O cancioneiro oral tradicional do Norte de Portugal e da Galiza

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O cancioneiro oral tradicional do Nortede Portugal e da GalizaCarlos Nogueira a & Rui Faria aa Universidade Nova de LisboaPublished online: 26 Dec 2012.

To cite this article: Carlos Nogueira & Rui Faria (2013) O cancioneiro oral tradicional do Norte dePortugal e da Galiza, Romance Quarterly, 60:1, 1-11, DOI: 10.1080/08831157.2013.735609

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Romance Quarterly, Vol. 60, No. 1, 1–11, 2013Copyright C© Taylor & Francis Group, LLCISSN: 0883-1157 print / 1940-3216 onlineDOI: 10.1080/08831157.2013.735609

CARLOS NOGUEIRA AND RUI FARIA

Universidade Nova de Lisboa

O cancioneiro oral tradicional do Norte de Portugal e da Galiza

The lyric cancioneiros from Northern Portugal and Galicia constitute, to a great extent, a sharedtradition. To affirm this is not to deny the specificity of the cancioneiro with regards to eachcountry or region. There are certain characteristics that distinguish the cancioneiros from oneanother, but equally there are clear similarities between them, in form as well as in content. Theirgeographic proximity, their various connections, and also the political, linguistic, and culturalseparation of Portugal and Galicia have given rise to the complicated relationship that hascreated a cancioneiro we can refer to as, to evoke the medieval lyric poetry school, Galician-Portuguese. Departing from these historical and cultural conjectures, this article aims to comparethe major lines of structure and form within the cancioneiros from Northern Portugal and fromGalicia. Through the comparison of poems which have circulated or are still in circulation inthis geo-cultural area, we can, on the one hand, reflect upon the way in which the cancioneirofunctions and, on the other hand, consider the world views of the communities from which thetexts originate and which are shaped at the same time by these very texts.

Keywords: cancioneiro, Galicia, popular, Portugal, traditional

Varios estudiosos, como Teofilo Braga, Adolfo Coelho, Jose Leite de Vasconcelos, Fernandode Castro Pires de Lima ou Fermın Bouza-Brey, aproximaram ja os cancioneiros da tradicaooral galega e do Norte de Portugal. Mais recentemente, Domingo Blanco acrescentou elementosimportantes a perspectiva comparativa de trabalhos que, no seu conjunto, identificam mais de cemquadras galegas e portuguesas em que sao evidentes afinidades tematicas, semanticas e lexicais,mas tambem diferencas as vezes subtis e profundas (“Sobre a tradicion”).

Partiremos dessas contribuicoes e desses quadros de variantes, e, na medida do possıvel,procuraremos confrontar versoes de um mesmo texto arquetıpico.1 As variantes garantem avitalidade do cancioneiro popular, a sua actualizacao e adaptacao ao momento e ao meio. Nesteconfronto entre os cancioneiros da Galiza e do Norte de Portugal, teremos em conta as principaismodalidades de variantes, inscritas em dois tipos fundamentais: as ideologicas (aquelas em queo tema e alterado, apesar da utilizacao da mesma forma) e as formais (a mesma ideia numaexpressao formal mais ou menos diferente). Veremos tambem o papel fundador da formula,que, constituıda por fragmentos linguısticos e rıtmicos, favorece a composicao e a circulacao denovos poemas. Para compreendermos os mecanismos de variacao da quadra nestes cancioneiros,utilizaremos as categorias “sintagma/paradigma”. A partir daqui, veremos como a comutacao,

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tanto ao nıvel da micro-variacao (variantes lexicais), como da macro-variacao (sequencias maisextensas, compreendendo um verso ou mais), constitui um mecanismo fundamental na poeticadestes cancioneiros.

A comutacao, propria do sistema de variantes de qualquer genero da literatura oral, e maisintensa na passagem do texto a outra lıngua e a outra cultura. Compreende-se: a variacao,cujas principais particularidades veremos mais a frente numa tentativa de tipologia de variantes,obedece a condicionamentos de ordem geografica, social e cultural. Na adaptacao ou recriacaode uma quadra, mas tambem noutras formas do cancioneiro, entram factores eticos, esteticose linguısticos que sao tao importantes quanto a memoria intertextual, que tende a conservar aidentidade do texto mais antigo (o que nao obsta a que, muitas vezes, o interprete-autor nao possarealizar uma transformacao conscientemente criativa).

