O Nexo de Causalidade Na Responsabilidade

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Brasília a. 37 n. 145 jan./mar. 2000 213 1. Introdução Este trabalho procura evidenciar o nexo de causalidade como um dos requi- sitos que enseja ou exime a responsabili- dade imputada ao Estado. A relação de causalidade é o vínculo entre o dano produzido e a atuação do Estado. Na hipótese da demonstração da existência de tal vínculo, o Estado, que possui personalidade jurídica, responde pelo prejuízo causado à vítima, com direito de regresso contra o agente causador. O Es- tado indenizará a vítima e posteriormente poderá ingressar com ação regressiva con- tra o causador do dano. Quando não exis- tir o nexo causal, o Estado não responde pelo dano em casos de dolo ou culpa do agente. O dano para ser reparável precisa ser certo, especial, anormal, ferir uma situação protegida pelo sistema jurídico brasileiro, além de possuir um valor economicamente apreciável. O nexo de causalidade na responsabilidade patrimonial do Estado Bruno Luiz Weiler Siqueira Bruno Luiz Weiler Siqueira é Juiz do Trabalho Presidente da Segunda Vara do Trabalho de Cuiabá–MT – Tribunal Regional do Trabalho da 23 ª Região, pós-graduado e mestrando em Direito pela Universidade de Cuiabá – UNIC, Conveniada à UNESP/SP. Sumário 1. Introdução. 2. Considerações Gerais. 2.1. Fundamento da responsabilidade estatal. 2.2. Evolução histórica da responsabilidade patrimonial do Estado. 3. Nexo de causalidade. 3.1. Causas excludentes e atenuantes da res- ponsabilidade do Estado. 3.1.1. Força maior. 3.1.2. Culpa exclusiva da vítima ou de terceiro. 3.1.3. Culpa concorrente da vítima ou de terceiro. 3.2. Dano reparável. 3.3. Responsabili- dade objetiva do Estado. 4. Conclusão.

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Evolução da Responsabilidade Civil na Sociedade moderna

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1. IntroduçãoEste trabalho procura evidenciar o

nexo de causalidade como um dos requi-sitos que enseja ou exime a responsabili-dade imputada ao Estado.

A relação de causalidade é o vínculoentre o dano produzido e a atuação doEstado. Na hipótese da demonstração daexistência de tal vínculo, o Estado, quepossui personalidade jurídica, respondepelo prejuízo causado à vítima, com direitode regresso contra o agente causador. O Es-tado indenizará a vítima e posteriormentepoderá ingressar com ação regressiva con-tra o causador do dano. Quando não exis-tir o nexo causal, o Estado não respondepelo dano em casos de dolo ou culpa doagente.

O dano para ser reparável precisa sercerto, especial, anormal, ferir uma situaçãoprotegida pelo sistema jurídico brasileiro,além de possuir um valor economicamenteapreciável.

O nexo de causalidade na responsabilidadepatrimonial do Estado

Bruno Luiz Weiler Siqueira

Bruno Luiz Weiler Siqueira é Juiz doTrabalho Presidente da Segunda Vara doTrabalho de Cuiabá–MT – Tribunal Regional doTrabalho da 23 ª Região, pós-graduado emestrando em Direito pela Universidade deCuiabá – UNIC, Conveniada à UNESP/SP.

Sumário1. Introdução. 2. Considerações Gerais.

2.1. Fundamento da responsabilidade estatal.2.2. Evolução histórica da responsabilidadepatrimonial do Estado. 3. Nexo de causalidade.3.1. Causas excludentes e atenuantes da res-ponsabilidade do Estado. 3.1.1. Força maior.3.1.2. Culpa exclusiva da vítima ou de terceiro.3.1.3. Culpa concorrente da vítima ou deterceiro. 3.2. Dano reparável. 3.3. Responsabili-dade objetiva do Estado. 4. Conclusão.

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A principal questão de análise desteartigo é mostrar que o nexo de causalidadee o dano são os requisitos básicos para fixara responsabilidade patrimonial do Estadoou retirá-la.

Por fim, busca demonstrar que o Estado,para realizar suas funções, desmembra-seem órgãos e organismos, utiliza-se deaparelhagens complexas, além dos seusagentes. Ao desempenhar suas atividades,pode causar danos aos administrados,denominada responsabilidade extracon-tratual do Estado, a qual designa a obri-gação de reparar danos causados a terceirosem face de comportamentos comissivosou omissivos, materiais ou jurídicos, lícitosou ilícitos imputáveis aos agentes públicos.

2. Considerações geraisO termo nexo significa o vínculo,

ligação, união; enquanto causalidade é arelação de causa e efeito.

Nexo de causalidade expressa a ligaçãoentre a atividade do Estado e o danoproduzido ao administrado.

Responsabilidade Patrimonial do Estadoé a obrigação de reparar danos patri-moniais causados a terceiros por agentespúblicos no desempenho de suas funções,ou ainda a pretexto de realizá-las.

A responsabilidade estatal por condutasgeradoras de danos, seja por atos lícitos ouilícitos, seja pelo comportamento doExecutivo, Legislativo ou Judiciário, éimputada ao Estado, o qual possui perso-nalidade jurídica, e nunca à AdministraçãoPública.

