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A MATEMÁTICA NO MEMORIAL DO CONVENTO Matemática e Literatura Daniela Ferreira da Costa Renato Pinheiro Veiga Matemática A e Português Escola Secundária D. Afonso Sanches

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A MATEMÁTICA NO MEMORIAL DO CONVENTO

Matemática e Literatura

Daniela Ferreira da Costa

Renato Pinheiro Veiga

Matemática A e Português

Escola Secundária D. Afonso Sanches

A Matemática no Memorial do Convento Página | 2

“É inclusive aqui que habita o sentido da vida: como uma

esponja, absorver daqui e dali, beber do conhecimento dos

outros, estar atento às pequenas coisas, reparar no que mais

ninguém repara, pensar no que mais ninguém pensa e

estabelecer relações como as que estamos a estabelecer neste

trabalho, por exemplo. Quem pensaria que a Matemática se

poderia unir a um texto literário de uma forma tão coincidente?

É o que vamos provar neste ensaio.”

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Introdução

Uma das obras de leitura integral obrigatória do ano terminal em que nos

encontramos, a nível do programa de Português, é o Memorial do Convento. Aliando

esta obra a uma atividade já existente na nossa escola - “Matemática e Literatura” -,

surge então a oportunidade de montarmos um trabalho que aliasse estas duas

componentes do nosso plano de estudos, contribuindo assim para a interdisciplinaridade

que sempre é salutar e profícua para nós, estudantes, tanto para ganharmos um sem

número de ferramentas para o futuro como para nos apercebermos que o que

aprendemos em certos momentos da nossa vida não é para ser colocado num

compartimento estanque e não se relacionar com outro tipo de ensinamentos e

aprendizagens que possamos adquirir noutras ocasiões.

Deste modo, veremos o que podemos encontrar de matemático nesta obra, no

entanto, não conseguiremos enumerar e citar absolutamente tudo o que seja relacionado,

pois tudo é, de facto, Matemática.

A propósito disso, certamente que José Saramago, Nobel da Literatura, não

escreveu esta sua grandiosa obra com a intenção de estabelecer algum tipo de ligação

com o assunto que este ensaio trata e há inclusive um excerto de uma obra de Saramago

que traduz uma definição da Geometria Fractal, e que este revela que “aquilo a que eles

[matemáticos] haviam chegado à custa de muito estudo, alcançara-o eu graças a um

golpe de intuição científica”1, o qual passo a citar:

“Observado desde o ar… parece uma árvore tombada, com um tronco curto e

grosso, constituído pelo núcleo central de sepulturas, de donde arrancam quatro

poderosas ramas, contíguas no seu nascimento, mas que depois, em bifurcações

sucessivas, se estendem até perder-se de vista, formando (…) uma frondosa copa em

que a vida e a morte se confundem”

in [Saramago, J. (1997). Todos os Nomes. Portugal: Editorial Caminho]

1 http://caderno.josesaramago.org/33361.html

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O Trabalho de José Saramago

Retomando o que falámos na introdução, conseguimos perceber distintamente

que Saramago não pretendia de forma alguma ligar estes dois assuntos e se o fez foi por

um mero acaso, visto que a Matemática não era nenhum dos temas do conjunto de todas

as suas obras.

Mas é aqui mesmo que reside a magia dos textos literários (podemos ousar dizer

da vida também): encontrar ligações que não estão visíveis, que não são óbvias, que são

aparentemente desconexas e que com um simples esforço se podem unir e tornar-nos

mais completos e maiores, com acesso a estádios mais elevados de conhecimento, visto

que é isso que as diversas aprendizagens que adquirimos ao longo da nossa efémera

existência nos trazem.

É inclusive aqui que habita o sentido da vida: como uma esponja, absorver daqui e

dali, beber do conhecimento dos outros, estar atento às pequenas coisas, reparar no que

mais ninguém repara, pensar no que mais ninguém pensa e estabelecer relações como as

que estamos a estabelecer neste trabalho, por exemplo. Quem pensaria que a

Matemática se poderia unir a um texto literário de uma forma tão coincidente? É o que

vamos provar neste ensaio.

