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Guia de Estudos Corte Internacional de Justiça: Caso Irã vs Estados Unidos Mesa: Ana Santo e Davi Fontoura

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Guia de Estudos

Corte Internacional de Justiça: Caso Irã vs Estados Unidos

Mesa: Ana Santo e Davi Fontoura

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Sumário Carta de Apresentação ............................................................ 3

O comitê ................................................................................. 4

Apresentação do tema ............................................................. 6

O Tratado de Amizade .......................................................... 12

A Atual Tensão ..................................................................... 15

Bibliografia ........................................................................... 18

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1. Carta de Apresentação

Queridos participantes,

É de imensa felicidade tê-los presentes na Corte Internacional de Justiça da V

SiNUCA. Durante os dias se simulação, vocês irão entrar na pele de verdadeiros promotores,

defensores e juízes, e, dessa forma, também vão compreender e imergir em uma realidade

totalmente diferente da nossa.

Ao longo de sua preparação, vocês perceberão que um comitê jurídico traz

diferenças notáveis dos demais: documentos, discursos e até mesmo a dinâmica. Porém, os

treinamentos em conjunto com uma análise apurada das regras especificas os deixarão mais

confortáveis.

Em primeiro lugar é – extremamente – necessário que vocês compreendam que

este Guia de Estudos é somente uma ideia geral sobre o caso Irã vs EUA. O devido

aprofundamento sobre acusação, defesa e posição dos magistrados é de responsabilidade

individual, sendo impresindível a leitura do Estatuto da Corte Internacional de Justiça e do

Tratado de Amizade de 1955.

Ademais, é importante que vocês entendam que toda a organização –

principalmente os diretores e secretários acadêmicos do seu comitê – estará disposta a sanar

todas as eventuais dúvidas. Portanto, se existir necessidade, é altamente aconselhável que o

contato seja feito.

Desejamos a todos uma magnifica simulação.

Sejam bem-vindos à V SiNUCA e à Corte Internacional de Justiça.

Ana Luiza Santo

Davi Fontoura

Letícia Thurler

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2. O comitê

2.1 Origem

A Corte Internacional de Justiça faz parte da

Organização das Nações Unidas. Assim sendo, é

imprescindível entender a origem da ONU para se

entender o surgimento da Corte.

Essa organização nasceu em 1945, após o

término da Segunda Guerra Mundial, com o objetivo de manter a paz mundial e a cooperação

por meio da diplomacia. Esse e outros princípios estão escritos na Carta das Nações Unidas,

documento que estabeleceu a Organização. Ele deixa claro que os principais objetivos da

ONU são a proteção dos direitos humanos, suporte humanitário, a promoção do

desenvolvimento sustentável e a manutenção da lei internacional.

A CIJ é o principal órgão judiciário da ONU. Ele foi estabelecido em 1945 pelo seguinte

artigo da Carta das Nações Unidas:

“Artigo 7. 1. Ficam estabelecidos como órgãos principais das Nações

Unidas: uma Assembléia Geral, um Conselho de Segurança, um Conselho

Econômico e Social, um conselho de Tutela, uma Corte Internacional de

Justiça e um Secretariado.”

O órgão jurídico passou a funcionar em 1946, tendo como sede o Palácio da Paz em Haia,

na Holanda.

2.2 Funcionamento

A função da Corte é a manutenção do direito internacional. Para isso, ela soluciona

disputas legais submetidas por Estados e também apresenta parecer consultivo sobre questões

que envolvem o direito para outros órgãos da ONU. É importante ressaltar que a diferença

entre a Corte Internacional de Justiça e o Tribunal Penal Internacional é que a Corte julga

Estados e o Tribunal, indivíduos.

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O Capítulo XIV da Carta das Nações Unidas estabelece que:

“Artigo 92. A Corte Internacional de Justiça será o principal órgão

judiciário das Nações Unidas. Funcionará de acordo com o Estatuto anexo,

que é baseado no Estatuto da Corte Permanente de Justiça Internacional e faz

parte integrante da presente Carta.

Artigo 93. 1. Todos os Membros das Nações Unidas são ipso facto

partes do Estatuto da Corte Internacional de Justiça.

2. Um Estado que não for Membro das Nações Unidas poderá tornar-

se parte no Estatuto da Corte Internacional de Justiça, em condições que

serão determinadas, em cada caso, pela Assembléia Geral, mediante

recomendação do Conselho de Segurança.

