Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP ......(Powys, 1838) (MORTON & CHAN, 2004) e I....

130
Leonardo Querobim Yokoyama Nassarius vibex (Gastropoda, Nassariidae): crescimento e reprodução em bancos de mitilídeos de substrato areno-lamoso na costa Sudeste do Brasil São Paulo 2010

Transcript of Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP ......(Powys, 1838) (MORTON & CHAN, 2004) e I....

Leonardo Querobim Yokoyama

Nassarius vibex (Gastropoda, Nassariidae): crescimento

e reprodução em bancos de mitilídeos de substrato

areno-lamoso na costa Sudeste do Brasil

São Paulo 2010

Leonardo Querobim Yokoyama

Nassarius vibex (Gastropoda, Nassariidae): crescimento e

reprodução em bancos de mitilídeos de substrato areno-

lamoso na costa Sudeste do Brasil

Tese apresentada ao Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, para a obtenção de Título de Doutor em Ciências, na Área de Zoologia. Orientadora: Profa. Dra. Antonia Cecília. Z. Amaral

Capa: foto de Nassarius vibex e do banco de mitilídeos da Praia da Cidade (Caraguatatuba, SP)

Ficha Catalográfica

Yokoyama, Leonardo Q. Nassarius vibex (Gastropoda, Nassariidae): crescimento e reprodução em bancos de mitilídeos de substrato areno-lamoso na costa Sudeste do Brasil 123p. Tese (Doutorado) - Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo. Departamento de Zoologia. 1. Nassarius vibex 2. Crescimento 3. Reprodução. I. Universidade de São Paulo. Instituto de Biociências. Departamento de Zoologia.

Comissão Julgadora:

Prof(a). Dr(a).

Prof(a). Dr(a).

Prof(a). Dr(a).

Prof(a). Dr(a).

Profa. Dra. Antonia Cecília Z. Amaral

Orientadora

A meus pais e Mê

Agradecimentos

À Cecília, pela orientação, grande amizade, conselhos, “puxões de orelha” e muitas alegrias ao

longo desses quase quatro anos.

Ao Prof. Pedro Gnaspini Neto pelo auxílio com as formalidades de orientação durante minha

matrícula.

Ao Prof. Luiz Simone pelos auxílios com a espécie durante o desenvolvimento do trabalho.

Aos Profs Paulo Inácio e Stelios Katsanevakis pela grande ajuda com as análises de máxima

verossimilhança e dos modelos alométricos.

À CAPES pela bolsa concedida.

Ao Curso de Pós-graduação do IB-USP por proporcionar acesso a ótimas disciplinas. Aos

secretários Érika e Helder, sempre solucionando as minhas dúvidas mais confusas.

À PROAP/USP, CNPQ, FAEPEX/UNICAMP e FAPESP pelos recursos financeiros.

Ao CEBIMar-USP pelo apoio logístico durante as coletas. Aos técnicos Zéilto, Joseph, Edu e

Elso.

Ao Laboratório de Macrobentos Marinhos do Departamento de Biologia Animal do

IB/UNICAMP pela infraestrutura para realização deste trabalho.

Ao laboratório de Citoquímica e Imunocitoquímica do Departamento de Histologia e Embriologia

da UNICAMP pela infraestrutura no início do desenvolvimento das análises histológicas. Ao Juvani por

sempre me atender mesmo para conseguir um simples reagente.

À meu “irmão” Gustavo, não só pelos conselhos estatíscos, mas também pela grande amizade de

quase 10 anos!

À meus grandes amigos André e Piricas. As quartas-feiras eram sempre um dos melhores dias da

semana..... Ao grande Jolnnye, amigo como poucos.....risadas não faltaram durante esses quatro anos.

À minhas amigas Mônica (vou sentir falta do café) e Michela. Os dinossauros que sobraram em

Campinas! Apesar de não nos vermos tanto como antes, é sempre muito bom conversar com vocês. Pri

(Bochecha), Aninha, Thais e Humbs, as reuniões demoram pra acontecer, mas sempre são fantásticas!

À toda turma do lab: Tati, Silvana, Camila, Rachel, Carol, Thalita, Marcela, Guilherme, Ana,

Natália, Fernanda, Micael e Giulia. Até mesmo aqueles que tomaram outros rumos (Gi, Vitor e Pri).

Ao amigo Flávio pelas conversas animadas e os “pits-stops” no final da tarde.

Aos amigos de Sampa: André, Sérgio, Bruno, Márcio e Fukuda.

Ao Joaquim (Kim) pelas bem-humoradas viagens até São Sebastião.

A meus pais, Carmen e Mauro, por sempre acreditarem em mim. A minha irmã Maysa, ao Felipe

e à Juju, pois iluminaram ainda mais a nossa família. À Milce, Nivaldo, Mô e Arnaldo pelo grande

carinho que sempre tiveram comigo!

À Mê. Qual seria a graça de tudo sem você ao meu lado... Obrigado pela compreensão nos

momentos difíceis e apoio incondicional.

Conteúdo Introdução Geral ........................................................................................................................... 1 Capítulo 1. – Caracterização estrutural dos bancos de Mytella charruana: Camaroeiro e Cidade............................................................................................................................................ 10

Resumo.................................................................................................................................... 10 Abstract ................................................................................................................................... 11 Introdução................................................................................................................................ 12 Metodologia ............................................................................................................................ 13

Área de estudo................................................................................................................ 13 Amostragem e procedimentos de laboratório................................................................ 15 Análise dos dados........................................................................................................... 16

Resultados ............................................................................................................................... 17 Caracterização ambiental.............................................................................................. 17 Caracterização da fauna associada............................................................................... 20

Discussão................................................................................................................................. 24 Considerações finais................................................................................................................ 27 Referências bibliográficas ....................................................................................................... 27

Capítulo 2. – Estágios de desenvolvimento das cápsulas ovígeras.............................................. 30 Resumo.................................................................................................................................... 30 Abstract ................................................................................................................................... 31 Introdução................................................................................................................................ 32 Metodologia ............................................................................................................................ 33

Amostragem e procedimentos de laboratório................................................................ 33 Análise dos dados........................................................................................................... 34

Resultados ............................................................................................................................... 34 Discussão................................................................................................................................. 37 Considerações finais................................................................................................................ 41 Referências bibliográficas ....................................................................................................... 41

Capítulo 3. – Biologia populacional............................................................................................. 44 Resumo.................................................................................................................................... 44 Abstract ................................................................................................................................... 45 Introdução................................................................................................................................ 46 Metodologia ............................................................................................................................ 48

Amostragem e procedimentos de laboratório................................................................ 48 Análise dos dados........................................................................................................... 50

Resultados ............................................................................................................................... 52 Densidade....................................................................................................................... 52 Estrutura populacional, crescimento e recrutamento.................................................... 54 Mortalidade e produção secundária.............................................................................. 59

Discussão................................................................................................................................. 59 Densidade....................................................................................................................... 59 Estrutura populacional, crescimento e recrutamento.................................................... 63 Mortalidade e produção secundária.............................................................................. 68

Considerações finais................................................................................................................ 71 Referências bibliográficas ....................................................................................................... 72

Capítulo 4. – Crescimento alométrico.......................................................................................... 77 Resumo.................................................................................................................................... 77 Abstract ................................................................................................................................... 78 Introdução................................................................................................................................ 79

Metodologia ............................................................................................................................ 81 Amostragem e procedimentos de laboratório................................................................ 81 Análise dos dados........................................................................................................... 82

Resultados ............................................................................................................................... 84 Morfometria................................................................................................................... 84 Crescimento relativo. .....................................................................................................86

Discussão................................................................................................................................. 89 Morfometria................................................................................................................... 89 Crescimento relativo. .....................................................................................................92

Considerações finais................................................................................................................ 94 Referências bibliográficas ....................................................................................................... 94

Capítulo 5. – Biologia reprodutiva............................................................................................... 98 Resumo.................................................................................................................................... 98 Abstract ................................................................................................................................... 99 Introdução.............................................................................................................................. 100 Metodologia .......................................................................................................................... 101

Amostragem e procedimentos de laboratório.............................................................. 101 Análise dos dados......................................................................................................... 102

Resultados ............................................................................................................................. 102 Razão sexual e variação morfométrica........................................................................ 102 Ciclo reprodutivo......................................................................................................... 104

Discussão............................................................................................................................... 113 Razão sexual................................................................................................................. 113 Variação morfométrica................................................................................................ 115 Ciclo reprodutivo......................................................................................................... 116

Considerações finais.............................................................................................................. 118 Referências bibliográficas ..................................................................................................... 119

Considerações Gerais................................................................................................................ 122

1

Introdução Geral

Grande parte das espécies da família Nassariidae habita normalmente substratos moles,

com alguns representantes ocorrendo em costões rochosos (BROWN, 1982). Espécies

pertencentes ao grupo Bullia são encontradas em substrato arenoso, particularmente em áreas

protegidas da ação das ondas (BROWN, 1982). O gênero Nassarius é comum em praias areno-

lamosas (BRITTON & MORTON, 1994) e associado a bancos de mitilídeos. Estes bancos,

formados por uma matriz de indivíduos vivos, conchas mortas, sedimento, fezes, pseudofezes e

filamentos do bisso, possuem uma disponibilidade significativa de habitats para um grande

número de organismos (HAMMOND & GRIFFITHS, 2004). A macrofauna associada a esses

ambientes é ricamente diversificada, sendo composta por epibiontes móveis que se abrigam entre

os espaços, devido ao agrupamento dos mitilídeos (ALBRECHT, 1998; REISE, 2002), fornecendo

alimento e proteção para aqueles organismos com tolerância restrita ao estresse ambiental (THIEL

& ULLRICH, 2002).

A maioria dos estudos sobre os Nassariidae tratam da influência de certos compostos

como a tributilína (TBT) sobre o processo de imposex (BARROSO et al., 2001, 2002; MARSHALL

& RAJKUMAR, 2003; SOUSA et al., 2005), na análise da dieta alimentar (MORTON & CHAN,

2003), em alguns aspectos ecológicos e morfológicos da reprodução (KASINATHAN et al., 1974;

HOUSTON, 1978; PECHENIK, 1978; BARNETT et al., 1980; TALLMARK , 1980; LAMBECK, 1984;

SILVA & BROWN, 1985; BARROSO & MOREIRA, 1998; CHEUNG & LAM , 1999; DEMAINTENON,

2001a,b; CHAN & MORTON, 2005) e na caracterização de suas cápsulas ovígeras (SCHELTEMA,

1962; PECHENIK, 1978; SULLIVAN & MAUGEL, 1984; SILVA & BROWN, 1985, D’ASARO, 1993;

CHAN, 1998; CHEUNG & LAM , 1999). Alguns nassarídeos possuem comprovada importância na

estruturação de comunidades bentônicas por meio de suas atividades forrageadoras (ANDERSON

& UNDERWOOD, 1997; KELAHER et al., 2003). Ilyanassa obsoleta (Say, 1822), comum em

regiões temperadas, possui uma participação significativa no ecossistema estuarino por

influenciar negativamente o desenvolvimento de comunidades microbianas (PACE et al., 1979;

CONNOR & EDGAR, 1982), acelerar a ciclagem de nutrientes no fundo (LEVINTON, 1985) e

controlar a abundância de poliquetas no nível superior da região entremarés (KELAHER et al.,

2

2003). Alimentação, defecação e escavação de certos gastrópodes podem diminuir o

assentamento e o recrutamento de outras espécies tanto pela ingestão de larvas e recrutas recém

assentados como pelo soterramento de larvas e juvenis (HUNT et al., 1987). Além disso, ao

ressuspenderem o sedimento por meio de sua locomoção, alguns gastrópodes podem reduzir a

capacidade de filtração de espécies suspensívoras (HUNT, et al., 1987) e até mesmo levar a

exclusão de outras (DEWITT & LEVINTON, 1985). Portanto, espécies que vivem associadas a

bancos de mitilídeos podem não somente ter papel importante na estruturação dessa comunidade

como também apresentar padrões populacionais e reprodutivos contrastantes à aquelas que

ocupam outros tipos de ambientes.

A compreensão dos padrões de crescimento de uma espécie muitas vezes implica na

determinação de suas estruturas etária e populacional (GRANT et al., 1987). Gastrópodes

normalmente possuem partes duras cujas estriações periódicas podem ser utilizadas para estimar

sua idade. Esta periodicidade muitas vezes é resultado da diminuição do crescimento associada

ao período reprodutivo ou a alguma variação ambiental (KNUTSON et al., 1972; LUTZ &

RHOADS, 1979; OLIVE , 1979; WILLIAMSON & KENDALL, 1981; NICHOLS et al., 1985). A dedução

dos atributos de uma população também pode ser realizada por meio da construção de

histogramas de freqüência de tamanho (CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2008). Esta

metodologia se baseia na premissa de que o tamanho dos indivíduos em cada conjunto de

organismos com idade semelhante (coorte) se aproxima de uma distribuição normal (MORALES-

NIN, 1992). Esta distribuição pode ser posteriormente analisada graficamente por meio da

freqüência cumulativa de cada coorte (BHATTACHARYA , 1967) ou por métodos estatísticos

apoiados na máxima verossimilhança (GRANT et al., 1987; MORALES-NIN, 1992; MACDONALD &

DU, 2008). Entretanto, recrutamento de pequeno porte, variação na época reprodutiva,

mortalidade e fusão das classes etárias mais velhas podem mascarar o real número de coortes de

uma população (CERRATO, 1980; GRANT et al., 1987). A técnica de marcação e recaptura de

indivíduos também pode fornecer informações sobre a estrutura etária de uma população

(GRANT et al., 1987) e é facilmente aplicada a gastrópodes por meio de marcadores

fluorescentes, etiquetas coloridas ou produção de marcas nas conchas (ROPES & MERRILL, 1970;

WILLIAMSON & KENDALL, 1981; EBERT, 1982; ROPES et al., 1984). Entretanto, para espécies

3

com grande tamanho populacional ou elevada mobilidade, as taxas de recaptura podem se tornar

muito baixas.

Os principais fatores no controle do crescimento das espécies de Nassariidae são

mudanças sazonais na temperatura da água, salinidade, disponibilidade de alimento e idade

(CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2008). O aumento no crescimento de Nassarius reticulatus

(Linnaeus, 758) (TALLMARK , 1980; LAMBECK, 1984; BARROSO et al., 2005a), N. festivus

(Powys, 1838) (MORTON & CHAN, 2004) e I. obsoleta (CURTIS, 1995) foi devido as temperaturas

elevadas durante o verão. RICHMOND e WOODIN (1996) provaram que a salinidade afetou a taxa

de crescimento de I. obsoleta. O tamanho médio dos adultos de Nassarius pauperatus (Lamarck,

1822) variou significativamente com a disponibilidade de alimento (MCKILLUP & BUTTLER,

1983), assim como recursos alimentares limitados retardaram o crescimento de Nassarius

dorsatus (Roding, 1798) (MCKILLUP & MCKILLUP, 1997). Já o crescimento de N. reticulatus foi

maior durante o primeiro ano de vida da espécie, entretanto, com a chegada da maturidade sexual

as taxas de crescimento tornaram-se irregulares (TALLMARK , 1980; BARROSO et al., 2005a).

Recentemente, o crescimento de N. reticulatus foi avaliado por meio de anéis de crescimento em

estatólitos (BARROSO et al., 2005b; CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2007) e distribuição de

freqüências de tamanho da concha (CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2008).

Com relação a longevidade e o recrutamento, há variações dentro da família. Nassarius

dorsatus na região de Coorooman Creek, Austrália, recruta durante o ano todo e apresenta um

rápido crescimento, mas um período de vida de apenas dois meses (MCKILLUP & MCKILLUP,

1997), enquanto que I. obsoleta, da baia de Delaware, Estados Unidos, possui um ciclo de vida

de aproximadamente 40 anos (CURTIS, 1995). O crescimento de N. reticulatus ocorre durante os

primeiros cinco anos de vida da espécie, sendo que a expectativa de vida foi estimada em 11

anos (BARROSO et al., 2005a). Nassarius festivus possui uma alta taxa de crescimento, que varia

de 2,00 a 2,70 mm no comprimento da concha por ano e uma expectativa de vida curta, variando

de 22 a 29 meses (MORTON & CHAN, 2004).

A liberação de gametas e o desenvolvimento larval são capazes de influenciar a

abundância e a distribuição de invertebrados marinhos (MORAN, 1997). Desta forma,

informações sobre a biologia reprodutiva e o desenvolvimento de gastrópodes, especialmente a

4

sazonalidade na reprodução, a duração da fase larval e o número de embriões produzidos

anualmente, são de suma importância para uma melhor compreensão de sua biologia

populacional, estrutura genética e ecologia (CHAPARRO et al. 2005). Na maioria dos gastrópodes

prosobrânquios, a atividade gamética é sincrônica dentro das populações e a maturação ocorre

em um determinado período. Entretanto, para algumas espécies, a gametogênese é assincrônica

entre indivíduos ou entre os sexos (WEBBER, 1977; ILANO et al., 2003).

Nassarídeos normalmente apresentam um padrão anual de reprodução com liberação de

gametas restrita a alguns meses, normalmente durante a primavera e o verão (BROWN, 1982). No

entanto, algumas espécies do gênero Nassarius podem se reproduzir no meio do inverno

(PECHENIK, 1978). Em N. festivus, a maturação gametogênica, regulada pela temperatura e

salinidade da água, ocorre no outono, com liberação de gametas restrita ao inverno (CHAN &

MORTON, 2005). A temperatura foi o principal fator regulador dos ciclos reprodutivos anuais de

N. reticulatus (TALLMARK , 1980) e N. obsoletus (Say, 1822) (SCHELTEMA, 1967). De uma

maneira geral, observa-se um pequeno conjunto de informações sobre a biologia reprodutiva de

Nassariidae.

Nassarius vibex (Say, 1822), espécie comum em regiões entremarés de praias areno-

lamosas no sudeste dos EUA (DEMAINTENON, 2001a), Caribe, Venezuela, e Brasil (RIOS, 1994),

pode alcançar até 15 mm no comprimento da concha (DEMAINTENON, 2001a). As informações

disponíveis sobre esta espécie referem-se a estudos sobre a ontogenia de seu sistema reprodutor

(DEMAINTENON, 2001a), a descrição de suas cápsulas ovígeras e larvas (SCHELTEMA, 1962;

D’A SARO, 1993), ao fenômeno de imposex (DEMAINTENON, 2001b), a observações sobre

resposta de escape (GORE, 1966), seus hábitos alimentares (HURST, 1965) e relações

morfométricas entre os tamanhos da concha e da rádula (MEIRELES & MATTHEWS-CASCON,

2003). Por ser uma espécie carnívora e que se alimenta de carcaças (MOORE et al., 1968;

BROWN, 1969; BRITTON & MORTON, 1994; HARASEWYCH, 1998; ARRUDA et al., 2003), é

possível que este nassarídeo, assim como I. obsoleta, tenha importância na regulação e

estruturação da comunidade de bancos de mitilídeos promovendo a ciclagem dos nutrientes. No

Litoral Norte do Estado de São Paulo, N. vibex ocorre associada a bancos de Mytella charruana

(D’Orbigny, 1842). Diante do exposto, o estudo populacional e reprodutivo de N. vibex não só

5

tem sua importância para o aumento do conhecimento sobre sua biologia, como também para

auxiliar na interpretação de como está estruturada a comunidade de bancos de mitilídeos.

Atendendo aos objetivos deste estudo, esse trabalho abordará, em seus cinco capítulos, os

resultados obtidos sobre as características dos bancos de mitilídeos, onde vive N. vibex, a espécie

de Gastropoda em foco; e do crescimento, da reprodução e do recrutamento.

O Capítulo 1 apresenta uma caracterização dos bancos de M. charruana das praias do

Camaroeiro e da Cidade (Caraguatatuba, SP), incluindo a avaliação de alguns parâmetros

ambientais (salinidade e temperatura da água, granulometria e teores de calcário e matéria

orgânica) e da fauna de invertebrados associada aos bancos.

No Capítulo 2, os estágios de desenvolvimento e a deposição das cápsulas ovígeras de N.

vibex são apresentados.

No Capítulo 3, são avaliados os padrões de crescimento, estrutura populacional e

recutamento de N. vibex, assim como as análises de densidade, mortalidade e produção

secundária, adicionadas às comparações entre as populações.

O crescimento relativo ou alométrico é o tema principal do Capítulo 4. Diferenças nas

proporções do crescimento entre os diferentes parâmetros morfológicos de N.vibex foram

averiguados utilizando metodologias que considerem as variações no crescimento ao longo do

tempo.

O Capítulo 5 trata do ciclo reprodutivo das duas populações de N. vibex, incluindo

avaliação da maturação gametogênica por meio de observações histológicas, diferenças na razão

sexual e existência de dimorfismo sexual no tamanho da concha.

No final do trabalho são apresentadas as Considerações Gerais, que inclui um indicador

dos principais resultados discutidos no trabalho.

6

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Albrecht, A.S. 1998. Soft bottom versus hard rock: Community ecology of macroalgae on intertidal mussel beds in the Wadden Sea. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 229: 85-109.

Anderson, M.J. & Underwood, A.J. 1997. Effects of gastropod grazers on recruitment and succession of an estuarine assemblage: a multivariate and univariate approach. Oecologia, 109: 442-453.

Arruda, E.P.; Domaneschi, O. & Amaral, A.C.Z. 2003. Mollusc feeding guilds on sandy beaches in São Paulo State, Brazil. Mar. Biol., 143: 691-701.

Barnett, P.R.O.; Hardy, B.L.S. & Watson, J. 1980. Substratum selection and egg-capsule deposition in Nassarius reticulatus (L.). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 45: 95-103.

Barroso, C.M. & Moreira, M.H. 1998. Reproductive cycle of Nassarius reticulatus in the Ria de Aveiro, Portugal: Implications for imposex studies. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 78: 1233-1246.

Barroso, C.M.; Moreira, M.H. & Bebianno, M.J. 2002. Imposex, female sterility and organotin contamination of the prosobranch Nassarius reticulatus from the Portuguese coast. Mar. Ecol. Prog. Ser., 230: 127-135.

Barroso, C.M.; Moreira, M.H. & Richardson, C.A. 2005a. Age and growth of Nassarius reticulatus in the Ria de Aveiro, north-west Portugal. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 85: 151-156.

Barroso, C.M.; Nunes, M.; Richardson, C.A. & Moreira, M.H. 2005b. The gastropod statolith: a tool for determining the age of Nassarius reticulatus. Mar. Biol., 146: 1139-1144.

Barroso, C.M.; Reis-Henrique, M.A.; Ferreira, M.S. & Moreira, M.H. 2001. The effectiveness of some compounds derived from antifouling paints in promoting imposex in Nassarius reticulatus. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 82: 249-255.

Bhattacharya, C.G. 1967. A simple method of resolution of a distribution into Gaussian components. Biometrics, 23: 115-135.

Britton, J.C. & Morton, B. 1994. Marine carrion and scavengers. Oceanogr. Mar. Biol. Annu. Rev., 32: 369-434.

Brown, A.C. 1982. The biology of sandy-beach whelks of the genus Bullia (Nassariidae). Oceanogr. Mar. Biol. Annu. Rev., 20: 309-361.

Brown, S.C. 1969. The structure and function of the digestive system of the mud-snail Nassarius obsoletus (Say). Malacologia, 9: 447-500.

Cerrato, R.M. 1980. Demographic analysis of bivalve populations. In: Skeletal growth of aquatic organisms: biological records of environmental change (Rhoads, D.C. & Lutz, R.A., eds), pp. 417-465. Plenum Press, New York.

Chan, K. 1998. The development of Nassarius festivus (Powys 1835) (Gastropoda: Nassariidae) in Hong Kong. In: Proceedings of the 3rd International Conference on the Marine Biology of the South China Sea (Morton, B., ed.), pp. 321-330. Hong Kong University Press, Hong Kong.

Chan, K. & Morton, B. 2005. The reproductive biology of Nassarius festivus (Powis, 1835) (Gastropoda: Nassariidae) in relation to seasonal changes in temperature and salinity in subtropical Hong Kong. Aqua. Ecol., 32: 213-228.

Chaparro, O.R.; Saldivia, C.L.; Pereda, S.V.; Segura, C.J.; Montiel, Y.A. & Collin, R. 2005. The reproductive cycle and development of Crepipatella fecunda (Gastropoda: Calyptraeidae) from southern Chile. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 85: 157-161.

Chatzinikolaou, E. & Richardson, C.A. 2007. Evaluating growth and age of netted whelk Nassarius reticulatus (Gastropoda: Nassariidae) using statolith growth rings. Mar. Ecol. Prog. Ser., 342: 163-176.

Chatzinikolaou, E. & Richardson, C.A. 2008. Population dynamics and growth of Nassarius reticulatus (Gastropoda: Nassariidae) in Rhosneigr (Anglesey, UK). Mar. Biol., 153: 605-619.

7

Cheung, S.G. & Lam, S. 1999. Effect of food availability on egg production and packaging in the intertidal scavenging gastropod Nassarius festivus. Mar. Biol., 135: 281-287.

Connor, M.S. & Edgar, R.K. 1982. Selective grazing by the mud snail Ilyanassa obsoleta. Oecologia, 53: 271-275.

Curtis, L.A. 1995. Growth, trematode parasitism, and longevity of a long-lived marine gastropod (Ilyanassa obsoleta). J. Mar. Biol. Ass. U.K., 75: 913-925.

D'Asaro, C.N. 1993. Gunnar Thorson´s world-wide collection of prosobranch egg capsules: Nassariidae. Ophelia, 38: 149-215.

Demaintenon, M.J. 2001a. Analysis of reproductive system ontogeny and homology in Nassarius vibex (Gastropoda: Buccinidae: Nassariinae). J. Mollus. Stud., 67: 37-49.

Demaintenon, M.J. 2001b. Ontogeny of the pseudohermaphroditic reproductive system in Nassarius vibex (Gastropoda: Buccinidae: Nassariinae). J. Mollus. Stud., 67: 51-57.

DeWitt, T.H. & Levinton, J.S. 1985. Disturbance, emigration, and refugia: How the mud snail, Ilyanassa obsoleta (Say), affects the habitat distribution of an epifaunal amphipod, Microdeutopus gryllotalpa (Costa). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 92: 97-113.

Ebert, T.A. 1982. Longevity, life history, and relative body wall size in sea urchins. Ecol. Monogr., 52: 353-394.

Grant, A.; Morgan, P.J. & Olive, P.J.W. 1987. Use made in marine ecology of methods for estimating demographic parameters from size/frequency data. Mar. Biol., 95: 201-208.

Gore, R.H. 1966. Observations on the escape response of Nassarius vibex (Say) (Mollusca: Gastropoda). Bull. Mar. Sci., 16: 423-434.

Hammond, W. & Griffiths, C.L. 2004. Influence of wave exposure on South African mussel beds and their associated infaunal communities. Mar. Biol., 144: 547-552.

Harasewych, M.G. 1998. Family Nassaridae. In: Mollusca: The Southern Synthesis. Fauna of Australia. Vol. 5 (Beesley, P.L.; Ross, G.J.B. & Wells, A., eds), pp. 829-831. CSIRO Publishing, Melbourne.

Houston, R.S. 1978. Notes on the spawning and egg capsules of two prosobranch gastropods: Nassarius tiarula (Kiener, 1841) and Solenosteira macrospira (Berry, 1957). Veliger, 20: 367-368.

Hunt, J.H.; Ambrose, W.G.Jr. & Peterson, C.H. 1987. Effects of the gastropod, Ilyanassa obsoleta (Say) and the bivalve, Mercenaria mercenaria (L.), on larval settlement and juvenile recruitment of infauna. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 108: 229-240.

Hurst, A. 1965. The feeding habits of Nassarius vibex (Say). Proc. Malacol. Soc. Lond., 36: 313.

Ilano, A.S.; Fujinaga, K. & Nakao, S. 2003. Reproductive cycle and size at sexual maturity of the commercial whelk Buccinum isaotakii in Funka Bay, Hokkaido, Japan. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 83: 1287-1294.

Kasinathan, R.; Govidan, K. & Natarajan, R. 1974. Notes on the spawning and hatching of three species of marine gastropods. Mal. Rev., 7: 133-135.

Kelaher, B.P.; Levinton, J.S. & Hoch, J.M. 2003. Foraging by the mud snail, Ilyanassa obsoleta (Say), modulates spatial variation in benthic community structure. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 292: 139-157.

Knutson, D.W.; Buddemeier, R.W. & Smith, S.V. 1972. Coral chronometers: seasonal growth bands in reef corals. Science, 177: 270-272.

Lambeck, R.H.D. 1984. Dynamics, migration and growth of Nassarius reticulatus (Mollusca, Prosobranchia) colonizing saline lake Grevelingen (SW Netherlands). Neth. J. Sea Res., 18: 395-417.

8

Levinton, J.S. 1985. Complex interactions of a deposit feeder with its resources—roles of density, a competitor, and detrital addition in the growth and survival of the mudsnail Hydrobia totteni. Mar. Ecol. Prog. Ser., 22: 31-40.

Lutz, R.A. & Rhoads, D.C. 1979. Growth patterns within the molluscan shell. In: Skeletal growth of aquatic animals (Rhoads, D.C. & Lutz, R.A., eds), pp. 203-254. Plenum Press, New York.

Macdonald, P.D.M. & Du, J. 2008. Mixdist: Finite Mixture Distribution Models, R package. Version 0.5-2. http://www.math.mcmaster.ca/peter/mix/mix.html. Último acesso: 25 de agosto de 2009.

Marshall, D.J. & Rajkumar, A. 2003. Imposex in the indigenous Nassarius kraussianus (Mollusca : Neogastropoda) from South African harbours. Mar. Poll. Bull., 46: 1150-1151.

McKillup, S.C. & Butler, A.J. 1983. The measurement of hunger as a relative estimate of food available to populations of Nassarius pauperatus. Oecologia, 56: 16-22.

McKillup, S.C. & McKillup, R.V. 1997. Effect of food supplementation on the growth of an intertidal scavenger. Mar. Ecol. Prog. Ser., 148: 109-114.

Meireles, C.A.O. & Matthews-Cascon, H. 2003. Relations between shell size and radula size in marine prosobranchs (Mollusca: Gastropoda). Thalassas, 19: 45-53.

Moore, H.B.; Davies, L.T.; Fraser, T.H.; Gore, R.H. & López, N.R. 1968. Some biomass figures from a tidal flat in Biscayne Bay, Florida. Bull. Mar. Sci., 18: 261-279.

Morales-Nin, B. 1992. Determination of growth in bony fishes from otolith microstructure. FAO Fish. Tech. Paper, 322: 1-51.

Moran, A.L. 1997. Spawning and larval development of the black turban snail Tegula funebralis (Prosobranchia: Trochidae). Mar. Biol., 128: 107-114.

Morton, B. & Chan, K. 2003. The natural diet and degree of hunger of Nassarius festivus (Gastropoda : Nassariidae) on three beaches in Hong Kong. J. Mollus. Stud., 69: 392-395.

Morton, B. & Chan, K. 2004. The population dynamics of Nassarius festivus (Gastropoda: Nassariidae) on three environmentally different beaches in Hong Kong. J. Mollus. Stud., 70: 329-339.

Nichols, D.; Sime, A.A.T. & Bishop, G.M. 1985. Growth in populations of the sea-urchin Echinus esculentus L. (Echinodermata: Echinoidea) from the English Channel and Firth of Clyde. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 86: 219-228.

Olive, P.J.W. 1979. Polychaete jaws. In: Skeletal growth of aquatic animals (Rhoads, D.C. & Lutz, R.A., eds), pp. 501-592. Plenum Press, New York.

Pace, M.L.; Shimmel, S. & Darley, W.M. 1979. The effect of grazing by a gastropod, Nassarius obsoletus, on the benthic microbial community of a salt marsh mudflat. Est. Coast. Mar. Sci., 9: 121-134.

Pechenik, J.A. 1978. Winter reproduction in gastropod Nassarius trivittatus. Veliger, 21: 297-298.

Reise, K. 2002. Sediment mediated species interactions in coastal waters. J. Sea Res., 48: 127-141.

Richmond, C.E. & Woodin, S.A. 1996. Short-term fluctuations in salinity: effects on planktonic invertebrate larvae. Mar. Ecol. Prog. Ser., 133: 167-177.

Rios, E.C. 1994. Seashells of Brazil. Fundação Universidade do Rio Grande, Rio Grande.

Ropes, J.W.; Jones, D.S.; Murawski, S.A.; Serchuk, F.M. & Jeald, A. 1984. Documentation of annual growth lines in ocean quahogs, Arctica islandica Linne. Fish. Bull., 82: 1-19.

Ropes, J.W. & Merrill, A.S. Marking surf clams. Proc. natn. Shellfish. Ass., 60: 99-106.

Scheltema, R.S. 1962. Pelagic larvae of New England intertidal gastropods. I. Nassarius obsoletus Say and Nassarius vibex Say. T. Am. Microsc. Soc., 81: 1-11.

9

Scheltema, R.S. 1967. The relationship of temperature to the larval development of Nassarius obsoletus (Gastropoda). Biol. Bull., 132: 253-265.

Silva, F.M.da & Brown, A.C. 1985. Egg capsules and veligers of the whelk Bullia digitalis (Gastropoda: Nassariidae). Veliger, 28: 200-203.

Sousa, A.; Mendo, S. & Barroso, C. 2005. Imposex and organotin contamination in Nassarius reticulatus (L.) along the Portuguese coast. App. Organ. Chem., 19: 315-323.

Sullivan, C.H. & Maugel, T.K. 1984. Formation, organization, and composition of the egg capsule of the marine gastropod, Ilyanassa obsoleta. Biol. Bull., 167: 378-389.

Tallmark, B. 1980. Population dynamics of Nassarius reticulatus (Gastropoda, Prosobranchia) in Gullmar fjord, Sweden. Mar. Ecol. Prog. Ser., 3: 51-62.

Thiel, M. & Ullrich, N. 2002. Hard rock versus soft bottom: the fauna associated with intertidal mussel beds on hard bottoms along the coast of Chile, and considerations on the functional role of mussel beds. Helgol. Mar. Res., 56: 21-30.

Webber, H.H. 1977. Gastropoda: Prosobranchia. In: Reproduction of marine invertebrates, vol. 4 (Giese, A.C. & Pearse, J.S., eds), pp. 1-95. Academic Press, New York.

Williamson, P. & Kendall, M.A. 1981. Population age structure and growth of the trochid Monodonta lineata determined from shell rings. J. Mar. Biol. Assoc. U.K., 61: 1011-1026.

10

Capítulo 1. – Caracterização estrutural dos bancos de

Mytella charruana: Camaroeiro e Cidade

RESUMO

A composição e abundância da fauna de invertebrados associados a dois bancos de

Mytella charruana em substratos inconsolidados, localizados nas praias do Camaroeiro e Cidade,

no Litoral Norte do Estado de São Paulo, foi analisada entre fevereiro de 2006 e fevereiro de

2007. Cada banco foi amostrado em sua parte central (nível médio) e nas bordas internas (níveis

superior e inferior). Posteriormente, as amostras foram lavadas com água do mar em malhas de 1

e 0,3 mm separadamente em fauna da concha (sedimento depositado na superfície externa da

concha e em bolhas-de-lama, encontradas na face interna da concha, fendas, perfurações e

bissos) e do substrato (formado pelo sedimento e outros componentes orgânicos e inorgânicos).

Ao todo foram amostrados 32.639 indivíduos associados às conchas de M. charruana, 14.432 no

banco do Camaroeiro e 18.207 no da Cidade, pertencentes principalmente a Polychaeta,

Crustacea, Mollusca e Nematoda. Polychaeta (64,90 e 63,13% dos indivíduos do Camaroeiro e

da Cidade, respectivamente) e Crustacea (18,36 e 17,05% dos indivíduos do Camaroeiro e da

Cidade, respectivamente) foram os taxa mais abundantes. Na fauna das conchas, poliquetas

foram os mais abundantes com 18 famílias identificadas, dentre as quais Spionidae foi a mais

comum representando 44,22% dos indivíduos do Camaroeiro e 80,50% dos indivíduos da

Cidade. Entre as espécies já identificadas, provenientes da concha, Polydora cornuta (6.599

inds) e Polydora neocaeca (6.626) foram as mais abundantes. No Camaroeiro, Polychaeta foi o

grupo dominante na fauna do substrato, seguido por Mollusca (Gastropoda). Na Cidade,

Polychaeta também foi dominante seguido por Crustacea (Decapoda) e Mollusca (Gastropoda e

Bivalvia).

