoacid CoA-transferase and acetoacetyl-CoA thiolase in relation to ketone-body utilisation

in muscles from vertebrates and invertebrates. Eur J Biochem. 1980;104:209-215.

99. Arnal M, Obled C, Attaix D, Patureau-Mirand P, Bonin D. Dietary control of protein

turnover. Diabete Metab. 1987;13:630-642.

100. Munro HN. Second Boyd Orr Memorial Lecture. Regulation of body protein metabolism in

relation to diet. Proc Nutr Soc. 1976;35:297-308.

101. Brooks GA. Anaerobic threshold: review of the concept and directions for future research.

Med Sci Sports Exerc. 1985;17:22-34.

102. Palmer TN, Caldecourt MA, Snell K, Sugden MC. Alanine and inter-organ relationships in

branched-chain amino and 2-oxo acid metabolism. Biosci Rep. 1985;5:1015-1033.

103. Mortimore GE, Pösö AR. Intracellular protein catabolism and its control during nutrient

deprivation and supply. Ann Rev Nutr. 1987;7:539-564.

104. Waterlow JC, Jackson AA. Nutrition and protein turnover in man. Br Med bull 1981; 37:5-

10.

105. Yuile CL, Lucas FV, Olson JP, Shapiro AB. Plasma protein turnover and tissue exchange;

influence of dietary protein and protein depletion. J Exp Med. 1959;109:173-186.

106. Sandow A. Skeletal muscle. Ann Rev Physiol. 1970;32:87-138.

107. Millward DJ, Bates PC, Brown JG, Rosochacki SR, Rennie MJ. Protein degradation and the

regulation of protein balance in muscle. Ciba Found Symp. 1979;75:307-329.

108. Owen OE, Reichard GA Jr, Patel MS, Boden G. Energy metabolism in feasting and fasting.

Adv Exp Med Biol. 1979;111:169-188.

109. Sakami W, Harrington H. Amino acid metabolism. Ann Rev Biochem. 1963;32:355-398.

110. Dunathan HC. Mechanism and stereochemistry of transamination. Vitam Horm.

1970;28:399-414.

111. Krebs HA. Metabolism of amino-acids: Deamination of amino-acids. Biochem J.

1935;29:1620-1644.

112. Lowenstein JM. Ammonia production in muscle and other tissues: the purine nucleotide

cycle. Physiol Rev. 1972;52:382-414.

113. Umbarger HE. Regulation of amino acid metabolism. Annu Rev Biochem. 1969;38:323-

370.

114. Shambaugh GE 3rd. Urea biosynthesis I. The urea cycle and relationships to the citric acid

cycle. Am J Clin Nutr. 1977;30:2083-2087.

115. Goldberg AL, Chang TW. Regulation and significance of amino acid metabolism in

skeletal muscle. Fed Proc. 1978 ;37:2301-2307.

116. Odessey R, Khairallah EA, Goldberg AL. Origin and possible significance of alanine

production by skeletal muscle. J Biol Chem. 1974;249:7623-7629.

117. Ruderman NB. Muscle amino acid metabolism and gluconeogenesis. Ann Rev Med.

1975;26:245-258.

118. Molé PA, Baldwin KM, Terjung RL, Holloszy JO. Enzymatic pathways of pyruvate

metabolism in skeletal muscle: adaptations to exercise. Am J Physiol. 1973;224:50-54.

119. Ruderman NB, Berger M. The formation of glutamine and alanine in skeletal muscle. J Biol

Chem. 1974;249:5500-5506.

Page 106: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

100

120. Garber AJ, Karl IE, Kipnis DM. Alanine and glutamine synthesis and release from skeletal

muscle. I. Glycolysis and amino acid release. J Biol Chem. 1976;251:826-835.

121. Felig P. The glucose-alanine cycle. Metabolism. 1973;22:179-207.

122. Snell K. Muscle alanine synthesis and hepatic gluconeogenesis. Biochem Soc Trans.

1980;8:205-213.

123. Dunn A, Chenoweth M, Schaeffer LD. Estimation of glucose turnover and the Cori cycle

using glucose-6-t-14C. Biochemistry. 1967;6:6-11.

124. Waterhouse C, Keilson J. Cori cycle activity in man. J Clin Invest. 1969;48:2359-2366.

125. Felig P, Marliss E, Owen OE, Cahill GF Jr. Blood glucose and gluconeogenesis in fasting

man. Arch Intern Med. 1969;123:293-298.

126. Exton JH. Gluconeogenesis. Metabolism. 1972;21:945-990.

127. Felig P, Wahren J. Protein turnover and amino acid metabolism in the regulation of

gluconeogenesis. Fed Proc. 1974;33:1092-1097.

128. Felig P. Amino acid metabolism in man. Ann Rev Biochem. 1975;44:933-955.

129. Newsholme EA. Carbohydrate metabolism in vivo: regulation of the blood glucose level.

Clin Endocrinol Metab. 1976;5:543-578.

130. Gollnick PD, Riedy M, Quintinskie JJ, Bertocci LA. Differences in metabolic potential of

skeletal muscle fibres and their significance for metabolic control. J Exp Biol. 1985;115:

191-199.

131. Tesch PA, Karlsson J. Muscle fiber types and size in trained and untrained muscles of elite

athletes. J Appl Physiol. 1985;59:1716-20.

132. Edström L, Grimby L. Effect of exercise on the motor unit. Muscle Nerve. 1986;9:104-126.

133. Yarasheski KE, Lemon PW, Gilloteaux J. Effect of heavy-resistance exercise training on

muscle fiber composition in young rats. J Appl Physiol. 1990;69:434-437

134. McDonagh MJ, Davies CT. Adaptive response of mammalian skeletal muscle to exercise

with high loads. Eur J Appl Physiol Occup Physiol. 1984;52:139-155.

135. Larsson L, Ansved T. Effects of long-term physical training and detraining on enzyme

histochemical and functional skeletal muscle characteristic in man. Muscle Nerve.

1985;8:714-722.

136. Baldwin KM, Fitts RH, Booth FW, Winder WW, Holloszy JO. Depletion of muscle and

liver glycogen during exercise. Protective effect of training. Pflugers Arch. 1975;354:203-

312.

137. Garthwaite SM, Cheng H, Bryan JE, Craig BW, Holloszy JO. Ageing, exercise and food

restriction: effects on body composition. Mech Ageing Dev. 1986;36:187-196.

138. Gollnick PD, Riedy M, Quintinskie JJ, Bertocci LA. Differences in metabolic potential of

skeletal muscle fibres and their significance for metabolic control. J Exp Biol.

1985;115:191-199.

139. Sahlin K, Katz A, Henriksson J. Redox state and lactate accumulation in human skeletal

muscle during dynamic exercise. Biochem J. 1987;245:551-556.

140. Broberg S, Sahlin K. Adenine nucleotide degradation in human skeletal muscle during

prolonged exercise. J Appl Physiol. 1989;67:116-122.

141. Söderlund K, Hultman E. ATP content in single fibres from human skeletal muscle after

electrical stimulation and during recovery. Acta Physiol Scand. 1990;139:459-466.

142. Meyer RA. A linear model of muscle respiration explains monoexponential

phosphocreatine changes. Am J Physiol. 1988;254(4 Pt 1):C548-553.

Page 107: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

101

143. Harris RC, Edwards RH, Hultman E, Nordesjö LO, Nylind B, Sahlin K. The time course of

phosphorylcreatine resynthesis during recovery of the quadriceps muscle in man. Pflugers

Arch. 1976;367:137-142.

144. Hultman E, Sjoholm H. Substrate availability. In: “Biochemistry of Exercise”, HG

Knuttgen, JA Vogel, J Poortmans (Eds). Human Kinetics: Champaign, 1983, pp 63-75.

145. Hultman E, Sjöholm H. Energy metabolism and contraction force of human skeletal muscle

in situ during electrical stimulation. J Physiol. 1983;345:525-532.

146. Andersen P, Saltin B. Maximal perfusion of skeletal muscle in man. J Physiol

1968;243:1337-1343.

147. Essen B, Jansson E, Henriksson J, Taylor AW, Saltin B. Metabolic characteristics of fiber

types in human skeletal muscle. Acta Physiol Scand 1975; 95: 153-165.

148. Meyer RA, Terjung RL. AMP deamination and IMP reamination in working skeletal

muscle. Am J Physiol. 1980;239:C32-38.

149. Dudley GA, Terjung RL. Influence of aerobic metabolism on IMP accumulation in fast-

twitch muscle. Am J Physiol. 1985;248(1 Pt 1):C37-42.

150. Sahlin K, Harris RC, Hultman E. Creatine kinase equilibrium and lactate content compared

with muscle pH in tissue samples obtained after isometric exercise. Biochem J.

1975;152:173-180.

151. Sahlin K, Katz A. Hypoxaemia increases the accumulation of inosine monophosphate

(IMP) in human skeletal muscle during submaximal exercise. Acta Physiol Scand.

1989;136:199-203.

152. Bergstrom J, Harris RC, Hultman E, Nordesjo L-O. Energy rich phosphagens in dynamic

and static work. In: “Muscle Metabolism during Exercise”. B Pernow, B Saltin (Eds). New

York: Plenum Press, 1971,pp 341-355.

153. Bergström J, Hultman E. A study of the glycogen metabolism during exercise in man.

Scand J Clin Lab Invest. 1967;19:218-228.

154. Coyle EF, Coggan AR, Hemmert MK, Ivy JL. Muscle glycogen utilization during

prolonged strenuous exercise when fed carbohydrate. J Appl Physiol. 1986;61:165-172.

155. Pernow B, Saltin B. Availability of substrates and capacity for prolonged heavy exercise in

man. J Appl Physiol. 1971;31:416-422.

156. Fox EL.” Sports Physiology”. Philadelphia: CS College Publishing/Saunders, 1984.

157. Holloszy JO, Booth FW. Biochemical adaptations to endurance exercise in muscle. Ann

Rev Physiol. 1976;38:273-291.

158. Wibom R, Hultman E. ATP production rate in mitochondria isolated from microsamples of

human muscle. Am J Physiol. 1990;259(2 Pt 1):E204-209.

159. Paul P. Effects of long lasting physical exercise and training on lipid metabolism.In:

“Metabolic Adaptation to Prolonged Exercise”, H. Howald, JR Poortmans (Eds). Basel:

Birkhäuser, 107, pp 156-193.

160. Baldwin KM, Winder WW, Terjung RL, Holloszy JO. Glycolytic enzymes in different

types of skeletal muscle: adaptation to exercise. Am J Physiol. 1973;225:962-966.

161. Blomstrand E, Ekblom B, Newsholme EA.Maximum activities of key glycolytic and

oxidative enzymes in human muscle from differently trained individuals. J Physiol.

1986;381:111-118.

162. Hurley BF, Hagberg JM, Allen WK, Seals DR, Young JC, Cuddihee RW, Holloszy JO.

Effect of training on blood lactate levels during submaximal exercise. J Appl Physiol.

1984;56:1260-1264.

Page 108: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

102

163. Hermansen L, Hultman E, Saltin B. Muscle glycogen during prolonged severe exercise.

Acta Physiol Scand. 1967;71:129-139

164. Sahlin B,Karlsson J. Muscle glycogen utilization during worçk of different intensities. In:

“Muscle Metabolism during Exercise”. B Pernow, B Saltin (Eds). New York: Plenum

Press, 1971,pp29-299.

165. Holloszy JO, Dalsky GP, Nemeth PM, Hurley BF, Martin WH III, Hagberg JM. Utilization

of fat as substrate during exercise:effect of training. In: Biochemistry of Exercise vol 6, No

16. B Saltin (Ed),Champaign:Human Kinetics 1986,pp 183-190.

166. Karlsson J, Nordesjö LO, Jorfeldt L, Saltin B. Muscle lactate, ATP, and CP levels during

exercise after physical training in man. J Appl Physiol. 1972;33:199-203.

167. Eriksson BO, Gollnick PD, Saltin B. Muscle metabolism and enzyme activities after

training in boys 11-13 years old. Acta Physiol Scand. 1973;87:485-497.

168. Nevill ME, Boobis LH, Brooks S, Williams C. Effect of training on muscle metabolism

during treadmill sprinting. J Appl Physiol. 1989;67:2376-2382.

169. Thorstensson A, Sjödin B, Karlsson J. Enzyme activities and muscle strength after "sprint

training" in man. Acta Physiol Scand. 1975;94:313-318.

170. Costill DL, Daniels J, Evans W, Fink W, Krahenbuhl G, Saltin B. Skeletal muscle enzymes

and fiber composition in male and female track athletes. J Appl Physiol. 1976;40:149-154.

171. Sharp RL, Costill DL, Fink WJ, King DS. Effects of eight weeks of bicycle ergometer

sprint training on human muscle buffer capacity. Int J Sports Med. 1986;7:13-17.

172. Nilsson LH, Fürst P, Hultman E. Carbohydrate metabolism of the liver in normal man

under varying dietary conditions. Scand J Clin Lab Invest. 1973;32:331-337.

173. Rothman DL, Magnusson I, Katz LD, Shulman RG, Shulman GI. Quantitation of hepatic

glycogenolysis and gluconeogenesis in fasting humans with 13C NMR. Science.

1991;254:573-576.

174. Nilsson LH, Hultman E. Liver glycogen in man--the effect of total starvation or a

carbohydrate-poor diet followed by carbohydrate refeeding. Scand J Clin Lab Invest.

1973;32:325-330.

175. Nilsson LH, Hultman E. Liver and muscle glycogen in man after glucose and fructose

infusion. Scand J Clin Lab Invest. 1974;33:5-10.

176. McLane JA, Holloszy JO. Glycogen synthesis from lactate in the three types of skeletal

muscle. J Biol Chem. 1979;254:6548-6553.

177. Wilson JR, McCully KK, Mancini DM, Boden B, Chance B. Relationship of muscular

fatigue to pH and diprotonated Pi in humans: a 31P-NMR study. J Appl Physiol.

1988;64:2333-2339.

178. Bergström J, Hermansen L, Hultman E, Saltin B. Diet, muscle glycogen and physical

performance. Acta Physiol Scand. 1967;71:140-150.

179. Loy SF, Conlee RK, Winder WW, Nelson AG, Arnall DA, Fisher AG. Effects of 24-hour

fast on cycling endurance time at two different intensities. J Appl Physiol. 1986;61:654-

659.

180. Hultman E, Sjöholm H. Biochemical causes of fatigue. In: “ Human Muscle Power”, N

Jones, N McCartney, AJ Comas (Eds). Champaign: Human Kinetics, 1986, pp 215-238.

181. Ahlborg G, Felig P. Influence of glucose ingestion on fuel-hormone response during

prolonged exercise. J Appl Physiol. 1976;41(5 Pt. 1):683-688.

182. Hultman E. Studies on muscle e of glycogen and active phosphate in man with special

reference to exercise and diet. Scand J Clin Lab Invest Suppl. 1967;94:1-63.

Page 109: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

103

183. Wahren J, Felig P, Ahlborg G, Jorfeldt L. Glucose metabolism during leg exercise in man. J

Clin Invest. 1971;50:2715-2725.

184. Newsholme EA. The control of fuel utilization by muscle during exercise and starvation.

Diabetes. 1979;28 Suppl 1:1-7.

185. Dohm GL, Beeker RT, Israel RG, Tapscott EB. Metabolic responses to exercise after

fasting. J Appl Physiol. 1986;61:1363-1368.

186. Hultman E, Bergström J. Muscle glycogen synthesis in relation to diet studied in normal

subjects. Acta Med Scand. 1967;182:109-117.

187. Bergström J, Hultman E. Muscle glycogen synthesis after exercise: an enhancing factor

localized to the muscle cells in man. Nature. 1966;210:309-310.

188. Chasiotis D, Sahlin K, Hultman E. Regulation of glycogenolysis in human muscle at rest

and during exercise. J Appl Physiol. 1982;53:708-715.

189. Bonen A, McDermott JC, Hutber CA. Carbohydrate metabolism in skeletal muscle: an

update of current concepts. Int J Sports Med. 1989;10:385-401.

190. Gleeson M, Maughan RJ, Greenhaff PL. Comparison of the effects of pre-exercise feeding

of glucose, glycerol and placebo on endurance and fuel homeostasis in man. Eur J Appl

Physiol Occup Physiol. 1986;55:645-653.

191. Kowalchuk JM, Heigenhauser GJ, Lindinger MI, Sutton JR, Jones NL. Factors influencing

hydrogen ion concentration in muscle after intense exercise. J Appl Physiol. 1988; 65:

2080-2089.

192. Hermansen L, Vaage O. Lactate disappearance and glycogen synthesis in human muscle

after maximal exercise. Am J Physiol. 1977;233:E422-429.

193. Gaesser GA, Brooks GA. Metabolic bases of excess post-exercise oxygen consumption: a

review. Med Sci Sports Exerc. 1984;16:29-43.

194. Brooks GA, Brauner KE, Cassens RG. Glycogen synthesis and metabolism of lactic acid

after exercise. Am J Physiol. 1973;224:1162-1166.

195. Gaesser GA, Brooks GA. Glycogen repletion following continuous and intermittent

exercise to exhaustion. J Appl Physiol. 1980;49(4):722-728.

196. Peters Futre EM, Noakes TD, Raine RI, Terblanche SE. Muscle glycogen repletion during

active postexercise recovery. Am J Physiol. 1987;253(3 Pt 1):E305-311.

197. Pagliassotti MJ, Donovan CM. Role of cell type in net lactate removal by skeletal muscle.

Am J Physiol. 1990;258(4 Pt 1):E635-642.

198. Gladden LB. Lactate uptake by skeletal muscle. Exerc Sport Sci Rev. 1989;17:115-155.

199. Stevenson RW, Mitchell DR, Hendrick GK, Rainey R, Cherrington AD, Frizzell RT.

Lactate as substrate for glycogen resynthesis after exercise. J Appl Physiol. 1987;62:2237-

2240.

200. Nordheim K, Vøllestad NK. Glycogen and lactate metabolism during low-intensity exercise

in man. Acta Physiol Scand. 1990;139:475-484.

201. Astrand PO, Hultman E, Juhlin-Dannfelt A, Reynolds G. Disposal of lactate during and

after strenuous exercise in humans. J Appl Physiol. 1986;61:338-343.

202. Brooks GA, Gaesser GA. End points of lactate and glucose metabolism after exhausting

exercise. J Appl Physiol. 1980;49:1057-1069.

203. Sahlin K, Harris RC, Nylind B, Hultman E. Lactate content and pH in muscle obtained after

dynamic exercise. Pflugers Arch. 1976;367:143-149.

204. Yates JW, Gladden LB, Cresanta MK. Effects of prior dynamic leg exercise on static effort

of the elbow flexors. J Appl Physiol. 1983;55:891-896.

Page 110: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

104

205. Gladden LB, Yates JW, Stremel RW, Stamford BA. Gas exchange and lactate anaerobic

thresholds: inter- and intraevaluator agreement. J Appl Physiol. 1985;58:2082-2089.

206. Brooks GA. Lactate production under fully aerobic conditions: the lactate shuttle during

rest and exercise. Fed Proc. 1986;45:2924-2929.

207. Wasserman K, Whipp BJ, Koyl SN, Beaver WL. Anaerobic threshold and respiratory gas

exchange during exercise. J Appl Physiol. 1973;35:236-243.

208. Connett RJ, Gayeski TE, Honig CR. Lactate production in a pure red muscle in absence of

anoxia: mechanisms and significance. Adv Exp Med Biol. 1983;159:327-335.

209. Connett RJ, Gayeski TE, Honig CR. Lactate efflux is unrelated to intracellular PO2 in a

working red muscle in situ. J Appl Physiol. 1986;61:402-408.

210. Richter EA, Kiens B, Saltin B, Christensen NJ, Savard G. Skeletal muscle glucose uptake

during dynamic exercise in humans: role of muscle mass. Am J Physiol. 1988;254(5 Pt

1):E555-561.

211. Baldwin KM, Campbell PJ, Cooke DA. Glycogen, lactate, and alanine changes in muscle

fiber types during graded exercise. J Appl Physiol. 1977;43:288-291.

212. Welch HG, Stainsby WN. Oxygen debt in contracting dog skeletal muscle in situ. Respir

Physiol. 1967;3:229-242.

213. Stanley WC, Wisneski JA, Gertz EW, Neese RA, Brooks GA. Glucose and lactate

interrelations during moderate-intensity exercise in humans. Metabolism. 1988;37:850-858.

214. Gertz EW, Wisneski JA, Neese R, Bristow JD, Searle GL, Hanlon JT. Myocardial lactate

metabolism: evidence of lactate release during net chemical extraction in man. Circulation.

1981;63:1273-1279.

215. Gertz EW, Wisneski JA, Stanley WC, Neese RA. Myocardial substrate utilization during

exercise in humans. Dual carbon-labeled carbohydrate isotope experiments. J Clin Invest.

1988;82:2017-2025.

216. Gordon RS Jr, Cherkes A. Unesterified fatty acid in human blood plasma. J Clin Invest.

1956;35:206-212.

217. Dole VP. A relation between non-esterified fatty acids in plasma and the metabolism of

glucose. J Clin Invest. 1956;35:150-154.

218. Hagenfeldt L. Metabolism of free fatty acids and ketone bodies during exercise in normal

and diabetic man. Diabetes. 1979;28 Suppl 1:66-70.

219. Rennie MJ, Park DM, Sulaiman WR. Uptake and release of hormones and metabolites by

tissues of exercising leg in man. Am J Physiol. 1976;231:967-973.

220. Sahlin K. Muscle fiber recruitment and metabolism in prolonged dynamic exercise. Ciba

Found Symp 1982; 82 :41-58.

221. Costill DL, Coyle E, Dalsky G, Evans W, Fink W, Hoopes D. Effects of elevated plasma

FFA and insulin on muscle glycogen usage during exercise. J Appl Physiol. 1977;43:695-

699.

222. Rennie MJ, Winder WW, Holloszy JO. A sparing effect of increased plasma fatty acids on

muscle and liver glycogen content in the exercising rat. Biochem J. 1976;15;156:647-655.

223. Galbo H, Holst JJ, Christensen NJ. The effect of different diets and of insulin on the

hormonal response to prolonged exercise. Acta Physiol Scand. 1979;107:19-32.

224. Ahlborg G, Felig P, Hagenfeldt L, Hendler R, Wahren J.Substrate turnover during

prolonged exercise in man. Splanchnic and leg metabolism of glucose, free fatty acids, and

amino acids. J Clin Invest. 1974;53:1080-90.

Page 111: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

105

225. Bülow J. Subcutaneous adipose tissue blood flow and triacylglycerol-mobilization during

prolonged exercise in dogs. Pflugers Arch. 1982 ;392:230-234.

226. Shaw WA, Issekutz TB, Issekutz B Jr.Interrelationship of FFA and glycerol turnovers in

resting and exercising dogs. J Appl Physiol. 1975;3:30-36.

227. Kather H, Simon B. Catecholamine-sensitive adenylate cyclase of human fat cell ghosts: a

comparative study using different beta-adrenergic agents. Metabolism. 1977;26:1179-1184.

228. Kather H, Pries J, Schrader V, Simon B. Inhibition of human fat cell adenylate cyclase

mediated via alpha-adrenoceptors. Eur J Clin Invest. 1980;10:345-348.

229. Bülow J, Madsen J. Influence of blood flow on fatty acid mobilization form lipolytically

active adipose tissue. Pflugers Arch. 1981;390:169-174.

230. Bülow J, Tøndevold E. Blood flow in different adipose tissue depots during prolonged

exercise in dogs. Pflugers Arch. 1982;392:235-238.

231. Larsen T, Myhre K, Vik-Mo H, Mjøs OD. Adipose tissue perfusion and fatty acid release in

exercising rats. Acta Physiol Scand. 1981;113:111-116.

232. Bülow J, Madsen J. Adipose tissue blood flow during prolonged, heavy exercise. Pflugers

Arch. 1976;363:231-234.

233. Wolfe RR, Klein S, Carraro F, Weber JM. Role of triglyceride-fatty acid cycle in

controlling fat metabolism in humans during and after exercise. Am J Physiol. 1990;258(2

Pt 1):E382-389.

234. Winder WW, Hickson RC, Hagberg JM, Ehsani AA, McLane JA. Training-induced

changes in hormonal and metabolic responses to submaximal exercise. J Appl Physiol.

1979;46:766-771.

235. Björntorp P, De Jounge K, Sjöström L, Sullivan L. The effect of physical training on

insulin production in obesity. Metabolism. 1970;19:631-638.

236. Gyntelberg F, Rennie MJ, Hickson RC, Holloszy JO. Effect of training on the response of

plasma glucagon to exercise. J Appl Physiol. 1977;43:302-305.

237. Bukowiecki L, Lupien J, Follea N, Paradis A, Richard D, LeBlanc J. Mechanism of

enhanced lipolysis in adipose tissue of exercise-trained rats. Am J Physiol. 1980;239:E422-

429.

238. Després JP, Bouchard C, Savard R, Tremblay A, Marcotte M, Thériault G. The effect of a

20-week endurance training program on adipose-tissue morphology and lipolysis in men

and women. Metabolism. 1984;33:235-239.

239. Williams RS, Bishop T. Enhanced receptor-cyclase coupling and augmented

catecholamine-stimulated lipolysis in exercising rats. Am J Physiol. 1982;243:E345-351.

240. Krotkiewski M, Mandroukas K, Morgan L, William-Olsson T, Feurle GE, von Schenck H,

Björntorp P, Sjöström L, Smith U. Effects of physical training on adrenergic sensitivity in

obesity. J Appl Physiol. 1983;55:1811-1817.

241. Martin WH III, Coyle EF, Joyner M, Santeusanio D, Ehsani AA, Holloszy JO. Effects of

stopping exercise training on epinephrine-induced lipolysis in humans. J Appl Physiol.

1984;56:845-848.

242. Borensztajn J, Robinson DS. The effect of fasting on the utilization of chylomicron

triglyceride fatty acids in relation to clearing factor lipase (lipoprotein lipase) releasable by

heparin in the perfused rat heart. J Lipid Res. 1970;11:111-117.

243. Oscai LB. Role of lipoprotein lipase in regulating endogenous triacylglycerols in rat heart.

Biochem Biophys Res Commun. 1979;91:227-232.

Page 112: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

106

244. Thompson PD, Cullinane E, Henderson LO, Herbert PN. Acute effects of prolonged ex

ercise on serum lipids. Metabolism. 1980;29:662-665.

245. Taskinen MR, Nikkilä EA. Effect of acute vigorous exercise on lipoprotein lipase activity

of adipose tissue and skeletal muscle in physically active men. Artery. 1980;6:471-483.

246. Marniemi J, Peltonen P, Vuori I, Hietanen E. Lipoprotein lipase of human postheparin

plasma and adipose tissue in relation to physical training. Acta Physiol Scand.

1980;110:131-135.

247. Potter BJ, Sorrentino D, Berk PD. Mechanisms of cellular uptake of free fatty acids. Annu

Rev Nutr. 1989;9:253-270.

248. Essén B. Intramuscular substrate utilization during prolonged exercise. Ann N Y Acad Sci.

1977;301:30-44.

249. Spriet LL, Heigenhauser GJ, Jones NL. Endogenous triacylglycerol utilization by rat

skeletal muscle during tetanic stimulation. J Appl Physiol. 1986;60:410-415.

250. Górski J, Kiryluk T The post-exercise recovery of triglycerides in rat tissues. Eur J Appl

Physiol Occup Physiol. 1980;45:33-41.

251. Staron RS, Hikida RS, Murray TF, Hagerman FC, Hagerman MT. Lipid depletion and

repletion in skeletal muscle following a marathon. J Neurol Sci. 1989;94:29-40.

252. Askew EW, Dohm GL, Huston RL. Fatty acid and ketone body metabolism in the rat:

response to diet and exercise. J Nutr. 1975;105:1422-1432.

253. Winder WW, Baldwin KM, Holloszy JO. Exercise-induced increase in the capacity of rat

skeletal muscle to oxidize ketones. Can J Physiol Pharmacol. 1975;53:86-91.

254. Décombaz J, Reinhardt P, Anantharaman K, von Glutz G, Poortmans JR. Biochemical

changes in a 100 km run: free amino acids, urea, and creatinine. Eur J Appl Physiol Occup

Physiol. 1979;41:61-72.

255. Haralambie G, Berg A. Serum urea and amino nitrogen changes with exercise duration. Eur

J Appl Physiol Occup Physiol. 1976;36:39-48.

256. Rennie MJ, Edwards RH, Krywawych S, Davies CT, Halliday D, Waterlow JC, Millward

DJ. Effect of exercise on protein turnover in man. Clin Sci. 1981;61:627-639.

257. Goldberg AL, Jablecki C, Li JB. Trophic functions of the neuron. 3. Mechanisms of

neurotrophic interactions. Effects of use and disuse on amino acid transport and protein

turnover in muscle. Ann N Y Acad Sci. 1974;228:190-201.

258. Dohm GL, Kasperek GJ, Tapscott EB, Beecher GR. Effect of exercise on synthesis and

degradation of muscle protein. Biochem J. 1980;18:255-262.

259. Wenger HA, Wilkinson JG, Dallaire J, Nihei T. Uptake of 3H-leucine into different

fractions of rat skeletal muscle following acute endurance and sprint exercise. Eur J Appl

Physiol Occup Physiol. 1981;47:83-92.

260. Babij P, Matthews SM, Rennie MJ. Changes in blood ammonia, lactate and amino acids in

relation to workload during bicycle ergometer exercise in man. Eur J Appl Physiol Occup

Physiol. 1983;50:405-411.

261. Katz A, Broberg S, Sahlin K, Wahren J. Muscle ammonia and amino acid metabolism

during dynamic exercise in man .Clin Physiol. 1986;6:365-379.

262. Refsum HE, Strömme SB. Urea and creatinine production and excretion in urine during and

after prolonged heavy exercise. Scand J Clin Lab Invest. 1974;33:247-254.

263. Felig P, Wahren J. Amino acid metabolism in exercising man. J Clin Invest. 1971;50:2703-

2714.

Page 113: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ADAPTAÇÃO METABÓLICA AO EXERCÍCIO FÍSICO

Actas Bioq. 1989; 1:57-107

107

264. Felig P, Pozefski T, Marliss E, Cahill, GFJ. Alanine, key role in gluconeogenesis. Science

1970, 167: 1003-1004.

265. Goldstein L, Newsholme EA. The formation of alanine from amino acids in diaphragm

muscle of the rat. Biochem J. 1976;154:555-558.

266. Wahren J, Felig P, Hendler R, Ahlborg G. Glucose and amino acid metabolism during

recovery after exercise. J Appl Physiol. 1973 Jun;34(6):838-845.

267. Eriksson LS, Broberg S, Björkman O, Wahren J. Ammonia metabolism during exercise in

man. Clin Physiol. 1985;5:325-336.

268. Bergström J, Fürst P, Hultman E. Free amino acids in muscle tissue and plasma during

exercise in man. Clin Physiol. 1985;5:155-160.

269. Blomstrand E, Celsing F, Newsholme EA. Changes in plasma concentrations of aromatic

and branched-chain amino acids during sustained exercise in man and their possible role in

fatigue. Acta Physiol Scand. 1988;133:115-121.

270. Lowenstein JM, Goodman MN. The purine nucleotide cycle in skeletal muscle. Fed Proc.

1978;37:2308-2312.

271. Wilkerson JE, Batterton DL, Horvath SM. Exercise-induced changes in blood ammonia

levels in humans. Eur J Appl Physiol Occup Physiol. 1977;37:255-263.

272. Meyer RA, Dudley GA, Terjung RL. Ammonia and IMP in different skeletal muscle fibers

after exercise in rats. J Appl Physiol. 1980;49:1037-1041.

273. Dolny DG, Lemon PW. Effect of ambient temperature on protein breakdown during

prolonged exercise. J Appl Physiol. 1988;64:550-555.

274. Lemon PW, Mullin JP. Effect of initial muscle glycogen levels on protein catabolism

during exercise. J Appl Physiol. 1980;48:624-629.

Page 114: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:109-124 109

BASES FISIOPATOLÓGICAS DA FADIGA MUSCULAR NO HOMEM

Lúcio Botas

Instituto de Bioquímica da FML e UTIC Arsénio Cordeiro do HSM

SUMÁRIO

A definição do termo "fadiga" é habitualmente sujeita a interpretações variadas

cuja aplicação na prática clínica pode levar a confusão. O conceito abordado é

o que se prende com a noção de "fadiga muscular". São analisados os "pontos

vulneráveis" da cadeia de comando para a contracção do músculo estriado,

susceptíveis de contribuírem para a interrupção do esforço por fadiga.

Excluem-se desta análise as situações de patologia cardio-respiratória e

hematológica, só por si condicionantes de diminuições da tolerância ao esforço.

Apresentam-se as diferentes teorias que atribuem a primazia do controlo da

resistência à fadiga, respectivamente aos centros nervosos (fadiga central) e às

unidades musculares (fadiga periférica) analisando-se os mecanismos

bioquímicos e histo-fisiológicos que justificam a importância do estímulo

psicológico a par do adequado treino físico, na melhoria da "performance" do

esforço. Atribui-se particular realce à importância dos teores de fosfocreatina e

ao "turnover" do ATP na manutenção da contracção muscular nos diferentes

tipos de esforço e à possível interferência, nestes mecanismos, do lactato,

"substancia major da fadiga", através do efeito da concentração hidrogeniónica

no acoplamento do Ca++

- As proteínas contrácteis, na inibição da enzima-chave

da via glicolítica (fosfofrutocinase) da glicogenóIise (fosforilase) e da

diminuição da lipólise bem como da disponibilidade da oxidação dos

substratos energéticos (glicose/glicogénio) e ácidos gordos livres) nos

diferentes tipos de fibra muscular estriada ("aeróbicas" ou tipo I e

"anaeróbicas" ou tipo II).

Palavras-chave: Fadiga muscular, fadiga central, fadiga periférica, ATP, fosfocreatina,

Acido láctico

Page 115: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS DOS SANTOS L.

110

A definição do termo "fadiga" é difícil, uma vez que pode servir para classificar situações

bastante diversas, sendo frequente na linguagem corrente e até nos meios científicos a sua

utilização de forma mais ou menos inadequada (Quadro I).

No desenvolvimento desta exposição utilizarei o termo "fadiga" relacionado apenas com

a actividade muscular normal (fadiga muscular). Procurando ser o mais possível sintético, ainda

que à custa de alguma clareza, definirei "fadiga" de acordo com Asmussen (1) como "a

diminuição transitória do rendimento de um músculo ou grupo muscular, após período prévio de

actividade contráctil, normalmente posta em evidência por uma quebra na capacidade de

desenvolver um esforço de determinada intensidade". Esta definição de fadiga muscular não

abrange situações em que haja envolvimento de apologia cardiorrespiratória ou hematológica.

A análise da cadeia de comando para a contracção muscular (cérebro/músculo) permite-

nos evidenciar vários pontos susceptíveis de poderem claudicar mais ou menos precocemente,

impedindo a actividade muscular normal e facilitando a fadiga (Quadro II).

QUADRO I

POSSIVEIS SIGNIFICADOS DA PALAVRA "FADIGA"

(adaptado de R.H.T. Edwards, 1981)

Definição

1. Perturbação na capacidade intelectual

2. Perturbação na capacidade motora

3. Aumento da actividade emg para uma determinada performance

4. Modificação do aspecto emg para baixas frequências

5. Incapacidade de gerar força

Confusão de percepção associada com actividade muscular fatigante

1. Aumento do esforço para manter força

2. Desconforto ou dor associada com actividade muscular

3. Incapacidade reconhecida de gerar força

No desenvolvimento desta exposição utilizarei o termo "fadiga" relacionado apenas com

a actividade muscular normal (fadiga muscular). Procurando ser o mais possível sintético, ainda

que à custa de alguma clareza, definirei "fadiga" de acordo com Asmussen (1) como "a

diminuição transitória do rendimento de um músculo ou grupo muscular, após período prévio de

actividade contráctil, normalmente posta em evidência por uma quebra na capacidade de

Page 116: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DA FADIGA

Actas Bioq. 1989; 1:109-124

111

desenvolver um esforço de determinada intensidade". Esta definição de fadiga muscular não

abrange situações em que haja envolvimento de apologia cardiorrespiratória ou hematológica.

A análise da cadeia de comando para a contracção muscular (cérebro/músculo) permite-

nos evidenciar vários pontos susceptíveis de poderem claudicar mais ou menos precocemente,

impedindo a actividade muscular normal e facilitando a fadiga (Quadro II).

Facilmente se depreende a interligação entre os diferentes mecanismos conducentes à

contracção muscular, sendo difícil de concretizar a afirmação do primado de qualquer destes no

resultado final, constituindo-se deste modo no elo mais frágil da resistência à fadiga.

Foi Marey em 1968, com os primeiros registos da contracção muscular, que iniciou os

estudos da fadiga, mas é com Mosso (2), em 1892, que surge a primeira tentativa sistematizada

de estudo dos mecanismos fisiológicos da fadiga no Homem. Foi também este autor quem

primeiro atribuiu a localização do "centro da fadiga" a uma determinada estrutura orgânica. Na

realidade, utilizando um ergógrafo, como o presente na figura 1, com registos semelhantes aos de

Marey, em cilindros de papel fumado, Mosso verificou que um mesmo indivíduo realizava mais

ou menos esforço consoante o estado fisiológico em que se encontrava, verificando que a euforia

actuava como estímulo e a preocupação conduzia a inibição mais precoce da força de contracção.

Em face destes resultados Mosso concluiu ser o cérebro o "centro da fadiga", constituindo-se

como o primeiro autor a defender a origem central da fadiga.

QUADRO II

CADEIA DE COMANDO PARA A CONTRACÇÃO MUSCULAR

CÉREBRO

ESPINAL MEDULA

NERVO PERIFÉRICO

PLACA MOTORA

MEMBRANA CELULAR DO MÚSCULO

SISTEMA TUBULAR TRANSVERSAL

LIBERTAÇÃO DO CÁLCIO

INTER-RELAÇÃO ACTINA / MIOSINA

CONTRACÇÃO MUSCULAR

Page 117: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS DOS SANTOS L.

112

FIGURA 1

Ergógrafo de braço para estudos de fadiga muscular (10)

Desde então têm surgido hipóteses diferentes para explicar a verdadeira localização do

"centro da fadiga" podendo estas resumirem-se em duas grandes correntes, com períodos

alternados de primazia. Assim, para um grupo de autores, a causa da fadiga seria sempre a

falência de um mecanismo central, localizado no cérebro ou porção proximal das vias nervosas

(fadiga central) (2, 3, 4). Para outros a origem da fadiga localizar-se-ia à periferia em qualquer

das estruturas orgânicas compreendidas entre o nervo periférico e as miofibrilhas (5) (fadiga

periférica). Os defensores da origem periférica da fadiga ainda a subdividem em fadiga de

transmissão (1), quando os mecanismos envolvidos na sua génese têm como substrato orgânico a

placa motora, a membrana celular do músculo e o retículo endoplásmico, e de contracção (6)

quando o problema reside numa perturbação do mecanismo de funcionamento das miofibrilhas.

Na realidade, quando se estimula uma preparação de músculo através de eléctrodos

aplicados ao nervo verifica-se que após um curto período a resposta começa a diminuir a sua

intensidade até que pára. Neste momento, se a estimulação se aplicar directamente ao músculo,

pode conseguir-se uma resposta máxima, que por sua vez também vai diminuindo. Parece

portanto que no primeiro caso a estimulação indirecta através do nervo leva a instalação de

bloqueio ao nível do mecanismo de transmissão (fadiga de transmissão) enquanto no segundo

seria o mecanismo de contracção que se fatigaria (fadiga da contracção).