Artigo 94. 1. Cada Membro das Nações Unidas se compromete a

conformarse com a decisão da Corte Internacional de Justiça em qualquer

caso em que for parte.

2. Se uma das partes num caso deixar de cumprir as obrigações que

lhe incumbem em virtude de sentença proferida pela Corte, a outra terá

direito de recorrer ao Conselho de Segurança que poderá, se julgar

necessário, fazer recomendações ou decidir sobre medidas a serem tomadas

para o cumprimento da sentença.

Artigo 95. Nada na presente Carta impedirá os Membros das Nações

Unidas de confiarem a solução de suas divergências a outros tribunais, em

virtude de acordos já vigentes ou que possam ser concluídos no futuro.

Artigo 96. 1. A Assembléia Geral ou o Conselho de Segurança poderá

solicitar parecer consultivo da Corte Internacional de Justiça, sobre qualquer

questão de ordem jurídica.

2. Outros órgãos das Nações Unidas e entidades especializadas, que

forem em qualquer época devidamente autorizados pela Assembléia Geral,

poderão também solicitar pareceres consultivos da Corte sobre questões

jurídicas surgidas dentro da esfera de suas atividades.”

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A Corte é formada por magistrados que são eleitos para um mandato de nove anos pela

Assembleia Geral e pelo Conselho de Segurança. Cada magistrado representa um país.

Seu funcionamento é regido pelo Estatuto da Corte Internacional de Justiça. Ele estabelece

que o órgão tem competência para qualquer assunto que as partes reconhecidas por ele lhe

estabeleçam, como questões citadas na Carta da ONU ou em tratados e convenções em vigor.

Portanto, os magistrados devem julgar de acordo com os tratados e/ou convenções vigentes a

respeito da questão submetida por uma das partes.

No direito internacional existe um princípio fundamental, que é conhecido por

responsabilidade dos Estados, ele define que “toda vez que um Estado comete um ato

internacional ilícito contra outro Estado, cria-se responsabilidade internacional entre os dois”

(SHAW, 2010, p. 572). Para que haja essa responsabilidade, primeiro é necessário que haja

um tratado vigente e segundo “um ato ou omissão que viole essa obrigação e seja atribuído ao

“Estado responsável”; e “que tenha resultado perda ou dano desse ato ou omissão ilegal”

(SHAW, 2010, p.574).

3. Apresentação do tema

O tema deste comitê refere-se especificamente ao caso: República Islâmica do Irã v.

Estados Unidos da América. Porem ao se analisar o caso de forma mais ampla, é perceptível

que se trata sobre o Direito Internacional Público, isto é, o ramo do Direito destinado a

construir um eixo jurídico de orientação a todas as nações e organizações no âmbito

internacional, para dessa forma criar uma ordem e lei comum que regule todo o

comportamento que extrapole a soberania nacional.

Falando especificamente sobre o tema, o Irã alega a Corte que o governo americano

violou uma serie de artigos estabelecidos em um Tratado de amizade, relações econômicas e

direitos consulares que ambos os países assinaram em Teerã no ano de 1955, estas medidas

segundo o país estão gerando impactos sobre a capacidade do Irã e de suas empresas de

controlarem sua produção e mercado no exterior.

No entanto o governo de Washington tem uma visão diferente do processo, a

representante do departamento de estado norte-americana denuncia o uso de ‘má-fé’ pelo Irã e

alega que a volta das sanções foi uma questão de segurança nacional e diz que a CIJ não tem

jurisdição sobre o caso.

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Levando sempre em conta a defesa de cada país, suas relações diplomáticas, a situação

atual entre os governos e o contexto histórico, é dever desta casa analisar e julgar o caso com

imparcialidade perante os fatos apresentados e sempre respeitando o estatuto e a jurisdição

vigente da CIJ.

3.1 – Contexto Histórico e relação bilateral EUA-Irã

Até o final da Segunda Guerra Mundial Irã e EUA mantinham relações cordiais. Dessa

forma muitos iranianos simpatizantes da Revolução Constitucional Pérsia passaram a ver os

EUA como um possível aliado contra a dominação russa e britânica que havia no país.