11

ABSTRACT

The composition and abundance of the invertebrate fauna associated with two soft-

bottom beds of the mitilid Mytella charruana on Camaroeiro and Cidade beaches (northern coast

of the state of São Paulo), were analyzed between February 2006 and February 2007. The beds

were sampled in their central portion (middle level) and inner edges (upper and lower levels).

The samples were washed with seawater through 1.0 and 0.3 mm mesh sieves, and were

separated into shell (sediment settled on the external shell surface and in mud blisters on the

inner side of the shell, and in crevices, drill holes, and the byssum) and substrate faunas (formed

by the sediment and other organic and inorganic components). A total of 32,639 individuals

associated with the shells of M. charruana were collected, 14,432 at Camaroeiro Beach and

18,207 at Cidade, and were basically composed by Polychaeta, Crustacea, Mollusca, and

Nematoda. Polychaeta (64.90 and 63.13% of the individuals from Camaroeiro and Cidade,

respectively) and Crustacea (18.36 and 17.05% of the individuals from Camaroeiro and Cidade,

respectively) were the most abundant taxa. In the fauna of the shells, 18 families of polychaetes

were identified, of which Spionidae represented 44.22% and 80.5% of the individuals found at

Camaroeiro and Cidade, respectively. The species Polydora cornuta (6,599 inds) and Polydora

neocaeca (6,626) were the most abundant on the shells. Polychaeta was the dominant group in

the substrate fauna of the Camaroeiro bed, followed by Mollusca (Gastropoda); whereas in the

Cidade bed, Polychaeta was also dominant, but followed by Crustacea (Decapoda) and Mollusca

(Gastopoda and Bivalvia).

12

INTRODUÇÃO

Um grande número de espécies bentônicas de praias e costões rochosos contribui de

modo significativo para modificar a estrutura primária do substrato. Entre essas se encontram os

mitilídeos (Mytilidae), moluscos bivalves responsáveis pela formação de substratos biológicos

muito complexos (PAINE, 1976; LOI, 1981; JACOBI, 1987), em fundos moles ou duros. Os bancos

de mitilídeos formam uma matriz de indivíduos vivos e conchas de mortos, sedimento

acumulado, fezes e pseudofezes, em um emaranhado de filamentos do bisso, o que aumenta

significativamente a disponibilidade de habitats para um grande número de organismos

(HAMMOND & GRIFFITHS, 2004). Esses bancos, por possuírem características distintas do meio,

fornecem proteção para aqueles organismos com tolerâncias restritas a estresses ambientais

(SEED & SUCHANEK, 1992) e também funcionam como refúgios espaciais em comunidades

tropicais (MENGE & LUBCHENKO, 1981).

Dessa maneira, a fauna associada a esses bancos pode ser mais abundante do que aquelas

que habitam outras áreas, tais como fundos arenosos ou lamosos e superfícies rochosas. Porém,

alguns organismos decrescem em abundância ou são completamente ausentes nesses ambientes

(THIEL & ULLRICH, 2002). Verifica-se também que a riqueza e a diversidade de espécies

associadas aumentam com a idade e o tamanho do banco (TSUCHIYA & NISHIHIRA, 1985, 1986),

e decrescem com o nível da maré (SEED, 1996). Segundo LINTAS e SEED (1994) a maior parte da

fauna associada se especializa em camadas específicas do banco, da base do sedimento à

superfície da concha. E de acordo com WERNER (1988), a estrutura da comunidade pode ser

utilizada como indicadora de poluição.

Mytella charruana, popularmente conhecida como “sururu”, destaca-se por sua alta

densidade em bancos na região entremarés de substratos lamosos e lagoas costeiras (SIBAJA,

1985, PEREIRA et al., 2003). A sua distribuição estende-se desde a baía de Petatlán (México) até

o estuário de Guaya (Equador), na costa do Pacífico e ilhas Galápagos, e do golfo de Paria

(Venezuela) até o cabo de San Antonio (Argentina), na costa atlântica (NARCHI & GALVÃO -

BUENO, 1983; RIOS, 1994). Devido a sua abundância e fácil coleta, a espécie é altamente

consumida por populações locais, representando um importante item alimentar, principalmente

na região Nordeste do Brasil.

13

A agregação desses mitilídeos na parte inferior da zona entremarés, próximo da linha de

maré baixa é capaz de formar estruturas biológicas em fundos lamosos de grande extensão. O

propósito deste capítulo foi caracterizar dois bancos de Mytella charruana, da enseada de

Caraguatatuba, Litoral Norte do Estado de São Paulo, com relação a alguns parâmetros

ambientais. Além disso, a composição e abundância de espécies de invertebrados associados a

esses bancos também foram analisadas, uma vez que constituem substrato ocupado por

Nassarius vibex, gastrópode estudado neste trabalho quanto ao crescimento e reprodução.

METODOLOGIA

Área de estudo

As amostragens foram realizadas em dois bancos de Mytella charruana, situados nas

praias do Camaroeiro (23°37’38’’S, 45°23’50’’W) e da Cidade (23°37’27’’S, 45°23’56’’W),

extremo norte da enseada de Caraguatatuba (SP) (Fig. 1). Ambas estão localizadas no trecho

mais urbanizado da cidade de Caraguatatuba.

Figura 1. Localização da enseada de Caraguatatuba e das praias do Camaroeiro e da Cidade no Litoral Norte do Estado de São Paulo

14

A praia do Camaroeiro é composta por areia fina, pobre a moderadamente selecionada.

As ondas que ali chegam sofrem refração de diversas barreiras naturais, entre elas a ponta do

Camaroeiro. A faixa de surfe é bastante larga, devido à presença de inúmeros bancos arenosos

submersos que promovem uma arrebentação distante da linha de maré baixa (FARINACCIO,

2000). A largura da região entremarés em períodos de maré baixa está em torno de 50 m. O

banco de M. charruana, que desapareceu, no período final das coletas, localizava-se a cerca de

200 m do rio Ipiranga, em direção à ponta do Camaroeiro e possuía cerca de 40 m de

comprimento por 20 m de largura na sua porção central. Este banco situava-se paralelamente à

linha da praia, com formato elipsóide e uma borda elevada formada por denso agregado de

indivíduos de M. charruana. Na parte central, os bivalves encontravam-se enterrados no

sedimento, formando uma região mais profunda em relação ao nível do banco (Fig. 2A).

A praia da Cidade ocupa toda a orla do centro da cidade de Caraguatatuba até o rio Santo

Antônio, que a separa da praia do Indaiá. Segundo ARRUDA & DOMANESCHI (2005) é uma praia

composta por sedimento fino e muito fino, alto teor de silte-argila e pequenas proporções de

matéria orgânica e carbonato de cálcio. A largura da zona entremarés está em torno de 60 m. O

banco, situado paralelamente à linha da praia, localizava-se a cerca de 30 m do rio Ipiranga,

possuindo formato irregular a elipsóide, com diversas poças delimitadas por denso agregado de

bivalves. Neste banco, com cerca de 28 m de comprimento e 18 m de largura, os mitilídeos

ficavam todos acima do nível da praia e não foi registrada a ocorrência de indivíduos soterrados

(Fig. 2B).

A B

Figura 2. Bancos de Mytella charruana das praias do Camaroeiro (A) e da Cidade (B). Me: região onde os mitilídeos encontravam-se enterrados no sedimento. Fotos: Cecília Amaral.

Me

15

Amostragem e procedimentos de laboratório

A coleta da fauna associada dos bancos de M. charruana no Camaroeiro e na Cidade foi

realizada mensalmente de fevereiro de 2006 a fevereiro de 2007. Paralelamente a coleta dos

organismos, foram obtidas amostras para análise granulométrica do sedimento (granulometria e

teor de calcário e matéria orgânica), e variação da temperatura e salinidade por nível. Para

análise da variação mensal da temperatura da água do mar foram utilizados os dados obtidos

diariamente no Centro de Biologia Marinha da USP (CEBIMar-USP). Este procedimento foi

adotado uma vez que os valores médios dessas temperaturas, tomadas na praia do Segredo (São

Sebastião, SP, onde está localizado o CEBIMar-USP), foram semelhantes aos amostrados

mensalmente, somente no dia da coleta, nas praias do Camaroeiro e da Cidade.

A partir do eixo central de cada banco foi delimitado um setor retangular de 20 m de

comprimento por 15 m de largura (extensão aproximada dos bancos). Nestes, foram traçados 15

transectos perpendiculares à linha d’água, e a cada mês um deles foi sorteado para amostragem.

Cada banco foi amostrado em sua parte central (nível médio) e nas bordas internas (níveis

superior e inferior), utilizando-se um delimitador quadrado de 0,04 m2 de área. Posteriormente,

essas amostras foram triadas separadamente: 1) concha, fauna encontrada no sedimento

depositado na superfície externa da concha e em bolhas-de-lama, na face interna da concha, e em

fendas, perfurações e bissos e 2) substrato, animais contidos no substrato formado pelo mitilídeo,

sedimento e outros componentes orgânicos e inorgânicos.

Concha

Mensalmente, no laboratório do Centro de Biologia Marinha da USP (CEBIMar-USP),

foram efetuados os procedimentos de triagem de 15 (Camaroeiro) e 5 (Cidade) indivíduos

coletados por mês em cada nível (superior, médio e inferior). Os filamentos do bisso foram

separados das conchas e triados com auxílio de microscópio estereoscópico. A superfície externa

das valvas dos mitilídeos foi cuidadosamente raspada e o sedimento retirado era analisado, com

o auxílio de microscópio estereoscópico. Após a retirada dos animais sobre as valvas, os

indivíduos de M. charruana foram abertos com o auxílio de um estilete, sua carne separada da

concha e suas valvas foram, então, analisadas sob microscópio estereoscópico em busca da

16

endofauna, em bolhas, fendas e perfurações. Os animais foram anestesiados em mentol, fixados

em formalina a 6% e, posteriormente transportados ao Laboratório de Macrobentos Marinho do

Departamento de Biologia Animal da UNICAMP para a triagem da fauna. Esta foi contabilizada,

separada em grandes grupos e preservada em álcool a 70 % para posterior identificação com

auxílio de especialistas.

Substrato

Após a separação das conchas, o sedimento remanescente (0,04m2) foi triado em peneiras

de 1,0 e 0,3 mm de malha. Nesse processo, todos os organismos da macrofauna foram separados

e posteriormente quantificados e identificados.

Análise dos dados

A técnica de SUGUIO (1973) foi utilizada para a análise granulométrica. Os dados

granulométricos foram calculados pelo programa desenvolvido no Laboratório de

Sedimentologia do Instituto de Geociências, Universidade de São Paulo (USP), e os parâmetros

estatísticos com base no método de FOLK e WARD (1957). A avaliação dos teores de calcário e

matéria orgânica foi realizada pela metodologia proposta por AMOUREUX (1966).

O teste de Cochran (UNDERWOOD, 1997) foi utilizado para testar a homogeneidade das

variâncias, e para remover qualquer heterogeneidade, os dados foram transformados em

logaritmo (x+1) antes da análise de variância (ANOVA) aplicada aos parâmetros ambientais.

Uma ANOVA aninhada bifatorial foi usada para testar a hipótese nula de que não havia

diferença significativa nos parâmetros físico-químicos (salinidade, tamanho médio do grão,

porcentagens de areia, silte, calcário e matéria orgânica) entre as estações do ano, bancos e

níveis, e níveis aninhados com bancos. Estação do ano e banco foram os fatores fixos, e o nível

foi um fator aleatório no modelo.

17

RESULTADOS

Caracterização ambiental

No banco do Camaroeiro, o sedimento foi constituído predominantemente por areia fina,

pobre a moderadamente selecionada; porém houve variações de areia grossa a muito fina,

conforme os níveis amostrados, principalmente em maio de 2006 no nível inferior (Fig. 3).

Figura 3. Composição do sedimento dos bancos de Mytella charruana do Camaroeiro e da Cidade, por nível (superior, médio e inferior) entre maio de 2006 a março de 2007. Areia fina (AF), areia grossa (AG), areia média (AM), areia muito fina (AMF), areia muito grossa (AMG), seixo (Se), silte e argila (Si+Arg).

18

O teor médio mensal de areia variou de 92,35 ± 1,43% (fevereiro de 2006) a 98,21 ±

0,74% (fevereiro de 2007), e o tamanho médio do grão variou de 1,72 ± 0,27 φ (novembro de

2006) a 2,86 ± 0,19 φ (dezembro de 2006) (Fig. 4). O sedimento do banco da Cidade foi

composto por areia fina, pobre a moderadamente selecionada; porém houve pequenas variações

na composição específica entre os níveis (Fig. 3). O teor médio de areia por mês variou ao longo

do período de estudo entre 84,46 ± 5,72% (fevereiro de 2007) e 95,85 ± 1,65 (julho de 2006), e o

tamanho médio do grão entre 2,11 ± 1,46φ (abril de 2006) e 2,64 ± 0,17φ (junho de 2006) (Fig.

4). Uma comparação estatística revelou diferença significativa no teor de areia entre os dois

bancos (Tabela 1). Entretanto, não foram verificadas diferenças significativas no tamanho médio

do grão entre os dois bancos, entre os níveis e entre as estações do ano.

Para os outros parâmetros granulométricos avaliados, o teor médio mensal de silte no

banco do Camaroeiro ficou entre 1,75 ± 0,67% (fevereiro de 2007) e 7,31 ± 1,09% (fevereiro de

2006), e de calcário entre 6,73 ± 2,59% (dezembro de 2006) e 10,59 ± 1,53% (junho de 2006)

(Fig. 4). No banco da Cidade, o teor médio mensal de silte variou entre 4,03 ± 1,53% (julho de

2006) e 14,46 ± 4,43% (fevereiro de 2007), e de calcário de 8,39 ± 2,54% (maio de 2006) a

12,13 ± 1,91% (novembro de 2006). Não houve diferenças significativas para as comparações

realizadas nos parâmetros teor de silte e de calcário (Tabela 1).

O teor médio mensal de matéria orgânica do sedimento no banco do Camaroeiro variou

de 2,17 ± 1,26% (janeiro de 2007) a 6,08 ± 2,08% (agosto de 2006). Na Cidade, o teor médio de

matéria orgânica variou entre 3,56 ± 0,22% (junho de 2006) e 6,11 ± 0,49% (novembro de

2006). Não foi verificada diferença significativa na porcentagem de matéria orgânica entre os

bancos (Tabela 1).

A salinidade média da água intersticial no banco do Camaroeiro variou mensalmente

entre 26,33 ± 4,04 ppm (janeiro de 2007) e 33,33 ± 1,15 ppm (novembro de 2006) (Fig. 4).

Houve pouca variação da salinidade no nível inferior e médio, porém ocorreu uma queda

acentuada no nível superior (22 ppm) em janeiro de 2007. No banco da Cidade, a salinidade

média mensal da água intersticial variou de 27,5 ± 3,54 ppm (outubro de 2006) a 33,3 ± 1,15

ppm (setembro de 2006) ao longo do período de estudo, com valores abaixo de 30 ppm apenas

19

em outubro de 2006, no nível médio (26 ppm). Não foi verificada diferença significativa em

relação à salinidade entre aos dois bancos estudados (Tabela 1).

A temperatura da água variou sazonalmente ao longo do período de estudo (Fig. 5). Os

menores valores foram registrados entre maio e setembro de 2006 e os maiores entre fevereiro e

abril de 2006 e em fevereiro de 2007.

Figura 4. Variação temporal dos parâmetros ambientais avaliados nos bancos de Mytella charruana do Camaroeiro e da Cidade. Barras verticais correspondem ao desvio padrão da média.

20

Caracterização da fauna associada

No total foram obtidos 32.639 indivíduos associados aos bancos de M. charruana (dos

quais já foram identificados 140 taxa), 14.432 no banco do Camaroeiro e 18.207 no da Cidade,

pertencentes principalmente a quatro táxons: Polychaeta, Crustacea, Mollusca e Nematoda

Variável Fator gl F p Areia (%) Bancos 1/63 22,94 0,0000 Níveis (bancos) 4/63 0,42 0,7903 Estação do ano 3/63 2,54 0,0645 Tamanho médio do grão (mm) Bancos 1/63 0,19 0,6647 Níveis (bancos) 4/63 1,91 0,1192 Estação do ano 3/63 0,99 0,4024 Silte (%) Bancos 1/63 20,47 0,0000 Níveis (bancos) 4/63 0,23 0,9191 Estação do ano 3/63 1,86 0,1451 Calcário (%) Bancos 1/55 13,14 0,0006 Níveis (bancos) 4/55 4,32 0,0042 Estação do ano 3/55 4,61 0,0060 Matéria orgânica (%) Bancos 1/55 0,72 0,3991 Níveis (bancos) 4/55 0,67 0,6137 Estação do ano 3/55 1,39 0,2561 Salinidade Bancos 1/49 0,00 0,9532 Níveis (bancos) 4/49 1,07 0,3796 Estação do ano 3/49 1,67 0,1853

Tabela 1. Resultados da análise de variância aninhada bifatorial (F) dos parâmetros físico-químicos (porcentagem de areia, tamanho médio do grão, porcentagem de silte, de matéria orgânica, de calcário e salinidade da água intersticial) nos dois bancos. Número de graus de liberdade (gl)/total de amostras utilizadas em cada comparação. Nível de significância dos testes (α) de 0,05.

Figura 5. Variação média da temperatura da água. As barras verticais indicam o desvio padrão da média.

21

(Tabela 2). Em ambos os bancos, Polychaeta (64,90 e 63,13% dos indivíduos do Camaroeiro e

da Cidade, respectivamente) e Crustacea (18,36 e 17,05% dos indivíduos do Camaroeiro e da

Cidade, respectivamente) foram os mais abundantes. Entre estes, os Polychaeta Spionidae

(13.493 inds) e Syllidae (3.748), os Crustacea Copepoda (2.887) e Tanaidacea (2.319), e

Nematoda (1.662) estavam incluídos entre os taxa mais abundantes e frequentes.

Camaroeiro Cidade Táxons Concha Substrato Total Concha Substrato Total Total Geral

Turbellaria 2 2 4 4 Nemertea 14 8 22 4 4 26 Nematoda Dorylaimidae 2 2 2 Dorylaimopsis 60 62 122 41 1 42 164 Phanodermatidae 0 Phanoderma 1 1 3 3 4 Ironidae Trissonchulus 24 24 48 4 4 52 Leptosomatidae Pseudocella 1 1 1 1 2 Synonchus 14 14 14 Thoracostoma 3 3 2 2 5 Oxystomonidae Oxystomina 1 1 1 Oncholaimidae Oncholaimus 582 83 665 27 1 28 693 Prooncholaimus 1 1 4 4 5 Viscosia 8 8 9 9 17 Enchelidiidae Eurystomina 41 3 44 66 66 110 Polygastrophora Chromadoridae Chromadora 126 126 7 7 133 Chromadorita 1 1 1 1 2 Euchromadora 145 18 163 92 1 93 256 Spilophorella 3 3 2 2 5 Cyatholaimidae Acanthonchus 1 1 2 3 3 5 Xyalidae 1 1 2 2 Daptonema 1 0 1 1 Steineria 2 2 2 Linhomoeidae Terschellingia 1 1 1 Comesomatidae Actarjania 13 3 16 16 Comesoma 94 65 159 11 11 170 Polychaeta Capitellidae 3 351 354 1 1 355 Capitella sp. 23 179 202 1 39 40 242 Heteromastus sp. 27 27 4 4 31 Mediomastus sp. 2 154 156 3 208 211 367 Notomastus sp. 1 1 1 Opheliidae Armandia sp. 3 3 1 1 4 Orbiniidae 2 261 263 2 154 156 419 Naineris sp. 15 15 47 47 62 Hesionidae 1 1 1 Nereididae 13 4 17 7 4 11 28 Laeonereis acuta 14 246 260 4 2 6 266 Neanthes sp. 2 2 1 1 3 Neanthes cf. succinea 18 18 25 25 43 (cont.)

Tabela 2. Mytella charruana. Fauna coletada nos bancos do Camaroeiro e da Cidade, na concha (sedimento depositado na superfície externa, bolhas-de-lama, fendas, perfurações e bissos) e no substrato (formado pelo mitilídeo, sedimento e outros componentes orgânicos e inorgânicos), entre fevereiro de 2006 e fevereiro de 2007.

22

(cont.) Camaroeiro Cidade

Táxons Concha Substrato Total Concha Substrato Total Total Geral Perinereis andersoni 1 2 3 5 5 8 Platynereis dumerilii 3 3 3 Pseudonereis palpata 1 3 4 4 Pilargidae 25 25 16 16 41 Sigambra sp. 40 40 19 19 59 Syllidae 2650 2650 186 103 289 2939 Exogone (E.) africana 38 24 62 3 3 65 Exogone (E.) breviantennata 201 297 498 37 27 64 562 Exogoninae 2 4 6 1 1 7 Proceraea okodai 1 1 1 Syllis prolifera 43 48 91 16 24 40 131 Eusyllinae 1 1 1 Syllinae 9 9 32 1 33 42 Goniadidae Glycinde multidens 30 30 11 11 41 Goniada littorea 1 1 1 Goniada sp. 1 1 1 Phyllodocidae 4 4 2 2 6 Dorvilleidae 6 6 16 16 22 Eunicidae Marphysa formosa 2 2 3 3 5 Lumbrineridae Lumbrineris magalhaensis 1 1 1 Scoletoma tetraura 3 3 9 9 12 Onuphidae Diopatra aciculata 11 11 16 16 27 Diopatra dexiognatha 1 1 1 Diopatra sp. 1 1 1 Mooreonuphis sp. 1 1 1 Sabelariidae 1 1 1 1 2 3 Sabellidae 24 24 24 Cirratulidae 54 311 365 60 942 1002 1367 Terebellidae Nicolea uspiana 3 3 168 168 171 Spionidae 1 1 14 6 20 21 Boccardiella sp. 1 1 7 7 8 Dipolydora socialis 3 4 7 80 148 228 235 Polydora cornuta 1773 1011 2784 1157 2658 3815 6599 Polydora neocaeca 1297 145 1442 3607 1577 5184 6626 Polydora nuchalis 0 1 1 1 Polydora sp. 1 1 2 2 3 Oligochaeta 1 1 1 1 2 Crustacea 41 41 5 5 46 Copepoda 2011 2011 876 876 2887 Ostracoda 8 8 1 1 9 Amphipoda 12 12 15 15 27 Caprellidae Caprella sp. 8 8 8 Falotriella sp. 1 1 1 Falotriella montoucheti 3 3 3 Paracaprella sp. 9 9 9 Corophiidae 0 0 Cheiriphotis sp. 2 2 2 Gammorapsis sp. 1 1 6 6 7 Monocoraphilum sp. 24 24 149 1 150 174 Hyalidae Apohyale media 1 1 1 Ischyroceridae Erictonius sp. 1 1 1 Melitidae Elasmopus sp. 7 7 2 2 9 Stenothoidae Stenothoe sp. 3 3 3 Isopoda 1 1 1 Cirolanidae 0 Cirolana sp. 1 1 1 Sphaeromatidae Clianella sp. 5 5 5 (cont.)

23

(cont.) Camaroeiro Cidade

Táxons Concha Substrato Total Concha Substrato Total Total Geral Tanaidacea 501 2 503 1798 18 1816 2319 Decapoda Caridea 2 2 2 Alpheidae Alpheus sp. 1 1 3 3 4 Upogebiidae Upogebia paraffinis 4 4 4 Porcellanidae Petrolisthes armatus 7 1 8 8 Paguridae 1 1 1 Brachiura 6 1 7 4 2 6 13 Majidae 1 1 1 Portunidae Callinectes sp. 3 3 1 1 4 Panopeidae Acantholobulus paulensis 1 2 3 14 11 25 28 Hexapanopeus schmitti 3 9 12 63 29 92 104 Hexapanopues sp. 4 4 1 1 5 Panopeus americanus 6 3 9 9 Panopeus austrobesus 1 1 4 2 6 7 Panopeus hartii 1 1 1 Panopeus lacustris 1 1 1 Panopeus occidentalis 2 2 17 6 23 25 Panopeus rugosus 1 1 4 2 6 7 Panopeus sp. 1 1 3 3 4 Grapsidae Pachygrapsus gracilis 2 2 2 Pachygrapsus transversus 1 1 3 10 13 14 Picnogonida 2 1 3 3 Gastropoda 5 5 1 14 15 20 Nassaridae Nassarius vibex 155 155 1 211 212 367 Olividae Olivella minuta 2 2 2 Bivalvia Arcidae Lunarca ovalis 1 1 1 Cardiidae Trachycardium muricatum 1 1 1 Myidae Sphenia antillensis 30 5 35 93 166 259 294 Mytilidae 703 1 704 2205 42 2247 2951 Brachidontes sp. 83 360 443 443 Perna perna 2 2 3 4 7 9 Ostreidae Crassostrea rhizophorae 2 2 2 Solecurtidae Tagelus divisus 14 14 14 14 28 Tagelus plebeius 1 1 1 Tellinidae 1 1 1 Macoma biota 6 6 21 21 27 Macoma constricta 40 40 39 39 79 Macoma uruguayensis 1 1 3 3 4 Tellina diantha 1 1 1 1 2 Tellina lineata 16 16 6 6 22 Tellina punicea 1 1 1 Tellina trinitatis 1 1 1 Veneridae 1 1 1 Anomalocardia brasiliana 1 14 15 1 40 41 56 Chione subrostrata 1 1 5 5 6 Protothaca pectorina 1 1 1 Ophiuroidea Amphiuridae Amphipholis squamata 1 1 1 Ophiactidae Hemipholis elongata 1 1 1 Osteichthyes 1 1 1 TOTAL 10648 3784 14432 10895 7312 18207 32639

24

Concha

Os poliquetas foram os mais abundantes entre a fauna associada amostrada nos bancos de

M. charruana. Um total de 11.351 indivíduos foram encontrados, 6.135 foram registrados em

450 conchas no Camaroeiro e 5.216 indivíduos em 150 conchas na Cidade. Dezoito famílias

foram identificadas, das quais a mais abundante foi Spionidae, quase que exclusivamente

composta pelo gênero Polydora, representando 44,22% dos indivíduos do Camaroeiro e 80,50%

dos indivíduos da Cidade (Tabela 2). Syllidae foi a segunda família mais abundante,

representando 35,41% e 3,75% dos indivíduos dos bancos do Camaroeiro e da Cidade,

respectivamente. Entre as espécies já identificadas, provenientes da concha, Polydora cornuta

(6.599 inds) e Polydora neocaeca (6.626) foram as mais abundantes.

Substrato

O número de indivíduos da macrofauna coletados no substrato alcançou um total de

3.784 no banco do Camaroeiro e 7.312 no da Cidade. No Camaroeiro, os Polychaeta foram

dominantes seguido por Mollusca (Gastropoda). No banco da Cidade, Polychaeta também foi

dominante seguido por Crustacea (Decapoda) e Mollusca (Gastropoda e Bivalvia). Os

poliquetas, principalmente das famílias Capitellidae, Spionidae, Orbiniidae, Nereididae e

Cirratulidae foram os mais frequentes e abundantes durante o período de estudo. Entre as

espécies mais abundantes têm-se os Spionidae P. cornuta e P. neocaeca (Tabela 2).

Comparando a frequência dos táxons mais representativos na fauna da concha e do

substrato é possível observar certos padrões. Spionidae é a família de poliquetas mais frequente

nos dois bancos, principalmente no da Cidade, no qual a contribuição das outras famílias como

Capitellidae, Cirratulidae, Orbiniidade e Nereididae é bem menor em relação ao banco do

Camaroeiro.

DISCUSSÃO

A fauna associada às conchas revelou diferenças entre os dois bancos. Em ambos os

bancos há um claro predomínio de poliquetas, dos quais Spionidae e Syllidae são quase que

igualmente dominantes. Algumas famílias, mesmo mais raras, destacam-se por ocorrerem em um

25

ou outro banco, como é o caso dos comedores de depósito Terebellidae, organismos comumente

encontrados em costões e que foram abundantes no banco da Cidade, ou as famílias Capitellidae,

Cirratullidae (comedores de depósito) e Nereididae (predador e/ou onívoro).

As famílias de poliquetas registradas neste estudo são, em geral, as encontradas sobre

conchas de outros moluscos e em proporções semelhantes, ou seja, a maior parte polidorídeos e

os demais, distribuídos entre as várias outras famílias identificadas. Ao estudar a fauna de

poliqueta associada a abalones no sul do Chile, VARGAS et al. (2005) encontraram 97% dos

indivíduos coletados como pertencentes a duas espécies de polidorídeos cavadores (Dypolydora

huelma e P. rickettsi). Os demais 3% dos indivíduos de poliquetas foram identificados entre os

Serpullidae, Cirratulidae, Phyllodocidae, Nereididae e Terebellidae. OLIVA e SANCHÉZ (2005),

identificaram duas espécies de polidorídeos no escalope Argopecten purpuratus, além de

Sabellidae, Terebellidae e Cirratullidae. No banco do Camaroeiro há um predomínio de

copépodas que supera os demais crustáceos; por outro lado, no da Cidade, os dois grupos de

crustáceos mais importantes (Copepoda e Tanaidacea) são igualmente dominantes.

Um fato interessante entre os nematodas associados aos bancos estudados é o registro de

novas ocorrências para o Brasil, gêneros Pseudocella e Synonchus, pois não constam do recente

levantamento realizado por VENEKEY (2007).

A fauna do substrato apresentou composição específica diferente em relação à das

conchas. No banco do Camaroeiro tem-se 71 táxons nas conchas e 72 no substrato; no banco da

Cidade, o número de táxons foi 74 na concha e 80 no substrato. Os Polychaeta também foram os

mais abundantes e diversificados. Com exceção de Spionidae, que foi abundante tanto na concha

quanto no substrato e Syllidae que foi de ocorrência quase que restrita às conchas, as demais

famílias, registradas em ambos, tem composição específica diferente e o substrato é o que

apresenta maior diversidade. Entre as famílias abundantes têm-se aquelas identificadas como

comedoras de depósito (Capitellidae, Orbinidae e Cirratullidae), predadoras e/ou onívoras

(Nereididae) e suspensívoras, onde dominam os Spionidae P. cornuta e P. neocaeca.

As espécies de Spionidae identificadas pertencem ao grupo dos poliquetas polidorídeos,

que são parasitas, frequentes em substrato duro, principalmente como perfuradores de estruturas

calcárias, conhecidos por infestarem conchas de diferentes espécies de bivalves. (CACERES-

26

MARTINEZ et al., 1998; BUCK et al., 2005) e gastrópodes (BAXTER, 1984). O complexo Polydora

(ou polidorídeos) inclui espécies perfuradoras de substrato calcário que utilizam para tal, tanto

métodos químicos quanto mecânicos (SATO-OKOSHI & OKOSHI, 2000). Nestes substratos podem

ser encontradas três formas de fixação: a) tubos formados por sedimento e muco aderidos à

superfície externa, não ocorrendo a perfuração da concha; b) galerias em formato de U,

perfuradas nas conchas; c) bolhas-de-lama (“mud-blisters”) formadas na face interna da concha

(SATO-OKOSHI & OKOSHI, 2000). Essas surgem pela reação do bivalve, que secreta uma camada

de conchiolina seguida de material nacarado, sobre o sedimento acumulado pelos polidorídeos

recém assentados (BLAKE & EVANS, 1973). Dessa forma, esses poliquetas podem causar sérios

danos em cultivos de moluscos (MORTENSEN et al., 2000). Algumas espécies desses espionídeos

são também consideradas como indicadores de poluição (PEARSON & ROSENBERG, 1978). Os

polidorídeos são organismos que constroem tubos ou galerias e que se alimentam de partículas

em suspensão (suspensívoros) e/ou localizados na periferia de seus tubos (depositívoros),

utilizando um par de longos palpos para tal. Possuem, também, uma grande diversidade de modo

reprodutivo, 10 dos 18 descritos por WILSON (1991). Estes poliquetas são comumente

abundantes em bancos de Mytilidae, os quais constituem um excelente habitat para espécies com

os referidos tipos de comportamento alimentar.

A maioria dos táxons presente apresentou poucos indivíduos. RAGNARSSON e RAFFAELLI

(1999) trabalhando em bancos lamosos de Mytillus edulis, registraram grandes volumes de

pelotas fecais que favoreceram a deposição de pequenas partículas e reduziram o fluxo de água.

Os grupos funcionais desses organismos, principalmente aqueles relacionados ao hábito

alimentar, com pequenas diferenças quanto à dominância, são bastante semelhantes tanto nas

conchas quanto no substrato, onde dominam os suspensívoros e comedores de depósito. Estes

últimos se alimentam do material orgânico depositado no substrato que comumente são mais

frequentes em fundos lamosos onde a matéria orgânica é mais abundante.

Nos bancos estudados notou-se também que estes facilitaram o recrutamento de espécies

como os polidorídeos, Nassarius vibex e, possivelmente, de alguns crustáceos epibentônicos.

Constata-se, portanto, que bancos de M. charruana têm um papel de organismo estruturador de

comunidades bentônicas em regiões lamosas no interior de baías. Observa-se que a fauna dos

27

bancos é bastante peculiar para alguns grupos, como por exemplo os Nematoda. Comparando os

resultados obtidos por MOELLMANN (2002) para praias arenosas, tem-se que apenas 4 espécies

das 22 encontradas nos bancos lamosos são referidas para praias arenosas.

Alguns estudos têm indicado que muitos organismos são favorecidos nos bancos de

mitilídeos. TOKESHI e ROMERO (1995) têm mostrado que poliquetas são muito mais abundantes

nos bancos do que em outro tipo de substrato no ambiente entremarés. Em particular espécies

móveis, tais como Syllidae e Nereididae, que podem ser favorecidas pelo complexo estrutural

desse tipo de substrato. COMMITO e BONCAVAGE (1989), com base no registro de altos números

de oligoquetas, sugeriu que espécies com desenvolvimento direto ou reprodução assexuada

podem ser favorecidas em densos bancos de suspensívoros (M. charruana). Assim como

encontrado por DITTIMANN (1990), os poliquetas comedores de depósito foram abundantes. No

entanto, os resultados aqui obtidos são divergentes quanto aos suspensívoros que também foram

abundantes, não mostrando evidências de exclusão causadas pelo modo de alimentação dos

mitilídeos. Estes fatos sugerem que dependendo do grupo trófico e tipo de reprodução dos

organismos, estes são favorecidos com o estabelecimento em bancos de moluscos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A fauna associada aos bancos de Mytella charruana foi composta principalmente por

poliquetas, com grandes abundâncias de espécies das famílias Spionidae e Syllidae. Mollusca,

Crustacea e Nematoda também possuíram grande contribuição na fauna, entretanto com menor

proporção comparada a Polychaeta. Entre os moluscos, Nassarius vibex foi o mais abundante,

sendo esta espécie utilizada no presente trabalho para avaliação de aspectos populacionais e

reprodutivos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

Amoureux, L. 1966. Étude bionomique et écologique de quelques annélides polyquetes des sables interidaux de côtes ouest de la France. Arch. Zool. Exp. Gen., 107: 1-128.

Arruda, E.P. & Domaneschi, O. 2005. New species of Macoma (Bivalvia: Tellinoidea: Tellinidae) from southeastern Brazil, and with description of its gross anatomy. Zootaxa, 1012: 13-22.

Baxter, J.M. 1984. The incidence of Polydora ciliata and Cliona celata boring the shell of Patella vulgate in Orkney. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 64: 728-729.

28

Blake, J.A. & Evans, J.W. 1973. Polydora and related genera as borers in mollusk shells and other calcareous substrates. Veliger, 15: 235-249.

Buck, B.H.; Thieltges, D.W.; Walter, U.; Nehls, G. & Rosenthal, H. 2005. Inshore-offshore comparison of parasite infestation in Mytilus edulis: implications for open ocean aquaculture. J. Appl. Ichthyol., 21: 107-113.

Caceres-Martinez, J; Oca, P.M.M.de & Vasquez-Yeomans, R. 1998. Polydora sp. infestation and health of the pacific oyster Crassostrea gigas cultured in Baja California, NW México. J. Shellfish Res., 17: 259-264.

Commito, J.A. & Boncavage, E.M. 1989. Suspension-feeders and coexisting infauna: an enhancement counterexample. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 125: 33-42.

Dittimann, S. 1990. Mussel beds - amensalism or amelioration for intertidal fauna? Helgol. Meeresunters., 44: 335-352.

Farinaccio, A. 2000. Alterações relacionadas à ação antrópica na dinâmica dos processos costeiros nas planícies de Praia Grande/ Mongaguá e Enseada de Caraguatatuba, SP. Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo, São Paulo. 150p.