Ao longo dos anos, os defensores das duas grandes correntes teóricas para a localização

do centro da fadiga (central e periférica) têm tentado fazer prevalecer os seus pontos de vista e

recentemente num simpósio dedicado exclusivamente ao assunto (Londres 1981) foi afirmado

que qualquer autor que tente responsabilizar uma determinada estrutura pela fadiga encontra

sempre comprovação laboratorial para o seu ponto de vista, justificando-se algumas das

discrepâncias encontradas pelos diferentes modelos experimentais e tecnologias utilizadas.

Não existem dúvidas sobre a importância da motivação psicológica na resistência á

fadiga. São dados de observação corrente os efeitos do estímulo psicológico do ambiente dos

grandes estádios sobre o rendimento dos atletas, levando a que uma boa motivação para a

execução de um determinado tipo de esforço possa levar a que este se prolongue até à exaustão.

Page 118: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DA FADIGA

Actas Bioq. 1989; 1:109-124

113

Por outro lado, consegue-se, em laboratório, ultrapassar a fadiga muscular alcançada após

contracção muscular voluntária, provocando estimulação eléctrica do músculo fatigado (1).

A "fadiga central, não resulta necessariamente de uma perturbação nas células do sistema

nervoso central, podendo o seu mecanismo ser explicado por um aumento da inibição do esforço

voluntário (1). Deste modo parece existir um sistema de adaptação fisiológica que provoca

diminuição da intensidade e frequência dos estímulos nervosos a partir dos centros motores, em

direcção aos músculos em actividade, quando estes começam a ficar fatigados, evitando-se deste

modo a instalação de um quadro de rigor (7, 8). O centro orgânico deste mecanismo adaptativo

parece residir em algumas porções da substancia reticulada, as quais têm propriedades inibitórias

frenando a quantidade e intensidade dos estímulos conduzidos para os músculos fatigados, após

receberem impulsos conduzidos por nervos aferentes destes músculos (1). Por outro lado, outros

sinais chegando a zonas com capacidade estimuladora, também na substancia reticulada, podem

por sua vez facilitar a propagação de estímulos motrizes retardando o aparecimento de fadiga

central ou apressando a recuperação após fadiga (1). Esta poderá ser a base explicativa para um

fenómeno descrito pela primeira vez em 1903 por Setchenov. Este autor verificou que após

esforço realizado só com um braço (por ex. serrar) a recuperação desse braço é acelerada se se

começar a realizar o mesmo tipo de esforço com o outro braço, durante o período de pausa do

primeiro (9).

Para justificar o fenómeno descrito por Setchenov e amplamente confirmado por outros

autores, os defensores das duas grandes teorias encontraram duas hipóteses explicativas. Os

adeptos da teoria central afirmaram que os centros nervosos fatigados são recarregados com

energia que vem conduzida por impulsos nervosos emitidos a partir do braço activo mas não

fatigado (10, 11). Por outro lado os defensores da teoria periférica justificaram o fenómeno

através de uma activação electiva da circulação no músculo fatigado provocada pela actividade

dos músculos não fatigados, facilitando a recuperação destes (12).

Estudos recentes, recorrendo à utilização de radioisótopos (133Xe) não confirmaram a

hipótese da estimulação circulatória (10). Por outro lado verificou-se que se conseguia uma mais

rápida recuperação da fadiga se, durante a pausa de músculos fatigados, se realizasse uma

actividade diferente, mesmo que fossem pequenas contracções levadas a cabo por grupos

musculares não fatigados, ou até mesmo actividade mental intensa, situações que não levam a

aumento da circulação contra-lateral (10, 11).

A explicação actual para o fenómeno de Setchenov parece assentar no facto de, na fadiga

muscular, existir um processo de "feedback" a partir dos músculos em actividade, mediado

provavelmente por quimiorreceptores aí localizados, que leva a que seja estimulada a "porção

inibidora" da formação reticulada, facto que vai causar inibição do esforço voluntário (1, 13). A

actividade diversificante, por outro lado, leva a um aumento da chegada de impulsos a partir de

grupos musculares não fatigados de outras regiões do organismo e que chegam à "porção

estimuladora" da formação reticulada, modificando o balanço entre inibição e facilitação com

predomínio do processo de facilitação (1, 10, 11, 13).

De acordo com a teoria da origem central da fadiga, através do balanço entre processes de

inibição e de estimulação, com repercussão ao nível do estado de consciência, verifica-se que

durante estudos de fadiga com registos electroencefalográficos, ocorre o aparecimento de ritmo

alfa, característico de diminuição do nível de consciência, à medida que a fadiga aumenta (1, 11,

14). A introdução de uma actividade diversificante leva ao desaparecimento do ritmo alfa (1, 11).

Também o simples acto de fechar os olhos leva ao aparecimento de ondas alfa no EEG,

verificando-se que um mesmo indivíduo realiza mais esforço com os olhos abertos do que com

Page 119: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS DOS SANTOS L.

114

eles fechados (11). Os reflexos simples osteo-articulares também são mais vivos quando

pesquisados com os olhos abertos (1, 11). Conclui-se assim que o acto de abrir os olhos provoca

estimulação dos centros reguladores, enquanto o encerramento provoca inibição (1, 11).

Apesar de todos estes dados experimentais parecerem confirmar a existência de um

mecanismo central para a fadiga, alguns autores põem-no em causa de forma absoluta. Assim,

Merton afirma que o mecanismo de controlo anti-rigor só se verifica quando há contracção

voluntária ou estimulação do nervo, uma vez que a estimulação directa do córtex cerebral na área

motriz leva a que a fadiga central não se evidencie, porque há sempre potencial de acção

muscular (15, 16). Por outro lado demonstra-se experimentalmente que a estimulação eléctrica

dum nervo periférico até ao desaparecimento ou grande atenuação da resposta contráctil do

músculo se associa com a persistência normal dos potenciais de acção do músculo (15, 16).

Para os defensores da teoria periférica deverão ocorrer perturbações no meio interno do

músculo que conduzem por si só à fadiga (1). Estas alterações poderão ser de dois tipos: a)

depleção de substratos fundamentais como o glicogénio e os fosfatos de alta energia nas fibras

musculares e acetilcolina nas terminações nervosas; b) acumulação de metabolitos como o

lactato e alguns electrólitos libertados durante a contracção muscular.

Alguns autores descrevem uma diminuição paralela do potencial de acção do músculo e

da tensão mecânica quando se aplica estimulação directa no nervo, no decurso da contracção

isométrica voluntária fatigante. Esta diminuição do potencial de acção, que pode atingir 65%,

pode aumentar se a circulação for bloqueada (17). A recuperação dos potenciais de acção até ao

tamanho normal só pode ocorrer se a circulação for livre, demonstrando que uma substância foi

removida do músculo fatigado ou que uma substancia consumida tem tempo de se regenerar,

porque lhe foi fornecido o substrato adequado, dependendo ambos os fenómenos da retirada do

bloqueio circulatório (17).

Durante o processo contráctil fisiológico parece ser pouco provável que ocorra uma

depleção total das reservas energéticas que conduza, só por si, à exaustão (1). Isto será verdade

principalmente nos esforços intensos de curta duração de tipo isométrico, uma vez que nos

esforços prolongados a capacidade de resistência à fadiga parece relacionar-se de perto, com os

teores de substratos energéticos como o glicogénio (18, 19).

Nos esforços curtos e intensos, as únicas substancias que podem sofrer uma diminuição

significativa são os fosfatos de alta energia e dentro destes mais especificamente a fosfocreatina,

uma vez que o ATP. sofre apenas ligeiras oscilações na sua síntese (1, 20) (Quadro III).

A diminuição dos fosfatos de alta energia não é devido à depleção das reservas de

substratos energéticos, mas sim à diminuição da velocidade de transferência da energia das

reservas para o ATP e fosfocreatina, fenómeno parcialmente dependente da glicólise e como tal

condicionado pelo efeito inibidor da acumulação do lactato sobre alguns enzimas-chave, como a

fosfofrutocinase e a fosforilase do músculo (21, 22). Por outro lado, a acumulação de

hidrogeniões, além de impedir a ressíntese de ATP, impede também a geração de força

contráctil, por inibir a activação da ATPase da actomiosina pelo Ca2+

. Verifica-se facilmente que

no esforço dinâmico a fadiga se atinge mais depressa se o indivíduo estiver em acidemia. A

alcalemia, pelo contrário, retarda a fadiga (22, 23).

Page 120: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DA FADIGA

Actas Bioq. 1989; 1:109-124

115

QUADRO III

REACÇÃO DA CREATINOFOSFOCINASE

ATP ADP + Pi + ENERGIA

CPK

CP + ADP ATP + C

Verifica-se, pelo atrás exposto, que a acumulação de uma "substância da fadiga", com as

características e efeito biológico do lactato, poderá desempenhar um papel importante na génese

da fadiga muscular periférica, com efeito nos mecanismos de transmissão e no acoplamento

excitação/contracção.

Segundo alguns autores, o mecanismo de transmissão neuromuscular não se altera na

fadiga, ocorrendo esta por diminuição da excitabilidade da membrana muscular (3, 24). Para

outros, o potencial de acção do músculo e o acoplamento excitação/contracção não são

grandemente afectados pela fadiga, actuando contudo num sistema contráctil enfraquecido (16).

Parece haver uma relação estreita entre o acoplamento excitação/contracção e o metabolismo

energético do músculo, ocorrendo perturbação neste mecanismo se o fornecimento de energia for

baixo, levando a que a força desenvolvida na contracção dependa da taxa de hidrólise e da

velocidade de ressíntese do ATP (25).

Existem contudo outros mecanismos causadores de perturbação no acoplamento

excitação contracção. Estes parecem originar-se em desvios no teor electrolítico do ambiente,

provocando a acumulação do K+ no espaço extracelular e consequentes perturbações da

excitabilidade da membrana, ocorrendo por outro lado depleção de Na+ que é responsável por

alterações na função do sistema tubular transverso (26).

Estas perturbações no acoplamento excitação/contracção originam uma diminuição das

necessidades energéticas da função contráctil, facto que parece constituir por si um mecanismo

impeditivo de falência absoluta, evitando a entrada em "rigor" por completo esgotamento de

ATP (8, 27). Este mecanismo parece estar envolvido nos doentes com deficiência de

miofosforilase, ainda que de forma não absoluta. Nestes casos, o acoplamento

excitação/contracção pode falhar e mesmo assim desenvolver-se contractura (Quadro IV).

No entanto, mesmo nesta situação os músculos não têm uma depleção de ATP tão

absoluta como no rigor (28).

Page 121: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS DOS SANTOS L.

116

QUADRO IV

CONSEQUENCIAS METABOLICAS E ELECTROFISIOLOGICAS DA

ACTIVIDADE MUSCULAR QUE PODEM LEVAR À FADIGA

(segundo R.H.T. Edwards, 1981) (25)

1. Depleção de energia para o mecanismo da contracção por limitação da velocidade

de fornecimento do ATP

2. Perturbação no fornecimento de energia para o funcionamento das membranas:

Incapacidade de geração e propagação do potencial de acção do sarcolema.

Incapacidade de bombeamento do Ca++

pelo retículo sarcoplásmico

3. Acumulação de produtos

H+ intracelular

a) - Pode inibir a actividade da fosfofrutocinase e da fosforilase

b) - Pode reduzir a interacção entre o Ca++

e a actomiosina

K+ extracelular (ou depleção de Na

+

a) - Perturbação na geração e propagação do potencial de acção do retículo

sarcoplásmico

b) - Perturbação do potencial de acção no sistema tubular transversal

resultando em redução da eficiência no acoplamento excitação /

contracção

Nos estudos realizados para a análise dos mecanismos causadores da fadiga por falência

do acoplamento excitação/contracção verifica-se existirem dois tipos diferentes de fadiga

dependentes da frequência do estímulo eléctrico (25). Num caso as fibras musculares deixam de

responder a estímulos de alta frequência (por ex. 100 Hz) para o fazerem apenas a frequências

menores (20 Hz). Este tipo de fadiga, que se denomina de alta frequência pode ser devido a

acumulação de K+ (ou depleção de Na

+) no espaço interfibras, mais particularmente no líquido

extracelular contido no sistema tubular transverso (25). Por outro lado, em alguns casos, quando

existe anaerobiose (por isquémia), verifica-se uma perda da capacidade contráctil para estímulos

de baixa frequência, mantendo-se contudo o nível de resposta para estímulos de alta frequência.

Esta situação, conhecida por fadiga de baixa frequência, não parece depender da depleção de

ATP ou fosfocreatina e demora várias horas a recuperar (25). O mecanismo subjacente parece

assentar numa diminuição da quantidade de cálcio libertado a partir do retículo sarcoplásmico

em resposta a um determinado potencial de acção, ou numa modificação no local de ligação do

cálcio à troponina (25). De qualquer forma existe uma perturbação no acoplamento

excitação/contracção originando uma diminuição da força contráctil em resposta a cada

estimulação da membrana. Provavelmente a lesão estrutural responsável por este tipo de fadiga

deverá ocorrer no sistema tubular transverso ou nas membranas do retículo sarcoplásmico

durante o período de isquémia (25) (Quadro V).

As fibras com elevada capacidade oxidativa (contracção lenta, tipo I) resistem melhor à

fadiga de baixa frequência que as de componente glicolítico dominante (contracção rápida, tipo

II), uma vez que a ATPase do cálcio do retículo sarcoplásmico e a ATPase K+/Na parecem ser

muito sensíveis a pequenas alterações na velocidade de síntese do ATP (25, 29).

Page 122: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DA FADIGA

Actas Bioq. 1989; 1:109-124

117

Prosseguindo na análise dos mecanismos fisiopatológicos da fadiga periférica,

verificamos que estes dependem do tipo de esforço realizado, bem como do tipo de fibras

musculares solicitadas.

No esforço dinâmico, para contracções correspondendo a 70-85% do consumo de oxigénio

máximo (V02 max), a fadiga está claramente relacionada com a perda da reserva de substratos

(por exemplo glicogénio) para o fornecimento de energia, que se considera a reserva destes

substratos nos músculos, no fígado ou em ambos os locais (30). Para esforços menores, a

utilização do glicogénio é menor e a totalidade da reserva não é utilizada até à exaustão. Para

esforços próximos ou superiores ao máximo de captação de oxigénio, a exaustão atinge-se antes

que a reserva de glicogénio esteja esgotada (31). Verifica-se portanto que existem outros

factores, para além da reserva de glicogénio, que limitam a capacidade para o esforço, causando

fadiga para este tipo de cargas. Dentro destes, um dos principais é o teor de fosfocreatina, o qual

é inversamente proporcional à carga suportada (32).

Para esforços elevados os níveis de fosfocreatina podem descer aquém de 10% do normal

em repouso, verificando-se rapidamente uma diminuição dos teores de ATP que pode chegar a

cerca de 40%, quando toda a creatina estiver esgotada (32). Para esforços supra-máximos o

conteúdo de fosfocreatina aproxima-se do zero, parecendo que esta diminuição determina o

ponto de exaustão (32).

De um modo geral podemos dizer que no esforço dinâmico a diminuição do teor de

glicogénio no músculo constitui um dos mecanismos conducentes à fadiga. A razão de ser para

este fenómeno parece passar pela dificuldade que o músculo tem para utilizar outros substratos,

tais como os ácidos gordos, os quais apesar de serem largamente metabolizados durante o

esforço não são captados a velocidade adequada pelo músculo porque as células endoteliais dos

seus capilares constituem uma barreira difícil de ultrapassar por estes metabolitos (33, 34). Por

outro lado, a dificuldade de carboxilação do piruvato reduz a capacidade do ciclo do ácido cítrico

em oxidar os grupos acetil provenientes em abundância da beta-oxidação dos ácidos gordos, por

dificuldade na obtenção de uma via alternativa para a produção de oxalacetato (33).

Em conclusão, podemos dizer que no esforço dinâmico prolongado a limitação ocorre por

esgotamento das reservas de glicogénio e por inferior capacidade do músculo para utilizar como

substrato os ácidos gordos livres do plasma.

Nos esforços isométricos para contracções próximo do máximo, cerca de 50% da energia

utilizada deriva da degradação de fosfatos de alta energia e 50% da glicólise anaeróbia,

utilizando a reserva de glicogénio (21).

Nestas situações, uma acumulação brusca de ácido láctico durante o esforço pode

provocar uma diminuição muito marcada do pH das células, o qual pode só por si diminuir a

glicólise através da inibição de algumas das suas enzimas-chave (por exemplo fosfofrutocinase)

(21).

Page 123: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS DOS SANTOS L.

118

QUADRO V

CLASSIFICAÇÃO PRÁTICA DA FADIGA MUSCULAR

(segundo R.H.T. Edwards, 1981) (25)

MECANISMOS FISIOLÓGICOS ASPECTOS CLÍNICOS

Fadiga central

Falência (voluntária ou involuntária) Neurastenia (ONV) paralisia histérica e

de estímulo nervoso, resultante em: outras situações nas quais a motivvação

para a actividade motora voluntária

a) - Redução do nº de unidades motoras está perturbada

funcionantes

b) - Redução na frequência de estímulos

para as unidades motoras.

Fadiga periférica

Falência da capacidade de gerar força

por todo o músculo

Fadiga de alta frequência

a) - Transmissão neuromuscular a) - Miastenia gravis

perturbada - Arrefecimento do músculo

- Curarização parcial

b) - Falência dos potenciais de b) - Miotonia-congénita

acção do músculo - Perturbações da via glicolítica

Fadiga de baixa frequência - Perturbações da função mitocondrial

Perturbação no acoplamento - Tratamento com dantroleno

Excitação / activação (dantrium) - espasticidade

- Miotonia congénita

- Paralisia periódica hipokaliémia

- Distrofia muscular - Duchenne

A diminuição da taxa de glicólise pode ser a responsável pelo baixo nível de

concentração de ATP observado no fim do esforço, bem como pela diminuição de capacidade de

ressíntese do ATP, donde resulta a perda da capacidade de fornecimento da ligação fosfato de

alta energia, principal causa para o impedimento da continuação da contracção muscular (22)

(Quadro VI).

Page 124: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DA FADIGA

Actas Bioq. 1989; 1:109-124

119

QUADRO VI

VIAS DE PRODUÇÃO DO ATP

Glicólise

Fosforilação oxidativa

Reacção da creatinocinase

Turnover do "Pool" de nucleótidos da adenina

A glicólise está dependente do funcionamento de enzimas-chave susceptíveis de serem

estimuladas por alguns intermediários metabólicos e inibidas por produtos

finais. Assim, a fosfofrutocinase, por exemplo, é activada pela frutose-6-fosfato, pelo AMP e

pelo NH4+ sendo inibida pelo ATP e pela fosfocreatina (22).

Parece haver uma proporcionalidade constante entre a acumulação de intermediários da via

glicolítica e a acumulação de lactato, qualquer que seja a taxa de glicólise (G-6-P/lactato = 0.2)

(22). A razão de ser desta constante parece assentar na ausência de controlo da glicólise pela

fosfofrutocinase, devido a excesso de concentração de intermediários activados e diminuição de

inibidores, ou num controlo indirecto da glicólise pela fosfofrutocinase através de um

mecanismo de "feed-back" exercido pela glicose-6-fosfato sobre a fosforilase b do glicogénio

(22).

A existência deste tipo de constante em indivíduos normais pode servir, na prática, para

detectar estados patológicos com perturbação da via glicolítica, principalmente devidos a

falência da actividade da fosfofrutocinase (22).

Durante a estimulação contínua de um músculo por eléctrodo exterior a taxa de glicólise

é máxima entre os 12 e os primeiros 25 segundos (21, 22, 35). Simultaneamente, a produção de

ATP é máxima nos primeiros 25 segundos de estimulação, com marcada redução se o estímulo

continuar (21, 22, 35). Durante os primeiros 25 segundos tanto a cisão da fosfocreatina como a

glicólise são utilizadas na produção de ATP. Se a circulação estiver ocluída não há ressíntese da

fosfocreatina por a glicólise estar inibida pelo ácido láctico (35).

Quando se faz a estimulação contínua de um músculo com bloqueio circulatório, verifica-

se que as excitabilidades do nervo e das membranas musculares podem modificar-se devido a

alterações nos teores de electrólitos, no pH do meio, ou devido a modificações na velocidade de

regeneração do ATP (22) (Quadro VII).

Page 125: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS DOS SANTOS L.

120

QUADRO VII

IMPORTÂNCIA DO "TURNOVER" DO ATP NA CONTRACÇÃO

MUSCULAR

A quantidade absoluta de ATP no músculo é pequena

A contracção muscular precisa exclusivamente do ATP (hidrólise]

Durante o esforço máximo apenas se nota ligeira diminuição do ATP

Deve existir um bom equilíbrio entre a velocidade de hidrólise do ATP

e a velocidade que o ATP é ressintetizado

Pequenas oscilações neste equilíbrio podem ser responsáveis pelo

aparecimento de fadiga muscular durante o esforço.

O sistema de transmissão nervo/músculo também pode alterar-se devido a perturbações

no mecanismo de condução no sistema T e por a libertação do Ca2+

a partir do retículo

sarcoplásmico também ser afectada por perturbações da composição iónica e do pH do meio

(22). Por outro lado o mecanismo contráctil também pode ser afectado devido a modificações da

afinidade da troponina para o Ca2+

devido a alterações de pH e ao aumento da concentração de

Mg2+

quando o ATP diminui (22). A actividade da ATPase da miosina pode diminuir quando o

pH diminui e o ADP e o fosfato inorgânico aumentam (22).

A energia livre obtida a partir da cisão (hidróIise) do ATP, diminui durante a estimulação

continua. Devido a este facto, a quantidade de energia disponível é insuficiente para manter o

ciclo de acoplamento nas proteínas contrácteis (actina/miosina), facto que pode só por si ser

limitativo da capacidade contráctil em resposta a estimulação continua (22).

Além da fase de encurtamento, também o período de relaxação pode estar perturbado no decurso

da estimulação continua, contribuindo para a disfunção contráctil que se verifica nestas situações

(22, 36).

O desacoplamento actina/miosina depende da velocidade de hidróIise do ATP e da

capacidade de bombear Ca2+

para o retículo sarcoplásmico a partir da sua ligação à troponina C

(vide "Calmodulina e ATPase do Ca2+

, noutra secção desta monografia), dependendo ambos os

mecanismos do metabolismo energético. Assim, a velocidade de relaxamento pode ser

considerada uma medida indirecta da capacidade energética do músculo (22). No Homem, o

relaxamento parece ser independente da energia livre disponível para a hidróIise do ATP, facto

que não se observa em preparações de músculo de rã (36). Por outro lado, parece que no Homem

a acumulação de lactato e as modificações de pH não são só por si responsáveis pela perturbação

no relaxamento, uma vez que se verifica uma rápida normalização neste parâmetro na fase

precoce da recuperação após estimulação eléctrica, quando. ainda existem profundas alterações

no pH e se mantém elevadas concentrações de lactato. Os valores absolutos da concentração de

ATP também não parecem ter importância decisiva, uma vez que pouco se alteram na fase

precoce da recuperação (22, 37). Um factor importante parece ser a concentração de ADP, uma

vez que quando aumentada leva a uma diminuição da velocidade de desacoplamento e a uma

redução na actividade da ATPase do Ca2+ existente na membrana do retículo sarcoplásmico, o

qual vai condicionar a transferência de e para esta estrutura celular (22). Por outro lado, parece

haver uma certa relação entre a queda na velocidade de síntese do ATP durante a estimulação

Page 126: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DA FADIGA

Actas Bioq. 1989; 1:109-124

121

continua e a ocorrência de perturbações na fase de relaxamento. Uma diminuição na relação

ATP/ADP leva a diminuição na velocidade de transferência do Ca2+

para o retículo

sarcoplásmico com atraso no fornecimento ao sistema contráctil e consequente prolongamento

do tempo de relaxação (22). Este fenómeno, contudo, coincide no tempo de relaxação (22). Este

fenómeno, contudo, coincide no tempo com o início da utilização da reserva de fosfocreatina e

normaliza rapidamente quando este metabolito é ressintetizado na fase precoce da recuperação.

Esta ligação entre a fosfocreatina e a relaxação parece dever-se ao facto desta substancia

constituir uma reserva imediata para a refosforilação do ADP recém-formado, permitindo que a

produção de ATP se conserve a um nível compatível com a ocorrência de relaxação a velocidade

normal (22).

Conforme foi referido noutra secção (vide "Energética muscular") existem diferentes

tipos de fibras musculares vocacionadas para diferentes tipos de esforço, devido às suas

características metabólicas próprias.

Num músculo ou grupo de músculos, quanto maior for a percentagem de fibras de

contracção rápida, mais dependente do conteúdo em glicogénio se torna a unidade muscular,

uma vez que este tipo de fibras tem um metabolismo energético altamente dependente da

glicólise, com elevada probabilidade de produção de lactato se o esforço for relativamente

prolongado. Este tipo de músculos esta melhor adaptado para esforços intensos e rápidos, uma

vez que nos esforços demorados a produção de lactato inibe rapidamente a glicólise (25, 29, 33,

38).

Pelo contrario, se os músculos forem ricos em fibras de contracção lenta, nas quais

predomina o metabolismo oxidativo como fonte energética, tornam-se mais resistentes à fadiga

quando solicitados para esforços prolongados, por serem capazes de utilizar outros substratos

para além do glicogénio (25, 29, 33, 38).

A distribuição destes tipos de fibras pelos diferentes músculos parece obedecer a padrões

individuais seguindo uma orientação em mosaico por influência genética, sem diferenças

notáveis intersexos e não sendo influenciável pelo tipo de treino seguido (33, 38).

CONCLUSÃO

A fadiga muscular. no homem activo e saudável resulta da interacção de diversos factores

periféricos locais, aos quais se juntam em determinadas circunstancias factores centrais. Estes,

provavelmente resultam da inibição de centros nervosos diferenciados, localizados no sistema

nervoso central, os quais são influenciados por estímulos provenientes dos músculos em

actividade.

O conhecimento destes mecanismos e da sua interdependência é fundamental para a

prevenção e correcta terapêutica da "síndrome fadiga" nas suas vertentes bioquímica,

neurológica e psicológica.

SUMMARY

The definition of the term "fatigue" is usually subjected to various

interpretations, which may lead to confusion when applied in daily clinical

practice. The subject discussed deals with the notion of "muscle fatigue". The

"vulnerable points" in the chain of reactions leading to contraction of striated

muscle are analysed, since they may presumably be involved in interruption of

Page 127: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS DOS SANTOS L.

122

exertion by fatigue. From this discussion are excluded situations such as

cardiorespiratory or hematologic pathologies, which by themselves can induce

impairment in tolerance to exertion. Different theories are presented that

attribute the leading role in resistance to fatigue to nervous centres (central

fatigue) or muscular units (peripheral fatigue), respectively. Biochemical and

hystophysiologic mechanisms justifying the importance of the psychologic

stimulus, coupled to an adequate physical training in improving effort

performance. A special emphasis is given to the importance of phosphocreatine

levels and ATP turnover in the maintenance of muscle contraction in different

kinds of efforts, and also to the possible interference of lactate, a "major

substance of fatigue", in these mechanisms (by means of a pH-effect upon Ca2+

binding by contractile proteins, inhibition of key-enzymes of glycolysis

(phosphofructokinase) and gluconeogenesis (phosphorylase), and diminished

lypolysis), as well as availability of oxidisable energetic substrates

glucose/glycogen and free fatty acids) in different types of striated muscle fibers

("aerobic" or type I; and "anaerobic" or type II).

BIBLIOGRAFIA

1. ASMUSSEN E. Muscle fatigue. Med Sci Sport Exercise 11:313-321,1979

2. MOSSO A. Die Ermüdung. Hirzel, Leipzig. p 333, 1892 (citado pela referência 1)

3. BIGLAND-RITCHIE B, JONES DA, HOSKING GP, EDWARDS RHT. Central and

peripheral fatigue in sustained maximum voluntary contractions of human quadriceps

muscle. Clin Sci Mol Med 54:609-614,1978

4. REID C. The mechanism of voluntary muscular fatigue. Q J Exp Physiol 19:17-42,1928

5. MERTON PA. Problems of muscular fatigue. Brit Med Bull 12:219,1956

6. BROWN GL, BURNS BD. Fatigue and neuromuscular block in mammalian skeletal

muscle. Proc Roy Soc Biol 136:182,1949 (citado pela referência 1)

7. BIGLAND-RITCHIE B, JONES DA, WOODS JJ. Excitation frequency and muscle

fatigue: electrical responses during human voluntary and stimulated contractions. Exp

Neurol 64:414-427,1979

8. GRIMBY-L, HANNERZ J, BORG J, HEDMAN B. Firing properties of single human

motor units on maintained maximal voluntary effort. In Ciba Foundation Symposium'82

"Human muscle fatigue: physiological mechanisms". Pitman Medical (London), pp 157-

165,1981

9. SETCHENOV IM. Zur Frage nach der Einwirkung sensitiver Reize auf die Muskelarbeit

des Menschen. in Selected works. Moscow, 1935 (citado pela referência 1)

10. ASMUSSEN E, MAZIN B. Recuperation after muscular fatigue by "diverging activities".

Europ J Appl Physiol 38:1-8,1978

11. ASMUSSEN E, MAZIN B. A central nervous component in local muscular fatigue. Eur J

Appl Physiol 38:9-15,1978

12. WEBER E. Eine physiologische Methode, die Leistungsfähigkeit ermüdeter Muskeln zu

erhölen. Arch Physiol (Leipzig) 385-420, 1914 (citado pela referência 1)

13. HANNERZ J, GRIMBY L. The afferent influence on the voluntary firing range of

individual motor units in man. Muscle Nerve 2:414-422,1979

Page 128: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DA FADIGA

Actas Bioq. 1989; 1:109-124

123

14. ROJTBACK AJ, DEDABRISHUILI CM. On the mechanism of "active rest". Dokl Akad

SSSR 124:957-960,1959

15. MERTON PA. Voluntary strength and fatigue. J Physiol (London) 123:553-564,1954

16. MERTON PA, HILL DK, MORTON HB. Indirect and direct stimulation of fatigued human

muscle. In Ciba Foundation Symposium'82 "Human muscle fatigue: physiological

mechanisms''- Pitman Medical (London), pp 120-126,1981

17. STEPHENS JA, TAYLOR A. Fatigue of maintained voluntary contraction in man. J

Physiol (London) 220:1-18,1972

18. BERGSTROM J, HULTMAN E. A study of glycogen metabolism during exercise in man.

Scand J Clin Lab Invest 19:218-228,1967

19. HULTMAN E, BERGSTROM J. Local energy-supplying substrates as limiting factors in

different types of leg muscle work in normal man. In Limiting factors of physical

performance. International Symposium (Gravenbruch 1971). Keul J (ed), Georg Thieme

(Stuttgart), pp 113-125,1973

20. SPANDE JI, SCHOTTELIUS BA. Chemical basis of fatigue in isolated mouse soleus

muscle. Amer J Physiol 219:1490-1495,1970

21. BERGSTROM J, HARRIS RC, HULTMAN E, NORDESJOL A. Energy rich phosphagens

in dynamic and static work. Adv Exp Med Biol 11:341-355,1971

22. HULTMAN E, SJOHOLM H, SAHLIN K, ERDSTROM L. Glycolytic and oxidative

energy metabolism and contraction characteristics of intact human mucle. In Ciba

Foundation Symposium'82 "Human muscle fatigue: physiological mechanis". Pitman

Medical (London), pp 19-35, 1981

23. HERMANSEN L. Effect of metabolic changes on force generation in skeletal muscle

during maximal exercise. In Ciba Foundation Symposium'82 "Human muscle fatigue:

physiological mechanisms". Pitman Medical (London), pp 75-82, 1981

24. JONES DA, BIGLAND-RITCHIE B, EDWARDS RHT. Excitation frequency and muscle

fatigue: mechanical responses during voluntary and stimulated contractions. Exp Neurol

64:401-413,1979

25. EDWARDS RHT. Human muscle function and fatigue. In Ciba Foundation Symposium'82

"Human muscle fatigue: physiological mechanisms". Pitman Medical (London), pp 1-18,

1981

26. BENAZILLA F, CAPUTO C, GONZALEZ-SERRATOS H, VENOSA RA. Sodium

dependence of the inward spread of activation in isolated twitch muscle fibers of the frog. J

Physiol (London) 223:507-523,1972

27. NASSAR-GENTINA V, PASSONNEAU JV, VERGARA JL, RAPAPORT SI. Metabolic

correlates of fatigue and of recovery from fatigue in single frog muscle fibers. J Gen

Physiol 72:593-606,1978

28. ROWLAND LP, ARAKI S, CARMEL P. Contracture in McArdle's disease. Arch Neurol

13:541-544,1965

29. WILES CM, JONES DA, EDWARDS RHT. Fatigue in human metabolic myopathy. In

Ciba Foundation Symposium'82 "Human muscle fatigue: physiological mechanisms".

Pitman Medical (London), pp 264-277,1981

30. BERGSTROM J, HULTMAN E. Nutrition for maximal sports performance. J Amer

MedAssoc 221:999-1006,1972

31. SALTIN B, KARLSSON J. Muscle glycogen utilization during work of different

intensities. Adv Exp Med Biol 11:289-299,1971

Page 129: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS DOS SANTOS L.

124

32. HULTMAN E. Studies on muscle metabolism of glycogen and active phosphate in man

with special reference to exercise and diet. Scand J Clin Lab Invest 19 (suppl 94):1-64,1967

33. SALTIN B. Muscle fibre recruitment and metabolism in prolonged exaustive dynamic

exercise. In Ciba Foundation Symposium,82 "Human muscle fatigue: physiological

mechanisms" Pitman Medical (London), pp 41-52,1981

34. ROSE CP, GORESKY CA. Constraints on the uptake of labeled palmitate by the heart.

The barriers at the capillary and sarcolemmal surfaces and the control of intracellular

sequestration. Circ Res 41:534-545,1977

35. HARRIS RC, SAHLIN K, HULTMAN E. Phosphagen and lactate contents of m.

quadriceps femoris of man after exercise. J Appl Physiol 43:852-857,1977

36. DAWSON MJ, GADIAN DG, WILKIE DR. Mechanical relaxation rate and metabolism

studied in fatiguing muscle by phophorus nuclear magnetic resonance. J Physiol (London)

229:465-484,1980

37. HARRIS RC, EDWARDS RHT, HULTMAN E, NORDESJO LO, NYLNID B, SAHLIN

K. The time course of phosphorylcreatine resynthesis during recovery of the quadriceps

muscle in man. Pflügers Arch-Eur J Physiol 367:137-142,1976

38. GOLLNICK PD, SEMBROWICH WL. Adaptation in human skeletal muscle as a result of

training. In Exercise in Cardiovascular Health and Disease. Amsterdam EA, Wilmore JH

and DeMaria A (eds), Yorke Medical Books (New York), 1977, pp 70-94

Page 130: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989, 1:125-129 125

ANATOMIA, FISIOLOGIA E PATOLOGIA DA PLACA MOTORA

F. Morgado

F.M. LISBOA - H.S. MARIA

SUMÁRIO

Descreve-se a morfologia ultramicroscópica normal da placa motora, faz-se

referência ao receptor da acetilcolina e a sua fisiologia e par fim aborda-se a

patologia da transmissão neuromuscular.

INTRODUÇÃO

Desde as primeiras descrições de Rouge em 2861, ate aos trabalhos de Couteaux em 2

946 e 47 em que descreve a microscopia óptica da zona de contacto neuromuscular, passando

peio desenvolvimento do conceito de neurotransmissor como mediador da contracção muscular,

de Otto Loewi em 2922, há um longo período cheio de descrições contraditórias. Nos últimos 30

anos no entanto, é de tal modo grande a número e a importância dos trabalhos sabre a junção do

nervo motor com a fibra muscular esquelética que não é possível fazer aqui senão um breve

resumo sabre o assunto.

Anatomia da Placa Motora (P.M.)

A actividade do músculo estriado esquelética é controlada pelo sistema nervoso central,

através da inervação pelo neurónio motor periférico.

Cada axónio motor ao entrar no músculo emite sucessivas ramificações sub-terminais

enervando um número variável de fibras, de 4 a 5 para os músculos oculares externos e algumas

centenas para a maioria dos outros músculos (ver por ex. 2,3, e 29).

Visto em microscopia electrónica, cada ramificação nervosa destinada a uma fibra

muscular, apresenta uma fasciculação distal de 10 a 15 filamentos que entram em contacto com a

membrana sarcoplásmica (M.S.) par uma dilatação terminal (29). A M.S. no ponto de contacto

Palavras-chave: Placa motora, junção mioneural, junção neuromuscular, receptor

da acetilcolina.

Page 131: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MORGADO F.

126

com a terminação nervosa, apresenta uma estrutura especializada constituída por numerosas

pregas que no conjunto são designadas por aparelho sub-neural (ASN) (2,3, e 29). As pregas do

ASN são no seu 1/3 externo ricamente anastomosadas entre si e constituídas por uma membrana

mais densa aos electrões.

Nos 2/3 internos, as pregas do ASN apresentam-se como fendas simples formadas por

uma membrana com densidade idêntica à restante M.S. Aqui são observadas numerosas

fenestrações em continuidade com o sistema tubular transverso da fibra muscular, o que vai ter

importância na propagação da onda de despolarização para o interior da fibra.

O conjunto formado pela terminação nervosa e o aparelho sub-neural isolado por um

prolongamento citoplasmático da célula de Schwann que acompanha o axónio motor, é

designado por placa motora, junção neuro-muscular ou junção mioneural (ver por ex. 2,3,5,9, e

29).

A dilatação nervosa terminal apresenta no centro muitas mitocôndrias, neurofilamentos e

neurotúbulos, à periferia, amontoadas junto à membrana nervosa, numerosas vesículas sinápticas

que contêm a acetilcolina (ACh).

No espaço sub-neural, por debaixo das pregas do ASN, podem ver-se algumas

mitocôndrias, perfis tubulares, filamentos, ribossomas e alguns núcleos vesiculosos.

A membrana nervosa da F.M. é designada por membrana pré-sináptica, a M.

sarcoplasmática da P.M. por membrana pós-sináptica e a fenda que os separa, a fenda sináptica.

Nesta pode ver-se ainda um extracto moderadamente denso aos electrões, a lâmina basal. Na

membrana pós-sináptica, justa neuronal, onde a densidade aos electrões é maior está situada a

maior concentração de receptores da acetilcolina (RACh). Isto foi comprovado usando uma

toxina da Cobra Bungarus-Multicinctus, a -Bungaratoxina, marcada pela peroxidase, que tem

uma afinidade específica para os RACh (2, 3, 28 e 29).

Usando os órgãos eléctricos da enguia, Electroforus electricus, que são constituídos quase

exclusivamente por RACh, foi possível conseguir material suficiente para a estudo da estrutura

dos RACh.

Há algumas linhas de evidência de que estes RACh não diferem muito dos RACh dos

mamíferos. Os RACh assim estudados têm um peso molecular de cerca de 250 000 e são

constituídos por 5 subunidades dispostos circularmente em torno do canal de iões. As 2

subunidades onde se liga a ACh têm um peso molecular de cerca de 40 000 a são designadas par

. As 3 restantes têm pesos moleculares que variam entre os 50 e 60 000 a são designados por

(ver por ex. 2, 5, e 30).

Fisiologia da P.M.