O Xá Mohammad Reza Pahlavi manteve laços estreitos com os Estados Unidos durante a

maior parte de seu reinado, que durou de 1941 até ser derrubado pela Revolução Islâmica em

1979. Ele perseguiu uma ocidentalização, modernização da política econômica e uma política

externa fortemente pró-ocidental; ele também fez uma série de visitas aos Estados Unidos,

onde era considerado como um amigo.

A posição estratégica do Irã durante a Guerra Fria e o fato de ser o maior e mais rico país

em petróleo no Golfo Pérsico fez com que o Irã passasse a ser tratado como ‘pilar’ nas

relações exteriores americanas.

Tudo mudou com a Revolução Iraniana de 1979, que derrubou o regime monárquico pró-

Estados Unidos de Reza Pahlevi e substituiu-o pela república islâmica liderada pelo Aiatolá

Ruhollah Khomeini. A revolução surpreendeu o governo dos Estados Unidos, o seu

Departamento de Estado e os serviços de inteligência, que não acreditavam numa possível

revolução no Irã.

3.1.2 – Revolução iraniana

A então citada revolução islâmica teve inicio em 1978 e foi basicamente uma reação da

população iraniana a forma de governar do então Xá Reza Pahlavi, que de acordo com a

camada mais conservadora do Irã, era um corrupto que trabalha em favor dos interesses norte-

americanos.

Desde 1977 o Xá já vinha sofrendo fortes pressões e criticas pelas reformas propostas que

não agradavam a população muçulmana. Na área econômica ele adotou uma politica liberal

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que estimulava a entrada de capital estrangeiro no pais para a exploração do petróleo e na área

social ele promovia uma serie de hábitos ocidentais que foram vistos com extremo desgosto

pela camada conservadora islâmica. Estas medidas geraram grandes manifestações que

permaneceram nas ruas ate 1978.

A população iraniana descontente tomou as ruas e derrubou o regime do Xá Mohamed

Reza Pahlavi. Com o desenrolar da agitação o Xá fugiu para o exterior em janeiro de 1979.

Ainda em janeiro do mesmo ano o Aiatolá Ruhollah Khomeini voltou do exilio, assumiu a

liderança da revolução e declarou o Irã um Estado Islâmico - Republica Islâmica do Irã,

regida pela Sharia (lei corânica) e caracterizando uma das únicas revoluções conservadoras do

mundo.

Com a criação do Estado Islâmico, o consumo de álcool foi proibido, os filmes ocidentais

foram banidos e as mulheres foram obrigadas a tapar seus rostos em publico. Esse retorno aos

costumes originais e a busca a fidelidade dos textos sagrados ficou conhecido com

fundamentalismo islâmico.

As medidas adotadas fortaleceram-se no Irã e buscavam expandir-se para outros países do

Oriente Médio, o que gerou reações tanto de países da região quanto de superpotências.

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3.2 – Sanções econômicas

As sanções econômicas são medidas apoiadas pela ONU e utilizadas como uma forma não

militar de punir países que ameacem a paz e a segurança mundial. As sanções internacionais

contra o Irã são para fazê-lo desistir de suas atividades nucleares, concentradas em setores-chave

(como defesa, petróleo, finanças), abaixo uma lista das principais sanções adotadas contra o país

desde a revolução de 1979:

• ONU

O Conselho de Segurança aprovou quatro séries de sanções.

- A resolução 1737 (23 de dezembro de 2006) prevê sanções econômicas e comerciais contra dez

entidades ligadas aos programas nuclear e de mísseis do Irã. Seus ativos e os de 12 personalidades

são congelados.

- A Resolução 1747 (24 de março de 2007) prevê o congelamento dos bens de 13 novas

entidades, um embargo sobre as compras de armas iranianas e restrições a empréstimos para o Irã.

- Resolução 1803 (Três de março de 2008) expande a lista de entidades e pessoas referidas e

proíbe o fornecimento ao Irã de bens de dupla utilização (civil e militar).

- Resolução 1929 (Nove de junho de 2010) limita ainda mais os investimentos iranianos, proíbe a

venda ao Irã de certas armas pesadas e expande a lista de pessoas e entidades sancionadas.

• Estados unidos

Em 14 de novembro de 1979, Washington congelou ativos iranianos em bancos americanos e

suas subsidiárias após a tomada de reféns na embaixada dos Estados Unidos em Teerã.