Domingo Blanco, no artigo a que acima nos referıamos, “Sobre a tradicion comun docancioneiro popular moderno de Galıcia e do Norte de Portugal”, afirma nao ser “posible negar(calquera que sexa a ideoloxıa que se profese) que as xentes que habitaron a area occidental daPenınsula entre o Cantabrico e o Douro compartiron durante moitos seculos a mesma cultura”(“Sobre a tradicion” 17); e acrescenta ser “tamen indubidable que a comunicacion ‘natural’(a uniformidade da lingua, os sentimentos de comunidade, etc.) foi freada ou interrumpidaartificialmente polos poderes polıticos, isto e, por grupos minoritarios con capacidade de decisione de influencia sobre a maioria da poboacion; tal feito manifestouse na creacion de fronteiras epeaxes, e axina repercutiu na economia (fabricacion de moeda propria) e na polıtica (exercitoproprio, alianzas e campanas militares)” (“Sobre a tradicion” 17). O autor lembra ainda que esteafastamento progressivo se manifestou tambem na lıngua e nas atitudes de suspeicao, e mesmoem confrontos entre portugueses e galegos.

Mas estas duas regioes estiveram sempre ligadas atraves da literatura oral e tradicional emgeral, e, em particular, do cancioneiro. Consumada a separacao polıtica e terminados os conflitosarmados, a Galiza e o Norte Portugal voltaram a unir-se social e culturalmente. A ruralidade, oscontextos geograficos e ecologicos comuns, o predomınio de aglomerados populacionais auto-suficientes, as correntes migratorias cıclicas ou definitivas, a grande importancia da mulher nacomunidade, a distancia em relacao aos centros de decisao polıtica e cultural sao factores deaproximacao entre as duas regioes. Por isso e que Domingo Blanco sublinha, no mesmo texto,que “A comunicacion—literaria, humana—segue, pois, firme entre Galicia e Portugal, a pesar dosesforcos oficiais que durante seculos intentaron evitala, e ainda hoxe feiras, romarias, casamentos,emigracion, tratos de comercio e viaxes de pracer seguen a xuntar com frecuencia e eficacia aportugueses e galegos e a facerles evidente as identidades basicas do seu comportamento cultural”(“Sobre a tradicion” 18).

A natureza provisoria da quadra oral, constantemente reformulada e actualizada, inviabi-liza quase sempre a determinacao exacta do primeiro texto. Antes de se operar o processo dediferenciacao, ha uma quadra inaugural, autoral, que podera fecundar um numero indeterminadoe teoricamente ilimitado de textos. A volubilidade da transmissao oral conduz a uma cadeia devariantes cuja graduacao nao e possıvel fixar.

Notamos esta evidencia porque queremos deixar bem claro que este nao e um trabalho dearqueologia textual. Nao vamos definir a genealogia de quadras pertencentes aos cancioneirosgalego e portugues (e, muitas vezes, nao so), nem propor a anterioridade de umas versoes emrelacao a outras. No cancioneiro, a transformacao constante de uma quadra faz com que areconstrucao do texto original seja praticamente sempre hipotetica e, mesmo, ilusoria. Impoe-se-nos aqui a sugestiva imagem do palimpsesto, patente em varias reflexoes sobre a intertextualidade

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(Genette), ligada a possibilidade de descobrirmos, subjacentes a um certo texto, inscricoes ante-riores ja desbotadas mas ainda reconhecıveis.

Interessa-nos antes ver como e que, no essencial, uma quadra vive e se transforma em versoes,indiferente tanto a questoes de teoria do texto ou da cultura (paraliteratura, literatura ou culturapopular . . . ) como a divisoes geograficas e polıticas. A quadra do Noroeste da Penınsula Ibericamantem, hoje como ontem, a sua vocacao nomada, a sua identidade de varias nacionalidades enaturalizacoes.

Mas tambem importa dizer que a instabilidade e a maleabilidade da quadra tradicional naonos impedem de formular hipoteses de ascendencia e filiacao. Ha quadras que, pela persistencianum dos cancioneiros e raridade no outro, e, as vezes, tambem pelos elementos que remetempara um paıs e nao para o outro, indicam a sua proveniencia portuguesa ou galega. DomingoBlanco apresenta, entre outras, estas quadras, a primeira das quais surge com frequencia emcancioneiros portugueses e escassamente na Galiza. A versao galega, que se apropria de elementosda historia e da cultura portuguesas (a cidade de “Braga”, a prisao lisboeta do “Limoeiro”, aemigracao portuguesa para o Brasil), substitui “Porto” por “Ourense” (“Sobre a tradicion” 27), eadapta o sentido original do texto aos caminhos da historia da Galiza (os emigrantes galegos emPortugal):

Fui a Braga e fui ao Porto, Fui a Braga e fui a Orense,Fui ao Rio de Janeiro;2 tamen fui o Limoeiro;nao achei amor mais firme non achei milhor amigodo que a saca do dinheiro. qu’a bulsa do meu dineiro.