A despolarização da fibra muscular inicia-se com a chegada de um potencial de acção à

terminação nervosa. Isto modifica a permeabilidade da membrana nervosa pré-sináptica para os

iões de Ca++

que entram e para a ACh que sai, por exocitose de centenas de vesículas que lançam

o seu conteúdo na fenda sináptica. Pensa-se que cada vesícula sináptica contem um número

constante de moléculas de ACh, 5 a 10 000, o que é designado por quantum. É referido a este

propósito que a libertação da ACh se faz de maneira quântica (o que significa que em dado

momento é lançado na fenda sináptica um múltiplo simples de um mínimo possível).

A ACh difunde-se rapidamente na fenda sináptica, indo ligar-se aos RACh da membrana

pós-sináptica, 2 moléculas de ACh por receptor, o que dá lugar à abertura do canal de iões com

saída de K+ e entrada de Na

+ na fibra muscular.

Page 132: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

PLACA MOTORA

Actas Bioq. 1989, 1:125-129

127

Quando o número suficiente de RACh for activado, o potencial de repouso da membrana

pós-sináptica cai de -90 mv para cerca de -50 mv, estando criadas as condições para a

propagação do potencial de acção a toda a membrana sarcoplásmica e para o interior da fibra,

através do sistema tubular transverso que está em contacto com a zona mais interna do ASN.

Segue-se a hidrólise da ACh pela acetilcolinesterase (AchE). A colina e os radicais acetilo

libertados reentram na terminação nervosa e são usados na síntese, por intermédio da acetilcoli-

transferase de novas moléculas de ACh, que ficam armazenadas nas yesículas sinápticas (2, 3, 4,

17 e 30).

Patologia da P.M.

1) Pré-sináptica

a) Com carácter transitório: Antibióticos que impedem a propagação do potencial de acção

do nervo com a clindamicina a lincomicina (17).

b) Degenerescência mielino/axonal com destruição das terminações nervosas dos nervos

motores (9).

Botulismo com fixação da toxina na face externa da membrana pré-sináptica o que impede a

entrada de Ca++

e saída de ACh (29).

S. Eaton-Lambert causada por anticorpos contra a terminação nervosa (TN) (7, 2 e 27).

Intoxicação pelo Mg++

que compete com a Ca++

e a saída de ACh da TN e da FM (17).

f) Aminoglicósidos qua inibem a libertação da ACh na TN assim coma fenitoína e a

cloropromazina (17).

g) Miastenia congénita por perturbações de resíntese da Ach na TN (7).

2) Patologia que actua a nível da fenda sináptica

a) Miastenia congénita com ausência na FM de AChE (5, 6 e 7).

b) Organofosforados que inibem de modo irreversível AChE e outros Anti-AChE usados no

tratamento da miastenia gravis como a piridostigmina, neostigmina e o edrofonium que

inibem o AChE de modo reversível (20).

3) Patologia que actua ao nível do RACh na membrana pós-sináptica da FM

a) Miastenia gravis em que há formação de anticorpos anti-RCch e subsequentemente a

destruição do ASN (2, 3 e 18, por ex.).

b) Miastenia congénita atribuída a uma deficiência na abertura do canal de iões do RACh

(5).

c) Intoxicação pela nicotina, alcaloide da Nicotiniana Tabacum, que estimula os RAcK e

pela d-tubocurarina alcaloide da Condodredum Tomentosum que os bloqueia (17).

SUMMARY

This rev1aw focuses the normal neuromuscular junction and acetylcholine

receptor in the postsynaptic membrane of muscle and the pathology of the

neuromuscular transmission.

BIBLIOGRAFIA

Page 133: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MORGADO F.

128

1 - ALBERS, JW. FAULKNER, JA. DOROVINI-ZIS K. BARALD, KF. MUST, RE. AND

BALL, RD. Abnormal neuromuscular transmission in an infantile myasthenic syndrome.

Ann Neural. 16:28--34, 1984

2 - ALBUQUERQUE, EX. AND ELDEFRAWI, AT. Myasthenia Gravis. Chapman and Hall

Ltd., Cambridge, 1983

3 - CANELIER, J. La Myasthenie. J.B. Baillière et Fils Editeurs, Paris 1968.

4 - CANELIER, S. BON, S. VIGNY, M. MASSOULIÉ. AND FARDEAU, M. Distribution of

acetylcholinesterase molecular farms in neurol and non-neural section of human muscle.

Elsevier/North/Holland Biomedical Press. Vol. 97 Nº 2: 348-352, 1979.

5 - ENGEL, AG. Morphologic and immunopathologic findings in myasthenia gravis and in

congenital myasthenic syndromes. Journal of Neurology, Neurosusgery and Psychiatry, 43:

577-589, 1980.

6 - ENGEL, AG. LAMBERT, EH. AND GOMEZ, MR. End-Plate acetylcholinesterasa

deficiency associated with sural nerve terminals and reduced acetylcholine release. A New

Syndrome. International Journal of Neurology, 14: Nº 1 73-86, 1980.

7 - ENGEL, AG. Myasthenia Gravis and myasthenia syndromes. Ann Neural. 16: 519-534,

1984.

8 - FARDEAU, H. GODET-GUILLAIN J. AND CHEVALLAY, M. Ultrastructural changes

of the motor end-plates in myasthenia gravis and myasthenia syndrome. Neurology.

Proceedings of the H International Congress of Neurology. Excerpts Medics, Amsterdan,

1972.

9 - FARDEAU, M. ET DREYFUS, F. La Jonction neuro-musculaira. Histoire et actualité. La

Revue du Praticien. 25, 59: 4663-4667, 1975.

10 - FARDEAU, M. La Jonction neuro-musculaire dans la myasthenia. Annales de Chirurgie,

34 Nº 3: 140-146, 1980.

11 - FARDEAU, M. DREYFUS, P. ET RIEGER, F. La Myasthénie. La Recherche Nº 115

Vol.11: 1206-1208, 1980.

12 - GOULAN, M. ESTOURNET, B. AND TULLIEZ, M. Myasthenia Gravis and associated

diseases. International Journal of Neurology. Vol. 14, Nº 1 : 61-72, 1980.

13 - HONEYBOURNE, D. DYER, PA. AND MOHR, PD. Familial myasthenia gravis Journal

of Neurology, Neurosurgery and Psychiatry. 45: 854-856, 1982.

14 - LINDSTROM, JM. EINARSORE, BL. LENNON, VA. AND SEYBOLD, ME.

Pathological mechanisms in experimental antoimmune myasthenia gravis. The Journal of

Experimental Medicine Vol. 144: 726-738, 1976.

15 - LINDSTROM, JM. AND LAMBERT, EH. Content of acetylcholine receptor and

antibodies bound to receptor in myasthenia gravis, experimental antoimmune myasthenia

gravis, and Eaton-Lambert syndrome. Neurology 28: 130-138, 1978.

16 - LENNON, VA. SEYBOLD, ME LINDSTROM, JM. COCHRANE, C. AND ULEVITCH,

R. Role of complement in the pathogenesis of experimental antoimmune myasthenia

gravis. 4. Exp. Mad. 147: 973-983, 1978.

17 - MASTAGLIA, FL. AND ARGOV, Z. Drug-Induced neuromuscular disorders John

Walton, Churchill Livingstone, Newcastle, 1981 pp 881-887.

18 - MORGADO, F. SALES-LUIS, ML. LOURENÇO, MG. PARAMÉS, MT. JUNIOR, MEC.

MACHADO, ML. FERREIRA, JA. ALVES, M. SERRÃO, R. MOREL, F. Myasthenia

Gravis clinical immunological and therapeutic correlations. Muscle and Nerve 9: 55; 150,

1986.

Page 134: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

PLACA MOTORA

Actas Bioq. 1989, 1:125-129

129

19 - PATTEN, BM. Myasthenia Gravis: review of diagnosis and management Muscle and

Nerve 1: 190—205, 1978

20 - PEN, AS. AND ROWLAN, LP. Neuromuscular Junction. Merritt’s text book of Neurology

Las and Febiger, Fhiladelphia, 1984, 561-569.

21 - REINESS, CG. WEINBERG, CB, AND HALL, ZW. Antibody to acetylcholina receptor

increases degradation of functional and extrajunctional receptors in adult muscle. Nature,

Vol. 274; 68-70, 1978.

22 - RIBETRO JA. AND MCQUEEN, DS. On the Neuromuscular depression and karotib

chemoreceptor activation caused by adenosina. Physiology and Pharmacology of

Adenosine Derivatives. J.W. Daly Raven Press New York, 1983, pp 179-1 88.

23 - RIGGS, JE. Pharmacologic enhancement of neuromuscular transmission in myasthenia

gravis. Clin. Neuropharmacol. Vol 5 Nº 3: 277-292, 1 982.

24 - SATYAMURTI, S. DRACHMAN, DB. AND SLONE, F. Blockade of acetylcholine

receptors; a model of myasthenia gravis. Science, 187; 955-957, 1975.

25 - SMIT, LME. AND BARTH, PG. Arthrogryposis multipla congenita due to congenital

myasthenia. British Medical Journal Vol.22 Nº.3: 490-491, 1 980.

26 - SANDERS, DB, KIM, YI. HOWARDJE, JF. AND GOETSCH, CA. Eaton-Lambert

syndrome: a clinical and electrophysiological study of a patient treated with -aminopyrina.

Journal of Neurology, Neurosurgery and Psychiatry, 43; 978-985, 1980.

27 - TROTTER, JL. RINGEL, SP. COOK, JD. ENGEL, WK. ELDEFRAWI, ME. AND

MCFARLIN, DE. Morphologic and immunologic studies in experimental autoimmune

myasthenia gravis and myasthenia gravis. Neurology 27 pp 1120-1124, 1977.

28 - TAYLOR, B. Excitation and contraction of muscle general physiological processes.

Physiological Basis of Medical Pratice. John R. Brobeck 10ª. Edição, London, 59-113,

1979.

29 - VAPAATALO, H. Role of cyclic nucleotides in the nervous system. Medical Biology 52:

200-207, 1974.

30 - VICENT, A. AND NEWSON-DAVIS, J. Anti-acetylcholine receptor anti-bodies. J. of

Neural, Neuros. and Psych., 43: 590-600, 1980.

Page 135: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989, 1:131-141 131

BINÓMIO EXCITAÇÃO-CONTRACÇÃO

J. Silva Carvalho

Instituto de Fisiologia da Faculdade de Medicina de Lisboa

RESUMO

O Autor esquematiza o acoplamento excitação-contracção do seguinte

modo: Estímu1o despolarização do sarcolema potencial de acção e sua

propagação libertação de Ca+ do retículo sarcop1asmático Ca

2+

Troponina C eliminação do efeito inibidor da Troponina I sobre a interacção

actina/rniosina os filamentos de actina deslizam ao longo dos de miosina

encurtando deste modo o sarcómero. Refere-se dum modo muito sucinto ao

estímulo e às modificações da membrana por ele provocadas e depois às

modificações que se lhe seguem. Dá importância especial ao papel

desempenhado pelos tubos transversais na propagação do estímulo em especial

até ao interior das fibras. Destaca a importância dos iões Ca no processo

excitação-contracção e refere os mecanismos de libertação deste ião para o

sarcoplasma, bem como as afinidades e locais da sua ligação ao complexo

Troponina. Em seguida, mostra corno a interferência do Ca permite a união

actina/miosina e daí o deslizamento dos filamentos com a resultante

contracção. Depois duma a1usão às relações entre o Ca e a força de contracção,

e entre esta e a posição dos filamentos de actina e miosina, descreve o

funcionamento da bomba de cálcio referindo a importância da Calsequestrina

na remoção deste ião, bem corno as hipóteses de transferência do Ca para o

sarcotúbulo.

Palavras-chave: Potencial de membrana, potencial de acção, Ca 2+

, proteínas Contrácteis,

calsequestrina

Page 136: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

132

A estimulação do músculo através do seu nervo ou directamente põe em marcha um

processo que se inicia no sarcolema e termina na máquina contráctil. Tal processo designa-se,

como é do conhecimento geral - acoplamento ou binómio excitação-contracção.

O processo resume-se ao seguinte esquema:

Estímulo despolarização do sarcolema potencial de acção e sua propagação

libertação do retículo sarcoplásmico (R. S.) Ca + troponina C eliminação do efeito inibidor

da troponina I sobre a interacção actina/miosina os filamentos de actina deslizam ao longo

dos filamentos de miosina encurtando deste modo o sarcómero.

Esta série de acontecimentos é completamente reversível, resultando daí o relaxamento

do músculo.

Nas linhas seguintes vamo-nos referir em primeiro lugar, e dum modo sucinto, ao

estímulo e às modificações da membrana por ele provocadas e depois aos acontecimentos que se

lhe seguem.

ESTÍMULO E MODIFICAÇÕES DO POTENCIAL DE MEMBRANA

O estímulo pode ter várias origens: eléctrica, compressão mecânica, química ou qualquer

outra que modifique o estado em repouso do sarcolema.

O estímulo fisiológico e químico é produzido no neurotransmissor - placa terminal -

aumentando aí subitamente a permeabilidade da membrana ao Na. Por isso modifica-se também

muito rapidamente o potencial de membrana (repouso) estabelecendo-se em sua substituição o

potencial de acção

Vejamos então muito resumidamente estas modificações.

O potencial de repouso das fibras do músculo esquelético é de (-90 mv.) semelhante aos

das fibras nervosas mielínicas, e tal como estas, devido às diferentes distribuições iónicas dentro

e fora da membrana, às próprias características desta estrutura e acção da bomba de Na-K.

A maioria dos aniões intracelulares está representada pelas grandes moléculas proteicas

designadas A.

O ião K é o principal componente do líquido intracelular e actua sobretudo mantendo os

potenciais de repouso que se aproximam do potencial de equilíbrio do K+ (EK). Se a

concentração de K+ extracelular aumentar, potencial de repouso diminuirá de acordo com e

Equação de Nerst. O ião Na é o principal componente do líquido extracelular. Actua aumentando

a pressão osmótica (osmolaridade do líquido extracelular). A permeabilidade (condutância) da

célula muscular ao Na+ é muito baixa.

O Cl- é o principal anião do líquido extracelular e segue de forma passiva os catiões que

se movem através da membrana da célula muscular distribuindo-se de acordo com o equilíbrio

de Gibbs-Donnan.

O potencial de acção resulta da modificação brusca da condutância iónica.

Na fase de ascensão do potencial de acção ou despolarização, a condutância do sódio

sofre um aumento de várias centenas de vezes por isso, cargas positivas entram nas células (sob a

forma de Na+) invertendo-se deste modo a polaridade. Devido a que a permeabilidade ao Na

depende da voltagem, “precipita-se” cada vez mais Na no interior da célula à medida que avança

a despolarização. O fenómeno apresenta-se como um processo de retro-alimentação positiva, que

se propaga ao longo do sarcolema, como veremos mais tarde.

Page 137: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

EXCITAÇÃO E CONTRACÇÃO

Actas Bioq. 1989, 1:131-141

133

No momento em que atinge o “pico” da despolarização, isto é, da máxima positividade

no interior da célula, o potencial de membrana aproxima-se do potencial de equilíbrio do Na

(ENa).

Em seguida, diminui a gNa e aumenta a do potássio. Essas modificações explicam o

regresso do potencial de acção ao nível do de repouso (repolarização). A repolarização processa-

se muito rapidamente até um potencial de -70 mv. Neste nível de potencial de membrana, o

processo de repolarização desenvolve-se com uma constante de tempo relativamente longa (Fig.

1). Este fenómeno observa-se com facilidade no músculo do mamífero e atribui-se a

permanência dum excesso do K nos tubos transversais. A voltagem da membrana neste último

período designa-se por pós-potencial negativo. O período de pós-potencial negativo vai por sua

vez ser seguido do um período de hiper-polarização designado por pós-potencial positivo. Só

então regressa o potencial do repolarização ao normal. O pós-potencial positivo deve-se

principalmente ao exagero na condutância do K em relação à que este ião apresenta em repouso.

A bomba do Na-K mantém o potencial do repouso constante até ao aparecimento dum novo

estímulo.

FIGURA I

Potencial de acção do músculo esquelético. Em ordenadas: potencial de

membrana intracelular. Em abcissas: tempo em segundos.

O potencial de acção, assim gerado numa região da membrana sarcoplasmática, propaga-

se às partes que lhe são adjacentes transmitindo assim a excitação a toda a fibra muscular.

Há provas evidentes que os tubos transversais do sarcómero intervêm na propagação do

estímulo até ao interior das fibras. Estes tubos têm continuidade com a membrana plasmática e

portanto o estreito canal do tubo é contínuo com o espaço extracelular.

Com efeito eles podem ser activados (corno Huxley e Taylor demonstraram) (6), pela

aplicação de correntes fracas através de um microeléctrodo. Obtém-se deste modo uma

despolarização local de uma região tão pequena que somente o tubo transverso é estimulado. O

resultado é uma contracção local limitada à miofibrilha superficial de duas metades dos

sarcómeros adjacentes ao tubo.

Page 138: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

134

Quanto maior for a intensidade do estímulo, mais em profundidade são o número de

miofibrilhas activadas (Fig. II). Por outro lado, se os tubos não existirem não há propagação do

estímulo, e falta também a contracção do músculo, embora possa haver Ca+. É o que se verifica

quando este sistema é destruído com soluções hipertónicas de Ringer com glicerol. Com efeito,

nestas condições, os músculos não se contraem como resposta à excitação. Embora os tubos

sejam necessários para a propagação dos estímulos, a natureza dos impulsos ao longo do sistema

T ainda se desconhece. Do ponto do vista estrutural existem todas as condições para se poder

considerar uma propagação electrónica das variações do potencial associadas com o potencial do

acção da membrana do sarcolema.

FIGURA II

Demonstração da actividade local do sistema T. A - antes da estimulação. B -

após a estimulação

Seja com for, a propagação do potencial de acção está acompanhada como vimos, por correntes

que fluem para o interior da fibra muscular. Contudo, estas correntes não são directamente

responsáveis pela activação dos mecanismos contrácteis. Com efeito, não existe interacção de

actina e miosina na presença do sistema troponina/tropomiosina e ATP se não existir também

Ca+. A activação depende portanto da libertação do ião Ca que é o mediador do processo que

vincula a excitação da membrana (que acabamos de ver) com o início da contracção, que

consideramos adiante.

Relação entre o cálcio e a excitação-contracção

Sabe-se desde há muitos anos, que a injecção intracelular de iões Ca produz contracção das

fibras musculares. Esta pode-se obter, segundo Campbell (3), com SR2+

e o Ba2+

mas em

Page 139: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

EXCITAÇÃO E CONTRACÇÃO

Actas Bioq. 1989, 1:131-141

135

concentrações muito superiores às obtidas com o Ca níveis tão elevados das concentrações destes

iões não existem no organismo).

O sítio onde se armazena o Ca é o retículo sarcoplasmático. Os iões Ca são fixados à

membrana destas estruturas e concentrados no lume dos tubos. Veremos adiante como se julga

que se processa esta fixação.

Interessa-nos agora saber corno a excitação liberta o Ca do retículo para o sarcoplasma.

Não há opinião unânime acerca do fenómeno. O assunto foi há poucos anos estudado por

Endo (5) e, recentemente, revisto por Campbell (3).

Duas possibilidades existem:

1) Despolarização da membrana do retículo como resultado da interacção directa com as

cargas eléctricas da membrana celular.

2) Libertação induzida pelo Ca e causada por um aumento local do Ca que cruzou a

membrana celular. Esta hipótese aplica-se especialmente ao músculo liso e coração.

Em relação à primeira hipótese (Fig. III) o potencial de acção chegaria pelos tubos em T

às cisternas laterais do retículo sarcoplasmático que libertariam o Ca para o sarcoplasma.

FIGURA III

Diagrama do acoplamento excitação/contracção (explicação no texto)

O achado de canais entre tubos e as cisternas laterais pareceria apoiar a hipótese.

Chandler e Schneider (4), sugerem que durante o repouso estes canais encontram-se fechados,

mas o potencial de acção que chega aos tubos T produz uma transferência do carga que, de

alguma maneira leva às modificações de configuração da membrana das cisternas e à abertura

Page 140: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

136

dos canais. Supõe-se que as correntes iónicas assim geradas, induzem a libertação de Ca das

cisternas para o sarcoplasma.

A segunda hipótese está apoiada na verificação de que o retículo do músculo cardíaco e

liso pode ser estimulado a libertar Ca para o citosol por concentrações muito baixas deste ião.

No músculo liso a concentração pode ser estimulada pela acetilcolina provocando a

abertura dos canais Ca-dependentes, sem contudo causar potenciais de acção.

Dum ou doutro modo, é possível demonstrar que a estimulação eléctrica liberta Ca para o

sarcoplasma e, que esta libertação precede a contracção, foi o que fizerem Blinks o col. (2). Os

autores injectaram numa fibra muscular isolada uma proteína obtida a partir da equarina

(acalifa), que omite luz quando reage com o Ca.

A fibra depois montada num sistema isométrico é estimulada. Um foto-multiplicador

muito sensível regista directamente a omissão de luz da equarina que acompanhe a libertação

intracelular de Ca. Depois da estimulação aumenta a luminescência que alcança o máximo

durante o desenvolvimento da tensão e diminui até ao mínimo no momento em que se atinge o

“pico” da contractilidade (Fig. IV). Se a fibra for estimulada a intervalos regulares observa-se

que cada abalo é precedido por um aumento da luminescência.

FIGURA IV

Relação entre a luminescência produzida pela equarina na presença do Cálcio

e a resposta mecânica a uma contracção isométrica (segundo Blinks e col.)

O cálcio é portanto o “acoplador” da excitação-contracção, isto é, desempenha funções de

segundo mensageiro porque transporta a mensagem da membrana excitada para e aparelho

contráctil no interior do músculo.

Vejamos então como o ião desempenha esta função, isto é, como provoca a contracção.

Como é do conhecimento geral, o mecanismo contráctil da fibra muscular está pronto a

actuar, mas é impedido de o fazer porque a tropomiosina está em posição errada.

Com efeito, as moléculas de tropomiosina estão dispostas duma ponta à outra ao longo

das cadeias de actina, de modo que cobrem os sítios de ligação para a miosina nas moléculas de

actina, impedindo deste modo a união com as pontes cruzadas de miosina.

Page 141: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

EXCITAÇÃO E CONTRACÇÃO

Actas Bioq. 1989, 1:131-141

137

Cada molécula de tropomiosina é mantida nesta posição de bloqueio por uma molécula C

(TNC), troponina I (Till), troponina T (TNT).

A união do Ca com a TNC modificava o complexo troponina, que secundariamente altera

a tropomiosina, permitindo ficar a descoberto os locais de ligação da actina e miosina..

Vejamos estes fenómenos com maior pormenor.

A troponina C do músculo esquelético e cardíaco são muito semelhantes. As proteínas

estão representadas no esquema da Fig. V. No músculo esquelético existem 4 locais do ligação

do Ca (no músculo cardíaco apenas três).

FIGURA V

Representação esquemática da ligação do Ca2 que permite a contracção

muscular.

As afinidades dos locais de ligação ao Ca são diferentes entre si. Os locais III o IV são de

alta afinidade e podem também ligar Mg., enquanto I e II são de baixa afinidade e não se ligam a

este ião. A ressonância magnética nuclear tem mostrado que os locais de alta afinidade requerem

Ca para manterem a estrutura e a disposição das hélices em forma estável.

A ligação de Ca aos locais I e II produz modificações na interacção dos resíduos

hidrófobos sem alteração da estrutura helicoidal. Esta alteração modifica a configuração do

complexo troponina, principalmente pela interacção com a troponina I.

Esta alteração desloca a tropomiosina no sulco da actina permitindo por isso o

deslizamento miosina/actina.

Page 142: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

138

Embora se diga desde há muito que o Ca do citosol está em equilíbrio com o da troponina

C, na realidade segundo Campbell (3) não é assim. Num abalo muscular, a ligação com o Ca está

limitada principalmente pela difusão, enquanto a contracção depende da velocidade de

modificação da troponina C (em primeiro lugar) e depois das outras proteínas do aparelho

contráctil.

O tempo médio para a modificação da troponina C como resultado da ligação ao Ca nos

locais de baixa afinidade é muito curto. (As ligações aos de alta afinidade já existem em

repouso). Estas afirmações têm sido confirmadas por diversos autores. Por outro lado, a

correlação feita por Ashley (1) entre o Ca livre intracelular, medido pela luminescência

produzido pela equarina, e a velocidade do desenvolvimento da força, mostra que a tensão

desenvolvida é dependente de 2 Ca+ por cada unidade de força. Também as experiências de

Blinks o col. (2) já referidas, sugerem que a força desenvolvida no abalo está na relação directa

do Ca do citoplasma. Portanto a Ca tem importância não apenas para "disparar" o processo

contráctil, mas também como interveniente na velocidade do fenómeno e na força de contracção.

Repare-se que a acção do ião é exercida no filamento delgado e por isso se tem afirmado (Taylor

o col.) (8), que o mecanismo reguladorda contracção é uma propriedade dos filamentos delgados.

No entanto é necessário assinalar que nalgumas espécies os filamentos grossos (miosina) fixam

Ca e portanto regulam nesses casos a interacção actina/miosina.

O resultado da interacção da actina/miosina foi descrito em sessões anteriores (7) (Fig.

VI) e, é o encurtamento do sarcómero:

FIGURA VI

Encurtamento do sarcómero (segundo Schmidt)

Com efeito, durante o processo de contracção, a cabeça da meromiosina pesada ("cross

bridge") - pontes transversais - liga o filamento de miosina com o filamento adjacente de actina.

Por rotação das cabeças geram-se forças que deslocam os filamentos de actina na direcção da

parte média do sarcómero, torna possível a direcção oposta dos filamentos de actina para as

metades da esquerda e direita do sarcómero. Foi demonstrado, pelo método de difracção com Rx

que o encurtamento do sarcómero produzindo uma só estimulação, faz-se por repetidas fixações

Page 143: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

EXCITAÇÃO E CONTRACÇÃO

Actas Bioq. 1989, 1:131-141

139

e libertações das cabeças de miosina à actina. Graças à elasticidade das pontes, o sarcómero pode

desenvolver força quando os filamentos não deslizam um sobre o outro. É o que sucede na

contracção isométrica esquematizada na Fig. VII, onde se observa distensão do "pescoço"

elástico da molécula, isto é, do sub-fragmento II da meromiosina pesada. A força desenvolvida

depende da relação dos filamentos. Existe uma relação óptima entre estas formações, na qual a

força de contracção será máxima. A distensão do músculo modifica estas relações e portanto

modifica a força muscular.

FIGURA VII

Comportamento do "pescoço" elástico do sub-fragmento II da meromiosina

pesada.

A energia necessária ao movimento deve-se à degradação de ATP. Com efeito, no local

de ligação para a actina, a extremidade globular da miosina tem actividade ATPase. O

desdobramento faz-se antes da miosina se ligar à actina. Tal desdobramento é um pré-requisito

para que novamente as pontes cruzadas se liguem à actina.

Esta interacção actina/miosina termina quando a redução do Ca livre do citoplasma desce

abaixo de 0,5 um iniciando assim o relaxamento muscular.

Para tal é necessária a suspensão da acção do estímulo que iniciou o processo excitação-

contracção. Nesta altura o cálcio é bombeado para o retículo sarcoplasmático e a tensão muscular

vai diminuindo à medida que o Ca se dissocia da sua ligação proteica nos filamentos.

Bomba de Cálcio

Vejamos então para terminar como funciona a Bomba de Ca. O retículo sarcoplasmático

é rico em bombas de Ca, que constituem cerca de 90% das proteínas da membrana. Em

esquemas, a secção transversal dum sarcotúbulo mostra que (Ca2+

) Mg ATPase e protolípidos

estão firmemente embebidos na membrana fosfolipídos (Fig. VIII).

Page 144: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

140

FIGURA VIII

Representação esquemática dum sarcotúbulo.

Além disso, existe também no interior do sarcotubulo uma proteína fixadora de cálcio, a

calsequestrina, que é mais abundante nas regiões das cisternas terminais. Este facto pode

relacionar-se com as observações de Winegrad, que sugerem ser as cisternas terminais os

principais locais de armazenamento e libertação de Ca.

Julga-se que o Ca seja bombeado do seguinte modo: 1º duas moles de Ca e 1 Mg ATP

ligam-se ao enzima; 2º hidrólise de ATP com a produção de um resíduo de aspartato fosforilado

no enzima; 3º transporte do Ca através da membrana do sarcotúbulo por um poro, quer móvel

quer fixo, ou por rotação da molécula; 4º libertação no lume do tubo e desfosforilação do enzima

com a intervenção de Mg.

Com base em experiências in vivo no músculo esquelético, tem-se afirmado que a

velocidade desta bomba é de 1 ou 2 mCa/mseg. No entanto, as experiências in vitro mostram

uma velocidade muito menor. Este facto pode sugerir que o rápido desaparecimento do Ca do

citosol se deve à sua inicial ligação à parte exterior do retículo, sendo só depois disso bombeado

para o lume.

Completamos deste modo o esquema inicial, apresentado como resumo do fenómeno

excitação-contracção e com ele concluímos o assunto.

SUMMARY

The A. schematizes the excitation-contraction coupling as follows: stimulus

despolarization of sarcolema action potencial initiated and propagated

along the T tubes calcium released from the sr system Ca2+

+ troponin C

the inhibitory effect of troponin I on the interaction of actin and myosin is

removed action filaments slide along myosin filaments shortening the

sarcomer. e refers in a very short way to the stimulus and to the changes of

membrane which are produced by it and then to the alterations which follow. e

Page 145: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

EXCITAÇÃO E CONTRACÇÃO

Actas Bioq. 1989, 1:131-141

141

give a special importance to the role performed by the transverse tubular

system in the propagation of the stimulus chiefly up to the inside of the

filaments. He makes stand out the importance of the Ca ions in the excitation-

contraction process and refers to the releasing mechanisms of this ion the

sarcomer as well as to the relationship and locals of its connection to the

troponin compound. Afterwards he shows how the interaction of the Ca

allows an actin/myosin coupling and therefore the sliding of the filaments

with the resulting contraction. After refering to the relations between the Ca

and the contractive force and between this last and the position of the actin

and myosin filaments, he describes the functioning of the calcium pump by

refering the importance of calsequestrin in the Transfer of this ion as well as

the hypotheses of transfer the Ca to the sarcotubule.

BIBLIOGRAFIA

1 - ASHLEY - cit. por CAMBELL A.K.

2 - BLINKS, JR.; RÜDEL, R; TAYLOR, SR - Calcium transients in isolated amphibian skeletal

muscle fibres. Detection with aequorin - J. Physiol. (London) 291, 277, 1978.

3 - CAMPBELL, AK - Intracellular Calcium. Ed. John Wiley and Sons, New York.

4 - CHANDLER, WK and SCHNEIDER, MF - Time-course of potencial spread along a skeletal

muscle fibre under voltage clamp - J. Gen. Physiol. 165, 67, 1976.

5 - ENDO, M - Calcium release from the sarcoplasmic reticulum - Physiol. Rev. 71, 57, 1977.

6 - HUXLEY, AF; TAYLOR, RE - Local activation of striated muscle fibres - J. Physiol.

(London) 426; 144, 1958.

7 - SCHMIDT, RF and THEWS, G - Human Physiology. Ed. Springer Verlag, Berlin London,

1983.

8 - TAYLOR - Physiological Bases of Medical Pratice. by BEST y TAYLOR. Ed. Williams e

Wilkins Co. London 1981.

Page 146: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989, 1:143-150 143

FISIOFARMACOLOGIA DOS INIBIDORES DA ENTRADA DE CÁLCIO E

PERSPECTIVAS TERAPEUTICAS

J.J. Polónia e S. Guimarães

Laboratório de Farmacologia , Faculdade de Medicina, 4200-Porto,Portugal

SUMÁRIO

Após uma breve introdução sobre a fisiologia do cálcio, os autores descrevem

os diferentes tipos de canais de entrada para esse ião, com base nas suas

características electrofisiológicas e no antagonismo exercido por bloqueadores

específicos. Seguidamente, apresentam os diferentes bloqueadores da entrada

de cálcio, que são classificados em seis grupos, de acordo com o critério

recomendado pela comissão para o efeito nomeada pela Organização Mundial

de Saúde. Finalmente, sugerem as indicações terapêuticas para esse grupo de

f6rmacos, com base na apreciação clínica feita em vários centros hospitalares

especializados.

INTRODUÇÃO

Os bloqueadores da entrada de cálcio, grupo relativamente novo de fármacos agrupados à

roda de um mecanismo de acção, são agentes terapêuticos com muito interesse no tratamento de

varias doenças, nomeadamente do foro cardiovascular e, ao mesmo tempo, instrumentos muito

úteis no estudo das funções do cálcio e dos seus canais nos processos biológicos.

Tudo o que diz respeito a este sector do conhecimento começou em 1967, quando

Fleckenstein observou que o aumento da concentração de cálcio anulava o antagonismo exercido

pelo verapamil e pela prenilamina sobre a contracção do músculo cardíaco.

Os antagonistas do cálcio impedem a passagem desse ião, do meio extra celular para o

meio intracelular, onde ele exerce variadas e importantes funções.

Papel fisiológico do cálcio

O cálcio é um regulador importante da função celular. Usualmente em combinação com

proteínas que o fixam, como a calmodulina, ou a troponina, o ião cálcio regula múltiplas

Palavras-chave: Ca2+

, canais de cálcio, antagonistas do cálcio

Page 147: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

POLÓNIA J.J. et al

144

funções, incluindo a contracção muscular (do músculo esquelético, do músculo cardíaco ou do

músculo liso) a secreção de neurotransmissores ou de hormonas, a condução de estímulos

eléctricos, a acção de várias enzimas, etc.

Sabe-se, hoje, que a concentração de cálcio no citosol da célula em repouso é da ordem

dos 100 nmol/l (10-7M), enquanto no meio extracelular, por um lado, e no retículo

endop1ásmico e nas mitocôndrias, por outro a concentração desse ião é cerca de 10.000 vezes

mais elevada (l0-3M). Este gradiente de concentrações é mantido pela regulação da entrada de

cálcio, do meio extracelular para o citosol, e pela sequestração do cálcio livre citosólico feita por

aqueles organelos e pela superfície interna da membrana plasmática.

Quando estimulada por uma hormona adequada ou por uma despolarização, a célula

responde libertando cálcio dos seus depósitos intracelulares ou abrindo os canais da membrana

para permitir a entrada do cálcio extracelular. Quando uma fibra muscular lisa ou uma fibra

muscular cardíaca é despolarizada, as alterações de voltagem produzidas na membrana celular

abrem os canais permitindo que o cálcio extracelular entre e inicie a contracção muscular.

Porém, quando uma fibra muscular lisa é estimulada pela noradrenalina (ou por alguns outros

agonistas), uma parte importante do cálcio que aparece no citosol provém de depósitos

intracelulares, de onde é libertado.

O cálcio extracelular pode entrar para célula por vários mecanismos; difusão passiva, em

função do gradiente (10-3M vs.l0-7 M), troca com sódio, troca com potássio, através dos canais

rápidos do sódio e através dos canais lentos (que podem ser operados só por agonistas próprios

ou, também, pela corrente eléctrica). O papel de cada uma destas vias de entrada varia de tecido

para tecido, de espécie para espécie. Do músculo esquelético (que para se contrair não carece de

cálcio extracelular) às diferentes variedades de órgãos com musculatura lisa, há uma grande

variedade de dependências do cálcio extracelular variando, também, a importância relativa de

cada uma daquelas vias de entrada.

Estes mecanismos ligados ao cálcio têm sido estudados em sistemas com funções muito

diversas e, por isso, é perfeitamente natural que a sua fenomenologia bioquímica não seja

inteiramente sobreponível em todos eles. Os sistemas mais usados para estes estudos têm sido a

secrecção de aldosterona mediada pela angiotensina II, a secreção de insulina induzida pela

glicose, a contracção do músculo liso de traqueia causada pelo carbacol e a contracção do

músculo esquelético. É a musculatura lisa a estrutura que vai ser mais frequentemente o alvo

para as acções terapêuticas exercidas pelos bloqueadores dos canais do cálcio. Por isso, este

texto será sempre orientado com base nos fenómenos conhecidos para o músculo liso.

Sabe-se, hoje, que, quando a noradrenalina activa os seus receptores surge, por um lado,

um aumento do fluxo de cálcio, de fora para dentro da célula e, por outro, uma activação da

fosfolipase C especifica que cataliza a hidrólise do fosfatidilinositol 4,5-difosfato. Da hidrólise

desta substância resulta a rápida formação de dois produtos - o inositol l,4,5-trifosfato e o

diacilglicerol, ambos possuidores de uma função de mensageiro. O inositol l,4,5-trifosfato vai

actuar sobre o reticulo endoplásmico e provocar a libertação de 10 a 20.000 nmol/l de cálcio,

provocando uma subida deste ião no citosol de 200-250 nmol/l (valores de repouso) para 600-

800 nmol/l. Esta subida, que é passageira, porque o depósito de cálcio do retículo se esgota e

porque os mecanismos de bombagem de cálcio para fora da célula entram a funcionar, é

suficiente para que o cálcio interactue com a calmodulina e active a cinase da cadeia de miosina

leve. Esta fosforiliza uma das cadeias de miosina, condição para que a actina e a miosina

originem a contracção (Figura 1). Há relaxamento quando a actividade fosfatásica

Page 148: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DOS INIBIDORES DO CÁLCIO

Actas Bioq. 1989, 1:143-150

145

(desfosforilação da cadeia de miosina leve) ultrapassa a actividade da cinase. Isto acontece

quando o nível de cálcio citosólico desce, quer por recaptação, quer por bombagem.

Figura 1

Esquema geral dos fenómenos bioquímicos operados pelo cálcio na génese da

contracção da fibra muscular lisa

No que diz respeito à musculatura lisa vascular, crê-se que a primeira fase da contracção

depende, sobretudo, da libertação de cálcio a partir dos depósitos intracelulares, enquanto a fase

mais sustentada da contracção (fase tónica) depende, sobretudo, do influxo de cálcio

extracelular, quer através dos canais dependentes da voltagem, quer através dos canais

dependentes dos receptores. Em boa harmonia com este conceito, existe o conhecimento de que

a resposta pressora mediada pelos receptores alfa2 (pós-sinápticos), que é uma resposta de inicio

lento e de duração sustentada, é antagonizada pelos bloqueadores dos canais de cálcio, enquanto

a resposta pressora devida à estimulação dos receptores p6s-sinápticos alfa1, que é uma resposta

de inicio rápido e de duração curta, não é afectada por esses fármacos.

Canais de cálcio

Tal como os canais de sódio, os canais de cálcio confinam-se à membrana, mas

distinguem-se deles, não apenas pelo seu número (que é de 16 por m2 no caso dos de sódio e de

0.1 por m2 nos do cálcio), mas também pela selectividade dos fluxos iónicos que através deles

se verificam e pelos diferentes potenciais de membrana que os activam (canais de cálcio: -45 a

+10 mV; canais de sódio: -90 a -40 mV).

Esta selectividade dos canais de cálcio pode ser comprovada pela avaliação cinética das

curvas de saturação do transporte de cálcio, pela sua inibição selectiva por iões como o cobalto e

pelos bloqueadores da entrada de cálcio e pela sua insensibilidade aos bloqueadores específicos

Page 149: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

POLÓNIA J.J. et al

146

dos canais de sódio (tetrodotoxina, quinidina). As variações de potencial condicionam segundo o

modelo de Huxley o encerramento ou abertura dos canais por modificações de regiões

electricamente carregadas do canal (portões) que assim se pode apresentar em três situações:

inactivado, em repouso e activado.