***

Para darmos uma certa contextualização da obra em si, analisaremos ao de leve as

obras de Saramago e as suas motivações para escrever o Memorial do Convento.

Nascido em Novembro de 1922, este escritor tem uma obra vastíssima, desde

romances a peças de teatro e contos e o seu estilo de escrita não se coaduna com o

normal da época em que viveu: é um estilo livre, quase a fugir do discurso literário e

quase a rasar a linguagem oral. Foge então a tudo o que é tradicional, trazendo temas

totalmente novos, tais como a verdade, a invenção, o conhecimento, que é passível de

ser alterado pela arte, e a religião, que Saramago satiriza e reprova.

A Matemática no Memorial do Convento Página | 5

O Contexto de Memorial do Convento

Com o estilo descrito anteriormente, o Nobel da Literatura mune-se de uma íntima

proximidade ao leitor, destrinçando assim todos os seus pontos de vista em relação, por

exemplo, às desigualdades relativas à estratificação social ou à corrupção por parte das

pessoas de um nível social mais elevado, tais como elementos do clero ou da

aristocracia.

***

DA CONTRACAPA:

“Era uma vez um rei que fez promessa de levantar um convento em Mafra.

Era uma vez a gente que construiu esse convento.

Era uma vez um soldado maneta e uma mulher que tinha poderes.

Era uma vez um padre que queria voar e morreu doido.

Era uma vez.”

O enredo desta obra tem pontos de realidade emaranhados nos pontos de ficção e

por isso é tão difícil (e tão bom!) distinguir aquilo o que é histórico e aquilo que foi

imaginado pelo intelecto do autor. A ação desenrola-se durante o reinado de D. João V,

que por ser tão magnânimo, manda construir o atual Palácio Nacional de Mafra, como

forma de saldar uma promessa feita a um frade franciscano, promessa essa que tinha

como finalidade a gravidez da esposa do rei, a rainha D. Maria Ana Josefa.

A partir deste momento na escrita, o rei ordena que se construa o Convento e tudo

vai girar à volta disso: novas personagens são apresentadas, vindas de outras partes da

cidade (podemos usar como exemplo Baltasar Sete-Sóis que participou na construção

do Convento), descrições intensas do trabalho submisso nas obras e também das

condições míseras que os homens auferiam. Pode ligar-se, deste modo, esta obra ao

propósito de louvar e glorificar o espírito de sacrifício e de submissão positiva do povo

português em prol de uma causa, ainda que forçada. Saramago não é o primeiro a fazê-

lo; já Camões o havia feito, noutras circunstâncias.

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A ligação

Esmiuçaremos daqui em diante as ligações que podemos encontrar neste romance

à ciência que tem como pedra basilar o raciocínio lógico e abstrato. Dividiremos esta

secção em duas partes, correspondentes aos dois ramos mais abrangentes da

Matemática: a Geometria e a Aritmética.

A Geometria do Memorial do Convento

DO DICIONÁRIO:

Geometria

s.f.

Ciência que tem por objecto as dimensões das linhas, das superfícies e dos volumes.

(in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa online,

Consultado à data de 28 de Março)

A Geometria em si é citada duas vezes na obra; primeiro por Baltasar Sete-Sóis -

“e que a minha arte tinha mais que ver com a jurisdição do Santo Ofício que com a

geometria, Padre Bartolomeu Lourenço, eu destas coisas não entendo…” (página 82) e

posteriormente quando Blimunda, Baltasar e o padre Bartolomeu Lourenço se preparam

para levantar a passarola e onde há uma invocação ao anjo Custódio, dizendo que

aquela é “uma obra que requer todas as geometrias e matemáticas que se puderem

reunir…” (página 252)

Agora seguindo a ordem do tempo de escrita, a primeira referência que surge

relacionada com a geometria emerge quando se fala do perímetro da basílica, palavra

que tem origem no grego perí (em volta de) + métron (medida). Perímetro significa

então medir em volta de algo. Vejamos o excerto que nos fala disso: ”Leva a dita igreja

uns altos e fortes mastros, dispostos pela mesma formalidade dos alicerces, quer dizer

segundo o perímetro que terá a basílica definitiva…” (página 178).