Na taxionomia de variantes que desenvolveremos a seguir, vamos referir-nos aos dois tiposmorfologicos da quadra, que Jose de Almeida Pavao Junior denomina de “estrutura dicotomica”e de “estrutura unitaria ou homogenea” (226; Sublinhados no original). Por isso, e convenienteque essa distincao fique desde ja evidente. Nas quadras dicotomicas, “e visıvel o cotejo de duasrealidades mais ou menos interdependentes ou ate independentes entre si”, enunciadas no primeiroe no segundo dısticos; nas unitarias, ha “apenas uma unidade semantica” (Almeida Pavao 226).Tambem aqui o autor clarifica e amplia a proposta de Jose Leite de Vasconcelos, o primeiro emPortugal a tratar da morfologia da quadra tradicional de forma exaustiva e ponderada, em variosestudos que anunciam os modernos processos estruturalistas (“Introducao”; Poesia Amorosa;Ensaios Etnograficos).

Segundo Leite de Vasconcelos, a morfologia de uma quadra compreende duas partes, or-ganizadas em conjuntos de dois versos que, na maioria das vezes, pelo menos aparentemente,sao dicotomicos: “Grande numero de cantigas tem duas partes morfologicamente distintas; uma,constituıda pelos dois primeiros versos; a outra, pelos ultimos. A distincao aparece muito nıtidaem certas comparacoes e antıteses, menos exacta noutros casos. O primeiro grupo encerra or-dinariamente um sentido geral, tirado quase sempre das coisas naturais; o segundo, um sentidoparticular, com aplicacao a dado facto” (Poesia Amorosa 21–22).

Em Portugal, antes de Jose Leite de Vasconcelos, ja Antonio Feliciano de Castilho e LuısAugusto Palmeirim haviam falado da estrutura dicotomica da quadra, embora sem o desenvolvi-mento que Leite de Vasconcelos dedicou ao assunto. Nas palavras de Castilho, “A primeirametade de cada quadra tem frequentemente um sentido diverso, e desconexo do sentido da se-gunda metade. Os primeiros dois versos contem uma sentenca geral, uma verdade vulgar, uma

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imagem campestre, a exposicao sucinta de qualquer facto, mas sem relacao alguma com o assuntoque se versa, o qual so nos dois versos ultimos aparece” (69).

Dos quatro exemplos de quadras tradicionais dicotomicas apresentadas por Castilho, tran-screvemos a primeira:

O loireiro bate bate,Que eu bem o sinto bater.Para comigo cantaresHas-de tornar a nascer. (70)

Palmeirim demonstra um maior entendimento da complexidade estrutural da quadra. Percebe,ao contrario de estudiosos como Fernando de Castro Pires de Lima,3 que a independenciasemantica dos dısticos nao empobrece esta forma poetica. Segundo ele, tal como defende Josede Almeida Pavao Junior (228), o corte desafia a agudeza do ouvinte (ou leitor), e intensi-fica a admiracao trazida pelos dois versos finais (Palmeirim 183). A quadra funciona assimcomo uma especie de enigma que oferece, no final, uma ideia clara e memoravel. O exem-plo que o autor apresenta serve para lembrar que, por vezes, mesmo se numa primeira im-pressao parece nao haver qualquer ligacao entre os dois dısticos, a verdade e que pode haveruma correlacao (“Apesar da diferenca aparente dos dois primeiros versos desta quadra como seguimento logico do raciocınio, nao ha ainda uma certa conexao entre o loureiro que-brado e ofendido, e o apartamento e despedida, que se anunciam nos dois versos finais daquadra?”):

O loureiro esta quebrado,Por tres partes ofendido . . .Fala, amor, com quem quiseresE de mim tira o sentido. (Palmeirim 183)

Na “Introducao” as Cancoes Populares da Beira, de Pedro Fernandes Tomas, Jose Leite deVasconcelos fornece um quadro de variantes que consideramos muito completo (“Introducao”).Jose de Almeida Pavao Junior, que tambem trata este assunto com rigor, elabora um quadromuito proximo do de Vasconcelos (233–47). Fazendo uma sıntese destes estudos, salientamosas variantes ideologicas, em que a mesma forma veicula ideias parcial ou totalmente distintas;e as variantes formais, em que o mesmo conteudo e traduzido atraves de alguns vocabulos ouexpressoes diferentes.