A abertura dos canais de cálcio pode ser modulada por alterações do cálcio intracelular,

por hormonas e neurotransmissores e por fosforilação dos constituintes do próprio canal.

As membranas de células excitáveis (coração, músculo liso, terminações nervosas)

podem conter vários tipos de canais de cálcio, que tem sido possível distinguir em função da

dependência da voltagem, da condutância selectiva, dos tempos de activação e da sensibilidade a

fármacos. No músculo liso têm sido descritos três tipos diferentes de canais de cálcio: canais

dependentes da voltagem, activados (operados) pela despolarização eléctrica ou pelo potássio;

canais dependentes da activação de receptores por agonistas (noradrenalina, acetilcolina, 5-

hidroxitriptamina, etc.); canais por onde entra cálcio, mesmo com a célula despolarizada em

certos vasos, garantem uma certa tensão muscular de repouso). Admite-se a existência dos dois

primeiros tipos porque os influxos máximos de cálcio causados pelo potássio e pela

noradrenalina são aditivos.

Bloqueadores dos canais de cálcio

Os bloqueadores dos canais de cálcio são, de cada vez, mais numerosos e mais

diversificados no seu perfil farmacológico e terapêutico. Para evitar a sua prescrição incorrecta,

nomeadamente a prescrição simultânea de mais do que um elemento, a Organização Mundial de

Saúde nomeou uma comissão de especialistas (farmacologistas, cardiologistas e neurologistas)

para discutir a classificação dessas substâncias. As conclusões a que esta comissão chegou vêm

publicadas na revista Trends in Pharmacological Sciences, no seu número de Janeiro de 1987.

Por razões históricas e por ser a designação mais simples, a comissão aconselha a

designação de antagonistas do cálcio e não a de bloqueadores dos canais do cálcio, a de

bloqueadores da entrada do cálcio, ou outra. Porque preferimos a lógica, embora sem renegar a

história, adoptámos, neste texto, a designação de bloqueadores ou inibidores da entrada do

cálcio.

As maiores diferenças entre os diferentes elementos radicam na selectividade da acção

antagonista da entrada do cálcio, na especificidade tecidual e na duração da acção. De acordo

com os efeitos produzidos numa série de testes, a comissão entende que os fármacos, até agora

existentes, devem ser subdivididos em seis tipos (Ver Tabela I).

Os principais elementos de cada tipo são os seguintes:

Tipo I - Verapamil, galopamil

Tipo II - Nifedipina, nicardipina, nimodipina, nitrendipina, felodipina, niludipina,

nisoldipina, dazodipina

Tipo III - Diltiazem

Tipo IV - Flunarizina, cinarizina, lidoflazina

Tipo V - Prenilamina, fendilina

Tipo VI - Perhexilina

Page 150: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DOS INIBIDORES DO CÁLCIO

Actas Bioq. 1989, 1:143-150

147

TABELA 1

CLASSIFICAÇÃO DOS INIBIDORES DA ENTRADA DE CÁLCIO

Os inibidores da entrada do cálcio exercem a sua acção mediante a fixação a receptores

próprios. Há, pelo menos, três tipos de receptores principais - dos quais se pensa depender a

abertura do canal-e que são aqueles a que a 3H-nitrendipina se liga. As diidropiridinas têm uma

grande afinidade para estes receptores. A sua ligação é rápida, reversivel, saturável e estéreo-

selectiva (o enantiómero levógiro é muito mais activo. Qualquer derivado diidropiridinico

desloca 100% da 3H-nitrendipina que a eles se fixa. Receptores de outro tipo são aqueles aos

quais o verapamil e fármacos afins se ligam e mediante os quais actuam como reguladores

alostéricos heterotrópicos negativos dos receptores principais. O verapamil só consegue impedir

30-40% da fixação de 3H-nitrendipina. Receptores de um terceiro tipo são aqueles a que se 1iga

o diltiazem para funcionar como regulador alostérico positivo dos receptores principais. Da

ligação do diltiazem a estes receptores resulta um aumento da fixação de 3H-nitrendipina da

ordem dos 50%. Est6, ainda, por demonstrar que os sítios alostéricos que regulam a ligação das

diidropiridinas coincidem com os sítios de ligação do verapamil e do diltiazem relevantes do

ponto de vista farmacológico. Quanto aos receptores das diidropiridinas, verificou-se uma

correlação significativa entre os dados obtidos com os radioligandos para uma série de análogos

da nifedipina e a sua capacidade de inibir a resposta mecânica do músculo liso longitudinal do

íleo de Cobaia, o que permite concluir que a ligação do radioligando se faz no sítio relevante do

ponto de vista biológico.

Page 151: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

POLÓNIA J.J. et al

148

Uso terapêutico

O objectivo neste sector da terapêutica é, como em todos os outros, encontrar fármacos

selectivos para cada uma das diversas situações clínicas. Contudo, esse desejo legitimo não pode

antecipar-se aos factos e estabelecer especificidades que não estão demonstradas. É,

naturalmente, um objectivo apetecido e que não se pode excluir dos objectivos possíveis, o

encontro de bloqueadores da entrada do cálcio selectivamente activos nos espasmos dos vasos

cerebrais, ou dos vasos coronários, ou dos vasos dos membros. Essa meta, porém, não foi, ainda,

atingida nem parece vir a sê-lo a curto prazo.

Por se tratar de um campo de intervenção terapêutica sobre o qual não há unanimidade de

opiniões, apresentaremos, também aqui, as indicações gerais sugeridas pela comissão nomeada

pela OMS (Tabela II). Faremos, além disso, uma breve menção das indicações mais comuns dos

inibidores da entrada do cálcio, que mais amplo consenso já concitaram.

Hipertensão

Os inibidores da entrada do cálcio têm um papel importante no tratamento da hipertensão

arterial, quer nas crises agudas, quer nas formas crónicas. Com o seu uso isolado conseguem

controlar-se cerca de um terço dos doentes com hipertensão essencial. A sua acção anti-

hipertensora é tanto mais intensa quanto mais elevados forem os valores iniciais da pressão

arterial e quanto mais baixos forem os valores da renina plasmática. Os inibidores da entrada do

cálcio são particularmente eficazes nos hipertensos idosos, com níveis baixos de renina e com

catecolaminas plasmáticas elevadas e, de um modo geral, nos casos de hipertensão

caracterizados por expansão do volume plasmático e retenção salina, isto é, nas situações em que

a vasoconstrição parece depender mais do influxo de cálcio e em que os bloqueadores

adrenérgicos beta e os inibidores da enzima de conversão parecem menos eficazes.

Doença cardíaca

Os inibidores da entrada do cálcio foram inicialmente usados na terapêutica da angina de

peito, onde alcançaram um lugar de grande relevo. A sua eficácia nestas patologias deve-se, por

um lado, ao aumento do afluxo de oxigénio ao miocárdio devido a uma acção vasodilatadora

coronária (acção especialmente importante nas formas de angor espásticas) e, por outro lado, à

redução do trabalho cardíaco e, portanto, do consumo de oxigénio pelo miocárdio. Constituem

indicações preferenciais as formas de angina de Prinzmetal, de angina em repouso e de angina de

esforço sempre que há predomínio do componente de vasoespasmo coronário. A eficácia dos

inibidores da entrada do cálcio no tratamento da clássica angina de esforço está igualmente

demonstrada e é sobreponível à dos nitratos, mesmo quando associados aos bloqueadores

adrenérgicos beta. A adição dos inibidores da entrada do cálcio à associação de nitratos com

bloqueadores adrenérgicos beta, em doentes com resposta terapêutica insuficiente àquela

associação, aumenta significativamente o número de doentes controlados.

Arritmias

A eficácia do verapamil no tratamento das arritmias supraventriculares está perfeitamente

estabelecida e parece ser devida a que elas dependem de potenciais de acção lentos, resultantes

Page 152: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DOS INIBIDORES DO CÁLCIO

Actas Bioq. 1989, 1:143-150

149

de um aumento do número de canais de cálcio activos dependentes da estimulação adrenérgica

beta. Na fibrilhação auricular, se não houver insuficiência cardíaca manifesta, o verapamil

apresenta vantagens relativamente aos digitálicos, designadamente no controlo da condução

aurículo-ventricular e da frequência ventricular, durante o esforço. A eficácia dos inibidores dos

canais do cálcio nas arritmias ventriculares carece de comprovação clínica.

TABELA 2

USO TERAPÊUTICO DOS BLOQUEADORES DA ENTRADA DO CÁLCIO

A eficácia do verapamil no tratamento das arritmias supraventriculares está perfeitamente

estabelecida e parece ser devida a que elas dependem de potenciais de acção lentos, resultantes

de um aumento do número de canais de cálcio activos dependentes da estimulação adrenérgica

Page 153: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

POLÓNIA J.J. et al

150

beta. Na fibrilhação auricular, se não houver insuficiência cardíaca manifesta, o verapamil

apresenta vantagens relativamente aos digitálicos, designadamente no controlo da condução

aurículo-ventricular e da frequência ventricular, durante o esforço. A eficácia dos inibidores dos

canais do cálcio nas arritmias ventriculares carece de comprovação clínica.

Perspectivas futuras

Como se pode ver na Tabela II, são muitas as situações clínicas que poderão vir a beneficiar da

acção destes fármacos.

Sugestões bibliográficas

EIKENBERG DC and LOKHANDWALA MF. Calcium antagonists and sympathetic

neuroeffector function. J. Auton. Pharmacol., 6:237-255,1986

MANNHOLD R. Calcium antagonists: basical chemical and harmacological properties. Drugs of

today, 6:69-90,1984

NEEDLEMAN P, CORR PB and JOHNSON EM Jr Calcium channel blockers. In Goodman and

Gilman's The Pharmacological Basis of Therapeutics. 7th Ed., pp 816-821,1985

POLÓNIA JJ. Bloqueadores dos canais lentos de cálcio. In Terapêutica Medicamentosa e suas

bases farmacológicas. 2º Ed. pp. 816-821,1986

RASMUSSEN H. The calcium messenger system. First of two parts. New Engl. J. Med. 314:

1094-1101,1986

RASMUSSEN H. The calcium messenger system. Second of two parts. New Engl. J. Med. 314;

1164-1170,1986

VANHOUTTE PM and PAOLLETTI R. The WHO classification of calcium antagonists. Trends

in Pharmacological Sciences, 8:4-5,1987

Page 154: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:151-156 151

REGULAÇÃO PURINÉRGICA DA CONTRACTILIDADE MUSCULAR

J.A. Ribeiro

Laboratório de Farmacologia, Instituto Gulbenkian de Ciência, 2781 Oeiras.

SUMÁRIO

Em condições em que o conteúdo quântico inicial é baixo, ou normal, a

adenosina endógena extracelular inibe a transmissão neuromuscular, e desta

forma regula indirectamente a contractilidade muscular. Este nucleósido é

inactivado ao nível da junção neuromuscular por um sistema de recaptação

sensível ao dipiridamol. Os nucleótidos da adenosina, em particular o ATP,

após hidrólise pela ecto-5'-nucleotidase, contribuem para a produção de

adenosina endógena que modula a transmissão neuromuscular. O

reconhecimento da existência de uma "nova" substância endógena como

agente neuromodulador, e a intervenção sobre este neuromodulador, poderá

contribuir para compreender a fisiopatologia de situações que ocorrem a nível

da junção neuromuscular, nomeadamente síndromas miasténicos e miastenia

gravis.

INTRODUÇÃO

As purinas (e.g. ATP) são libertadas das terminações nervosas motoras após estimulação

nervosa (1) e/ou pós-sinapticamente em resultado da contracção muscular (2). O ATP, aplicado

do lado externo da membrana das fibras musculares esqueléticas, é desprovido de qualquer acção

directa na contractilidade. No entanto, uma acção indirecta na contracção pode ser detectada

após a sua aplicação a preparações de músculo esquelético inervado de mamífero (diafragma de

rato) ou de anfíbio (costureiro de rã). Nestes casos, o ATP, em concentrações semelhantes às

calculadas como sendo libertadas, reduz a transmissão neuromuscular (3). Esta acção está

aparentemente confinada às terminações nervosas motoras, dado que a amplitude média dos

potenciais miniatura de placa motora não é afectada por este nucleótido (4).

A redução da libertação de neurotransmissores pelo ATP e, em particular pelo seu

metabolito, a adenosina, tem sido estudada utilizando uma grande variedade de sinapses (para

revisões ver 5-7), e parece estar relacionada com a redução causada por estas substancias na

Palavras-chave: Purinas, transmissão neuromuscular, contractilidade muscular, miastenia gravis,

síndromas miasténicos.

Page 155: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

RIBEIRO J.A.

152

concentração de cálcio intracelular necessário para activar o processo de libertação dos

neurotransmissores (8-12).

Acções pré-sinápticas da adenosina (4,13) parecem envolver receptores da adenosina

específicos, sensíveis às xantinas e localizados extracelularmente (14), os quais. em

consequência de não seguirem o perfil característico dos subtipos A1 e A2 dos receptores da

adenosina, poderão pertencer a um terceiro subtipo já proposto com a designação de A3 (15).

Por outro lado, a adenosina poderá ser um factor de agravamento das situações de

alteração da transmissão neuromuscular que se assemelham quer a síndromas miasténicos quer à

miastenia gravis, uma vez que a adenosina aplicada exogenamente possui um efeito inibitório

pronunciado na transmissão neuromuscular quando a depressão inicial pelo magnésio (bloqueio

pré-sináptico) ou pela tubocurarina (bloqueio pós-sináptico) é aproximadamente 30% (16,17). É

sabido que na placa motora de miasténicos o número de canais abertos pela acetilcolina está

reduzido em cerca de 30% e que o número de receptores colinérgicos pós-juncionais está

igualmente reduzido na mesma proporção (18).

O envolvimento da adenosina endógena na transmissão neuromuscular poderia ser

claramente definido se fosse possível estabelecer as seguintes evidências experimentais: a) que a

adenosina desaminase, enzima que degrada a adenosina em inosina (19) tem um efeito

excitatório na transmissão neuromuscular; b) que as metilxantinas, antagonistas do receptor da

adenosina na junção neuromuscular (14), podem facilitar a transmissão neuromuscular; c) que o

dipiridamol, um bloqueador da recaptação de adenosina (e.g. 20), tem uma acção inibitória, na

transmissão neuromuscular e é capaz de potenciar acção inibitória da adenosina exógena. Assim,

nas secções seguintes far-se-á uma descrição, ainda que resumida, das evidências experimentais

que permitem concluir sobre o papel neuromodulador das purinas na transmissão neuromuscular

e indirectamente na contractilidade muscular. Dado que ocorre libertação de ATP a nível da

placa motora (1,2) e que o ATP pode ser hidrolisado em adenosina no espaço pericelular através

de ecto-ATPases (21, 22), seguida da acção da ecto-5'-nucleotidase (23), é também de interesse

saber em que medida o efeito neuromodulador do ATP depende da sua hidróIise em adenosina.

ENVOLVIMENTO DA ADENOSINA ENDÓGENA NA TRANSMISSÃO

NEUROMUSCULAR

A adenosina desaminase aumenta a amplitude e o conteúdo quântico dos potenciais de

placa motora (e. p. ps). O efeito excitatório desta enzima na transmissão neuromuscular,

observado quer em condições de conteúdo quântico baixo (preparações paralisadas a nível pré-

juncional com magnésio) (24) quer em condições de conteúdo quântico elevado (preparações

paralisadas a nível pós-juncional com tubocurarina) (25), parece ser uma consequência da sua

capacidade de inactivar a adenosina endógena existente na junção neuromuscular. A evidência

experimental que apoia esta ideia é: a) a acção da adenosina desaminase na amplitude dos e.p.ps

é prevenida pelo inibidor da sua actividade enzimática, eritro-hidroxi-nonil-adenina (EHNA); b)

a inosina, produto da desaminação da adenosina, é virtualmente inactiva na transmissão

neuromuscular; c) a adenosina desaminase previne totalmente o efeito inibitório da adenosina na

transmissão neuromuscular, não afectando contudo o efeito inibitório da 2-cloroadenosina,

análogo da adenosina resistente à desaminação (24, 25).

Comparando o efeito excitatório da adenosina desaminase com o efeito inibitório da

adenosina na amplitude dos e.p.ps, pode-se estimar que a concentração de adenosina endógena

junto das terminações nervosas motoras é aproximadamente 12 M (25). Assumindo que a fenda

Page 156: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

REGULAÇÃO PURINÉRGICAE CONTRACTILIDADE

Actas Bioq. 1989; 1:151-156

153

sináptica tem cerca de 450 m3 de volume (26), a quantidade de adenosina presente será

aproximadamente 5,4 x 10-18 moles. De interesse notar que a quantidade de ATP libertada por

impulso nervoso, conjuntamente com a acetilcolina na junção neuromuscular, é da mesma ordem

de grandeza (aproximadamente 3,7 x 10-18 moles) (1).

Outro aspecto que evidencia a presença de adenosina endógeno extra celular na placa

motora é a observação de que os antagonistas do receptor da adenosina, 8-fenilteofilina (8-PT) e

teofilina (14), facilitam a transmissão neuromuscular (25). Embora alguns autores tenham

interpretado a acção excitatória da teofilina na transmissão neuromuscular em termos da sua

capacidade em inibir as fosfodiesterases (27,28; ver porém 13), o aumento na amplitude dos

e.p.ps causado por concentrações micromolar de 8-PT e teofilina parece estar relacionado com o

seu comportamento como antagonistas do receptor da adenosina e não com a inibição das

fosfodiesterases, já que: a) as concentrações de 8-PT e teofilina que facilitam a transmissão

neuromuscular (25) são inferiores às necessárias para inibir as fosfodiesterases (29); b) a 8-PT é

menos potente que a teofilina como inibidor das fosfodiesterases (29), é mais potente que a

teofilina como antagonista do receptor da adenosina na junção neuromuscular (14) e é mais

potente que a teofilina como facilitador da transmissão neuromuscular (25); c) a

isobutilmetilxantina, um potente inibidor das fosfodiesterases (29, 30) que não se comporta

como antagonista do receptor da adenosina na junção neuromuscular de rã (14) não facilita, pelo

contrário, inibe a transmissão neuromuscular (25).

INACTIVAÇÃO DA ADENOSINA NA.JUNÇÃO NEUROMUSCULAR

Dois mecanismos de inactivação da adenosina têm sido propostos: a inactivação

enzimática por desaminação em inosina e a recaptação pelas células através de um processo de

difusão facilitada (e.g. 20). O primeiro ocorre principalmente no citoplasma, enquanto a

adenosina presente no espaço pericelular e em grande parte inactivada por recaptação (19). O

inibidor da adenosina deaminase, EHNA, não afecta consideravelmente a transmissão

neuromuscular, enquanto o bloqueador da recaptação de adenosina, dipiridamol, inibe a

amplitude dos e.p.ps (25). Numa concentração virtualmente desprovida de efeito na amplitude

dos e.p.ps, o dipiridamol potência a acção inibitória da adenosina na transmissão neuromuscular,

mas não afecta a acção inibitória da 2-cloroadenosina (25), um análogo da adenosina

dificilmente captado pelas células (e.g. 31). Estes resultados sugerem que a inactivação da

adenosina na junção neuromuscular se processa por recaptação.

CONTRIBUIÇÃO DO ATP PARA OS NÍVEIS DE ADENOSINA ENDOGENA

EXTRACELULAR QUE MODULA A TRANSMISSÃO NEUROMUSCULAR

O , -metileno ATP, um análogo do ATP que não é susceptível de ser metaboIizado em

adenosina (32) e inactivo na transmissão neuromuscular, enquanto que o , -metileno ATP, que

é metabolizado em adenosina, imita a acção inibitória deste nucleósido na transmissão

neuromuscular (25). Estes factos, tomados em conjunto com a observação de que a adenosina é

equipotente com o ATP a inibir a transmissão neuromuscular (4), sugerem que o efeito inibitório

do ATP na transmissão neuromuscular depende da sua hidrólise prévia em adenosina, sendo o

ATP rapidamente metabolizado em adenosina no meio extracelular. A apoiar esta ideia estão

também as observações de que o , -metileno ADP, um inibidor da 5'-nucleotidase (33) previne

o efeito inibitório do ATP na transmissão neuromuscular e aumenta a amplitude dos e.p.ps (25).

Page 157: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

RIBEIRO J.A.

154

Se o ATP é hidrolisado em adenosina na junção neuromuscular, é provável que o ATP libertado

ao nível da fenda sináptica quer pré-sinapticamente (1) quer pós-sinapticamente em

consequência da contracção muscular (2) contribua para os níveis de adenosina endógena que

modulam a transmissão neuromuscular.

O aumento causado pelo , -metileno ADP na amplitude de e.p.ps de preparações

curarizadas é cerca de 49% do aumento causado pela adenosina desaminase nas mesmas

condições experimentais (25). Se o efeito excitatório do , -metileno ADP na transmissão

neuromuscular resulta da sua propriedade inibitória da 5'-nucleotidase, pode-se estimar que os

nucleótidos da adenosina presentes endogenamente na fenda sináptica contribuem pelo menos

com 40% a 50% para os níveis de adenosina endógena que modula a transmissão neuromuscular

(25). Este valor poderá ser subestimado se nem toda a actividade ecto-5'-nucleotidásica estiver

inibida pelo , -metileno ADP (cf. 34, 35).

CONCLUSÕES

Em conclusão, o facto de a adenosina desaminase e os antagonistas do receptor da

adenosina na junção neuromuscular terem um efeito excitatório, e de o bloqueador da recaptação

da adenosina, dipiridamol, ter um efeito inibitório na transmissão neuromuscular, sugerem que

ao nível da junção neuromuscular existe endogenamente adenosina em quantidades suficientes

para inibir tonicamente a transmissão neuromuscular e que a adenosina endógena é inactivada

por recaptação. Os resultados obtidos com o , -metileno ADP indicam que o ATP pode

contribuir com pelo menos 40% a 50% para a reserva de adenosina endógena que modula a

transmissão neuromuscular. Pode, portanto, deduzir-se que outra substancia além da acetilcolina,

a adenosina, existe endogenamente ao nível da junção neuromuscular participando nos processes

de transmissão que aí decorrem, com a seguinte sequência funcional: libertação de ATP para a

fenda sináptica; sua metabolização em adenosina, que inibe tonicamente a transmissão

neuromuscular, constituindo este processo um mecanismo de regulação da contractilidade

muscular. Em condições em que a transmissão neuromuscular esteja parcialmente inibida quer

pré-juncionalmente, no caso de síndromas miasténicos, quer pós-juncionalmente, no caso da

miastenia gravis, a modulação causada pela adenosina poderá constituir um factor de

agravamento de tai situações.

SUMMARY

In conditions in which the initial quantal content is assumed to be low or

normal, endogenous adenosine inhibits neuromuscular transmission and in

this way regulates indirectly muscle contractility. This nucleoside is

inactivated at the neuromuscular junction through a dipyridamole-sensitive

uptake process. Released adenine nucleotides, in particular ATP, after being

hydrolysed by ecto-5'-nucleotidase, might contribute to the pool of

endogenous adenosine which modulates neuromuscular transmission. The

finding that another endogenous agent, besides acetylcholine, is involved in

neuromuscular transmission, together with the possibility of interfering with

the levels of this neuromodulator, might contribute to understand the

physiopathology of some neuromuscular dysfunctions, namely myasthenic

syndromes and myasthenia gravis.

Page 158: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

REGULAÇÃO PURINÉRGICAE CONTRACTILIDADE

Actas Bioq. 1989; 1:151-156

155

BIBLIOGRAFIA

1. SILINSKY, E.M. On the association between transmitter secretion and the release of

adenine nucleotides from mammalian motor nerve terminals. J. Physiol. Lond. 247:145-

163, 1975.

2. FORRESTER, T. An estimate of adenosine triphosphate release into the venous effluent

from exercising muscle. J. Physiol. Lond. 224:611-628, 1972.

3. RIBEIRO, J.A. and WALKER, J. Action of adenosine triphosphate on endplate potentials

recorded from muscle fibres of the rat-diaphragm and frog sartorius. Br. J. Pharmacol.

49:724-725, 1973.

4. RIBEIRO, J.A. and WALKER, J. The effects of adenosine triphosphate and adenosine

diphosphate on transmission at the rat and frog neuromuscular junctions. Br. J. Pharmacol.

54:213-218, 1975.

5. RIBEIRO, J.A. ATP; related nucleotides and adenosine on neuromuscular transmission.

Life Sci.22:1373-1380, 1978.

6. PHILLIS, J.W. and WU, P.H. The role of adenosine and its nucleotides in central synaptic

transmission. Prog. Neurobiol. 16:187-239, 1 9 81.

7. STONE, T.W. Physiological roles for adenosine and adenosine 5'-triphosphate in the

nervous system. Neuroscience 6: 523-555, 1981.

8. RIBEIRO, J.A., SÁ-ALMEIDA, A.M. and NAMORADO, J.M. Adenosine and adenosine

triphosphate decrease 45Ca uptake by synaptosomes stimulated by potassium. Biochem.

Pharmacol. 28:1297-1300, 1979.

9. WU, P.H., PHILLIS, J.W. and THIERRY, D.L. Adenosine receptor agonists inhibit K+

évoked Ca2+ uptake by rat brain cortical synaptosomes. J. Neurochem. 39:700-708. 1982.

10. SILINSKY, E.M. On the mechanism by which adenosine receptor activation inhibits the

release of acetylcholine from motor nerve terminals. J. Physiol. Lond.346:243-256, 1984.

11. DOLPHIN, A. C., FORDA, S. R. and SCOTT, R. H. Calcium dependent currents in

cultured dorsal root ganglion neurones are inhibited by an adenosine analogue. J. Physiol.

Lond. 373:47-61, 1986.

12. MacDONALD, R.L.. SKERRITT, J.H. and WERZ, M.A. Adenosine agonists reduce

voltage-dependent calcium conductance of mouse sensory neurones in cell culture. J.

Physiol. Lond. 370: 75-90, 1986.

13. GINSBORG, B.L. and HIRST, G.D.S. The effect of adenosine on the release of the

transmitter from the phrenic nerve of the rat. J. Physiol. Lond. 224:629-645, 1972.

14. RIBEIRO, J.A. and SEBASTIÃO, A.M. On the type of receptor involved in the inhibitory

action of adenosine at the neuromuscular junction. Br. J. Pharmacol. 84:911-918, 1985.

15. RIBEIRO, J.A. and SEBASTIÃO, A.M. Adenosine receptors and calcium: basis for

proposing a third (A3) adenosine receptor. Prog. Neurobiol. 26:179-209, 1986.

16. RIBEIRO, J.A. The modulation of transmission by purinergic substances at the

neuromuscular junction. Ann. N.Y. Acad. Sci. 377:874-876, 1981.

17. RIBEIRO, J.A. The decrease of neuromuscular transmission by adenosine depends on

previous neuromuscular depression. Arch. Int. Pharmacodyn. 255:59-67, 1982.

18. CULL-CANDY, S.G., MILEDI, R. and TRAUTMAN, A. End-plate currents and

acetylcholine noise at the normal and myasthenic human endplates. J. Physiol. Lond.

287:247-265, 1979.

Page 159: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

RIBEIRO J.A.

156

19. ARCH, J.R.S. and NEWSHOLME, E.A. The control of metabolism and the hormonal role

of adenosine. Essays in Biochem. 14:82-123, 1978.

20. WU, P.H. and PHILLIS, J.W. Uptake by central nervous tissues as a mechanism for the

regulation of extracelular adenosine concentrations. Neurochem. Int. 6:613-632, 1984.

21. NAGY, A., SHUSTER, T.A. and ROSENBERG, M.D. Adenosine triphosphatase activity

at the external surface of chicken brain synaptosomes. J. Neurochem. 40:226-234, 1983.

22. KELLER, F. and ZIMMERMANN, H. Ecto-adenosine triphosphatase activity at the

cholinergic nerve endings of the Torpedo electric organ. Life Sci.33:2635-2641, 1983.

23. KREUTZBERG, G.W.,HEYMANN, D. and REDDINGTON, M. In Cellular Biology of

Ectoenzymes, G. W. Kreutzberg, M. Reddington and H. Zimmermann (editors), Springer-

Verlag, Berlin, 1986, pp. 147-164.

24. SEBASTIÃO, A.M. and RIBEIRO, J.A. Enhancement of transmission at the frog

neuromuscular junction by adenosine deaminase: evidence for an inhibitory role of

endogenous adenosine on neuromuscular transmission. Neurosci. Letts 62, 267-270, 1985.

25. RIBEIRO, J.A. and SEBASTIÃO, A.M. On the role, inactivation and origin of endogenous

adenosine at the frog neuromuscular junction. J. Physiol. Lond. 384:0-00, 1987 (in the

press).

26. SALPETER, M. M. and ELD EFRAWI, M.E. Sizes of end-plate compartments, densities

of acetylcholine receptor and other quantitative aspects of neuromuscular transmission. J.

Histochem. Cytochem. 21:769-778, 1873.

27. GOLDBERG, A.L. and SINGER, J.J. Evidence for a role of cyclic AMP in neuromuscular

transmission. Proc. Natl. Acad. Sci. U.S.A. 64: 134-141, 1969.

28. WILSON, D.F. The effects of dibutyryl cyclic adenosine 3',5'-mono phosphate,

theophylline and aminophylline on neuromuscular transmission in the rat. J. Pharmac. Exp.

Ther. 188:447-452, 1974.

29. SMELLIE, F.W., DAVIS, C.W., DALY, J.W. and WELLS, J.N. Alkylxanthines: inhibition

of adenosine-élicited accumulation of cyclic AMP in brain slices and of brain

phosphodiesterase activity. Life Sci. 24:2475-2482, 1979.

30. WU, P.H., PHILLIS, J.W. and NYE, M.J. Alkylxanthines as adenosine receptor

antagonists and membrane phosphodiesterase inhibitors in the central nervous tissue. Life

Sci. 31:2857-2867, 1982.

31. DALY, J.W. In Physiology and Pharmacology of Adenosine Derivatives, J.W. Daly, Y.

Kuroda, J.W. Phillis, H. Shimizu and M. Ui (editors), Raven Press, New York, 1983, pp.

275-279.

32. YOUNT, R.G. ATP analogs. Adv. Enzymol. 43:1-56, 1975.

33. BURGER, R.M. and LOWENSTEIN, J.M. Preparation and properties of 51-nucleotidase

from smooth muscle of small intestine. J. Biol. Chem. 245:6274-6280, 1970.

34. FREDHOLM, B.B., JONZON, B. LINDGREN, E. and LINDSTROM, K. Adenosine

receptors mediating cyclic AMP production in the rat hippocampus. J. Neurochem. 39:165-

175, 1982.

35. MacDONALD, W.F. and WHITE, T.D. Nature of extrasynaptosomal accumulation of

endogenous adenosine evoked by potassium and veratridine. J. Neurochem. 45:791-797,

1985.

Page 160: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:157-160 157

ASPECTOS MICROSCÓPICOS DO TECIDO MUSCULAR LISO

R. Trindade dos Anjos

Departamento de Histologia e Embriologia da Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa,

Universidade Nova de Lisboa

SUMÁRIO

As células musculares lisas estão habitualmente agrupadas em feixes, com um

estroma conjuntivo intercelular de dimensões variáveis. São em geral

alongadas e fusiformes, com comprimento dependente da sua localização e

estado funcional. Apresentam um único núcleo, de localização central. O

sarcoplasma é homogéneo em microscopia óptica, não apresentando

estriações. Os organelos celulares, incluindo as mitocôndrias, estão

preferencialmente distribuídos numa região adjacente a cada pólo nuclear. As

imagens ultra-estruturais revelam a existência de finos miofilamentos de

disposição longitudinal. Dispersos pelo sarcoplasma existem corpos densos

característicos, onde se parecem inserir os filamentos. As fibras musculares

lisas estão unidas entre si por “gap junctions” ou “nexus”, com baixa

resistência eléctrica. Com base na inervação e comportamento contráctil,

foram definidos dois tipos de células musculares lisas: o tipo unitário, com

poucas terminações nervosas e contracções musculares de origem miogénica;

e o tipo formado por unidades múltiplas, complexos nervosos abundantes, e

contracções de origem neurogénica.

As células musculares lisas são alongadas, fusiformes, com extremidades que se afilam

progressivamente, e uma região central, mais larga, onde se localiza o núcleo. Tem uma

distribuição muito diversa, e apresentam grandes variações em número, forma, dimensões e

orientação, reflectindo a actividade funcional dos respectivos órgãos. Podem apresentar-se

isoladamente ou, mais frequentemente, agrupadas em feixes ou lâminas, de modo que a porção

mais larga de uma célula está adjacente às porções mais finas das células vizinhas. A sua forma

pode ser muito alongada e estreita (como é o caso das células musculares na parede intestinal) ou

mais curta e larga, como na parede dos vasos. O comprimento das fibras musculares lisas varia

entre cerca de 20 m, na parede vascular, até aos 500 m no miocárdio gravídico (1)

Palavras-chave: Miofilamentos, corpos densos, “gap junctions”

Page 161: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

TRINDADE DOS ANJOS R.

158

O núcleo da célula é único, em posição central, e acompanha a forma da célula, sendo

geralmente oval ou alongado. Na célula em contracção tem um perfil irregular, com várias

invaginações laterais. Habitualmente a cromatina é fina, com um ou mais nucléolos.

O citoplasma apresenta miofibrilhas dispostas longitudinalmente, mas ao contrário dos

outros tipos de células musculares, não estão organizadas em sarcómeros e portanto não existe

estriação transversal.

A observação ultraestrutural convencional revela uma população homogénea de

miofibrilhas dispostas em feixes, formadas apenas por filamentos finos (50 a 80 A), compostas

sobretudo por actina. As miofibrilhas dispõem-se paralelamente ao eixo da célula, convergindo

para corpúsculos electrono-densos, do 500 a 800 A, dispostos irregularmente no sarcoplasma ou

adjacentes à membrana celular (2). Estas estruturas, designadas por corpos densos, têm sido

comparadas aos discos Z do músculo estriado.

Sob condições técnicas apropriadas, pode ser demonstrada a existência de filamentos

espessos no músculo liso, em particular quando a célula está contraída. São menos numerosos

que os filamentos finos que os rodeiam, apresentando este conjunto uma configuração em roseta

nos cortes transversais.

Alguns autores admitem que a miosina poderia existir numa forma dispersa, e que a sua

agregação, traduzida pelo aparecimento de filamentos espessos, poderia ocorrer quando

houvesse contracção a nível celular (3, 4). Foi descrito um terceiro tipo de filamentos, de

dimensões intermédias, estabelecendo pontes de união entre os corpos densos (5).

Os organelos celulares ocupam preferencialmente a zona perinuclear, em particular junto

dos polos nucleares, onde são abundantes as mitocondrias, e estão presentes ribossomas, o

aparelho do Golgi, gotículas lipídicas e elementos do retículo endoplásmico rugoso e liso. Este

último, tão desenvolvido nos outros tipos de células musculares, não atinge dimensões

importantes na célula muscular lisa.

FIGURA I

Representação esquemática de células musculares lisas. Estão assinalados: l-

Núcleo; 2- Corpos densos, onde se inserem os miofilamentos: 3- Mitocôndrias;

4- Nexus ou gap junctions. Modificado de Poirier, 1977 (6).

Page 162: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MICROSCOPIA DO MÚSCULO LISO

Actas Bioq. 1989; 1:157-160

159

A membrana celular encontra-se envolvida por uma lâmina basal. A superfície celular é

por vezes irregular, formando projecções que se dirigem para células adjacentes, estabelecendo

conexões denominadas “nexus’: Estas uniões são do tipo “gap junctions”, em que as membranas

celulares Se justapõem, ficando separadas por estreito espaço extracelular do 10 a 20 A, onde

não está presente a lâmina basal (7,8).

Vários estudos sugerem que os "nexus" são mediadores das comunicações intercelulares,

em particular a transmissão do influxo nervoso. Na fase interna da membrana celular existem

alguns corpos densos, especialmente numerosos nas extremidades da célula. Não existem no

músculo liso invaginações membranosas dando origem a túbulos T, ao invés do que sucede nas

células musculares estriadas. No entanto observa-se a superfície da membrana celular numerosas

microvesículas, as caveolae, relacionadas com fenómenos de pinocitose e que podem constituir

verdadeiros reservatórios celulares de cálcio (9,10).

O estroma conjuntivo intercelular apresenta importância variável. As células musculares

estão envolvidas por uma trama de fibras reticulares e elásticas onde são raros os fibroblastos. As

fibras agrupadas em feixes ou lâminas estão rodeadas por tecido conjuntivo relativamente mais

abundante com fibroblastos e outras células conjuntivas.

As artérias e veias correm nos septos conjuntivos mais importantes. Existem capilares em

pequenos septos junto a grupos de células musculares e mais raramente entro células individuais.

As fibras nervosas que atingem o músculo liso são amielínicas e as terminações nervosas

podem ser observadas junto as células musculares. Com base na inervação e propriedades

funcionais foram definidos dois tipos de células musculares lisas. O músculo tipo unitário, ou de

unidades simples, do que é exemplo o tecido muscular liso do intestino, possui poucas

terminações nervosas mas é extremamente rico em “nexus” intercelulares, e as miofibrilhas

encontram-se dispersas por todo o citoplasma (11,12). As contracções musculares são neste caso

de origem miogénica, e o músculo unitário responde sobretudo ao estímulo mecânico provocado

pelo estiramento. A sua actividade é no entanto modulada e coordenada por influências nervosas

(13). Por outro lado, os músculos de tipo unidades múltiplas, como o músculo pupilar, contém

terminações nervosas que alcançam praticamente todas as células. Os “nexus” ou “gap

junctions” são menos abundantes, e as miofibrilhas localizam-se especialmente à periferia da

célula. Neste tipo muscular as contracções têm uma origem predominantemente neurogénica

(13).

BIBLIOGRAFIA

1. WEISS L and GREEP R. HISTOLOGY. Mc GRAW HILL Book Company, New York,

1977.

2. ASHTON FT, SOMLYO AV and SOMLYO AP. The contractile apparatus of vascular

smooth muscle. J Mol Biol 98:17-29, 1975.

3. FAY, FS and COOKE, PH. “Reversible disaggregation of myofilaments in vertebrate

smooth muscle”. J. Cell Biol 56,299, 1973.

4. BOIS RM and PEASE DC. Electron miscroscopic studies of the state of myosin

aggregation in the vertebrate smooth muscle cell. Anat Rec 180:465-480, 1974

5. SALL JV. Studies on isolated smooth muscle cells: the contractile apparatus. J Cell Sci

24:327, 1977.

6. POIRIER J, COHEN I, BERNAUDIN JF. HISTOLOGIE HUNAINE. MALOINE

EDITEUR, PARIS, l977.

Page 163: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

TRINDADE DOS ANJOS R.

160

7. GABELLA G and BLUNDELL. Nexuses between the smooth muscle cells of the guinea-

pig ileum. J. Cell Biol 82:239-247, 1979.

8. ZAMPIGHI G, CORLESS J, and ROBERTSON J. On gap junction structure. J Cell Biol

86:190-198, 1980.

9. COPENHAVER WM, KELLY DE, WOOD RL. Bailey’s Textbook of Histology. Williams

and Wilkins Ed, Baltimore, 1977.

10. SOMLY0 AV, et al. New view of smooth muscle structure using freezing, deep-etching

and notary shadowing. Experiential 41:841-56, 1985.

11. BOIS RM. The organization of the contractile apparatus of vertebrate smooth muscle. Anat

Rec 177:61, 1973.

12. MEYER GW. Muscle Anatomy of the human esophagus. J Clinic Gast 8 (2): 131-4,1986.

13. DANIEL EE and SARNA S. The generation and conduction of activity in smooth muscle.

Ann Rev Pharm Toxicol. 18:145, 1978.

