Estado foi alertado cinco o de tragédia Borba - ULisboa · 2018-11-22 · nifestação de...

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Estado foi alertado cinco vezes para o risco de tragédia em Borba Avisos Câmara e Direcção-Geral de Energia e Geologia ignoraram os sucessivos alertas sobre a iminência de um acidente na Estrada Nacional 255 Destaque, 2a6

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Estado foi alertado cinco vezespara o risco de tragédia em BorbaAvisos Câmara e Direcção-Geralde Energia e Geologia ignoraramos sucessivos alertas sobrea iminência de um acidentena Estrada Nacional 255

Destaque, 2a6

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TRAGÉDIA EM BORBA

Estado foi cinco

vezes aleitado parao perigo na EstradaNacional 255

As pedreiras jáexistiam antesda legislação queveio regular osector. E acabarampor ter licençasem cumpriressa legislação,nomeadamente noque diz respeitoà criação de umafaixa de segurançade 30 metros

Luísa Pinto

Hão

foi por falta de aviso. Oacidente que levou ao co-lapso da estrada municipalque liga Borba a Vila Viçosana segunda-feira à tarde foi

previsto, ou motivo de ma-

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nifestação de preocupações, pelomenos cinco vezes. Mas nenhumadelas foi suficiente para evitar que o

colapso fosse uma realidade e, piordo que isso, que o acidente acabasse

por fazer vítimas mortais. A Câmara

Municipal de Borba, a única entidadea quem competia a decisão final defechar a Estrada Nacional 255 nãoo fez. A Direcção-Geral de Energiae Geologia, que é responsável porreceber e aprovar os planos de lavradas pedreiras em actividade, tambémnão exerceu qualquer pressão defi-nitiva para que tal acontecesse. Mashã muitos mais envolvidos e muitosníveis de responsabilidade que po-dem ser questionados. E porventuraé isso que o somatório de inquéritose diligências de investigação que fo-ram anunciadas depois da tragédiapoderão vir a destapar.

O Ministério Público anuncioua abertura de um inquérito "paraapurar as circunstâncias" em queocorreu o acidente. O ministro daEconomia, Pedro Siza Vieira, tam-bém garantiu que iria ser aberto uminquérito ao sucedido, deixando esteaviso na mesma declaração em queapresentou as condolências às fa-mílias das vítimas. Marcelo Rebelode Sousa também quis ir ver com os

próprios olhos o que tinha aconte-cido, mas fez uma visita relâmpago(chegou às 13h33 e saiu um quartode hora depois) e sem direito a de-

clarações.A estrada em causa, a EN255 pas-

sou a ser municipal em 2005. E quan-do a Câmara de Borba a recebeu jáera uma estrada com uma pedreirade cada lado. De acordo com o Mi-nistério do Ambiente e da TransiçãoEnergética (MATE), que na última re-

modelação governamental passoua tutelar a DGEG, a pedreira que se

encontrava em actividade, a "OlivalGrande São Sebastião", foi licencia-da em Maio de 1989. E a Pedreira"Carrascal JS", que está inactiva,foi licenciada em Novembro desse

mesmo ano. Mas a existência delasé muito anterior a isso, como expli-cou ao PÚBLICO o actual presidentedo Colégio de Minas da Ordem dos

Engenheiros, Carlos Caxaria, que se

lembra de hã 30 anos, então técnicoda DGEG, perceber que foi a tutela

que mandou fazer as vedações e os

muros na estrada.A actividade nas pedreiras era en-

quadrada com apenas uma declara-

ção, em que se fazia prova da titula-ridade do terreno, e a actividade erapermitida. Foi com a publicação dodecreto-lei 227/82, de 14 de Junho,que estas passaram a ter de pediruma licença junto da tutela, na oca-sião a Direcção-Geral de Geologia eMinas (DGGM). Essa legislação im-punha que as pedreiras deveriamrespeitar uma zona de defesa (umamargem de segurança) de cerca de30 metros das estradas nacionais.As imagens mostram que essa zonade defesa estava muito longe de ser

cumprida. O mais provável, arrisca-se a adivinhar Carlos Caxaria, foi as

empresas terem "apresentado plan-tas de implantação que não corres-pondiam à realidade", para poderemobter o licenciamento. Caxaria dizque estava em causa "uma gestão do

passado", numa zona do país onde aactividade económica das pedreirasera essencial.