Faz-se necessário diferenciar a respon-sabilidade patrimonial do Estado em doisaspectos: (a) contratual, em que existe umacláusula contratual que vincula o Estadoà reparação patrimonial; (b) extracon-tratual, em que o Estado tem a obrigaçãode reparar, em face do próprio sistemajurídico, por comportamentos comissivosou omissivos, lícitos ou ilícitos.

O nexo de causalidade é um aspectonovo nas teorias da responsabilidade

brasileira. Ele surge com a Constituição de1946, art. 194, substituindo a teoria subje-tiva, baseada na culpa civil pela teoriaobjetiva fundamentada no nexo de causa-lidade entre o dano produzido e a atuaçãoestatal. É a responsabilidade direta do enteestatal, fator esse conservado pela Cons-tituição Federal de 1967 e pela EmendaConstitucional nº 1 de 1969, ou ConstituiçãoFederal de 1969, e ainda pela ConstituiçãoFederal de 1988 em seu art. 37 º , § 6º ,atribuindo o direito estatal em ação regres-siva contra o agente causador do dano, noscasos de dolo ou culpa.

2.1. Fundamento daresponsabilidade estatal

O fundamento da responsabilidadepatrimonial do Estado baseia-se no prin-cípio da igualdade de situação dos indiví-duos perante os encargos públicos, nasatividades lícitas, e no princípio dalegalidade, nas atividades ilícitas.

A responsabilidade, regida por normasde Direito Público, serve como garantia dainvulnerabilidade dos direitos básicos doindivíduo diante da atuação da Adminis-tração Pública.

Diógenes Gasparini afirma que, noscasos dos atos lícitos, como a construçãode um calçadão que impede a utilizaçãode um prédio, construído e regularmenteusado como garagem, o fundamento é oprincípio da distribuição igualitária dosônus e encargos a que estão sujeitos osadministrados. Alega que, se o serviço oua obra é de interesse público, porém causadano a terceiro, toda a comunidade deveresponder por ele, por meio da indenização,a qual é paga com os tributos recolhidosde todos, inclusive do prejudicado.

O referido autor afirma que, no casodos atos ilícitos (descumprimento da lei),o fundamento é a própria violação dalegalidade, como ocorre quando o Estadose apossa de área particular em nome dointeresse público, acontecendo o esbulho,e, por ter praticado ato ilícito, vê-se na

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contingência de ressarcir a vítima, no casoo proprietário espoliado. Observe-se queo agente público autor do ato ou compor-tamento ilícito é obrigado a recompor, àcusta do seu, o patrimônio público, desfal-cado com o ressarcimento dos prejuízossofridos pela vítima1 .

2.2. Evolução histórica da responsabilidadepatrimonial do Estado

A Administração Pública viveu dife-rentes fases na teoria da responsabilidade,através das quais deparamo-nos com trêsteorias, quais sejam:

nível que o súdito, em desrespeito à suasoberania2 .

A teoria da irresponsabilidade doEstado (Regaliana ou Feudal) foi trazidapara o Brasil-Colônia, entretanto foinegada e combatida por muitos juristas elegisladores, pois o administrado suportavasozinho os danos originários da ação ouomissão estatal.

No período Imperial, segundo JoséCarlos de Oliveira, a responsabilidadepatrimonial do Estado é caracterizada pordisposições normativas referentes à res-ponsabilidade civil do Estado; a CartaMagna brasileira de 1824, em seu artigo179, inciso 29, determinava a responsabi-lidade dos empregados públicos em face dosabusos e omissões praticados no exercíciode suas funções, exceto o Imperador (art.99), que gozava do privilégio da irrespon-sabilidade3 .

As Cartas Magnas de 1824 e 1891previam a responsabilidade do funcio-nário nas hipóteses de abusos ou omissões,entretanto não estabeleciam a responsa-bilidade estatal. Maria Sylvia Zanella DiPietro afirma que nessa fase havia leisordinárias prevendo a responsabilidadedo Estado, recebidas pela jurisprudênciacomo sendo solidária com a dos funcio-nários, como, por exemplo, os danoscausados por estrada de ferro, por colocaçãode linhas telegráficas, pelos serviços decorreio4 .

O Código Civil Brasileiro, Lei nº 3.071de 1º de janeiro de 1916, em seu artigo 15,dispunha que

“as pessoas jurídicas de direitopúblico são civilmente responsáveispor atos de seus representantes quenessa qualidade causem danos aterceiros, procedendo de modo con-trário ao direito ou faltando a deverprescrito por lei, salvo direito regres-sivo contra os causadores do dano”.

Nota-se que a expressão “modo con-trário ao direito” possibilita a idéia deculpa ou dolo do funcionário, logo, exigindo

Teorias

a - da irresponsabilidade

b - civilista

c - publicista

- atos de império e gestão

- da culpa civil ou da respon-sabilidade subjetiva

- da culpa administrativa ouculpa do serviço público

- do risco integral ou adminis-trativo ou teoria da respon-sabilidade objetiva

{{ { No Brasil, a análise da evolução da res-

ponsabilidade patrimonial estatal ofereceas seguintes fases: irresponsabilidade,civilista e no próprio plano do direitopúblico.