Page 164: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:161-171 161

PARTICULARIDADES DA ELECTROFISIOLOGIA DO MÚSCULO LISO POTENCIAIS DE

MEMBRANA, POTENCIAIS DE ACÇÃO E JUNÇÃO NEURO-MUSCULAR.

L. Silva Carvalho

Instituto de Fisiologia da Faculdade de Medicina de Lisboa

SUMÁRIO

O Autor começa por rever as características electrofisiológicas do

músculo estriado, apresentando as bases iónicas dos seus potenciais de

repouso e acção. Apresenta a classificação dos músculos lisos segundo Bozler.

Trata depois separadamente a electrofisiologia do músculo liso visceral

(unitário) e vascular (multiunitário). Relativamente ao primeiro, começa por

referir os valores do potencial de repouso. Em seguida, são abordadas as

ondas lentas, e os potenciais de acção "em flecha" e com plateau, e

apresentadas as bases iónicas destes potenciais. É igualmente referida a

condução da actividade eléctrica ao longo do músculo liso visceral,

relacionando-a com a presença de "vias" de baixa resistência entre células

adjacentes. Em relação ao músculo liso vascular, aborda sucessivamente os

potenciais de repouso, acção e suas bases iónicas. São realçadas as

semelhanças e diferenças com o músculo liso visceral. Finalmente, revê a

junção neuroefectora no músculo liso, procurando correlacionar os aspectos

morfológicos e electrofisiológicos.

INTRODUÇÃO

A compreensão das particularidades electrofisiol6gicas do músculo liso torna-se mais

fácil quando apresentadas em comparação com as de um modelo mais estudado e conhecido - o

músculo esquelético. Nesta breve apresentação são sucessivamente abordados: I - Características

electrofisiológicas do músculo esquelético; II - Classificação do músculo liso; III -

Características electrofisiológicas do músculo liso visceral; IV - Características fisiológicas do

músculo liso multi-unitario; V - Canais de cálcio activados por receptores; VI - Aspectos

electrofisiológicos da transmissão neuro-muscular no músculo liso.

Palavras-chave: Músculo liso, potenciais de membrana, potenciais de acção, junção neuro-

muscular

Page 165: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

162

I - Características electrofisiológicas do músculo esquelético

Como e do conhecimento geral (1), na célula muscular esquelética em repouso existe

uma diferença de potencial de cerca de -90mv sendo o interior, negativo em relação ao exterior.

Esta diferença pode ser medida com um dispositivo em que um voltímetro ou um osciloscópio

compara o potencial de dois eléctrodos (um microelétrodo e um eléctrodo de referência). Quando

ambos estão colocados perto da face externa da membrana celular, o voltímetro não regista

nenhuma diferença do potencial. Quando o microeléctrodo é introduzido na célula, o voltímetro

acusa uma diferença de potencial entre os dois eléctrodos estando o microeléctrodo negativo em

relação ao eléctrodo extra-celular. Esta diferença de potencial que se verifica na célula na

ausência de qualquer estímulo chama-se potencial de repouso. Este deve-se à diferente

distribuição de iões de um lado e doutro da membrana, e à diferente permeabilidade da

membrana celular para os iões. A observação de um esquema de uma pequena extensão da

membrana celular (Fig. I), permite notar: que o interior é rico em potássio e pobre em sódio, ao

inverso do que acontece no exterior; bem como a presença junto à membrana, do lado de dentro,

de aniões proteicos, e do lado de fora um número igual de iões de potássio. Pelo seu tamanho, os

aniões proteicos, ao contrário do potássio, sódio e cloro, não podem atravessar a membrana.

Esses 6 pares de iões cujo número é insignificante relativamente ao número total de iões

presentes na sua proximidade, são no entanto suficientes para criar o potencial de repouso.

FIGURA I

Distribuição de cargas na membrana celular durante o potencial de repouso. As

setas indicam efluxo de potássio (segundo Schmidt)

Page 166: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ELECTROFISIOLOGIA DO MÚSCULO LISO

Actas Bioq. 1989; 1:161-171

163

A contribuição de cada ião para o potencial de repouso é representada pela equação de Goldman:

E = RT . ln ___________________________________________________

em que R é a constante dos gases, T a temperatura absoluta. O facto de a membrana, ser muito

mais permeável ao potássio que ao sódio faz com que o primeiro ião contribua de forma mais

importante para o potencial de repouso. Este aproxima-se na verdade do potencial de equilíbrio

para o potássio. Recordemos que o potencial de equilíbrio para o potássio, calculado pela

equação de Nernst, é cerca de - 90 mv. (interna negativo relativamente ao exterior), e o calculado

para o sódio é de + 40 mv. (interior positivo relativamente ao exterior). O potencial de repouso

do músculo esquelético permanece constante se a célula não for estimulada. A bomba de sódio e

potássio é responsável pelas diferentes concentrações destes iões do lado de dentro e de fora da

membrana celular, mas ela é, em si, electroneutra, ou seja, em condições normais o número de

cargas eléctricas que transporta para fora da célula, idêntico ao que transporta em sentido

contrário.

Quando à célula é aplicado um estímulo de intensidade e duração suficiente, ou seja, um

estímulo eficaz, toda esta situação se altera (Fig. II), tornando-se o interior rapidamente menos

negativo, depois positivo retornando rapidamente em seguida as condições eléctricas à situação

inicial.

FIGURA II

Em cima: registo do potencial de acção numa fibra muscular esquelética. Em

baixo: registo da contracção isométrica da mesma fibra a qual sucede ao

potencial de acção.

Pk . [ K+] e P Na [ Na

+] e + PCl

- . [ Cl

-

]i

Pk . [ K+] i P Na [ Na+] i + PCl- . [ Cl-]e

Page 167: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

164

Esta alteração brusca do potencial transmembranar que representa a resposta de um

tecido excitável a um estímulo eficaz, chama-se potencial de acção. Nele existem duas fases: a

primeira (perda rápida da negatividade interior seguida de inversão da polaridade) é a

despolarização; a segunda (recuperação da negatividade normal do interior) chama-se

repolarização. Um potencial de acção que tem uma forma estreita e alta, em que a despolarização

e repolarização se processam rapidamente, chama-se potencial em flecha ou spike". Nos

músculos esqueléticos de tipo fásico, é necessário que ocorra um potencial de acção para que

exista contracção.

As bases iónicas (2), (3), do potencial de acção podem ser esquematicamente resumidas

do seguinte modo (Fig. III): quando o potencial transmembranar se aproxima do limiar de

excitação há uma abertura dos canais rápidos de sódio, e o consequente aumento da

permeabilidade ao sódio, o qual é independente do estímulo, e é designado por excitação.

FIGURA III

Representação de um potencial de acção e das variações de condutância da

membrana para o sódio e o potássio que estão na sua base.

De acordo com a equação de Goldman, tal significa que o sódio passa a ser o principal

ião determinante do potencial transmembranar. Como o potencial de equilíbrio para o sódio é

atingido com o interior celular positivo em relação ao exterior, o aumento da permeabilidade ao

sódio traduz-se pela inversão do potencial transmembranar. Perto do cume do potencial de acção

dá-se a inactivação do mecanismo do sódio. Enquanto este estiver inactivado é impossível

provocar outro potencial de acção. São assim explicados os períodos refractários absolutos e

relativos. A repolarização deve-se ao aumento da permeabilidade ao potássio, ou seja, à saída de

potássio do interior da célula. Quando se recupera o potencial de repouso há pequenas diferenças

iónicas relativamente à situação inicial, já que entrou sódio e saiu potássio. A recuperação das

condições iónicas de repouso deve-se à reentrada em actividade da bomba de sódio-potássio.

Page 168: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ELECTROFISIOLOGIA DO MÚSCULO LISO

Actas Bioq. 1989; 1:161-171

165

II - Classificação do músculo liso

Em 1941, Bozler (4) propôs uma classificação do músculo liso, o qual dividiu em unitário

(visceral) e multiunitário. Os músculos lisos unitários são caracterizados fisiologicamente por

actividade eléctrica espontânea, ou seja, pela capacidade de gerarem em si o estímulo que leva à

sua contracção e por se comportarem como um sincício funcional. Neste tipo de músculo

existem áreas pacemakers onde se gera o estímulo que depois é conduzido às outras células

através de zonas de contacto de baixa resistência eléctrica. O músculo liso multiunitário não

apresenta actividade eléctrica espontânea; é activado em mais de uma região por nervos motores,

e está organizado sob a, forma de unidades motoras. Unidades motoras menos definidas, mais

difusas e de limites menos nítidos que os das unidades motoras dos músculos esqueléticos. São

exemplos do músculo liso visceral ou unitário, os do tacto gastro-intestinal, o útero; e de

músculo liso multi-unitário, os músculos pilo-erectores, ciliares, "íris", membrana nictitante e

vasos sanguíneos de grande calibre. Esta classificação, cómoda e hoje muito aceite, não deve ser

encarada como rígida. Assim, os músculos dos canais deferentes que são normalmente activados

pelos seus nervos extrínsecos, quando colocados num banho de órgãos tornam-se

espontaneamente activos, e algumas arteríolas apresentam actividade auto-rítmica.

III - Músculo liso visceral

Entre 1938 e 1948, Bozler (4), (5) realizou uma série de trabalhos que representaram o

ponto de partida dos nossos conhecimentos actuais sobre o músculo liso. Aquele autor registou,

com eléctrodos extracelulares, a actividade eléctrica em músculo liso visceral, e relacionou-a

com a actividade mecânica observada. As contracções espontâneas que observava

periodicamente na sua preparação, eram precedidas por salvas de potenciais de acção. Estas

observações foram confirmadas pelo uso de microeléctrodos (6). Com estes, foi possível registar

o potencial transmembranar na ausência de estímulos externos. Verificou-se que nestas

condições, e ao contrário do que acontece no músculo esquelético, aquele não é estável, antes

varia espontaneamente entre - 55 e - 60 mv. Nestas condições é difícil definir potencial de

repouso no músculo liso visceral. Existe um ritmo básico de variação do potencial

transmembranar denominado de ondas lentas. (Fig. IV). Esse ritmo é diferente de tecido para

tecido. É muito nítido na camada longitudinal dos músculos intestinais e no miométrio durante o

parto. Nestas condições considera-se potencial de repouso o valor máximo (mais negativo)

atingido pelo potencial transmembranar entre períodos de actividade. Assim, o potencial de

repouso de um músculo liso visceral difere do músculo esquelético em dois aspectos: é menos

negativo e é mais lábil. Algumas áreas (grupo de células), de um músculo liso visceral

apresentam em sobreposição a esta actividade rítmica, outra mais rápida e localizada, os pré-

potenciais, cuja forma é semelhante à dos observados no músculo cardíaco.

Quando uma célula atinge o limiar de excitação, surge um potencial de acção, o qual

precede a contracção. Esquematicamente podemos dizer que as ondas lentas aproximam e

afastam, periodicamente, o potencial transmembranar do limiar de excitação. Quando o potencial

transmembranar está mais próximo do limiar de excitação, os pré-potenciais existentes em

células pacemakers levam ao aparecimento de potenciais de acção. Assim, as ondas lentas

determinam o intervalo entre as contracções, e os pré-potenciais a frequência dos, potenciais de

acção, e consequentemente a força e duração de cada contracção.

Page 169: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

166

FIGURA IV

A - Potencial de acção provocado no músculo liso por um estímulo externo. B

- Série de potenciais de acção associados à ocorrência espontânea de ondas

lentas nos músculos lisos da parede intestinal.

Os potenciais de acção que surgem nas áreas pacemakers parecem propagar-se às outras

células através de zonas de contacto entre elas, que apresentam uma baixa resistência eléctrica

(7). A presença de um potencial de acção de um lado dessa "barreira" de baixa resistência,

provocará uma alteração do potencial do outro lado, a qual atinge o valor suficiente para

desencadear um potencial de acção. Portanto a transmissão de um potencial de acção de uma

célula a outra do músculo liso visceral parece dar-se pelo desencadear de potenciais electrónicos

de amplitude suficiente para excitarem a célula. Esta hipótese é apoiada por experiências (8) em

que era introduzida numa célula um microeléctrodo através do qual se injectava corrente. Outros

microeléctrodos de registo, colocados em células vizinhas a diferentes distâncias, permitiram

verificar que o sinal eléctrico registado diminuía exponencialmente com a distância à célula

estimulada, o que é próprio de um potencial electrotónico.

a) Bases iónicas do potencial de repouso.

A relação entre as permeabilidades ao sódio e ao potássio é maior no músculo liso

visceral que no esquelético, ou seja, na equação de Goldman a importância relativa na génese do

potencial transmembranar, do sódio é maior no músculo liso visceral que no esquelético (10,16 e

0,01 respectivamente) (7). É de esperar, assim, que o potencial de repouso se afaste mais do

potencial de equilíbrio para o potássio no primeiro (músculo liso visceral) que no segundo

músculo esquelético), aproximando-se mais do potencial de equilíbrio para o sódio. Com efeito,

o potencial de repouso atrás referido para o músculo liso visceral foi de - 60 mv e para o

esquelético - 80 mv.

Page 170: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ELECTROFISIOLOGIA DO MÚSCULO LISO

Actas Bioq. 1989; 1:161-171

167

As flutuações do potencial transmembranar do músculo liso visceral, em contraste com o

potencial de repouso estável do músculo esquelético, tem sido explicado pelas diferenças entre

as bombas de sódio-potássio dos dois tipos de músculo. Assim, foi referido que a do músculo

esquelético funcionava de forma electroneutra, ou seja, por si só ela não contribuía para a

negatividade do interior celular. No músculo liso visceral ela parece ser electrogénica, isto é,

transporta para o exterior da célula mais cargas positivas do que as que transporta em sentido

inverso, contribuindo deste modo, pelo simples facto de funcionar, para a negatividade do

interior da célula (9). Outra característica desta bomba do músculo liso visceral parece ser

flutuações no seu funcionamento, não trabalhando sempre com a mesma intensidade. Estas

flutuações de funcionamento, de causa não conhecida, explicariam as variações em repouso do

potencial transmembranar.

b) Bases iónicas do potencial de acção

No músculo estriado, a despolarização rápida que se observa no potencial de acção é

devida à entrada rápida do sódio, e a repolarização à saída do potássio. No músculo liso visceral,

existe uma diferença importante quanto a base iónica da fase de despolarização do potencial de

acção, já que neste tipo de músculo essa fase depende do sódio e do cálcio, e a contribuição

relativa destes dois iões varia de um tipo muscular para outro. (6), (10). Assim, no músculo da

camada longitudinal do intestino, a velocidade de subida (despolarização) do potencial de acção

e a sua amplitude não são modificados pela alteração da concentração do sódio extracelular, mas

ambas diminuem acentuadamente com pequenas reduções na, concentração extracelular de

cálcio. Por outro lado, no músculo liso do útero, tanto a redução das concentrações de sódio

como de cálcio provocam diminuições da amplitude do potencial de acção e da velocidade de

despolarização.

IV - Características electrofisiológicas do músculo liso multi-unitário.

Dos vários exemplos possíveis para ilustrar o comportamento do músculo liso multi-

unitário, usaremos o músculo liso da parede de grandes vasos. Este músculo não apresenta

actividade eléctrica espontânea e o seu potencial transmembranar é estável na ausência de

qualquer estímulo (11). Existe pois um potencial de repouso verdadeiro, tal como no músculo

esquelético. O valor desse potencial é porém cerca de - 50 mv, mais próximo portanto do

verificado no músculo liso visceral, o que é explicável pela relação entre a permeabilidade

relativa da membrana para o sódio e para o potássio (0,38) a qual é ainda maior que no músculo

liso multi-unitário. Apesar deste baixo valor do potencial transmembranar de repouso, o músculo

liso visceral não apresenta actividade espontânea. A causa não é ainda completamente

conhecida, mas parece relacionar-se com um aumento marcado da permeabilidade do músculo

liso vascular para o potássio quando o potencial se aproxima dos - 40 mv (11), (12). Com efeito,

um estímulo eléctrico que despolarize a membrana, do músculo liso vascular dificilmente

provoca um potencial de acção. O aumento da saída de potássio, à medida que a membrana,

despolariza, contraria este efeito e tende a impedir o potencial de acção. Experiências com a

artéria do ouvido do coelho parecem apoiar esta hipótese (13). O músculo desta, artéria

comporta-se como músculo multi-unitário, mas na presença de um inibidor das correntes de

saída de potássio, como a procaína ou o TEA, apresenta actividade eléctrica espontânea.

Page 171: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

168

Os potenciais de acção observados em vasos de grande calibre como resultado da

estimulação do nervo que com eles entra em contacto, são insensíveis à tetrodoxina e muito

sensíveis ao verapamil, o que indica serem devidos principalmente a uma entrada de cálcio (14).

A importância fisiológica desta forma de activação do músculo liso vascular (acompanhada de

potenciais de acção), não é ainda clara.

V - Canais de cálcio activados por receptores.

Como é do conhecimento geral, o cálcio é essencial para a contracção dos músculos

esquelético e liso. Dado o pequeno desenvolvimento do seu retículo sarcoplasmático, o cálcio

necessário para a contracção deste último provém em grande parte do meio extracelular. Nesta

breve revisão, temos referido a entrada de cálcio associada à despolarização no potencial de

acção, ou seja, entrada de cálcio através dos canais voltagem dependentes. Existem porém outros

canais de cálcio activados por receptores, o que é exemplificado pela acção da noradrenalina na

artéria do ouvido do coelho, a qual provoca vasoconstricção sem alteração do potencial

transmembranar (13). Admite-se, (14) (15), que os agonistas ao ligarem-se aos receptores

provoquem duas acções independentes: primeiro, a libertação do cálcio intracelular, e em

seguida, a abertura dos canais de cálcio com a entrada deste ião. Estes canais comandados por

agonistas são menos sensíveis à nifedipina e ao D 600 que os voltagem dependentes.

VI - Aspectos electrofisiológicos da transmissão neuromuscular no músculo liso.

As duas preparações que tem sido mais extensamente estudadas (16), (17), são as do

nervo hipogástrico - canal deferente e nervo - músculo intestinal, tendo esta a particularidade de

o músculo receber uma dupla inervação, simpática e parassimpática, enquanto os canais

deferentes são inervados apenas pelo simpático

A introdução de um microeléctrodo numa célula (em qualquer célula) do músculo liso do

canal deferente permite registar um potencial estável de cerca de - 65 mv. Nestas condições, a

estimulação repetida do nervo hipogástrico com estímulos de 1 ms de duração, provocará

despolarizações localizadas (uma por cada estímulo) (Fig. V). O aumento da frequência de

estimulação leva à somação destes potenciais individuais atingindo o potencial transmembrana, o

valor de - 35 mv. e surgindo então um potencial de acção. Estas pequenas despolarizações

localizadas, produzidas por cada estímulo, são denominadas potenciais excitatórios de junção, e

são o análogo a nível do músculo liso dos potenciais de placa da junção neuro-muscular do

músculo esquelético. O tratamento prévio da preparação com fentolamina, impede que a

estimulação do nervo hipogástrico desencadeie potenciais excitatórios de junção, apoiando a

hipótese de que eles sejam devidos à libertação de noradrenalina pelas terminações nervosas, e a

subsequente ligação destes neurotransmissores a receptores pós-simpáticos musculares. Na

ausência de qualquer estimulo nervoso, os microeléctrodos colocados no interior das fibras

musculares, registam pequenos potenciais que tem sido interpretados como análogos dos

potenciais mínimos de placa observados no músculo esquelético. Outra preparação que tem sido

muito usada para estudo da electrofisiologia da junção neuromuscular no músculo liso, é o

músculo da camada longitudinal do cólon do coelho. É possível estudar nessa preparação os

efeitos da estimulação parassimpática e simpático. A estimulação do parassimpático, a qual

provoca a libertação da acetilcolina leva ao aparecimento de potenciais excitatórios de junção.

Com frequência adequada estes potenciais somam-se e a despolarização é suficiente para atingir

Page 172: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ELECTROFISIOLOGIA DO MÚSCULO LISO

Actas Bioq. 1989; 1:161-171

169

o limiar de excitação da fibra muscular, surgindo então um potencial de acção. O estudo doe

potenciais excitatórios de junção é mais complicado nesta preparação do que na do canal

diferente, já que por um lado, o intestino apresenta actividade eléctrica espontânea, e por outro,

os movimentos a que esta actividade dá origem provocam deslocamento dos microeléctrodos, o

que torna difícil mantê-los durante muito tempo no interior da célula em estudo. Esta preparação

permite, porém, estudar o efeito dos nervos inibitórios sobre o músculo liso. A distensão de um

músculo liso visceral, provoca a diminuição do seu potencial transmembranar, o qual se

aproxima do limiar de excitação. Nesta condição, a frequência de potenciais de acção aumenta, e

se a distensão for adequada, torna-se contínua. A estimulação, então, das fibras simpáticas que

inervam o músculo, provoca a hiperpolarização da membrana celular e o desaparecimento da

descarga continua de potenciais de acção provocada pela distensão prévia. Esta hiperpolarização

é impedida, por bloqueadores adrenérgicos. Foi ainda esta preparação que permitiu observar

potenciais inibitórios de junção. Os nervos intramurais, os que existem entre as camadas

musculares, quando activados com pulsos de corrente de curta duração (inferior a 1 ms),

provocam o aparecimento de hiperpolarizações localizadas, as quais se somam para produzirem

hiperpolarização e desaparecimento de potenciais de acção. Estes potenciais inibitórios não são

impedidos pelo bloqueio adrenérgico e consideram-se actualmente mediados por nervos

purinérgicos.

FIGURA V

Efeito da estimulação repetitiva do nervo hipogástrico sobre o potencial

transmembrana de uma fibra muscular lisa isolada do canal deferente de cobaia

(segundo Burnstock e Holman).

Page 173: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

SILVA CARVALHO L.

170

SUMMARY

The main aspects of the electrophysiology of skeletal muscle are

reviewed as well as the ionic basis of resting and action potentials. Bozler's

classification of smooth muscle as unitary or multi-unitary is referred. The

electrophysiological aspects of the two groups are reviewed in separate: first,

the ionic basis of resting potential, slow waves, prepotential and spikes in

unitary muscles; then, the ionic basis of resting and action potentials in arterial

smooth muscle. Neuroeffector junctions in smooth muscle are briefly

reviewed.

BIBLIOGRAFIA

1. SCHMIDT, RF e THEWS, G - Human Physiology. Ed. Springer Verlag 1983

2. HILLE, B - Ionic basis of resting and action potentials. Handbook of Physiology. Sec. I,

pg. 99, 1977

3. HODGKIN, AL e HOROWICZ, P - The effect of sudden changes in ionic concentrations

on the membrane potential of single muscle fibres - J. Physiol. 153: 370, 1960

4. BOZLER, E - Action potentials and conduction of excitation in muscle. - Biol. Symp. 3,

95, 1941 - cit. em Medical Physiology, Mountcastle, pg. 123, 1980

5. BOZLER, E. Conduction, automaticity and tonus of visceral smooth muscle Experientia, 4:

213, 1948

6. PROSSFR, CL - Smooth muscle - Ann. Rev. Physiol. 36; 503, 1974

7. MOUNTCASTLF, Medical Physiology. Cap. 4 , 1980

8. TOMITA, T - Electrophysiology of mammalian smooth muscle - Prog. Biophys. Mol. Biol.

30; 185, 1975

9. GUYTON, A - Fisiologia Médica. Cap. 12, 1981

10. INOMATE, H e KAO, CY - Ionic currents in the guinea-pig taenia coli - J. Physiol. 255,

347, 1976

11. SOMLYO, AP e SOMLYO, AV - Vascular smooth muscle. II Pharmacology of normal

and hypertensive vessels - Pharmacol. Rev. 22; 249, 1970

12. MEKATA, F - Current spread in the smooth muscle of the rabbit aorta - J. Physiol. 242,

143, 1974

13. DROOGMANS, G; RAEYMAEKERS, L e CASTELS, R - Electro and pharmaco-

mechanical coupling in the smooth muscle cells of the rabbit ear artery - J. Gen. Physiol.

70; 129, 1977

14. CASTEELS, R e DROOGMANS, G - The role of calcium in contraction of vascular

smooth muscle. In: Calcium channel blocking agents in the treatment of cardiovascular

disorders. Ed. Stone e Antman, 1983

15. BEVAN, JA e WATERSON, JB - Biphasic constrictor response of the rabbit ear artery -

Circ. Res. 28; 655, 1971

16. BURNSTOCK, G e HOLMAN, ME - The transmission of excitation from autonomic nerve

to smooth muscle - J. Physiol. 155; 115, 1961

17. GILLESPIE, JS - The electrical and mechanical responses of intestinal muscle cells to

stimulation of their extrinsic parasympathetic nerves - J. Physiol. 162; 76, 1962

Page 174: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ELECTROFISIOLOGIA DO MÚSCULO LISO

Actas Bioq. 1989; 1:161-171

171

Page 175: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989, 1:173-177 173

ASPECTOS MICROSCÓPICOS DO TECIDO MUSCULAR CARDÍACO

R. Trindade dos Anjos

Departamento de Histologia e Embriologia da Faculdade do Ciências Médicas do Lisboa,

Universidade Nova do Lisboa

SUMÁRIO

O miocárdio é formado por células musculares estriadas, envolvidas por

um fino tecido conjuntivo, com uma extensa rede capilar. As células

musculares cardíacas são ramificadas, com os núcleos localizados no centro

da célula. O sarcoplasma contém miofibrilhas, com estriação transversal

semelhante a do músculo esquelético. Tal como neste, a estriação é

determinada pela organização dos miofilamentos, verificando-se igualmente a

existência de bandas A, bandas I e Linhas 7. Feixes de filamentos de uma

miofibrilha tornam-se por vezes confluentes com os de outra, não existindo

portanto no músculo cardíaco uma demarcação tão bem definida entre as

miofibrilhas como no músculo esquelético. As miofibrilhas divergem na

proximidade do núcleo, deixando zonas livres de sarcoplasma em cada um dos

polos nucleares, extremamente ricas em mitocôndrias. Estas distribuem-se

igualmente ao longo das miofibrilhas, formando filas contínuas. O retículo

sarcoplasmático, de disposição longitudinal, é menos complexo do que o do

músculo esquelético. As invaginações tubulares da membrana plasmática, ou

sistema T, (menos numerosas mas de maiores dimensões do que as do sistema

análogo do músculo esquelético), distribuem-se transversalmente ao longo da

linha Z. As células musculares cardíacas estão unidas entre si pelos discos

intercalares, junções complexas que podem adoptar a forma de macula ou

fascia quer do tipo “adherens” quer do tipo “occludens”. As junções do tipo

“occludens” constituem os chamados “nexus”, com um estreito espaço

intercelular, pelo que são por vezes descritas corno “gap junctions”. Estes

últimos são locais de baixa resistência eléctrica, que constituem a base

estrutural da transmissão eléctrica intercelular.

Palavras-chave: Músculo, miofibrilha, discos intercalares

Page 176: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

TRINDADE DOS ANJOS R.

174

O tecido muscular cardíaco é constituído por células estriadas, de forma cilíndrica, com

duas ou mais ramificações. Reúnem-se entre si por junções intercelulares especializadas, adiante

descritas.

Cada célula muscular cardíaca tem cerca de 100 m de comprimento por 15 m de

diâmetro. A membrana celular ou sarcolema é revestida por uma membrana basal, tal corno no

músculo esquelético. Também no músculo cardíaco as células apresentam miofibrilhas com uma

distribuição semelhante (embora sejam de assinalar algumas diferenças) (1).

As miofibrilhas são mantidas relativamente alinhadas no sarcoplasma através de

filamentos e microtúbulos do citoesqueleto, que estabelecem ligações entre as linhas Z de

miofibrilhas adjacentes (2). Estas linhas, que delimitam os sarcómeros, constituem o local onde

terminam e se interdigitam os filamentos finos das bandas I adjacentes. Nas linhas Z existem

elementos filamentares secundários que reúnem entre si os miofilamentos finos (3).

Tal como no músculo esquelético, as bandas A, de densidade elevada, possuem

filamentos espessos que se cruzam na sua porção mais extrema com filamentos finos, de modo

que cada filamento espesso se encontra rodeado de seis filamentos finos, emitindo na sua

direcção pequenas projecções filamentares (cabeças do filamento espesso) (4). No centro da

banda A observa-se também uma zona de menor densidade, a banda H, e na sua porção média

uma linha M, que reúne os filamentos espessos.

No músculo cardíaco ao contrário do músculo esquelético, as miofibrilhas têm disposição

mais irregular, ramificando-se frequentemente de tal forma que feixes do miofibrilhas ou mesmo

sarcómeros inteiros de uma miofibrilha se tornam confluentes com os de outra miofibrilha

adjacente (5).

FIGURA 1

Secção longitudinal de músculo cardíaco. O núcleo encontra-se em posição

central. As miofibrilhas estão organizadas cm sarcómeros, e o citoplasma

contém grande número de mitocôndrias. (X 12.000). Retirado do Ferrans (2).

Page 177: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MICROSCOPIA DO MÚSCULO CARDÍACO

Actas Bioq. 1989; 1:173-177

175

O núcleo celular apresenta uma localização central característica, entre as miofibrilhas.

Tem um diâmetro variável, que por vezes chega a alcançar metade da largura da célula. O núcleo

está delimitado pela membrana nuclear (com um folheto interno e um folheto externo)

interrompida por alguns poros nucleares, e que está directamente relacionada com as estruturas

tubulares do retículo sarcoplasmático. A forma do núcleo varia consoante o estado contráti1 da

célula, e durante a contracção as membranas nucleares tornam-se irregulares, com invaginações

(6). As membranas nucleares ligam-se através de filamentos do citoesqueleto às linhas Z das

miofibrilhas, e estão envolvidas por uma rede de microtúbulos do sarcoplasma (7). Todas estas

estruturas tendem a manter o núcleo na sua posição, e levam a alteração da sua forma, com as

modificações do estado contráctil.

As mitocôndrias são ovóides ou alongadas, em número maior do que nos outros tipos do

células musculares e apresentam numerosas cristas e grânulos densos no seu interior. Encontram-

se sobretudo ao longo das miofibrilhas, mas também adjacentes ao sarcolema e na zona

perinuclear.

Em cada pólo nuclear existe uma zona de citoplasma livre de miofibrilhas. Para além do

grande número de mitocôndrias, esta região possui um aparelho do Golgi de pequenas

dimensões, partículas do glicogénio, gotículas lipídicas e lisossomas (8). Com a idade,

acumulam-se progressivamente grânulos do lipofuscina.

Os túbulos T são invaginações da membrana plasmática, dispostas a nível da linha Z,

entrando profundamente na célula, para se relacionarem com estruturas do retículo

sarcoplasmático. Embora menos numerosos do que no músculo esquelético, os túbulos T são

muito mais largos no coração, permitindo mesmo que a lâmina basal da superfície celular

penetre no sou interior e revestindo a sua superfície interna.

FIGURA II

Representação esquemática de uma célula muscular cardíaca. Estão indicados:

l- cisterna terminal; 2- retículo livre; 3- mitocôndria; 4- túbulo T; 5- linha Z.

Page 178: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

TRINDADE DOS ANJOS R.

176

O retículo sarcoplásmico, menos abundante e elaborado do que no músculo esquelético, é

composto sobretudo por retículo liso, não associado a ribossomas. Foram descritos três

componentes distintos: o retículo sarcoplásmico livre, funcional e funcional alargado (9). O

retículo livre forma uma rede extensa que se anastomosa ao longo de todo o sarcómero, o não

apenas a nível da linha M (10). O retículo funcional é composto do dilatações saculares, as

cisternas terminais, que possuem um conteúdo granular electrono-denso. O retículo funcional

relaciona-se intimamente com o sarcolema, quer a nível da superfície celular quer ao nível dos

túbulos T. A associação destes últimos túbulos com uma cisterna terminal constitui as chamadas

„díades”. O retículo funcional alargado é constituído por estruturas que embora possuam as

características do retículo funcional não estão em contacto com o sarcolema ou os seus

prolongamentos.

O músculo auricular apresenta as mesmas características gerais do músculo ventricular,

descrito anteriormente. No entanto as células auriculares possuem menor diâmetro, contendo

maior número do mitocôndrias. Os túbulos T a nível auricular são raros, e podem mesmo não

existir, sendo nestas células preponderante o retículo funcional alargado. Nas células auriculares

há ainda grânulos de elevada densidade, dispersos no citoplasma em número variável, contendo a

chamada hormona auricular natriurética.

As células musculares cardíacas estão unidas entre si por junções intercelulares

particulares, denominadas discos intercalares. Nestes locais existem especializações quer da

membrana quer do sarcoplasma adjacente. Os discos dispõem-se entre duas fibras segundo um

padrão em degrau, com porções transversais e longitudinais sucessivas. Nas zonas transversais, a

membrana apresenta um aspecto ondulado, e o sarcoplasma adjacente contém zonas densas do

material filamentoso, semelhante às linhas Z, onde se vão inserir as porções terminais das

miofibrilhas (11). As junções intercelulares a este nível são do tipo “macula adhaerens” ou

desmossomas, e quando mais extensas constituem as “fascia adhaerens”. No seu conjunto estas

junções são responsáveis pela firme coesão intercelular do músculo cardíaco. As porções

longitudinais dos discos intercalares apresentam junções intercelulares do tipo "zónula

occludens” ou "macula occludens”. Estes dois tipos de junções constituem os chamados nexus,

ou „gap junctions”, por apresentarem um estreito espaço intercelular, do 18 a 40 Å (12). Possuem

resistência eléctrica muito baixa, e constituem a base estrutural de transmissão eléctrica

intercelular.

Entre as células musculares existe um tecido conjuntivo rico do fibras reticulares e de

colagéneo, e que corresponde ao endomísio do músculo esquelético, embora mais irregular, dado

o padrão complexo de anastomoses intercelulares. Envolvendo feixes de células musculares há

tecido conjuntivo com fibras elásticas, formando o equivalente ao perimísio esquelético. Estes

tecidos apresentam um extenso plexo dos capilares sanguíneos, além dos ramos das artérias

coronárias e veias cardíacas. Aí existem também pequenos ramos nervosos, provenientes do

sistema vegetativo. Ao nível da junção atrioventricular o tecido conjuntivo é particularmente

denso, formando o chamado esqueleto fibroso do coração.

As células do tecido cardio-nector são células cardíacas com características particulares

(13). As células nodais são pequenas, mas as do feixe atrioventricular possuem habitualmente

grandes dimensões. Estas últimas, também designadas células de Purkinje, não possuem túbulos

T o têm grandes quantidades do glicogénio no seu sarcoplasma. As miofibrilhas dispõem-se à

periferia da célula o são pouco numerosas (14).

Page 179: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MICROSCOPIA DO MÚSCULO CARDÍACO

Actas Bioq. 1989; 1:173-177

177

BIBLIOGRAFIA

1. INTERNATIONAL ERWIN RIESCH SYMPOSIUM, MARCH 1984. Adult heart muscle

cells. Isolation, properties and applications. Bas Res Card 80 (l):l-166,1985.

2. FERRANS V J. Normal Myocardial Ultrastructure. In Electron Microscopy in Human

Medicine, McGRAW-HYLL, 1980, vol 5, 4-7.

3. GOLDSTEIN MA, SCHROETER JP and SASS RL. Optical diffraction of the Z lattice in

canine cardiac muscle. J Cell Biol, 75, 818, 1977.

4. WEISS L and GREEP R. HISTOLOGY. McGraw Hill Book Company, New York, 1977.

5. PAGE E and McCALLISTER LP. Quantitative electron microscopic description of heart

muscle cells: Application to normal, hypertrophied and thyroxin-stimulated hearts. Am J

Cardiol, 3l, 172, 1973.

6. BLOOM S. Structural changes in nuclear envelopes during elongation of heart muscle

cells. J Cell Biol, 44:218, 1970.

7. FERRANS,VJ. Intermyofibrillar and nuclear-myofibrillar connections in human and

camyne myocardium. An ultrastructural study. J Mol. Cell Cardiol, 5: 247, 1973.

8. HAN 5 and HOLMSTED J. Human Microscopic Anatorny. McGRAW HILL Book

Company , 1981.

9. BOOK PJ, FERRANS VJ, JONES M, et al. Tubuloreticubar structures in myocardium. An

ultrastructural study. J Mol Cell Cardiol, 11: 967-976, 1986.

10. SOMMER JR and WANGH RA. The ultrascture of the mammalian cardiac muscle - with

special emphasis on the tubular membrane systems. Am J Pathol 82: 191-232, 1976.

11. FAWCETT DW and McNUTT NS. The ultrastructure of the cat myocardium. I ventricular

papillary muscle. J Cell Biol, 42:1, 1969.

12. Mc NUTT NS. Ultrastructure of intercellular junctions in adult and developing cardiac

muscle. Am J Cardiol, 25:169, 1970.

13. SOMMER JR, et al. Geometry of cell and bundle appositions in cardiac muscle: light

microscopy. Am J Physiol 248:792-803, 1985.

14. JAMES TN, SHERI L and URTHALER F. Fine structure of the bundle -branches. Br.

Heart J 36:1-18, 1974.

Page 180: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:179-187 179

PERIODOS REFRACTÁRIOS

A. LONGO

Unidade de Tratamento Intensivo para Coronários (UTIC Arsénio Cordeiro), Hospital de Santa

Maria, 1600 Lisboa, Portugal

SUMÁRIO

Definem-se os períodos refractários cardíacos em electrofisiologia celular e

clínica e as suas variações nas várias estruturas do coração. Descrevem-se as

causas que determinam o seu aumento ou diminuição nomeadamente a

frequência cardíaca, o potássio e os fármacos.

Quando estimulamos electricamente uma célula cardíaca obtemos um potencial de acção (PA)

semelhante ao que esquematicamente está representado na figura 1 em cima (A) e à esquerda.

Em cima e à direita estão representados os PA obtidos por estímulos de prematuridade crescente.

A amplitude e a Vmax das respostas estão relacionadas com o valor do potencial de membrana

na altura da estimulação. As respostas aos estímulos mais prematuros (a e b) tem origem a baixos

potenciais de membrana e tem uma amplitude tão pequena e uma subida tão lenta que não se

propagam as células vizinhas. A resposta propagada mais precoce (c) define o fim do período

refractário efectivo (PRE).

Na figura 1 em baixo (B) e à esquerda estão representadas as intensidades mínimas do

estímulo necessário para obter respostas. Essa intensidade é constante durante a fase de repouso.

Perto do final da fase 3 do PA existe um curto período em que a membrana responde a estímulos

mais baixos e se denomina período super-normal (PSN). Este período é antecedido por outro em

que para se obter respostas são precisos estímulos de intensidade crescente, e se denomina

período refractário relativo (PRR).

Segue-se o período refractário absoluto (PRA), durante o qual a membrana não responde

qualquer que seja a intensidade do estímulo (2).

Os PA e os períodos refractários (PR) são diferentes nas várias estruturas cardíacas. Na

figura 2 estão esquematizados sequencialmente os vários PA que se podem registar do nó sinusal

ao miocárdio ventricular. (2).

Palavras-chave: Períodos refractários, potencial de acção

Page 181: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

LONGO A.

180

FIGURA 1

A - Intensidade das respostas; B - Intensidade dos estímulos; PSN - Período

super normal; PRP Período refractário relativo; PRA - Período refractário

absoluto; PRE - Período refractário efectivo; PRT - Período refractário total;

TRT Tempo de recuperação total; PL - Potencial limiar; PR - Potencial de

repouso.