Folk, R.L. & Ward, W.C. 1957. Brazos river bar: a study in the significance of grain size parameters. J. Sediment. Petrol., 27: 3-27.

Hammond, W. & Griffiths, C.L. 2004. Influence of wave exposure on South African mussel beds and their associated infaunal communities. Mar. Biol., 144: 547-552.

Jacobi, C.M. 1987. The invertebrate fauna associated with intertidal beds of the brown mussel Perna perna (L.) from Santos, Brazil. Stud. Neo. Fauna. Env., 22: 57-72.

Lintas, C. & Seed, R. 1994. Spatial variation in the fauna associated with Mytilus edulis on a wave-exposed rocky shore. J. Mollus. Stud., 60: 165-174.

Loi, T. 1981. Environmental stresses and intertidal assemblages on hard substrates in the Port of Long Beach, California, USA. Mar. Biol., 63: 197-211.

Menge, B.A. & Lubchenko, J. 1981. Community organization in temperate and tropical rocky intertidal habitats: prey refuges in relation to consumer pressure gradients. Ecol. Monogr., 51: 429-450.

Moellmann, A.M. 2002. Variação espaço-temporal da meiofauna de duas praias arenosas do Estado de São Paulo e efeito antropogênico sobre a meiofauna e os Nematoda, no verão. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo, São Paulo. 153p.

Mortensen, S.; Van der Meeren, T.; Fosshagen, A.; Hernar, I.; Harkestad, L.; Torkildsen, L. & Bergh, Ø. 2000. Mortality of scallop spat in cultivation, infested with tube dwelling bristle worms, Polydora sp. Aquacult. Int., 8: 267-271.

Narchi, W. & Galvão-Bueno, M.S. 1983. Anatomia funcional de Mytella charruana (D`Orbigny, 1846) (Bivalvia:Mytilidae). Bol. Zool. Univ. S. Paulo, 6: 113-145.

Oliva, M.E. & Sanchez, M.F. 2005. Metazoan parasites and commensal of the northern Chilean scallop Argopecten purpuratus (Lamarck, 1819) as a tool for stock identification. Fish. Res., 56: 313-320.

Paine, R.T. 1976. A short term experimental investigation of resource partitioning in a New Zealand rocky intertidal habitat. Ecology, 52: 1096-1106.

Pearson, T.H. & Rosenberg, R. 1978. Macrobenthic succession in relation to organic enrichment and pollution of the marine environment. Oceanogr. Mar. Biol. Annu. Rev., 16: 229-311.

Pereira, O.M.; Hilberath, R.C.; Ansarah, P.R.A.C. & Galvão, M.S.N. 2003. Estimativa da produção de Mytella falcata e de M. guyanensis em bancos naturais do estuário de Ilha Comprida - SP - Brasil. Bol. Inst. Pesca, São Paulo, 29: 139-149.

Ragnarsson, S.A. & Raffaelli, D. 1999. Effect of the mussel Mytilus edulis on the invertebrate fauna of sediments. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 241: 31-43.

Rios, E.C. 1994. Seashells of Brazil. Fundação Universidade do Rio Grande, Rio Grande.

29

Sato-Okoshi, W. & Okoshi, K. 2000. Structural characteristics of self-excavated burrows by boring polydorid species (Polychaeta, Spionidae). Bull. Mar. Sci., 67: 235-248.

Seed, R. 1996. Patterns of biodiversity in the macro-invertebrate fauna associated with mussel patches on rocky shores. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 76: 203-210.

Seed, R. & Suchanek, T.H. 1992. Population and community ecology of Mytilus. In: The mussel Mytilus: ecology, physiology, genetics and culture (Gosling, E.M., ed.), pp. 87-169. Elsevier, Amsterdam.

Sibaja, W.G. 1985. Dimensiones de la concha del mejillón Mytella strigata Hanley (Bivalvia:Mytilidae), de la playa de Lepanto, Costa Rica. Revi. Biol. Trop., 33: 59-60.

Suguio, K. 1973. Introdução a Sedimentologia. EDUSP, São Paulo.

Thiel, M. & Ullrich, N. 2002. Hard rock versus soft bottom: the fauna associated with intertidal mussel beds on hard bottoms along the coast of Chile, and considerations on the functional role of mussel beds. Helgol. Mar. Res., 56: 21-30.

Tokeshi, M. & Romero, L. 1995. Filling a gap: dynamics of space occupancy on a mussel-dominated subtropical rocky shore. Mar. Ecol. Prog. Ser., 119: 167-176.

Tsuchiya, M. & Nishihira, M. 1985. Islands of Mytilus edulis as a habitat for small intertidal animals: effect of island size on community structure. Mar. Ecol. Prog. Ser., 25: 71-81.

Tsuchiya M. & Nishihira M. 1986. Islands of Mytilus edulis as a habitat for small intertidal animals: effect of Mytilus age structure on the species composition of the associated fauna and community organization. Mar. Ecol. Prog. Ser., 31: 171-178.

Underwood, A.J. 1997. Experiments in ecology: their logical design and interpretation using analysis of variance. Cambridge University Press, Cambridge.

Vargas, L.; Quijón, P. & Bertran, C. 2005. Polychaete infestation in cultured abalone (Haliotis rufescens Swainson) in Southern Chile. Aqua. Res., 36: 721-724.

Venekey, V. 2007. Atualização do conhecimento taxonômico dos Nematoda na costa brasileira e sua ecologia na Praia de Tamandaré - PE (Brasil). Tese de Doutorado. Universidade Federal de Pernambuco, Recife. 144 p.

Wenner, A.M. 1988. Crustacean and other invertebrates as indicators of beach pollution. In: Marine Organisms as Indicators, (Soule, D.F. & Kleppel, G.S., eds). pp. 199-229. Springer Verlag, Berlin.

Wilson, W.H. 1991. Sexual reproductive modes in polychaetes: classification and diversity. Bull. Mar. Sci., 48: 500-516.

30

Capítulo 2. – Estágios de desenvolvimento das cápsulas

ovígeras

RESUMO

A deposição de cápsulas ovígeras por duas populações de Nassarius vibex foi analisada,

ao longo de um ano, em dois bancos de mitilídeos, localizados na costa sudeste do Brasil. Do

total de 1.558 cápsulas, 859 foram amostradas no banco da praia do Camaroeiro e 699 no da

praia da Cidade. Os tamanhos médios das cápsulas e o número de ovos e/ou véligers por cápsula

foram similares entre os dois bancos. Houve diferença significativa na deposição das cápsulas,

entre os três níveis do banco (superior, médio e inferior), apenas no Camaroeiro (F=7,445;

p<0,05). Nos dois bancos, os maiores números médio de cápsulas foram registrados nos níveis

superior e inferior, entretanto em épocas diferentes. Os períodos de deposição foram semelhantes

entre as populações. No banco do Camaroeiro, cápsulas foram inicialmente registradas em maio

de 2006, com pico em julho e redução aos menores valores em dezembro de 2006. Na Cidade,

cápsulas ovígeras foram observadas entre julho de 2006 e dezembro de 2006, com pico de

abundância em agosto. Um segundo grupo de cápsulas foi observado, no banco da Cidade entre

janeiro e abril de 2007, indicando um ciclo reprodutivo bianual para N. vibex.

31

ABSTRACT

The deposition of egg capsules by two populations of Nassarius vibex was investigated

over a one-year interval, on two beaches located on the southeast coast of Brazil. A total of 1558

capsules were collected on beds of the mitilid Mytella charruana, 859 for Camaroeiro Beach and

699 for Cidade Beach. The mean sizes of the egg capsules and numbers of eggs or larvae per

capsule were similar on the two beaches. There was also a close similarity between the beaches

in the period of capsule deposition. At Camaroeiro Beach, capsules first appeared in May 2006,

reached a peak in July 2006, and disappeared in December 2006. At Cidade Beach, the first

capsules were recorded in July 2006, with a peak in August 2006. A second group was also

observed at this beach between January 2007 and April 2007. Regarding the influence of

intertidal level on capsule deposition, there was a significant difference in the number of

capsules between the levels at Camaroeiro Beach (F=7.445, p<0.05), and for the second capsule-

deposition peak at Cidade Beach (F=6.382, p<0.05). The two periods of deposition recorded at

the latter beach may indicate two periods of recruitment in the same year for N. vibex.

32

INTRODUÇÃO

Em invertebrados marinhos bentônicos, cujos embriões possuem desenvolvimento parcial

ou completo, esses normalmente são depositados em estruturas protetoras fechadas, variando de

cápsulas multi-laminadas até massas e cordões gelatinosos (FRETTER & GRAHAM , 1994;

RAWLINGS, 1990, 1999; OJEDA & CHAPARRO, 2004). Tais estruturas são comuns em

platelmintos, nemertíneos, anelídeos e moluscos (PECHENIK, 1979; RAWLINGS, 1999). As

cápsulas protegem contra estresses como predação (PECHENIK, 1979; PERRON, 1981), ataque

bacteriano (PECHENIK et al., 1984; LORD, 1986), mudanças osmóticas (PECHENIK, 1982, 1983;

HAWKINS & HUTCHINSON, 1988), dessecação (SPIGHT, 1977; PECHENIK, 1978), variações

bruscas na temperatura (SPIGHT, 1977; PECHENIK, 1986), ação das ondas (PERRON, 1981) e

radiação UV (RAWLINGS, 1996). PECHENIK (1982) verificou que a encapsulação ofereceu uma

significativa proteção às baixas salinidades no desenvolvimento de embriões dos gastrópodes

Ilyanassa obsoleta (Say, 1822), Nucella lamellosa (Gmelin, 1791) e N. lima (Gmelin, 1791).

Praticamente todos os moluscos neogastrópodes, desde aqueles que habitam as

profundezas dos oceanos aos que ocorrem nas fendas das regiões mais superiores da zona

entremarés, depositam seus ovos em alguma forma de cápsula ovígera bentônica (PONDER, 1973;

RAWLINGS, 1999). Estas estruturas possuem uma infinidade de formas e tamanhos, com paredes

proteináceas complexamente estruturadas compostas por várias finas lâminas (D’ASARO, 1986;

RAWLINGS, 1999). Internamente, possui câmara central preenchida por fluído que abriga os ovos

durante uma parte de seu desenvolvimento (RAWLINGS, 1999). A formação das cápsulas ocorre

no oviduto das fêmeas e sua forma definitiva é moldada pela glândula pedal ventral que se

localiza na base do pé (RAWLINGS, 1999). Em contato com a água do mar endurece e é

posteriormente depositada no substrato pelo pé (WEBBER, 1977; SAGLAM & DUZGUNES, 2007).

Ambientes de fundo mole podem representar um desafio para gastrópodes depositarem

suas cápsulas ovígeras e muitas espécies adotam diferentes estratégias. Em praias arenosas, estes

organismos procuram normalmente realizar a deposição em substratos estáveis para evitar serem

carregadas pela ação das ondas e, podendo acarretar a morte das larvas (BARNETT et al., 1980).

Polinices alderi (Forbes, 1838) (ANSELL, 1982) e Polinices pulchellus (Risso, 1826) (KINGLEY-

SMITH et al., 2003) depositam seus ovos nos interstícios dos grãos de areia, produzindo colares

33

circulares. Nassarius reticulatus (Linnaeus, 1758) utiliza macrófitas como substrato para

deposição (BARNETT et al., 1980) e Conus spp. pedras, conchas de congêneres e cápsulas vazias

(KOHNM, 1961). Nassarius vibex (Say, 1822) ocorre em diferentes substratos como praias areno-

lamosas e bancos de mitilídeos, implicando em uma variedade diferente de substratos para a

deposição de cápsulas ovígeras. SCHELTEMA (1962) descreveu as cápsulas e o desenvolvimento

larval de N. vibex em laboratório, entretanto, assim como para aspectos reprodutivos, ainda não

há informações sobre os substratos utilizados e os períodos de deposição.

Neste contexto, o presente capítulo apresentará uma investigação sobre os períodos de

deposição das cápsulas ovígeras de N. vibex ao longo de um ano. Atenção será dada sobre a

influência do gradiente entremarés na deposição das cápsulas.

METODOLOGIA

Amostragem e procedimentos de laboratório

As amostragens foram realizadas mensalmente, de março de 2006 a janeiro de 2007 no

banco de M. charruana da praia do Camaroeiro e, entre abril de 2006 e abril de 2007, na praia da

Cidade. Esses bancos de mitilídeos, localizados próximos a linha da maré baixa, com

aproximadamente 24 m de comprimento e 15 m de largura, foram divididos em 15 transectos

perpendiculares à linha d’água (Fig. 1).

Figura 1. Desenho esquemático do banco de Mytella charruana e do setor de coleta. I: nível inferior, M: nível médio, S: nível superior.

34

Mensalmente, um transecto era sorteado e dividido em três níveis (superior, médio e

inferior, sendo este último próximo a linha da maré baixa). A cada amostragem, 45 indivíduos de

M. charruana foram coletados na praia do Camaroeiro (15 por nível) e 15 na praia da cidade

(cinco por nível). Esta diferença no número de indivíduos foi devido ao menor tamanho do

banco da Cidade, evitando assim danos na estrutura desse banco.

No laboratório, as algas e o sedimento sobre as conchas foram inspecionados com auxílio

de um microscópio estereoscópico a procura das cápsulas ovígeras. Estas foram inicialmente

fixadas em formol a 6% e posteriormente preservadas em álcool a 70%. O comprimento e a

largura de cada cápsula foram medidos com auxílio de um microscópio estereoscópico com

objetiva graduada e o número de ovos e/ou larvas por cápsula foi contabilizado.

Análise dos dados

A área média das cápsulas ovígeras foi comparada entre os dois bancos por meio do teste-

t de Student. Diferenças na deposição entre os níveis do banco (superior, médio e inferior) foram

averiguadas com uma análise não-paramétrica de Kruskall-Wallis, uma vez que o conjunto de

dados não foi considerado normalmente distribuído pelo teste de Shapiro-Wilk.

RESULTADOS

Um total de 1558 cápsulas foi amostrado, 859 no Camaroeiro e 699 na Cidade. Diferença

significativa foi observada no número de cápsulas depositadas por N. vibex entre os níveis do

banco do Camaroeiro (F=7,417, p<0,05). Os níveis superior e inferior tiveram maior número

médio de desovas do que o nível médio, entretanto em momentos diferentes. Entre março e

junho de 2006, e em janeiro de 2007, maiores quantidades de cápsulas foram registradas no nível

inferior ao passo que entre julho e dezembro de 2006 no superior ocorreram os maiores valores

(Fig. 2A). No banco da Cidade não foi verificada diferença significativa no número de cápsulas

por nível. No entanto, foi observada maior quantidade de cápsulas no nível superior entre maio e

novembro de 2006 e no inferior entre janeiro e abril de 2007 (Fig. 2B).

35

As fêmeas de Nassarius vibex depositaram suas cápsulas ovígeras nos bancos de

mitilídeos, sobre as frondes de Ulvae lactuca Linnaeus 1753, as quais normalmente ocorreram

aderidas às conchas de M. charruana.

Três estágios de desenvolvimento dos embriões foram identificados em cada banco:

Estágio 1: ovos fertilizados, com formato arredondado (Fig. 3A).

Estágio 2: desenvolvimento inicial de larvas véliger (Fig. 3B).

Estágio 3: larva com protoconcha formada, velário e trato digestivo (Fig. 3C).

Não houve diferença significativa entre os valores médios do comprimento, da largura, da

área média das cápsulas ovígeras e do número total médio de ovos ou larvas por cápsulas entre

Figura 2. Nassarius vibex. Número médio de cápsulas por mês e frequência relativa (%) das cápsulas ovígeras por nível nos bancos do Camaroeiro (A) e da Cidade (B). As barras verticais indicam o desvio padrão da média.

Figura 3. Nassarius vibex. Estágios de desenvolvimento das cápsulas ovígeras. A) Estágio 1; B) Estágio 2; C) Estágio 3.

36

os dois bancos (Tabela 1). O número médio de ovos ou larvas de cada estágio também não

diferiu significativamente entre os bancos.

A frequência de cada estágio foi monitorada para os dois bancos e, exceto em uma

ocasião no Camaroeiro, não foram verificadas diferenças quanto ao período de ocorrência.

Cápsulas em Estágio 1 foram as mais abundantes, seguidas pelos outros dois estágios (Fig. 4).

Tamanho médio (DP) Número médio (DP)

Banco Comprimento Largura Área Estágio 1 Estágio 2 Estágio 3 Total

Camaroeiro 1,64 (0,15)

1,44 (0,15)

1,87 (0,32)

39,8 (10,3)

37,1 (7,4)

37,0 (7,0)

39,2 (9,7)

Cidade 1,64 (0,17)

1,43 (0,14)

1,86 (0,33)

44,6 (6,7)

24,6 (3,2)

32,3 (1,9)

39,5 (9,3)

Tabela 1. Nassarius vibex. Tamanho médio (desvio padrão) das cápsulas ovigeras e número médio (desvio padrão) de ovos ou larvas de cada estágio de desenvolvimento por cápsula registrados nos bancos do Camaroeiro e da Cidade. Unidade para tamanho: mm; unidade para area: mm²

Figura 4. Nassarius vibex. Número de cápsulas ovígeras de cada estágio por mês e variação na temperatura da água nos bancos do Camaroeiro (A) e da Cidade (B).

37

No Camaroeiro, as cápsulas ovígeras foram inicialmente registradas em maio de 2006,

com um pico em julho de 2006 e praticamente desapareceram em dezembro de 2006 (Fig. 4A).

Entre junho e julho de 2006, grandes quantidades de cápsulas do Estágio 1 foram observadas e

quase nenhuma dos estágios 2 e 3. O baixo número de cápsulas em setembro de 2006 permitiu o

registro de dois subgrupos: maio-agosto de 2006 e outubro-dezembro de 2006. Na Cidade, as

primeiras cápsulas foram observadas em julho de 2006, com pico em agosto de 2006 (Fig. 4B).

Neste banco, também foram reconhecidos os dois subgrupos separados em setembro de 2006

(julho-agosto de 2006 e outubro-dezembro de 2006). Diferentemente do Camaroeiro, um

segundo episódio de deposição foi registrado na Cidade, entre janeiro de 2007 e abril de 2007,

com pico de abundância em março de 2007. No Camaroeiro, a deposição ocorreu nos períodos

de menor temperatura da água (Fig. 4A), entretanto na Cidade cápsulas foram registradas tanto

nos picos de menor como nos de maior temperatura (Fig. 4B).

DISCUSSÃO

A morfologia externa das cápsulas ovígeras de Nassarius vibex é condizente com a

classificação proposta por D´ASARO (1993) para a família Nassariidae. As cápsulas são lisas,

possuem abas laterais com suturas, sem ornamentações e com abertura terminal. De acordo com

as observações de CERNOHORSKY (1984), diferentes populações de N. vibex podem apresentar

variações na morfologia de suas cápsulas, posteriormente confirmado por D´ASARO (1993),

analisando cápsulas de quatro diferentes localidades. No presente estudo, as cápsulas são

similares as observadas por D´ASARO (1993), nas populações de N. vibex do rio Earman, na

Flórida (EUA), de formato circular com estolões curtos e abertura externa com um tampão.

O tamanho (comprimento e largura) das cápsulas de N. vibex foi semelhante à N. festivus,

N. incrassatus, N. pygmaeus e N. tiarula; entretanto, não foi similar a outras populações de N.

vibex (Tabela 2). Estruturalmente, as cápsulas de N. vibex não foram consideradas espécie-

específica por D´ASARO (1993), sendo muito semelhantes às de N. gayii, N. incrassatus e N.

tiarula. É interessante notar que N. festivus e N. tiarula apresentam tamanho e número de ovos

bem parecidos aos registrados neste estudo. Em Nucella emarginata (Deshayes, 1839), a

morfologia das cápsulas variou entre as populações analisadas e tanto a espessura como a

38

resistência diferiram significativamente entre três populações (RAWLINGS, 1990). Segundo o

autor, estas variações podem ser resultado de (1) diferenças no tamanho corporal das fêmeas; (2)

resposta à modificações nas condições ambientais; ou (3) divergências genéticas causadas pela

Espécie Tamanho (mm) No ovos Referência

Comprimento Largura

Bullia digitalis (Dillwyn, 1817) 3,0 1,5 150-200 Silva & Brown (1985)

Cyclope nerita (Linné, 1758) 0,87 1,03 1 D'Asaro (1993)

Dorsanum miran (Bruguière, 1789) 3,77 1,73 25-48 D'Asaro (1993)

Ilyanassa obsoleta (Say, 1822) 2,0 1,0 Sullivan & Maugel (1984)

Nassarius acutus (Say, 1822) 0,47 0,51 1-6 D'Asaro (1993)

Nassarius castus (Gould, 1850) 0,45-0,55 0,35-0,55 1 D'Asaro (1993)

Nassarius conspersus (Philippi, 1849) 2,63 1,87 2-4 D'Asaro (1993)

Nassarius corniculus (Olivi, 1792) 1,06 1,13 1 D'Asaro (1993)

Nassarius dorsatus (Röding, 1798) 0,39 0,39 1 D'Asaro (1993)

Nassarius festivus (Powys, 1835) 16-46 Chan & Morton (2005)

Nassarius festivus (Powys, 1835) 1,88 1,42 30,8 Chan (1998)

Nassarius festivus (Powys, 1835) 1,2-1,33 1,5-1,55 28,3-34,9 Cheung & Laun (1999)

Nassarius festivus (Powys, 1835) 1,52 2,47 28-35 D'Asaro (1993)

Nassarius fossatus (Gould, 1850) 8,05 5,01 1800-2000 D'Asaro (1993)

Nassarius gayii (Kiener, 1834) 1,06 0,82 12-19 D'Asaro (1993)

Nassarius incrassatus (Ström, 1768) 1,5 50-80 D'Asaro (1993)

Nassarius livescens (Philippi, 1849) 0,85 1,05 1 D'Asaro (1993)

Nassarius mendicus (Gould, 1850) 1,57 0,99 28-33 D'Asaro (1993)

Nassarius miga (Bruguière, 1789) 4,06 3,81 460-545 D'Asaro (1993)

Nassarius mutabilis (Linné, 1758) 2,89 3,24 9-18 D'Asaro (1993)

Nassarius obsoletus (Say, 1822) 2,52 2,07 58-112 D'Asaro (1993)

Nassarius obsoletus (Say, 1822) 1,5 Pechenik (1978)

Nassarius obsoletus (Say, 1822) 2,7 40-150 Scheltema (1962)

Nassarius pauperatus (Lamarck, 1822) 1,08 15-27 D'Asaro (1993)

Nassarius perpinguis (Hinds, 1844) 2,72 3,06 213-487 D'Asaro (1993)

Nassarius pullus (Linné, 1758) 0,46 0,49 1 D'Asaro (1993)

Nassarius pygmaeus (Lamarck, 1822) 1,71 1,34 40-145 D'Asaro (1993)

Nassarius reticulatus (Linné, 1758) 4,86 4,22 209 D'Asaro (1993)

Nassarius reticulatus (Linné, 1758) 160-303 Thorson (1946)

Nassarius sufflatus (Gould, 1860) 1,31 0,47 1 D'Asaro (1993)

Nassarius tiarula (Kiener, 1841) 1,51 0,92 27-37 D'Asaro (1993)

Nassarius tiarula (Kiener, 1841) 1,6 1,5 62-80 D'Asaro (1993)

Nassarius tiarula (Kiener, 1841) 13 3 50 Houston (1978)

Nassarius trivittatus (Say, 1822) 2,12 1,53 42-200 D'Asaro (1993)

Nassarius vibex (Say, 1822) 1,35 1,15 13-34 D'Asaro (1993)

Nassarius vibex (Say, 1822) 1,63 0,82 12-19 D'Asaro (1993)

Nassarius vibex (Say, 1822) 1,39 0,88 12-18 D'Asaro (1993)

Nassarius vibex (Say, 1822) 1,04 0,8 9-14 D'Asaro (1993)

Nassarius vibex (Say, 1822) 1,64 1,44 39,2 Presente estudo Nassarius vibex (Say, 1822) 1,64 1,43 39,5 Presente estudo Nassarius vibex (Say, 1822) 1,6 12-30 Scheltema (1962)

Tabela 2. Morfologia (comprimento e largura) e número de ovos por cápsula ovígera da família Nassariidae.

39

seleção. PERRON e CORPUZ (1982) reportaram que a espessura da cápsula de Conus pennaceus

Born, 1778 aumentou com o tamanho da própria cápsula e com o comprimento da concha. Neste

caso, conforme RAWLINGS (1990) afirma, pode existir relação com o tamanho da glândula da

cápsula. CHEUNG e LAM (1999), estudando a influência da dieta na produção de cápsulas

ovígeras por N. festivus, obtiveram comprimento e largura média semelhantes (1.33 mm ± 0.17

and 1.55 mm ± 0.17, respectivamente).

O número médio de ovos por cápsula (Camaroeiro: 39.2 ± 9.7 e Cidade: 39.5 ± 9.3) em

N. vibex é maior do que os resultados obtidos por SCHELTEMA (1962) e D´ASARO (1993). Em N.

festivus, CHAN (1998) encontrou um número médio de 30,8 ovos por cápsula, entretanto o autor

analisou apenas três cápsulas. CHAN e MORTON (2005) observaram que esta espécie produziu

entre 16 e 46 ovos por cápsula. Os valores registrados para o Camaroeiro e a Cidade são

próximos aos observados em N. festivus, N. mendicus (Gould, 1850), N. tiarula e Dorsanum

miran. Outros nassarídeos apresentam produção de apenas um ovo ou centenas por cápsula.

As oportunidades para encontrar locais adequados a deposição das cápsulas deve ser

limitado pelo tipo de substrato onde a espécie ocorre (BARNETT et al., 1980). Para N. vibex, seria

esperado que a espécie utilizasse as conchas de M. charruana como substrato para deposição,

entretanto não foram registradas cápsulas sobre as conchas do bivalve, apenas nas frondes de U.

lactuca. Para outras espécies de nassarídeos, há também registros de deposição em frondes de

algas. Nassarius reticulatus, do mar de Clyde (Grã-Bretanha), deposita suas cápsulas na alga

vermelha Gigartina (BARNETT et al., 1980), nas frondes de Zostera, Fucus, outras vegetações

maiores, conchas de adultos (RASMUSSEN, 1973), e em rochas (FRETTER & GRAHAM , 1962).

Ilyanassa obsoleta coloca cápsulas em talos da alga verde Codium fragile Hariot, 1889 e na

gramínea aquática Zostera marina Linnaeus, 1753 (BRENCHLEY, 1981, 1982).

Os períodos de maior incidência de cápsulas ovígeras de N.vibex nos dois bancos estão

fortemente relacionados com o desenvolvimento de U. lactuca. LARGO et al. (2003), estudando

uma população tropical desta alga na ilha Mactan (Filipinas), observaram altos níveis de

biomassa em março e julho, decrescendo após tais períodos. Este padrão de desenvolvimento é

similar ao observado no presente estudo e suporta os registros dos períodos de deposição de N.

vibex. Concholepas concholepas (Bruguière, 1789) foi observada em laboratório com época de

40

liberação de gametas e deposição das cápsulas entre abril e setembro (CASTILLA & CANCINO,

1976). Em outro estudo com a mesma espécie, GALLARDO (1973) amostrou cápsulas ovígeras na

região entremarés de Valdivia (Chile) entre novembro e fevereiro. O período de deposição de

Littorina planaxis Philippi, 1847 foi analisado por SCHMITT (1979) em duas regiões da costa da

Califórnia (EUA). Na praia de Dillon, a deposição ocorreu entre março e o início de agosto de

1974, e na enseada de Fisherman, entre março e julho de 1977. SAGLAM e DUZGUNES (2007)

observaram em laboratório deposição de ovos por Rapana venosa (Valenciennes, 1846) durante

o início de junho e agosto. Nos nassarídeos Bullia pura Melvill, 1885, B. rhodostoma (Reeve,

1847) e B. digitalis foram observados períodos de liberação entre novembro e dezembro para B.

pura e após dezembro para as outras duas espécies (BROWN, 1982).

Nos dois bancos, os padrões de desenvolvimento das cápsulas ovígeras foram

semelhantes. Entre junho e dezembro foi registrado o primeiro pico de deposição em ambos os

bancos, entretanto somente na Cidade foi verificado um segundo período entre janeiro e abril. É

possível assumir que no Camareiro o segundo pico foi suprimido pelas alterações

morfodinâmicas ocorridas na área a partir de setembro de 2006 (Capítulo 1). Uma análise

comparativa entre os períodos de deposição e o ciclo reprodutivo de N. vibex demonstraram que

cápsulas são depositadas logo após os períodos com grande quantidade de indivíduos maduros e

em liberação. Estas épocas de liberação de gametas de N. vibex foram registradas no verão,

inverno e primavera para as duas populações, com pequenas discrepâncias (Capítulo 5), mesmo

período da deposição das cápsulas ovígeras. Em algumas espécies, como P. pulchellus, adultos e

juvenis possuem períodos de produção de ovos diferentes, com os adultos concentrando a

produção no verão e juvenis no inverto (KINGLEY-SMITH et al., 2003), permitindo uma

reprodução contínua para a espécie. ANSELL (1982), em experimento de laboratório com P.

alderi, encontrou uma produção máxima de colares ovígeros em junho, e mínima em outubro e

novembro.

Nos níveis superior e inferior dos dois bancos, foram registrados os maiores números de

cápsulas ovígeras de N. vibex, entretanto em diferentes períodos. No Camaroeiro, a região

superior teve maior abundância de cápsulas a partir de julho de 2006. A mudança na

morfodinâmica dessa praia, com a formação do banco de areia entre o banco de mitilídeos e o

41

limite da baixa-mar, impossibilitou a deposição no nível inferior. Este processo passou a ser

concentrado no nível superior, mais protegido dessas alterações que ocorreram na estrutura

morfodinâmica da praia, que provocaria o soterramento das cápsulas. No banco da Cidade, o

pico julho-dezembro de 2006 foi caracterizado por maior deposição no nível superior, ao passo

que o pico fevereiro-abril de 2007 no inferior. Apesar de uma aparente distribuição homogênea

da cobertura de U. lactuca, não houve avaliações sobre diferenças nas porcentagens de cobertura

vegetal entre os níveis de cada banco. Neste caso, variações na cobertura vegetal podem ter

causado as diferentes abundâncias registradas. Assim como previsto por BARNETT et al. (1980),

o menor tamanho das cápsulas deve torná-las menos visíveis a predadores que se alimentam de

organismos associados a fauna incrustante em rochas e conchas. Locais com maior cobertura

vegetal também devem fornecer uma melhor estabilidade contra a turbulência provocada pelas

ondas e a dessecação em níveis inferiores. Além disso, a ação diferencial de predadores entre os

níveis não pode ser descartada.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nassarius vibex utilizou para depositar suas cápsulas ovígeras as frondes da alga verde U.

lactuca; apresentou padrão de deposição durante duas épocas ao longo do ano (inverno-

primavera e verão-outono), totalmente condizente com seu ciclo reprodutivo e padrão de

recrutamento. Os resultados obtidos sugerem que a dinâmica de desenvolvimento da alga é uma

condição importante para o início da deposição das cápsulas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Ansell, A.D. 1982. Experimental studies of a benthic predator-prey relationship: I. Feeding, growth and egg collar production in long-term cultures of the gastropod drill, Polinices alderi (Forbes) feeding on the bivalve Tellina tenuis (da Costa). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 56: 235-255.

Barnett, P.R.O.; Hardy, B.L.S. & Watson, J. 1980. Substratum selection and egg-capsule deposition in Nassarius reticulatus (L.). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 45: 95-103.

Brenchley, G.A. 1981. Limiting resources and the limits to reproduction in the ‘‘mud’’ snail Ilyanassa obsoleta in Barnstable Harbor, Massachusetts. Biol. Bull., 161: 323.

Brenchley, G.A. 1982. Predation on encapsulated larvae by adults: effects of introduced species on the gastropod Ilyanassa obsoleta. Mar. Ecol. Prog. Ser., 9: 255-262.

Brown, A.C. 1982. The biology of sandy-beach whelks of the genus Bullia (Nassariidae). Oceanogr. Mar. Biol. Annu. Rev., 20: 309-361.

42

Castilla, J.C. & Cancino, J. 1976. Spawning behavior and egg capsules of Concholepas concholepas (Mollusca: Gastropoda: Muricidae). Mar. Biol., 37: 255-263.

Cernohorsky, W.O. 1984. The systematics of the family Nassariidae. Bull. Auckland Inst. Mus., 14: 1-356.

Chan, K. 1998. The development of Nassarius festivus (Powys 1835) (Gastropoda: Nassariidae) in Hong Kong. In: Proceedings of the 3rd International Conference on the Marine Biology of the South China Sea (Morton, B., ed.), pp. 321-330. Hong Kong University Press, Hong Kong.

Chan, K. & Morton, B. 2005. The reproductive biology of Nassarius festivus (Powys, 1835) (Gastropoda: Nassariidae) in relation to seasonal changes in temperature and salinity in subtropical Hong Kong. Aquat. Ecol., 39: 213-228.

Cheung, S.G. & Lam, S. 1999. Effect of food availability on egg production and packaging in the intertidal scavenging gastropod Nassarius festivus. Mar. Biol., 135: 281-287.

D'Asaro, C.N. 1986. Egg capsules of eleven marine prosobranchs from Northwest Florida. Bull. Mar. Sci., 39: 76-91.

D'Asaro, C.N. 1993. Gunnar Thorson´s world-wide collection of prosobranch egg capsules: Nassariidae. Ophelia, 38: 149-215.

Fretter, V. & Graham, A. 1962. British prosobranch molluscs. Ray Society of London, London.

Fretter, V. & Graham, A. 1994. British prosobranch molluscs. Their functional anatomy and ecology. Ray Society of London, London.

Gallardo, C. 1973. Desarollo intracapsular de Concholepas concholepas (Brugière) (Gastropoda, Muricidae). Publnes occ. Mus. nac. Hist. nat., Santiago de Chile, 16: 3-16.

Hawkins, L.E. & Hutchinson, S. 1988. Egg capsule structure and hatching mechanism of Ocenebra erinacea (L.) (Prosobranchia: Muricidae). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 119: 269-283.

Houston, R.S. 1978. Notes on the spawning and egg capsules of two prosobranch gastropods: Nassarius tiarula (Kiener, 1841) and Solenosteira macrospira (Berry, 1957). Veliger, 20: 367-368.

Kingley-Smith, P.R.; Richardson, C.A. & Seed, R. 2003. Size-related and seasonal patterns of egg collar production in Polinices pulchellus (Gastropoda: Naticidae) Risso 1826. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 295: 191-206.

Kohn, A.J. 1961. Studies on spawning behavior, egg masses and larval development in the gastropod genus Conus: II. Observations in the Indian Ocean during the Yale Seychelles Expedition. Bull. Bingham Oceanogr. Coll., 17: 1-51.

Largo, D.B.; Sembrano, J.; Hiraoka, M. & Ohno, M. 2003. Taxonomic and ecological profile of ‘green tide’ species of Ulva (Ulvales, Chlorophyta) in central Philippines. Hydrobiologia, 512: 247-253.

Lord, A. 1986. Are the contents of egg capsules of the marine gastropod Nucella lapillus (L.) axenic? Am. Malac. Bull., 42: 201-203.

Ojeda, J.A. & Chaparro, O.R. 2004. Morphological, gravimetric, and biochemical changes in Crepidula fecunda (Gastropoda: Calyptraeidae) egg capsule walls during embryonic development. Mar. Biol., 144: 263-269.

Pechenik, J.A. 1978. Adaptations to intertidal development: Studies on Nassarius obsoletus. Biol. Bull., 154: 282-291.

Pechenik, J.A. 1979. Role of encapsulation in invertebrate life histories. Am. Nat., 114: 859-870.

Pechenik, J.A. 1982. Ability of some gastropod egg capsules to protect against low-salinity stress. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 63: 195-208.

Pechenik, J.A. 1983. Egg capsules of Nucella lapillus (L.) protect against low-salinity stress. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 71: 165-179.

Pechenik, J.A. 1986. The encapsulation of eggs and embryos by molluscs: An overview. Am. Malacol. Bull., 4: 165-172.

43

Pechenik, J.A.; Chan, S.C. & Lord, A. 1984. Encapsulated development of the marine prosobranch gastropod Nucella lapillus. Mar. Biol., 78: 223-229.

Perron, F.E. 1981. The partitioning of reproductive energy between ova and protective capsules in marine gastropods of the genus Conus. Am. Nat., 118: 110-118.