A Teoria da Irresponsabilidade do Estado– destacou-se no período dos EstadosAbsolutistas, negando a obrigação deindenizar os prejuízos gerados pelosagentes do Estado no desempenho de suasfunções aos administrados.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro asseveraque essa teoria repousava na idéia desoberania, em que o Estado dispõe deautoridade incontestável perante o súdito;ele exerce a tutela do direito, não podendo,por isso, agir contra ele; daí os princípiosde que o Rei não pode errar e de que aquiloque agrada ao Príncipe possui força de lei.Qualquer responsabilidade atribuída aoEstado significaria colocá-lo no mesmo

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do administrado tal comprovação (respon-sabilidade subjetiva).

A Constituição de 1934, artigo 171,estabelece que os funcionários são respon-sáveis solidariamente com a FazendaNacional, Estadual ou Municipal porquaisquer danos originários de negli-gência, omissão ou abuso no exercício desuas funções. Esse aspecto será conservadopela Constituição de 1937, retirandoapenas os dois parágrafos do texto consti-tucional anterior que determinava acitação do funcionário como litisconsortee a execução regressiva contra o funcio-nário causador do dano.

A Constituição de 1946, no art. 194,determinava que as pessoas jurídicas dedireito público interno eram civilmenteresponsáveis pelos danos que seus funcio-nários, nessa qualidade, causassem aterceiros, estipulando a ação regressivacontra os funcionários causadores do danoquando tivesse havido culpa destes.

O elemento culpa só é previsto paraassegurar a ação regressiva. A teoriasubjetiva fundada na culpa civil é, pelonovo texto constitucional, substituída pelateoria da responsabilidade objetiva, em quea responsabilidade do Estado é direta,baseada na relação de causalidade entre odano sofrido pelo administrado e a atuaçãoda Administração Pública causadora dodano.

A Constituição de 1967 repete a deter-minação da Constituição Federal de 1946,seguindo a mesma linha a Emenda Cons-titucional nº 01 de 1969, conhecida comoConstituição Federal de 1969. A autorareferida, ao analisá-las, concluiu que, apartir da Constituição de 1946, ficouconsagrada a teoria da responsabilidadeobjetiva do Estado, sendo que se o dispo-sitivo só exige culpa ou dolo para o direitode regresso contra o funcionário é porquenão quis fazer a mesma exigência para aspessoas jurídicas. Afirma ainda que nodispositivo constitucional estão compre-endidas duas regras: a da responsabilidade

objetiva do Estado e a da responsabilidadesubjetiva do funcionário5 .

A Constituição Federal de 1988 estabe-lece em seu art. 37, § 6º:

“As pessoas jurídicas de direitopúblico e as de direito privadoprestadoras de serviços públicosresponderão pelos danos que seusagentes, nessa qualidade, causarema terceiros, assegurado o direito deregresso contra o responsável noscasos de dolo ou culpa”.

A obrigação de reparar o dano peloEstado existirá quando ficar demonstradoo nexo de causalidade entre o dano sofridoe o ato da administração, independente deculpa do servidor. Porém, não são todosos danos que ensejam responsabilidade;nos atos lícitos, responde quando houverimputação, nexo de causalidade e o danofor certo, não-eventual e possível, bemcomo anormal e especial; nos atos ilícitos,fundamentado no princípio da legalidade,bastando o preenchimento dos requisitosda imputabilidade e do nexo de causali-dade, todos os danos certos, não eventuaise possíveis serão indenizados; além disso,existem circunstâncias em que o Estadoatua com extrema potencialidade de risco,logo, se houver danos, responderá por eles,como é o caso de paiol de munição doExército ou usina nuclear.

Celso Antônio Bandeira de Melloestuda os danos dependentes de situaçãoproduzida pelo Estado diretamente propi-ciatória e alega que, sem ser o geradorimediato do dano, entra decisivamente emsua linha de causação. O caso mais comum,embora não único, é o que deriva daguarda, pelo Estado, de pessoas ou coisasperigosas, em face do que o Poder Públicoexpõe terceiros a risco. Servem de exemploso assassinato de um presidiário por outropresidiário; os danos nas vizinhançasoriundos de explosão em depósito militarem decorrência de um raio; lesões radio-ativas oriundas de vazamento em centralnuclear cujo equipamento protetor

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derrocou por avalancha ou qualqueroutro fenômeno da natureza. Em todosesses casos, o dano liga-se, embora media-tamente, a um comportamento positivo doEstado. Sua atuação é o termo inicial deum desdobramento que desemboca noevento lesivo, incindivelmente ligado aosantecedentes criados pelo Estado6 .

Analisando a Constituição Federal de1988, art. 37, § 6º , Hely Lopes Meirellesrevela que foi estabelecido para todas asentidades estatais e seus desmembra-mentos administrativos a obrigação deindenizar o dano causado a terceiros porseus servidores, independente da prova deculpa na produção do dano. Firmou,portanto, o princípio objetivo da respon-sabilidade sem culpa pela atuação lesiva dosagentes públicos e seus delegados7.

Na responsabilidade objetiva do Estado,ocorre a substituição da responsabilidadeindividual do servidor pela do PoderPúblico, por sua ação ou omissão.

As causas excludentes ou atenuantes,como a força maior, culpa exclusiva ouconcorrente da vítima ou de terceiros, sãoutilizadas pelo Estado como forma deeximir-se ou diminuir sua responsabilida-de sobre o dano ao mesmo imputado.