Os PA de major duração registam-se a nível dos ramos e das ramificações de Purkinje.

Os períodos refractários variam no mesmo sentido.

Em electrofisiologia clínica os períodos refractários são determinados de maneira

diferente (1). Por um lado, não se utilizam habitualmente estímulos limiares, o que poderia levar

a resultados aleatórios e, por outro, não se pesquisa o PRA pois para isso era necessário

empregar estímulos com energia que podia ser perigosa.

Se colocarmos electrocateteres em sítios determinados no coração, podemos decompor a

condução em vários níveis e estudar as propriedades das várias estruturas que compõem o tecido

excito-conductor.

Na figura 3 está representada a recolha em simultâneo dos potenciais do ECG periférico,

dum electrocateter colocado na parte alta da aurícula direita e doutro na transição aurículo-

ventricular. Com este último recolhem-se os potenciais da parte baixa da aurícula, do feixe de

His e do ventrículo. Da conjugação dos vários traçados podemos decompor o tempo de condução

A-V (intervalo P-R), neste caso de 175 ms, nos tempos de condução intra-auricular (intervalo P-

A), nodal aurículo-ventricular (intervalo A-H), e His-Purkinje (intervalo H-V).

Page 182: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

PERÍODOS REFRACTÁRIOS

Actas Bioq. 1989; 1:179-187

181

FIGURA 2

Representação esquemática do tecido excito-condutor (A) e respectivos

potenciais de acção e do ECG periférico resultante (B). As letras representam:

a) nódulo sinusal; b) feixe de Bachmann; c) miocárdio auricular; d) nódulo MV;

e) feixe de His; f) ramos; g) fibras de Purkinje; h) fibras de Purkinje terminal; i)

miocárdio ventricular.

FIGURA 3

Registos simultâneos de derivações bipolares (BE) da aurícula direita alta

(HRA), da zona do feixe de His (BH) e de 3 derivações (L-1, aVF e V1) do

ECG periférico. P - Deflexão correspondente à activação da parte alta da

aurícula; A - Deflexão correspondente à activação da parte baixa da aurícula;

BH - Deflexão correspondente à activação do feixe de His.

Page 183: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

LONGO A.

182

Se estimularmos uma estrutura cardíaca - figura 4 - com um estímulo eficaz (S1)

obteremos uma resposta (R1). Se passado certo tempo emitirmos outro estímulo (S2) obteremos

outra resposta (R2). O intervalo de tempo entre S1 e R1 é igual ao entre S2 e R2 e o intervalo

S1-S2 é igual ao intervalo R1-R2. Se formos aproximando no tempo o S2 do S1 vamos obtendo

os mesmos resultados: os R1-R2 vão encurtando de igual modo que os S1-S2. A partir de

determinada altura, porém, e devido à prematuridade, aumenta o intervalo S2-R2 e agora o S1-

S2 é menor que o R1-R2.

FIGURA 4

PRR 500; PRF 480; PRE 450.

Continuando a aproximar o S2 do S2 em dado momento deixaremos de obter resposta ao

S2.

A partir do momento em que os R1-R2 são maiores que os S1-S2 entramos no PRR.

Define-se (1): PRR como o menor S1-S2 a que corresponde um R1-R2 do mesmo valor; PRE

como o menor S1-S2 com que se obtém respostas (R2); PRF como o mais curto intervalo entre

as respostas (R1-R2).

Estas relações podem ser expressas sob a forma dum gráfico - figura 5 - pondo em

abcissas os valores de S1-S2 e em ordenadas os de R1-R2.

Na figura 6 estão representadas 3 derivações do ECG periférico e o electrograma do feixe

de His. Se quisermos estudar os períodos refractários do nódulo A-V, vamos estimular a aurícula

com intervalos de acoplamento decrescentes e verificar o que acontece aos out-puts do sistema,

neste caso através dos intervalos H-H, quando fazemos variar os in-puts, neste caso as intervalos

A-A.

Na figura 7 representam-se as variações do H1-H2 (em ordenadas) em função dos A1-A2

(em abcissas) e a determinação dos respectivos períodos refractários do nódulo A-V (6).

Page 184: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

PERÍODOS REFRACTÁRIOS

Actas Bioq. 1989; 1:179-187

183

FIGURA 5

Diagrama de correlação entre os intervalos S1-S2 e os intervalos R1-R2.Os

valores do PRE e do PRR determinam-se no eixo das abcissas e o do PRF no

das ordenadas.

FIGURA 6

DI, DIII, V1 e electrograma do feixe de His. O intervalo A-H é a medida do

tempo de condução intranodal

Page 185: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

LONGO A.

184

FIGURA 7

Correlação entre os valores de A1-A2 e o do H1-H2 e determinação dos

períodos refractários do nódulo A-V.

Os potenciais de acção e OS períodos refractários são afectados por vários factores, dos

quais destacamos a frequência, os electrólitos e os fármacos.

Na tabela I apresentarmos as variações com a frequência dos PRE da aurícula, do nódulo

A-V e do ventrículo. Os PRE da aurícula, e do ventrículo decrescem francamente quando a

frequência aumenta. Os do nódulo A-V têm uma variação menos franca com ligeira tendência à

subida (1)

TABELA 1

VARIAÇÃO COM A FREQUÊNCIA DOS PRE DA AURÍCULA (A), DO

NÓDULO A-V (NAV) E DO VENTRÍCULO (V)

Page 186: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

PERÍODOS REFRACTÁRIOS

Actas Bioq. 1989; 1:179-187

185

Nas figuras 8 e 9 representa-se a variação dos potenciais de acção com a caliémia. À medida que

o K sobe, diminuem a duração e a amplitude dos potenciais de acção. Quando o potássio desce,

aumenta a duração dos potenciais de acção. Os PR variam no mesmo sentido (5).

FIGURA 8

Representação esquemática dos potenciais de acção auriculares (A) e

ventriculares (V) e do EGG periférico, com a variação da caliémia. Os números

à esquerda representam o potencial transmembranar em mV e os de baixo os

valores do potássio em mEq/l.

FIGURA 9

Potenciais de acção, EGG e hipocaliémia

Page 187: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

LONGO A.

186

A lista dos fármacos com acção nos potenciais de acção e nos períodos refractários é

muito extensa. Dentre eles destacam-se, pela sua importância neste contexto, os antidisrítmicos.

No quadro I figuram os mais importantes, dispostos em grupos segundo a classificação de

Vaughan Williams, modificados por Harrison.

QUADRO I

No quadro II apresentam-se as suas acções, de maneira esquemática. nos PA s nos PR

auriculares e ventriculares (3, 4).

QUADRO II

Os das classes Ia o III aumentam os PA s os PR, sendo mais acentuada a acção dos da

classe III nestes parâmetros.

Os das classes Ib e II encurtam-se ligeiramente ou não os modificam.

Page 188: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

PERÍODOS REFRACTÁRIOS

Actas Bioq. 1989; 1:179-187

187

Os da classe Ic duma maneira geral não os modificam, embora estejam registados casos

na literatura de pequenos aumentos ou diminuições.

Os da classe IV não modificam as PA e os PR.

Nos PR do nódulo A-V as acções são as seguintes:

Classe Ia - aumento por efeito directo, diminuição por efeito vagolítico, geralmente

com predomínio deste último.

Classe Ib - aumento discreto ou nulo

Classe Ic e III - aumento por efeito directo.

Classe II - aumento, por efeito simpaticolítico e um pequeno efeito directo

Classe IV - aumento acentuado por efeito directo.

SUMMARY

Definitions of cardiac refractory periods are given. Their evaluation in cellular

and clinical electrophysiology and their variability in the different heart

structures are described. Factors that influence their duration (namely, heart

rats, potassium and drugs) are discussed.

BIBLIOGRAFIA

1. CIVERA, RG, MAÑEZ, RS and SANCHIS, JL - Electrofisiologia Cardíaca Clínica. Sandoz,

S.A.E. Barcelona, 1983.

2. GADSBY, DC and WIT, AL - Normal and abnormal eloctrophysiology of cardiac cells. In

Cardiac Arrhythmias. Their Mecanisms, Diagnosis, and Management. Mandel WJ (editor),

JB Lippincott Company, Philadelphia 1980, pp 55-82.

3. SINGH, NB and MANDEL, WJ - Antiarrhythmic drugs: basic concepts of their actions. In

Cardiac Arrhythmias. Their Mecanism, Diagnosis and Management. Mandel WJ (editor), JB

Lippincott Company, Philadelphia 1980, pp 550-588.

4. SOMBERG, JC - New directions in antiarrhythmic drug therapy. Am. J. Card. 54:88-178,

1984.

5. SURAWICZ, B - The interrelationship of electrolyte abnormalities and arrhythmias. In

Cardiac Arrhythmias. Their Mecanisms, Diagnosis, and Management. Mandel WJ (editor),

JB Lippincott Cornpany, Philadelphia, 1980, pp 83-106.

6. WU, D and DENES PE ROSEN, KM - Refractoriness of atrioventricular conduction. In His

Bundle Electrocardiography and Clinical Electrophysiology. Narula, O (editor), FA Davis

Company, Philadelphia, 1975, pp 95-103.

Page 189: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:189-193 189

BINÓMIO EXCITAÇÃO/CONTRACÇÃO-PARTICULARIDADESDE ACÇÃO DO CÁLCIO

E DE OUTROS IÕES

H. Bastos Machado

Departamento de Cardiologia da Faculdade de Medicina de Lisboa

SUMÁRIO

O Ca++

entrado na célula na fase 2 do potencial de acção induz a libertação de

novos iões Ca (cálcio regenerativo ou induzido) dos depósitos intracelulares.

Há difusão dos iões Ca no citoplasma onde se ligam à troponina C,

inactivando um inibidor da contracção muscular, dando origem à contracção.

Em repouso, a célula cardíaca está polarizada (o interior tem carga negativa cm relação

ao exterior). O espaço extracelular tem maior concentração de iões Na+ e Ca

++, sendo maior a

concentração de K+ intracelular.

Durante o “plateau’ da fase 2 do potencial de Acção (Fig. 1) há remoção de ides Ca++

intravascular e dos depósitos da membrana celular (glicocálice e sobretudo das invaginações que

formam o sistema tubular T, nas proximidades das linhas Z) e sua passagem através da abertura

dos canais lentos, para o citoplasma (Fig. 2). A concentração de Ca++

plasmático é então ainda

insuficiente para a activação do aparelho contráctil: contudo, estes iões que só difundiram no

interior da célula tem um primeiro papel importante como mediadores da contractilidade, uma

vez que vão libertar uma quantidade importante de Ca++

do depósitos intracelulares - retículo

sarcoplásmico (sobretudo das cisternas laterais as invaginações do sistema T) que constitui o

sistema longitudinal e, em menor quantidade, das mitocôndrias. Este Ca++

“induzido” ou

“regenerativo’, junto com o Ca++

que atravessou a membrana atinge uma concentração

citop1asmática 100 vezes superior à anterior à da despolarização da membrana celular, sendo

agora suficiente para activar o aparelho contráctil.

O aparelho contráctil é constituído por filamentos grossos e filamentos finos, que, vistos

em corte transversal, se dispõem geometricamente, ocupando um filamento grosso o centro do

um hexágono, em cujos vértices, se encontra um filamento fino (Fig.3). Assim, cada filamento

grosso está em relação com seis filamentos finos, e cada filamento fino em relação com três

filamentos grossos. Os filamentos grossos são compostos por moléculas de miosina com uma

Palavras-chave: Ca++

, miosina, actina, troponina, tropomiosina

Page 190: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BASTOS MACHADO H.

190

cabeça globular, rica em ATP, agregadas do modo que as cabeças ficam à periferia, sendo o

interior enzimaticamente inactivo (Fig. 4).

FIGURA I

Fluxo de iões associado de potencial do acção do miocárdio

FIGURA II

Esquema da passagem dos Ca++

(esférulas) do espaço extra-celular e do

glicocálice, pelos canais lentos, para o citoplasma, sobretudo através do sistema

tubular T, e remoção do Ca++

do depósito intracelular (sistema longitudinal ou

reticulo sarcoplásmico, SR, com as cisternas laterais, LC, contíguas às

invaginações T), e das mitocôndrias, MI. Na parte inferior da figura estão

representados os sarcómeros (entre duas linhas Z) com os filamentos grossos de

miosina e os filamentos finos (actínicos).

Page 191: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ACÇÃO MUSCULAR DO CÁLCIO

Actas Bioq. 1989; 1:189-193

191

Dos filamentos miosínicos saem apêndices transversos, formados pelo enrolamento em

espiral de moléculas, com uma cabeça biglobular (Fig. 5).

FIGURA III

Ampliação microscópica de corte transversal de fibra muscular (à direita) e

esquema (à esquerda) para mostrar a relação geométrica entre os filamentos

grossos e finos

FIGURA IV

Moléculas assimétricas de miosina, que se ordenam espacialmente de modo que

as cabeças fica na parte exterior do filamento.

Page 192: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BASTOS MACHADO H.

192

FIGURA V

Zonas articulares dos apêndices dos filamentos grossos, que permitem a formação

de pontes.

Estes apêndices transversos tem duas áreas articulares, uma junto à cabeça e outra ao

corpo do filamento, o que lhos permite angulações do molde a contactar os filamentos finos,

formando pontes. Os filamentos finos são compostos por moléculas de actina dispostas em forma

helicoidal, em cujo sulco se encontra a tropomiosina; os complexos de troponina não se

encontram dispostas sobre as moléculas de actina de forma contínua, mas a intervalos regularas

do sete moléculas de actina (Fig. 6). Os complexos de troponina são formados por a) troponina

C, ou factor sensibilizante do cálcio, que se liga ao Ca++

; b) troponina I, ou factor inibidor, que

inibe a ATPase da actomiosina estimulada pelo Mg++

, evitando a formação de pentes; e c) a

troponina I, com acção reguladora sobre a globalidade das funções do complexo troponínico e

das suas relações com a actina e a tropomiosina.

FIGURA VI

Filamento fino, com a disposição especial dos seus componentes: actina,

tropomiosina e complexos de troponina

Quando a concentração plasmática do Ca++

é suficiente, este liga-se à troponina C, sendo inibida

a ligação da troponina I à actina; há modificações na configuração espacial da troponina-

tropomiosina de modo a melhorar a formação das pontes de miosina. Desta interacção

actina/miosina, com utilização energética do ATP, resulta um movimento de deslizamento dos

filamentos finos em direcção ao centro do sarcómero (Fig. 7), levando ao seu encurtamento - a

contracção.

Page 193: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ACÇÃO MUSCULAR DO CÁLCIO

Actas Bioq. 1989; 1:189-193

193

FIGURA VII

Esquema do desligamento dos filamentos finos. À esquerda em diástole, ao centro

no início da sístole e à direita no acme sistólico.

Foi pedida ao Editor autorização para reprodução total ou parcial das figures 2-7 do livro

“Miocárdio. Vasos sanguíneos. Cálcio” do Lossnitzer. Pfennigsdorf e Brauer, ed. Knoll AG,

Ludwigshafen.

Page 194: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:195-205 195

FISIOPATOLOGIA DA CONTRACÇÃO DO MIOCÁRDIO ISQUÉMICO1

R. Ferreira2

UTIC Arsénio Cordeiro - Hospital do Santa Maria

SUMÁRIO

A contracção miocárdica cessa após a laqueação do um vaso coronário e a área

afectada toma-se cianótica e, eventualmente, procidente. Na clínica, episódios

reversíveis de isquémica do miocárdio provocam falência ventricular esquerda

transitória. A repercussão hemodinâmica e clínica da necrose do miocárdio,

deponde da extensão da área necrosada e da zona em sofrimento isquémico,

tomando-se evidente quando a necrose é superior a 20%. Várias explicações

têm sido invocadas para a perda da contractilidade do miocárdio isquémico: a

acidose intracelular, dificultando a interacção do Ca++, com as proteínas

contrácteis, parece ser o mecanismo mais importante, embora não único, a

invocar. A isquémia e necrose do miocárdio interferem igualmente com as

propriedades diastólicas ventriculares. Há uma diminuição do relaxamento

ventricular que se traduz por descida do dP/dt negativo e prolongamento do

período do relaxamento isovolumétrico. Concomitantemente, alteram-se a

rigidez e a distensibilidade do ventrículo esquerdo (em sentidos opostos). Deste

conjunto de alterações resulta uma subida da pressão telediastóica do ventrículo

esquerdo, que inicia os mecanismos de compensação os quais, mais tarde,

levarão a insuficiência cardíaca congestiva. Para além dos quadros clássicos de

isquémia reversível (angor pectoris) e de isquémica irreversível, necrose

(enfarte do miocárdio), consideram-se duas ou três situações, recentemente

descritas: o miocárdio deprimido, disfunção ventricular prolongada, pós-

isquémica, sem necrose do miocárdio, demonstrada no modelo experimental e

cuja contrapartida clínica se encontra em situações do espasmo coronário

prolongado, espontaneamente reversível e nos quadros de angina instável:

1 Trabalho subsidiado. em parte, pelo Instituto Nacional do Investigação Cientifica. Centro de Cardiologia da Universidade do Lisboa. Linha de

Acção nº 2 2 Trabalho subsidiado. em parte, pelo Instituto Nacional do Investigação Cientifica. Centro de Cardiologia da Universidade do Lisboa. Linha de

Acção nº 2

Palavras chave: Função ventricular; contractilidade do miocárdio: função diastólica: isquémia

do miocárdio; miocárdio deprimido; coração em hibernação

Page 195: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FERREIRA R.

196

coração em hibernação, disfunção ventricular persistente grave, secundária a

isquémia crónica, ainda com miocárdio viável e susceptível de melhorar com

medidas de revascularização coronária. Discute-se a patologia destas novas

entidades, a sua individualização clínica e perspectivas terapêuticas.

INTRODUÇÃO

Carl Wiggers, célebre fisiologista norte-americano, foi o primeiro autor que, há pouco

mais do 50 anos, chamou a atenção para as consequências, sobre a contractilidade do miocárdio,

da laqueação dum vaso coronário principal, no animal de experiência. Escreveu ele que a zona

irrigada por um vaso coronário laqueado sofria cianose, dilatação e se alterava na sua

contractilidade [1]. Mais tarde foi possível estudar, em pormenor, graças à utilização de

microsferas radioactivas, o padrão do fluxo sanguíneo da parede livre do ventrículo esquerdo

após laqueação de vasos coronários [2]. Demonstramos então, que havia heterogeneidade do

fluxo a qual permitia definir, ao lado de uma área necrosada de forma irreversível, uma zona

circundante do miocárdio em sofrimento isquémico, a zona corpuscular do Edwards [3],

susceptível de ser recuperada com medidas terapêuticas adequadas [4]. Assim nasceu o conceito

do limitação da área do enfarte pela recuperação do miocárdio em risco, cujas implicações

terapêuticas e prognósticas se têm feito sentir nos anos mais recentes.

Na clínica, sabemos que episódios transitórios de isquémia do miocárdio provocam

alterações da contractilidade com assinergia ou mesmo discinesia [5], por vezes com tradução

clínica, sob a forma do falência ventricular esquerda, transitória, reversível. Uma perda

significativa do miocárdio contráctil na sequência de uma obstrução coronária prolongada,

enfarte do miocárdio, conduz a perturbação significava da função ventricular esquerda, desde

uma diminuição da função diastólica (redução da distensibilidade) até à alteração de índices mais

grosseiros, primeiro hemodinâmicos (elevação da pressão e volume telediastólicos e diminuição

da fracção de ejecção) e depois, clínicos, nos casos de enfarte mais extenso, com graus

progressivos de falência ventricular esquerda até ao shock cardiogénico [6].

ALTERAÇÃO DA FUNÇÃO SISTÓLICA

Uma vez que o coração não possui depósitos de oxigénio e é o órgão com maior consume

de oxigénio no desempenho da sua função, a oclusão coronária provoca uma diminuição intensa

e brusca da contractilidade do miocárdio [7], com anóxia subsequente, iniciando um ciclo, cujas

linhas gerais definidas por Katz no final da década do 60 [8], ainda são actuais (Quadro I).

Várias explicações têm sido avançadas para a patogenia da redução de contractilidade do

miocárdio isquémico. A perda de excitabilidade tem sido invocada, mas a existência de um

desfasamento temporal, que permite evidenciar que a excitabilidade é ainda normal quando a

contractilidade já se encontra fortemente deprimida, afasta-a com causa primária deste

fenómeno.

Page 196: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DO MIOCÁRDIO ISQUÉMICO

Actas Bioq. 1989: 1:195-205

197

TABELA - I

ISQUÉMIA AGUDA POR OCLUSÃO CORONÁRIA

HIPÓTESE DE A. KATZ

OCLUSÃO CORONÁRIA

ANOXIA DO MIOCÁRDIO

ACELERAÇÃO DA GLICÓLISE

PRODUÇÃO DE ÁC. LÁCTICO

ACIDOSE INTRACELULAR

AFASTAMENTO DO Ca LIGADO À

TROPONINA NA SÍSTOLE

IMPEDIMENTO DA ACTIVAÇÃO DA

ACTINA-MIOSINA QUE LEVA À TENSÃO E ENCURTAMENTO

DIMINUIÇÃO DA CONTRACTILIDADE

BOMBEAMENTO SISTÓLICO DO

VENTRÍCULO ISQUEMIADO

Note-se, no entanto, que o potencial de acção se altera na sua fase de plateau, e que

sugere modificação das correntes lentas moduladas pelo cálcio.

Uma outra possibilidade levantada para explicar a perda da contractilidade é a depleção

dos depósitos intracelulares de fosfatos de alta energia, em particular em áreas mais sensíveis

como e retículo sarcoplásmico ou o sarcolema onde essa descida de concentração se daria mais

precocemente [9]. Outros autores falam em alterações estruturais das proteínas plasmáticas,

hipótese que não parece ter suporte experimental concludente [10, 11].

Uma última possibilidade, a mais aceite na actualidade, realça o significado do pH

intracelular, o qual iria interferir com a inter-acção do Cálcio com as proteínas plasmáticas. Com

efeito, sabe-se que a contracção miocárdica é iniciada pela libertação do Ca++

do retículo

sarcoplásmico, que se vai combinar com receptores específicos da troponina, seguindo-se a inter-

acção actina-miosina que leva ao desenvolvimento de tensão e encurtamento [2]. O mecanismo

desencadeador desta libertação da Ca++

-- e aumento dos iões Ca na vizinhança do retículo

sarcoplásmico até um nível crítico -- seria alterado pela acidose, que iria diminuir a sensibilidade

do retículo sarcoplásmico [3]. Por outro lado os próprios [H+], iriam competir com Ca

++ ao nível

dos receptores da troponina, diminuindo igualmente a interacção actina-miosina [14]. A

Page 197: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FERREIRA R.

198

verosimilhança desta hipótese é apoiada por trabalhos que mostram que a inversão da acidose

pela infusão de alcalinos melhora a resposta contráctil [15], resta acrescentar que pequenas

descidas dos níveis de ATP, interferindo com o transporto iónico, podem acentuar o deficit de

Ca++

nos locais de contracção,

Em resumo, podemos acentuar que a acidose intracelular subsequente à isquémia, peça

fulcral no esquema de Katz [Quadro I , cria condições que levam à diminuição e perda da

contractilidade do miocárdio, com os aspectos experimentais enunciados por Wiggers e as

repercussões clínicas que hoje tão bem conhecemos.

ALTERAÇÕES DA FUNÇÃO DIASTÓLICA

A isquémia do miocárdio altera não só as propriedades contrácteis do miocárdio mas

igualmente a função diastólica, traduzindo-se na clínica, por um aumento da pressão e volume

telediastólicos do ventrículo esquerdo [16]. De entre as propriedades diastólicas do ventrículo

esquerdo [15], interessam-nos considerar, para esta exposição, e relaxamento ventricular e as

propriedades elásticas passivas: a rigidez, (stiffness] e a distensibilidade (compliance).

O relaxamento ventricular é essencial ao processo pelo qual o ventrículo esquerdo volta à

sua pressão e volume iniciais após a contracção. É um processo altamente dependente da

energia, ao contrário do que se julgava antes [17]. De acordo com Langer [18] 15% de energia

total libertada em cada batimento cardíaco é dispendido no processo do relaxamento. É, deste

modo, lógico que a isquémia do miocárdio interfira com o processo do relaxamento, efeito esse

evidenciado pela diminuição do dP/dt negativo e prolongamento do período de relaxamento

isovolúmico [19]. Esta diminuição do relaxamento do ventrículo esquerdo encurtando a diástole

e aumentando a resistência ao enchimento ventricular, é, em porte responsável pela subida da

pressão telediastólica do ventrículo esquerdo que se encontra nos doentes com isquémia

miocárdica evoluída (20].

Após completar-se o relaxamento, o comportamento da diástole ventricular é dominada

pelas propriedades elásticas que já enunciamos: rigidez e distensibilidade são conceitos

recíprocos que relacionam a variação do volume [ V] com a variação da pressão [ P] e

representam-se num sistema de coordenadas com a variação de volume diastólico em abcissas e

a variação da pressão diastólica em ordenadas. Determinações sucessivas ao longo da diástole

permitem obter uma curva que exprima a relação pressão-volume na diástole [Fig. 1]. O desvio

desta curva para cima e para a esquerda, significa aumento da rigidez da câmara ventricular e

encontra-se na fase crónica do enfarte do miocárdio [21]. Este “endurecimento” do miocárdio

enfartado impede o seu bombeamento sistólico e melhora a eficiência das porções indemnes do

miocárdio [22]. Além disso, quando há lugar à formação de aneurisma e aumento da rigidez do

segmento discinético, limitando a, expansão sistólica, tem efeito beneficio sobre a função global

do ventrículo esquerdo, conforme demonstraram Parmley e col. [23].

Nas formas crónicas da cardiopatia isquémica, as alterações das propriedades elásticas

ventriculares resultam da heterogeneidade da composição da parede ventricular [fibrose,

aneurisma] podendo levar a uma diminuição da distensibilidade responsável por quadros de

edema pulmonar de doentes coronários sem cardiomegália [24]. Trabalhos recentes recorrendo a

controlo duplo, hemodinâmico e ecocardiográfico, confirmam a diminuição da distensibilidade

do miocárdio nos segmentos isquémicos, mostrando existir diminuição acentuada da velocidade

do adelgaçamento da parede posterior no protodiástole [25].

Page 198: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DO MIOCÁRDIO ISQUÉMICO

Actas Bioq. 1989: 1:195-205

199

FIGURA 1

Representação, em diagrama, das relações pressão-volume na diástole do

ventrículo esquerdo. Na curva da direita representa-se um aumento da rigidez

[dP/dV] sem alteração da constante de rigidez. À esquerda, nota-se desvio da

curva por aumento da constante de rigidez [Kp].

Reproduzido da referência 21, com autorização do editor.

Brutsaert e col. consideram, em editorial recente [26], que existe um controlo triplo do

relaxamento dependente da carga, da inactivação o da heterogeneidade temporal e espacial

resultante da distribuição, não uniforme da carga e inactivação [Fig, 2]. Este aspecto da

heterogeneidade decorre da natureza própria da doença isquémica, que é regional e segmentar,

podendo agravar as anomalias, já existentes, da fase precoce do relaxamento, e acelerar o

desenvolvimento de insuficiência cardíaca [27].

FIGURA 2

Relaxamento Descoordenado

P= pressão; PTD= pressão telediastólica; RS= retículo sarcoplásmico. Reproduzido, com

autorização do editor

Page 199: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FERREIRA R.

200

Dentro do conceito de controlo triplo do relaxamento a habitual subdivisão do ciclo

cardíaco em sístole e diástole [Fig. 3] deve, segundo este autor, ser redefinida. Com efeito na

subdivisão fisiológica clássica de Wiggers do ciclo cardíaco, a sístole termina com a abertura da

válvula mitral, iniciando-se estão a diástole. Na clínica esta interpretação foi ligeiramente

modificada, passando a sístole a terminar na altura do 2º som cardíaco, com o encerramento da

válvula aórtica. O que Brutsaert propõe é que o período de relaxamento [integrando a segunda

metade da fase de ejecção, o período de relaxamento isovolúmico e a fase de enchimento

rápido], seja considerado como parte integral da sístole. As implicações clínicas, daqui

resultantes, em particular no campo da investigação, são evidentes: alguns índices usados para

medir a função sistólica, como, por exemplo, a fracção de ejecção, já estão a incluir a parte

inicial do relaxamento e, portanto, são incorrectas porque não separam contracção de

relaxamento, embora úteis como índices globais de função ventricular.

FIGURA 3

Subdivisão do ciclo cardíaco em sístole e diástole, P, V= curvas de pressão e

volume, em função do tempo; S= sístole; D= diástole; Cl= contracção

isovolúmica; RI= relaxamento isovolúmico; FER= fase de enchimento rápido;

CONTR= contracção.

Reproduzido, da referência 26, com autorização do editor.

Page 200: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DO MIOCÁRDIO ISQUÉMICO

Actas Bioq. 1989: 1:195-205

201

O MIOCÁRDIO DEPRIMIDO

Durante as últimas décadas, acreditou-se que a isquémia do miocárdio, conforme a sua

duração e gravidade pode originar dois quadros distintos [28]: lesão irreversível, com necrose,

quando a oclusão é total e prolongada; lesão reversível, com restitutio ad integrum, com

períodos mais curtos da isquémia, seguidos do reperfusão. Sabe-se hoje, no entanto, que após

breves períodos de isquémia as propriedades estruturais, metabólicas e funcionais do miocárdio

lesionado de maneira reversível permanecem gravemente alteradas durante períodos longos,

horas ou dias, antes de recuperarem. O miocárdio fica fatigado, atordoado, deprimido.

Trabalhos experimentais de isquémia miocárdica de duração variável, seguida de

restabelecimento do fluxo, permitiram equacionar os principais problemas levantados pela

reperfusão [29]: a necrose irreversível [função da duração da oclusão coronária], a hemorragia e

as arritmias pós-reperfusão, o atraso no restabelecimento da função contráctil. Assim, foi

possível verificar que a reperfusão não é seguida, na fase inicial, duma melhoria da função

ventricular e da contractilidade do miocárdio e que a recuperação pode demorar largos dias [30]

ou semanas, após uma fase inicial da instabilidade, por vezes de agravamento [31, 32]. Sabe-se

hoje, após porfiados estudos histoquímicos que a depressão da função miocárdica está

relacionada com o esgotamento dos depósitos do ATP, e que ela permanece deprimida até que os

depósitos de ATP, directamente relacionados com o processo contráctil, tenham regressado a

níveis normais [33].

O conceito de que a isquémia transitória deprime o miocárdio por períodos prolongados

pode ter implicações clínicas importantes, em especial nos doentes submetidos a reperfusão

farmacológica ou cirúrgica e ainda naqueles em que se tenta a limitação da área em risco por

processos farmacológicos. Uma avaliação muito precoce da função ventricular após estas

atitudes terapêuticas pode não mostrar qualquer melhoria da função ventricular esquerda, mesmo

quando a terapêutica teve sucesso imediato [reperfusão controlada por coronariografia]. Um

controle tardio, virá, em muitos casos mostrar o benefício da reperfusão sobre a contractilidade

ventricular. A concordância com os estudos experimentais da década do 70 é flagrante e deve ser

realçada.

A isquémia grave do miocárdio ocorre no decurso de muitas intervenções de cirurgia

cardíaca, levando a quadros do baixo débito que implicam e recurso a suporte circulatório por

meio de balão intra-aórtico. O conceito de depressão pós-isquémia, poderá levar ao

prolongamento do suporte circulatório durante um período mais dilatado do tempo e chama a

atenção para a necessidade de desenvolver técnicas que permitam distinguir o miocárdio

deprimido do miocárdio irreversivelmente lesado [28], a fim de identificar os doentes que

beneficiem do um apoio circulatório prolongado.

O conceito de miocárdio deprimido deve, por fim, levar a um novo exame das

consequências de episódios comuns de isquémia do miocárdio, com ou sem tradução clínica, em

que, de acordo com as hipóteses que vimos expondo, se pode observar uma depressão pós

isquémica, muito para além do episódio fugaz consagrado pela clínica. Tal sucede, sem dúvida,

nos quadros mais graves de angina de Prinzmetal, por espasmo coronário, com isquémia

transmural e nas crises da angina instável, conforme demonstraram Nixon e col. [34], recorrendo

à ecocardiografia. Ellis e col. [35], mostraram que a função do miocárdio deprimido pode ser

melhorada pela infusão de fármacos inotrópicos.

Page 201: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FERREIRA R.

202

MIOCÁRDIO EM HIBERNAÇÃO

A depressão do miocárdio, que se segue a um episódio de isquémia grave, transitória,

deve ser separada da situação de disfunção ventricular esquerda persistente, principal

manifestação de isquémia miocárdica crónica, que Rahimtoola cunhou com a designação de

miocárdio em hibernação [36]. O miocárdio deprimido resulta de um episódio de isquémia

transitória, com duração de minutos ou horas, e a disfunção contráctil prolonga-se por horas ou

dias após cessar a isquémia. Pelo contrário, o miocárdio em hibernação resulta de meses ou anos

de isquémia e a disfunção ventricular persiste até o fluxo sanguíneo ser restaurado.

Sabe-se hoje, após 20 anos da cirurgia coronária, que a disfunção ventricular esquerda

crónica não é contra-indicação para cirurgia de revascularização e que a função do miocárdio em

hibernação pode melhorar após revascularização bem sucedida. Constitui, deste modo, um

desafio para os clínicos, identificar entre os doentes com cardiopatia isquémica crónica e

disfunção ventricular esquerda os que apresentam um quadro de miocárdio em hibernação

susceptível de ser corrigido por revascularização coronária.

A situação de miocárdio em hibernação deve ser suspeitada em doentes com cardiopatia

isquémica em que exista desproporção entre o grau de disfunção ventricular esquerda e a

gravidade da doença isquémica [enfartes prévios ou angor]. Nestes casos deve preceder-se a

estimulação inotrópica e estudo da função ventricular esquerda global e regional por meio de

angiografia de radionuclidos de equilibrio [37]. Nesto demonstrou que, nestas circunstancias, os

doentes cuja fracção de ejecção melhorava 10% ou mais após estimulação com epinefrina ou

norepinefrina, tinham melhor sobrevivência após revascularização do que aqueles que não

tinham resposta significativa à estimulação inotrópica, Estes casos deveriam corresponder a

situações de isquémia irreversível.

Os exames estáticos e dinâmicos [após esforço] com isótopos radioactivos, quer os

estudos de perfusão com Tálio-201 [38], quer os estudos da função ventricular esquerda com

tecnésio-99m [39], constituem método de eleição para evidenciar zonas de miocárdio viável. A

demonstração de um defeito de perfusão reversível, induzido pelo esforço, ou de uma área

circunscrita de alteração da motilidade segmentar sugere que a disfunção miocárdica deve estar

dependente da diminuição da perfusão e não da necrose.

Mais recentemente a topografia de emissão de positrões [40] permite, pela utilização

simultânea de um marcador do metabolismo do miocárdio [FDG] e um marcador de perfusão

miocárdica [N-13 amonia], a separação entre miocárdio necrosado e miocárdio isquémico,

viável.

Em conclusão, poder-se-á dizer como Braunwald [33] que os efeitos da isquémia no

miocárdico são mais complexos do que se julgava há uma década atrás. Para além dos dois

síndromes principais: isquémia transitória com angor e isquémia prolongada com enfarte do

miocárdio, reconhecem-se, presentemente dois outros síndromes [Quadro II]: disfunção

miocárdica prolongada pós-isquémia aguda [miocárdio deprimido] e disfunção cardíaca

secundária a isquémia crónica, com miocárdio viável [coração em hibernação]. O

reconhecimento destes dois síndromes pode no futuro melhorar a qualidade de vida e a

sobrevivência do um grupo significativo de doentes com cardiopatia isquémica.

Page 202: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DO MIOCÁRDIO ISQUÉMICO

Actas Bioq. 1989: 1:195-205

203

QUADRO II

SÍNDROMES ISQUÉMICOS DO MIOCARDIO

ISQUÉMIA TRANSITÓRIA ANGOR PECTORIS

ISQUÉMIA PROLONGADA ENFARTE DO MIOCÁRDIO

DISFUNÇÃO PROLONGADA

PÓS- ISQUÉMIA AGUDA MIOCÁRDIO “ATORDOADO”

DISFUNÇÃO PERSISTENTE

PÓS-ISQUÉMIA CRÓNICA MIOCÁRDIO EM “HIBERNAÇÃO"

BIBLIOGRAFIA

1 TENNANT R, ANC WIGGERE CJ. The effect of coronary occlusion en myocardial

contracttion, Amen, J, Physiol, CXII:351, 1935

2 BECKER LC, FERREIRA R AND THOMAS M. Mapping of left ventricular blood flow

with radioactive microspheres in experimental coronary artery occlusion, Cardiovasc, Res,

9:128, 1975

3 EDWARDS JE, What is myocardial infarction? Circulation 39:supl, IV-5, 1969

4 FERREIRA. Enfarte do miocárdio experimental. Estudo do circulação regional do

miocárdio com microsferas marcadas com isótopos radioactivos, Efeito da digoxina e da

neropinefrina. Tese de Doutoramente, Lisboa 1979

5 GORLIN R, KLEIN MO AND SULLIVAN JM. Prospective correlative study of

ventricular aneurysm, Am. J. Med. 42:515, 1967

6 RUSSEL RO Jr AND RACKLEY CE. In Hemodynamic monitoring in Coronary Intensive

Care Unit, Mount Kisco, NY - Futura Publishinh Company, 1974, pp 173-277

7 AMSTERDAM EA. Function of the hypoxic myocardium. Experimental and clinical

aspects, Am. J. Candid. 32:451-171, 1973

8 KARDESCH M, HOGANCAMP LE AND BING RJ, The effect of complete ischemia on

the intracellular electrical activity of the whole mammalion heart, Circ. Res. 6:715, 1958

9 BRAUNWALD E AND SOBEL BE. In Heart Disease, Braunwald E editor] W.B.

Saunders Philadelphia, 1980 pp 1279-1308

10 KAKO K AND BING RJ. Contractility of actomyosin bands prepared from normal and

failing human hearts, J. Clin. Invest. 37:465, 1958

11 KATZ AM AND MAXWELL JB. Actin from heart muscle: sulphydryl groups, Circ. Res.

14:345, 1964

12 KATZ AM AND HECHT HH. The early pump failure of the ischemic heart, Am. J. Med.

47:497, 1969

13 KATZ AM. Effects of ischemia on the contractile process of heart muscle. Am. J. Cardiol.

32:456-460, 1973

14 BRAUNWALD E. ROSS J Jr. AND SONNENBLICK EH. Mechanisms of contraction of

the normal and failing heart. 2nd. ed. Lithe Browns - Boston. 1976

Page 203: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FERREIRA R.