Nestas quadras de estrutura unitaria, colocadas lado a lado por Domingo Blanco numaextensa lista de quadras galegas e portuguesas, a mesma forma basica e usada com divergenciasevidentes ao nıvel do conteudo:

Fixch’a casa no monte, Moro a beira do monte,os vecinos son penedos; meus vizinhos sao penedos:na tua casa non entran nao tenho quem chor’por mim,sinon mouchos e morcegos. senao mochos ou morcegos.(“Sobre a tradicion” 22) (“Sobre a tradicion” 22)

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Trata-se de variantes ideologicas, em que se diz algo bem diferente quase com as mesmaspalavras. Temos o contrario da parafrase, processo muito proprio da literatura oral, que permitedizer o mesmo por outras palavras, isto e, sem alterar o sentido. Na primeira quadra, o enunciadordirige-se a um tu, que e (parece) ridicularizado, satirizado; na segunda, um eu fala de si comtristeza, lamentando a sua solidao. A mudanca de sentido vem do terceiro verso, que constituiuma variante activa, nao das outras variantes (formais, baseadas na parafrase, no primeiro verso,e na comutacao de “os” por “meus”, no segundo).

Nestas quadras, tambem variantes ideologicas, o verso que altera a estrutura profunda trazuma diferenca ainda mais inequıvoca ao tema. Na primeira, num discurso de terceira pessoae num tom jocoso, visa-se um destinatario que, no cancioneiro (e nao so), e referido ironicae satiricamente pelo seu sucesso junto das raparigas; na segunda, um eu canta, com graca e,porventura, com algum desencanto, o seu insucesso como namorador, ou apresenta-se, dizendoa quadra, como galanteador:

Tantas naranxas da China, Tanto limao, tanta lima,tantos limons polo chan, tanta laranja no chao!tantas meninas solteiras Tantas menina bonita,ten o noso capellan. nenhuma na minha mao.(Blanco, “Sobre a tradicion” 22) (Blanco, “Sobre a tradicion” 22)

Aquelas quadras sao um bom exemplo da modalidade que pode ser entendida ora comounitaria ora como dicotomica. Por um lado, sobretudo numa primeira impressao, poder-se-a dizerque nao ha qualquer relacao entre os dois dısticos; por outro, parece haver uma analogia obviaentre a abundancia de frutos espalhados pelo chao e as mocas que o eu diz ver a sua frente.

Nas variantes formais, cuja funcao e manter a invariante (conteudo), a diferenca limita-se,muitas vezes, a substituicao de uma unica palavra da mesma area semantica (“agosto”/“Maio”),como se ve nesta quadra de estrutura unitaria perfeita (por ser evidente que os quatro versosconstituem uma unidade sintactica e semantica. A versao galega, alias, nao prescinde sequer daconjuncao subordinada relativa, que une os dois dısticos):

Naquela banda do rio Da outra banda do rioten meu pai un castanheiro; tem meu pai um castanheiroda castanas en agosto, que da castanhas em Maio,uvas blancas en xaneiro. uvas brancas em Janeiro.(Blanco, “Sobre a tradicion” 21) (Blanco, “Sobre a tradicion” 21)

Nesta fase do nosso trabalho, continuaremos a aproximar os cancioneiros da Galiza e doNorte de Portugal, e proporemos uma classificacao para as variantes, a partir dos processosde variacao definidos para o romance tradicional por Braulio do Nascimento (“Processos devariacao”). Recorreremos aos conceitos, inscritos na linguıstica de Noam Chomsky, de “estruturade superfıcie” (unidades lexico-gramaticais, fonologicas e grafemicas) e de “estrutura profunda”(base semantica, o tema); e, tambem na linha da linguıstica contemporanea, teremos igualmenteem conta os conceitos de “sintagma”/“paradigma”.