Perron, F.E. & Corpuz, G.C. 1982. Cost of parental care in the gastropod Conus pennaceus: Age specific changes and physical constraints. Oecologia, 55: 319-324.

Ponder, W.F. 1973. The origin and evolution of the Neogastropoda. Malacologia, 12: 295-338.

Rasmussen, E. 1973. Systematics and ecology of the Isefjord marine fauna (Denmark). Ophelia, 11: 1-507.

Rawlings, T.A. 1990. Associations between egg capsule morphology and predation among populations of the marine gastropod, Nucella emarginata. Biol. Bull., 179: 312-325.

Rawlings, T.A. 1996. Shields against ultraviolet radiation: an additional protective role for the egg capsules of benthic marine gastropods. Mar. Ecol. Prog. Ser., 136: 81-95.

Rawlings, T.A. 1999. Adaptations to physical stresses in the intertidal zone: the egg capsules of neogastropod molluscs. Am. Zool., 39: 230-243.

Saglam, H. & Duzgunes, E. 2007. Deposition of egg capsule and larval development of Rapana venosa (Gastropoda: Muricidae) from the south-eastern Black Sea. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 87: 953-957.

Scheltema, R.S. 1962. Pelagic larvae of New England intertidal gastropods. I. Nassarius obsoletus Say and Nassarius vibex Say. T. Am. Microsc. Soc., 81: 1-11.

Schimitt, R.J. 1979. Mechanics and timing of egg capsule release by the littoral fringe periwinkle Littorina planaxis (Gastropoda: Prosobranchia). Mar. Biol., 50: 359-366.

Silva, F.M.da & Brown, A.C. 1985. Egg capsules and veligers of the whelk Bullia digitalis (Gastropoda: Nassariidae). Veliger, 28: 200-203.

Spight, T.M. 1977. Do intertidal snails spawn in the right places? Evolution, 31:682-691.

Sullivan, C.H. & Maugel, T.K. 1984. Formation, organization, and composition of the egg capsule of the marine gastropod, Ilyanassa obsoleta. Biol. Bull., 167: 378-389.

Thorson, G. 1946. Reproduction and development of Danish marine bottom invertebrates. Medd. Kom. Havundersøg., Kbh., ser. Plankton, 4: 1-523.

Webber, H.H. 1977. Gastropoda: Prosobranchia. In: Reproduction of marine invertebrates, vol. 4 (Giese, A.C. & Pearse, J.S., eds), pp. 1-95. Academic Press, New York.

44

Capítulo 3. – Biologia populacional

RESUMO

A densidade, estrutura populacional, crescimento, recrutamento e produção secundária de

Nassarius vibex foram analisados em duas populações, localizadas em bancos do bivalve Mytella

charruana, no Litoral Norte paulista. Os indivíduos de N. vibex foram amostrados mensalmente,

de fevereiro de 2006 a fevereiro de 2007 no banco da praia do Camaroeiro e, entre dezembro de

2006 e março de 2008, no banco da praia da Cidade. 8.925 indivíduos foram amostrados, 4.191

no banco do Camaroeiro e 4.734 no banco da Cidade, sem diferenças significativas nas

densidades médias anuais (Camaroeiro: 72 ± 21 inds m-2; Cidade: 91 ± 38 inds m-2). Para ambos

os bancos foram registradas variações significativas ao longo dos meses (Camaroeiro: F=2,902,

p<0,01; Cidade: F=4,375, p<0,05), entretanto não relacionadas à mudanças na temperatura da

água. O comprimento da concha apresentou diferenças significativas entre os bancos

(U=1.833.005, p<0,05) e ao longo do tempo em cada banco (Camaroeiro: F = 15,88, p <0,05;

Cidade: F = 9,67, p <0,05). A estrutura populacional de N. vibex foi caracterizada pela presença

de pelo menos 4 classes etárias adultas e três de juvenis, com dois períodos de recrutamento

anuais. O padrão de crescimento foi semelhante a outras espécies de regiões subtropicais e

temperadas com crescimento lento e longa expectativa de vida. Entre os bancos, a população do

Camareiro apresentou menor comprimento assintótico e maior taxa de crescimento do que a da

Cidade. Entretanto, o período de redução no crescimento ocorreu antes na Cidade. A baixa

representatividade de juvenis nas populações pode ter relação com alta taxa de mortalidade

verificada no primeiro ano de vida. Com relação aos índices de mortalidade, produção

secundária e biomassa não houve grandes contrastes entre as duas populações.

45

ABSTRACT

The density, population structure, growth, recruitment, and secondary production were

assessed in two populations of Nassarius vibex on beds of the mitilid Mytella charruana, on the

northern coast of the state of São Paulo. The individuals of N. vibex were sampled monthly from

February 2006 to February 2007 in the Camaroeiro Beach mitilid bed, and from December 2006

to March 2008 in the Cidade Beach mitilid bed. A total of 8,925 individuals were collected,

4,191 in the Camaroeiro bed and 4,734 in Cidade, with no significant differences in the mean

annual densities (Camaroeiro: 72 ± 21 inds m-2; Cidade: 91 ± 38 inds m-2). For both beds,

significant variations over the months were recorded (Camaroeiro: F=2.902; p<0.01; Cidade:

F=4.375; p<0.05), not related to changes in the water temperature. The shell length differed

significantly between the areas (U=1,833,005; p<0.05) and over time (Camaroeiro: F = 15.88; p

<0.05; Cidade: F = 9.67; p <0.05). The population structure of N. vibex was characterized by the

presence of at least four adult age classes and three juvenile cohorts, with two recruitment

periods during the year. The growth pattern was similar to other subtropical and temperate

species, with slow growth and a long life span. The Camaroeiro population had a lower

asymptote length and higher growth rate than the Cidade population; however, the reduction in

growth, i.e., the winter point, occurred first in the latter population. The low proportion of

juveniles in both populations may result from a high mortality rate in the first year of life.

Regarding the rates of mortality, secondary production, and annual biomass, there were no

differences between the populations.

46

INTRODUÇÃO

As características demográficas de uma população (abundância, estrutura etária, taxa de

crescimento, mortalidade e produção secundária) são importantes para o entendimento da

biologia da espécie (CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2008), de sua evolução e manutenção no

ecossistema (MALAQUIAS & SPRUNG, 2005), e da influência das pressões temporal e espacial do

ambiente (CERRATO, 1980; CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2008). Um dos principais fatores

para a compreensão da dinâmica populacional é a determinação da proporção da população em

cada classe de tamanho (GRANT et al., 1987), sendo esta utilizada posteriormente para a

obtenção de taxas de crescimento. Tais taxas variam sazonalmente de acordo com mudanças na

temperatura da água (MORAN et al., 1984; CHOW, 1987), disponibilidade de alimento (TAKADA ,

1995) e período reprodutivo (MORAN et al., 1984).

Gastrópodes marinhos apresentam grandes alterações nas taxas de crescimento intra e

interespecífica (VERMEIJ, 1980). Apesar de STRUHSAKER (1968) e JANSON (1982) evidenciarem

a origem genética desta variação intraespecífica, o crescimento parece ser inicialmente

determinado por uma gama de fatores externos (CHOW, 1987). Dentre estes pode-se destacar os

recursos alimentares, que variam em resposta a mudanças nas densidades dos consumidores

(CASTENHOLZ, 1961; SUTHERLAND, 1970; HAVEN 1973; UNDERWOOD, 1976, 1978; CREESE,

1980) ou nas condições ambientais (SUTHERLAND, 1970; CUBIT 1975; STICKLE, 1985). Alguns

estudos sugerem que o estresse físico pode restringir o forrageamento de gastrópodes (BEHRENS,

1974; MENGE, 1974; MENGE, 1978a,b) e, indiretamente, reduzir a taxa de crescimento (FRANK,

1965; LEWIS & BOWMAN, 1975; ROBERTS & HUGHES, 1980).

Para espécies da região entremarés, o crescimento é normalmente sujeito a fatores

bióticos (tamanho corporal e suprimento alimentar) e abióticos (temperatura e salinidade)

(HUGHES, 1986). Além disso, por ser dependente destes, é aceitável que a taxa de incremento

corporal varie de acordo com a estação do ano e a idade. O crescimento de duas espécies de

Japeuthria, da costa leste da ilha de Kyushu no Japão, demonstrou claramente uma variação

sazonal e dependência do tamanho corporal, sendo que indivíduos menores possuíam taxas de

crescimento mais elevadas (OTA & TOKESHI, 2000). Variações sazonais semelhantes foram

também observadas para três espécies de Thais na costa Pacífica da América do Norte (SPIGHT,

47

1981). Neste trabalho, Thais lamellosa (Gmelin, 1792) alcançou o maior crescimento no verão,

enquanto que T. emarginata (Deshayes, 1839) e T. canaliculata (Dudos, 1832) cresceram mais

rápido na primavera, sendo que todas demonstraram pouco ou nenhum crescimento durante os

meses de inverno. MORAN et al. (1984) também atribuiu uma variação sazonal na taxa de

crescimento de Morula marginalba Blainville, 1832, sugerindo que existe forte ligação entre o

período de baixo crescimento, a época reprodutiva e a baixa temperatura da água.

Para a família Nassariidae, mudanças sazonais na temperatura da água, disponibilidade de

alimento e idade são os principais fatores no controle do crescimento das espécies

(CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2008). Temperaturas elevadas durante o verão foram

relacionadas com o aumento do crescimento de Nassarius reticulatus (Linnaeus, 758)

(TALLMARK , 1980; LAMBECK, 1984; BARROSO et al., 2005), N. festivus (Powys, 1838) (MORTON

& CHAN, 2004) e Ilyanassa obsoleta (Say, 1822) (CURTIS, 1995). MCKILLUP e BUTLER (1983)

observaram que o tamanho médio dos adultos de Nassarius pauperatus (Lamarck, 1822) variou

significativamente com a disponibilidade de alimento. De forma semelhante, recursos

alimentares limitados retardaram o crescimento de Nassarius dorsatus (Roding, 1798)

(MCKILLUP & MCKILLUP, 1997). TALLMARK (1980) e BARROSO et al. (2005) demonstraram que

o crescimento de N. reticulatus foi mais rápido durante o primeiro ano de vida da espécie,

entretanto, com a chegada da maturidade sexual as taxas de crescimento tornaram-se irregulares.

CHATZINIKOLAOU e RICHARDSON (2008) observaram diferentes taxas de crescimento entre

adultos e juvenis de N. reticulatus, sendo que os últimos possuíam maiores taxas de aumento

corporal. Além disso, os autores não encontraram diferenças significativas no crescimento entre

machos e fêmeas, entretanto, notaram que fêmeas atingem um tamanho maior.

Padrões de crescimento diferem de acordo com a ocorrência geográfica da população

(MCKILLUP et al., 1993). Nassarius festivus, considerada uma espécie tropical, possui um rápido

crescimento juvenil e pequena longevidade (MORTON & CHAN, 2004). Os autores explicaram

que os padrões de história de vida dessa espécie são conseqüência das perturbações nas

condições ambientais e flutuações na disponibilidade de alimento. Por outro lado, espécies de

regiões subtropicais e temperadas, como I. obsoleta (CURTIS, 1995) e N. reticulatus (TALLMARK ,

1980; CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2008) respectivamente, devido a marcada sazonalidade

48

na temperatura, salinidade e disponibilidade de alimento possuem crescimento lento e grande

expectativa de vida. Outras espécies, como N. pauperatus, possui capacidade para alterar sua

estratégia de vida se adequando as mudanças ambientais (MCKILLUP & BUTLER, 1979).

Entre esses prosobrânquios, Nassarius vibex (Say, 1822) é comum em regiões entremarés

de praias areno-lamosas no sudeste dos EUA (DEMAINTENON, 2001), Caribe, Venezuela, e Brasil

(RIOS, 1994). No sudeste brasileiro, altas densidades desta espécie foram observadas sobre

bancos do bivalve Mytella charruana (D’Orbigny, 1842) por AMARAL et al. (submetido).

Informações acerca da estrutura populacional, crescimento, recrutamento e produção secundária

desta espécie são inexistentes. Levando em consideração a ocorrência de N. vibex em condições

climáticas tropical e subtropical, a espécie pode apresentar um padrão de crescimento similar

tanto a N. festivus (MORTON & CHAN, 2004) como a N. reticulatus (CHATZINIKOLAOU &

RICHARDSON, 2008) e I. obsoleta (CURTIS, 1995), dependendo de sua localidade de ocorrência.

Neste contexto, o presente capítulo tratará da análise de alguns parâmetros da biologia

populacional de Nassarius vibex como a densidade, a estrutura populacional, o crescimento, o

recrutamento e a produção secundária. Atenção será dada a comparações dos padrões de

crescimento de N. vibex com populações de regiões tropicais, subtropicais e temperadas para

avaliar a hipótese apresentada acima.

METODOLOGIA

Amostragem e procedimentos de laboratório

Os indivíduos de N. vibex foram amostrados mensalmente, de fevereiro de 2006 a

fevereiro de 2007 no banco do Camaroeiro e, entre dezembro de 2006 e março de 2008, no

banco da Cidade. O tamanho dos setores de coleta e do quadrado de 1 m de lado foi definido

após coletas-piloto realizadas em janeiro de 2006. As amostragens no Camaroeiro foram

suspensas a partir de março de 2007, devido a alterações na morfodinâmica da área.

Para a obtenção dos indivíduos de N. vibex foi delimitado um setor retangular,

abrangendo parte do banco de mitilídeos e de suas bordas externas superior e inferior, com

dimensões de 24 m de comprimento por 15 m de largura. Dentro deste setor, na área mediana do

banco, 4 quadrados foram rebatidos paralelamente à linha d’água (área A) e outros 4 quadrados

49

foram rebatidos a 1 m de distância da margem superior do banco em direção a maré alta (área B)

(Fig. 1). Entretanto, devido à pequena extensão da margem superior do banco da Cidade, não

foram obtidas amostras nessa região. Todas as áreas delimitadas foram cuidadosamente

examinadas e quando necessário, o sedimento foi peneirado em malhas de 0,5 mm no próprio

local da coleta. Durante a coleta piloto, observou-se que N. vibex pode se enterrar a uma

profundidade de até 3 cm no sedimento e, desta forma, todo o substrato até esta profundidade

também foi examinado.

No laboratório, o comprimento da concha de todos os indivíduos foi medido com o

auxílio de um paquímetro digital com precisão de 0,01 mm. Para a análise da produção

secundária, os gastrópodes foram divididos em 17 classes de tamanho, a primeira variando de

0,01 a 5,00 mm e as 16 restantes entre 5,01 e 21,00 mm, com um intervalo de 1,00 mm. Cerca de

15 indivíduos foram selecionados aleatoriamente de cada classe de tamanho e, de acordo com a

metodologia modificada de URBAN e CAMPOS (1994) e CAETANO et al. (2003), os gastrópodes

foram secos a 60°C por 24 horas para a estimativa o peso seco (PS). As cinzas resultantes do

peso seco (CRPS) foram obtidas após a queima das partes moles secas a 500°C em forno mufla

durante 5 horas. O peso livre de cinzas (PSLC) foi calculado subtraindo o peso das cinzas

(CRPS) do peso seco (PS) da parte mole do animal.

Figura 1. Desenho esquemático do banco de Mytella charruana e do setor de coleta.

50

Análise dos dados

Devido à impossibilidade de amostragens na área B do banco da Cidade, as análises

comparativas de tamanho, crescimento, mortalidade e produção secundária entre os bancos

foram realizadas apenas com os dados das áreas A. Comparações de densidade e tamanho entre

as áreas A e B foram realizadas somente no Camaroeiro, no entanto o baixo número amostral da

área B não permitiu análises de crescimento, mortalidade e produção secundária.

Os dados de densidade e tamanho foram inicialmente avaliados quanto à normalidade e

homogeneidade das variâncias por meio dos testes de Shapiro-Wilk e Levene, respectivamente.

Este procedimento prévio permitiu a escolha de testes paramétricos e não-paramétricos

adequados para cada conjunto de dados. Comparações das densidades médias anuais de N. vibex

entre os bancos e, entre as áreas A e B do Camaroeiro foram realizadas por meio de um teste t de

Student. A existência de variações mensais nas densidades em cada população foi avaliada por

uma análise de variância (ANOVA).

O teste U de Man-Whitney foi utilizado para a comparação do tamanho médio de N.

vibex entre os dois bancos. Para cada um, variações mensais nos comprimentos médios da

concha foram avaliadas por meio do teste de Kruskal-Wallis. A existência de diferentes grupos

etários nas populações de N. vibex foi observada por meio das distribuições das freqüências

mensais de tamanho, permitindo a identificação de padrões de crescimento e recrutamento. Para

tanto, as distribuições heterogêneas de freqüência de tamanho foram submetidas à análise com

auxílio do pacote estatístico Mixdist, presente na plataforma do ambiente R (MACDONALD & DU,

2008). Esta metodologia permite o isolamento de grupos de indivíduos com tamanhos próximos

e, consequentemente, idades semelhantes por meio do método de estimativa por máxima

verossimilhança (DU, 2002). Após este procedimento, idades absolutas foram designadas para

cada comprimento de concha estimado, formando um conjunto de dados de idade-comprimento

(GÓMEZ & DEFEO, 1999). Posteriormente, para avaliar o crescimento de N. vibex, esses dados

foram aplicados a versão sazonal da equação de crescimento de von Bertalanffy (RICHARDSON et

al., 2005), dada por:

)1( )))(2)2/()(2)(2/()(( 00 ss ttsenCKttsenCKttkeLL −−−−−−∞ −= ππππ

onde L é o comprimento na idade t, L∞ é o comprimento assintótico máximo, K é a constante de

51

crescimento de von Bertalanffy, to é a idade no comprimento zero, C é a amplitude de variação

sazonal no crescimento, e ts é o parâmetro que fixa o período dentro de um ano, em que o

crescimento é o menor, sendo denominado “winter point” (WP = ts+0,5).

O índice de crescimento phi-prima (φ’) definido como: φ’ = 2log10(L∞)+log10K (PAULY

& M UNRO, 1984) foi usado para medir o desempenho do crescimento, uma vez que a

correlação negativa entre L∞ e K invalida as comparações entre os parâmetros individuais.

A taxa instantânea de mortalidade (Z) foi estimada de acordo com o modelo de

mortalidade exponencial simples negativo (BREY, 2001) para os dados de freqüência de

tamanho de N. vibex log-transformados por meio da equação:

Ztt eNN −= 0

aplicando-se os valores dos parâmetros de crescimento de von Bertalanffy L∞, K, C e ts, em

uma curva de captura convertida em tamanho (PAULY , 1984a,b):

ibtatNi +=∆ )/ln(

na qual Ni é número médio de indivíduos da classe de tamanho i, ∆t é o tempo necessário para

o crescimento ao longo dessa classe de tamanho, ti é a idade do tamanho médio da classe de

tamanho i, e Z = -b.

A produção secundária foi calculada segundo a metodologia de LOMOVASKY et al.

(2005) por meio do método do crescimento massa–específica desenvolvido por CRISP (1984):

∑= NiGiWiP

onde Ni é o número médio de indivíduos na classe de tamanho i durante o período ∆t, Gi é a

taxa de crescimento massa-específica por classe de tamanho i, Wi é peso médio da classe de

tamanho i, e ∆t o intervalo de tempo. A taxa de crescimento massa-específica foi calculada por:

( )( )1−= ∞ LiLbKGi

na qual b é o coeficiente exponencial da relação linear tamanho e massa corporal, K e L∞ são

constantes da equação de crescimento de von Bertalanffy, e Li é o tamanho médio da classe de

tamanho i. A biomassa média anual, B = ƩNiWi∆t, assim como a razão P/B (CAETANO et al.,

2003) também foram calculadas.

52

RESULTADOS

Densidade

Um total de 8.925 indivíduos de Nassarius vibex foi amostrado, 4.734 no banco da

Cidade e 4.191 no Camaroeiro. Neste, foram observadas diferenças significativas (t=-7,57,

p<0,05) entre as densidades anuais médias das áreas A (72,34 ± 7,92 indivíduos m-²) e B (15,68

± 7,68 inds m-²), e ao longo dos meses (Área A: F=2,902, p<0,01; Área B: F=9,366, p<0,01).

Na área A, foi verificado um aumento gradual na densidade média entre março (34,66 ± 23,02

inds m-²) e agosto de 2006 (98,50 ± 32,72 inds m-²), intercalado por pequenas reduções em

maio e julho de 2006 (Fig. 2A). Paralelamente, houve uma diminuição na temperatura da água

de 26°C para 22°C. A partir de agosto de 2006, a densidade média sofre pequenas oscilações

até fevereiro de 2007 (90,00 ± 27,01 inds m-²), enquanto ocorre aumento gradual da

temperatura (Fig. 2A).

Figura 2. Nassarius vibex. Variações mensais da densidade para as regiões central (A) e borda superior (B) do banco do Camaroeiro, e da temperatura da água. As barras verticais indicam o desvio padrão da média.

53

A densidade média na área B foi menor do que na A, com aumento similar entre março

(17,50 ± 9,74 inds m-²) e agosto de 2006 (50,25 ± 16,23 inds m-²) (Fig. 2B). Posteriormente, a

queda acentuada na densidade média até os menores valores registrados em setembro (2,50 ±

2,38 inds m-²) e outubro de 2006 (2,00 ± 6,55 inds m-²), contrasta com a elevação da

temperatura. Entre novembro de 2006 (6,25 ± 6,55 inds m-²) e fevereiro de 2007 (17,50 ± 9,03

inds m-²) houve um pequeno aumento na densidade.

A variação significativa (F=4,375, p<0,05) na densidade do banco da Cidade (Fig. 3)

demonstrou padrão semelhante ao observado na região A do Camaroeiro (Fig. 2A), sem

diferenças significativas nas densidades médias anuais (Camaroeiro: 72 ± 21 inds m-2; Cidade:

91 ± 38 inds m-2). Na Cidade, entre dezembro de 2006 e agosto de 2007, houve uma elevação

nos valores de densidade de 73,66 ± 6,11 inds m-² para 192,25 ± 65,36 inds m-², alternado por

períodos de pequenas oscilações (Fig. 3). Neste mesmo período, a temperatura da água sofreu

uma redução de 26°C (fevereiro de 2007) para 19°C (agosto de 2007). Entre agosto de 2007 e

março de 2008 há redução na densidade para 62,75 ± 36,87 inds m-². Já a temperatura da água

sofreu aumento de 19°C para 26°C entre agosto de 2007 e fevereiro de 2008 (Fig. 3).

Figura 3. Nassarius vibex. Variação mensal da densidade e da temperatura da água no banco da Cidade. As barras verticais indicam o desvio padrão da média.

54

Estrutura populacional, crescimento e recrutamento

Indivíduos do Camaroeiro (16,33 ± 1,97 mm) foram significativamente maiores

(U=1.833.005, p<0,05) do que os da Cidade (15,43 ± 2,33 mm). Para ambas as áreas, houve

variações significativas no comprimento da concha ao longo dos meses (Camaroeiro: F =

15,88, p <0,05; Cidade: F = 9,67, p <0,05) (Fig. 4). No banco do Camaroeiro, o comprimento

médio da concha sofreu uma redução inicial de 17,20 ± 1,22 mm em fevereiro de 2006 para

15,35 ± 3,04 mm em maio de 2006 (Fig. 3). Um rápido aumento foi observado nos próximos

meses, seguido por uma diminuição de junho de 2006 (17,08 ± 1,47 mm) a fevereiro de 2007

(15,28 ± 2,45 mm). No banco da Cidade, entre dezembro de 2006 e fevereiro de 2007, a média

aumentou de 15,41 ± 1,21 mm para 16,71 ± 1,35 mm, com uma posterior redução para 14,66 ±

2,42 mm em maio de 2007. Um aumento no tamanho foi observado a partir de maio a julho de

2007, seguido por uma constante oscilação entre agosto e dezembro de 2007, e sem maiores

variações significativas ao longo dos últimos três meses (janeiro-março 2008).

O padrão populacional observado em fevereiro de 2006 não se repetiu no banco do

Camaroeiro em fevereiro de 2007. Neste mês houve registro de coortes de juvenis em

desenvolvimento, as quais não foram observadas no mesmo período de 2006. No banco da

Cidade, as estruturas populacionais apresentaram semelhanças e diferenças entre os anos. Ao

Figura 4. Nassarius vibex. Variação mensal do comprimento da concha (mm) das duas populações. As barras verticais indicam o desvio padrão da média.

55

comparar o resultado de dezembro de 2006, nota-se grande semelhança com dezembro de

2007, sendo que a única diferença foi observada em janeiro e fevereiro de 2007 com os

respectivos meses em 2008. Em janeiro e fevereiro de 2007, há um evento de recrutamento

(Ci5), o qual não foi registrado nos no mesmo período de 2008.

Sete coortes foram identificadas na população do banco do Camaroeiro (Fig. 5): três de

adultos (Ca1, Ca2 e Ca3) e quatro de juvenis (Ca4, Ca5, Ca6 e Ca7). Ca1 foi registrada entre

fevereiro de 2006 e fevereiro de 2007, Ca2 entre fevereiro de 2006 e janeiro de 2007, e Ca3

entre março e junho de 2006. Os primeiros eventos de recrutamento (Ca4, Ca5 e Ca6) foram

observados em abril de 2006 e estas coortes mantiveram-se na população até fevereiro de 2007.

Em agosto de 2006, uma possível sobreposição de Ca3 com Ca4, produzindo um grupo etário

heterogêneo, o qual foi considerado Ca4 a partir deste ponto. O segundo pico de recrutamento

(Ca7) foi verificado em novembro de 2006, sendo coorte observada até fevereiro de 2007.

A população do banco da Cidade apresentou padrão estrutura populacional (Fig. 6)

composta por quatro coortes de adultos (Ci1, Ci2, Ci3 e Ci4) e quatro de juvenis (Ci5, Ci6, Ci7

e Ci8). A coorte Ci1 foi observada entre dezembro de 2006 e março de 2008, Ci2 em dezembro

de 2006 e janeiro de 2007, e Ci3 de dezembro de 2006 a fevereiro de 2008.O desaparecimento

de Ci2 a partir de fevereiro de 2007 pode ser resultado de uma sobreposição com Ci3. Ci4

ocorreu inicialmente em dezembro de 2006 e permaneceu na população até março de 2008,

enquanto o primeiro recrutamento (Ci5) foi observado em janeiro de 2007, sendo esta coorte

registrada até fevereiro de 2008. Novos episódios de recrutamento (Ci5, Ci6, Ci7 e Ci8) foram

registrados a partir de abril de 2007 e grande parte das coortes foi observada até março de 2008.

56

Figura 5. Nassarius vibex. Distribuição das freqüências de tamanho da população do banco do Camaroeiro. As coortes identificadas para cada mês estão marcadas nos gráficos, assim como o grupo de indivíduos utilizados na composição de cada coorte. O resultado do teste de Qui-quadrado (X²), que avaliou a existência de sobreposição entre as coortes, também está indicado. Valores de p acima de 0,05 indicam ausência de sobreposição.

57

Figura 6. Nassarius vibex. Distribuição das freqüências de tamanho da população do banco da Cidade. As coortes identificadas para cada mês estão marcadas nos gráficos, assim como o grupo de indivíduos utilizados na composição de cada coorte. O resultado do teste de Qui-quadrado (X²), que avaliou a existência de sobreposição entre as coortes, também está indicado. Valores de p acima de 0,05 indicam ausência de sobreposição.

58

O crescimento da população de N. vibex do Camaroeiro caracterizou-se por menor

comprimento assintótico, e maiores constantes de crescimento e oscilação do que o da Cidade

(Fig. 7A,B). O início do período de menor crescimento, ou ¨winterpoint¨, também foi diferente

entre as duas populações, com a da Cidade reduzindo antes do Camaroeiro. Após o

assentamento dos juvenis, o crescimento foi similar em ambas as áreas, com indivíduos

atingindo aproximadamente 10,00 mm no comprimento da concha ao final do primeiro ano de

vida. No entanto, após este período, a população do Camaroeiro apresentou maior crescimento

atingindo 16,00 mm, no segundo ano, enquanto a população da Cidade só cresceu para 14,00

mm. O terceiro ano ainda apresenta uma separação entre as populações com os indivíduos do

Camaroeiro crescendo de 16,00 a 17,00 mm, enquanto a população da Cidade, com uma taxa

de crescimento menor, atinge apenas 16,00 mm. No quarto ano, a população do Camaroeiro

alcançou o valor do comprimento assintótico, enquanto a da Cidade se manteve em um

crescimento estável até 17,0 mm. Nesta população, somente ao final do quinto ano é alcançado

o comprimento assintótico. Os índices phi-prima para os bancos do Camaroeiro e da Cidade

foram 2,60 e 2,30, respectivamente.

Figura 7. Nassarius vibex. Curvas de crescimento das populações nos bancos do Camaroeiro (A) e da Cidade (B). Os círculos e triângulos indicam o comprimento médio estimado para cada coorte e as barras verticais, o desvio padrão da média. As linhas cheias indicam as curvas estimadas de von Bertalanffy, assim como os respectivos parâmetros de crescimento.

59

Mortalidade e produção secundária

A taxa de mortalidade instantânea de N. vibex (Z) foi de 0,92 para a população do

Camaroeiro e 1,01 para a da Cidade. A biomassa anual média (B) neste último banco foi de

7,98 g PSLC m-2, a produção anual (P) de 3,60 g PSLC m-2 ano-1 e a relação P:B de 0,45. Os

resultados para o banco da Cidade foram maiores dos que os registrados no banco do

Camaroeiro (B = 0,90 g PSLC m-2, P = 0,35 g PSLC m-2 ano-1, P:B = 0,38).

DISCUSSÃO

Densidade

As duas populações de Nassarius vibex apresentaram diferenças na densidade e na

variação média ao longo do período de estudo. No banco do Camaroeiro, as densidades médias

de N. vibex foram maiores na área A (parte central do banco) do que na área B (borda superior

do banco). Tal fato pode estar relacionado à organização estrutural de bancos de mitilídeos,

pois a agregação de indivíduos vivos, filamentos do bisso, conchas vazias, sedimento, fezes e

pseudofezes aumenta a disponibilidade de microhabitats para diversos organismos (HAMMOND

& GRIFFITHS, 2004). Por terem características distintas do meio, estes bancos podem fornecer

alimento e proteção para organismos com tolerância restrita ao estresse ambiental (SAIER,

2002; THIEL & ULLRICH, 2002). Os bancos de M. charruana representam um recurso alimentar

de alta qualidade para N. vibex, uma vez que esta é uma espécie carniceira, se alimentando

principalmente de animais mortos (MOORE et al., 1968; BRITTON & MORTON, 1994), entretanto

há registro da utilização de poliquetas (FORRONI et al., 2008) e massas ovígeras dos mesmos

(HURST, 1965). As altas densidades de N. vibex registradas nos bancos de M. charruana devem

ser resultado da maior disponibilidade de alimento, além de proporcionar proteção contra

predadores e variações ambientais para os indivíduos e suas cápsulas ovígeras, depositadas nas

algas que crescem sobre os mitilídeos (Capítulo 2). Os poliquetas polidorídeos, entre outros,

conforme já mencionado no Capítulo 1, foram os grupos mais abundantes, constituindo uma

rica fonte de alimento para a fauna associada a esses bancos.

60

As áreas A e B do banco do Camaroeiro apresentaram padrões semelhantes de variação

temporal da densidade. Houve aumento gradual nestes valores de março até o pico em agosto

(A: 98,50 ± 32,72 e B: 50,25 ± 16,23 inds m-2) e posterior redução. A queda drástica na

densidade média da área B, a partir de setembro de 2006, ocorreu principalmente devido a

alterações na morfologia da praia (Fig. 8). A partir deste mês, na borda superior do banco de

mitilídeos (Bm) começou a ocorrer acúmulo de areia média; em dezembro, uma banco de areia

(Ba) se formou em frente ao nível inferior do banco; e, em fevereiro de 2007, este banco de

areia isolou, o banco de mitilídeos, completamente do contato com o mar, deixando-o

seriamente ameaçado de extinção. Até o presente momento, as alterações do banco de

mitilídeos continuam sendo observadas e o banco de areia ainda não apresentou sinais de recuo.

Ao longo do período de estudo, as densidades de N. vibex variaram de 34 a 98 inds m-2

para o banco do Camaroeiro e de 38 a 192 inds m-2 para o da Cidade, com valores anuais

médios de 72,34 ± 21,74 e 91,96 ± 38,11 inds m-2, respectivamente. Outros estudos utilizaram

o número de indivíduos amostrados em armadilhas ao longo do tempo para avaliar diferenças

nas abundâncias de N. festivus (MORTON & CHAN, 2004) e N. reticulatus (CHATZINIKOLAOU &

RICHARDSON, 2008) em diferentes locais. Para N. festivus, o número de indivíduos coletados

por minuto em três diferentes baias de Hong Kong foi de 0,48, 0,77 e 2,01 (MORTON & CHAN,

2004). A comparação entre a população de N. reticulatus de uma lagoa costeira e de uma praia

exposta, ambas da região de Rhosneigr (Grã-Bretanha), demonstrou maior abundância na lagoa

Figura 8. Banco de Mytela charruana na praia do Camaroeiro, Caraguatatuba, SP. As fotografias mostram o banco de mitilídeos (Bm), a evolução do banco de areia (Ba) e o isolamento com relação ao mar. Fotos: Cecília Amaral.

Janeiro/06 Março/07

Bm Bm

Ba Ba

61

(CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2008). Entretanto, esta metodologia é dependente da

temperatura do ar e do nível de atividade apresentado pelos nassarídeos no momento da

amostragem e, desta forma, os valores podem não ser comparáveis com a realidade.

As densidades comumente observadas para outros gastrópodes variam grandemente.

SOLA (1996) observou densidades médias anuais variando entre 5.620 e 8.270 inds m-² para

Hydrobia ulvae (Pennant, 1777) no estuário de Bidasoa, Espanha. Ventrosia maritima

(Montagu, 1803) apresentou densidades médias anuais de 14.571,1 e 9.743,8 inds m-² em duas

áreas lamosas da lagoa Monolimni, Grécia (KEVREKIDIS & W ILKE , 2005). No Brasil, DENADAI

et al. (2004) observaram uma densidade anual média de 4,98 inds m-² para Cerithium atratum

(Born, 1778) na praia do Engenho d’Água, São Sebastião (SP). A população da espécie

Olivancillaria vesica vesica (Gmelin,1791) apresentou as maiores densidades durante o outono

e inverno (CAETANO et al., 2003), sem correlações com fatores abióticos (tamanho do grão de

areia, salinidade e temperatura da água) e bióticos (densidade da principal presa).

Variações na densidade de populações de gastrópodes estão relacionadas com

oscilações na temperatura (e.g. WILSON & FORREST, 2004; CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON,

2008). Estas oscilações podem afetar direta ou indiretamente a sobrevivência dos organismos e,

consequentemente, as densidades populacionais. Para as duas populações de N. reticulatus em

Rhosneigr (Grã-Bretanha), as maiores abundâncias foram observadas nos meses de verão

(CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2008), nos quais houve um aumento significativo na

atividade alimentar dos gastrópodes quando comparado aos períodos de inverno. TALLMARK

(1980) observou padrão semelhante para N. reticulatus na baia de Kvarnbukten (Suécia), com

indivíduos inativos nas temperaturas abaixo de 4°C e as maiores densidades registradas no

verão. A população de Nassarius sinusigerus (Adams, 1852) apresentou alta abundância no

outono e baixa no verão (EDEN et al., 2003), semelhante ao observado por MORTON e CHAN

(2004) para N. festivus, entretanto para N. sinusigerus, eventos de recrutamento foram os

principais fatores para variações nas abundâncias. Para Gabbia vertiginosa Frauenfeld, 1862,

em New South Wales (Austrália), as maiores densidades foram verificadas no verão (KOCH,

2004) e, foram, portanto, relacionadas à temperatura e também ao nível da água adequado ao

62

crescimento da planta composta Elatine gratioloides (A. Cunn, 1839) utilizada pelo gastrópode

para alimentação, abrigo e deposição das cápsulas ovígeras. No presente estudo, as maiores

densidades de N. vibex ocorreram nos meses de inverno. A influência da temperatura da água e

a quantidade de matéria orgânica do substrato possuem efeito significativo na reprodução de

alguns nassarídeos, controlando períodos de liberação de gametas e regulando a magnitude do

recrutamento, como para N. reticulatus (TALLMARK , 1980), N. obsoletus (SCHELTEMA, 1967;

SASTRY, 1970), N. trivittatus (Say, 1822) (PECHENIK, 1978) e N. sinusigerus (EDEN et al.,

2003),

Recentemente, foi reconhecido que o assentamento larval limitado, pode causar

mudanças nos padrões da abundância populacional e da estrutura da comunidade (YOSHIOKA,

1982; UNDERWOOD & DENLEY, 1984; GAINES & ROUGHGARDEN, 1985; ROUGHGARDEN et al.,

1988, NODA & NAKAO , 1996). No evento denominado limitação por recrutamento, o número

de recrutas larvais que sobrevivem tem maior participação no controle da abundância da

população do que fatores pós-assentamento, como competição por recursos limitados e

predação (YOSHIOKA, 1982; DOHERTY, 1983; VICTOR, 1983, 1986; CONNELL, 1985; SHULMAN

& OGDEN, 1987; HUGHES, 1990; PETERSON & SUMMERSON, 1992). Neste caso, a percepção da

importância do recrutamento só é compreendida ao longo do desenvolvimento da população,

uma vez que o assentamento dos juvenis é reduzido. EDEN et al. (2003) observaram que a

magnitude dos picos de abundância de N. sinusigerus resulta de grandes assentamentos de

juvenis advindos dos episódios de recrutamentos anuais. Comparando as variações nos valores

médios de densidade de N. vibex ao longo dos meses (Figs. 2 e 3) com suas respectivas

estruturas populacionais (Figs. 5 e 6), não houve relação dos picos de densidade com episódios

de recrutamento. A baixa representatividade de recrutas em ambas as populações indica

pequena sobrevivência de juvenis, uma vez que as populações depositam grandes quantidades

de cápsulas ovígeras no ambiente (Capítulo 2).