3. Nexo de causalidadeNexo de causalidade é o vínculo, o elo

entre a atividade estatal e o dano produ-zido ao terceiro. Ele surge da obrigaçãoextracontratual entre o sujeito estatal e oparticular.

A reparação desse prejuízo causadopela Administração Pública a terceiros pormeio de seus agentes pode ser obtidaamigavelmente ou mediante a ação deindenização . A Constituição Federal de1988, art. 37, § 6º , determina que, umavez imputado o dano ao Estado, e estejulgado responsável, indenizará a vítima,porém fica com o direito de ação regres-siva contra o servidor que tiver agido comculpa ou dolo.

Verifica-se que a pessoa jurídica é oEstado e não a Administração Pública;assim, o Estado responde perante a vítimae esse tem o direito de regresso contra seuagente que tenha agido com dolo ou culpa.

Segundo Yussef Said Cahali, o prejuízode que se queixa o administrado precisater conseqüência direta ou indireta daatividade ou omissão do Poder Público:

“a responsabilidade da Administra-ção Pública, desvinculada de qual-quer fator subjetivo, pode, por isso,ser afirmada independentemente dedemonstração de culpa – mas estásempre submetida, como é óbvio, àdemonstração de que foi o serviçopúblico que causou o dano sofridopelo autor” (RJTJSP, 68:145)8 .

Assevera o doutrinador acima referidoque a causa geradora do dano poderá serrepresentada por uma atividade lícita,normal, da Administração Pública, comotambém por ato anormal, ilícito, de seusagentes; para a determinação da respon-sabilidade civil do Estado, exige-se, porém,a presença de um nexo causal entre o danoe a atividade ou omissão da AdministraçãoPública, ou de seu nexo com o ato dofuncionário, mesmo que lícito ou regular.Demonstrado o liame causal, a decor-rência do dano à causa da atividade ouomissão da Administração Pública, ou deseus funcionários, exsurge daí o dever deindenizar (RT, 484:68, 539:174).

3.1. Causas excludentes ou atenuantes daresponsabilidade do Estado

Ao ser imputado um dano ao Estado,este pode utilizar-se das causas excluden-tes para eximir-se da responsabilidade oupara atenuá-la, por meio das quais deve-rá demonstrar a ocorrência exclusiva ouconcorrente de força maior, culpa exclu-siva ou concorrente da vítima ou de ter-ceiro. Caso inexista a relação de nexo en-tre o prejuízo e a ação estatal está desca-racterizada sua responsabilidade.

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3.1.1. Força maior

A força maior é um acontecimentoexterno, estranho à vontade humana,imprevisível e inevitável.

José Carlos de Oliveira cita casos comoo das águas do Rio Ribeira (SP), queatingiram 10 metros acima do nívelnormal do rio, deixando mais ou menos 400famílias desabrigadas e muitos prejuízos.Em 1937, acontece a maior enchente dahistória do município, atingindo 14 metrosacima do nível normal. Em Cuiabá, o rioatinge 9,60 metros acima do normal,ocasionando desabrigo à população ribei-rinha. Nesses casos, diferentemente dasenchentes ocasionadas por obstrução ouinsuficiência de vazão das galerias cole-toras de águas pluviais, o administradodeve questionar sobre a existência depossibilidade da atuação estatal paraminorar as conseqüências do evento. Nãoexistindo meios para evitar o que já setornou previsível, o Poder Público libera-se da obrigação de recompor o patri-mônio do cidadão. Trata-se de fenômenoinevitável.

Registre-se, como leciona o ilustreautor, que

“a força maior, quando é a únicacausa ensejadora do dano, liberasempre e integralmente o erário.Mas se a culpa do poder públicoconcorreu com a força maior narealização do prejuízo, a vítima temsempre direito a uma reparação”.

3.1.2. Culpa exclusiva da vítimaou de terceiro

A culpa exclusiva da vítima ou deterceiro ocorre quando a vítima ou oterceiro é o próprio causador do prejuízoe não o Estado, não existindo a relaçãocausa e efeito entre o dano e a ação estatal.

Colhe-se da jurisprudência, verbis:“Para a obtenção de indenização

da Fazenda Pública basta que oautor da ação demonstre o nexocausal entre o fato lesivo imputável

à Administração e o dano, sem quereste comprovado que a vítima con-correu com culpa ou dolo para oevento danoso”(TJSP – 7ª C – Ap. –Rel. Leite Cintra – J. 23-6-93 – JTJ –LEX 148/75)9.

“Ocorrendo culpa exclusiva davítima que sofreu o dano, deixa deexistir o imprescindível nexo causaljustificador da atribuição da respon-sabilidade objetiva do Estado”(STF– 1ª T – RE – Rel. Moreira Alves – J.25-5-93 - JTJ - LEX 145/274)10 .

3.1.3. Culpa concorrente da vítimaou de terceiro

A culpa concorrente da vítima ou deterceiro não é motivo suficiente paracomprovara a ausência do nexo causalentre a atuação do Estado e o dano ocor-rido, sendo que, na referida hipótese, ficaautorizada a redução do valor da indeni-zação a ser paga pelo Estado, como éexemplo o seguinte julgado, verbis:

“Responsabilidade civil – FazendaPública – Vítima que veio a sertombada na galeria de águas plu-viais – falta de sinalização eviden-ciando perigo – vítima que tinhaconsciência do perigo a que se expu-nha, mas mesmo assim se arriscou apassar no local – conseqüência deculpa – indenização devida pelametade (Yussef Said Cahali, respon-sabilidade civil do Estado, nº 14, p.44-5, Revista dos Tribunais, 1982; 2ªTurma do STF, 4-5-1970)”11.