A intensa actividade de pedreiras éconfirmada pelo MATE, que diz quenos municípios de Borba, Estremoz eVila Viçosa há 180 pedreiras, que es-tão ora em laboração, em suspensão,em regularização, em recuperaçãopaisagística ou em encerramento. Apedreira em actividade tinha um pla-no de lavra aprovado (eles devem serfeitos e aprovados a cada três anos,segundo a legislação) e o MATE diz

que só após a conclusão do inquéritoé que a DGEG irá avaliar a situaçãoda exploração da pedreira, podendoimpor, "se for o caso", alterações aoPlano de Pedreira que se afiguremnecessárias quer à exploração querà segurança".

O MATE refere que a Divisão dePedreiras do Sul da DGEG tem efec-tuado "um acompanhamento de

proximidade ao nível técnico juntodas empresas, quer ao nível da fis-

calização no local quer ao nível dereuniões e contactos, designadamen-te com os responsáveis técnicos das

pedreiras", mas não esclareceu emquantos casos houve propostas deencerramento em cima da mesa ou

propostas concretas para amenizarum problema que se adivinhava.

Refere, apenas, que foram apresen-tados estudos técnicos (InstitutoSuperior Técnico e Universidade deÉvora), designadamente no que res-

peita à estabilidade dos taludes, bemcomo a adopção de "pregagens" paraevitar deslizamentos. "Acresce quequanto à pedreira Olival Grande São

Sebastião e com vista à aprovação da

revisão do Plano de Pedreira, foramsolicitados recentemente diversoselementos ao explorador", conclui.

543 quilómetros em dez anosSe a actividade da pedreira nuncachegou a ser posta em causa, a deci-são de interditar a estrada tambémnunca chegou a acontecer. Ela teriade ser assumida pela câmara, depoisde a Estradas de Portugal ter cons-truído e inaugurado uma variante à

cidade, variante essa que passou a

integrar o plano rodoviário nacional,desclassificando a EN255 para a con-

dição de estrada municipal.Em resposta a um pedido de in-

formações do PÚBLICO, a Infra-Estruturas de Portugal refere quedesde Janeiro de 2009 foram trans-feridas para 89 municípios mais de540 quilómetros de estradas. Estas

transferências, que levaram o vice-

presidente da Associação Nacionalde Municípios, Almeida Henriques,a alertar para o facto de existirem"milhares de quilómetros de estradas

por esse país fora" sem manutençãoporque as autarquias não têm dinhei-ro para a fazer, são quase sempre im-

pulsionadas pela Infra-Estruturasde Portugal. Mas obedecem a umamoldura legal e obrigam, sempre,a comum acordo. As autarquias não

são obrigadas a ficar com a gestão daestrada se entenderem que não têm

condições para o fazer.Tal não significa que os 89 mu-

nicípios tenham a obrigação de ternos seus quadros funcionários comcompetência especializada na fisca-

lização e gestão de rodovias - gestãoessa que, em alguns casos, vai muito

para além de verificar e garantir obom estado de conservação do pa-vimento. As câmaras podem pediresses serviços à Infra-Estruturas de

Portugal, que presta este tipo de ser-

viços.No caso em apreço, a estrada foi

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desclassificada com base no pontolegal que determina que "a cons-trução de qualquer variante operaa desclassificação do troço de estra-da que aquela substitui", e o acordoentre empresa pública e municípioé sujeito, previamente, à recolha de

aprovações de várias entidades, co-mo os órgãos municipais, e ainda oInstituto da Mobilidade e dos Trans-portes, o regulador que tem comoincumbência fiscalizar o sector dasinfra-estruturas rodoviárias, bem co-

mo supervisionar e regulamentar a

execução, conservação, gestão e ex-

ploração das mesmas.

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