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Na página 273 é feita uma referência às noções de concavidade e convexidade,

numa ligação belíssima ao amor entre dois seres, humanos ou não. Observemos:

“Acertará com o particular lugar onde nascemos, o côncavo meu no teu convexo, no

meu convexo o teu côncavo…”.

Escreve-se também a “história” das linhas retas e oblíquas na descrição do trajeto

efetuado pela passarola: “a máquina começa a derivar para nordeste, em linha reta,

obliquando na direção da terra…” (página 274). Também nesta descrição, durante a

queda da máquina, são mencionados os círculos concêntricos que, como o próprio nome

indica, são círculos que apresentam o mesmo centro, dando a ideia de uma queda em

espiral: “em círculos concêntricos, queda que parece infinita e vai acabar…” (página

274).

Há inclusivamente na obra uma referência a Arquimedes, matemático grego,

responsável pela lei da alavanca, instrumento utilíssimo na construção do mui-nobre

convento. Desenvolveu técnicas engenhosas para calcular áreas e volumes, antecipando

em várias maneiras o moderno cálculo integral. Atente-se: “Imaginemos que amanhã se

perde o sentido da alavanca, não haverá mais remédio que meter o ombro e o braço,

até que ressuscite Arquimedes e diga, Dêem-me um ponto de apoio para vocês

levantarem o mundo.” (Página 335).

***

No entanto não é apenas na obra que se pode falar de Geometria. Aliado à obra,

temos o magnífico Palácio Nacional de Mafra. Desde a fachada aos jardins, estão

presentes diversos lugares geométricos.

Começando pela fachada do palácio é evidente a existência de um eixo de simetria

(representado a vermelho); também estão presentes duas circunferências se pensarmos

no contorno dos relógios (castanho) e dois círculos, os próprios relógios.

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Pensando agora na noção de ponto médio, M é o ponto médio do segmento de reta

[AB], ou seja, a distância do ponto M ao ponto A é igual à distância do ponto M ao

ponto B.

Passando para o interior, na igreja também é notória a existência de simetria.

Existem frisos geométricos neste espaço, com diferentes tipos de simetria (Fig.2). A

disposição dos bancos também é simétrica (Fig.3).

Figura 1 – Fachada do Palácio Nacional de Mafra

Figura 2 – Interior da Basílica (pormenor)

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Nos jardins, também estão presentes variados lugares geométricos. Podemos

observar uma coroa circular (figura 4), uma circunferência (figura 5), um círculo (figura

6), diversos eixos de simetria (figura 7) e ainda bissetrizes de ângulos (figura 8).

Figura 3 – Interior da Basílica

Figura 4 – Coroa Circular

Figura 6 – Círculo

Figura 5 – Circunferência

Figura 7 – Eixos de Simetria

Figura 8 – Bissetriz do ângulo AĈB

A Matemática no Memorial do Convento Página | 10

A Aritmética do Memorial do Convento

DO DICIONÁRIO:

Aritmética

s.f.

Ciência que estuda as propriedades elementares dos números racionais.

(in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa online,

Consultado à data de 28 de Março)

Durante a invocação ao anjo Custódio, este é caracterizado como sendo

aritmético; veja-se o seguinte excerto: “mas nenhum é, como tu, aritmético, tu sim, que

sabes as treze palavras, e de uma a treze, sem falha, as enumeras…” (página 262).