As quadras do cancioneiro tradicional reproduzem-se a partir dos efeitos da oposicao entre oeixo sintagmatico, que funciona como apoio da estrutura, e o eixo paradigmatico, que actua sobreaquele atraves da comutacao. Este procedimento esta na origem da variacao e, consequentemente,

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da adaptacao, recriacao e fecundacao da poesia oral. Os processos de comutacao actuam comoinstrumentos de reelaboracao em variantes: daı a importancia dos equilıbrios entre a estruturade superfıcie e a estrutura profunda. Essa harmonia verifica-se nas relacoes sintagmaticas eparadigmaticas que se constituem entre os dois nıveis estruturais do poema. A estrutura desuperfıcie encontra no eixo paradigmatico um campo privilegiado de accao comutativa; e asestruturas profundas dependem do eixo sintagmatico para a sua propria sobrevivencia.

A dialectica sintagma / paradigma e, por isso, fulcral para a compreensao das causas quesubjazem as multiplas variacoes observadas na quadra. Nao esquecamos, porem, que, ao contrariodas simples construcoes linguısticas, as estruturas desta forma breve nao estao apenas sujeitas arestricoes sintacticas ou semanticas, mas tambem a constrangimentos impostos pela rima, pelametrica, pelo ritmo, pela musica.

E no eixo horizontal, sintagmatico, que se instauram os contextos que orientam as operacoesde comutacao e se situam predominantemente as invariantes, enquanto que no eixo vertical,paradigmatico, se colocam de modo dinamico as variantes. Como nota Braulio do Nascimentoacerca dos romances tradicionais, “nao devemos minimizar o papel das invariantes. Sao elas quepermitem uma estrutura de sobrevivencia ao texto, que o identificam e estabelecem a distincaoentre textos diferentes. ( . . . ) Uma invariante e representada pelo conjunto das suas variantes,podendo cada uma delas ser considerada tambem, no momento da producao, como uma invarianteem si” (“Romancero traditionel” 219–20).

Num artigo publicado em 1964 na Revista Brasileira de Folclore, o mesmo estudioso instituiuma classificacao tipologica dos processos de variacao, cuja importancia nos leva a adapta-la anossa analise de composicoes dos cancioneiros galego e portugues. O autor apresenta catorzeprocessos (participacao psicologica, anastrofe, supressao, justaposicao, aglutinacao, analogia,sinonımia, eufemismo, generalizacao, repeticao, substituicao, contaminacao, actualizacao eadaptacao), mas neste estudo veremos apenas cinco. As diferencas estilısticas e formais queseparam o romanceiro do cancioneiro, relacionadas, antes de mais, com a extensao dos poemas,explicam a nossa opcao (“Processos de variacao”).

Tal como Maria de Fatima Pessoa Viana Silva e Andrea Ciacchi, que tambem partem daclassificacao de Braulio do Nascimento, suprimimos a “participacao psicologica”, por consider-armos que se trata de um criterio subjectivo e, por isso, de difıcil apreensao. O poder criador dointerprete-autor pode fazer-se sentir em todos os outros processos (232).

Tambem nao abordamos a “justaposicao”, que, relacionada com a questao dos segmentostematicos, nao se enquadra nos objectivos do nosso trabalho.

Excluımos igualmente a “aglutinacao”, que e um processo de difıcil de detectar no can-cioneiro, devido a economia de meios das suas composicoes. Esta caracterıstica determina tambemque nao consideremos a “supressao”, isto e, a “perda de elementos ou de sequencias sem afetaro sentido geral” (Nascimento, “Variantes e invariantes” 175).

Eliminamos ainda a “substituicao” simples, que, na nossa tipologia, aparece integrada noprocesso unico de “analogia” e de “sinonımia”, a que chamaremos “substituicao por analo-gia fonetica” e “substituicao por analogia sinonımica”. E um processo que, desencadeado pormotivacoes semanticas e/ou foneticas, tem como elemento distintivo um certo caracter aleatorionas operacoes de comutacao (Silva e Ciacchi 240–41).

Nao vamos tambem ocupar-nos da “generalizacao”, que, como processo substitutivo, nao efrequente no cancioneiro. O mais comum e os poemas ja encerrarem originalmente afirmacoesproverbiais.4 No romanceiro tradicional, pelo contrario, a apresentacao de casos mais concretos epormenorizados favorece a passagem do particular para o geral, e, logo, a inclusao de expressoes

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e versos aforısticos. Braulio do Nascimento ilustra esta tendencia com o romance “Juliana e D.Jorge”:

D. Jorge tem o costume dos mocinhos enganarEsses rapazes de hoje so que querem e enganarBem te disse, Juliana, homem nao ha que fiar. (“Variantes e invariantes” 109–10)

A distincao entre “actualizacao” e “adaptacao” e tambem impraticavel, uma vez que “ilsconservent le meme critere fonctionnel, celui de ‘rapprocher’ le texte en facilitant ainsi sacomprehension et en l’eloignant du risque de la repetition mecanique entierement ou partiellementprive de son contexte” (Silva e Ciacchi 243).