O caso fortuito é considerado aqueleevento interno, acidente decorrente dopróprio serviço, imprevisível, o qual nãoteve a participação do Estado ou dohomem. Não é considerado como causaque possa eximir ou diminuir a responsa-bilidade do Estado, como é o entendimentodo ilustre jurista Celso Antônio Bandeirade Mello, para quem

“... o caso fortuito não é utilmenteinvocável pois, sendo um acidentecuja raiz é tecnicamente desco-

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nhecida, não elide o nexo entre ocomportamento defeituoso do Estadoe o dano assim produzido. O porquêda incorreta atuação do Estado nãointerfere com o dano objetivo rele-vante, a saber: ter agido de modoa produzir a lesão sofrida poroutrem...” 12

Nesse mesmo sentido é a lição de RuiStoco, para o qual

“... sendo o caso fortuito um acidentedecorrente de causa desconhecida,não tem o condão de elidir o nexoentre o comportamento defeituosodo Estado e o dano produzido”13.

E ainda os ensinamentos de MariaSylvia Zanella Di Pietro, que leciona

“... já na hipótese de caso fortuito, emque o dano seja decorrente de atohumano, de falha da administração,não ocorre a mesma exclusão;quando se rompe, por exemplo, umaadutora ou um cabo elétrico, cau-sando dano a terceiros, não se podefalar em força maior...”14

Observa-se ainda o Concurso de Causasou Concausa, quando concorrem mais deuma causa para a produção do dano, logo,o Estado será responsabilizado tambémquando colaborar para a realização dodano.

Concorrência da responsabilidade obje-tiva e subjetiva:

“Responsabilidade objetiva doMunicípio, provado o nexo de causae efeito, pela explosão em pedreirade sua propriedade, que vitimou ummenor a 500 m de distância. Ocor-rência também de responsabilidadesubjetiva, em virtude de culpa daAdministração Pública (TJRS – 3ªC – Ap. Rel. Galeno Lacerda – RT575/227)15 .

Comprovado que não existe o nexocausal entre o dano gerado e a atividadeda Administração Pública, inexiste igual-mente a responsabilidade estatal em indeni-zar a vítima. O Estado não é obrigado a

indenizar se não deu causa ao dano.Demonstradas também as causas excluden-tes, pode-se eximir ou atenuar a obrigaçãodo Estado pelo dano produzido.

3.2. Dano reparávelNem todos os danos são reparáveis.

Atualmente existe a teoria da responsabi-lidade patrimonial por todos atos ilícitos,lícitos e em alguns casos por risco integral.

Na responsabilidade por atos lícitos,fundamentada no princípio da igualdade,são ressarcidos os danos que além de seremcertos, não-eventuais e possíveis, tambémsejam anormais e especiais, desde queexista o nexo de causalidade e a imputação.

Na responsabilidade por atos ilícitos,fundamentada no princípio da legalidade,todos os danos certos, possíveis e não-eventuais serão indenizáveis, enquanto nateoria do risco integral ou excepcional,todos os danos serão indenizáveis, tendoem vista a própria atividade do Estado dealta potencialidade de risco, como é o casode usina nuclear, paiol de munição doExército, sendo nesta descartada a possi-bilidade das excludentes ou atenuantes.

Diógenes Gasparini alega que o danosó é reparável pela Administração Públicacausadora do evento danoso se for certo(possível, real, efeito, presente – exclui-se,pois, o dano eventual, i. e., o que poderáacontecer), especial (individualizado,referido à vítima, pois, se geral, configu-raria ônus comum à vida em sociedade),anormal (excedente aos inconvenientesnaturais dos serviços e encargos decorren-tes do viver em sociedade), referente a umasituação protegida pelo direito (incidentesobre uma atividade lícita; não são prote-gidos, por exemplo, os danos decorrentesda destruição de uma plantação de maco-nha) e de valor economicamente não apre-ciável (não tem sentido a indenização dedano de valor econômico irrisório).

O dano que não apresentar, ao mesmotempo, essas características não é repará-vel pelo Poder Público que lhe deu causa16.

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A indenização do dano, segundo HelyLopes Meirelles, deve abranger o que avítima efetivamente perdeu, o que des-pendeu e o que deixou de ganhar emconseqüência direta e imediata do atolesivo da Administração, ou seja, o danoemergente e os lucros cessantes, bem comohonorários advocatícios, correção mone-tária e juros de mora, se houver atraso nopagamento. A liquidação desses prejuízosserá realizada conforme os preceitoscomuns (CC, arts. 1.059 a 1.064, e CPC,arts. 603 a 611). Liquidados os danos oufixados na própria sentença condenatória,o que é sempre conveniente, para evitaras delongas da execução, segue-se arequisição do pagamento devido pelaFazenda Pública (arts. 730 e 731 do CPCcombinado com o art. 100 da ConstituiçãoFederal de 1988). O não-atendimentodessa requisição autoriza o seqüestro daquantia necessária, depois de ouvido ochefe do Ministério Público, e, se frustradaessa providência, o caso será de interven-ção federal na entidade devedora, pordescumprimento da ordem ou decisãojudicial.