Na página 290, é dito que “não pode Baltasar contar os barracões todos, chegou

a cinquenta e sete e perdeu-se, sem falar que ao cabo destes anos não melhorou em

aritméticas”, sendo aqui evidenciado que a contagem numérica está relacionada com a

aritmética, e desde cedo, muito cedo mesmo, lidamos com ela.

Ainda relacionado com a contagem, na página 341, é mencionado que “quem fez

as contas aos quatrocentos bois e aos seiscentos homens, se as errou, foi na falta, não

que estejam de sobra.” e, na página 183, “ grande número de gente, passante três mil,

se não se enganou a quem a contou…”.

Ao longo de todo o romance são parafraseadas igualmente as várias operações

aritméticas tais como:

Soma/ Subtração

Multiplicação/ Divisão

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SOMA/ SUBTRAÇÃO

A palavra “somando” surge nas páginas 112/113, na descrição dos meios de

transporte (liteiras e coches) utilizados por D. Nuno da Cunha e pelo enviado do papa, e

sendo utilizada com o objetivo de realçar a quantidade de “caprichos”, adquirindo o

valor de junção. Atente-se: “e à frente da liteira doze lacaios, que somando a isto tudo

os cocheiros e liteireiros é uma multidão para servir um cardeal só …”.

No capítulo XVIII, é feita uma enumeração dos bens do Império de D. João V,

onde aparece a palavra “somado” e a palavra “somas”, na página 308: “as cascas de

limão cristalizadas, os frutos, e dos lugares que hão-de vir a ser Brasil o açúcar,

o tabaco (…) claro está que este todo não é o rendimento da coroa, rica sim, mas não

tanto, porém, tudo somado, de dentro e de fora, entram nas burras de el-rei para

cima de dezasseis milhões de cruzados, (...) Medita D. João V no que fará a tão grandes

somas de dinheiro…”. A primeira palavra é utilizada com o sentido de “adicionado”, já

a segunda realça a elevada quantia de dinheiro.

Na página 335, durante a descrição do trabalho de construção do convento aparece

a palavra “soma” novamente com o significado de grande quantidade: “…até as pedras

com tanto trabalho alçadas, os homens que as erguem, as alavancas que as suportam,

os calços que as amparam, nem os senhores imaginam a soma de trabalho que está

neste convento…”.

No capítulo XXI, na página 393, aparece pela segunda vez a palavra “soma” e

também com o significado de grande quantidade: “… é que o meu querido rei nem

imagina o tamanho daquele monte e a soma de homens que requer …”.

Já durante a descrição das características dos santos do cortejo em Fanhões está

presente a palavra “somadas” com o significado de “juntas”/ ”reunidas”. Considere-se o

seguinte excerto: “Vêm os três juntos, talvez por parecenças de rosto, talvez porque as

virtudes de todos, somadas, fariam um homem honesto …” (página 442).

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Na página 244, durante a recolha de vontades por Blimunda, é referido que em 32

casas que entrou conseguiu 24 nuvens fechadas, pois 6 doentes já não as possuíam e em

2 deles se encontravam agarradas ao corpo. Pelo que podemos verificar que:

32 - (6 + 2) = 24

MULTIPLICAÇÃO/ DIVISÃO

Durante a descrição da epidemia que afetava Lisboa, na página 245, é referido que

“para virem a morrer nesta epidemia quatro mil pessoas em três meses, o que

representa mais de quarenta cadáveres para enterrar todos os dias.” Com isto,

sabendo que 3 meses são aproximadamente 92 dias, verificamos que:

, quantidade esta superior a 40.

Surge na página 257 e na página 294 a noção de triplo: “duzentos mil cruzados de

renda, imagine-se, três vezes os direitos que el-rei cobra pelos pretos que vão para as

minas do Brasil.”; “o braço direito anda há quase quinze anos a triplicar o jeito e a

força”.