NODA e NAKAO (1996) comprovaram que a dominância de adultos na população de

Umbonium costatum (Kiener, 1834), da baia de Hakodate (Japão), foi conseqüência de eventos

de recrutamento bem sucedidos em anos anteriores. Na população de N. vibex do Camaroeiro, o

63

pico de densidade observado em agosto de 2006 pode ter derivado dos recrutamentos (Ca4,

Ca5 e Ca6) ocorridos em abril de 2006. A principal justificativa é a evolução da coorte Ca4,

alcançando cerca de 15,00 mm no comprimento médio da concha, tamanho compatível com a

maturidade sexual da espécie, conforme mencionado por DEMAINTENON (2001). No banco da

Cidade, o mesmo padrão foi observado com recrutamento em abril de 2007 (Ci5 a Ci8) e

posterior pico de densidade em agosto de 2007. Entretanto, o segundo recrutamento (Ca7) em

novembro de 2006 no Camaroeiro não foi acompanhado de grandes modificações nas

densidades entre novembro de 2006 e fevereiro de 2007. Neste caso, o efeito da entrada de

juvenis pode ter sido mascarado pela influência da mudança na morfodinâmica do banco do

Camaroeiro, com a formação do banco de areia no entorno do banco de mitilídeos. Notou-se

nesse período que indivíduos das regiões adjacentes migraram para dentro do banco, mantendo

as densidades elevadas.

Estrutura populacional, crescimento e recrutamento

As estruturas populacionais de N. vibex nas duas áreas foram muito semelhantes,

apresentando pequenas diferenças. As populações foram compostas principalmente de

indivíduos adultos, com dois períodos de recrutamento durante o ano, sendo que o principal

episódio de entrada de juvenis ocorreu em abril e maio. Este período foi marcado pelo início da

redução na temperatura da água. Entretanto, ambas as populações apresentaram outro evento de

recrutamento em épocas diferentes. No Camaroeiro, este foi observado em novembro de 2006 e

na Cidade em fevereiro de 2007. Este padrão de dois períodos de recrutamento ao longo do ano

não é compartilhado por outros nassarídeos que normalmente apresentam apenas uma época de

entrada de juvenis. Para N. reticulatus em Aveiro (Portugal), BARROSO et al. (2005) registrou

um único período de recrutamento em setembro; LAMBECK (1984) observou recrutamento

anual em Grevelingen (Holanda); e CHATZINIKOLAOU e RICHARDSON (2008) registraram

recrutamento entre janeiro e abril na região de Rhosneigr (Grã-Bretanha). No caso de N.

festivus, a espécie apresentou entrada de juvenis em janeiro e fevereiro em três baías em Hong

Kong (MORTON & CHAN, 2004). Para N. sinusigerus, este período foi restrito no final do verão

64

e outono (EDEN et al., 2003). Para outros gêneros de nassarídeos, o padrão de recrutamento

anual também é mantido. NAVARTE (2006) registrou grandes quantidades de juvenis de

Buccinanops globulosum (Kiener, 1834) em janeiro de 2002 e em janeiro e fevereiro de 2003

em Villarino (Argentina).

Os períodos de recrutamento de N. vibex foram os responsáveis pela variação no

tamanho médio ao longo desse estudo. No Camaroeiro, a queda no tamanho médio da

população entre fevereiro e maio de 2006 resultou do recrutamento de Ca4, Ca5, Ca6 e Ca7 em

abril e maio. Posteriormente, o desenvolvimento contínuo das coortes de recrutas aliado ao

surgimento de Ca7 em novembro de 2006 continuou a contribuir para a redução no tamanho

médio da população (Figs. 4 e 5). Na Cidade, o aparecimento de Ci5 não foi suficiente para

diminuir as médias de comprimento de concha entre dezembro de 2006 e fevereiro de 2007.

Entretanto, a partir de fevereiro de 2007, a redução no tamanho médio foi conseqüência direta

das coortes Ci4, Ci5, Ci6 e Ci7, diminuindo o tamanho médio da população (Figs. 4 e 6). As

sucessivas oscilações a partir de julho de 2007 correspondem aos efeitos no desenvolvimento

das coortes de juvenis, as quais, por terem menor representatividade na população, nem sempre

são fortemente amostradas.

Além desse padrão na entrada de juvenis nas populações de nassarídeos, há também

variações na sua composição etária. Para a espécie N. reticulatus, três classes etárias foram

diferenciadas, no entanto, ao atingir a maturidade sexual, as classes de adultos se sobrepõem,

tornando complicada a definição de seu número exato. (TALLMARK ,1980). A população desta

espécie, em Aveiro (Portugal), foi composta por várias coortes com adultos sendo formado por

pelo menos quatro classes etárias (BARROSO et al., 2005). Este mesmo padrão foi observado

nas duas populações de N. reticulatus por CHATZINIKOLAOU e RICHARDSON (2008). Por outro

lado, as populações de N. festivus em Hong Kong apresentaram apenas uma coorte de adultos

ao longo da maior parte do seu desenvolvimento, exceto em períodos de recrutamento quando

juvenis foram observados (MORTON & CHAN, 2004). Em N. vibex, o padrão é semelhante a N.

reticulatus, com a população composta principalmente por adultos, divididos em pelo menos

três classes etárias adultas e mais uma de juvenis.

65

Variações sazonais na temperatura da água, disponibilidade de alimento e idade são

fatores com capacidade para influenciar o crescimento em nassarídeos (CHATZINIKOLAOU &

RICHARDSON, 2008). Levando estes fatos em consideração, populações distintas podem ser

afetadas de forma diferente e, portanto, possuir crescimentos diferenciados. Em alguns

gastrópodes, o rápido crescimento juvenil e sua estabilização em adultos são padrões comuns,

como em Concholepas concholepas (Bruguiére, 1789) (RABÍ & MARAVÍ , 1997), Japeuthria

ferrea (Reeve, 1847) e J. cingulata (Reeve, 1847) (OTA & TOKESHI, 2000). Para nassarídeos,

os padrões de crescimento podem divergir, como no caso de N. festivus, a qual possui rápido

crescimento, alcançando 14,00 mm de comprimento da concha no seu primeiro ano de vida

(MORTON & CHAN, 2004), com posterior redução após atingir o comprimento assintótico. Esta

espécie possui uma vida curta e maximiza o crescimento para alcançar a maturidade sexual em

alguns meses, o que é revelado pelos altos valores das constantes de crescimento (Tabela 1).

Por outro lado, as populações de N. reticulatus apresentam crescimento lento, com baixos

valores de K e longevidades estimadas em pelo menos 5 anos (CHATZINIKOLAOU &

RICHARDSON, 2008). BARROSO et al. (2005) observaram um crescimento de 6,7 a 7,8 mm no

comprimento da concha no primeiro ano de vida desta espécie, valores bem diferentes de N.

festivus. De forma semelhante, MCKILLUP e MCKILLUP (1997) demonstraram que na enseada

de Coorooman (Australia), N. dorsatus recruta ao longo de todo ano, possui um rápido

crescimento e morre dentro de dois meses. Padrões contrastantes como esses foram explicados

por MORTON e CHAN (2004), sendo resultado da condição tropical de N. festivus, ao passo que

I. obsoleta e N. reticulatus estão localizadas em regiões subtropical e temperada,

respectivamente.

Avaliando comparativamente estudos de crescimento de nassarídeos realizados ao longo

de um gradiente latitudinal (Tabela 1), é possível observar uma redução nas taxas de

crescimento de espécies de regiões tropicais, subtropicais e temperadas. Em regiões tropicais,

dada a pequena variação nas temperaturas da água, as espécies apresentam alta atividade e

crescimento para atingir a maturidade sexual. Entretanto, o ciclo de vida torna-se mais curto e a

longevidade é menor. As taxas de crescimento tendem a diminuir com o aumento da latitude,

66

uma vez que a sazonalidade da temperatura da água força indivíduos a dedicarem um período

do ano ao crescimento somático e outro ao desenvolvimento gonadal. Espécies de regiões

subtropicais e temperadas podem, por conseqüência, alcançar altas longevidades e formar

populações com grande sobreposição de gerações.

Ambas as populações de N. vibex foram caracterizadas, ao longo do período de estudo,

por um crescimento lento e alta longevidade quando comparadas a outras espécies de

Nassariidae e gastrópodes (Tabela 1). Este comportamento está mais relacionado a espécies de

regiões subtropicais (B. globulosum e I. obsoleta) e temperadas (N. reticulatus) do que com

tropicais (N. festivus). Portanto, há influência latitudinal na estrutura populacional e no

crescimento das duas populações de N. vibex. Outro fator a ser levado em consideração é a

estabilidade proporcionada pelos bancos de M. charruana. Estes microhabitats formados pela

Família/Espécie Local Região climática L∞ K φ’ Referência

Nassarius festivus Hong Kong Tropical (22o N) 16,6 2,7 2,87 Morton & Chan (2004)

Hong Kong Tropical (22o N) 17,4 2,3 2,84 Morton & Chan (2004)

Hong Kong Tropical (22o N) 18 2,0 2,81 Morton & Chan (2004)

Nassarius vibex Brasil Subtropical (23o S) 18 1,22 2,60 Presente estudo

Brasil Subtropical (23o S) 18,5 0,58 2,30 Presente estudo

Ilyanassa obsoleta EUA Subtropical (38o N) 29,8 0,13 2,06 Curtis et al. (2000)

Buccinanops globulosum Argentina Subtropical (40o S) 30,8 0,22 2,32 Navarte et al. (2008)

Argentina Subtropical (40o S) 51,6 0,49 3,12 Navarte (2006)

Nassarius reticulatus Grã-Bretanha Temperada (53o N) 19,7 0,69 2,43 Chatzinikolaou & Richardson (2007)

Grã-Bretanha Temperada (53o N) 25,1 0,48 2,48 Chatzinikolaou & Richardson (2007)

Grã-Bretanha Temperada (53o N) 25,1 0,52 2,52 Chatzinikolaou & Richardson (2007)

Grã-Bretanha Temperada (53o N) 25,2 0,54 2,54 Chatzinikolaou & Richardson (2007)

Grã-Bretanha Temperada (53o N) 27,3 0,35 2,42 Chatzinikolaou & Richardson (2007)

Grã-Bretanha Temperada (53o N) 31,1 0,21 2,31 Chatzinikolaou & Richardson (2007)

Grã-Bretanha Temperada (53o N) 25,5 0,7 2,66 Chatzinikolaou & Richardson (2008)

Grã-Bretanha Temperada (53o N) 28,6 0,85 2,84 Chatzinikolaou & Richardson (2008)

Tabela 1. Parâmetros da curva de crescimento de von Bertallanfy para espécies da família Nassariidae. Comprimento assintótico (L∞), constante de crescimento (K), índice de desempenho do crescimento (φ`).

67

agregação de bivalves, conchas vazias, filamentos do bisso e sedimento, fornecem recursos

alimentares e proteção para diversos organismos (ALBRECHT, 1998; THIEL & ULRICH, 2002).

O índice de desempenho do crescimento (φ`) de N. vibex é semelhante aos observados

para N. reticulatus (CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2007) e para a população de B.

globosum, na Baia de San Antonio (NAVARTE et al., 2008) (Tabela 1). Ainda em comparação

com N. reticulatus, as populações investigadas por CHATZINIKOLAOU e RICHARDSON (2008)

tiveram maior desempenho do que N. vibex, assim como N. festivus (MORTON & CHAN, 2004) e

na localidade de Villarino (Argentina) para B. globulosum (NAVARTE, 2006). Já I. obsoleta foi

a única a apresentar valor de phi-prima menor que as duas populações de N. vibex. Apenas esta

última e N. festivus não são espécies boreais e, apesar de serem encontradas em regiões

tropicais e subtropicais respectivamente, apresentaram características de crescimento

totalmente distintas. A comparação dos valores de comprimento assintótico, constante de

crescimento e índice phi-prima (Tabela 1) leva a concepção de que, no presente estudo, N.

vibex apresentou crescimento semelhante a N. reticulatus e B. globulosum, espécies tipicamente

de região temperada.

Os dois períodos anuais de recrutamento registrado nas populações de N. vibex

caracterizaram a espécie com um ciclo reprodutivo bianual. A maioria dos registros de

liberação de gametas para nassarídeos demonstram apenas uma época prolongada no verão,

como em N. reticulatus (RASMUSSEN, 1973) e N. tiarula (Kiener, 1841) (HOUSTON, 1978), ou

no inverno, como em N. festivus (CHAN & MORTON, 2005). A população de N. vibex do banco

do Camaroeiro teve dois períodos de recrutamento, um em abril e maio de 2006 e um segundo

em novembro de 2006. Entretanto, há diferenças na magnitude do recrutamento para as duas

épocas, com três coortes de recrutas em abril e maio e apenas uma em novembro. Cápsulas

ovígeras foram registradas neste banco entre abril e dezembro de 2006 (Capítulo 2), separadas

em dois subgrupos (abril-agosto e outubro-dezembro) sem nenhum registro em setembro de

2006. SCHELTEMA (1962) observou véligers de N. vibex alcançando 0,6 mm no comprimento

da concha em 16 dias, portanto juvenis levariam aproximadamente cinco meses para

assentarem na população com tamanho de 5,0 mm, implicando em recrutamentos entre

68

setembro e janeiro e entre março e maio. Desta forma, admitindo uma constância anual nos

períodos de deposição de cápsulas por N. vibex, as coortes Ca4, Ca5 e Ca6 devem ter derivado

de uma deposição entre outubro e dezembro de 2005, enquanto a coorte Ca7 da deposição entre

abril e agosto de 2006.

No banco da Cidade, assim como no Camaroeiro, também foram observados os dois

períodos de deposição com separação em setembro de 2006: o primeiro entre julho e setembro

e o segundo entre outubro e dezembro. Entretanto, um terceiro episódio de deposição, com

proporções similares ao primeiro (julho-setembro), foi registrado entre janeiro e abril de 2007

(Capítulo 2). Usando a mesma analogia aplicada para o banco do Camaroeiro, a coorte Ci5

deve ter derivado das cápsulas depositadas entre julho e setembro 2006, assim como Ci6, Ci7 e

Ci8 resultaram da deposição de outubro a novembro de 2006. Não houve o reconhecimento de

novas coortes na população de N. vibex neste banco até o último mês analisado (março de

2008), no entanto é possível supor que novos recrutas possam ter sido sobrepostos pelas coortes

recrutadas em abril de 2007. A ausência de juvenis nas populações de N. reticulatus em Aveiro

(Portugal) foi explicada por BARROSO e MOREIRA (1998) como resultado da separação entre os

locais de assentamento de recrutas e a população adulta, com juvenis migrando após um ano de

desenvolvimento. Esta hipótese pode não ser válida para N. vibex, que deposita suas cápsulas

ovígeras nas frondes das algas Ulvae lactuca Linnaeus 1753, a qual cresce sobre as conchas de

M. charruana, que também é o mesmo habitat dos adultos do gastrópode. Neste caso, a falta de

pequenos indivíduos pode ser resultado de outros fatores como pressão de predação ou mesmo

alta mortalidade juvenil após eclosão.

Mortalidade e produção secundária

A alta mortalidade no início da fase de vida juvenil é comum entre invertebrados

bentônicos (GOSSELIN & QJAN, 1997). Em uma revisão sobre mortalidade juvenil de

invertebrados marinhos, estes autores observaram que a sobrevivência de juvenis decresce

exponencialmente nos primeiros dias ou semanas de vida. Para algumas espécies de bivalves de

planícies lamosas, THORSON (1966) estimou que menos de 1,4% dos indivíduos assentados

69

conseguem atingir 2 mm de comprimento da concha. Portanto, pequenas variações na

mortalidade juvenil devem repercutir significativamente no tamanho, abundância e distribuição

populacional (THORSON, 1966; GOSSELIN & QJAN, 1997). A pressão seletiva exercida por essa

mortalidade é dependente da idade, sendo mais intensa durante um breve período ao invés de

adquirir constância ou redução linear com aumento da idade (GOSSELIN & QJAN, 1997).

Desta forma, o pequeno número de juvenis nas populações de N. vibex pode ser

resultado da alta mortalidade juvenil. Entretanto, ambas as populações apresentam grande

composição de adultos, implicando em alta sobrevivência, o suficiente para manutenção dessas

populações. GOSSELIN e QJAN (1996) afirmam que mudanças anatômicas, fisiológicas e

possivelmente comportamentais no início da vida juvenil são responsáveis pela redução das

taxas de mortalidade, permitindo que os indivíduos se adaptem ao novo ambiente. Neste caso, o

crescimento tem grande participação, pois à medida que juvenis alcancem valores críticos nos

quais a vulnerabilidade às influências negativas físicas e biológicas é reduzida, a sobrevivência

aumenta (GOSSELIN & QJAN, 1997). Além disso, a rápida eliminação de indivíduos que

permanecem em locais não favoráveis ao seu desenvolvimento é outro fator a ser considerado

(GOSSELIN & QJAN, 1997).

Em N. reticulatus, variações na temperatura da água e mortalidade induzida por

predadores (caranguejos) podem ter contribuído para as altas mortalidades observadas durante

a primavera e o verão (CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2008). Estes autores observaram

taxas de mortalidade anual mais altas em uma lagoa da região entremarés (Z = 0,778) do que

em uma praia exposta (Z = 0,577), menores do que as observadas para N. vibex no Camaroeiro

(Z = 0,922) e na Cidade (Z = 1,007).

A produção anual e a biomassa de N. vibex foram maiores na Cidade em comparação

com o Camaroeiro (Tabela 2). Não há relação da produção secundária com a composição do

sedimento, uma vez que não houve diferenças entre os dois bancos, especialmente quanto à

porcentagem de matéria orgânica. A produção anual da população do Camaroeiro (0,30 g

PSLC m-2 ano-1) foi semelhante a outras espécies como Haminoea hydatis (Linné, 1758),

Hydrobia ulvae (Pennant, 1777) e O. vesica vesica (Tabela 2). No banco da Cidade, a

70

população apresentou biomassa (7,68 g PSLC m-2) e produção (3,60 g PSLC m-2 ano-1) maiores

do que no Camaroeiro, sendo a produção próxima ao observado por KEVREKIDES e WILKE

(2005) para V. marítima, na Grécia.

Na população de U. costatum da baía de Hakodate (Japão), o fator mais importante na

determinação das mudanças nas produções anuais não foi a variação na biomassa média anual,

mas a variação na estrutura de tamanho (NODA, 1997). Nesta população, a produção anual foi

maior durante o recrutamento, pois apesar do pequeno tamanho corporal, há uma alta taxa de

crescimento. Isto é uma conseqüência do declínio geral na taxa de crescimento peso-específico

com a idade. A composição relativa de juvenis (< 15 mm no comprimento de concha) nas

populações de N. vibex foi maior na Cidade (35,8%) em comparação com o Camaroeiro

(19,9%). Desta forma, baseado em NODA (1997), a maior produção anual registrada na Cidade

seria resultado da grande contribuição dada por recém-juvenis e juvenis em avançado estágio

de desenvolvimento.

Espécie Local P B P/B Referência

Cerithium atratum Brasil 1,15 0,29 3,90 Denadai et al. (2004)

Nassarius vibex Brasil 0,35 0,90 0,38 Presente estudo

Brasil 3,60 7,98 0,45 Presente estudo

Olivancillaria vesica vesica Brasil 0,17 0,17 1,03 Caetano et al. (2003)

Brasil 0,21 0,20 1,06 Caetano et al. (2003)

Espanha 6,01 3,07 1,96 Sola (1996)

Espanha 1,55 1,84 0,84 Sola (1996)

Espanha 6,56 1,79 3,66 Sola (1996)

Hydrobia acuta França 0,78 0,14 4,56 Britton (1985)

Ventrosia maritima Grécia 4,50 1,70 2,65 Kevrekides & Wilke (2005)

Grécia 9,90 3,20 3,09 Kevrekides & Wilke (2005)

Cerithium vulgatum Portugal 1,05 0,60 1,75 Sprung (1994)

Haminoea orbygniana Portugal 1,88 1,69 1,11 Malaquias & Sprung (2005)

Haminea hydatis Portugal 0,20 0,17 1,17 Sprung (1994)

Hydrobia ulvae Portugal 0,26 0,14 1,85 Sprung (1994)

Tabela 2. Produção anual (P) (g PSLC m-2 ano-1), biomassa média anual (B) (g PSLC m-2) e relação P/B para Nassarius vibex e outras espécies de Gastropoda.

71

Apesar destes contrastes na produção e biomassa de N. vibex, a razão P/B das duas

populações é semelhante entre si e menor do que outros gastrópodes (Tabela 2). Para

KEVREKIDES e WILKE (2005), as diferenças entre os valores da razão P/B de V. maritima entre

duas áreas da Grécia, resulta da ação de fatores locais como taxa de renovação na água,

hidrodinamismo e tipo de sedimento. SOLA (1996) observou grandes diferenças nos valores de

produção em H. ulvae ao longo de três anos de estudo em um estuário na Espanha. Como

mencionado anteriormente, no presente estudo, não houve variação na maioria dos parâmetros

ambientais entre os bancos. Neste caso, é possível descartar tais influências nas diferenças na

razão P/B de N. vibex.

É esperado que um aumento no número de classes de idade em uma população deva

diminuir a razão P/B (ROBERTSON, 1979). A adição de indivíduos adultos, apesar do grande

peso corporal, possui pequena taxa de crescimento e, portanto, não traria grandes alterações à

produção secundária de uma população, levando à redução de P/B (ROBERTSON, 1979). Como

visto anteriormente, a população de N. vibex da Cidade possuiu grande quantidade de juvenis

comparada ao Camaroeiro, o que direciona para um aumento na parcela populacional com

maior capacidade de produção secundária, por causa das altas taxas de crescimento. As

diferenças observadas nos valores de P/B entre os dois bancos podem também ser resultado da

estrutura etária apresentada pelas populações.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No presente estudo, as populações de Nassarius vibex foram compostas por pelo menos

4 classes etárias e dois períodos de recrutamento anuais. A alta mortalidade juvenil durante o

primeiro ano de vida deve ser o principal fator na estruturação das populações de N. vibex. O

padrão de crescimento da espécie foi semelhante a outras espécies de regiões subtropicais e

temperadas com crescimento lento e longa expectativa de vida. Devido a sua ampla distribuição

ao longo da costa Atlântica (RIOS, 1994; DEMAINTENON, 2001), esta espécie pode ser utilizada

na avaliação da influência do gradiente latitudinal no crescimento de gastrópodes.

72

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Albrecht, A.L. 1998. Soft bottom versus hard rock: Community ecology of macroalgae on intertidal mussel beds in the Wadden Sea. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 229: 85-109.

Barroso, C.M. & Moreira, M.H. 1998. Reproductive cycle of Nassarius reticulatus in the Ria de Aveiro, Portugal: Implications for imposex studies. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 78: 1233-1246.

Barroso, C.M.; Moreira, M.H. & Richardson, C.A. 2005. Age and growth of Nassarius reticulatus in the Ria de Aveiro, north-west Portugal. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 85: 151-156.

Behrens, S. 1974. Ecological interactions of three Littorina (Gastropoda, Prosobranchia) along the west coast of North America. Tese de Doutorado. University of Oregon, Eugene. 111p.

Brey, T. 2001. Models for seasonal oscillations in growth. In: Population Dynamics in Benthic Invertebrates - A Virtual Handbook. Version 01.2. http://www.thomas-brey.de/science/virtualhandbook/. Último acesso: 25 de agosto de 2009.

Britton, J.C. 1985. Life cycle and production of Hydrobia acuta Drap. (Gastropoda: Prosobranchia) in a hypersaline coastal lagoon. Hydrobiologia, 122: 210-230.

Britton, J.C. & Morton, B. 1994. Marine carrion and scavengers. Oceanogr. Mar. Biol. Annu. Rev., 32: 369-434.

Caetano, C.H.S.; Veloso, V.G. & Cardoso, R.S. 2003. Population biology and secondary production of Olivancillaria vesica vesica (Gmelin, 1791) (Gastropoda: Olividae) on a sandy beach in southeastern Brazil. J. Mollus. Stud., 69: 67-73.

Castenholz, R.W. 1961. The effect of grazing marine populations. Ecology, 42: 783-194.

Cerrato, R.M. 1980. Demographic analysis of bivalve populations. In: Skeletal growth aquatic organisms: biological records of environmental change (Rhoads, D.C. & Lutz, R.A., eds), pp. 417-465. Plenum Press, New York.

Chan, K. & Morton, B. 2005. The reproductive biology of Nassarius festivus (Powis, 1835) (Gastropoda: Nassariidae) in relation to seasonal changes in temperature and salinity in subtropical Hong Kong. Aqua. Ecol., 32: 213-228.

Chatzinikolaou, E. & Richardson, C.A. 2007. Evaluating growth and age of netted whelk Nassarius reticulatus (Gastropoda: Nassariidae) using statolith growth rings. Mar. Ecol. Prog. Ser., 342: 163-176.

Chatzinikolaou, E. & Richardson, C.A. 2008. Population dynamics and growth of Nassarius reticulatus (Gastropoda: Nassariidae) in Rhosneigr (Anglesey, UK). Mar. Biol., 153: 605-619.

Chow, V. 1987. Patterns of growth and energy allocation in northern California populations of Littorina (Gastropoda: Prosobranchia). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 110: 69-89.

Connell, J.H. 1985. The consequences of variation in initial settlement vs. post-settlement mortality in rocky intertidal communities. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 93: 11-46.

Creese, R.G. 1980. An analysis distribution and abundance of populations of the high-shore limpet, Notoacmea petterdi (Tension-Woods). Oecologia, 45: 252-260.

Crisp, D.J. 1984. Energy flow measurements. In: Methods for the study of marine benthos (Holme, N.A. & McIntyre, A.D., eds), pp. 284-372. Blackwell Scientific Publications, Oxford.

Cubit, J.D. 1975. Interactions of seasonally changing physical factors and intertidal communities a rocky shore. Tese de Doutorado. University of Oregon, Eugene. 122p.

Curtis, L.A. 1995. Growth, trematode parasitism, and longevity of a long-lived marine gastropod (Ilyanassa obsoleta). J. Mar. Biol. Ass. U.K., 75: 913-925,

Curtis, L.A.; Kinley, J.L. & Tanner, N.L. 2000. Longevity of oversized individuals: growth, parasitism, and history in an estuarine snail population. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 80: 811-820.

73

Demaintenon, M.J. 2001. Analysis of reproducive system ontogeny and homology in Nassarius vibex (Gastropoda: Buccinidae: Nassariinae). J. Mollus. Stud., 67: 37-49.

Denadai, M.R.; Amaral, A.C.Z. & Turra, A. 2004. Biology of a tropical intertidal population of Cerithium atratum (Born, 1778) (Mollusca, Gastropoda). J. Nat. Hist., 38: 1695-1710.

Doherty, P.J. 1983. Tropical territorial damselfish: is density limited by aggression or recruitment? Ecology, 64: 176-190.

Du, J. 2002. Combined algorithms for constrained estimation of finite mixture distributions with grouped data and conditional data. Dissertação de Mestrado. McMaster University, Ontário. 124p.

Eden, N.; Katz, T. & Angel, D.L. 2003. Dynamic response of a mud snail Nassarius sinusigerus to changes in sediment biogeochemistry. Mar. Ecol. Prog. Ser., 263: 139-147.

Forroni, T.deO.; Yokoyama, L.Q. & Amaral, A.C.Z. 2008. Dieta alimentar de Nassarius vibex (Gastropoda: Nassariidae). In: XXVII Congresso Brasileiro de Zoologia, Curitiba, Paraná.

Frank, P.W. 1965. The biodemography of an intertidal population. Ecology, 46: 267-280.

Gaines, S. & Roughgarden, J. 1985. Larval settlement rate: a leading determinant of structure in an ecological community of the marine intertidal zone. P. Natl. Acad. Sci. USA, 82: 3707-3711.

Gómez, J. & Defeo, O. 1999. Life history of the sandhopper Pseudorchestoidea brasiliensis in sandy beaches with contrasting morphodynamics. Mar. Ecol. Prog. Ser., 182: 209-220.

Gosselin, L.A. & Qian, P.-Y. 1996. Early postsettlement mortality of an intertidal barnacle: a critical period for survival. Mar. Ecol. Prog. Ser., 135: 69-75.

Gosselin, L.A. & Qjan, P.-Y. 1997. Juvenile mortality in benthic marine invertebrates. Mar. Ecol. Prog. Ser., 146: 265-282.

Grant, A.; Morgan, P.J. & Olive, P.J.W. 1987. Use made in marine ecology of methods for estimating demographic parameters from size/frequency data. Mar. Biol., 95: 201-208.

Hammond, W. & Griffiths, C.L. 2004. Influence of wave exposure on South African mussel beds and their associated infaunal communities. Mar. Biol., 144: 547-552.

Haven, S.B. 1973. Competition for food between the gastropods Acmaea scabra and Acmaea digitalis. Ecology, 54: 143-151.

Houston, R.S. 1978. Notes on the spawning and egg capsules of two prosobranch gastropods: Nassarius tiarula (Kiener, 1841) and Solenosteira macrospira (Berry, 1957). Veliger, 20: 367-368.

Hughes, R.N. 1986. A functional biology of marine gastropods. Croom Helm, London.

Hughes, T.P. 1990. Recruitment limitation, mortality, and population regulation in open system: a case study. Ecology, 71: 12-20.

Hurst, A. 1965. The feeding habits of Nassarius vibex (Say). Proc. Malacol. Soc. Lond., 36: 313-317.

Janson, K. 1982. Genetic and environmental effects on growth rate of Littorina saxatilis. Mar. Biol., 69: 73-78.

Kevrekidis, T. & Wilke, T. 2005. Life cycle, population dynamics and productivity of Ventrosia maritima in the Evros Delta (northern Aegean Sea). J. Mar. Biol. Ass. U.K., 85: 375-382.

Koch, M. 2004. Observations of the reproduction and population structure of the caenogastropod, Gabbia vertiginosa Frauenfeld, 1862 (Rissoidea: Bithyniidae). Molluscan Res., 24: 65-73.

Lambeck, R.H.D. 1984. Dynamics, migration and growth of Nassarius reticulatus (Mollusca, Prosobranchia) colonizing saline lake Grevelingen (SW Netherlands). Neth. J. Sea Res., 18: 395-417.

74

Lewis, J.R. & Bowman, R.S. 1975. Local habitat-educe variations in the population dynamics of Patella vulgata L. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 17: 165-203.

Lomovasky, B.J.; Brey, T. & Morriconi, E. 2005. Population dynamics of the venerid bivalve Tawera gayi (Hupé, 1854) in the Ushuaia Bay, Beagle Channel. J. Appl. Ichthyol., 21: 64-69.

Macdonald, P.D.M. & Du, J. 2008. Mixdist: Finite Mixture Distribution Models, R package. Version 0.5-2. http://www.math.mcmaster.ca/peter/mix/mix.html. Último acesso: 25 de agosto de 2009.

Malaquias, M.A.M. & Sprung, M.J. 2005. Population biology of the cephalaspidean mollusc Haminoea orbygniana in a temperate coastal lagoon (Ria Formosa, Portugal). Estuar. Coast. Shelf Sci., 63: 177-185.

McKillup, S.C. & Butler, A.J. 1979. Modification of egg production and packaging in response to food availability by Nassarius pauperatus. Oecologia, 43: 221-231.

McKillup, S.C. & Butler, A.J. 1983. The measurement of hunger as a relative estimate of food available to populations of Nassarius pauperatus. Oecologia, 56: 16-22.

McKillup, S.C.; Butler, A.J. & McKillup, R.V. 1993. The importance of sandflat morphology to recruitment of the intertidal snail Nassarius pauperatus during ten consecutive years at three sites in South Australia. Mar. Biol., 115: 577-580.

McKillup, S.C. & McKillup, R.V. 1997. Effect of food supplementation on the growth of an intertidal scavenger. Mar. Ecol. Prog. Ser., 148: 109-114.

Menge, B.A. 1978a. Predation intensity in a rocky intertidal community: relation between predator foraging activity and environmental harshness. Oecologia, 34: 1-16.

Menge, B.A. 1978b. Predation intensity in a rocky intertidal community: effect of an algal canopy, wave action and desiccation on predator feeding rates. Oecologia, 34: 17-35.

Menge, J.L. 1974. Prey selection and foraging period of the predaceous rocky intertidal snail, Acanthina punctulata. Oecologia, 17: 293-316.

Moore, H.B.; Davies, L.T.; Fraser, T.H.; Gore, R.H. & López, N.R. 1968. Some biomass figures from a tidal flat in Biscayne Bay, Florida. Bull. Mar. Sci., 18: 261-279.

Moran, M.J.; Fairweather, P.G. & Underwood, A.J. 1984. Growth and mortality of the predatory intertidal whelk Morula marginalba Blainville (Muricidae): the effects of different species of prey. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 75: 1-17.

Morton, B. & Chan, K. 2004. The population dynamics of Nassarius festivus (Gastropoda: Nassariidae) on three environmentally different beaches in Hong Kong. J. Mollus. Stud., 70: 329-339.

Navarte, M.A. 2006. Biology and fishery of the whelk Buccinanops globulosum (Kiener, 1834) in northern coastal waters of the San Matías Gulf (Patagonia, Argentina). Fish. Res., 77: 131-137.

Navarte, M.A.; Willers, V.; Avaca, M.S. & Echave, M.E. 2008. Population structure of the snail Buccinanops globulosum (Prosobranchia, Nassariidae) in San Matías Gulf, Patagonia Argentina: Isolated enclaves? J. Sea Res., 60: 144-150.

Noda, T. 1997. Temporal changes in secondary production of a population of the subtidal sand snail Umbonium costatum in Hakodate Bay, northern Japan: importance of annual change in age structure. J. Sea Res., 37: 145-152.

Noda, T. & Nakao, S. 1996. Dynamics of an entire population of the subtidal snail Umbonium costatum: the importance of annual recruitment fluctuation. J. Anim. Ecol., 65: 196-204.

Ota, N. & Tokeshi, M. 2000. A comparative study of feeding and growth in two coexisting species of carnivorous gastropods. Mar. Biol., 136: 101-114.

Pauly, D. 1984a. Length-converted catch curves: a powerful tool for fisheries research in the tropics (part II). Fishbyte, 2: 17-19.

75

Pauly, D. 1984b. Length-converted catch curves: a powerful tool for fisheries research in the tropics (part III). Fishbyte, 2: 8-10.

Pauly, D. & Munro, J.L. 1984. Once more on the comparison of growth in fish and invertebrates. Fishbyte, 2: 21.

Pechenik, J.A. 1978. Adaptations to intertidal development: studies on Nassarius obsoletus. Biol. Bull., 154: 282-291.

Peterson, C.H. & Summerson, H.C. 1992. Basin-scale coherence of population dynamics of an exploited marine invertebrate, the bay scallop: implications of recruitment limitation. Mar. Ecol. Prog. Ser., 90: 257-272.