Um embargo econômico total é decretado em 1995, seguido em 1996 por sanções contra

empresas, independentemente da sua nacionalidade, que investem nos setores de petróleo e gás

iranianos. As sanções são regularmente modificadas:

- Em 2008, proíbe os bancos americanos de mediar o trânsito de fundos com o Irã.

- Em julho de 2010, uma lei atinge o abastecimento de gasolina ao Irã, em represália aos grupos

estrangeiros que investem no setor de petróleo iraniano.

- Em novembro de 2011, sanções mais duras contra aqueles que apoiam a indústria do petróleo no

Irã.

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- Em 31 de dezembro, congelamento dos bens de instituições financeiras estrangeiras que

comercializam com o Banco Central do Irã no setor de petróleo.

- 31 de julho de 2012, aumentam as sanções contra os setores de petróleo e petroquímico do Irã.

- 3 de junho de 2013, a indústria automotiva passa a ser alvo, assim como a moeda iraniana, o rial.

- 31 de julho de 2013, novas sanções aprovadas pela Câmara dos Deputados.

• União Europeia

- 26 de julho de 2010, a UE proíbe a assistência técnica e transferência de tecnologia para o

petróleo iraniano e aumenta a lista da ONU de personalidades proibidas de viajar.

- Em maio e dezembro de 2011, congelamento dos bens de 243 entidades iranianas e de quarenta

pessoas a mais, também proibidas de visto.

- 23 de janeiro de 2012, a UE impõe embargo petrolífero contra o Irã, que entra plenamente em

vigor em 1º de julho de 2012, e congela os bens do banco central iraniano.

- 15 de outubro de 2012, a UE proíbe transações entre bancos europeus e iranianos, com eventuais

exceções, e coloca na lista negra o ministro iraniano da Energia e 34 administrações e empresas.

- 21 de dezembro de 2012, a UE estende a sua lista negra: no total 105 iranianos e 490 empresas

são sancionadas.

Todas essas sanções citadas acima serviram especialmente para sufocar a economia iraniana,

obrigando então o Irã a aceitar a negociação de um acordo nuclear com os EUA, em troca do

cancelamento das sanções americanas.

3.4 – Acordo nuclear

A desconfiança americana de que o Irã vem mantendo atividades nucleares como o

enriquecimento de uranio e plutônio para a construção de uma bomba atômica levou com que

em 14 de julho de 2015 depois de dois anos de negociações o Irã e os EUA assinassem um

acordo nuclear juntamente com as cinco maiores potencias mundiais (China, Rússia, França,

Reino Unido e Alemanha) com objetivo imediato de impedir durante pelo menos uma década

o acesso iraniano a uma possível bomba atômica, em troca de suspender as sanções

econômicas estadunidenses que vem sufocando o estado iraniano.

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3.4.1 – Saída de Trump e a retomada das sanções

O que poucos esperavam era que apenas dois anos após a assinatura do acordo nuclear, o

presidente Donald Trump anunciaria que os EUA estão oficialmente se retirando do acordo e

reimpondo as sanções sobre o Irã. A decisão polemica despertou os olhares do mundo para os

países que imediatamente começaram a trocar ameaças e o medo de uma guerra nuclear

voltou a assombrar a comunidade internacional.

A tensão estava de novo no ar, logo depois do anuncio da saída dos EUA do acordo

nuclear o Presidente Rohani alertou os EUA para ‘’não brincar com a cauda do leão’’ e

advertiu que uma possível guerra entre os países seria considerada ‘’a mãe de todas as

guerras’’, em reposta ao país persa Donald Trump deixou bem claro ao Irã nunca mais

ameaçar os EUA ou sofrerão consequências nunca vistas antes na historia.

Foi nesse contexto que em meio a severas sanções e agressões diplomáticas, o Irã em

julho de 2018 decidiu denunciar o EUA na Corte Internacional de Justiça de Haia por violar

um Tratado de amizade assinado em 1955 entre os países. As alegações feitas pelo Irã são de

que o Governo de Washington infringiu uma serie de artigos que definem as relações

econômicas e consulares entre as nações.

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4. O Tratado de Amizade

Um Tratado, ou convenção internacional, é um acordo resultante da convergência de

vontades e interesses entre dois ou mais estados nacionais, que é concretizado por meio de um

texto escrito, com o objetivo de causar efeitos jurídicos no cenário internacional.