A inversao dos termos de uma sequencia sintactica – a anastrofe – e a mudanca maissuperficial na estrutura do poema. Trata-se de uma variacao sintagmatica porque o processoestabelece-se nas combinacoes de elementos da corrente da fala. O verso sofre apenas uma ligeiraalteracao de ordem, enquanto o tema da quadra se mantem exactamente igual, ja que nao ha maisalteracoes ou aquelas que existem sao tambem formais:

O coxo e mais o manco O manco e mais o coxoe mais o corcovado e mais o corcovadoforon a casa do tolleito foram todos de visitaa falar co derreado. a casa do esquadrilhado.(Blanco, “Sobre a tradicion” 24) (Blanco, “Sobre a tradicion” 24)

A “substituicao por analogia fonetica” ou por “analogia sinonımica” e um processo de na-tureza paradigmatica, o que significa que esta intensamente vinculado a escolha, a praticabilidadeda comutacao, que pode ir da permuta de uma palavra a substituicao de um verso. Esta variacao,muito comum, garante a preservacao da unidade tematica da composicao e permite a introducaode alteracoes semanticas:

Tes os ollinos negros Oh Antonio, oh Antoninho,com’a seda de coser; retroz verde de cozer;nacimos un para o outro: nascemos um para o outro,que ll’habemos de facer. que lhe havemos de fazer?(Blanco, “Sobre a tradicion” 22) (Blanco, “Sobre a tradicion” 23)

Quem canta ou diz o poema pode querer esconder de quem ouve ou de si mesmo determinadaspalavras e imagens mais cruas. Daı a substituicao eufemıstica, que ora tem a ver mais com ocontexto (o perfil do receptor ou o estado de espırito do emissor no momento da enunciacao),ora se relaciona de modo mais profundo com a mundividencia do poeta-interprete. Como estaoperacao envolve um processo de seleccao, estamos perante uma variacao paradigmatica:

A mulher pra ser mulher A muller que ha de ser minaha-de ter o cu de pau; ha de ter o cu de pau,a barriga de manteiga, a barriga de cortizoas mamas de bacalhau. e a nariz de bacalao.(Nogueira, Cancioneiro Popular de Baiao II: 183) (Blanco, Escolma 108)

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Mas o poeta, por motivos mais contextuais ou mais idiossincrasicos, pode optar pelodisfemismo e pelo realismo, pelo burlesco e pelo riso, e assim surpreender pela invencao verbale pela imagetica:

O amor que ha de ser meuha de ter o cu de pau,a barriga de manteigai o demais de porco baldau. (Carballo 27)

A “repeticao” e um processo de tipo sintagmatico que consiste na reiteracao de uma palavra,de um segmento ou mesmo de um verso. Resulta de imposicoes rıtmicas e melodicas perantelapsos de memoria, mas tambem pode nascer do desejo de destacar certas ideias e sentimentos,como, neste caso, a emocao do eu face a morte da “amada”:

Mala morte, itirana morte! O morte, tirana morte!Olha o pago que me destes: O morte, tu que fizeste?levacheme a mina amada Levaste a minha amadapra sombra dos alciprestes. pra sombra do arcipreste!(Blanco, “Sobre a tradicion” 23) (Blanco, “Sobre a tradicion” 23)

A “actualizacao” / “adaptacao” e um processo que ajusta o poema ao novo meio geografico,social e cultural. Nos cancioneiros galego e portugues, e na quadra-padrao toponımica e religioso-profana que este procedimento, ligado a seleccao e substituicao de elementos, mais se verifica.Basta mudar o primeiro verso, inserindo um novo lugar ou outro santo e o lugar em que ele epadroeiro, para se dar a acomodacao:

Santo San Xusto da Fraga, Sao Goncalo d’Amarante,casamenteiro das vellas, Casamenteiro das velhas,por que nao casais as mozas, Por que nao casais as novas,que mal vos fixeron elas? Que mal vos fizeram elas?(Blanco, “Sobre a tradicion” 18) (Nogueira, Cancioneiro Popular de Baiao II: 35)

Assinalamos, por fim, uma tecnica intertextual muito importante para a recriacao textuale ideologica dos cancioneiros galego e portugues (e nao so): a “contaminacao”. Atraves desterecurso, a quadra oral e popular incorpora versos e segmentos de outros poemas, pertencentes ounao ao cancioneiro, em que podem entrar cumulativamente os outros processos de variacao. Estavariacao, de tipo sintagmatico, envolve o plano verbal e o tema do novo texto, que nao e o meroresultado da acumulacao de um patrimonio fixo de formulas.