204

15 REGAN TJ. EFFROS RM. HAIDER B. OLDEWURTEL HA. ETTINGER PO AND

AHMED SS. Myocardial ischemia and cell acidosis: modification by alkali and the effects

on ventricular function and cation composition. Am. J. Cordial. 37:501,1976

16 McCANS JL AND PARKER JO. Left ventricular pressure-volume relationship during

myocardial ischemia in man. Circulation 48:775-785. 1973

17 GROSSMAN W AND McLAURIN LP. Diastolic propesties of the left ventricle. Ann Int.

Med. 84:316-326, 1975

18 LANGER GA. Ion fluxes in cardiac excitation and contraction and their relation to

myocardial contractility. Physiol. Rev. 48:708-757. 1968

19 MATHEY D. BLEIFELD W AND FRANKEN G. Left ventricular relaxation and diastolic

stiffness in experimental myocardial infarction. Cardiovasc. Res. 8:583-592. 1974

20 McLAURIN LP. ROLETT EL AND GROSSMAN W. Impaired left ventricular relaxation

during pacing induced ischemia. Am. J. Cardiol. 32:751-757, 1973

21 GAASCH WH. LEVINE HJ. QUINONES MA AND ALEXANDER JK. Left ventricular

compliance: mechanisms and clinical implications. A. J. Cardiol. 38:647, 1976

22 DIAMOND G AND FORRESTER JS. Effect of coronary artery disease and acute

myocardial infarction on left ventricular compliance in man. Circulation 45:11-19. 1972

23 PARMLEY WW; CHUCK L AND KIVOWITZ C. In vitro lenght-tension relations of

human ventricular aneurysms. Am. J. Cardiol. 32:889-894. 1973

24 DODEK A. KASSEBAUM DG AND BRISTON JD. Pulmonary edema in coronary artery

disease without cardiomegaly. Paradox of the stiff heart. N. Eng. J. Med. 286:1347-1350.

1972

25 BOURDILLON PD. LORELL BH. MIRSKY I. PAULUS WJ. WYNNE J AND

GROSSMAN M. Increased regional myocardial stiffness of the left ventricle during pacing

induced angina in man. Circulation 67:316, 1983

26 BRUTSAERT DL. RADEMAKERS FE AND SYS SU. Trpiple control of relaxation:

implications in cardiac disease. Circulation 69:190,1984

27 KUMADA T. KARLINER JS. POULEUR H. GALLAGHER KP. SHIRATO K AND

ROSS J Jr. Effects of coronary occlusion on early ventricular diastolic events in conscious

dogs. Am. J. Physiol. 242: H 855. 1982

28 BRAUNWALD E. KLONER RA. The stunned myocardium: prolonged. pos-ischemic

ventricular disfunction. Circulation 66:1146-1149, 1982

29 FERREIRA R. Enfarte do miocárdio experimental. Estudo da circulação regional do

miocárdio com microsferas marcadas com isótopos radioactivos. Efeito da digoxina e da

norepinefrina. Tese de Doutoramento. Lisboa. 1979 pp 44-48

30 ROSS J. Jr. THEROUX P AND SASAYAMA S. Late recovery of cardiac function after

coronary artery reperfusion. Circulation 52: supl 11-21, 1975

31 COSTANTINI C. CORDAYE AND LANG T-W. Revascularization after 3 hours of

coronary artery occlusion: effects on regional cardiac metabolic function and infarct. Am.

J. Cardiol. 36:368, 1975

32 THEROUX P. ROSS J. Jr AND FRANKLIN D. Coronary artery reperfusion. III - early

and late effects on regional myocardial function and dimensions in concious dogs. Am. J.

Cardiol. 38:599, 1976

33 REIMER KA. HILL ML AND JENNIN9S RB. Prolan9ed deplectian of ATE and the

adenine nucleatide pool due to delayed resynthorsis of adenine nucleotides followin9

reversible myocardial ischemio injury in do9s. J Melee. Cell Cordial. 13:229. 1981

Page 204: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

FISIOPATOLOGIA DO MIOCÁRDIO ISQUÉMICO

Actas Bioq. 1989: 1:195-205

205

34 NIXON JV. BROWN CN AND SMITHERMAN TC. Identification of transient and

persistent segmental wall motion abnormalities in patients with unstable angina by two-

dimensional echocardiography. Circulation 65:1497, 1982

35 ELLIS SG. WYNNE J. BRAUNWALD E. HENSCHKE CI. SANDOR T AND KLONER

RA. Response of reperfusion salvaged, stunned myocardium to inotropic stimulation. Am

Heart J. 107:13-19, 1984

36 RAHIMTOOLA SA. A perspective on the three large multicenter randomized clinical trials

of coronary bypass surgery for chronic stable angina. Circulation 72:supl. V-123-135, 1985

37 NESTO RW. COHN LH. COLLINS JJ Jr. WYNNE J. HOLMAN L AND COHN PF.

Inotropic contractile reserve: a useful predictor of five years survival and improved

postoperative left ventricular function in patients with coronary artery disease and reduced

ejectian fraction. Am J Cardiol 50:39-44. 1982

38 BODENHEIMER MM. BANKA VS. FOOSHEE C. HERMANN GA AND HELFANT

RH. Relationship between regional myocardial perfusion and the presence. severity and

reversibility of asynergy in patients with coronary heart disease. Circulation 58:789-795,

1978

39 HIGGIBOTHAM MB. COLEMAN RE. JONES RH AND COBB FR. Mechanism and

significance of a decrease in ejection fraction during exercise in patients with coronary

artery disease and left ventricular dysfunction at rest. J. Am. Coll. Cardiol. 3:88-97, 1984

40 TILLISCH J. BRUNKEN R AND MARSHALL R. Reversibility of cardiac wall motion

abnormalities predicted by positron tomography. N. Engl. J. Med 314:884,888, 1986

Page 205: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:207-219 207

METABOLISMO ENERGÉTICO DA CÉLULA MUSCULAR CARDÍACA

Lúcio Botas

Instituto de Bioquímica, Fac. Medicina de Lisboa

RESUMO

O coração saudável depende apenas da produção aeróbica do ATP (na

mitocôndria) para o fornecimento de energia ao aparelho contráctil através da

oxidação de diferentes substratos no ciclo do Krebs (desidrogenação de

intermediários do ciclo do ácido cítrico, requerendo, NAD+). Aqui, além da

descarga de CO2 e consequente transporte do H+ e seus electrões através da

cadeia respiratória (resultando consumo do O2 e produção de H2O), ocorre

fosforilação oxidativa na qual o fosfato inorgânico se combina com ADP para

formar ATP. No miocárdio, fora do período pós-prandial o substrato

predominante para a síntese de ATP é representado pelos ácidos gordos livres

(AGL). A glicose sanguínea é utilizada preferencialmente no período pós-

prandial. Durante o esforço físico, a produção acelerada do lactato a nível dos

músculos periféricos, tornam este substrato o metabolito preferencialmente

utilizado pelo coração no indivíduo normal, não treinado. A captação

miocárdica da maior parte dos substratos energéticos está directamente

relacionada com a respectiva concentração arterial e com o fluxo coronário. A

oxidação dos AGL catalisada pela carnitina (que no músculo cardíaco atinge

valores particularmente elevados) origina grandes quantidades do citrato e

ATP que vão deprimir a utilização da glicose por inibirem a fosfofrutocinase

(enzima chave da glicólise). Por outro lado, o excesso do acetil-CoA

eNADH2 resultantes da oxidação dos AGL, vão “desviar” CoA e inibir a

desidrogenase pirúvica impedindo a “entrada” do ácido pirúvico no ciclo de

Krebs, contribuindo também para limitar a glicólise. O miocárdio mantém

valores de glicogénio mínimos e praticamente constantes (0,4-0,6% do peso

do tecido fresco) pelo que em condições normais este substrato desempenha

papel irrisório na produção de energia (excepto em situações de esforço

extremo nos quais a fosforilase é activada devido a grande aumento de

AMPc). Várias hormonas intervêm no metabolismo energético do miocárdio.

Palavras-chave: Miocárdio, ciclo do Krebs, carnitina, ácidos gordos livres

Page 206: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS L.

208

A insulina aumenta a captação de glicose. No esforço, a sua secreção diminui

sem descer a níveis que bloqueiem o normal aumento de captação de glicose

nesta fase. A descida de secreção de insulina origina aumento dos AGL

disponíveis, por aumento da lipólise a partir do tecido adiposo e ainda

aumento da glicogénese no fígado, estas acções são reforçadas pela acção

conjugada da glicagina e da hormona do crescimento. As catecolaminas

estimulam a glicólise (provável efeito sobre a fosfofrutocinase) e a

glicogenólise (estimulando a activação da fosforilase), aumentando também a

lipólise. Todas estas acções das catecolaminas são potenciadas no esforço.

O miocárdio é um tecido com necessidades energéticas muito grandes, consentâneas com

o tipo de actividade que realiza. O adenosinotrifosfato (ATP) constitui a fonte de energia

imediata que a célula cardíaca, tal como a grande maioria das células do organismo, utiliza,

através da sua hidrólise, para a realização do trabalho que tem que executar (no coração,

predominantemente a função de bomba impulsionadora da corrente sanguínea) (1-7). Deste

modo, o ATP é essencial para assegurar o funcionamento das proteínas contrácteis, bem como

para outro tipo de actividade, fundamental no miocárdio, e que se prende com a manutenção da

homeostasia iónica do interior da célula. No miocárdio existem vários mecanismos envolvendo

enzimas consumidoras de ATP (ATP-ases) cuja tarefa consiste em assegurar a manutenção de

gradientes electroquímicos adequados às trocas de sódio, potássio e hidrogeniões, através do

sarcolema (2, 5, 8). Por outro lado contribuem também para o transporte de cálcio, quer dentro

da própria célula (movimentando-se dos seus depósitos até ao local de acção) quer no sentido do

exterior, de forma a manter no interior apenas a quantidade de cálcio indispensável a actividade

das proteínas contrácteis (8, 9).

A extrema dependência do miocárdio em relação aos teores de ATP e, principalmente, a

“biodisponibilidade" deste metabolito, condiciona a tipo de metabolismo energético que este

tecido apresenta, a qual assenta numa avidez absoluta para o oxigénio (1 -8). O miocárdio é o

maior consumidor de oxigénio por grama de tecido, donde resulta uma extracção máxima a partir

do sangue arterial que pode rondar os 75%, mesmo em situações basais (saturação do sangue do

seio coronário é cerca de 25%) (10).

A extracção de oxigénio pelo miocárdio não pode ser significativamente alterada, mesmo

em situações de maior necessidade energética pelo que o coração tem de se socorrer de outros

mecanismos que levem ao aumento do fornecimento de oxigénio (10). A dilatação da árvore

coronária, com aumentos proporcionais do fluxo sanguíneo regional, é o mecanismo mais eficaz

que o coração utiliza para aumentar o rendimento energético, uma vez que não só obtém maior

fornecimento de oxigénio mas também de substratos utilizáveis para a produção de ATP (10).

O aumento do fluxo coronário, por utilização da reserva coronária, é condicionado pela

acção de intermediários químicos entre as quais se salienta a adenosina, a qual produzida no

interior da célula, junto do aparelho contráctil, atravessa o sarcolema e contacta a rede vascular,

diminuindo deste modo a “pool” de nucleótidos disponíveis no interior da célula (10-12). Este

facto, em condições fisiológicas é largamente compensado pelo aumento significativo do

rendimento energético conseguida pelo maior aporte de oxigénio e substractos metabolizáveis.

O miocárdio está bem adaptado ao metabolismo aeróbio, possuindo estruturas adequadas

à fixação e utilização do oxigénio, com elevado rendimento. A mioglobina é uma das estruturas

mais eficiente para este tipo de objectivo. Existindo em grande abundância no citoplasma da

célula miocárdica (1,4mg/g de miocárdio) esta hemoproteína tem uma capacidade de fixação do

Page 207: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA DO MIOCÁRDIO

Actas Bioq. 1989; 1:205-219

209

oxigénio superior à da hemoglobina, apresentando uma curva de dissociação do oxigénio,

fortemente desviada para a esquerda em relação a hemoglobina, traduzindo a sua maior “avidez”

para o oxigénio, evidente principalmente para pressões parciais baixas deste elemento (3, 13).

Por outro lado, existem, dispersas pelo citoplasma, numerosas mitocôndrias, ocupando no seu

conjunto cerca de 35% do volume total de células, sendo curiosa a relação íntima existente entre

estas e o aparelho contráctil, principal “cliente” do ATP produzido naqueles arganelos (3, 14).

A produção aeróbia do ATP, ocorre na mitocôndria através da oxidação de vários

substratos sequenciados e interdependentes, no ciclo de Krebs, que se inicia pela condensação da

acetil-CoA com a oxaloacetato, originando citrato (3, 14, 15). Este intermediário metabólico e os

seus derivados imediatos são submetidos a acção sucessiva de várias enzimas,

predominantemente desidrogenasses, libertando dois “resíduos” de carbono e correspondestes

átomos de hidrogénio, estes provenientes principalmente da oxidação das coenzimas nicotínicas

e flavínicas (NADH e FADH2) (14, 16). O transporte dos átomos de hidrogénio e respectivos

electrões, através das cadeias de oxidação-redução, constituídas por flavoproteínas e citocromos,

realiza-se com consumo de oxigénio e formação final de água (14-16). A execução destas

reacções sucessivas de oxidação dos átomos de hidrogénio liberta a energia neles contida (ou no

seu electrão) permitindo que se criem condições locais para que a adenosinodifosfato (ADP) se

ligue ao fosfato inorgânico, regenerando o ATP consumido (14-16).

Este processo, resumidamente descrito, é conhecido, por fosforilação oxidativa,

constituindo-se na “pedra de toque” de toda a via aeróbia do metabolismo energético. Também a

adenosinomonofosfato (AMP) e o ácido adenílico se podem comportar como "aceitadores de

potencial energético” que lhes permite fixar iões de fosfato originando ATP ou outros

nucleótidos que lhe fiquem próximos na hierarquia energética (3).

O coração, tal coma outros órgãos com necessidades energéticas elevadas (cérebro e músculo

estriado) contém, no citoplasma das suas células, uma substância de elevada “potencial

energético”, a fosfocreatina, a qual, contrariamente ao ATP, não se constitui como fonte de

energia para as actividades celulares (15-16). No entanto, graças à actividade de uma enzima

específica (a creatinafosfocinase) ajuda a manter estável a concentração de ATP quando este está

a ser utilizado em larga escala (actividade contráctil intensa), catalisando a transferência de um

grupo fosfato para o ADP (15, 16).

No coração, a fosfocreatina parece funcionar também como um sistema de vaivém, para

transferir a energia do ATP formado na mitocôndria, a qual tem dificuldade em atravessar a

membrana mitocondrial para o citoplasma, onde é utilizado no aparelho contráctil (miofibrilhas).

Deste modo, o ATP consumido na actividade contráctil (no citoplasma) é rapidamente reposto

pela fosfocreatina. A creatina que resta, difunde até a superfície externa da membrana

mitocondrial. Aí existe uma variedade própria da creatinofosfocinase que, ligada a uma

translocase específica (para nucleótidos adenílicos), transfere um grupo fosfato do ATP

intramitocondrial, para se ligar à creatina, regenerando a fosfocreatina consumida (17).

A reposição dos teores de fosfocreatina do citoplasma é um mecanismo fundamental uma

vez que torna disponível este metabolito para assegurar os elevados níveis citoplásmicos de ATP

necessário para o funcionamento do aparelho contráctil. O ADP resultante da transferência do

grupo fosfato através da membrana mitocondrial para a refosforilação da creatina é por sua vez

rapidamente refosforilado na cadeia respiratória (15-17).

O miocárdio é um tecido com poucas exigências sob o ponto de vista metabólico,

podendo virtualmente, recorrer a substratos das mais diversas origens, para a produção de

energia (1-7). No entanto, são preferencialmente utilizadas os ácidos gordos livres (AGL), a

Page 208: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS L.

210

glicose e o lactato, consoante a intensidade da actividade muscular e a relação com o período de

ingestão de alimentos (1-7).

A glicose é utilizada, como substrato principal, no período pós-prandial, quando os seus

níveis séricos são elevados. Após este período os AGL constituem o substrato energético por

excelência, posição que ocupam durante a maior parte das 24 horas (1-7).

Em períodos de grande actividade física, à medida que o ácido láctico começa a ser

produzido nos músculos em actividade, o coração começa a utilizá-lo como substrato energético

preferencial (1-7).

A razão de ser destas preferências de ocasião prende-se com a capacidade de extracção

destas substâncias, a partir do sangue arterial, pelo miocárdio, o qual se relaciona com os níveis

séricos e com o limiar de extracção para cada um deles (1-7).

A capacidade de o miocárdio utilizar preferencialmente as AGL durante a maior parte das

24 horas, relaciona-se com uma “nuance” da via glicolítica, própria deste tecido. No miocárdio, a

metabolização da glicose até piruvato não “fornece’ directamente o ciclo de Krebs, uma vez que

o piruvato, por ausência da carboxilase neste tecido, não passa directamente a oxaloacetato (16).

Assim, para posterior oxidação no ciclo de Krebs, o piruvato proveniente da glicólise, tem de se

conjugar com a coenzima A (CoA), para originar acetil-CoA. Como a quantidade de moléculas

de CoA não é ilimitada e estas são essencialmente utilizadas na degradação dos AGL, através da

-oxidação, a quantidade de CoA disponível para facilitar a “entrada” do piruvato no ciclo

tricarboxílico, fica diminuída e a glicólise diminui de intensidade (1, 16, 18, 19).

Existem também outros factores limitativos da glicólise no músculo cardíaco. A

actividade "exuberante" da -oxidação dos AGL, que permite a entrada destes nas mitocôndrias

e a incorporação de grandes quantidades de acetil-CoA no ciclo de Krebs, leva à produção de

elevada número de moléculas de citrato que vão inibir uma enzima fundamental da via glicolítica

- a fosfofrutocinase, a qual catalisa a passagem da frutose-6-fosfato a frutose 1,6-difosfato (3, 16,

18, 19). Por outro lado, o elevado número de moléculas de ATP produzidas através da

metabolização aeróbia dos AGL, tem também uma função inibidora semelhante à do citrato,

inibindo a fosfofrutocinase e a fosforilase do glicogénio, enzima reguladora da glicogenólise. A

inibição desta última enzima, perturba indirectamente a glicólise uma vez que promove a

diminuição da glicose-1-fosfato (G-1-P) proveniente da desagregação da grande molécula de

glicogénio, diminuindo, por consequência, a quantidade de glicose-6-fosfato (G-6-P) (obtida por

interconversão do G-1-2) disponível para a glicólise. Por outro lado, o excesso de produção do

acetil-CoA, proveniente da -oxidação dos AGL e o correspondente excesso de produção de

NADH, levam também a inibição da desidrogenase pirúvica, complexa enzimática responsável

pela passagem de piruvato a acetil-CoA (7, 18, 19). A inibição conjugada destas diferentes

enzimas e grupos enzimáticas cootribui, decisivamente, para a interrupção do fluxo de moléculas

de glicose, interrompendo a sua utilização como substrato energético (7, 18, 19).

A estimulação ou inibição das diferentes vias metabólicas, relaciona-se, quase sempre,

com o mesmo tipo de acção sobre as enzimas dominantes dessas mesmas vias.

Em resumo, podemos dizer que no miocárdio a via glicolítica é estimulada pelo fosfato

inorgânico, 5'-AMP, ADP e frutose-1,6-difosfato, substâncias que estão acumuladas no

miocárdio em hipoxia, enquanto os metabolitos presentes quando o coração está bem oxigenado

(citrato e ATP), inibem a actividade das enzimas atrás citadas, bloqueando a via glicolítica (7).

Em situações de aumenta do consumo de oxigénio e ATP, como sejam as que resultam

dos aumentos da pressão intraventricular, da frequência cardíaca e das catecolaminas circulantes,

se os níveis plasmáticos dos AGL estiverem diminuídos, aumenta a captação da glicose, bem

Page 209: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA DO MIOCÁRDIO

Actas Bioq. 1989; 1:205-219

211

como a sua oxidação. A insulina tem uma acção semelhante estimulando também a captação da

glicose pelo miocárdio. (7).

Na captação e metabolização da glicose estão envolvidas diferentes etapas, cada uma

delas com os seus componentes inibidores e estimuladores específicas. A 1ª etapa consiste no

transporte, através da membrana celular, que envolve um sistema transportador contra gradiente

de concentração.

Na ligação aos receptores da membrana celular existe competição entre as diferentes

tipos de açúcares, com ligações de cada uma das substâncias a uma enzima especifica (7, 20).

Quando diminui a insulina, a concentração intracelular da glicose diminui também e o transporte

através da membrana celular (sarcolema) é o factor limitativo major para a utilização da glicose.

Por outro lado, se a insulina aumentar é o passo seguinte (fosforilação) que vai determinar a taxa

de utilização da glicose (7, 20). O transporte da glicose no coração, em condições fisiológicas, é

inibido pela oxidação dos AGL. Nos diabéticos a diminuição da sensibilidade insulina no

miocárdio, resulta de um aumento plasmático e tecidual dos AGL (7, 20).

O aumento do trabalho cardíaco acelera o transporte da glicose tanto na presença como

na ausência da insulina, mas não na presença de grandes quantidades de AGL (7, 16, 21).

A fosforilação da glicose (2ª etapa na via metabólica desta substância) é regulada pela

hexocinase, enzima que consome ATP, transformando a glicose em G-6-P, a qual irá exercer

depois inibição sobre a hexocinase (20).

Prosseguindo na via metabólica da glicose encontramos um dos factores reguladores mais

importantes, a fosfofrutocinase, que catalisa a passagem da frutase-6-fosfato a frutose-1,6-

difosfato (7, 22, 23). Esta enzima, que sofre a inibição do ATP e do citrato, controla não só a

glicólise mas também, indirectamente, o metabolismo do glicogénio, sendo também inibida pelo

pH ácido (7). Se a actividade da fosfofrutocinase for estimulada, a regulação da via glicolítica

passa para a desidrogenase do gliceraldeido-3-fosfato tal como acontece na hipoxia e na

isquémia, bem como em situações de aerobiose, mas com grandes aumentos da actividade

cardíaca (7, 21-23). A actividade da desidrogenase do gliceraldeído-3-fosfato é inibida pelo

aumento do NADH, da concentração hidrogeniónica e do lactato, sendo o 1º factor o mais

importante (7, 21-23).

O produto final da via glicolítica é a piruvato que no coração pode ter três destinos. O

principal consiste na passagem a acetil-CoA, etapa que ocorre nas mitocôndrias, por acção de um

grupo enzimático habitualmente designado desidrogenase pirúvica (na realidade um conjunto de

três enzimas, desidrogenase pirúvica, dehidrolipoiltransacetilase e dehidrolipoildesidrogenase)

que, por descarboxilação oxidativa, catalisa a formação de acetil-CoA que pode entrar

directamente no ciclo de Krebs. Esta via pode diminuir a sua intensidade por acção da -

oxidação dos AGL, que ao aumentar a concentração de acetil-CoA e NADH, inibe o complexo

de desidrogenase pirúvica por activar a respectiva cinase (fosforilação) (7, 20, 22).

Nestas circunstancias dois outros caminhos se apresentam ao piruvato - a passagem a

lactato (por acção da desidrogenase láctica) ou a passagem a alanina (por acção da alanina amino

transferase). Estas vias alternativas dependem dos níveis de NAD, NADH, -cetoglutarato e

glutamato no citoplasma. Na hipóxia a piruvato e a NADH aumentam levando a aumento de

concentração do lactato e da alanina no seio coronário (7, 20, 22).

Uma das vias que a glicose pode seguir no miocárdio é a da constituição de moléculas de

glicogénio. O coração mantém um conteúdo desta substância mais ou menos constante,

correspondendo a cerca de 0.4 a 0,6% do peso do tecido fresco, existindo a maior parte sob a

forma de grânulos no sarcoplasma (3).

Page 210: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS L.

212

O glicogénio constitui-se como uma fonte potencial de material energético capaz de

assegurar, só par si, o funcionamento do coração durante cerca de 4 minutos, facto que só ocorre

em condições externas (isquémia) (1, 3).

O único precursor do glicogénio no miocárdio é a glicose, devido à ausência de frutose-

1,6-difosfatase neste tecido (22, 24).

UIP UDP

glicose glicose-6-fasfato glicose-1-fosfato glicogénio

Na síntese do glicogénio influem a sintetase do glicogénio (uridino difosfato glicose

glicogénio transferase) que necessita uridino trifosfato (LJIR) como fornecedor de energia

(contrariamente ao habitual ATP), além de uma enzima ramificante da molécula (amilo-1,4-1.6-

transglicosidade) (3, 7, 20).

Na glicogenólise intervém a fosforilase e uma enzima desramificante (amilo-1,6-

glicosidade) que remove por hidrólise unidades de glicose (7, 20).

fosforilase

glicogénio + fosfato inorgânico glicose-1-fosfato glicose-6-fosfato

Ambas as enzimas principais do metabolismo do glicogénio, sintetase e fosforilase, se

encontram em formas activas e não activas, dependendo a sua actividade e interconversão de

controlo hormonal (adrenalina, noradrenalina, insulina, glicagina, hormonas tiroideias) e não

hormonal (glicose-6-fosfato, ATP, AMPc, 5'AMP, glicogénio) (1, 7, 20).

A síntese do glicogénio aumenta quando se eleva a concentração de glicose na circulação,

como acontece no período pós-prandial imediato. Nesta fase a estimulação exercida pela insulina

e a glicose-6-fosfato são determinantes para o crescimento da molécula de glicogénio,

principalmente à custa das ramificações mais exteriores. No jejum, a síntese do glicogénio

diminui drasticamente e nem a insulina pode exercer a sua função estimulante. Convém contudo

referir que no estado pós-prandial imediato, o conteúdo do glicogénio do miocárdio diminui em

relação ao jejum porque apesar da síntese estar estimulada, a degradação também está aumentada

(o “turnover” do glicogénio está acelerado em relação ao jejum), uma vez que nesta fase a

glicose é o principal substrato energético do miocárdio. No jejum, apesar de não haver síntese, a

glicogenólise também não é significativa. O mesmo se passa na diabetes na qual o aumento do

conteúdo de glicogénio do miocárdio fica a dever-se à inibição da glicólise e à economia do

consumo de glicogénio provocadas pelo aumento da concentração de AGL e pela metabolização

preferencial dos corpos cetónicos pelo miocárdio. Este aumento na concentração do glicogénio

parece depender, também em parte, da acção da hormona do crescimento que estimula a

mobilização dos AGL a partir dos seus depósitos. A glicogenólise diminui também no esforço,

devido à metabolização preferencial pelo miocárdio, do lactato produzido nos músculos dos

membros em actividade (1, 3, 7, 20).

A sintetase do glicogénio existe em duas formas, sendo uma independente do precursor do

glicogénio (a G-6-P) e que se denomina a sintetase I, e outra que requer a presença de G-6-P para

que possa actuar, a sintetase D. A maior parte da enzima encontra-se na forma D, necessitando

ATP para a interconversão a partir da forma I, uma vez que a sintetase D existe na forma

fosforilada. Neste processo intervém uma ATP-ase dependente do Mg e que é estimulada pela

Page 211: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA DO MIOCÁRDIO

Actas Bioq. 1989; 1:205-219

213

AMPc e por uma cinase da sintetase I. Nas situações em que há diminuição marcada do ATP

(hipoxia) há uma rápida interconversão da sintetase D em I (4, 24).

A fosforilase existe também sob duas formas senda uma activa na ausência de 5'AMP

(fosforilase a) e outra activa só na presença de 5'AMP (fosforilase b). As fosforilases distribuem-

se no coração do mesmo modo que o glicogénio aumentando do epicárdio para o endocárdio,

correspondendo a sua maior predominância a zonas com menor índice de metabolismo

oxidativo. O tecido ventricular possui maiores quantidades de fosforilases que a auricular (1, 4,

24).

A fosforilase é dimerizada e fosforilada por acção de uma cinase especifica (cinase da

fosforilase b) a qual é activada pelo AMPc, transformando-se na forma mais activa, a fosforilase

a. Esta interconversão é importante na resposta do miocárdio à isquémia e parece ser

influenciada pela libertação de catecolaminas endógenas, que estimulam a produção de AMPc.

Este, assim que é produzido, é rapidamente hidrolisado pelas fosfodiesterases, existentes no

miocárdio, impedindo que a sua acumulação iniba a adenilciclase, responsável pela renovação

dos teores de AMPc (4, 24).

A fosforilase b é estimulada pela presença de 5'AMP, sendo a sua actividade especialmente

importante nas situações de anoxia mantida, aumentando a afinidade para os seus substratos,

glicogénio e fosfato inorgânico (4, 24).

Existe urna semelhança notável nas variações das concentrações de nucleótidos de adenosina que

na anoxia e no esforço intenso estimulam, quer a glicólise quer a glicogenólise, através da acção

sobre as suas enzimas chave, respectivamente a fosfofrutocinase e a fosforilase. Assim, a

diminuição de ATP e o aumento de ADP, AMP e fosfato inorgânico, actuam sinergicamente

sobre as duas enzimas sugerindo um mecanismo de controlo integrado para a actividade da

glicólise e da glicogenólise (7, 20).

Os AGL são o substrato energético por excelência do miocárdio, durante grande parte do

dia (1-7). O coração capta os AGL a partir da circulação, dependendo este processo da

concentração daqueles metabolitos no sangue arterial, do comprimento da cadeia, do grau de

instauração dos AGL e do grau de actividade do coração. O limiar de captação dos AGL é de

0,35mM no sangue arterial, abaixo do qual não há captação pelo coração (1-7).

Os AGL instaurados (exº oleato) são preferencialmente utilizados sendo captados e

oxidados mais rapidamente que os saturados (estearatos) e os di-insaturados (linoleatos). Nos

saturados a captação diminui quando aumenta a extensão da cadeia (1-7).

Os ácidos gordos circulam no sangue de forma livre, ligados à albumina ou como

triglicéridos nos quilomicra e lipoproteínas. O miocárdio utiliza preferencialmente os AGL

podendo também hidrolisar os triglicéridos da circulação ou endógenos (no esforço intensa ou

jejum prolongado), uma vez que possui elevada concentração de lipoproteinolipases no espaço

intersticial e na membrana celular (sarcolema). Após refeição rica em gorduras, o miocárdio

pode extrair AGL dos quilomicra (1-7).

O conteúdo plasmático em AGL depende da dieta e da mobilização destes a partir do

fígado e do tecido adiposo, fenómeno que é regido por controlo hormonal. As catecolaminas

aumentam os AGL no sangue arterial e condicionam maior extracção pelo miocárdio. A insulina

diminui os AGL e diminui a captação destes pelo miocárdio. O processo de captação não

necessita de energia e funciona obedecendo a gradientes de concentração entre o plasma e o

interior da célula. Se houver consumo aumentado (oxidação) no interior da célula, por aumento

das necessidades energéticas, aumenta a captação dos AGL. É o que acontece, por exemplo,

quando aumenta a pressão intraventricular (1-7).

Page 212: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS L.

214

O primeiro passo na cadeia metabólica dos AGL é a sua conversão em acil-CoA de longa

cadeia (activação) (7).

AGL + ATP + CoA acil CoA + Pi + AMP

sintetase

A sintetase do acil-CoA existe no miocárdio na parte externa da membrana mitocondrial

e tem a sua acção regulada pela concentração de CoA no citoplasma, pela relação ATP/AMP e

pela concentração de fosfato inorgânico (7, 14-16).

Após a activação, o acil-CoA pode ter dois destinos. Uma parte pode permanecer no

citoplasma e contribuir para a síntese de lípidos complexos e a outra pode atravessar a membrana

mitocondrial e ser oxidada. Este último é o destino mais frequente no miocárdio, para a grande

maioria das moléculas de acil-CoA resultantes dos AGL (7, 14-16)

Para a fase seguinte (oxidação) o grupo acilo precisa de ser removido do exterior da

membrana mitocondrial para a interior da mitocôndria. Para tal liberta-se do CoA e liga-se à

carnitina (por acção da carnitina acil-CoA transferase I) formando um complexo acil-carnitina

(7, 16, 22). A carnitina é um constituinte normal da grande maioria dos tecidos, sendo sintetizada

principalmente no fígado e apresentando no coração os seus níveis mais elevados apesar de não

ser aí sintetizada (25). A quantidade de carnitina disponível para formar acil-carnitina é que vai

decidir do destino do acil-CoA. Se existir em quantidade adequada o acil-CoA seguirá na via da

oxidação. Se faltar vai formar triglicéridos (7).

O complexo acilcarnitina uma vez formado vai atravessar a membrana mitocondrial por

acção de uma transferase (palmitilcarnitina transferase I) situada na porção exterior da

membrana mitocondrial, trocando com carnitina livre que se encontra no interior da mitocôndria

e que assim volta ao citoplasma, ficando de novo disponível para formar mais acilcarnitina.

Depois de chegar ao interior da mitocôndria o grupo acilo liberta-se da carnitina e liga-se

novamente ao COA (CoASH) existente no local, por acção de outra transferase

(palmitilcarnitinatransferase II) situada na face interior da membrana mitocondrial, reconstruindo

o acilo-CoA que entra de seguida na cadeia da -oxidação onde vai “sofrer” as transformações

necessárias até chegar a acetil-CoA que fica pronto a fornecer o ciclo de Krebs (7, 14-16, 22).

Quando o ventrículo desenvolve pressão elevada, durante a sístole, a oxidação dos AGL

acelera-se e os níveis de acil-carnitina aumentam em relação aos de acil-CoA que diminuem.

Nestas condições a -oxidação remove rapidamente o acil-CoA a uma velocidade superior à da

que o sistema de transporte acil-carnitina ou a transferase da porção interna da membrana

mitocondrial pode funcionar para renovar a reserva (7).

No esforço intenso pode haver inibição das transferases do interior da mitocôndria

(principalmente da transferase I da carnitina palmitil CoA) pelo lactato produzido nos músculos

esqueléticos levando à interrupção da -oxidação, assumindo nesta fase o lactato, o papel de

substrato energético principal. Por acção da desidrogenase láctica o lactato pode retornar a

piruvato o qual segue depois a via metabólica já descrita (7).

A inibição produzida pela lactato (ou outro metabolito alterado pelo lactato) sobre a

transferase, demonstra que esta enzima pode ser sensível não só a variações de substrato e seus

produtos mas também à acção de outros agentes. Como a malonil CoA inibe a transferase e o

miocárdio possui malonil CoA, pensa-se que a inibição da transferase pelo lactato, possa ser

mediado pelo malonil CoA (7, 26, 27).

Page 213: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA DO MIOCÁRDIO

Actas Bioq. 1989; 1:205-219

215

A captação e activação dos AGL são limitadas pela concentração intracelular destes, bem

como pela diminuição da disponibilidade do CoA e da carnitina no citoplasma (16). A

velocidade da -oxidação é regulada pela capacidade de reoxidação do NADH e FADH2 pela

disponibilidade de CoASH na mitocondria e também pela possibilidade de oxidação do acetil-

CoA pelo ciclo do ácido cítrico (7, 16).

Todo a acetil-CoA produzido na -oxidação deverá, para que a sua capacidade total

energética seja aproveitada, ser “absorvido” pelo ciclo de Krebs, tendo como única alternativa a

passagem do grupo acetilo para fora da mitocôndria, ligado à carnitina (acetilcarnitina),

regenerando acetil-CoA e carnitina (por acção conjugada de duas enzimas a carnitina acetil

transferase e a carnitina acetilcarnitina transferase) (7, 15, 16, 22). Quando no citoplasma se

acumulam a acetil-CoA e acetilcarnitina diminuem os níveis de CoA e carnitina disponíveis para

transporte intramitocondrial do acil-CoA. Neste caso a -oxidação diminui e aumenta o teor de

AGL no miocárdio. Se aumentar o trabalho cardíaco (esforço) o fluxo através do ciclo do ácido

cítrico aumenta também, permitindo o “escoamento” de mais moléculas de acetil-CoA e assim

os níveis citoplásmicos de acetil-CoA e acetilcarnitina também diminuem e a -oxidação é

estimulada (7).

Conforme já atrás referimos o miocárdio não sintetiza carnitina. A regulação dos níveis

desta substância no miocárdio é realizada por alterações na sua concentração sérica e pela

velocidade de transporte para dentro das células (7).

O CoA é sintetizado pelo coração a partir do ácido pantoténico captado do sangue

(controlo realizado pelo pantotenatocinase) (28).

A manutenção do funcionamento adequado do ciclo do ácido cítrico e da -oxidação

pressupõe a reoxidação constante do NADH formado em grande quantidade nestas duas etapas

decisivas para a produção de energia. Como o NADH formado no citoplasma (glicólise) não

pode atravessar directamente a membrana mitocondrial (nos mamíferos). são utilizados sistemas

indirectos de transporte em vaivém que no coração assumem importância vital. Existem vários

destes sistemas sendo predominante no coração o que utiliza o ciclo malato-aspartato. Neste

ciclo, o oxaloacetato do citoplasma é reduzido a malato que entra na mitocôndria, onde é

reoxidado a oxaloacetato com libertação de NADH que é reoxidado na cadeia de oxidação-

redução (cadeia respiratória). A saída de oxaloacetato da mitocôndria é cineticamente limitada,

por isso a oxaloacetato é preferencialmente transaminada com o glutamato originando aspartato

e -cetoglutarato. Este último pode sair da mitocôndria por troca com o malato, enquanto a saída

do aspartato se equilibra com a entrada de glutamato para completar o ciclo (7, 16).

Outro dos sistemas de vaivém utilizados na reoxidação do NADH é a que é realizado pela

interconversão dos corpos cetónicos acetoacetato/ -hidroxibutirato (29, 30). Estas substâncias,

no coração, além de contribuírem para a reoxidação do NADH, podem actuar como substratos

energéticos (1). Assim, o -hidroxibutirato quando é oxidado por uma desidrogenase dependente

do NAD, converte-se em acetoacetato (3). Este é por sua vez convertido em acetoacetil-CoA que

pode ser cindido até acetil-CoA, o qual poderá ser oxidado no ciclo do ácido cítrico (3). Durante

o jejum prolongado ou cetose diabética, pode haver uma preferência especial do miocárdio pela

metabolização dos corpos cetónicos como substrato energético, provocando inibição do

metabolismo da glicose e aumento do glicogénio cardíaco (3).

A metabolização de grandes quantidades de acetoacetato inibe a oxidação dos AGL, do

lactato e do piruvato, possivelmente por competir com o CoA disponível (31).

Page 214: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS L.

216

CONCLUSÕES

O miocárdio é um tecido com elevadas necessidades energéticas, encontrando-se

altamente apetrechada para a via aeróbia de produção de energia.

A fosfocreatina assume no miocárdio um papel fundamental na manutenção dos teores de

ATP necessários ao funcionamento do aparelho contráctil, quer por fornecer rapidamente um

grupo fosfato ao ADP citoplásmico que resulta da hidrólise do ATP pelas proteínas contrácteis,

quer porque funciona como mecanismo de vaivém, permitindo a passagem do ATP mitocondrial

para o citoplasma.

Os substratos metabólicos utilizados são várias, explicando-se a preferência pelos AGL

durante a maior parte das 24 horas, pelo facto do miocárdio não possuir carboxilase pirúvica

impedindo desta forma o piruvato de passar directamente a oxaloacetato, ficando dependente da

sua ligação ao CoA para formar acetil-CoA, impedindo assim a glicose de se tornar o metabolito

energético preferencial, tal como acontece na maioria de todos os tecidos.

A utilização de substratos alternativos aos AGL depende fundamentalmente da ingestão

de alimentos, da actividade imposta ao coração e da acção de várias hormonas (insulina,

glicagina e catecolaminas).

O glicogénio cardíaco constitui uma reserva de substrato energético utilizável apenas em

situações de emergência, quando há compromisso isquémico.

A carnitina desempenha um papel chave na metabolização dos AGL pelo miocárdio,

permitindo o acesso do grupo acilo ao interior da mitocôndria onde será oxidado na cadeia da -

oxidação.

A capacidade de oxidação do acetil-CoA no ciclo do ácido cítrico, a reoxidação do

NADH e do FADH2 e a disponibilidade do CoASH na mitocôndria são os factores mais

importantes da regulação da velocidade da oxidação dos AGL.