Na hipótese de não existir verba parao cumprimento da condenação, o ilustreautor leciona que a autoridade compe-tente do Executivo, ou o dirigente daautarquia, deverá providenciar imedia-tamente a obtenção de crédito especialpara o pagamento devido, sob pena deincidir pessoalmente no crime de desobe-diência a ordem legal (CP, art. 330), semprejuízo da providência constitucional17 .

3.3. Responsabilidade objetiva do Estado

A teoria da responsabilidade objetivasurge com a Constituição Federal de 1946,substituindo a subjetiva baseada na culpado serviço. O texto constitucional de 1946estabelece a responsabilidade direta doEstado, exigindo culpa ou dolo do funcio-nário apenas para estabelecer o direitoregressivo do Estado contra seu agente.

A Constituição Federal de 1988 deter-mina que a pessoa jurídica de direitopúblico responderá toda vez que compro-var o nexo de causalidade entre o ato daadministração e o prejuízo gerado, inde-pendentemente de culpa.

O nexo de causalidade e o dano, con-forme José Carlos de Oliveira, são requi-sitos para estabelecer a responsabilidadeda pessoa jurídica. Compete ao autor aprova de que a atividade ou a omissão aum dever estatal foi a causa que produziuos prejuízos injustamente suportados, emque o administrado foi lesado em seudireito, que não estava legalmente obrigadoa suportar, ocasionando um dano certo.

Para caracterizar a responsabilidadepatrimonial extracontratual do Estado, énecessário demonstrar quando seu com-portamento foi causa do dano e quais ascaracterísticas do dano que lhe podem serimputadas18 .

A objetividade da responsabilidadepatrimonial do Estado expressa a ausência/exclusão do elemento subjetivo baseado naculpa e, segundo a Constituição Federal de1988, art. 37, § 6º, exige: pessoa jurídica dedireito público ou de direito privadoprestadora de serviços públicos; a prestaçãode serviços públicos; a existência de umdano causado a terceiros por agentesestatais e que o agente gere o dano naquelaqualidade.

Pode-se compreender que, dentrodessa teoria da responsabilidade objetivado Estado, existe uma subdivisão:

a) Responsabilidade por ato lícito.Dano certo e não-eventual, possívele, ainda, anormal e especial; impu-tabilidade e nexo de causalidade;

b) Responsabilidade por ato ilícito .Princípio da legalidade; indenizatodo dano certo, não-eventual epossível; imputabilidade e nexo decausalidade;

c) Responsabilidade por risco inte-gral. Em algumas situações nas quaisa Administração Pública atua com

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alta potencialidade de risco (ex:usina nuclear); imputabilidade enexo de causalidade.

Almiro do Couto e Silva, diz que anoção da responsabilidade objetiva esta-belecida na Constituição Federal de 1988,art. 37, § 6º, demonstra dupla vantagem:dá tratamento unitário à responsabilidadeextracontratual do Estado, eliminando adistinção tradicional entre responsabili-dade por atos lícitos e ilícitos, acolhida peloCódigo Civil, e supera as diferentesespécies de responsabilidade conhecidas(por culpa individual, por falha ou culpado serviço, por risco, pela distribuiçãodesigual dos encargos públicos), apagandoou pelo menos empalidecendo a impor-tância de cada uma delas para fundi-lasem conceito mais abstrato e dilatado, demodo a proporcionar, assim, o maioramparo possível à vítima. Esta só não seráreconhecida caso tenha culpa exclusiva naprodução do evento ou o dano resulteexclusivamente de força maior ou de fatode terceiro, portanto, se não existir nexode causalidade entre a ação ou omissão doEstado e o dano.

Leciona o referido autor que, verificadoo dano, a vítima terá apenas de demons-trar que é indenizável (certo e não-eventual) e a existência de nexo de causa-lidade entre ele e a ação ou omissão dapessoa jurídica de direito público ou dapessoa jurídica da administração públicaindireta prestadora de serviço público,para que fique caracterizada a responsa-bilidade. Dispensável, pois, será quecomprove ou até mesmo que alegue, porexemplo, a culpa do agente do PoderPúblico. O Estado é que, para eximir-se daresponsabilidade ou atenuá-la, terá deprovar a culpa exclusiva ou concorrenteda vítima ou de terceiro, ou a ocorrênciaexclusiva ou concorrente de força maior,conforme o caso. Sendo objetiva a respon-sabilidade, nada lhe adiantará provar quenão teve culpa. A discussão sobre a culpado agente só é pertinente na ação deregresso que o Estado contra ele propuser19.

Eduardo Enterria e Tomas-Ramon afir-mam que

“La existencia de una relacion decausa a efecto entre el hecho que seimputa a la Administración y el dañoproducido es, lógicamente, una condi-ción indispensable para que puedaatribuirse a aquélla el deber de rasorcirdicho daño. Es, pues, necesario en estemomento analizar el problema de larelación de causalidad, es decir, precisarlos criterios en base a los cuales puedaafirmarse que una determinada acti-vidad (en nuestro caso la actividadadministrativa a la que se refiere lafórmula legal ‘funcionamiento normalo anormal de los servicios públicos’) esla causa de la lesión patrimonial”20 .