Rabí, M. & Maraví, C. 1997. Growth curves and specific growth rate of Concholepas concholepas (Bruguière, 1789) (Gastropoda: Muricidae) in culture experiments. Sci. Mar., 61: 49-53.

Rasmussen, E. 1973. Systematics and ecology of the Isefjord marine fauna (Denmark). Ophelia, 11: 1-507.

Richardson, C.A.; Kingsley-Smith, P.R.; Seed, R. & Chatzinikolaou, E. 2005. Age and growth of the naticid gastropod Polinices pulchellus (Gastropoda: Naticidae) based on length frequency analysis and statolith growth rings. Mar. Biol., 148: 319-326.

Rios, E.C. 1994. Seashells of Brazil. Fundação Universidade do Rio Grande, Rio Grande.

Roberts, D.J. & Hughes, R.N. 1980. Growth and reproductive rates of Littorina rudis from three contrasted shores in North Wales, UK. Mar. Biol., 58: 47-54.

Robertson, A.I. 1979. The relationship between annual production: biomass ratios and lifespans for marine macrobenthos. Oecologia, 38: 193-202.

Roughgarden, J.; Gaines, S. & Possingham, H. 1988. Recruitment dynamics in complex life cycles. Science, 241: 1460-1466.

Saier, B. 2002. Subtidal and intertidal mussel beds (Mytilus edulis L.) in the Wadden Sea: diversity differences of associated epifauna. Helgol. Mar. Res., 56: 44-50.

Sastry, A.N. 1970. Effect of temperature on egg capsule deposition in the mud snail Nassarius obsoletus (Say). Veliger, 13: 339-341.

Scheltema, R.S. 1962. Pelagic larvae of New England intertidal gastropods. I. Nassarius obsoletus Say and Nassarius vibex Say. T. Am. Microsc. Soc., 81: 1-11.

Scheltema, R.S. 1967. The relationship of temperature to the larval development of Nassarius obsoletus (Gastropoda). Biol. Bull., 132: 253-265.

Shulman, M.J. & Ogden, J.C. 1987. What controls tropical reef fish populations: recruitment or benthic mortality? An example in the Caribbean reef fish Haemulon flavolineatum. Mar. Ecol. Prog. Ser., 39: 233-242.

Sola, C. 1996. Population dynamics, reproduction, growth and secondary production of the mud-snail Hydrobia ulvae (Pennant). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 205: 49-62.

Spight, T.M. 1981. How three rocky shore snails coexist on a limited food resource. Res. Popul. Ecol., 23: 245-261.

Sprung, M. 1994. Macrobenthic secondary production in the intertidal zone of the Ria Formosa – a lagoon in southern Portugal. Estuar. Coast. Shelf Sci., 38: 539-558.

Stickle, W.B. 1985. Effects of environmental factor gradients on scope for growth in several species of carnivorous marine invertebrates. In: Marine biology of polar regions and effects of stress on marine organisms. Proc. 18th Eur. Mar. Biol. Symp. (Gray, J.S. & Christiansen, M.E., eds). pp. 601-616. John Wiley & Sons, London.

76

Struhsaker, J.W. 1968. Selection mechanisms associated with intraspecific shell variation in Littorina picta (Prosobranchia: Mesogastropoda). Evolution, 22: 459-480.

Sutherland, J.P. 1970. Dynamics of high and low populations of the limpet, Acmaea scabra (Gould). Ecol. Monogr., 40: 169-188.

Takada, Y. 1995. Variation of growth rate with tidal level in the gastropod Monodonta labio on a boulder shore. Mar. Ecol. Prog. Ser., 117: 103-110.

Tallmark, B. 1980. Population dynamics of Nassarius reticulatus (Gastropoda, Prosobranchia) in Gullmar fjord, Sweden. Mar. Ecol. Prog. Ser., 3: 51-62.

Thiel, M. & Ullrich, N. 2002. Hard rock versus soft bottom: the fauna associated with intertidal mussel beds on hard bottoms along the coast of Chile, and considerations on the functional role of mussel beds. Helgol. Mar. Res., 56: 21-30.

Thorson, G. 1966. Some factors influencing the recruitment and establishment of marine benthic communities. Neth. J. Sea Res., 3: 267-293.

Underwood, A.J. 1976. Food competition between age-classes in the intertidal neritacean Nerita atramentosa Reeve (Gastropoda: Prosobranchia). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 23: 145-154.

Underwood, A.J. 1978. An experimental evaluation of competition between three species of intertidal prosobranch gastropods. Oecologia, 33: 185-202.

Underwood, A.J. & Denley, E.J. 1984. Paradigms, explanations, and generalizations in models for the structure of intertidal communities on rocky shores. In: Ecological Communities (Strong, D.R.; Simberloff, D.; Abele, L.G. & Thistle, A.B., eds), pp. 151-180. Princeton University Press, Princeton.

Urban, H.J. & Campos, B. 1994. Population dynamics of the bivalves Gari solida, Semele solida and Protothaca thaca from a small bay in Chile at 36° S. Mar. Ecol. Prog. Ser., 115: 93-102.

Vermeij, G.J. 1980. Gastropod shell growth rate, allometry, and adult size: environmental implications. In: Skeletal growth of aquatic organisms: biological records of environmental change (Rhoads, D.C. & Lutz, R.A., eds), pp. 379-394. Plenum Publishing Corporation, New York.

Victor, B.C. 1983. Recruitment and population dynamics of a coral reef fish. Science, 219: 419-420.

Victor, B.C. 1986. Larval settlement and juvenile mortality in a recruitment-limited coral reef fish population. Ecol. Monogr., 56: 145-460.

Wilson, J.G. & Forrest, N. 2004. Population dynamics, biomass and productivity of Limapontia depressa (Gastropoda, Opisthobranchia) at Bull Island, Dublin, Ireland. Aquat. Ecol., 38: 575-585.

Yoshioka, P.M. 1982. Role of planktonic and benthic factors in the population dynamics of the Membranipora menbranacea. Ecology, 63: 457-468.

77

Capítulo 4. – Crescimento alométrico

RESUMO

O crescimento alométrico de duas populações de Nassarius vibex, localizadas em bancos

de Mytella charruana, no Litoral Norte de São Paulo, foi avaliado entre setembro de 2006 e

fevereiro de 2007 no banco da praia do Camaroeiro e, entre março e junho de 2007, no da praia

da Cidade. Os indivíduos do banco do Camaroeiro possuem conchas significativamente mais

compridas e largas e com menor abertura do que os da Cidade. Apesar destas diferenças, a

análise de componentes principais não demonstrou separação morfométrica entre as populações

quando todos os parâmetros morfométricos foram considerados em conjunto. O crescimento

alométricos das duas populações apresentou grandes variações ao longo do desenvolvimento do

indivíduo. Tanto o crescimento da largura como o da altura em relação ao comprimento da

concha não apresentaram diferenças entre as áreas. Entretanto, a abertura da concha difere entre

os bancos, com indivíduos do Camaroeiro com menor abertura. A metodologia baseada na teoria

da informação de Kullback-Leibler (K-L) e na inferência de muti-modelos (IMM) permitiu

observar que, para N. vibex, o modelo de alometria clássico não forneceu as melhores

explicações para as relações morfométricas. As diferenças no crescimento relativo entre as

populações podem ser conseqüência de diferentes taxas de crescimento e oscilação, modificando

o ritmo de desenvolvimento do indivíduo ao longo do tempo. Outros fatores como

disponibilidade de alimento e condições ambientais, os quais podem apresentar contrastes entre

as áreas, também devem ser considerados.

78

ABSTRACT

The allometric growth of two populations of Nassarius vibex on beds of Mytella

charruana on the northern coast of the state of São Paulo, was evaluated between September

2006 and February 2007 in the bed on Camaroeiro Beach, and from March 2007 to June 2007 at

Cidade Beach. The shells of the Camaroeiro population were longer, wider and with a smaller

shell aperture than those at Cidade; however, a principal components analysis did not indicate

different morphometric patterns between the populations. The allometric growth of the two

populations showed great variation in the development of individuals. The growth of shell width

and shell height in relation to shell length did not differ between the two areas. On the other

hand, the shell aperture showed a contrasting growth pattern, with individuals from Camaroeiro

having smaller apertures. The methodology based on the Kullback-Leibler (K-L) information

theory and the multi-model inference (MMI) showed, for N. vibex, that the classic linear

allometric growth was not the most suitable explanation for the observed morphometric

relationships. The patterns of relative growth observed in the two N. vibex populations may be a

consequence of different growth and oscillation rates, which modifies the development of the

individuals. Other factors such as food resource availability and environmental parameters,

which might also differ between the two areas, should also be considered.

79

INTRODUÇÃO

O crescimento relativo de um organismo geralmente envolve mudanças na proporção de

partes do seu corpo, bem como no tamanho (RABAOUI et al., 2007). Segundo GOULD (1966), o

controle genético das relações alométricas é o responsável pela variação morfológica entre

populações ou linhagens de uma espécie. Grande parte do conhecimento do crescimento

alométrico é baseada na aplicação do modelo linear clássico de alometria (Y = aXb), no qual a

proporção do crescimento entre os parâmetros morfométricos, ou seja, o expoente alométrico b,

é sempre uma constante (RABAOUI et al., 2007). No entanto, a influência da sazonalidade de

fatores como temperatura da água (MORAN et al., 1984; CHOW, 1987), disponibilidade de

alimento (TAKADA , 1995) e período reprodutivo (MORAN et al., 1984; KATSANEVAKIS et al.,

2007) sobre o crescimento não é considerada pelo modelo linear. Erros na adoção de tal

metodologia podem ocorrer caso a relação entre os parâmetros não seja linear ou devido à uma

descontinuidade no expoente alométrico (KATSANEVAKIS et al., 2007). Recentemente, novas

alternativas baseadas na teoria da informação de Kullback-Leibler (K-L) e na inferência de

multi-modelos (IMM) (BURNHAM & ANDERSON, 2002) foram desenvolvidas para evitar esses

problemas.

Assumindo que o expoente alométrico possa variar ao longo do tempo, KATSANEVAKIS et

al. (2007) aplicaram a metodologia da seleção de modelos em alguns invertebrados marinhos

para avaliar a existência de perda de informação pelo modelo alométrico linear. Estes autores

verificaram que, para várias relações, o modelo linear não foi o mais adequado para explicar o

crescimento proporcional dos parâmetros morfométricos. Estes resultados demonstraram a

necessidade da aplicação de modelos que considerem em seus pressupostos a possível

heterogeneidade das variâncias e a falta de normalidade nos dados (KATSANEVAKIS et al., 2007;

PROTOPAPAS et al., 2007; RABAOUI et al., 2007).

Atualmente, são poucos os trabalhos que avaliaram as informações teóricas e a inferência

multi-modelo em moluscos (KATSANEVAKIS, 2007; KATSANEVAKIS et al., 2007; RAOBOUI et al.,

2007). A grande maioria dos estudos de crescimento alométrico aplicou a abordagem clássica

(modelo linear) em gastrópodes marinhos (MCSHANE et al., 1988; TOKESHI et al., 2000; CLEDÓN

et al., 2005; TANAKA & MAIA , 2006), de água doce (KEMP & BERTNESS, 1984; MARTÍN, 2003;

80

ELKARMI & ISMAIL , 2006, 2007; MOHAMMAD , 2008) e terrestres (SHANMUGAN , 1997;

ESTEBENET, 1998). No Brasil, DENADAI et al. (2004), analisando aspectos da biologia de

Cerithium atratum (Born, 1778), observaram o crescimento relativo de alguns parâmetros

morfométricos por meio do modelo alométrico linear.

Normalmente, apenas o comprimento da concha é empregado na avaliação do

crescimento de gastrópodes (EKARATNE & CRISP, 1984). Este parâmetro é utilizado na

construção de distribuição de freqüências de tamanho, as quais são analisadas quanto à formação

de grupos etários (coortes). Há a possibilidade de aplicação de modelos de crescimento

matemáticos como von Bertalanffy (CHOW, 1987; MCSHANE et al., 1988; BORULYA &

BREGMAN, 2002; CLARKE et al., 2004; ILANO et al., 2004; CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON,

2008), Gompertz (CHEN & SOONG, 2002; GIMÉNEZ et al., 2004; HARDING, 2006; BIGATTI et al.,

2007) e Richards (ISMAIL & ELKARMI , 2006; ELKARMI & ISMAIL, 2006, 2007) para avaliar o

desenvolvimento da população. Entretanto, como observado anteriormente, o conhecimento

sobre o crescimento relativo de gastrópodes é ainda incipiente e demanda investigações. O

entendimento do desenvolvimento conjunto dos parâmetros morfométricos de uma espécie pode

trazer explicações para padrões de distribuição, impacto de competição e predação, e influências

ambientais.

A família Nassariidae, comumente encontrada na região entremarés de praias areno-

lamosas (BRITTON & MORTON, 1994), possui o crescimento de algumas espécies analisado. A

distribuição das freqüências do comprimento da concha foi utilizada para descrever o padrão de

crescimento da Nassarius reticulatus (Linnaeus, 1758) (TALLMARK , 1980; LAMBECK, 1984;

CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2008). BARROSO et al. (2005), estudando a mesma espécie,

trabalhou com a distribuição das freqüências de tamanho e o comprimento de anéis de

crescimento interno e externo à concha. Experimentos de marcação e recaptura foram utilizados

para N. reticulatus (TALLMARK , 1980), N. dorsatus (Roeding, 1798) (MCKILLUP & MCKILLUP,

1997) e Ilyanassa obsoleta (Say, 1822) (CURTIS, 1995). Recentemente, anéis de crescimento em

estatólitos foram usados com sucesso para avaliar o crescimento de N. reticulatus (BARROSO et

al., 2005; CHATZINIKOLAOU & RICHARDSON, 2007). Em Nassarius obsoletus (Say, 1822) as

únicas variáveis analisadas foram o comprimento da concha e o peso úmido do indivíduo

81

(MCKINNEY et al., 2004), sendo estas significativamente relacionadas. Apesar da existência de

tais estudos, o número de análises do crescimento alométrico para esta família é bem escasso.

Neste contexto, no presente capítulo, o crescimento alométrico de Nassarius vibex (Say,

1822), foi estudado em duas praias do Litoral Norte do Estado de São Paulo seguindo a

metodologia descrita por KATSANEVAKIS et al. (2007). Levando em consideração que o

crescimento pode variar ao longo de um gradiente temporal e espacial, será dada atenção para

possíveis diferenças entre duas populações.

METODOLOGIA

Amostragem e procedimentos de laboratório

As análises morfométricas foram aplicadas aos exemplares de Nassarius vibex

amostrados mensalmente nos dois bancos de M. charruana, de setembro de 2006 a fevereiro de

2007 na praia do Camaroeiro (23°37’39’’S, 45°23’48’’W) e, entre março e junho de 2007, na

praia da Cidade (23°37’23’’S, 45°24’21’’W). Informações detalhadas das características das

áreas e da metodologia de amostragem, constam nos capítulos 1 e 3, respectivamente.

No laboratório, cinco parâmetros morfométricos foram medidos para cada indivíduo com

auxílio de um paquímetro digital com precisão de 0,01 mm: comprimento (C), largura (L) e

altura (A) da concha, e comprimento (Ca) e largura (La) da abertura da concha (Fig. 1). O ângulo

apical (Ap) da concha foi calculado com base na metodologia de PRESTON e ROBERTS (2007),

pela equação: ( )CLAp 5,0tan2= .

Figura 1. Nassarius vibex. Parâmetros morfométricos medidos e diagrama esquemático do cálculo do ângulo apical da concha (Aa). Altura (A), comprimento (C), comprimento da abertura (Ca), largura (L), largura da abertura (La).

82

Análise dos dados

DEMAINTENON (2001) afirma que N. vibex possui crescimento determinado, ou seja, ao

atingir a maturidade sexual, os juvenis sofrem uma mudança na forma da concha com parada ou

redução no crescimento. O desenvolvimento de um lábio externo grosso e um calo columelar

adjacente ao lábio interno da abertura da concha em adultos, contrasta com a ausência dessas

estruturas em juvenis. No entanto, observações histológicas demonstraram a existência de

gônadas maduras com espermatozóides ou oócitos em diferentes fases de maturação em

“juvenis” (Capítulo 5). Portanto, não foi possível estabelecer uma separação entre juvenis e

adultos de N. vibex com base em diferenças morfológicas da concha. Indivíduos com tamanho

menor do que 15,00 mm foram considerados juvenis, por não apresentarem estágios de

maturação de gametas (Capítulo 5). No presente estudo, as análises foram realizadas

considerando a população como um todo.

A normalidade dos dados foi testada por meio de um teste de Shapiro-Wilk e a existência

de diferenças no tamanho médio dos indivíduos entre os bancos foi testada para todos os seis

parâmetros por meio de um teste t de Student. Os dados morfométricos de N. vibex foram

submetidos à uma análise de componentes principais (PCA) para observar possíveis padrões

interpopulacionais. Esta metodologia é utilizada para identificar uma série de variáveis

hipotéticas (componentes principais) que são ortogonais entre si e que respondem pela maior

parte da variância em um conjunto de dados (MANLY , 1986; PRESTON & ROBERTS, 2007). Neste

tipo de análise, o conjunto de dados é reduzido para dois ou três componentes principais (CPs 1,

2 e 3), os quais podem ser utilizados em análises morfométricas (PRESTON & ROBERTS, 2007).

Posteriormente, o teste de Qui-Quadrado (χ²) foi aplicado para avaliar a existência de diferenças

entre os autovalores de cada componente.

O crescimento alométrico de L, A, Ca, La e Ap em relação a C; e das relações L/A e

Ca/La foram investigados. Os dados foram log transformados e, para cada comparação, três

diferentes modelos alométricos (linear, quadrático e cúbico) foram aplicados (Tabela 1). Outros

modelos, sugeridos por KATSANEVAKIS et al. (2007), tais como “broken-stick” e “two segments”

foram descartados, pois visualmente não se enquadravam nos dados.

83

A versão corrigida do critério de informação de Akaike (AIC) para amostras pequenas

(BURNHAM & ANDERSON, 2002), AICc (HURVICH & TSAI, 1989), foi utilizada para a seleção dos

modelos de crescimento alométrico, dada pela equação:

1

)1(2

−−++=

kn

kkAICAICc

na qual o AIC é dado por:

kn

SQRnAIC 212log +

+

= π

onde SQR é a soma dos quadrados dos resíduos da regressão, n o número de observações e k o

número de parâmetros da regressão somados a 1. Neste caso, foi necessário assumir dados com

desvios normalmente distribuídos com variâncias homogêneas. O modelo com o menor valor

AICc (AICc,min) foi selecionado como o mais plausível entre os modelos testados. A diferença

entre os AICc, min,, cici AICAIC −=∆ , foi calculada para todos os modelos.

De acordo com BURNHAM e ANDERSON (2002), modelos com ∆i>10 não possuem valor e

podem ser omitidos de uma análise mais profunda; aqueles com ∆i<2 possuem valor substancial,

ao passo que há menor apoio para modelos com 4<∆i<7. No entanto, os autores não esclarecem

certos resultados, tais como 2<∆i<4 ou 7<∆i<10. No presente estudo, considerou-se que todos os

valores de ∆i<2, dão suporte ao modelo. O peso de Akaike (wi), considerado como o peso das

evidências a favor do modelo i sendo o melhor modelo real do conjunto de modelos disponíveis

(AKAIKE , 1983; BUCKLAND et al., 1997; BURNHAM & ANDERSON 2002), é dado pela equação:

∑ =∆−

∆−=

5

1)5,0(exp

)5,0exp(

k k

iiw

sendo a mesma utilizada para quantificar a plausibilidade de cada modelo.

Tabela 1. Modelos alométricos utilizados na análises de crescimento relativo.

Modelo K Equação

Linear (Ln) 3 logY=a1+b1logX

Quadrático (Qd) 4 logY=a1+b1logX+b2(logX)2

Cúbico (Cb) 5 logY=a1+b1logX+b2(logX)2+b3(logX)3

84

RESULTADOS

Morfometria

A comparação dos valores médios dos seis parâmetros morfométricos de Nassarius vibex

entre os bancos permitiu a observação de diferenças significativas no comprimento, na largura,

no comprimento da abertura da concha e no ângulo apical. Os indivíduos do Camaroeiro

possuem conchas mais compridas e largas e com menor abertura do que os da Cidade (Tabela 2).

A análise de componentes principais (CPs) não permitiu a distinção das duas populações

quanto ao tamanho (Fig. 2).

Diferenças foram observadas na composição de cada componente principal (Tabela 3). O

CP1 explicou 73,01% da variação observada nos dados, influenciado por todos os parâmetros. O

Tabela 2. Nassarius vibex. Média e desvio padrão (DP) dos parâmetros morfométricos medidos para os indivíduos dos bancos do Camaroeiro e Cidade. O teste t de Student foi aplicado para cada comparação com nível de significância (α) de 0,05. A: altura , Aa: ângulo apical, C: comprimento, Ca: comprimento da abertura, L: largura, La: largura da abertura, N: número de indivíduos, N.S.: não significativo, t: resultado do teste t de Student. Camaroeiro (N=421) Cidade (N=427)

Parâmetro Média (mm) DP Média (mm) DP t p

C 15,89 2,58 15,23 2,65 3,66 < 0,05 L 9,40 1,61 8,58 1,39 7,89 < 0,05 A 7,92 1,06 7,68 4,14 1,13 N.S. Ca 3,86 0,66 4,01 0,71 -3,14 < 0,05 La 2,81 0,48 2,86 0,53 -1,24 N.S. Aa 34,93 2,03 33,42 2,36 9,32 < 0,05

Figura 2. Nassarius vibex. Análise de componentes principais para as duas populações.

85

ângulo apical foi a influência mais notável no CP2, correspondendo a 91% da variação

acumulada nos dados junto com CP1. O terceiro componente principal, apesar do baixo

autovalor, foi caracterizado por ser composto pelos parâmetros da abertura da concha (Ca e La).

Este CP foi responsável por 5,15% da variância observada nos dados, totalizando conjuntamente

com os outros CPs 96,75% da variância total.

Entre os três componentes foram observadas diferenças significativas (Fig. 3). Os

indivíduos do Camaroeiro são maiores (t=2,10; p<0,05) do que os indivíduos da Cidade. Além

disso, devido ao maior ângulo apical apresentado pelos gastrópodes do Camaroeiro, suas

conchas são significativamente mais alargadas (t=11,63; p<0,05). Entretanto, CP3 apresentou

uma inversão quando comparado com CP1 e CP2, na qual os indivíduos da Cidade possuem

maior abertura da concha (t=-11,238; p<0,05).

Figura 3. Autovalores dos componentes principais (CP) e comparações de cada CP entre as populações. Barras verticais indicam o erro padrão da média. Histogramas com letras diferentes representam diferenças significativas entre os componentes (α=0,05).

Tabela 3. Nassarius vibex. Resultados da análise de componentes principais (CP). Autovalores dos componentes principais de cada parâmetro e porcentagens da variação explicada. Em negrito estão destacados os maiores autovalores. A: altura, Aa: ângulo apical, C: comprimento, Ca: comprimento da abertura, L: largura, La: largura da abertura.

CP1 CP2 CP3 C 0,975 0,01 0,197 L 0,908 -0,379 0,149 A 0,957 -0,056 0,209 Ca 0,905 0,142 -0,309 La 0,914 0,077 -0,3 Aa -0,195 -0,971 -0,137 % da variação explicada 73,014 18,585 5,152 % acumulado da variação explicada 73,014 91,599 96,751

86

Crescimento relativo

O crescimento relativo da população do banco do Camaroeiro apresentou grandes

variações ao longo do desenvolvimento do indivíduo. O modelo cúbico foi o mais freqüente,

com os maiores valores de wi para três das seis relações (Tabela 4). O modelo linear foi mais

plausível para a relação C/L, enquanto as relações C/Ca e C/La tiveram o modelo quadrático

com maiores valores de wi (Tabela 4).

O modelo cúbico também foi o mais comum para quatro das seis relações morfométricas

da população da Cidade (Tabela 5). As relações C/Ca e C/La foram melhores explicadas pelos

modelos linear e quadrático, respectivamente (Tabela 5).

Tabela 4. Nassarius vibex. Valores do critério de informação de Akaike (AICc), diferenças de AICc (∆i) e dos pesos de Akaike (wi) para os modelos linear (Ln), quadrático (Qd) e cúbico (Cb) utilizados nas seis relações morfométricas para o banco do Camaroeiro. As porcentagens em negrito correspondem aos modelos mais plausíveis. A: altura, Aa: ângulo apical, C: comprimento, Ca: comprimento da abertura, L: largura, La: largura da abertura. Modelo C/L C/A C/Ca C/La L/A Ca/La AICc Ln -1950,8 -2150,4 -1551,3 -1492,2 -1938,8 -1495,8 Qd -1928,2 -2154,2 -1552,8 -1495,6 -1965,5 -1497,4 Cb -1931,3 -2155,1 -1550,8 -1495,4 -1969,1 -1500,3 ∆i Ln 0,0 4,7 1,5 3,4 30,3 4,6 Qd 22,6 0,9 0,0 0,0 3,6 2,9 Cb 19,5 0,0 2,0 0,2 0,0 0,0 wi (%) Ln 99,99 5,57 26,00 8,57 0,00 7,68 Qd 0,00 36,62 54,10 47,70 14,18 17,47 Cb 0,01 57,82 19,90 43,73 85,82 74,85

Tabela 5. Nassarius vibex. Valores do critério de informação de Akaike (AICc), diferenças de AICc (∆i) e dos pesos de Akaike (wi) para os modelos linear (Ln), quadrático (Qd) e cúbico (Cb) utilizados nas seis relações morfométricas para o banco da Cidade. As porcentagens em negrito correspondem aos modelos mais plausíveis. A: altura, Aa: ângulo apical, C: comprimento, Ca: comprimento da abertura, L: largura, La: largura da abertura. Modelo C/L C/A C/Ca C/La L/A Ca/La AICc Ln -1818,0 -2169,2 -1474,0 -1478,4 -1813,9 -1521,1 Qd -1820,9 -2130,7 -1445,0 -1479,2 -1839,9 -1512,1 Cb -1821,4 -2174,5 -1446,1 -1477,2 -1841,8 -1524,2 ∆i Ln 3,4 5,4 0,0 0,8 27,9 3,1 Qd 0,5 43,8 29,0 0,0 1,9 12,0 Cb 0,0 0,0 27,9 2,0 0,0 0,0 wi (%) Ln 9,26 6,34 99,99 33,21 0,00 17,75 Qd 39,92 0,00 0,00 48,83 27,89 0,20 Cb 50,82 93,66 0,01 17,96 72,11 82,05

87

As duas populações apresentaram o mesmo modelo de crescimento alométrico para

grande parte das regressões (Tabela 4 e 5). Diferença foi observada na relação C/L, em que Ln

foi o modelo mais plausível para o Camaroeiro enquanto que Cb apresentou o maior valor de wi

para a Cidade. Já para C/Ca, o modelo Qd foi o mais plausível no Camaroeiro e o Ln na Cidade.

Os indivíduos do Camaroeiro possuem crescimento isométrico entre o comprimento e a

largura da concha (Fig. 4), entretanto o crescimento de C em relação a A, Ca e La varia ao longo

do tempo, sendo determinado por relações quadráticas e cúbicas. As duas relações do

comprimento da concha com parâmetros da abertura foram definidas por relações quadráticas

(Tabela 4, Fig. 4). Nas relações L/A e Ca/La, o modelo cúbico demonstra uma variação ao longo

do tempo no crescimento relativo entre esses parâmetros.

Figura 4. Nassarius vibex. Regressões logarítmicas lineares, cubicas e quadráticas para as seis relações morfométricas avaliadas no banco do Camaroeiro. As linhas de tendência, as respectivas equações e os coeficientes de correlação (R²) estão indicados para cada uma das regressões. Altura (A), comprimento (C), comprimento da abertura (Ca), largura (L), largura da abertura (La).

88

No banco da Cidade, o crescimento do comprimento em relação à largura e altura da

concha foi determinado por relações cúbicas, indicando uma variação do crescimento ao longo

do desenvolvimento do indivíduo (Fig. 5). Da mesma forma, tanto L/A e Ca/La também possuem

variação no crescimento relativo. As relações C/Ca e C/La foram regidas pelos modelos linear e

quadático, respectivamente.

O crescimento da largura e da altura em proporção ao comprimento da concha não

aparentam distinções entre as áreas, mesmo com diferentes modelos alométricos (Fig. 6). O

desenvolvimento da abertura da concha é diferente entre os dois bancos, com indivíduos do

Figura 5. Nassarius vibex. Regressões logarítmicas lineares, cubicas e quadráticas para as seis relações morfométricas avaliadas no banco da Cidade. As linhas de tendência, as respectivas equações e os coeficientes de correlação (R²) estão indicados para cada uma das regressões. Altura (A), comprimento (C), comprimento da abertura (Ca), largura (L), largura da abertura (La).

89

Camaroeiro com menor abertura em comparação com o da Cidade. Não há diferenças nos

padrões de crescimento alométrico entre a largura e a altura da concha, entretanto tal padrão não

é o mesmo para a relação Ca/La. Neste último caso, o início do crescimento é distinto, com

menores tamanhos para a Cidade, entretanto, ao atingir tamanhos maiores, a diferença entre as

duas áreas desaparece.

DISCUSSÃO

Morfometria

O tamanho médio de Nassarius vibex, durante o período de estudo, foi significativamente

diferente entre as duas populações. Os indivíduos da população do Camaroeiro possuem conchas

com maior comprimento, largura e ângulo apical, e menor abertura do que os da Cidade. A

Figura 6. Nassarius vibex. Estimativa de crescimento para as seis relações morfométricas avaliadas nas duas populações. As curvas foram calculadas com base nas equações obtidas para cada modelo. Altura (A), comprimento (C), comprimento da abertura (Ca), largura (L), largura da abertura (La).

90

redução do conjunto de dados, por meio da análise de componentes principais, reforçou as

diferenças morfométricas entre as duas populações. Os CPs 1 e 2, explicaram cerca de 91% da

variação nos dados e foram fortemente influenciados por variáveis da forma da concha (Tabela

3). Estes resultados foram semelhantes aos encontrados por PRESTON & ROBERTS (2007) para

Calliostoma zyziphinum (Linnaeus, 1758), os quais admitiram que a disponibilidade de alimento

no ambiente foi determinante para as diferenças nos tamanhos entre quatro áreas das ilhas

Britânicas. Indivíduos de C. zyziphinum que habitavam locais com mais recursos apresentavam

maior taxa de crescimento, evitavam a predação por caranguejos e/ou se recuperavam

rapidamente de ataques mal-sucedidos pelos predadores. As populações de N. vibex não

apresentam sinais da influência de predação. Conchas vazias, em grande número, ou mesmo

marcas de regeneração nas conchas dos indivíduos vivos não foram constantes. Isto implica na

influência de outros fatores para as diferenças morfométricas registradas entre as populações. Por

ser uma espécie comedora de carniça (DEMAINTENON, 2001), os bancos e seus arredores

representam, para N. vibex, uma fonte de reservas alimentares de grande potencial. Estudos sobre

a condição de desenvolvimento de M. charruana entre as duas áreas, aparentemente não

indicaram diferenças na qualidade desse possível recurso alimentar (AMARAL , comunicação

pessoal). Em uma avaliação da dieta alimentar de N. vibex, FORRONI et al. (2008) identificaram

algas e fragmentos de poliquetas e crustáceos nos conteúdos estomacais da espécie. Os autores

não realizaram uma avaliação da disponibilidade de tais recursos alimentares e, portanto, ainda

não é possível estabelecer relações entre as diferenças morfológicas observadas entre as

populações.

Dentro da família Nassariidae, a influência da disponibilidade de alimento foi observada

para Nassarius pauperatus (Lamarck, 1822) (MCKILLUP & BUTLER, 1983) e N. reticulatus

(MCKILLUP & MCKILLUP, 1997), nos quais indivíduos das menores classes de tamanho, quando

expostos à altas concentrações de alimentos, apresentaram desenvolvimento mais rápido do que

os mais velhos e maiores, sob as mesmas condições. MORTON e CHAN (2004), estudando a

dinâmica populacional de Nassarius festivus (Powys, 1838) em três diferentes praias de Hong

Kong, observaram pequenas variações nas taxas de crescimento e, conseqüentemente, diferentes

comprimentos finais em adultos. Os autores afirmam que a disponibilidade de alimento e o

91

assentamento irregular das larvas podem ser os principais fatores que regulam o tamanho dos

adultos.

Além da disponibilidade de alimentos, a forma da concha pode variar em resposta a

estímulos ambientais como ação de ondas, altas densidades de indivíduos, presença de

predadores, competição e maturação gonadal (UNDERWOOD, 1976; WELLINGTON & KURIS,

1983; KEMP & BERTNESS, 1984; APPLETON & PALMER, 1988; IRIE 2006). A influência das altas

densidades de competidores, predadores e presas sobre o crescimento dos gastrópodes são bem

conhecidas (MORRISEY, 1987; RAY & STONER, 1994; GORBUSHIN, 1996; BLANCHARD et al.,

2000; KAWATA et al., 2005; IRIE, 2006). Segundo UNDERWOOD (1976), a regulação da densidade

por meio de competição alimentar pode causar uma elevação no tamanho da população devido

ao alto recrutamento juvenil que, por si só, reduz o tamanho dos organismos. Além disso, a alta

mortalidade de adultos e a redução do crescimento em juvenis são esperadas. Conclusões

semelhantes foram feitas por IRIE (2006) para Cyprea annulus Linnaeus, 1758, onde o tamanho

final dos juvenis foi afetado por elevados níveis de densidades. Para Hydrobia ulvae (Pennant,

1777), a interação intraespecífica reduziu as taxas de crescimento (MORRISEY, 1987). No

presente estudo, não foi verificada diferença significativa nas densidades entre as duas

populações de N. vibex (Capítulo 3), excluindo o efeito da competição alimentar regulada por

diferenças nas densidades na definição dos tamanhos dos indivíduos.

MARTÍN (2003) apontou a possibilidade de existência de isolamento genético para

explicar as variações morfológicas observadas em Chilina parchappii (d'Orbigny, 1835), ao

longo de quatro localidades do ribeirão Napostá Grande (Argentina). BARREIRO et al. (2006)

demonstrou que as populações de N. reticulatus em ria dos Muros (Portugal) são geneticamente

homogêneas. Os autores observaram que a curta distância geográfica entre estas populações e

seu confinamento dentro do rio, aparentemente favorece um alto nível de fluxo gênico e a

população desta área foi considerada como uma única unidade. A princípio, a alta proximidade

entre as duas áreas (500 m) leva a consideração da inexistência de isolamento genético entre as

populações de N. vibex. MARTÍN (2003) afirma que mesmo populações muito próximas podem

apresentar heterogeneidades genotípicas devido à uma barreira eficiente ao fluxo gênico. A

região do banco do Camaroeiro recebe trens de ondas do tipo NE e SE (FARINACCIO, 2000), o

92

que justificaria um fluxo gênico do banco do Camaroeiro para o da Cidade. Entretanto, este

mesmo autor admite que a atuação da deriva litorânea de N para S promove um acúmulo de

sedimentos junto à porção esquerda (N) do molhe do rio Ipiranga. Este atuaria como um

dissipador artificial de energia, barrando os sedimentos transportados em direção ao sul e, desta

forma, diminuindo um possível fluxo de larvas nas áreas ao sul da enseada de Caraguatatuba.

Mesmo a ausência de barreiras físicas não assegura uma homogeneidade genética entre

populações próximas, caso a espécie apresente baixa capacidade de dispersão (JOHANNESSON et

al., 1993). A deposição dos ovos de N. vibex em cápsulas (Capítulo 2) pode limitar a dispersão

das véligers, uma vez que estas completam seu desenvolvimento dentro da cápsula

Crescimento relativo

A adoção do modelo alométrico clássico para analisar o crescimento relativo de um

organismo, em vez da seleção de um modelo baseado na teoria da informação de Kullback-

Leibler (KL) e na inferência multi-modelo (IMM) pode levar à falsas conclusões

(KATSANEVAKIS et al,, 2007; PROTOPAPAS et al., 2007; RAOBOUI et al., 2007). Nesse caso, existe

uma grande possibilidade de conclusão de alometria positiva quando esta é negativa ou vice-

versa (KATSANEVAKIS et al., 2007; PROTOPAPAS et al., 2007).