A reoxidação constante do NADH, formado em grandes quantidades no ciclo do ácido

cítrico e na -oxidação dos AGL é um mecanismo fundamental para a manutenção da via

oxidativa do metabolismo energético do miocárdio. O NADH formado no citaplasma (glicólise)

não pode atravessar directamente a membrana mitocondrial. Por isso são utilizados sistemas

indirectos de transporte em vaivém (malato/asparato, acetoacetato/ -hidroxibutirato).

SUMMARY

A healthy heart is exclusively dependent an aerobic production of AIR (in the

mitochondrion) for the supply of energy to its contractile apparatus, by means

of the oxidation of different Krebs’ cycle substrates (dehydrogenation of citric

acid cycle intermediate metabolites requiring NAD+). Thus, in addition to CO2

discharge and consequent H+ and electron transport through the respiratory

chain (resulting in O2 consumption and H2O production), there is also an

oxidative phosphorylation where inorganic phosphate combines with ADP to

yield ATP. In the myocardium, outside postprandial periods, the predominant

substrates fan AIR production are free fatty acids (FFA). Blood glucose is

preferentially used in postprandial situations. During physical exertion, the

increased production of lactic acid in peripheral muscles favours its utilization

by heart muscle cells in the normal untrained individual. Myocardial uptake of

mast energetic substrates is directly proportional to their respective arterial

Page 215: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA DO MIOCÁRDIO

Actas Bioq. 1989; 1:205-219

217

concentration and coronary blood flow. The heart is particularly rich in

carnitin and carnitin-catalysed oxidation of FFA originates a great amount of

citric acid and ATP, which inhibits glucose utilization via inhibition of

phosphofructokinase (a key enzyme of glycolysis). On the other hand, excess

of acetyl-CoA and NADH2 (resulting from FFA oxidation) has a “pooling”

effect upon CoA residues, and inhibits pyruvate dehydrogenase, thus causing

an impaired transport of pyruvic acid into the Krebs’ cycle, thereby

contributing to a limitation of glycolysis. Glycogen in the heart is minimal and

fan practical purposes its level is almost constant (0.4 to 0.6% for fresh tissue

weight); consequently this substrate normally plays a negligible role in energy

production (except in situations of extreme and strenuous exertion, where its

phosphorylase is activated by great elevations of cAMP levels). Several

hormones take part in the energetic metabolism of the myocardium. Insulin

increases glucose uptake. During physical exercise, insulin secretion is

impaired, although it never reaches such low values, as to block the

physiological increase in glucose uptake. In this setting, a lower insulin

secretion originates an elevation of available FFA, by means of an increased

lipolysis in adipose tissue and additionally a increased glycogenesis in the

liver. These metabolic shifts are reinforced by the concerted actions of

glucagon and growth hormone. Catecholamines stimulate glycolysis (probable

effect upon phosphofructokinase), glycogenolysis (via phosphorylase

activation), and lipolysis. All these described actions of catecholamines are

potentiated in exertion states.

BIBLIOGRAFIA

1. OPIE LH. Metabolism of the heart in health and disease (parte I). Am. Heart J. 76:685-

698,1968.

2. OPIE LH. Metabolism of the heart in health and disease (parte II). Am Heart J., 77:100-

122,1969.

3. SCHLANT RC. Metabolism of the heart. In The Heart, 4th Edition. U.W. Hurst, P. Bruce

Logne, P.C. Schlant and N.K. Wenger (eds), McGraw-Hill Book Company, New York,

1978, p 107-118

4. NEELY JR, ROVETTO MH, and ORAM JF. Myocardial utilization of carbohydrate and

lipids. Prog. Cardiovasc. Dis. 15:289-329,1972.

5. MOMMAERTS WF. Current problems in myocardial metabolism. In Symposium on

myocardial metabolism. E. Braunwald (ed). Circul. Res. 35 (suppl. III):III2-III7,1974.

6. DAVIES RE. Biochemical processes in cardiac function. In the Myocardium: Failure and

Infarction. E. Braunwald (ed), HP Publishing Co Inc. New York, 1974, pp 29-35

7. MORGAN HE and NEELY JR. Metabolic regulation and myocardial function. In the

Heart, 6th edition. J. Willis Hurst (ed), McGraw Hill Book Company, New York, 1986, p

85-100

8. ALLEN DG and ORCHAND CH. Myocardial contractite function during ischemia and

hypoxia. Circul. Res. 60:1.53-168,1987.

9. CHEUNG JY, BONUENTRE JV, MALIS CD and LEAF A. Calcium and ischaemic

injury. New Eng. J. Med. 314:1670-1676,1986.

Page 216: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

BOTAS L.

218

10. RUBIO R. The role of adenosine in the regulation of coronary blood flow. Circul. Res.

47:807-813,1980.

11. RUBIO R. and BERNE RM. Release of adenosine by the normal myocardium in dogs and

its relationship to the regulation of coronary resistance. Circul. Res. 25:407-415,1969.

12. BERNE RM, THOMPSON I, MILLER L, FOLEY H, WATKINSON P and RUBIO R.

The effect of increases in cardiac oxygen need on adenosine formation and coronary blood

flow in the steady state and during the cardiac cycle. In Microcirculation of the Heart. H.

Tillmans, W. Kübler and H. Zebe (eds), Springer-Verlag, Berlin-Heidelberg, 1982, p 39-

48.

13. FORSTER RE. Oxygenation of the muscle cell. Circul. Res. 20 (suppl. 1):115-120, 1967

14. IDELL-WENGER JA, GROTYOHANN LW and NELLY JR. Coenzime A and carnitine

distributian in normal and ischaemic hearts. J. Biol. Chem. 253:4310-4318,1978

15. MELA-RIKER LM and BUKOSKI RD. Regulation of mitochondrial activity in cardiac

cells. Ann. Rev. Physiol. 47:645-653,1985

16. WILLIAMSON JR. Mitochondrial function in the heart. Ann. Rev. Physiol. 41:485-

506,1979

17. JACOBUS WE. Respiratory control and the integration of heart high energy phosphate

metabolism by mitochondrial creatine kinase. Ann. Rev. Physiol. 47:707-725,1985

18. RANDLE PJ, ENGLAND PJ and DENTON RM. Control of the tricarboxylate cycle and

its interactions with glycolysis during acetate utilization in rat heart. Biochem. J. 117:677-

695,1970

19. EVANS JR, OPIE LH, and REYNOLD AE. Piruvate metabolism in the perfused rat heart.

Am. J. Physiol. 205:971-976,1963

20. NEELY JR and MORGAN HE. Relationship between carbohydrate and lipid metabolism

and energy balance of heart muscle. Ann. Rev. Physiol. 36:413-459,1974

21. NEELY JR, WHITMER KM and MOCHIZUKIS. Effects of mechanical activity and

hormones on myocardial glucose and fatty acid utilization. Circul. Res. 38 (suppl. I):22-

29,1976

22. VARY TC, REIBEL DK and NEELY JR. Control of energy metabolism of heart muscle.

Ann. Rev. Physiol. 43:419-430,1981

23. OPIE LH and NEWSHOLME EA. The activities of fructose 1,6 diphosphate,

phosphofructakinase and phosphoenolpyruvate carboxykinase in white muscle and red

muscle. Biochem. J. 103:391-398,1967

24. VILLAR-PALASI C and LARMER J. Glycogen metabolism and glycolytic enzymes. Ann.

Rev. Biochem. 39:639-645,1970

25. HAIGLER HT and BROQUISI HP. Carnitine synthesis in rat tissue slices. Biochem.

Biophys. Res. Commun. 56:676-681,1974.

26. BIELEFELD DR, VARY TC and NEELY JR. Site of inhibition of fatty acid oxidation by

lactate and oxfenicine in cardiac muscule. Fed. Proc. 42:1258, 1983(abstract)

27. McGARRY JD, MILLS SE, LONG CS and FOSTER DW. Observations on the affinity for

carnitine and malonyl-CoA sensitivity of carnitine palmitoyl-transferase I in animal and

human tissues: demonstration of the presence of malonyl-CoA in non-hepatic tissues of the

rat. Biochem. J. 214:21-28,1983

28. SMITH CM. The effect of metabolic state on incorporation of 14C-pantothenate into CoA

in rat liver and heart. J. Nutr. 108:863-873,1978

Page 217: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ENERGÉTICA DO MIOCÁRDIO

Actas Bioq. 1989; 1:205-219

219

29. BOXER GE and DEVLIN TM. Pathways of intracellular hydrogen transport. Science,

134:1495-1501,1961

30. LENHINGER AL. Biochemistry, New York Worth Publishers, 1970, p 400-408

31. BOSSENGE E, WENDT VE, SCHOLLMEYER P, BLUNCHEN G, GUDBJARNOSON S

and BING RJ. The effect of ketone bodies an cardiac metabolism. Am. J. Physiol. 208:162-

168,1965

Page 218: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq. 1989; 1:221-230 221

REGISTOS DA ELECTROGÉNESE CARDÍACA

Carlos Ribeiro

UTIC - Arsénio Cordeiro - Hospital Universitário de Santa Maria, Lisboa

SUMÁRIO

Definem-se e discutem-se as componentes dum sistema de aquisição de

fenómenos bioeléctricos nomeadamente sensores, transdutores,

amplificadores (amplificam e/ou filtram o sinal eléctrico), galvanómetros,

sistemas de registos (fotográfico, raios ultra-violetas, esguicho do tinta,

estilete do inscrição mecânica sobre papel especial termo-sensível, em fita

magnética) e de armazenamento das informações. Apontam-se os tipos de

eléctrodos (micro-eléctrodos, em fios de prata, de agulha, em placa, em anzol,

em botão, de sucção, agulha tipo Durrer com várias derivações,

electrocateteres) e as características das derivações (unipolares e bipolares).

Classificam-se e caracterizam-se os tipos de registos em intracelulares e

extracelulares. Estes dividem-se em directos (electrograma intracavitário,

electrograma do feixe de His; mapas endocárdicos; registos com eléctrodos de

sucção; mapas epicárdicos; registos intramurais e técnicas de estimulação

programada do coração) e indirectos (electrocardiograma clássico, do Holter e

de esforço; vectocardiograma o esferocardiograma; mapas torácicos, registo

precordial de potenciais de His e de potenciais tardios: análise de velocidade

espacial e da frequência das vibrações eléctricas cardíacas; análise do campo

magnético). São definidas as indicações, limitações e perspectivas futuras de

cada uma destas técnicas de registo da electrogénese cardíaca.

A actividade eléctrica cardíaca tem sido estudada por vários métodos, indo do estudo

global pelo electrocardiograrna periférico, até ao estudo de fibras rniocárdicas isoladas com

emprego de microeléctrodos.

Um sistema de aquisição dos fenómenos bioeléctricos pode ser esquematizado do

seguinte modo:

1. Um sensor que capta o sinal biológico.

Palavras-chave: Electrogénese cardíaca, electrografia directa electrografia indirecta

Page 219: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

RIBEIRO C.

222

2. Um transductor que transforma o sinal biológico em sinal eléctrico.

3. Alguns amplificadores e modificadores que tornam o sinal eléctrico mais acessível ao

estudo, amplificação e filtragem.

4. Galvanómetros que transformam o sinal eléctrico em deflexão.

5. Um sistema de registo que permite a apresentação do fenómeno em osciloscópio e a

sua inscrição em papel (fotográfico, termo-sensível, directo a tinta...) ou em película

fotográfica.

6. Um modo de armazenamento que facilita a gravação em fita magnética ou a colagem

em carteiras próprias dos sinais eléctricos.

Eléctrodos

Os sensores que captam os fenómenos biológicos denominam-se eléctrodos. Os

eléctrodos são elementos condutores dos fenómenos biológicos até ao circuito de medida.

Existem vários tipos de eléctrodos: começamos por citar os micro-eléctrodos para

exp1oração intracelular. Utilizam-se dois tipos: a) micro-eléctrodos de vidro; b) micro-eléctrodos

metálicos.

Os micro-eléctrodos de vidro também denominados micropipetas, constam dum tubo de

vidro com 1 mm de diâmetro terminado em ponta. O micro-eléctrodo está cheio dum liquido

condutor e dum arame que permite a sua conexão ao sistema de registo. Os micro-eléctrodos

metálicos (aço, tungsténio, platina) são mais utilizados como eléctrodos de superfície, mas

podem também ser úteis para registos intracelulares. Também se usam na experimentação animal

eléctrodos em fios de prata e eléctrodos de agulha ou em placa que se divulgaram também para

registos de potenciais epicárdicos ou intramurais durante intervenções torácicas no homem. Os

eléctrodos de anzol, de latão, ou agulhas com vários canais, servem para a experimentação

animal e ultimamente também para a realização de mapas epicárdicos. Os electrocateteres

utilizados em estudos electrofisiológicos no homem, apresentam-se com grande variedade de

tamanho e de número de eléctrodos e com distâncias diversas entre os seus pontos terminais. É

muito divulgado o cateter de Berkovitz-Castellanos. É um cateter hexapolar com um par distal de

eléctrodos e dois pares proximais, estes separados do outro por 8 cm.

Eléctrodos de sucção - Com os electrocateteres de sucção colhe-se o potencial de acção

dm pequeno grupo de fibras cardíacas (1, 2). Este potencial de acção possui morfologia e

comportamento semelhantes aos obtidos com os micro-eléctrodos intracelulares, permitindo

assim uma aproximação electrofisiologia celular no coração “in vivo”.

O registo deste potencial de lesão, detectado durante a actividade cardíaca, dá origem a

um traçado constituído por ondas que se inscrevem num só sentido e com aspecto monofásico;

dai a designação de potencial de acção monofásico (Monophasic Action Potential: MAP)

Em 1931, Schutz (3) utilizou pela primeira vez o método de sucção para a criação duma

lesão local e o registo do MAP. Em 1936 (4) discute a relação entre os seus registos, o período

refractário e o ECG de superfície.

Olsson, a partir de 1970, publica vários trabalhos sobre o assunto (5-8) , estudando o

MAP auricular e ventricular no homem, e as suas modificações em função das alterações do

ritmo, de modificações iónicas e dos efeitos de drogas.

Page 220: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ELECTROGÉNESE CARDÍACA

Actas Bioq. 1989; 1:221-230

223

FIGURA 1

Cateter de sucção, modelo “Dupuis”. A: extremidade distal; B: extremidade

proximal; C: terminais de ligação.

Cateteres de sucção - Utilizam-se cateteres de sucção modelo “Dupuis” (fig. 1) tamanho

5F, com um lume de cerca de 0,5 mm, e um eléctrodo central de cádmio cromado de 0,15 mm de

diâmetro; a sua extremidade distal dista cerca de 0,5 mm da ponta do cateter (fig. 2) . O segundo

eléctrodo é um eléctrodo cilíndrico, colocado na parede do cateter, a cerca de 1 mm da sua

extremidade. A extremidade proximal do cateter tem uma forma que permite a sua ligação a uma

torneira de 3 vias e, por seu intermédio, a uma pequena câmara de pressão munida dum

manómetro, que nos permite a regulação da pressão negativa conseguida por um aspirador ligado

à citada câmara de pressão. Uma seringa com soro fisiológico e posta em comunicação com e

lume do cateter através dum dos ramos da torneira de três vias, e que nos permite evitar a entrada

de sangue para dentro do cateter antes da sua aposição às paredes cardíacas.

Page 221: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

RIBEIRO C.

224

FIGURA 2

Cateter de sucção. Esquema. A: extremidade distal; 1:eléctrodo parietal; 2:

eléctrodo central; B: extremidade proximal; 3: ligação à câmara de presão.

A câmara de pressão e munida dum manómetro que permite a medição de pressões até

aos 800 mm de Hg.

Habitualmente, utilizam-se pressões negativas da ordem dos 400 mm de Hg.

Derivações

A corrente captada peles dois eléctrodos tem de ser introduzida nas duas entradas do

amplificador diferencial. A derivação não e mais do que a forma de realizar esta conexão. Há

dois tipos de derivações: unipolar e bipolar.

Nas derivações bipolares, cada um dos dois eléctrodos conectam com cada uma das

entradas do amplificador, enquanto nas derivações unipolares existe um eléctrodo explorador e

outro afastado ou indiferente.

Amplificadores

Os amplificadores transformam o sinal de entrada, amplificando-o e filtrando-o de forma

que o sinal de saída possa ser registado convenientemente no galvanómetro. Na definição dos

amplificadores temos de considerar as características de entrada (única eu dupla, impedância,

nível do sinal máximo...) a sensibilidade, a banda de preferencia e as características de saída

(única ou dupla, impedância ou nível do sinal máximo)

Nos amplificadores bio-eléctricos a entrada do sinal é dupla

Page 222: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ELECTROGÉNESE CARDÍACA

Actas Bioq. 1989; 1:221-230

225

A impedância de entrada do amplificador, é importante, principalmente quando se trata

de potenciais intracelulares, em que pequenas correntes enxertadas podem alterar o registo.

Pensa-se que a impedância de entrada deve ser pelo menos dez vezes superior à da impedância

da fonte de potenciais.

A sensibilidade dum amplificador resulta da capacidade de aumentar ou diminuir e sinal

eléctrico de entrada. O principal óbice ao aumento dos potenciais de entrada reside não só na

existência dum “ruído de fundo” devido a interferências electromagnéticas externas, nas também

ao “ruído” térmico secundário a fluxo de electrões.

O sinal eléctrodo captado e na verdade formado pelo somatório de ondas de diversa

frequência. Podemos filtrar as que não interessem e amplificar e registar as que desejamos

estudar. Há amplificadores DC que não filtram as frequências baixas e AC que filtram as

frequências baixas. Nos amplificadores em que se filtram as frequências altas e baixas podem

seleccionar-se só os registos que se querem estudar.

Galvanómetros e registadores

O galvanómetro de Arsonval é o utilizado universalmente como indicador de saída dos

sistemas de aquisição dos dados bioeléctricos. O sinal de entrada transforma-se numa deflexão

que pode ser visualizado por dois processos:

1. Por Osciloscópio de raios catódicos.

2. Por Registadores de inscrição directo com características diversas:

fotográficas, por raios ultra-violetas, por esguicho de tinta e por estilete de inscrição

mecânica sobre papel especial termo-sensivel.

A massa e a inércia das partes móveis do sistema de inscrição são factores fundamentais

na capacidade de resposta para registos de alta frequência. Os sistemas de estilete tem grande

inércia e só permitem registos satisfatórios para baixo de 50-100 cps. Os outros sistemas

apontados têm frequências de resposta superiores a 1000 cps.

A inscrição per esguicho de tinta é mais barata, se bem que haja mais dificuldade em

armazenar os resultados. É importante escolher a velocidade de deslocação do papel. A

velocidade habitual na clinica de 25 mm/s só permite, com segurança, medidas de 20 ms. A

100 mm/s a segurança passa para 5 ins, enquanto a 400 mm/s a segurança chega a 1 ins.

Geralmente utiliza-se em medidas de precisão a velocidade de 200 nm/s.

O osciloscópio de raios catódicos não tem inércia mecânica, tendo uma frequência de

resposta superior à dos sistemas de inscrição directa. Utiliza-se este método para estudes de

precisão notadamente os potenciais intracelulares, recorrendo-se então ao registo fotográfico.

Os registos em fita magnética tem a vantagem de proporcionar um armazenamento que

permite estudos e visualizações repetidos e quando desejados.

Tipos de registos

Os tipos de registos dependem fundamentalmente do local onde se capta o sinal eléctrico,

que podo ser intracelular ou extracelular, directo ou indirecto.

A - Directos - quando se situam nas estruturas cardíacas

a) Electrograma intracavitário

b) Electrograma do Feixe de His

c) Mapas endocárdicos

Page 223: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

RIBEIRO C.

226

d) Registos com eléctrodos do sucção

e) Mapas epicárdicos

f) Registos intramurais

g) Técnicas de estimulação programada do coração

B - Indirectos - quando a electrogénese cardíaca se capta à superfície corporal

a) Electrocardiograma: Clássico; Dinâmico; Esforço; Esofágico.

b) Vectocardiograma

c) Mapas electrocardiográficos torácicos

d) Registo de potenciais tardios

e) Análise de velocidade espacial da frente de activação cardíaca

f) Análise das frequências das vibrações eléctricas cardíacas

g) Análise do campo magnético.

A - a) O Electrograma Intracavitário permite a recolha de potenciais eléctricos dentre das

cavidades cardíacas e define muitas vezes a origem de certas taquicardias e a posição

dos cateteres.

b) O Electrograma do feixe de His obtém-se a partir de várias técnicas. No homem utiliza-

se geralmente a técnica de Seldinger introduzindo o electrocateter por via venosa

femural, sob controlo fluoroscópio, e depois em função dos registos endocavitários

obtidos, assim só determina a sua posição. Deste modo é possível definir os intervalos

PA, AH, HV, utilizando derivações de superfície geralmente Dl, D3 e Vl. A existência

duma derivação intra-cavitária alta facilita a medição do intervalo PA.

Os registos por via arterial, com o cateter situado no seio não coronário da aorta,

descrito por Norula, são reservados quase só ao animal de experiência. Quando há

problemas com a utilização das veias safenas (embolias pulmonares, tromboflebites dos

membros inferiores, obesidade extrema, amputados, patologia inguinal...) Norula

preconiza as veias do braço.

c) Mapas endocárdicos

Trata-se do registo de potenciais a nível endocárdico permitindo a obtenção da

sequência da activação, quer em ritmo sinusal, quer durante arritmias. Esta exploração

pode ser feita com electrocateteres ou com eléctrodos manuais durante 0a cirurgia de

coração aberto. É importante e registo dos mapas endocárdicos para a definição da

origem das taquicardias auriculares e ventriculares e das vias acessórias da condução.

Utilizam-se geralmente registos na aurícula, dois no seio coronário e o electrograma do

feixe de His. Quando se precisa dum mapa mais ilustrativo, um dos cateteres deve

deslocar-se e colher potenciais em diferentes pontos.

O mapa ventricular foi desenvolvido e sistematizado por Josephson e permite o registo

do 6 pontos no ventrículo esquerdo. Tem interesse para definir a origem de taquicardias

ventriculares, podendo adicionar-se para maior precisão a técnica de estimulação

programada, a fim do encontrar um local em que se reproduza a morfologia da

taquicardia anteriormente registada no electrocardiograma de superfície.

d) Registos com eléctrodos de sucção

Os estudos dos potenciais de acção monofásicos recolhidos por eléctrodos de sucção,

foram desenvolvidos principalmente por Ollson.

O registo dos potenciais de acção monofásicos é muito semelhante aos potenciais

intracelulares e pode ser realizado tanto nas aurículas como nos ventrículos. Todavia a

Page 224: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ELECTROGÉNESE CARDÍACA

Actas Bioq. 1989; 1:221-230

227

duração da colheita não deve ultrapassar os 2 minutos para evitar lesões locais

irreversíveis.

O registo destes potenciais é geralmente realizado com a colheita dos potenciais do

feixo do His e tem interesse para definir a acção de certos fármacos.

e) Mapas epicárdicos

Os registos epicárdicos permitem estudar a sequência da activação epicárdica tanto no

coração normal como em casos patológicos nomeadamente síndrome de pré-excitação

ventricular e taquicardias ventriculares e na definição de zonas do ressecção no

tratamento cirúrgico da cardiopatia isquémica. A união de pontos com tempos de

activação semelhantes permite a definição do um mapa de linhas isócronas.

f) Registos intramurais

Os registos intramurais permitem o estudo da activação da parede livre e septal

ventricular com agulhas, tipo agulha-elétrodos do Durrer, que tivermos ocasião do

utilizar em experiências em cães, para definição do local da interrupção nos bloqueios

intraventriculares esquerdos e no estudo da acção de fármacos anti-arrítmicos sobre os

potenciais intra-septais (9-12)

g) Técnicas de estimulação programada do coração.

A análise dos estudos electrofisiológicos compreende a definição duma série do

parâmetros electrofisiológicos básicos nomeadamente intervalos e períodos refractários.

A análise o interpretação de arritmias espontâneas ou provocadas por métodos do

estimulação programada. Inclui por vezes a análise da resposta de fármacos ou a

“pacing” com vista a terapêuticas agudas ou crónicas.

B - a) Electrocardiograma

Clássico - suficientemente difundido habitualmente de 12 derivações podendo associar-

se V7 - V8 - VD3 - VD4 - epigástrica - esofágicas, segundo o caso clínico estudado.

Electrocardiografia de Holter ou Dinâmica - Introduzido em 1961 por Holter o registo

contínuo do ECG do 6 - 12 - 24 - 48 horas permite o estudo das alterações do ritmo, da

condução cardíaca e da presença do isquémia do miocárdio correlacionados quer com

certos quadros clínicos (síncopes, palpitações, angina...) , quer com diversas situações

(desporto, sono, actividade sexual...) , quer ainda sob influência do fármacos.

O sistema básico consta:

1. Um aparelhe de registo magnético colocado numa mini-cassete portátil com

velocidade muito lenta permitindo um registo de 24 horas.

2. Um analisador de registo que permite uma leitura rápida do electrocardiograma

recolhido durante 24 heras ou 20-30 minutos.

3. Eléctrodos e derivações

Os eléctrodos conectam o aparelho do registo ao torax do doente.

Geralmente registam-se duas derivações V5 e V1 “like”

Os registos de Holter vieram trazer avanços impetrantes no estudo das disritmias e

dos defeitos da condução sendo menos específicos na definição da isquémia do

miocárdio.

Provas de Esforço

Page 225: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

RIBEIRO C.

228

Temos do considerar vários tipos de teste do esforço, que vão depender dos dados a

analisar, do grupo do indivíduos a estudar, da familiaridade da equipa com o aparelho, da

intensidade do esforço pretendido e dos custos e do espaço disponíveis.

Usam-se como aparelhos: Tapete rolante, cicloergómetro e os degraus variáveis.

Utilizam-se protocolos de nível único, de níveis múltiplos (pesados, leves,

fisiológico), testes máximo ou limitado por sintomas e testes sub-máximos ou limitados

pela frequência cardíaca.

As aplicações das provas de esforço são as seguintes:

- Avaliar sintomas (dor torácica, palpitações, dispneia),

- Estimar a gravidado da doença coronária,

- Predizer futuros acontecimentos cardíacos,

- Apreciar efeitos terapêuticos (fármacos, cirurgia cardíaca, treino físico)

- Guiar a reabilitação no pós-enfarte do miocárdio,

- Determinar e precisar a capacidade funcional (em valvulares...),

- Escolher programas de treino físico,

- Avaliar profissionais de alto risco (pilotos...)

- Estudar factores do risco em assintomáticos , nomeadamente a isquémia

silenciosa e arritmias.

b) Vectocardiograma

É a representação sequencial dos vectores médios sucessivos da activação

cardíaca num plano. Utilizam-se geralmente planos ortogonais (H, F, S,) dependendo

de eixos x , y , z ). Os métodos do recolha são vários, tendo sido mais difundidos os de

Grishman e posteriormente o de Frank o e do McFee Parungao. Estes pretendem com

mais eléctrodos e com resistências várias corrigir a homogeneidade do meio e tornar a

fonte dos potenciais cardíacos como correspondendo a m ponto central do torax.

A vectocardiografia é útil como complemento dos estudos electrocardiográficos,

nomeadamente na melhor definição da área de necrose, nos bloqueios e no WPW.

A polarcardiografia ou a esferocardiografia são representações da electrogénese

cardíaca semelhantes às da vectocardiografia.

c) Mapas electrocardiográficos torácicos

Os mapas electrocardiográficos torácicos constituem um sistema de estudo

“semelhante” aos mapas epicárdicos. Cabe aqui aceitar que o registo à superfície do

tórax dos potenciais cardíacos e dependente de vectores sucessivos representativos da

actividade eléctrica global cardíaca momentânea, adicionada todavia de vectores

representativos da actividade eléctrica regional.

A aceitar tal somatório os mapas torácicos devem trazer um aumento de

informação em relação ao ECC clássico e ao VCG.

É útil pois, na localização das áreas de pré-excitação, na determinação das áreas

de necrose ou de lesão, na localização de zonas com a repolarização alterada e para

aventar hipertrofias locais ou seleccionar doentes com risco arritmogénico.

Existem dois tipos de “mapping”:

O mapa precordial, em que se utilizam 30 eléctrodos sistemáticos na parede

anterior do tórax e que preferencialmente serve para definir o tamanho do enfarte.

Chama-se a atenção para o mapa da parede anterior do hemitórax direito com vista à

definição do enfarte do ventrículo direito.

Page 226: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

ELECTROGÉNESE CARDÍACA

Actas Bioq. 1989; 1:221-230

229

No mapa torácico total, utilizam-se geralmente 192 eléctrodos. Necessita

sofisticados meios de colheita simultânea e de um computador devidamente

programado para realizar os mapas de isopotenciais e de curvas do isoáreas.

As curvas isopotenciais melhoram o diagnóstico nomeadamente, no enfarte

crónico dorsal, nas alterações de condução intraventricular direita e na determinação de

zonas de pré-excitação no WPW.

Os mapas isoáreas permitem detectar alterações regionais primárias na

repolarização cardíaca e delimitar grupos de doentes com alto risco arritmogénico.

Áreas iguais de complexos QRS a que correspondem ondas T com áreas

diferentes, podem significar existência de diferenças na repolarização ventricular em

determinada zona e que tal foco pode ser arritmogénico e justificar profilaxia

farmacológica ou física (desfibrilhador implantado)

d) Pós-potenciais tardios o precoces - Os pós-potenciais tardios e os precoces registados à

superfície do torax com electrocardiógrafos de alta sensibilidade (idênticos a

electroencefalógrafos) permitem em certos casos experimentais e clínicos ser

premonitórios de arritmias graves nomeadamente taquicardia e fibrilhação

ventriculares. Esta associação todavia terá de ser confirmada de forma mais cabal no

futuro.

e) Velocidade Espacial

A análise da velocidade espacial da frente de activação tem vindo a crescer de

interesse.

O ECC e o VCC resultam duma progressão da onda de activação numa

determinada fracção sucessiva de tempo. É possível daí deduzir a velocidade dessa

onda de activação numa determinada fracção de tempo, por exemplo de 0,020 a 0,025

segundos antes do fim ou após o início da activação ventricular.

Para calcular a velocidade espacial do ECG registam-se as derivações x, y, z e

aplica-se a fórmula do Hellerstein o Hamlim.

No Grupo Cooperativo Português do Vectocardiografia foi utilizado este método para

definir se os bloqueios fasciculares anteriores esquerdos eram parietais ou septais (14).

f) ECC de Frequência

A análise do ECC em relação à frequência das vibrações eléctricas, tem merecido

grande atenção por parte de autores japoneses.

No ECC habitual os fenómenos eléctricos são registados em função do tempo. O

estudo dos componentes de frequência é uma técnica de grande interesse para definir

alterações do automatismo e da condução cardíaca, com perspectivas de grande

desenvolvimento futuro nas Unidades de Cuidados Intensivos e nas Unidades de

implantação de „pacemakers” autoprogramáveis e de desfibrilhadores implantáveis.

Magnetocardiografia

(d)2

dt

(d)2

dt

(d)2

dt+ +VE =

(d)2

dt

(d)2

dt

(d)2

dt+ +VE =

Page 227: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

RIBEIRO C.

230

A introdução de sensores supercondutores no campo de metodologia biológica levou ao

desenvolvimento da magnetocardiografia que permite a definição da actividade eléctrica das

estruturas do tecido específico do coração.

BIBLIOGRAFIA

1. LONGO, A; BOTAS, L; MOURÃO, L e RIBEIRO, C. Modelo experimental para estudo

de drogas antidisrítmicas. Jornal do Médico. 98:121-127,1978.

2. LONGO, A; MOURÃO, L; BOTAS, L e RIBEIRO C. O efeito da procainamida na

vulnerabilidade eléctrica auricular. Jornal do Médico 98:457-461,1978.

3. SCHUTZ, E. Menophasic aktionsstreme von in situ durchbluteten saugertierhezen. Kli.

Wschr. 10:1454-458,1931.

4. SCHUTZ, E. Elektrophysiologie des Herzens bei einphasischer Ableitung. Ergeben.

Physiol. 38:493-98,1936.

5. OLSSON, S B; VARBAUSKAS, E; KORSGREN, M. Further improved method for

neasuring monophasic action potentials of the intact human heart. J. Electroc. 4:19-

24,1971.

6. OLSSON, S B. Right ventricular monophasic action potentials during regular rhythm. Acta

Med. Scand. 191:145-50, 1972.

7. OLSSON, S B; BROSSON, L; VARNAUSKAS, E. Class 3 antiarrhythmic action in man.

Monophasic action potential recordings and amiodarone treatment. Brit. Heart. J. 35: 1255-

60, 1973.

8. OLSSON, S B. Atrial repolarisation in nan. Effect of beta receptor blockade. Brit. Heart J.

36:806-10,1974.

9. RIBEIRO, C. Les blocs intraventriculaires gauches. Arch. Mal. Coeur 59:1665-80,1966.

10. RIBEIRO,C. Bases experimentais para o diagnóstico dos bloqueios intraventriculares. Rev.

Medicina Universal 25:275-280, 1972.

11. RIBEIRO, C; SANCHES, C; FERREIRA, R; ARAÚJO, A. e MARTINS-CORREIA, J.F.

A Acção da ajmalima, dos bloquoadores beta-adrenérgicos e do difenilhidantoinato do

sódio sobre a activação ventricular, estudada com eléctrodos intramurais. Bol. Soc. Port.

Cardiol. 8:175-197,1970 - 9:37-74,1971.

12. RIBEIRO, C; FERREIRA, R; SANCHES, C; CORREIA, M; LACXIMY, I; PERDIGÃO,

C; CARRAGETA, M; LONGO, A; ARAÚJO, A e PIRES-CARVALHO, M.H. A acção

antidisrítmica da lidocaína estudada com eléctrodos intramurais. Bol. Soc. Port. Cardiol.

10:34-46, 1972.

13. LONGO, A; MOURÃO, L; BOTAS, L e RIBEIRO, C. A procainanida efeitos

electrofisiológicos no animal experimental. Bol. Soc. Port. Cardiol. 17: 307-22,1979.

14. CERQUEIRA-GOMES, M; PÁDUA, F; RIBEIRO, C; AGUIAR, A J C; ABREU-LIMA,

C; BRUT0-C0STA, B; SANCHES, A; CABRAL, A; FELIX, S; LACXIMY, I;

MAYNONE-MARTINS; GONÇALVES, F e MAIA J. Estudos sobre o desvio esquerdo do

eixo médio do QRS. Estudo Cooperativo. I- Bases Experimentais e Clínicas. Jornal do

Médico 81:345-353,1973. II- Resultados Preliminares. Jornal do Médico 81:726-732,1973.

Page 228: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

Actas Bioq.1986; 1:231-132 231

CONCLUSÕES E ENCERRAMENTO DO CURSO

J. Martins e Silva

Instituto de Bioquímica, Faculdade de Medicina de Lisboa, Av. Prof. Egas Moniz, 1600 Lisboa,

Portugal

Concluímos agora dois dias de intenso trabalho dedicado aos fundamentos da

"Contractilidade Muscular no âmbito do 1º Curso Avançado de Bioquímica Aplicada à

Medicina.

O programa apresentado justificou a associação cientifica e de trabalho prático comum de

dois serviços, um com vocação essencialmente hospitalar - a UTIC-AC do Hospital de Santa

Maria – e outro com características basicamente académicas, de ensino e investigação

experimental - o Instituto de Bioquímica, FML.

Consolidando o que o Professor Carlos Ribeiro afirmou na lição inaugural, desejamos

reafirmar o nosso desejo de que este vínculo de actividade partilhada permaneça e, sobretudo, se

fortifique em acções desdobradas que visem o aperfeiçoamento da ciência experimental numa

perspective aplicada a assuntos que, só na aparência, se afiguram com características

essencialmente clínicas. Da nossa parte - Instituto de Bioquímica - apraz-nos bastante registar

tão forte vínculo, como este que temos tido a felicidade de manter com a UTIC-AC, sob a

direcção do Professor Carlos Ribeiro, e que, após quase 10 anos, convergiu nesta iniciativa

pedagógica comum, dirigida a uma fase de pós-graduação plurifacetada em várias áreas da

Medicina.

Foi também uma grande honra para a Organização deste Curso ter merecido tão notável

leque de patrocinadores científicos como o verificado, e que, mais uma vez importa salientar por

elementar justiça, e que são os seguintes:

(i) Instituições académicas e do Ensino Superior:

Faculdade de Medicina de Lisboa

Reitoria da Universidade de Lisboa

Secretaria do Estado do Ensino Superior

(ii) Instituições científicas:

INIC

Page 229: “CONTRACTILIDADE MUSCULAR”...O sistema T é constituído por invaginações da membrana plasmática, que c orrem perpendicularmente ao eixo da célula muscular, a nível da junção

MARTINS E SILVA J.

232

(iii) Sociedades Cientificas:

Sociedade Portuguesa da Bioquímica

Sociedade Portuguesa de Cardiologia

Será ainda importante realçar a colaboração que merecemos da Indústria Privada, com

actividade orientada para a área médica, e que co-possibilitaram a concretização deste Curso.

Nesta oportunidade, é-nos grato destacar e agradecer o apoio recebido de Bayer Portugal, Ciba-

Geigy Portuguesa, Companhia Higiene Portuguesa, HemoPortugal, Laboratórios Delta,

Munditer, Neo-Farmacêutica, Ranx-Xerox e Sogás.

Noutro nível importa dar o devido relevo à participação de prelectores oriundos não só da

Faculdade de Medicina de Lisboa/Hospital de Santa Maria, mas ainda da Faculdade de Ciências

Médicas, Faculdade de Medicina do Porto e Centro Gulbenkian de Ciência.

Com tão variado conjunto de especialistas, tornou-se visível a abordagem da

CONTRACTILIDADE MUSCULAR, desde as suas bases histológicas nos diversos tipos

musculares (por Trindade dos Anjos) até aos aspectos mais significativos da isquemia do

miocárdio (por Rafael Ferreira) e electrogénese cardíaca (por Carlos Ribeiro, Álvaro Bordalo,

Armando Longo, Bastos Machado), passando pelos fundamentos indispensáveis de Bioquímica

(Carlota Saldanha, João Freitas, Lúcio Botas, Martins e Silva), da Fisiologia (Joaquim Silva

Carvalho, Luís Silva Carvalho, Basílio Pinto) e Farmacologia (Serafim Guimarães, Polónia,

Alexandre Ribeiro), sem esquecer as particulares repercussões na Neurologia (Fernando

Morgado).

Tivemos assim a felicidade de congregar o muito saber e experiência de distintos

cientistas nacionais que, na área das ciências básicas - morfológicas ou experimentais - ou de

ciências clínicas, há muito cultivam aspectos tão importantes como os que aqui nos deram a

conhecer.

A tão favorável ambiente conjuntural, como o referido, foi ainda possível receber o

interesse de tão numeroso e interessado número de participantes que acompanhou, desde o

primeiro minuto, os trabalhos do Curso e que, por tal, justificam amplamente a nossa admiração

e agradecimento.

Estamos em crer que os objectivos traçados pela organização foram integralmente cumpridos. É

nossa convicção de que após estes dois dias de trabalho foi conseguida uma reciclagem e/ou

ampliação de conhecimentos iniciais. Estamos também certos de que o assunto discutido

suscitou motivações a concretizar em pesquisas em futuro próximo por bastantes participantes,

nos seus serviços de origem.

Os trabalhos estão concluídos.

Em nome da Organização, Secretariado e todos os que contribuíram directamente para o

bom êxito deste Curso, desejamos expressar os nossos cumprimentos de despedida e gratidão

pelo interesse revelado.