É mencionado o milagre da multiplicação dos peixes e pães: “mais fácil foi

multiplicar os peixes e os pães, ou caberem duas mil vontades num frasco de vidro “

(página 312)

No capítulo XIX, na página 334, durante o transporte da pedra-mãe, é dito que “a

laje tem de comprimento trinta e cinco palmos, de largura quinze, e a espessura é de

quatro palmos, e, para ser completa a notícia, depois de lavrada e polida, lá em Mafra,

ficará só um pouco mais pequena, trinta e dois palmos, catorze, três, pela mesma

ordem e partes, e quando um dia se acabarem palmos e pés por se terem achado metros

na terra, irão outros homens a tirar outras medidas e encontrarão sete metros, três

metros, sessenta e quatro centímetros…”.

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Com isto, o autor dá a conhecer ao leitor que um palmo equivale a

aproximadamente 0,22 m, ou seja, 22 cm

A conversão de medidas aparece novamente nesta página, desta vez de medidas

de peso, quando falamos da mesma “mãe da pedra” supratranscrita, o autor faz-nos mais

uma vez o trabalho de traduzir (quando a uma medida que já não é usada faz

corresponder uma recente) que “em vez de duas mil cento e doze arrobas, diremos que

o peso da pedra (…) é de trinta e um mil e vinte e um quilos, trinta e uma toneladas em

números redondos”. Ficamos assim a saber que uma arroba equivale a 15 quilos:

Na página 346, durante o transporte das pedras para a construção do convento, é

referido que “fizeram uns mil e quinhentos passos, menos de meia légua das nossas.”

Sabendo que 1 légua equivale a 6600 metros e um passo a 1,48m, 1500 passos são 2220

metros:

Meia légua são então 3300 metros:

Como se confirma, os 1500 passos correspondem a menos de meia légua.

LEGENDA:

m – metros

p - passos

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No dia-a-dia…

E então? Gostaste da aula de Matemática hoje?

Um pouco estranha, não achas? Porquê que se lembraram de juntar coisas que são tão

díspares como Português e Matemática?

Não são tão díspares como tu pensas que são, permite-me discordar.

Ai sim? Então diz-me: o quê que se pode encontrar de matemático no Memorial?

Sem querer adiantar muito, visto que não vamos escrever o ensaio juntos, e não quero

que fiques privilegiado em relação a mim, podem encontrar-se imensas ligações entre

uma e outra coisa… Por exemplo, sabes quem foi Arquimedes?

Hmmm, lembro-me de já ter ouvido qualquer coisa sobre ele numa das aulas de

Matemática, mas já há muito tempo…

Pois bem, Arquimedes foi um matemático grego, responsável pela lei da alavanca e

desenvolveu ainda técnicas para calcular áreas e volumes, coisas que na sua altura

eram extremamente avançadas. E sabes que mais? Ele é referido na obra.

Aposto que não tem nenhuma ligação à parte literária da obra…

Claro que tem, Saramago fala nele quando refere que a alavanca foi extremamente útil

na construção do Convento. Olha, aí está outra ligação com a Matemática: se

Arquimedes não tivesse existido, a alavanca não teria existido e as obras de construção

civil seriam muito mais complexas… Sabias que o amor também tem Matemática?

Claro que tem, quando é amor, duas pessoas juntas não são duas pessoas individuais

mas uma, e uma só, até ao infinito. Mas o que tem isso a ver com o Memorial?

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Ai, que piroso (risos). Saramago fala de amor no Memorial, do amor entre Baltasar e

Blimunda, e dá-nos uma descrição belíssima de amor e não fatela como a tua. Olha

isto: “acertará com o particular lugar onde nascemos, o côncavo meu no teu convexo,

no meu convexo o teu côncavo…”. Não é bonito?

Eu continuo a preferir a minha definição de amor, perdoa-me. É tão mais romântica e

sentimental. Tu também deverias achar...

Eu acho que o que é sentimental e belo é conseguirem existir destas ligações na vida,

não só da Matemática, como de muitas outros âmbitos. Acho que é nisto que reside a

felicidade do Homem mais realizado do mundo.