É importante deixar claro as condições de validade para um tratado existir, estas

condições são:

• Capacidade das partes contratantes;

• Habilitação dos agentes signatários;

• Consentimento mutuo;

• Formalidade;

• Objeto licito possível;

Um Tratado pode ser considerado a fonte principal do direito internacional, já que o

mesmo exige o consentimento expresso das partes contratantes. Quando se fala sobre tratados

internacionais é sempre relevante se referir a Convenção de Viena sobre direito dos tratados

(CVDT) de 1969 que definiu o principio fundamental do direito dos tratados, que são o fato

do cumprimento obrigatório para ambas as partes além de deverem ser cultuados de boa-fé.

Levando em consideração os fatos e conceitos citados acima, é nesse contexto que

devemos analisar como o Irã avalia que os EUA violaram o tratado de amizade de 1955.

Tendo em vista as alegações constadas no texto apresentado a Corte em 2016, que deu origem

ao processamento do caso.

4.1 – Violações alegadas

No Artigo III (1) deste Tratado é declarado que as empresas de ambos os países devem ter

seu status jurídico reconhecido quando estiverem dentro do território da outra parte, ou seja,

do outro país. Sendo assim, para o Irã, seu Banco Central e todas as outras empresas iranianas

se encaixam como uma dessas empresas que deveriam ter esse status reconhecido. Portanto,

não deveria ter sido alvo de julgamento em cortes americanas. Segundo o estado iraniano,

estas ações feitas pelos Estados Unidos ameaçam estas empresas, e prejudicam o Banco

Central dado que houve um bloqueio de ativos deste banco por uma corte interna americana.

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“Artigo III

1. As sociedades constituídas de acordo com as leis e regulamentos aplicáveis de ambas as

Partes Contratantes devem ter seu status jurídico reconhecido nos territórios da outra

Alta Parte contratante. Conclui-se, no entanto, que o reconhecimento do estatuto jurídico

não confere, por si só, direitos às sociedades para se envolverem nas atividades para as

quais estão organizadas. Conforme usado no presente Tratado, “sociedades” (empresas)

significa corporações, parcerias, companhias e outras associações, com ou sem

responsabilidade limitada e com ou sem lucros pecuniários.”

Com base no Artigo III (2) do Tratado de Amizade, o Irã alega que os EUA violaram o

Tratado ao negar imunidade ao Banco Central iraniano e a outras empresas iranianas.

Violando também o direito delas de liberdade de acesso às cortes americanas para terem

capacidade de se defender.

“Artigo III

2. Os cidadãos e as sociedades da Alta Parte contratante terão liberdade de acesso aos

tribunais de justiça e às agências administrativas nos territórios da outra Alta Parte

contratante, em todos os graus de jurisdição, tanto na defesa como na prossecução dos

seus direitos, em vista de assegurar uma justiça rápida e imparcial. Esse acesso será

permitido, em qualquer caso, em termos não menos favoráveis do que os aplicáveis aos

cidadãos e sociedades da outra Parte contratante ou de qualquer país terceiro. Entende-

se que as sociedades que não exercem atividades no país devem gozar do direito de tal

acesso sem qualquer requisito de registro ou domesticação.”

Segundo o Irã, o Tratado também foi violado ao se analisar o Artigo IV (1), que diz que

as partes assinantes deveriam sempre tratar uns aos outros de maneira justa e equitativa, sendo

que isto se estenderia as empresas de ambos os Estados. Dessa maneira, o Irã alega que o

tratamento dado as suas empresas, incluindo o Banco Central, tem sido injusto e

discriminatório, impedindo de exercerem seus direitos adquiridos com o Tratado. Já no Artigo

IV (2), ficou definido que as propriedade e empresas de ambas as partes deveriam receber

total proteção e segurança quando em território do outro. O que o Irã alega é que,

especificamente o seu Banco Central não obteve tal proteção.

“Artigo IV

1. Cada Alta Parte contratante deverá, em todos os momentos, conceder um tratamento

justo e equitativo aos cidadãos e sociedades da outra Alta Parte contratante e aos seus

bens e empresas; deve abster-se de aplicar medidas arbitrárias ou discriminatórias que

prejudiquem os seus direitos e interesses legalmente adquiridos; e deve assegurar que

seus direitos contratuais legais sejam oferecidos meios efetivos de execução, de acordo

com as leis aplicáveis.