ATUAÇÃO ESTATAL DANO

a) Poder Executivob) Poder Judiciárioc) Poder Legislativo

a) certob) possívelc) não-eventuald) anormale) especial

NEXO DECAUSALIDADE

Outro aspecto polêmico é a partici-pação de entes públicos no dano. JoséCarlos de Oliveira afirma que, existindooutros entes públicos responsáveis pelacalamidade, todos eles são solidariamenteresponsáveis. A indenização pode serexigida integralmente de qualquer deles,porquanto nesses casos a responsabilidadedecorrente da culpa anônima do serviçose aproxima da culpa, como anotou oMinistro Themístocles Cavalcanti, emjulgado do STF, pela omissão em tomar asprovidências exigidas para a segurança doserviço (RTJ 1969, v. 47, p. 381).

O ilustre autor afirma ainda que, noplano da responsabilidade das pessoas dedireito público, vigora a solidariedade pelodever de reparação, de modo que o entemais diretamente ligado ao evento podeser demandado pelo total da indenizaçãoe posteriormente voltar-se contra as outras

{ {

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entidades públicas eventualmente respon-sáveis pelas conseqüências reparatóriasdo fato danoso21.

É notório que, para ensejar responsa-bilidade estatal, faz-se necessária a exis-tência de um comportamento injusto doEstado em qualquer dos três poderes ouatividade, podendo o dano advir de umaconduta lícita (certo, possível e não-eventual e, ainda, anormal e especial),ilícita (certo, possível e não-eventual),comportamento omissivo ou comissivo,além de apresentar o nexo de causalidadeentre o dano produzido e a participaçãodo Estado de forma global ou parcial nalesão de um direito da vítima.

O referido autor assegura que, sendo aresponsabilidade uma conseqüência sócio-jurídica da falta cometida, pode o gruposocial aplicá-la ou não, ainda que patenteo dano e identificado o autor. Assim, ascoisas não acontecem no plano naturalís-tico, do ser, e sim no normativo, do dever-ser, motivo pelo qual a sanção não tem ocaráter de necessidade e sim de contin-gência, tanto podendo suceder como não23.

Entende-se que a reparação de umdano baseia-se na delimitação do nexocausal do dano ressarcível e não do fatoque o produziu. E ele será ressarcívelquando for anormal, especial, certo, não-eventual, possível e lesar um direito davítima.

Celso Antônio Bandeira de Melloanalisa o assunto, dizendo que não bastapara caracterizá-lo a mera deterioraçãopatrimonial sofrida por alguém. Não ésuficiente a simples subtração de uminteresse ou de uma vantagem que alguémpossa fruir, ainda que legitimamente.Importa que se trate de um bem jurídicocuja integridade o sistema normativoproteja, garantindo-o como um direito doindivíduo.

O festejado autor menciona comoexemplo o caso da mudança de uma escolapública, de um museu, de um teatro, deuma biblioteca, de uma repartição, quepodem representar para comerciantes eprofissionais instalados em suas imedia-ções evidentes prejuízos, na medida emque lhes subtrair toda a clientela naturalderivada dos usuários daqueles estabeleci-mentos transferidos. Não há dúvida deque os comerciantes e profissionais vizi-nhos terão sofrido um dano patrimonial,inclusive porque o “ponto” ter-se-á desva-lorizado. Mas não haverá dano jurídico24.

O ilustre professor de Direito Adminis-trativo Almiro do Couto e Silva 25 lecionaque, pela responsabilidade objetiva doEstado, verificado o dano, a vítima teráapenas de demonstrar que é indenizável(que não é, por exemplo, incerto ou

Atos lícitos Ressarcimento Responsabilidadesatisfatória

Atos ilícitos Indenização Responsabilidadereparatória

Transcrevo o seguinte julgado, verbis:“Responsabilidade Civil – Indeni-

zação – Ação contra Municipalidade– Desmoronamento de muro porinvasão de águas – Má conservaçãode córrego – Muro lateral de pro-priedade vizinha construído semobservação das exigências técnicas– Concorrência de culpa – Indeni-zação devida por metade (SydneySanches, presidente e relator, nº270.087 reexame, S. Paulo, 28/Maio/1980, 6ª Câmara do 1º Tri-bunal de Alçada Civil)22.

Juary C. Silva analisa o nexo de causa-lidade e a conseqüência na responsabili-dade no plano naturalístico, normativo efilosófico, afirmando que a responsabili-dade se reveste desses aspectos em face dasua dualidade básica: primeiro o nexocausal, operante no mundo fático, entre oato cometido e o dano. Depois o vínculojurídico (ou pelo menos social), emergenteda constatação do dano provocado e dasua imputação à pessoa do agente. Estesegundo não é naturalístico, porém socialou jurídico, operante no plano cultural.

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eventual) e a existência de nexo de causa-lidade entre ele e a ação ou omissão dapessoa jurídica de direito público ou dapessoa jurídica na Administração Públicaindireta prestadora de serviços públicos,para que fique caracterizada a responsa-bilidade. Registrando-se ser dispensável,que comprove ou até mesmo que alegue,por exemplo, a culpa do agente do poderpúblico. O Estado é que, para excluir-se daresponsabilidade ou diminuí-la, terá deprovar a culpa exclusiva ou concorrenteda vítima ou de terceiro, ou a ocorrênciaexclusiva ou concorrente de força maior,conforme o caso. Tratando-se de respon-sabilidade objetiva, de nada adiantará aoEstado provar que não teve culpa, vistoque a discussão sobre a culpa do agenteque, nessa qualidade, causar danos aterceiros só é pertinente em eventual açãode regresso que o Estado contra ele ajuizar.

