25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax...

16
23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax início 11.00 Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril Jovem» 15.00 Porto Organizaçªo do IPJ «Uma Revoluçªo Desenhada» - BD 17.00 Coimbra Organizada pelo Centro de Documentaçªo 25 de Abril c/ apoio da Bedeteca de Lisboa (inaugurada dia 15). Visita. «A Poesia EstÆ na Rua» 18.45 Porto/CafØ Magestic Organizada pela Associaçªo de Jornalistas e Homens de Letras do Porto e INATEL NetArtFax 21.00 Porto/Pav. Rosa Mota Visita Concerto «25 Ideias de Abril» 21.30 Lisboa/Teatro S. Luiz Organizaçªo da Antena 1 (a repetir no dia 25 à noite, em directo de Grândola) 24 de Abril, SÆbado Visita Æ EPI 09.00 Mafra Condecoraçªo da Unidade c/ Ordem Liberdade Visita à EPA 11.15 Vendas Novas Condecoraçªo da Unidade c/ Ordem Liberdade Visita à EPC 13.30 SantarØm Condecoraçªo da Unidade c/ Ordem Liberdade Almoço 14.00 SantarØm/EPC À mesma hora as unidades militares oferecem um al- moço aos portugueses que se encontravam nas FFAA à data do 25 de Abril de 74. Inauguraçªo da EstÆtua a Salgueiro Maia, à EPC e à Liberdade 15.30 SantarØm Iniciativa da CMS. NetArtFax 12.00 Parque das Naçıes/Sala Tejo Início em Lisboa, com 25 horas de animaçªo perma- nente (encerramento às 13.00 de dia 25) Almoço militares de Abril de 74 13.00 Todo o País Participam os cidadªos que se encontravam nas filei- ras em 25 de Abril de 74 Visita às actividades de animaçªo organizadas pelas FFAA 17.00 Parque das Naçıes «Horas da Liberdade» 18.00 Parque das Naçıes Exposiçªo do «designer» H Cayatte Visita ao Regimento Engenharia n” 1 19.00 Pontinha Posto de Comando do 25 de Abril de 74 Vídeo «Imagens do 25A» 21.30 Praça Sony Ecrª gigante. Iniciativa Parque das Naçıes Concerto «Sons da Lusofonia e Convidados» 23.00 Parque das Naçıes Às 00.25 «Grândola». Iniciativa Parque das Naçıes EspectÆculo/Animaçªo Tarde/Noite Lisboa/Praça do ComØrcio Organizaçªo da CML «Grândola Vila Morena» 00.25 País e Estrangeiro Simultâneo nos meios audio-visuais Fogo de artifício simultâneo 00.30 Todo o País Apelo feito às autarquias 25 de Abril, Domingo Sessªo solene 09.00 Lisboa/AR Corrida da Liberdade 10.00 Lisboa/Avenida da Liberdade Organizaçªo da A25A/CML Parada militar 12.00 Parque das Naçıes Cerimónia de condecoraçªo a unidades militares com a Ordem da Liberdade Lançamento de selo 13.30 Parque das Naçıes/Pav. Portugal Carimbo de 1” Dia no selo comemorativo do 25” Ani- versÆrio do 25 de Abril. Almoço 13.45 Parque das Naçıes/Pav. Portugal Desfile de bandas de metais 15.00 Parque das Naçıes/Alam. Oceanos Iniciativa Parque das Naçıes Concerto para os mais novos 16.00 Parque das Naçıes/Praça Sony Grupo «Batoto Yetu». Iniciativa Parque das Naçıes Abertura ao pœblico da residŒncia oficial do Primeiro Ministro c/ actuaçªo da banda da PSP 18.30/20.00 Lisboa/PalÆcio de S. Bento 26 de Abril, Segunda-feira «Portugal 25 anos de democracia: Transiçªo e consolidaçªo» 15.00 Universidades de Évora/Coimbra/Lusíada Início do ciclo de debates organizado pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP)/ Fund. Das Universidades Portuguesas. Esta primeira iniciativa junta em vídeo-conferŒncia a Universidade de Évora, Universidade Lusíada e Universidade de Coimbra. 27 de Abril, Terça-feira Recepçªo 18.45 PalÆcio de BelØm A jornalistas e correspondentes da Imprensa estran- geira que fizeram a cobertura do 25 de Abril de 74.

Transcript of 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax...

Page 1: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

SUPLEMENTO 22 ABRIL 1999 ACÇÃO SOCIALISTA1

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

23 de Abril, Sexta-feira

NetArtFax � início11.00 � Porto/Pav. Rosa MotaColaboração IPJ

Festa - «25 de Abril Jovem»15.00 � PortoOrganização do IPJ

«Uma Revolução Desenhada» - BD17.00 � CoimbraOrganizada pelo Centro de Documentação 25 de Abrilc/ apoio da Bedeteca de Lisboa (inaugurada dia 15).Visita.

«A Poesia Está na Rua»18.45 � Porto/Café MagesticOrganizada pela Associação de Jornalistas e Homensde Letras do Porto e INATEL

NetArtFax21.00 � Porto/Pav. Rosa MotaVisita

Concerto «25 Ideias de Abril»21.30 � Lisboa/Teatro S. LuizOrganização da Antena 1 (a repetir no dia 25 à noite, emdirecto de Grândola)

24 de Abril, Sábado

Visita á EPI09.00 � MafraCondecoração da Unidade c/ Ordem Liberdade

Visita à EPA11.15 � Vendas NovasCondecoração da Unidade c/ Ordem Liberdade

Visita à EPC13.30 � SantarémCondecoração da Unidade c/ Ordem Liberdade

Almoço14.00 � Santarém/EPCÀ mesma hora as unidades militares oferecem um al-moço aos portugueses que se encontravam nas FFAAà data do 25 de Abril de 74.