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2. A propriedade dos cidadãos e das sociedades da Alta Parte contratante, incluindo os

lucros na propriedade, deve receber constante proteção e segurança nos territórios da

outra Alta Parte contratante, em nenhum caso inferior ao exigido pelo Direito

Internacional. Essa propriedade não deve ser tomada, exceto para fins públicos, sem o

pagamento imediato da justa compensação. Essa compensação deve ser efetivamente

realizável e deve representar o equivalente total da propriedade realizada; disposições

adequadas devem ser feitas, no momento ou antes da despossessão, para a determinação

e pagamento do mesmo.”

Ademais, o Irã afirma que o tratamento dado ao Banco Central e a outras empresas

iranianas interfere no Artigo V (1) do Tratado de 55, uma vez que no artigo ficou explicitado

que as empresas de ambas as partes, quando instaladas em território do outro, deveriam ter a

permissão de comprar ou adquirir propriedades pessoais de qualquer tipo, e dispor de

qualquer que seja esta propriedade para poderem, por exemplo, vendê-la.

“Artigo V

1. Os cidadãos e as sociedades da Alta Parte contratante serão autorizados, nos territórios

da outra Alta Parte contratante: (a) arrendar, por períodos adequados de tempo, bens

imóveis necessários para a sua residência ou para a realização de atividades nos termos

do presente Tratado; (b) comprar ou de outra forma adquirir bens pessoais de todos os

tipos; e (c) alienar bens de todos os tipos por venda, testamento ou de outra forma. O

tratamento concedido nestes aspectos não deve, em caso algum, ser menos favorável do

que os cidadãos e as sociedades concedidos de qualquer país terceiro.”

Sobre o Artigo VII (1) do Tratado, declarou-se que nenhuma das partes contratantes

deveria impor restrições ao pagamento e às remessas de fundos que se destinam entre ambas

as partes do Tratado. Definiram-se como exceção os casos aprovados e solicitados de

pagamentos, por exemplo, pelo Fundo Monetário Internacional e/ou quando for para o

pagamento dos bens e serviços essenciais à saúde e bem estar da população (ICJ, p. 15-16,

s/d).

“Artigo VII

1. Nenhuma das Altas Partes contratantes aplicarão restrições à realização de pagamentos,

remessas e outras transferências de fundos para ou a partir dos territórios da outra Alta

Parte contratante, exceto (a) na medida necessária para garantir a disponibilidade de

divisas para pagamentos de bens e serviços essenciais para a saúde e bem-estar de sua

população, ou (b) no caso de um membro do Fundo Monetário Internacional, impor

restrições expressamente aprovadas.”

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Por fim, no Artigo X (1) é estabelecido que entre ambas as partes devessem ter liberdade

de comércio e navegação. Com isso, o Irã julga que o tratamento que ele, seu Banco Central e

outras empresas iranianas receberam conflita com o que se assegura sob o Artigo supracitado

(ICJ, p. 16, s/d). Portanto, o Irã pede que a Corte julgue o caso com o intuito de assegurar que

as imunidades das empresas iranianas sejam asseguradas no território estadunidense; que os

atos do legislativo estadunidense que implicam em imposições às empresas iranianas não

continuem, ou seja, que o status jurídico destas empresas seja respeitado; e que os EUA façam

as reparações necessárias de todas as violações cometidas em uma quantidade estipulada pela

Corte.

“Artigo. X

1.Entre os territórios das duas Partes Contratantes, deverá haver liberdade de comércio e

navegação.”

O Tratatado de Amizade de 1955 na íntegra e traduzido está disponibilizado no site da

SiNUCA.

5. A Atual Tensão

5.1 Prejuízos ao Irã

O Irã alega que houve desrespeito do Tratado da Amizade pelo Estados Unidos e que o

mesmo agiu de má fé. Isso porque, após Trump retirar os EUA do Tratado Nuclear, impôs

novas sanções ao país que causaram inúmeros prejuízos a sua população.

Em agosto de 2018, começaram a valer as sanções:

• À compra de dólar americano pelo governo do Irã.

• Ao comércio de ouro ou metais preciosos.

• À venda, fornecimento ou transferência direta e indireta de materiais como alumínio,

aço, carvão e softwares para integrar processos industriais.

• Às transações relacionadas à compra ou venda de riais (moeda iraniana), assim como a

manutenção de fundos ou contas bancárias com quantias altas de riais fora do território

iraniano.