Agora que falas nisso… Já reparaste na fachada do Palácio Nacional de Mafra?

Sim, é gira…

Gira?! Vê-se mesmo que és mais ligada às ciências empíricas, de maneira que não

consegues arranjar adjetivos adequados para descrever a beleza de tal construção.

Aquilo é magnificente, é fantástico, grandioso, faustoso, sumptuoso, opulento, irreal

mesmo… E só de pensar que aquilo está cheio de eixos de simetria, e para ser

construído foram precisas tantas medidas matemáticas, na altura diferentes das de

agora… Acho que é a isso que te referes quando falas da magia destas ligações.

Exatamente, boa, é isso! Conseguiste chegar onde já tinha chegado há muito. Parece

que as ciências empíricas não são tão más como aparentam…

Não estava a menosprezar de forma alguma a área e que te encontras, tanto que a

maior parte do conhecimento científico é gerado por ela. Não fiques chateada comigo,

sim? Estava só feliz por parte do meu intelecto de se ter iluminado!

Não te preocupes, não há problema. Eu fico extremamente feliz por ti por teres chegado

a essa conclusão! Bravo!

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Conclusão

Ao longo deste trabalho, pudemos interligar aquilo que, em primeira instância,

não se poderia correlacionar de modo tão óbvio. Dividimos este ensaio em duas partes,

tornando-as indistinguíveis, de maneira a que o propósito do mesmo não saísse lesado.

Deste modo, demos uma breve contextualização da obra, referindo o trabalho do autor,

a sua obra e falando muito resumidamente da narrativa deste livro. Em seguida,

desnudámos as ligações profundas e os elementos que, da Matemática, se encontram

nesta grandiosa obra de Saramago.

Como já foi referido, áreas que exteriormente não têm ligação, ao pensarmos

nelas a fundo, conseguimos sempre (e sempre mesmo!) encontrar algum tipo de

conjugação. E é esta a grande conclusão deste trabalho: mais do que especificar quais os

pontos de união, o importante é perceber-se que esses pontos de união existem e pensar,

no nosso ser intrínseco, quais são.

Queremos ainda acrescentar que ao longo da investigação que necessitámos de

produzir, encontrámos mais uma ligação desta obra, mas desta vez à música; Azio

Corghi, professor de Composição no Conservatório de Milão, compôs o libretto de uma

ópera em três atos inspirada em Memorial do Convento, que estreou em 1990 e que a

levou ao Teatro alla Scala de Milão. Esta ópera tinha o nome da personagem mais

misteriosa da obra: “Blimunda”.

Queremos deixar uma nota de esperança, com vista a que se façam mais destas

relações, aplicadas a coisas mais abrangentes. Já foi referido, mas é disto que se faz a

felicidade. Saia-se do marasmo e da letargia das redes sociais em exagero, dos dias

plenos em casa, dos programas fracos de televisão, da ignorância generalizada da classe

estudantil da nossa época. Pense-se mais; pense-se melhor. Leia-se nas entrelinhas,

leiam-se as imagens, leiam-se os gráficos, leiam-se os anúncios de publicidade, leia-se

informação mais credível e mais interessante, mas principalmente leiam-se as palavras

para além das palavras!

A Matemática no Memorial do Convento Página | 17

Referências bibliográficas:

SÍTIOS NA INTERNET:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Jos%C3%A9_Saramago

http://josesaramago.blogs.sapo.pt/95699.html

http://www.portaldaliteratura.com/autores.php?autor=58

http://umcadernoparasaramago.blogspot.pt/2010/06/teatro-opera-blimunda-opera-

lirica.html

OBRA COMPLETA:

Saramago, J. (1982). Memorial do Convento. (52ª Edição). Editorial Caminho

* Todas as páginas citadas ao longo deste ensaio pertencem a esta edição do livro. *