No presente estudo, o modelo alométrico linear não foi o mais comum para todas as

relações de N. vibex (Tabela 3), provando que a adoção somente da abordagem linear poderia

resultar em perda de informação, fato também observado para o bivalve Pinna nobilis Linnaeus,

1758 (RABAOUI et al., 2007). Para gastrópodes, como N. festivus (MORTON & CHAN, 2004),

existe uma variação temporal nas taxas de crescimento durante a sua vida, com juvenis

crescendo mais rapidamente do que adultos. Essa oscilação no crescimento dos indivíduos ao

longo do tempo não é considerada pelo modelo linear (Y = aXb), onde o expoente alométrico b é

sempre uma constante. No entanto, este nem sempre permanece constante, uma vez que pontos

de descontinuidade foram inicialmente reconhecidos por HUXLEY (1932), podendo ainda sofrer

mudanças continuas, sem pontos de quebra conspícuos (HALL et al., 2006; RABAOUI et al.,

2007). Isto é resultado do crescimento diferencial entre as classes de idade por pressões como

competição (GRUDEMO & BOHLIN, 2000), disponibilidade alimentar (UNDERWOOD, 1976;

93

EDWARDS & HUEBNER, 1977; MCKILLUP & MCKILLUP, 1997) e temperatura (BARROSO et al.,

2005).

Estas variações no expoente alométrico foram calculadas para N. vibex, sendo possível a

observação de diferentes padrões de crescimento relativo para as relações melhor explicadas

pelos modelos não-lineares. A diferença no desenvolvimento da largura da concha entre as duas

populações está no fato do modelo cúbico ter sido o mais plausível para a relação C/L na Cidade.

Já os crescimentos das relações C/A e L/A não tiveram distinções entre as áreas. No entanto, o

desenvolvimento da abertura da concha é diferente entre os dois bancos, com indivíduos do

Camaroeiro com menor abertura em comparação com os da Cidade. Já para o crescimento

relativo de Ca/La, o início é distinto entre as duas populações, entretanto ao longo do

desenvolvimento dos indivíduos, tal diferença entre as áreas desaparece (Fig. 6). Isto implicaria

em uma maior taxa de crescimento para a população da Cidade. Entretanto, as análises de

crescimento apresentadas no Capítulo 3 excluem essa possibilidade, uma vez que esta população

apresentou índice de crescimento (K=0,58) menor que o do Camaroeiro (K=1,22). Outra

explicação seria a maior longevidade da população na Cidade (pelo menos 5 anos), permitindo

que mesmo com menor constante de crescimento, os indivíduos alcancem valores de abertura da

concha semelhantes ao do Camaroeiro. Apesar disso, há uma diferença significativa no tamanho

da abertura da concha entre os bancos e, considerando o crescimento de cada componente da

abertura (Ca e La) em relação ao comprimento da concha é visível que a população do

Camaroeiro sempre apresentou menor crescimento relativo. Muito provavelmente esta diferença

no tamanho da abertura é mais influenciada pelas menores classes de tamanho, onde há diferença

nas taxas de crescimento.

É notável que muitas das observações realizadas neste capítulo não seriam possíveis sem

a utilização da teoria da informação de K-L e a seleção de multi-modelos. ESTEBENET (1998)

observou que o modelo linear não conseguiu descrever com acurácia o crescimento relativo entre

o comprimento da concha e o peso total da concha de Pomacea canaliculata (Lamarck 1822). A

autora explicou que a grande variação no peso da concha se deveu à variação no crescimento dos

gastrópodes influenciada pela sazonalidade na temperatura da água. HOLLANDER et al. (2006)

demonstraram que Littorina saxatilis (Olivi, 1792) possui tanto crescimento alométrico como

94

isométrico e que os padrões ontogenéticos deste crescimento estão intimamente relacionados

com o microhabitat, sexo e estágio de vida dos indivíduos. Estes fatos implicam na necessidade

de se utilizar outras metodologias que considerem as variações nas taxas de crescimento.

Modelos não-lineares, como o quadrático e o cúbico, utilizados no estudo morfométrico de N.

vibex possuem alta plausibilidade, refletindo padrões de desenvolvimento mais confiáveis para a

espécie. A falta de estudos com a aplicação desta metodologia para outras espécies de

gastrópodes, não permitiu ampla discussão e comparações específicas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados apresentados permitem concluir que Nassarius vibex apresenta crescimento

relativo irregular, variando ao longo do desenvolvimento dos indivíduos. Os efeitos das

diferenças nos padrões de crescimento populacional, como longevidade e taxas de crescimento,

permitem explicar o crescimento alométrico das duas populações. No presente estudo fica

evidente a necessidade da aplicação de um conjunto de modelos alométricos, incluindo o linear e

aqueles que assumam mudanças na alometria e na descontinuidade do expoente alométrico,

devem ser considerados para o estudo do crescimento relativo. Estas mudanças nas trajetórias do

crescimento durante a ontogenia são uma potencial fonte de informações, pois podem ser

causadas por eventos marcantes na história de vida das espécies (maturidade sexual ou

recrutamento).

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Akaike, H. 1983. Information measures and model selection. Int. Stat. Inst., 44: 277-291.

Appleton, R.D. & Palmer, A.R.. 1988. Water-borne stimuli released by predatory crabs and damaged prey induce more predator-resistant shells in a marine gastropod. P. Natl. Acad. Sci. USA, 85: 4387-4391.

Barreiro, R.; Couceiro, L.; Quintela, M. & Ruiz, J.M. 2006. Population genetic structure of the prosobranch Nassarius reticulatus (L.) in a ria seascape (NW Iberian Peninsula) as revealed by RAPD analysis. Mar. Biol., 148: 1051-1060.

Barroso, C.M.; Moreira, M.H. & Richardson, C.A. 2005. Age and growth of Nassarius reticulatus in the Ria de Aveiro, north-west Portugal. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 85: 151-156.

Bigatti, G.; Penchaszadeh, P.E. & Cledón, M. 2007. Age and growth in Odontocymbiola magellanica (Gastropoda: Volutidae) from Golfo Nuevo, Patagonia, Argentina. Mar. Biol., 150: 1199-1024.

Blanchard, G.F.; Guarini, J.M.; Provot, L.; Richard, P. & Sauriau, P.G. 2000. Measurement of ingestion rate of Hydrobia ulvae (Pennant) on intertidal epipelic microalgae: the effect of mud snail density. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 255: 247-260.

95

Borulya, E.M. & Bregman, Y.E. 2002. Growth and life span of the commercial gastropods of Buccinidae family in Peter the Great Bay, sea of Japan. Russ. J. Mar. Biol., 28: 270-273.

Britton, J.C. & Morton, B. 1994. Marine carrion and scavengers. Oceanogr. Mar. Biol. Annu. Rev., 32: 369-434.

Buckland, S.T.; Burnham, K.P. & Augustin, N.H. 1997. Model selection: an integral part of inference. Biometrics, 53: 603-618.

Burnham, K.P. & Anderson, D.R. 2002. Model selection and multimodel inference: a practical information-theoretic approach. Springer, New York.

Chatzinikolaou, E. & Richardson, C.A. 2007. Evaluating growth and age of netted whelk Nassarius reticulatus (Gastropoda: Nassariidae) using statolith growth rings. Mar. Ecol. Prog. Ser., 342: 163-176.

Chatzinikolaou, E. & Richardson, C.A. 2008. Population dynamics and growth of Nassarius reticulatus (Gastropoda: Nassariidae) in Rhosneigr (Anglesey, UK). Mar. Biol., 153: 605-619.

Chen, M.-H. & Soong, K. 2002. Estimation of age in the sex-changing, coral-inhabiting snail Coralliophila violacea from the growth striae on opercula and a mark-recapture experiment. Mar. Biol., 140: 337-342.

Chow, V. 1987. Patterns of growth and energy allocation in northern California populations of Littorina (Gastropoda: Prosobranchia). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 110: 69-89.

Clarke, A.; Prothero-Thomas, E.; Beaumont, J.C.; Chapman, A.L. & Brey, T. 2004. Growth in the limpet Nacella concinna from contrasting sites in Antarctica. Polar Biol., 28: 62-71.

Cledón, M.; Brey, T.; Penchaszadeh, P.E. & Arntz, W. 2005. Individual growth and somatic production in Adelomelon brasiliana (Gastropoda; Volutidae) off Argentina. Mar. Biol., 147: 447-452.

Curtis, L.A. 1995. Growth, trematode parasitism, and longevity of a long-lived marine gastropod (Ilyanassa obsoleta). J. Mar. Biol. Ass. U.K., 75: 913-925.

Demaintenon, M.J. 2001. Analysis of reproductive system ontogeny and homology in Nassarius vibex (Gastropoda: Buccinidae: Nassariinae). J. Mollus. Stud., 67: 37-49.

Denadai, M.R.; Amaral, A.C.Z. & Turra, A. 2004. Biology of a tropical intertidal population of Cerithium atratum (Born, 1778) (Mollusca, Gastropoda). J. Nat. Hist., 38: 1695-1710.

Elkarmi, A.Z. & Ismail, N.S. 2006. Allometry of the gastropod Melanopsis praemosa (Thiaridae: Prosobranchia) from Azraq Oasis, Jordan. Pak. J. Biol. Sci., 9: 1359-1363.

Elkarmi, A.Z. & Ismail, N.S. 2007. Growth models and shell morphometrics of two populations of Melanoides tuberculata (Thiaridae) living in hot springs and freshwater pools. J. Limnol., 66: 90-96.

Estebenet, A.L. 1998. Allometric growth and insight on sexual dimorphism in Pomacea canaliculata (Gastropoda: Ampullariidae). Malacologia, 39: 207-213.

Edwards, D.C. & Huebner, J.D. 1977. Feeding and growth rates of Polinices duplicatus preying on Mya arenaria at Barnstable Harbor, Massachusetts. Ecology, 58: 1218-1236.

Ekaratne, S.U.K. & Crisp, D.J. 1984. Seasonal growth studies of intertidal gastropods from shell micro-growth band measurements, including a comparison with alternative methods. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 64: 183-210.

Farinaccio, A. 2000. Alterações relacionadas à ação antrópica na dinâmica dos processos costeiros nas planícies de Praia Grande/ Mongaguá e Enseada de Caraguatatuba, SP. Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo, São Paulo. 150p.

Forroni, T.deO.; Yokoyama, L.Q. & Amaral, A.C.Z. 2008. Dieta alimentar de Nassarius vibex (Gastropoda: Nassariidae). In: XXVII Congresso Brasileiro de Zoologia, Curitiba, Paraná.

Giménez, J.; Brey, T.; Mackensen, A. & Penchaszadeh, P.E. 2004. Age, growth, and mortality of the prosobranch Zidona dufresnei (Donovan, 1823) in the Mar del Plata area, south-western Atlantic Ocean. Mar. Biol., 145: 707-712.

96

Gorbushin, A.M. 1996. The enigma of mud snail shell growth: asymmetrical competition or character displacement? Oikos, 77: 85-92.

Gould, S.J. 1966. Allometry in Pleistocene land snails from Bermuda; the influence of size upon shape. J. Paleontol., 40: 1131-1141.

Grudemo, J. & Bohlin, T. 2000. Effects of sediment type and intra- and interspecific competition on growth rate of the marine snails Hydrobia ulvae and Hydrobia ventrosa. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 253: 115-127.

Hall, N.G.; Smith, K.D.; Lestang, S.de & Potter, I.C. 2006. Does the largest chela of the males of three crab species undergo an allometric change that can be used to determine morphometric maturity? ICES J. Mar. Sci., 63:140-150.

Harding, J.M. 2006. Growth and development of veined rapa whelk Rapana venosa veligers. J. Shellfish Res., 25: 941-946.

Hollander, J.; Adams, D.C. & Johannesson, K. 2006. Evolution of adaptation trhough allometric shifts in a marine snail. Evolution, 60: 2490-2497.

Hurvich, C.M. & Tsai, C.L. 1989. Regression and time series model selection in small samples. Biometrika, 76: 297-307.

Huxley, J.S. 1932. Problems of relative growth. Methuen, London.

Ilano, A.S.; Ito, A.; Fujinaga, K. & Nakao, S. 2004. Age determination of Buccinum isaotakii (Gastropoda: Buccinidae) from the growth striae on operculum and growth under laboratory conditions. Aquaculture, 242: 181-195.

Irie, T. 2006. Geographical variation of shell morphology in Cypraea annulus (Gastropoda: Cypraeidae). J. Mollus. Stud., 72: 31-38.

Ismail, N.S. & Elkarmi, A.Z. 2006. Age, growth and shell morphometrics of the gastropod Monodonta dama (Neritidae:Prosobranchia) from the Gulf of Aqaba, Red Sea. Pak. J. Biol. Sci., 5: 843-847.

Johannesson, K.; Johannesson, B. & Rolám-Alvarez, E. 1993. Morphological differentiation and genetic cohesiveness over a microenvironmental gradient in the marine snail Littorina saxatilis. Evolution, 47: 1770-1787.

Katsanevakis, S. 2007. Growth and mortality rates of the fan mussel Pinna nobilis in Lake Vouliagmeni (Korinthiakos Gulf, Greece): a generalized additive modelling approach. Mar. Biol., 152: 1319-1331.

Katsanevakis, S.; Thessalou-Legaki, M.; Karlou-Riga, C.; Lefkaditou, E.; Dimitriou, E. & Verriopoulos, G. 2007. Information-theory approach to allometric growth of marine organisms. Mar. Biol., 151: 949-959.

Kawata, M.; Sawada, H.; Yokoyama, J.; Echenique-Días, L.M. & Ishibashi, Y. 2005. The effects of spatial habitat structure on the evolution of density-dependent growth and reproduction in freshwater snails. Hydrobiologia, 533: 229-241.

Kemp, P. & Bertness, M.D. 1984. Snail shape and growth rates: evidence for plastic shell allometry in Littorina littorea. P. Natl. Acad. Sci. USA, 81: 811-813.

Lambeck, R.H.D. 1984. Dynamics, migration and growth of Nassarius reticulatus (Mollusca, Prosobranchia) colonizing saline lake Grevelingen (SW Netherlands). Neth. J. Sea Res., 18: 395-417.

Manly, B.F.J. 1986. Multivariate statistical methods – a primer. Chapman & Hall, London.

Martín, P.R. 2003. Allometric growth and inter-population morphological variation of the freshwater snail Chilina parchappii (Gastropoda: Chilinidae) in the Napostá Grande Stream, Southern Pampas, Argentina. Stud. Neotrop. Fauna Environ., 38: 71-78.

McKillup, S.C. & Butler, A.J. 1983. The measurement of hunger as a relative estimate of food available to populations of Nassarius pauperatus. Oecologia, 56: 16-22.

97

McKillup, S.C. & McKillup, R.V. 1997. Effect of food supplementation on the growth of an intertidal scavenger. Mar. Ecol. Prog. Ser., 148: 109-114.

McKinney, R.A.; Glatt, S.M. & McWillians, S.R. 2004. Allometric length-weight relationships for benthic prey of aquatic wildlife in coastal marine habitats. Wildl. Biol., 10: 241-249.

McShane, P.E.; Smith, M.G. & Beinssen, K.H.H. 1988. Growth and morphometry in abalone (Haliotis rubra Leach) from Victoria. Aust. J. Mar. Fresh. Res., 39: 161-166.

Mohammad, S.H. 2008. Vertical zonation and biometric parameters of the gastropod Cerithium scabridum in Suez Canal. Res. J. Environ. Sci., 2: 100-107.

Moran, M.J.; Fairweather, P.G. & Underwood, A.J. 1984. Growth and mortality of the predatory intertidal whelk Morula marginalba Blainville (Muricidae): the efects of diferent species of prey. J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 75: 1-17.

Morrisey, D.J. 1987. Effect of population density and presence of a potential competitor on the growth rate of the mud snail Hydrobia ulvae (Pennant). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 108: 275-295.

Morton, B. & Chan, K. 2004. The population dynamics of Nassarius festivus (Gastropoda: Nassaridae) on three environmentally different beaches in Hong Kong. J. Mollus. Stud., 70: 329-339.

Protopapas, N.; Katsanevakis, S.; Thessalou-Legaki, M. & Verriopoulos, G. 2007. Relative growth of the semi-terrestrial crab Pachygrapsus marmoratus: an information-theory approach. Sci. Mar., 71: 383-394.

Preston, S.J. & Roberts, D. 2007. Variation in shell morphology of Calliostoma zizyphinum (Gastropoda: Trochidae). J. Mollus. Stud., 73: 101-104.

Rabaoui, L.; Zouari, S.T.; Katsanevakis, S. & Hassine, O.K.B. 2007. Comparison of absolute and relative growth patterns among five Pinna nobilis populations along the Tunisian coastline: an information theory approach. Mar. Biol., 152: 537-548.

Ray, M. & Stoner, A.W. 1994. Experimental analysis of growth and survivorship in a marine gastropod aggregation: balancing growth with safety in numbers. Mar. Ecol. Prog. Ser., 105: 47-59.

Shanmugam, A. 1997. Length - weight and allometric relationship in a pulmonate snail Cassidula nucleus Martyn. Indian J. Mar. Sci., 26: 224-226.

Tallmark, B. 1980. Population dynamics of Nassarius reticulatus (Gastropoda, Prosobranchia) in Gullmar fjord, Sweden. Mar. Ecol. Prog. Ser., 3: 51-62.

Takada, Y. 1995. Variation of growth rate with tidal level in the gastropod Monodonta labio on a boulder shore. Mar. Ecol. Prog. Ser., 117: 103-110.

Tanaka, M.O. & Maia, R.C. 2006. Shell morphological variation of Littoraria angulifera among and within mangroves in NE Brazil. Hydrobiologia, 559: 193-202.

Tokeshi, M.; Ota, N. & Kawai, T. 2000. A comparative study of morphometric in shell-bearing molluscs. J. Zool., 251: 31-38.

Underwood, A.J. 1976. Food competition between age-classes in the intertidal neritacean Nerita atramentosa Reeve (Gastropoda: Prosobranchia). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 23: 145-154.

Wellington, G.M. & Kuris, A.M. 1983. Growth and shell variation in the tropical eastern pacific intertidal gatropod genus Purpura: ecological and evolutionary implications. Biol. Bull., 164: 518-535.

98

Capítulo 5. – Biologia reprodutiva

RESUMO

O ciclo reprodutivo das duas populações de Nassarius vibex (Say, 1822) foi analisado

entre fevereiro de 2006 e março de 2007 no banco do Camaroeiro e entre abril de 2007 e março

de 2008 no da Cidade. O estudo teve como foco: razão sexual, variação morfométrica entre

fêmeas e machos, maturação gametogênica e períodos de liberação de gametas. Fêmeas de N.

vibex foram mais comuns nos dois bancos (Camaroeiro: 1,63 fêmeas para cada macho; Cidade:

2,98 para 1). Em ambas as populações, as fêmeas foram maiores do que os machos para vários

parâmetros morfológicos, exceto no comprimento médio da concha no banco da Cidade. Fêmeas

e machos do Camaroeiro foram maiores do que as da Cidade. As duas populações de N. vibex

apresentaram grande heterogeneidade em seus ciclos reprodutivos. Não houve diferenças no

tamanho dos indivíduos entre os estágios de maturação, entretanto houve diferenças entre os

bancos, com indivíduos do Camaroeiro sendo maiores do que os da Cidade. O ciclo reprodutivo

de N. vibex foi considerado bianual, com dois períodos de maturação e liberação gametogênica

durante o ano. A maturidade sexual ficou normalmente restrita ao verão e inverno, intercalada

por períodos de liberação e posterior crescimento gametogênico no outono e na primavera. Não

há aparente relação entre os períodos reprodutivos de N. vibex e a variação na temperatura da

água. Outros fatores, como época de desenvolvimento da alga Ulvae lactuca, substrato utilizado

para a deposição das cápsulas ovígeras, revelou ser mais importante para a definição do padrão

reprodutivo do gastrópode.

99

ABSTRACT

The reproductive cycle of two populations of Nassarius vibex was analyzed between

February 2006 and March 2007 in a mitilid bed on Camaroeiro Beach, and from April 2007 to

March 2008 on a second mitilid bed at Cidade Beach. The study focused on the sex ratio,

morphometric variation between the sexes, gametogenic maturation, and spawning periods.

Females of N. vibex were more abundant in both beds (Camaroeiro: 1.63 females/1 male;

Cidade: 2.98/1). In both populations, females were larger than males in several morphometric

parameters, except in mean shell length in the Cidade population. These populations of N. vibex

showed great heterogeneity in their biannual reproductive cycles, with two maturation and

spawning periods per year. Regarding each maturation stage, differences were restricted to inter-

population variations, with individuals of the Camaroeiro bed varying more than those at Cidade.

Sexual maturity was normally restricted to summer and winter, and spawning was recorded in

autumn and spring. There was no apparent relationship between the reproductive periods and the

water temperature. Other factors, such as the period of development of the green alga Ulva

lactuca, on which the egg capsules are deposited, seemed to be more important in defining the

reproductive period of this gastropod.

100

INTRODUÇÃO

A liberação de gametas e o desenvolvimento larval são fatores capazes de influenciar a

abundância, a distribuição (MORAN, 1997) e o crescimento de invertebrados marinhos

bentônicos; a temperatura, a salinidade, a periodicidade lunar e as marés podem regular tanto a

gametogênese como a liberação de gametas (WEBBER, 1977). Desta forma, informações sobre a

biologia reprodutiva e o desenvolvimento de gastrópodes, especialmente a sazonalidade na

reprodução, a duração da fase larval e o número de embriões produzidos anualmente é de suma

importância para uma melhor compreensão de sua biologia populacional, estrutura genética e

ecologia (HENDLER, 1991; CHAPARRO et al. 2005). Tanto a liberação de gametas como o

desenvolvimento larval de várias espécies tem sido descritos em detalhes, entretanto,

surpreendentemente, a reprodução de algumas dessas espécies, bem estudadas com relação a sua

dinâmica populacional, permanece desconhecida (MORAN, 1997).

Na maioria dos gastrópodes prosobrânquios, a atividade gamética é sincrônica dentro das

populações e a maturação ocorre em um determinado período, entretanto, para algumas espécies,

a gametogênese é assincrônica entre indivíduos ou entre os sexos (WEBBER, 1977; ILANO et al.,

2003). A espécie Buccinum isaotakii (Kira, 1959) de Hokkaido, Japão, apresenta um ciclo

gametogênico anual, com machos maduros ocorrendo alguns meses antes do início do

amadurecimento das gônadas femininas (ILANO et al., 2003). Esses autores admitiram que

machos são estimulados a produzir espermatozóides assim que finalizam o período de cópula,

enquanto que nas fêmeas esse estímulo ocorrerá somente após a postura dos ovos.

Dentro da família Nassariidae, poucos são os estudos sobre sua biologia reprodutiva. No

geral, as espécies demonstram um padrão anual de reprodução com liberação de gametas restrita

a alguns meses, normalmente durante a primavera e o verão (BROWN, 1982). No entanto, alguns

membros do gênero Nassarius podem se reproduzir no meio do inverno (PECHENIK, 1978). A

maturação gametogênica em Nassarius festivus (Powys, 1835), regulada pela temperatura e

salinidade da água, ocorre no outono, sendo que a liberação de gametas é restrita ao inverno

(CHAN & MORTON, 2005). Para a espécie Nassarius reticulatus (Linnaeus, 1758) também

verificou-se que a temperatura é o principal fator regulador do seu ciclo reprodutivo anual

(TALLMARK , 1980). Nassarius obsoletus (Say, 1822) também apresenta um padrão reprodutivo

101

anual regulado pela temperatura (SCHELTEMA, 1967). De acordo com o autor, as variações na

temperatura em ambientes distintos poderiam explicar as diferenças nas épocas de liberação de

gametas.

Os resultados apresentados no segundo capítulo apontam para a existência de dois

períodos reprodutivos ao ano para N. vibex e, por conseqüência, dois de recrutamento. Dentro

deste contexto, este capítulo tem como objetivos analisar o ciclo reprodutivo das duas

populações de Nassarius vibex (Say, 1822), focando em aspectos como razão sexual, variação

morfométrica entre fêmeas e machos, maturação gametogênica e períodos de liberação de

gametas.

METODOLOGIA

Amostragem e procedimentos de laboratório

As análises do ciclo reprodutivo foram realizadas com os exemplares de N. vibex

coletados mensalmente nos dois bancos de M. charruana, de fevereiro de 2006 a março de 2007

na praia do Camaroeiro e, entre abril de 2007 e março de 2008, na praia da Cidade. Para maiores

informações sobre as áreas de estudo e a metodologia de amostragem, consultar capítulos 1 e 3,

respectivamente.

Nassarius vibex apresentou maturidade sexual a partir de 11,5 mm no comprimento da

concha para machos e 15,0 mm para as fêmeas, em duas localidades do sul da Flórida, EUA

(DEMAINTENON, 2001a). Entretanto, outros registros apontaram maturidade sexual entre 6,3 e

12,1 mm (DEMAINTENON, 2001b). Diante destes resultados, no presente estudo, 20 indivíduos

com comprimento de concha acima de 15,0 mm foram separados mensalmente de cada amostra

para essas análises.

No laboratório, o comprimento, a largura e a altura da concha de cada indivíduo foram

medidos com auxílio de um paquímetro digital com precisão de 0,01 mm. As partes moles foram

removidas de suas conchas e fixadas em solução de Bouin por 48 horas. Seguindo a metodologia

de RAMÓN e AMOR (2002), após a preservação, secções de 1 mm3 da parte dorsal posterior da

massa visceral foram retiradas para as análises histológicas, desidratadas em etanol, infiltradas e

embebidas em resina. Dos blocos de resina foram obtidas secções de 3 a 4 µm de espessura e os

102

cortes corados com técnica rotineira de azul de toluidina. Para cada indivíduo foram

confeccionadas 2 lâminas, totalizando aproximadamente 1040 lâminas ao final do estudo.

Análise dos dados

As razões sexuais das duas populações foram avaliadas por meio de um teste de Qui-

Quadrado (χ2) de contingência para proporções esperadas iguais. Os dados referentes aos

tamanhos dos indivíduos foram inicialmente submetidos a uma análise de normalidade de

Shapiro-Wilk (MORTON, 1999). Posteriormente, comprovada a não-normalidade dos mesmos, as

diferenças nos tamanhos médios dos parâmetros medidos (comprimento, largura e altura da

concha) entre os sexos e dentre os sexos foram avaliadas para cada banco com auxílio de teste U

de Wilcoxon-Mann-Whitney (ITO & WADA , 2006).

O ciclo gametogênico foi dividido em 6 fases, de acordo com as comparações com os

estudos de BARROSO e MOREIRA (1998) e CHAN e MORTON (2005), definidos através do estado e

quantidade de gametas nas gônadas. Como diversas fases podem estar presentes

simultaneamente nas diferentes partes do tecido gonadal, o estágio foi definido por um deles

ocupando mais de 50% da secção.

RESULTADOS

Razão sexual e variação morfométrica

A razão sexual nas populações dos bancos do Camaroeiro (1,63 fêmeas para cada macho)

e da Cidade (2,98:1) foi significativamente desviada em favor das fêmeas (Camaroeiro:

χ2=15,39; p<0,001 e Cidade: χ2=58,25; p<0,001). Tal dominância de um dos sexos foi verificada,

exceto em alguns meses, ao longo de todo o período avaliado em cada banco (Fig. 1A,B). No

Camaroeiro, a frequência relativa de fêmeas variou entre 33 e 72% e a de machos entre 25 e 66%

(Fig. 1A). Os meses com maior proporção de fêmeas ocorreram em junho, julho, agosto e

outubro de 2007. Com relação aos machos, a maior freqüência foi registrada em fevereiro de

2006. Na Cidade, a variação na freqüência de fêmeas ficou entre 55 e 90% e, para machos entre

10 e 35% (Fig. 1B). Grandes proporções de fêmeas nesta população foram verificadas em julho,

setembro, outubro e dezembro de 2007.

103

Nas duas populações as fêmeas foram significativamente maiores do que os machos

(Tabela 1) para todos os parâmetros morfológicos, exceto no comprimento médio da concha no

banco da Cidade. A comparação de cada sexo entre os bancos demonstrou que as fêmeas do

Camaroeiro são significativamente maiores do que as da Cidade (Tabela 1). Entre os machos, há

diferenças significativas apenas na largura e na altura da concha, sendo indivíduos da Cidade

menores do que os do Camaroeiro.

Figura 1. Nassarius vibex. Variação mensal da freqüência relativa de cada sexo (fêmea, macho e indeterminado) para as populações dos bancos do Camaroeiro (A) e da Cidade (B).

104

Ciclo reprodutivo

As duas populações de N. vibex apresentaram grande heterogeneidade em seus ciclos

reprodutivos. Durante o desenvolvimento de oócitos e espermatozóides, não houve predomínio

de um determinado estágio de maturação ao longo dos meses, exceto em alguns casos isolados

em machos.

Com auxílio dos cortes histológicos foram identificados os diferentes estágios de

maturação gametogênica nas populações de N. vibex. A seguir serão apresentadas descrições de

cada estágio para fêmeas e machos.

Histologia dos folículos ovarianos

Quatro categorias de oócitos foram identificadas (Fig. 2A-H): 1) pré-vitelogênicos com

diâmetro entre 30 e 64 µm (média = 48,2 ± 9,9 µm), com citoplasma sem granulação e núcleo

grande; 2) vitelogênese inicial com diâmetro entre 57 e 97 µm (média = 73 ± 11,3 µm), com

citoplasma levemente granulado devido ao início da vitelogênese; 3) pré-maduros com diâmetro

entre 82 e 148 µm (média = 104 ± 16,5 µm), com formação de pequenos grânulos de vitelo e

reservas lipídicas; 4) maduros, com diâmetro entre 146 e 294 µm (média = 197,3 ± 35,9 µm),

citoplasma repleto de grânulos de vitelo e reservas lipídicas.

Camaroeiro Cidade Entre sexos Entre bancos

Fêmea Macho Fêmea Macho Camaroeiro Cidade Fêmea Macho

Parâmetros

Média (DP)

Média (DP)

Média (DP)

Média (DP)

U (p)

U (p)

U (p)

U (p)

Comprimento

17,90 (0,85)

17,50 (1,04)

17,70 (0,78)

17,46 (0,78)

10.286 (<0,01)

4.913 (N.S.)

15.342 (<0,01)

2.714,5 (N.S.)

Largura

10,74 (0,63)

10,46 (0,65)

9,72 (0,50)

9,49 (0,61)

10.530,5 (<0,01)

5.249,5 (<0,01)

24.110 (<0,01)

4.508,5 (<0,01)

Altura

8,84 (0,48)

8,55 (0,51)

8,58 (0,40)

8,32 (0,36)

11.396 (<0,01)

5.823 (<0,01)

18.520 (<0,01)

3.428 (<0,01)

Tabela 1. Nassarius vibex. Média e desvio padrão (DP) de cada parâmetro morfométrico. Os testes estatísticos de Wilcoxon-Mann-Whitney (U) foram aplicados nas comparações entre os sexos em cada banco e entre os bancos em cada sexo com nível de significância (α) de 0,01. N.S.: não significativo.

105

De acordo com a composição de cada folículo ovariano e as freqüências das quatro

categorias de oócitos, o ciclo reprodutivo das fêmeas de N. vibex foi divido em cinco estágios:

I- Recuperação (Fig. 2A, B)

Poucos folículos ovarianos de tamanho diminuto dispersos no tecido conectivo.

Internamente, presença de oócitos pré-vitelogênicos e em vitelogênese inicial ainda restritos as

paredes foliculares.

II- Crescimento (Fig. 2C, D)

Início da atividade gametogênica em alguns folículos com expansão dos mesmos e

compressão do tecido conectivo interfolicular. Grande presença de ovócitos em vitelogênese

inicial e pré-maduros. É perceptível a existência de oócitos pré-vitelogênicos aderidos a camada

germinativa na periferia folicular e alguns poucos maduros com grandes grânulos de vitelo e

reservas lipídicas.

III- Pré-maduro (Fig. 2E)

Intensificação da vitelogênese com folículos compostos em sua maioria por oócitos pré-

maduros e maduros. Células em vitelogênese inicial e pré-vitelogênicas são raras, normalmente

restritas à periferia folicular.

IV- Maduro (Fig. 2F, G)

Tecido gonadal completamente preenchido por oócitos maduros densamente agrupados

com grandes grânulos de vitelo e reservas de lipídio. Em pequeno número foram registrados

oócitos pré-vitelogênicos, em vitelogênese inicial e pré-maduros.

V- Liberação (Fig. 2H)

Folículos ovarianos com grandes lacunas devido a liberação de oócitos maduros. Os

remanescentes permanecem aleatoriamente dispersos nos folículos junto com oócitos pré-

vitelogênicos, vitelogenese inicial e pré-maduros.

106

Figura 2. Nassarius vibex. Histologia dos folículos ovarianos. A, B) Recuperação; C, D) crescimento; E) pré-maduro; F, G) maduro; H) liberação; oócito maduro (Om), oócito pré-maduro (Pm), oócito pré-vitelogênico (Pv), oócito em vitelogênese inicial (Vi).

107

Histologia dos folículos testiculares

O desenvolvimento dos espermatozóides em N. vibex apresenta aspectos semelhantes aos

da oôgenese como a presença de células imaturas em conjunto com maduras. Neste caso, a

espermatogênese foi dividida em seis estágios:

I- Recuperação (Fig. 3A)

Folículos espermáticos com pequeno tamanho, formados basicamente pela camada

germinativa, com poucos espermatócitos espalhados pelo tecido conjuntivo intrafolicular

indiferenciado. Em alguns observa-se espermatozóides no lúmen.

II- Crescimento (Fig. 3B)

Grande proliferação de espermatócitos que preenchem parte dos folículos. Ainda há

tecido conjuntivo intrafolicular na periferia, aos poucos sendo substituído a novos

espermatócitos. Em alguns é possível observar maior acúmulo de espermatozóides no lúmen.

III- Pré-maduro (Fig. 3C, D)

Periferia dos folículos totalmente coberta pelas células germinativas. Há aumento do

tamanho dos folículos devido ao acúmulo de espermatozóides no lúmen formando camada

espessa em alguns folículos.

IV- Maduro (Fig. 3E)

Folículos espermáticos completamente preenchidos por espermatozóides. Camada

germinativa ainda presente, mas com menor espessura comparada ao estágio anterior.

V- Liberação (Fig. 3F, G)

Formação de lacunas devido a liberação de espermatozóides e posterior acúmulo nos

dutos espermáticos. Camada germinativa composta por poucos espermatócitos e desconectada da

parede folicular.

VI- Vazio (Fig. 3H)

Folículos completamente esvaziados sem presença de camada germinativa. A

identificação deste estágio para machos foi possível devido a presença de poucos

espermatozóides não liberados no lúmen de alguns folículos. Não há presença de tecido

conjuntivo no folículo, característica marcante do estágio de recuperação.

108

Figura 3. Nassarius vibex. Histologia dos folículos testículares. A) Recuperação; B) crescimento; C, D) pré-maduro; E) maduro; F) liberação; G) duto espermático; H) vazio; espermatócitos (Ec), espermatozóides (Ez), tecido conjuntivo intrafolicular (Tc).

109

Ciclo oôgenico

Em ambos os bancos, não houve diferenças no tamanho dos indivíduos entre os estágios

de maturação (Tabela 2). É possível notar que existem diferenças nos tamanho entre os bancos,

com indivíduos do Camaroeiro maiores do que os da Cidade nos três parâmetros analisados.

No Camaroeiro, fêmeas em estágio de crescimento foram observadas em quase todos os

meses, com maior proporção em abril e maio de 2006, e entre novembro de 2006 e janeiro de

2007 (Fig. 4A). Indivíduos em estágio de pré-maturação foram mais comuns em março, junho,

agosto, outubro e dezembro de 2006, e em fevereiro e março de 2007. Fêmeas maduras

ocorreram, em maior número, em fevereiro de 2006, entre julho e outubro de 2006, e em

fevereiro e março de 2007. No entanto, estes dois últimos estágios estiveram presentes em quase

todos os meses analisados, demonstrando um potencial para reprodução contínua em N. vibex.

Poucos indivíduos com folículos em liberação e recuperação foram registrados, normalmente

após períodos de grande número de gastrópodes maduros, como em março, agosto e setembro de

2006. A partir deste mês, nota-se um aumento considerável na quantidade de fêmeas em

crescimento, indicando o início de um novo ciclo gametogênico, que culminou com maior

proporção de indivíduos maduros em fevereiro e março de 2007. Estes dois últimos meses

apresentam resultados semelhantes aos do ano anterior, apontando para uma sazonalidade no

ciclo reprodutivo da espécie.