Temos, portanto, a responsabilidadeobjetiva do Estado e a responsabilidadesubjetiva do seu agente.

4. ConclusãoA Constituição da República Federativa

do Brasil, por meio do seu artigo 37, § 6º,estabelece que as pessoas jurídicas dedireito público e as de direito privado pres-tadoras de serviços públicos responderãopelos danos que seus agentes, nessa quali-dade, causarem a terceiros, assegurado odireito de regresso contra o responsávelnos casos de dolo ou culpa.

A responsabilidade objetiva fixada pelotexto constitucional exige como requisitopara que o Estado responda pelo dano quelhe for imputado a fixação do nexo causalentre o dano produzido e a atividadefuncional desempenhada pelo agenteestatal. Responde o Estado pela indeni-zação ou ressarcimento, pois é ele quepossui a personalidade jurídica para tal enão a Administração Pública, recompondoo patrimônio lesado, e tem o direito dereembolso daquilo que despendeu, pormeio da ação regressiva contra o agente

causador do dano nos casos de dolo ouculpa daquele.

Observa-se que a responsabilidadeobjetiva do Estado surge com a Consti-tuição Federal de 1946, sendo mantida nasconstituições seguintes. Estabelecido oliame causal e o dano for indenizável/ressarcível, ou seja, certo, possível, não-eventual, especial e anormal, estabelecer-se-á a obrigação estatal de indenizar avítima nos casos de atos ilícitos e ressarcirnas hipóteses dos atos lícitos, sendo que,para os danos decorrentes de atividadesde risco integral, basta a imputabilidade ea demonstração do nexo de causalidade.

Cabe ao Estado, para eximir-se de suasresponsabilidades sobre o dano ou atenuá-las, utilizar-se das causas excludentes(força maior exclusiva ou concorrente,culpa exclusiva ou concorrente da vítimaou de terceiro).

É evidente que pode acontecer danosuscetível de reparação estatal não apenasna ação como na omissão, a qual poderáestar presente em qualquer dos trêspoderes do Estado.

Conclui-se que o nexo causal e o danoindenizável são requisitos essenciais paraensejar a responsabilidade patrimonial doEstado, cabendo à vítima apenas demons-trar que o comportamento estatal foi acausa única ou concorrente do dano, logoa relação de causa e feito é indispensávelpara imputar ao Estado a obrigação deressarcir ou indenizá-la.

Notas1 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 3.

ed. São Paulo : Saraiva, 1993. p. 618.2 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Admi-

nistrativo. 5. ed. São Paulo : Atlas, 1995. p. 409-410.3 OLIVEIRA, José Carlos de. Responsabilidade Patri-

monial do Estado: danos decorrentes de enchentes, ven-davais e deslizamentos. Bauru : Edipro, 1995, p. 21.

4 DI PIETRO, op. cit., p. 413.5 DI PIETRO, op. cit., p. 414.6 MELLO, Antônio Bandeira de. Curso de Direito

Administrativo. 8. ed. São Paulo : Malheiros Editores,1996. p. 585-595.

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7 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito AdministrativoBrasileiro. 20. ed. São Paulo : Malheiros Editores, 1995.p. 561.

8 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil:doutrina e jurisprudência. 2. ed. São Paulo : Saraiva,1988. p. 376.

9 Oliveira, op. cit., p. 48.10 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpre-

tação jurisprudencial: doutrina e jurisprudência. 3. ed.São Paulo : Revista dos Tribunais, 1997. p. 379.

11 Cahali, op. cit., p. 393.12 MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Admi-

nistrativo. 8. ed. São Paulo : Malheiros Editores, p. 597.13 Stoco, op. cit., p. 383.14 Di Pietro, op. cit., p. 415.15 Stoco, op. cit., p. 379.16 Gasparini, op. cit., p. 623-624.17 Meirelles, op. cit., p. 565.18 Oliveira, op. cit., p. 45.19 SILVA, Almiro do Couto e. A responsabilidade

extracontratual do Estado no Direito. Revista do DireitoAdministrativo. Rio Janeiro : Livraria e Editora RenovarLtda, v.1. 1991. p. 23.

20 ENTERRIA, Eduardo Garcia de. Curso de DerechoAdministrativo II. [s. l.] : Civitas, p. 394.

21 Revista dos Tribunais. a. 70, v. 550, ago. 1981.p. 106.

22 Revista dos Tribunais. São Paulo : RT, a. 70, v. 550,ago. 1981. p. 106.

23 SILVA, Juary C. A responsabilidade do Estado poratos judiciários e legislativos: teoria da responsabilidadeunitária do poder público. São Paulo : Editora Saraiva,1985. p. 10-12.

24 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Responsabili-dade extracontratual do estado por comportamentosadministrativos. São Paulo : Revista dos Tribunais, n.552, s.d. p. 18.

25 Silva, op. cit., p. 23.

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