• À compra ou facilitação da emissão da dívida soberana iraniana.

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• Ao setor automotivo do Irã.

Em novembro, houveram sanções:

• Aos operadores portuários no Irã e empresas ligadas aos setores de transporte e construção

naval.

• Às transações na área petrolífera com empresas como a National Iranian Oil Company

(NIOC), Naftiran Intertrade Company (NICO) e a National Iranian Tanker Company (NITC),

entre outras. Inclui não só a compra de petróleo, como a de produtos derivados e

petroquímicos.

• Às transações de instituições financeiras estrangeiras com o Banco Central do Irã e

instituições financeiras iranianas.

• À prestação de serviços de transferências financeiras para o Banco Central do Irã e instituições

financeiras iranianas.

• Para prestação de serviços de seguro.

• Ao setor de energia do Irã.

O Estado iraniano também diz que

essas sanções foram responsáveis pelo

aumento dos preços dos alimentos, alta nas

taxas de desemprego e falta d’água, o que

gerou protestos pela população iraniana

contra o seu governo. Tais levantes foram

os maiores no país em nove anos e

totalizaram mais de vinte mortos. O

governo diz que, se não fossem pelos

prejuízos causados pelo governo norte-americano, essas manifestações não teriam ocorrido e

a popularidade do presidente não teria sido tão abalada.

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5.1 Defesa estadunidense

O governo dos EUA alega que o Tratado de Amizade não tem mais validade, tendo em

vista que o Irã e o governo de Washington DC não tem mais relações diplomáticas desde os

anos 80, após a revolução iraniana. Não havendo, portanto, nenhuma das violações alegadas.

O Presidente Donald Trump ainda alegou que a acusação do Irã é um “abuso de direito”,.

É importante lembrar que, como citado nos primeiros capítulos desse guia, na Corte

Internacional de Justiça apenas Tratados vigentes podem ser levados em consideração durante

um julgamento. Porém, cabem aos magistrados da Corte determinar a vigência do Tratado de

Amizade de 1955.

Além disso, os Estados Unidos dizem que suas ações contra o governo iraniano foram

feitas para que o mesmo ‘abandone seu rumo revolucionário”, como alegou o Secretário de

Estado americano Mike Pompeo. Ele ainda reiterou que o Irã deve acabar com suas políticas

de raízes revolucionárias, que incluem o apoio a forças como a milícia islâmica Hezbollah e o

desenvolvimento de mísseis. "Estamos esperançosos de que um acordo com o Irã seja

possível, mas até que o Irã faça as 12 mudanças que pedimos em maio, seremos implacáveis

na pressão sobre o regime", disse Pompeo.

Portando, o Estado norte-americano diz que suas ações apenas contribuem para a

derrubada da “ditadura corrupta” iraniana e a defesa da democracia e da liberdade, pilares da

constituição estadunidense.

Page 18: Corte Internacional de Justiça: Caso Irã vs Estados Unidos€¦ · este Guia de Estudos é somente uma ideia geral sobre o caso Irã vs EUA. O devido aprofundamento sobre acusação,

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6. Bibliografia https://www.bbc.com/portuguese/noticias/030617_hardycs.shtml

https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2018/10/apos-corte-decidir-a-favor-do-ira-eua-

ameacam-deixar-pactos-internacionais.shtml

https://brasil.elpais.com/brasil/2018/05/09/internacional/1525851466_466217.html

https://nacoesunidas.org/nacoes-unidas-manifestam-preocupacao-com-saida-dos-eua-de-

acordo-nuclear-com-ira/

http://www.atimes.com/irans-look-east-policy-takes-wings/

https://brasil.elpais.com/brasil/2018/07/23/internacional/1532329460_108608.html

https://www.em.com.br/app/noticia/internacional/2018/08/30/interna_internacional,98476

2/eua-denunciam-ma-fe-do-ira-por-denuncia-na-cij.shtml

https://pt.wikipedia.org/wiki/San%C3%A7%C3%B5es_contra_o_Ir%C3%A3

https://www.ufrgs.br/nerint/wp-content/uploads/2015/09/ROBERTO-W-Acordo-Nuclear-

Ir%C3%A3.pdf

http://www.trt.net.tr/portuguese/mundo/2018/11/05/a-nova-rodada-de-sancoes-dos-eua-

contra-o-ira-entra-em-vigor-1081607