Estágio Comprimento Largura Altura No fêmeas Camaroeiro Recuperação 18,07 ± 0,74 10,93 ± 0,21 9,16 ± 0,21 4 Crescimento 18,00 ± 0,71 10,83 ± 0,52 8,81 ± 0,49 42 Pré-maduro 17,95 ± 0,93 10,70 ± 0,69 8,89 ± 0,49 67 Maduro 17,72 ± 0,84 10,67 ± 0,64 8,79 ± 0,46 49 Liberação 18,20 ± 1,05 11,45 ± 0,21 9,14 ± 0,30 3 Vazio - - - 0 Cidade Recuperação 17,98 ± 0,95 9,75 ± 0,52 8,79 ± 0,46 10 Crescimento 17,81 ± 0,82 9,64 ± 0,44 8,62 ± 0,34 47 Pré-maduro 17,66 ± 0,79 9,82 ± 0,53 8,59 ± 0,46 58 Maduro 17,60 ± 0,67 9,70 ± 0,52 8,53 ± 0,36 59 Liberação 18,23 ± 1,25 9,73 ± 0,68 8,55 ± 0,55 2 Vazio - - - 0

Tabela 2. Nassarius vibex. Tamanho médio ± desvio padrão e número total das fêmeas para cada estágio de maturação identificado nos bancos do Camaroeiro e da Cidade.

110

O padrão reprodutivo das fêmeas no banco da Cidade foi similar ao do Camaroeiro.

Indivíduos pré-maduros e maduros foram registrados em todos os meses, com maior freqüência

dos pré-maduros em abril e maio de 2007, e dos maduros entre agosto e novembro de 2007 (Fig.

4B). Ao contrário da população do Camaroeiro, não houve grande quantidade de indivíduos em

maturação. Folículos em crescimento foram registrados em maior proporção em junho e julho de

2007 e, entre dezembro de 2007 e março de 2008. Os períodos de liberação foram pouco

registrados nas fêmeas, entretanto mais concentrados nas épocas de maturação (outubro e

Figura 4. Nassarius vibex. Freqüência relativa dos estágios de maturação dos folículos ovarianos das populações do Camaroeiro (A) e da Cidade (B), incluindo o número de indivíduos examinados por mês.

111

novembro de 2007). Após estes meses, fêmeas em recuperação e crescimento são mais comuns,

novamente indicando o início de uma nova época reprodutiva para esta população.

As fêmeas de N. vibex possuem maturação preferencial no inverno e primavera (julho-

novembro) e, apesar de pouco observado, a época de liberação dos gametas deve estar

relacionado a estes períodos. Além disso, a população do Camaroeiro apresentou um segundo

pico de maturação gametogênica no verão (fevereiro) de menor proporção, comparado ao

primeiro pico. Devido à grande heterogeneidade gametogênica dos indivíduos, a espécie

aparenta estar pronta para reprodução independentemente da época do ano.

Ciclo espermatogênico

Assim como nas fêmeas de N. vibex, não foram verificadas diferenças nos tamanhos dos

indivíduos para cada estágio em cada banco (Tabela 3). No entanto, comparações entre as

populações demonstraram que os indivíduos do Camaroeiro foram maiores do que os da Cidade.

No Camaroeiro, folículos espermáticos ocorreram inicialmente em março, com pico em

abril e maio de 2006, com pré-maturação registrada desde fevereiro de 2006 até agosto de 2006,

e entre novembro e dezembro de 2006 (Fig. 5A). A maior proporção de indivíduos maduros foi

registrada em fevereiro de 2006, entretanto a partir de junho de 2006, pequenas quantidades de

machos maduros foram observadas até março de 2007. O estágio mais freqüente em machos foi

o de liberação, registrado em quase todos os meses, mas concentrado nos períodos posteriores a

Estágio Comprimento Largura Altura No machos Camaroeiro Recuperação 17,49 ± 0,30 10,60 ± 0,77 8,16 ± 0,63 3 Crescimento 16,95 ± 1,06 10,23 ± 0,68 8,23 ± 0,43 20 Pré-maduro 17,54 ± 1,35 10,57 ± 0,71 8,65 ± 0,54 23 Maduro 17,61 ± 0,87 10,43 ± 0,69 8,62 ± 0,54 25 Liberação 17,76 ± 0,83 10,56 ± 0,51 8,68 ± 0,40 30 Vazio - - - 0 Cidade Recuperação 17,59 ±0,56 9,59 ± 0,39 8,54 ± 0,30 7 Crescimento 17,40 ± 0,94 9,67 ± 0,73 8,42 ± 0,42 14 Pré-maduro 17,56 ± 0,90 9,52 ± 0,62 8,13 ± 0,39 10 Maduro 17,54 ± 0,51 9,58 ± 0,73 8,47 ± 0,33 9 Liberação 17,36 ± 0,88 9,31 ± 0,57 8,18 ± 0,27 18 Vazio 18,00 9,27 8,59 1

Tabela 3. Nassarius vibex. Tamanho médio ± desvio padrão e número total de machos para cada estágio de maturação identificado nos bancos do Camaroeiro e da Cidade.

112

maturação em março de 2006, entre julho e outubro de 2006, e em fevereiro e março de 2007.

Machos em recuperação foram observados no início de 2006, após a liberação em março de

2007. A partir de novembro de 2006 ocorre o início de nova época reprodutiva com o registro

dos primeiros indivíduos em crescimento, alcançando picos de freqüência em janeiro e março de

2007 (Fig. 5A).

A população de machos do banco da Cidade teve, em alguns momentos, padrão

reprodutivo similar ao Camaroeiro, no entanto devido ao baixo número de indivíduos, algumas

Figura 5. Nassarius vibex. Freqüência relativa dos estágios de maturação dos folículos espermáticos das populações do Camaroeiro (A) e da Cidade (B), incluindo o número de indivíduos examinados por mês. .

113

fases podem não ter sido observadas. O padrão do crescimento folicular em abril e maio de 2007

se assemelha com o observado no Camaroeiro (Fig. 5B). Indivíduos em estágio de pré-maturação

foram registrados em abril e maio de 2007, e em novembro e dezembro de 2007, e março de

2008. Machos maduros foram escassos nesta população, observados em junho, agosto, outubro e

novembro de 2007, e em fevereiro e março de 2008 (Fig. 5B). A liberação dos gametas foi

freqüentemente registrada ao longo dos meses, com picos em setembro de 2007 e entre janeiro e

março de 2008 (Fig. 5B). Neste banco, houve maior quantidade de machos em recuperação, e

assim como na população do Camaroeiro, segue padrão de freqüência após períodos de

maturação e liberação. Indivíduos com folículos espermáticos vazios (fevereiro de 2008) foram

registrados apenas no banco da Cidade.

O ciclo gametogênico em machos de N. vibex aparenta acompanhar o padrão em fêmeas,

com pequenas discrepâncias. Tanto o crescimento como a pré-maturação dos folículos

espermáticos ocorrem em paralelo com as fêmeas (Figs. 2 e 3). Entretanto, machos maduros

foram pouco observados nas duas populações. O período de liberação dos gametas está sempre

adiantado em relação a maturação sexual nas fêmeas, em pelo menos um mês.

Com relação a comparação da maturação gametogênica e a temperatura da água, foi

possível notar que tanto nos períodos com maiores temperaturas (fevereiro e março) como nos de

menores (junho a setembro) houve picos de indivíduos em maturação (fêmeas) e liberação

(machos). O que indica que não houve uma relação direta entre a variação na temperatura da

água e a maturação gametogênica de N. vibex. Apesar destas diferenças, os períodos de

maturação e liberação mais prolongados ocorreram no inverno.

DISCUSSÃO

Razão sexual

A razão sexual nas duas populações de Nassarius vibex foi desviada a favor das fêmeas

(Camaroeiro: 1,63:1 e Cidade: 2,98:1). Para N. festivus, o resultado foi significativo na relação

fêmea/macho para três localidades de Hong Kong, com diferentes valores entre as áreas (CHAN

& M ORTON, 2005). Os autores observaram razões de 1,23:1, 1,49:1 e 2,43:1. KOBAYASHI e

WADA (2004) registraram maior número de fêmeas em relação a machos (1,76:1) em Iravadia

114

sakaguchii (KURODA & HABE, 1954). Outras espécies apresentam populações com razões

sexuais desviadas a favor dos machos como em Plicopurpura pansa (Gould, 1853) (NAEGEL &

GARCIÁ-DOMÍNGUEZ, 2006) e Scutellastra flexuosa (Quoy & Gaimar, 1834) (LINDBERG, 2007).

ILANO et al. (2003) e CHUNG et al. (2002) não encontraram diferenças entre o número de fêmeas

e machos para B. isaotakii e Rapana venosa (Valenciennes, 1846), respectivamente.

FISHER (1930) sugeriu que o total do investimento parental na produção da prole para

cada sexo deve ser igual ao final do período do cuidado parental. Caso ambos os sexos tenham o

mesmo custo, isto deve levar a uma razão sexual de 1:1 dentro da população (CHAN & MORTON,

2005). Além disso, condições reprodutivas favoráveis beneficiariam a aproximação da razão em

1:1 (TORRES & DRUMMOND, 1999). Entretanto, caso exista uma diferença no custo, é esperada

uma maior produção do sexo menos custoso (MAYNARD-SMITH , 1980; CHARNOV, 1982). Assim

como em N. festivus, o desvio nas proporções de fêmeas de N. vibex podem representar

incoerências nas expectativas Fisherianas e seriam reflexos de variações nas condições

ambientais ou ecológicas (TRIVERS & W ILLARD , 1973; CHARNOV, 1982; FRANK, 1990;

KOMDEUR et al., 1997). CHAN e MORTON (2005) relacionaram as diferentes condições

ambientais, entre três locais, com os contrastes nas razões sexuais em N. festivus, e observaram

que o local com maiores hidrodinamismo e quantidade de matéria orgânica foi o que apresentou

maior desvio em favor das fêmeas.

A razão sexual em N. vibex variou ao longo do tempo para as duas áreas estudadas. No

Camaroeiro, as maiores freqüências de fêmeas foram observadas entre junho e agosto de 2006 e

em outubro de 2006, enquanto na Cidade entre julho e dezembro de 2007. Portanto, as maiores

discrepâncias na razão sexual foram registradas do inverno à primavera. POWER e KEEGAN

(2001) observaram variação no número de fêmeas e machos em Neptunea antiqua (Linnaeus,

1758) ao longo do ano, com dominância notável de pequenos machos em março de 1998, o que

coincidiu com a época da liberação das desovas. Isto pode ser reflexo da diminuição da

alimentação, no início da época de acasalamento ou da migração das fêmeas maturas para

deposição das cápsulas ovígeras (KIDEYS et al., 1993). No estudo de ILANO et al. (2003), as

poucas fêmeas de B. isaotakii coincidiram com os períodos de deposição de cápsulas. No

presente estudo, os períodos com maiores freqüências de fêmeas coincidem com grandes

115

quantidades de indivíduos em processo de maturação e liberação. Além disso, também há

coincidência com os picos de deposição das cápsulas ovígeras por N. vibex (Capítulo 2).

Variação morfométrica

Muitas das espécies dióicas de prosobrânquios apresentam dimorfismo sexual no

tamanho ou na forma da concha (WEBBER, 1977). No presente estudo, foram verificadas

diferenças significativas nos tamanho da concha de machos e fêmeas de N. vibex, sendo as

fêmeas maiores do que os machos em ambos os bancos. CHAN e MORTON (2005) não

observaram diferença significativa no comprimento da concha entre fêmeas e machos de N.

festivus. Por outro lado, na população de Nassarius pauperatus (Lamarck, 1822) do sul da

Austrália, o comprimento da concha de machos foi maior do que das fêmeas (MCKILLUP &

BUTLER, 1979).

O tamanho dos indivíduos maduros foi invertido entre as espécies Assiminea japonica

von Martens,1877 e Angustassiminea castanea Westerlund, 1883 (KURATA & K IKUCHI, 2000).

As fêmeas de A. japonica foram maiores que os machos, enquanto que o contrário ocorreu em A.

castanea. Os autores explicaram que tais diferenças foram causadas por crescimento diferencial

para cada sexo durante os primeiros estágios de vida. A maturidade sexual no gastrópode

Adelomelon brasiliana (Lamarck, 1811) ocorre em maiores tamanhos nas fêmeas do que em

machos (CLEDÓN et al., 2008). Os autores não observaram diferenças na taxa de crescimento

entre os sexos e, neste caso, admitiram que o dimorfismo foi conseqüência do longo tempo no

desenvolvimento gametogênico das fêmeas. Seleção desviada para aumento de fecundidade em

fêmeas foi proposto por SON e HUGHES (2000) para explicar o dimorfismo sexual observado em

16 diferentes populações de Nucella lapillus (Linnaeus, 1758) ao longo da costa da Grã-

Bretanha.

COB et al. (2008), analisando diferenças no tamanho entre machos e fêmeas de Strombus

canarium Linnaeus 1758, observaram que machos são menores que fêmeas, mas não registraram

diferenças significativas. Os autores sugerem que fêmeas, por alocarem mais recursos na

produção somática e gonadal comparada aos machos, possuem maior relação comprimento-peso

corporal e, conseqüentemente, tamanhos maiores. Apesar do baixo número de indivíduos

116

utilizados na avaliação do dimorfismo sexual de N. vibex, é possível observar a influência do

maior investimento somático e gonadal no maior desenvolvimento da concha, justificando o

maior tamanho apresentado pelas fêmeas.

Ciclo reprodutivo

Dois períodos reprodutivos anuais foram registrados nas populações de N. vibex. No

banco do Camaroeiro a maturidade sexual ocorreu no verão de 2006, no inverno e no início da

primavera de 2006, e no verão de 2007. A liberação de gametas nesta área foi observada no final

do verão e início do outono de 2006, durante o inverno e a primavera de 2006, e no final do

verão e início do outono de 2007. O banco da Cidade apresentou padrão semelhante com

maturação registrada no outono de 2007, no inverno e primavera de 2007, e no verão de 2008.

Estágios de liberação foram observados no outono de 2007, no inverno e primavera de 2007 e no

verão de 2008. Em N. vibex observa-se um ciclo extremamente dinâmico com rápida renovação

gametogênica, assim como observado em três populações de Turbo torquatus Gmelin, 1791 por

WARD e DAVIS (2002) em New South Wales (Austrália). Esta espécie teve períodos conjuntos de

maturação/liberação no outono-inverno de 1996 e na primavera-verão de 1996. Comparando os

períodos reprodutivos de Hydrobia ulvae (Pennant, 1777) ao longo de um gradiente latitudinal,

SOLA (1996) observou dois padrões. Populações da Dinamarca e Ilhas Britânicas apresentaram

um curto período de liberação na primavera enquanto populações estudadas na França e Espanha

tiveram ciclos bianuais com maturação e liberação ocorrendo no final do inverno/início da

primavera e, entre o verão e o outono. Reprodução bianual também foi verificada para Helcion

pruinosus (Krauss, 1848), da África do Sul, a qual tem principal época reprodutiva no verão,

com segundo evento de liberação de menor proporção no inverno (HENNINGER & HODGSON,

2001). Outros registros de ciclos reprodutivos bianuais também foram feitos para Umbonium

costatum (Kierner, 1858) no Japão (NODA et al., 1995) e Astrea undosa (Wood, 1828) no

México (BELMAR-PEREZ et al., 1993).

Grande parte dos moluscos marinhos possui periodicidade anual no desenvolvimento

gametogênico, apresentando mudanças cíclicas no desenvolvimento de células germinativas

durante o ciclo reprodutivo (CHUNG et al., 1993; CHUNG, & RYOU, 2000). Para várias famílias de

117

gastrópodes, o padrão comum é a existência de uma única época reprodutiva ao longo do ano

(ver lista em WARD & DAVIS, 2002). Em Nassariidae, este padrão foi observado nas espécies N.

festivus (CHAN & MORTON, 2005) e N. reticulatus (BARROSO & MOREIRA, 1998). Em N.

festivus, a maturação inicia no outono e atinge ápice no inverno, com liberação ocorrendo

durante a primavera. BARROSO e MOREIRA (1998) observaram maturidade sexual para N.

reticulatus no inverno e conseqüente liberação de gametas entre a primavera e o verão. Em

outros estudos para esta espécie foi observada liberação de gametas com início em maio na baía

de Kvarnbukten, costa oeste da Suécia (TALLMARK , 1980); em abril no lago Grevelingen, na

costa sudeste da Holanda (LAMBECK, 1984); e entre maio e julho na ilha de Cumbrae, na Escócia

(BARNETT et al., 1980). Nassarius tiarula (Kiener, 1841) teve liberação de gametas registrada

entre abril e junho por HOUSTON (1978) e Bullia digitalis (Dillwyn, 1817) entre julho e janeiro

por SILVA & BROWN (1985). Já em Nassa dorsata (Roding) foi verificada liberação de gametas

entre janeiro e maio (KASINATHAN et al., 1974).

Outras espécies como R. venosa também apresenta maturidade no verão e liberação de

seus gametas no inverno (CHUNG et al., 2002). Buccinum isaotakii, da baía de Funka (Japão)

possui maturação no outono e inverno com liberação e deposição de cápsulas ovígeras durante a

primavera e o verão (ILANO et al., 2003). Entretanto, espécies como Haliotis asinina Linnaeus,

1758 possuem um ciclo reprodutivo assincrônico, no qual não há período definido para a

liberação de gametas, podendo ocorrer ao longo de todo o ano (CAPINPIN et al., 1998). Esta

espécie não libera gametas somente durante o verão, quando suas gônadas se encontram em

estágio de recuperação. O mesmo padrão também foi observado por HAHN (1993) em Trochus

niloticus Linnaeus, 1767 na qual cada estágio gametogênico está sempre presente na população.

Apesar da população de N. vibex ter diferentes estágios reprodutivos ao longo do ano, é possível,

ao contrário das espécies mencionadas anteriormente, reconhecer dois períodos bem definidos de

maturação e liberação de gametas.

A temperatura é um dos fatores mais importantes no controle da reprodução de moluscos

em geral (NEWMAN, 1967). Além de estimular a liberação de gametas, mudanças na temperatura

também tem participação ativa na maturação (UKI & K IKUCHI, 1984; HAHN, 1994). Em

gastrópodos prosobrânquios, além deste fator, o desenvolvimento e a maturação gametogênica

118

são geralmente influenciados pela disponibilidade de alimento, duração do dia e hormônios

(BOOLOOTIAN et al., 1962; FRETTER, 1984). Em R. venosa, a gametogênese está relacionada com

a variação na temperatura e na disponibilidade de alimento (CHUNG et al., 2002). Crepidula

argentina Simone, Pastorino & Penchaszadeh, 2000 só apresenta início da maturação com o

aumento da temperatura da água durante o verão entre agosto e abril (CLEDÓN &

PENCHASZADEH, 2001). TALLMARK (1980) afirma que a temperatura é o gatilho para o início da

liberação dos gametas em N. reticulatus com valores entre 10 e 12 °C na Suécia. Entretanto,

tanto BARNETT (1972) e LAMBECK (1984) registraram liberações iniciadas com menores

temperaturas para populações da Escócia e Holanda, respectivamente. A reprodução bianual de

N. vibex não indica um relacionamento entre os períodos reprodutivos e a temperatura da água,

pois foram observados episódios de liberação no verão e no inverno. Portanto, outros fatores

devem ser responsáveis pelo início da maturação gametogênica em N. vibex, e conseqüente

liberação. O fato desses gastrópodes utilizarem as frondes das algas Ulvae lactuca Linnaeus

1753 como substrato para deposição das cápsulas ovígeras pode ser um deles. Foram observados,

nos dois bancos, dois picos de abundância de desovas, no verão-outono e no inverno-primavera.

Portanto, N. vibex pode ter ajustado seu ciclo reprodutivo ao ciclo de desenvolvimento das algas,

conseguindo realizar uma reprodução bianual e aumentando dessa forma as chances de

sobrevivência de suas larvas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As populações de Nassarius vibex apresentaram razão sexual desviada a favor das fêmeas

e dimorfismo sexual com diferenças nos tamanhos entre os sexos. Seleção favorável a fêmeas e

diferenças no crescimento de cada sexo, são fatores a serem considerados para explicar as

diferenças observadas. O ciclo reprodutivo foi caracterizado como bianual composto por dois

períodos de maturação e liberação de gametas ao longo do ano. A maturidade gametogênica é

atingida normalmente no verão e inverno com liberação concentrada no outono e primavera.

Portanto, não há relação entre a variação sazonal da temperatura da água e os períodos

reprodutivos de N. vibex. O ciclo reprodutivo de N. vibex está relacionado com o substrato

utilizado para deposição de cápsulas ovígeras, a alga U. lactuca, a qual apresentou dois períodos

119

de desenvolvimento no ano, compatíveis com as épocas de reprodução de N. vibex. As

características dos bancos de mitilídeos também devem ter contribuído para o padrão reprodutivo

observado em N. vibex.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Barnett, P.R.O. 1972. Effects of warm water effluents from power stations on marine life. P. R. Soc. B, 180: 497-509.

Barnett, P.R.O.; Hardy, B.L.S. & Watson, J. 1980. Substratum selection and egg-capsule deposition in Nassarius reticulatus (L.). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 45: 95-103.

Barroso, C.M. & Moreira, M.H. 1998. Reproductive cycle of Nassarius reticulatus in the Ria de Aveiro, Portugal: Implications for imposex studies. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 78: 1233-1246.

Belmar-Perez, J.; Guzmán del Próo, S.A. & Martinez-Morales, I. 1993. Gonadic maturity and reproductive cycle of wavy turban snail (Astrea undosa Wood, 1828; Gastropoda: Turbinidae) in Bahai Tortugas, BCS. An. Inst. Cienc. del mar y Limnol. Univ. Nal. Autón. México, 18: 169-187.

Boolotian, R.A.; Farmanfarmaina, A. & Giese, A.C. 1962. On the reproductive cycle and breeding habits of two western species of Haliotis. Biol. Bull., 122: 183-192.

Brown, A.C. 1982. The biology of sandy-beach whelks of the genus Bullia (Nassariidae). Oceanogr. Mar. Biol. Annu. Rev., 20: 309-361.

Capinpin, E.C.J.; Encena II, V.C. & Bayona, N.C. 1998. Studies on the reproductive biology of the Donkey’s ear abalone, Haliotis asinina Linne´. Aquaculture, 166: 141-150.

Chan, K. & Morton, B. 2005. The reproductive biology of Nassarius festivus (Powis, 1835) (Gastropoda: Nassariidae) in relation to seasonal changes in temperature and salinity in subtropical Hong Kong. Aqua. Ecol., 32: 213-228.

Chaparro, O.R.; Saldivia, C.L.; Pereda, S.V.; Segura, C.J.; Montiel, Y.A. & Collin, R. 2005. The reproductive cycle and development of Crepipatella fecunda (Gastropoda: Calyptraeidae) from southern Chile. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 85: 157-161.

Charnov, E. 1982. The Theory of Sex Allocation. Princeton University Press, Princeton.

Chung, E.-Y.; Kim, S.-Y. & Kim, Y.G., 1993. Reproductive ecology of the purple shell, Rapana venosa (Gastropoda: Muricidae), with special reference to reproductive cycle, deposition of egg capsules and hatching of larvae. Korean J. Malacol., 9: 1-15.

Chung, E.-Y.; Kim, S.-Y.; Park, K.H. & Park, G.-M. 2002. Sexual maturation, spawning, and deposition of the egg capsules of the female purple shell, Rapana venosa (Gastropoda: Muricidae). Malacologia, 44: 241-257.

Chung, E.-Y. & Ryou, D.K. 2000. Gametogenesis and sexual maturation of the surf clam Mactra veneriformis on the west coast of Korea. Malacologia, 42:149-163.

Cledón, M.; Arntz, W. & Penchaszadeh, P.E. 2008. Size and age at sexual maturity in Adelomelon brasiliana (Neogastropoda: Volutidae) off Argentina. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 88: 169-173.

Cledón, M. & Penchaszadeh, P.E. 2001. Reproduction and brooding of Crepidula argentina, Simone, Pastorino and Penchaszadeh, 2000 (Gastropoda: Calyptraeidae). The Nautilus, 115: 15-21.

Cob, Z.C.; Arshad, A.; Idris, M.H.; Bujang, J.S. & Ghaffar, M.A. 2008. Sexual polymorphism in a population of Strombus canarium Linnaeus, 1758 (Mollusca: Gastropoda) at Merambong Shoal, Malaysia. Zool. Stud., 47: 318-325.

Demaintenon, M.J. 2001a. Analysis of reproductive system ontogeny and homology in Nassarius vibex (Gastropoda: Buccinidae: Nassariinae). J. Mollus. Stud., 67: 37-49.

120

Demaintenon, M.J. 2001b. Ontogeny of the pseudohermaphroditic reproductive system in Nassarius vibex (Gastropoda: Buccinidae: Nassariinae). J. Mollus. Stud., 67: 51-57.

Fisher, R.A. 1930. The Genetical Theory of Natural Selection. Clarendon Press, Oxford.

Frank, S.A. 1990. Sex allocation theory for birds and mammals. Ann. Rev. Ecol. Syst., 21: 13-55.

Fretter, V. 1984. Prosobranchs. In: The Mollusca Vol. 7 (Tompa, A.S.; Verdonk, H. & Van Den Biggelaar, J.A.M., eds), pp. 1-45. Academic Press, New York.

Hahn, K.O. 1993. The reproductive cycle of the tropical top shell, Trochus niloticus in French Polynesia. Invert. Reprod. Dev., 24: 143-156.

Hahn, K.O. 1994. Gametogenic cycle of the Japanese abalone (ezoawabi), Haliotis discus hannai, during conditioning with effective accumulative temperature. Aquaculture, 122: 227-236.

Hendler, G. 1991. Ophiuroidea. In: Reproduction of Marine Invertebrates, Vol. 6 (Giese, A.C.; Pearse, A.C. & Pearse, V.B. eds), pp. 355-483. Boxwood Press, Pacific Grove.

Henninger, T.O. & Hodgson, A.N. 2001. The reproductive cycle of Helcion pruinosus (Patellogastropoda) on two South African boulder shores. J. Mollus. Stud., 67: 385-394.

Houston, R.S. 1978. Notes on the spawning and egg capsules of two prosobranch gastropods: Nassarius tiarula (Kiener, 1841) and Solenosteira macrospira (Berry, 1957). Veliger, 20: 367-368.

Ilano, A.S.; Fujinaga, K. & Nakao, S. 2003. Reproductive cycle and size at sexual maturity of the commercial whelk Buccinum isaotakii in Funka Bay, Hokkaido, Japan. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 83: 1287-1294.

Ito, A. & Wada, S. 2006. Intrasexual copulation and mate discrimination in a population of Nodilittorina radiata (Gastropoda: Littorinidae). J. Ethol., 24: 45-49.

Kasinathan, R.; Govidan, K. & Natarajan, R. 1974. Notes on the spawning and hatching of three species of marine gastropods. Mal. Rev., 7: 133-135.

Kideys, A.E.; Nash, R.D.M. & Hartnoll, R.G. 1993. Reproductive cycle and energetic cost of the reproduction of the neogastropod Buccinum undatum in the Irish Sea. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 73: 391-403.

Kobayashi, Y. & Wada, K. 2004. Growth, reproduction and recruitment of the endangered brackish water snail Iravadia (Fairbankia) sagakuchii (Gastropoda: Iraviidae). Molluscan Res., 24: 33-42.

Komdeur, J.; Daan, S.; Tinbergen, J. & Mateman, C. 1997. Extreme adaptive modification in sex ratio of the Seychelles warbler’s eggs. Nature, 385: 522-525.

Kurata, K. & Kikuchi, E. 2000. Comparisons of life-history traits and sexual dimorphism between Assiminea japonica and Augustassiminea castanea (Gastropoda: Assimineidae). J. Mollus. Stud., 66: 177-196.

Lambeck, R.H.D. 1984. Dynamics, migration and growth of Nassarius reticulatus (Mollusca, Prosobranchia) colonizing saline lake Grevelingen (SW Netherlands). Neth. J. Sea Res., 18: 395-417.

Lindberg, D.R. 2007. Reproduction, ecology, and evolution of the Indo-Pacific limpet Scutellastra flexuosa. Bull. Mar. Sci., 81: 219-234.

Maynard-Smith, J. 1980. A new theory of sexual investment. Behav. Ecol. Sociobiol., 7: 247-251.

McKillup, S.C. & Butler, A.J. 1979. Modification of egg production and packaging in response to food availability by Nassarius pauperatus. Oecologia, 43: 221-231.

Moran, A.L. 1997. Spawning and larval development of the black turban snail Tegula funebralis (Prosobranchia: Trochidae). Mar. Biol., 128: 107-114.

Morton, B. 1999. Competitive grazers and the predatory whelk Lepsiella flindersi (Gastropoda: Muricidae) structure a mussel bed (Xenostrobus pulex) on a southwest Australian shore. J. Mollus. Stud., 65: 435-452.

121

Naegel, L.C.A. & García-Domíngues, F.A. 2006. Reproductive cycle of the purple snail Plicopurpura pansa (Gould 1853) from two locations at Baja California Sur, Mexico. J. Shellfish Res., 25: 925-933.

Newman, G.G., 1967. Reproduction of the South African abalone, Haliotis midae. Invest. Rep. Div. Sea Fish. S. Afr., 64: 1-24.

Noda, T.; Nakao, S. & Goshima, S. 1995. Life history of the temperate subtidal gastropod Umbonium costatum. Mar. Biol., 122: 73-78.

Pechenik, J.A. 1978. Adaptations to intertidal development: studies on Nassarius obsoletus. Biol. Bull., 154: 282-291.

Power, A.J. & Keegan, B.F. 2001. Seasonal patterns in the reproductive activity of the red whelk, Neptunea antiqua (Mollusca: Prosobranchia) in the Irish Sea. J. Mar. Biol. Ass. U.K., 81: 243-250.

Ramón, M. & Amor, M.J. 2002. Reproductive cycle of Bolinus brandaris and penis and vaginal duct size variations in a population affected by imposex. J. Mar. Biol. Ass. U. K., 82: 435-442.

Scheltema, R.S. 1967. The relationship of temperature to the larval development of Nassarius obsoletus (Gastropoda). Biol. Bull., 132: 253-265.

Silva, F.M.da & Brown, A.C. 1985. Egg capsules and veligers of the whelk Bullia digitalis (Gastropoda: Nassariidae). Veliger, 28: 200-203.

Sola, C. 1996. Population dynamics, reproduction, growth and secondary production of the mud-snail Hydrobia ulvae (Pennant). J. Exp. Mar. Biol. Ecol., 205: 49-62.

Son, M.H. & Hughes, R.N. 2000. Sexual dimorphism of Nucella lapillus (Gastropoda: Muricidae) in North Wales, UK. J. Mollus. Stud., 66: 489-498.

Tallmark, B. 1980. Population dynamics of Nassarius reticulatus (Gastropoda, Prosobranchia) in Gullmar fjord, Sweden. Mar. Ecol. Prog. Ser., 3: 51-62.

Torres, R. & Drummond, H. 1999. Variably male-biased sex ratio in a marine bird with females larger than males. Oecologia, 118: 16-22.

Trivers, R.L. & Willard, D.E. 1973. Natural selection of parental ability to vary the sex ratio of offspring. Science, 179: 90-92.

Uki, N. & Kikuchi, S. 1984. Regulation of maturation and spawning of an abalone, Haliotis (Gastropoda) by external environmental factors. Aquaculture, 39: 247-255.

Ward, D.W. & Davis, A.R. 2002. Reproduction of the turban shell Turbo torquatus Gmelin 1791 (Mollusca: Gastropoda), in New South Wales, Australia. Mar. Freshwater Res. 53: 85-91.

Webber, H.H. 1977. Gastropoda: Prosobranchia. In: Reproduction of marine invertebrates, vol. 4 (Giese, A.C. & Pearse, J.S., eds), pp. 1-95. Academic Press, New York.

122

Considerações gerais

O presente estudo apresentou novas informações sobre a biologia populacional e

reprodutiva do gastrópode Nassarius vibex (Say, 1822). A dinâmica populacional, o crescimento,

o recrutamento, a alometria, o ciclo reprodutivo e a deposição de cápsulas ovígeras foram

comparados entre duas populações desta espécie. Estas populações ocorreram associadas a

bancos do bivalve Mytella charruana, localizados no Litoral Norte do Estado de São Paulo.

Paralelamente, também foi realizada uma caracterização das condições ambientais dos bancos,

assim como uma avaliação da composição específica e abundância da fauna associada.

A diversidade da fauna de invertebrados associados aos dois bancos de M. charruana foi

caracterizada principalmente por Polychaeta, Crustacea, Mollusca e Nematoda. Entre esses, os

poliquetas foram os mais abundantes tanto na fauna de concha quanto na do substrato em ambos

os bancos. Dentre os moluscos encontrados associados aos bancos, N. vibex foi o mais

abundante.

As populações de N. vibex foram compostas por três coortes de adultos e quatro de

juvenis, recrutados em dois eventos ao longo do ano (Tabela 1). Apesar da grande quantidade de

coortes de juvenis, a estrutura populacional foi caracterizada por uma grande proporção de

adultos. A alta mortalidade juvenil atuando sobre o primeiro ano de vida deve ser o principal

fator na estruturação das populações de N. vibex. O padrão de crescimento da espécie foi

semelhante a outras espécies de regiões subtropicais e temperadas com crescimento lento e longa

expectativa de vida.

As populações de N. vibex apresentaram razão sexual desviada a favor das fêmeas e

dimorfismo sexual com diferenças nos tamanhos entre os sexos. Seleção favorável a fêmeas e

diferenças no crescimento de cada sexo são fatores a serem considerados para explicar as

diferenças observadas. O ciclo reprodutivo foi caracterizado como bianual, composto por pelo

menos dois períodos de maturação e liberação de gametas ao longo do ano (Tabela 1). A

maturidade gametogênica é atingida normalmente no verão e inverno com liberação concentrada

no outono e primavera. Não houve relação entre a variação sazonal da temperatura da água e os

períodos reprodutivos de N. vibex.

123

A alga verde U. lactuca, substrato utilizado para deposição de cápsulas ovígeras por N.

vibex, apresentou dois períodos de desenvolvimento durante o ano, compatíveis com as épocas

de reprodução do nassarídeo (inverno-primavera e verão-outono), totalmente condizente com seu

ciclo reprodutivo e padrão de recrutamento (Tabela 1). O desenvolvimento da alga deve ser o

fator chave para o início da deposição pelos gastrópodes, assim como seu crescimento e

reprodução.

Ficou evidente que a aplicação de um conjunto de modelos alométricos que assumam a

falta de normalidade nos dados e descontinuidades no expoente alométrico fornece resultados

mais confiáveis. A irregularidade no crescimento relativo das duas populações pode ser resultado

das oscilações nas taxas de crescimento populacional. Estas mudanças ao longo do

desenvolvimento ontogenético dos indivíduos podem ainda estar diretamente relacionadas a

eventos marcantes na história de vida da espécie como maturidade sexual e recrutamento. O

ciclo reprodutivo bianual, com dois períodos de deposição e recrutamento ao ano são fatores com

capacidade de promover os padrões observados no crescimento alométrico de N. vibex.

Levando em consideração os resultados apresentados no presente estudo, assim como a

ampla distribuição de N. vibex ao longo da costa oeste do Atlântico, é possível considerar esta

espécie para futuros estudos sobre a influência do gradiente latitudinal no crescimento de

gastrópodes.

Maturação Liberação Deposição Recrutamento P B

Banco Fêmas Machos Fêmeas Machos

Camaroeiro Fev-Mar Fev-Mar Mar Mar Abr-Ago Nov 0,35 0,9

Jul-Out Jun-Nov Ago-Set Jul-Out Out-Dez Abr-Mai

Cidade Mai Jun - Abr, Jun Jul-Ago Jan 3,6 7,98

Ago-Nov Ago, Nov-Dez Out-Nov Ago-Set Out-Dez Abr-Mai

Jan-Mar Mar - Jan-Mar Jan-Abr -

Ciclo reprodutivo: bianual Crescimento: lento e com alta longevidade Crescimento alométrico: irregular com constantes variações Estrutura populacional: 4 classes etárias

Taxa de mortalidade: 0,922 – 1,007

Tabela 1. Nassarius vibex. Resumo dos períodos de parâmetros populacionais e reprodutivos nos bancos do Camaroeiro e Cidade. A sequência de informação por parâmetro pode representar uma hipótese do desenvolvimento populacional. B: biomassa média anual (g PSCL m-2), P: produção secundária (g PSCL m-2 ano-1).