A formula, seja um verso, um segmento de verso ou quase uma estrofe inteira, constituium esquema textual de pronta e contınua reutilizacao que devemos entender numa perspectivagerativista. Enquanto esquema rıtmico-formal e tematico, a formula constitui a base do processode contaminacao: faz parte de um conjunto de tecnicas e de capacidades que permitem a repeticaomas tambem a evolucao do cancioneiro, a partir da relacao entre a criatividade do poeta e a tradicaoem que se integra. A lexicalizacao da formula, em vez de acusar a pobreza da poetica popular etradicional, traz dinamismo ao cancioneiro (e a qualquer outro genero da tradicao oral).

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Entre estes poemas, que partilham a mesma formula inicial, ha uma relacao de parentesco quenao e meramente mecanicista, dependente apenas de um esquema rıtmico e metrico armazenadoe reproduzido automaticamente pela memoria:

Pasei pol-a tua porta, Passei pola tua porta,botei a man o ferrolho pu’la mao na fechadura:e a ladra da tua mai nao me quijestes abrir,meteume un pau por um ollo. coracao de pedra dura.(Lima 178) (Nogueira,Cancioneiro Popular de Baiao I: 130)

Pasei pola tua porta, Passei pela tua porta,pedınch’augua, non ma deches. Pedi-te agua, nao ma deste:Valgach’o demo, menina, Nem os moiros da Moiramaque tan cruel te fixeche. fazem o que tu fizeste!(Blanco, “Sobre a tradicion” 25) (Nogueira, Cancioneiro Popular de Baiao I: 130)

Muito comum na tradicao oral galega e talvez ainda mais na portuguesa, a formula “Passeipela tua porta”, e a serie de poemas galegos e portugueses de estrutura unitaria que a partir delase desencadeou, dizem-nos que a memoria tradicional e activa nao so por conservar discursos,temas e motivos, mas tambem porque os transforma.

Esta formula nao aparece nestas quadras a preencher um espaco vazio deixado por falhas dememoria. O facto de o verso formulıstico surgir no inıcio das varias quadras diz-nos que a suafuncao e mais activa. Ha uma interacao evidente entre os varios textos: quer entre aqueles quesao versoes de uma quadra arquetıpica, quer entre aqueles que apenas partilham a formula, queorigina sempre uma quadra de estrutura unitaria subordinada a tematica do amor contrariado ounao correspondido.Para concluir, apresentamos um exemplo que mostra como por vezes e possıvel compreender,por um lado, o processo de construcao da quadra, com base nos elementos que discutimos aproposito da variante, e, por outro, perceber tambem razoavelmente o que esta na origem de umadeterminada versao. A absorcao dinamica do patrimonio externo pelo patrimonio interno decorre,neste caso, de relacoes de proximidade e convivialidade. E o que acontece entre as duas quadrasseguintes, a que, no estudo aqui citado, Domingo Blanco ja se referiu de modo eloquente:

A cana verde no mar A cana verde no marbot’a raiz donde quer: navega por onde quer:ası fai o Portugues e como o moco solteirocando lle falt’a muller. enquanto nao tem mulher.(“Sobre a tradicion” 28) (“Sobre a tradicion” 28)

A quadra galega “semella unha imitacion parodica e ocasional da minota, aplicada a unhasituacion concreta na que o cantor ou cantora dirixen a cantiga a un portugues ( . . . ), precisamenteporque saben que e unha cantiga portuguesa, que ten como marca inconfundible a formula doprimeiro verso, moi frecuente en Portugal pero inexistente no cancioneiro de Galicia” (Blanco,“Sobre a tradicion” 28). Dirıamos apenas que nada nos assegura que a versao da Galiza tenhasido produzida por um galego ou uma galega. A hipotese de Domingo Blanco e a mais plausıvel,

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mas a quadra pode ter sido dita por um portugues ou uma portuguesa e acolhida imediatamentepor alguem da Galiza, sem, portanto, ter chegado a impor-se no cancioneiro portugues.

Nestas quadras de estrutura dicotomica, ha duas realidades distintas que, contudo, se rela-cionam entre si por analogia. Daı termos uma dicotomia que nao implica, como em muitasquadras, apenas justaposicao de elementos. As expressoes comparativas “ası fai” e “e como”ligam os dois dısticos e assinalam essa relacao: “A cana verde no mar” e o “Portugues” / “mocosolteiro” tem o mesmo comportamento.

Na versao galega, que assimila e transforma criativamente a quadra portuguesa apresentadapor Domingo Blanco ou outra equivalente, ve-se como a participacao psicologica e decisiva parao enriquecimento do cancioneiro (Nascimento, “Variantes e invariantes” 167). A intervencao, quenao deixa de preservar a invariante teorica, e, ou parece ser, voluntaria e consciente. O interprete-poeta quis deixar a sua marca individual numa versao cujas variantes sao formais. Ocorre a“substituicao por analogia sinonımica”: uma parafrase, no segundo verso, e uma comutacao,no terceiro, circunscrita a uma palavra. Poder-se-a ainda dizer que a substituicao de “mocosolteiro” (ou “rapaz solteiro”, noutras versoes) por “Portugues” faz da quadra galega uma varianteideologica, mas isto dependera sempre do modo como encararmos o texto: se virmos o termo“Portugues” num contexto de satira, essa leitura faz sentido. So assim poderemos aceitar quea mesma forma aceita um conteudo consideravelmente distinto, embora apenas ao nıvel daintencionalidade do texto e nao propriamente do seu significado profundo, que continua a seressencialmente o mesmo: a errancia ou a instabilidade do homem solteiro.

Por aqui se ve como a quadra oral encerra uma forca de conflito, uma dialectica de aberturae fechamento, de condensacao e derivacao de sentidos. Projectando-se num horizonte invariantecontinuamente evocado e reconstruıdo, esta forma breve e instabilidade e fragmentacao, mastambem totalidade e plenitude.

Resta-nos dizer que este estudo comparativo nao pretende ser mais do que um modestocontributo para o conhecimento de uma forma breve que em Portugal e na Galiza todos iden-tificam e consomem, muitos utilizam criativamente, mas cuja profundidade nem sempre lhe ereconhecida. Quisemos clarificar o funcionamento da quadra, que e tao breve e simples quantointegral e complexa, e, ao mesmo tempo, mostrar como entre duas culturas e dois povos circulamquadras cuja simplicidade esconde subtis artifıcios da poetica oral e popular mais conseguidae comunicativa. Este metodo serviu-nos para provar como e rica uma forma em que muitos sovem pobreza de expressao e de conteudos, e tambem para lembrar que a quadra continua a sera forma poetica por excelencia de portugueses e galegos, que, em grande parte atraves dela, seunem numa comunidade cuja visao e (re)criacao do mundo e essencialmente a mesma.

Notas1Chamamos versao a uma quadra de que ha varias ocorrencias registadas; e variante a cada um dos tracos distintivos

de uma versao em relacao a outras versoes.2Como bem observa o autor, a versao de que resulta a quadra galega e necessariamente esta (ou semelhante a esta),

publicada por Teofilo Braga em 1865 (137):

Fui ao Porto, fui a Braga,tambem fui ao Limoeiro;nao achei melhor amigoque a bolsa do meu dinheiro.

Ou talvez possamos pensar que a versao galega se apropriou de versos de duas versoes: a uma tera ido buscar “Fui aBraga ( . . . )” e a outra “tambem fui ao Limoeiro”, em vez de “fui ao Rio de Janeiro”.

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3“Noutras quadras, infelizmente muito numerosas, o sentido dos dois primeiros versos nada tem que ver com odos seguintes, revelando o poeta uma especie de incapacidade na ampliacao do pensamento basico, que irrompe, assim,abruptamente no segundo dıstico: Eu ja vi nascer o sol/ Numa bacia de prata:/ Menina, da os teus olhos/ A quem por elesse mata” (19).

4Repare-se nestas quadras:

O mar pediu a Deus aguaE os peixes a Deus fundura,Os homens a Deus riquezaE as mulheres formosura.

(Nogueira, Cancioneiro Popular de Baiao I: 46)A oliveira cortadaSempre fica oliveira;A moca casada cedoAinda julga que e solteira.

(Nogueira, Cancioneiro Popular de Baiao I: 68)

Obras citadas

Almeida Pavao, Junior, Jose de. Aspectos do Cancioneiro Popular Acoriano. Ponta Delgada: Universidade dos Acores,1981. Impressao.

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