Inauguração da Estátua a Salgueiro Maia,à EPC e à Liberdade15.30 � SantarémIniciativa da CMS.

NetArtFax12.00 � Parque das Nações/Sala TejoInício em Lisboa, com 25 horas de animação perma-nente (encerramento às 13.00 de dia 25)

Almoço militares de Abril de 7413.00 � Todo o PaísParticipam os cidadãos que se encontravam nas filei-ras em 25 de Abril de 74

Visita às actividades de animaçãoorganizadas pelas FFAA17.00 � Parque das Nações

«Horas da Liberdade»18.00 � Parque das NaçõesExposição do «designer» H Cayatte

Visita ao Regimento Engenharia nº 119.00 � PontinhaPosto de Comando do 25 de Abril de 74

Vídeo «Imagens do 25A»21.30 � Praça SonyEcrã gigante. Iniciativa Parque das Nações

Concerto «Sons da Lusofonia e Convidados»23.00 � Parque das NaçõesÀs 00.25 «Grândola». Iniciativa Parque das Nações

Espectáculo/AnimaçãoTarde/Noite � Lisboa/Praça do ComércioOrganização da CML

«Grândola Vila Morena»00.25 � País e EstrangeiroSimultâneo nos meios audio-visuais

Fogo de artifício simultâneo00.30 � Todo o PaísApelo feito às autarquias

25 de Abril, Domingo

Sessão solene09.00 � Lisboa/AR

Corrida da Liberdade10.00 � Lisboa/Avenida da LiberdadeOrganização da A25A/CML

Parada militar12.00 Parque das NaçõesCerimónia de condecoração a unidades militares coma Ordem da Liberdade

Lançamento de selo13.30 � Parque das Nações/Pav. PortugalCarimbo de 1º Dia no selo comemorativo do 25º Ani-versário do 25 de Abril.

Almoço13.45 � Parque das Nações/Pav. Portugal

Desfile de bandas de metais15.00 � Parque das Nações/Alam. OceanosIniciativa Parque das Nações

Concerto para os mais novos16.00 � Parque das Nações/Praça SonyGrupo «Batoto Yetu». Iniciativa Parque das Nações

Abertura ao público da residência oficial doPrimeiro Ministro c/ actuação da banda da PSP18.30/20.00 � Lisboa/Palácio de S. Bento

26 de Abril, Segunda-feira

«Portugal 25 anos de democracia: Transiçãoe consolidação»15.00 � Universidades de Évora/Coimbra/LusíadaInício do ciclo de debates organizado pelo Conselhode Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP)/Fund. Das Universidades Portuguesas. Esta primeirainiciativa junta em vídeo-conferência a Universidadede Évora, Universidade Lusíada e Universidade deCoimbra.

27 de Abril, Terça-feira

Recepção18.45 � Palácio de BelémA jornalistas e correspondentes da Imprensa estran-geira que fizeram a cobertura do 25 de Abril de 74.

Page 2: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

ACÇÃO SOCIALISTA 2 22 ABRIL 1999 SUPLEMENTO

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

Cultura e lazerPortugal orgulhosamentemoderno

regime democrático inauguradocom a Revolução dos Cravos fezda esfera cultural portuguesaum meio de livre expressão, di-

versificado e abundante em géneros e esti-los.A democratização do acesso à cultura acar-retou um aumento de produção no sector,porém, as estatísticas apontam para um

crático já não se envergonham do seu pa-trimónio intelectual e mostram aos visitan-tes os templos multiculturais de lazer e co-nhecimentos como o Parque das Nações,o Centro Cultural de Belém, a Culturgestentre outros.Com os restos do Antigo Regime foi enter-rado, há 25 anos, o culto do obscurantis-mo e da ignorância que se apoiava nos ten-

O

EducaçãoSaber sem «anexos»

m 1974 existiam apenas qua-tro universidades públicas euma privada. Como as infra-estruturas eram escassas só

alguns podiam ter acesso aos níveis deformação mais avançados. A segregaçãonão estava escrita em lado nenhum, semdeixar, contudo de existir.O Estado Novo tinha escolas para as eli-tes, como o Liceu Pedro Nunes, e parapobres, nomeadamente a Casa Pia.No Pedro Nunes não era fácil entrar. Pela«porta grande» passavam somente os fi-lhos da notável � ou será melhor dizer no-tória � burguesia lisboeta e os «meninosprodígio» que obtivessem as melhoresclassificações nos exames de admissão.Às crianças mais pobres, confrontadascom situações económicas precárias, erareservada uma educação mais prática,com vista á aprendizagem de um ofício,longe do seio familiar, na Casa Pia.Há cerca de 30 anos o discurso oficialdesmentia toda e qualquer insinuação dediscriminação social. Para todos os efei-tos nunca houve, em tempos de OliveiraSalazar, segregação de classes. Porém,ainda há quem se lembre da altura emque o primeiro ano era dividido em duasturmas: a dos filhos dos homens de ne-gócios e a dos alunos que tinham tidoboas notas nas provas de acesso.Antigos alunos do Liceu Pedro Nunes hoje

de ensino.A título de exemplo destaque-se, no queao ensino superior diz respeito, que actu-almente existem 14 universidade públicas,espalhadas pelo continente e ilhas, e noveprivadas com ramificações.Além dos estabelecimento universitáriosfor a criados, ao longo destas duas déca-das e meia, 16 institutos politécnicos e 29escolas superiores.Quanto à procura, esta também aumen-tou. Só neste ano lectivo candidataram-se à universidade quase tantos estudan-tes (54 414) como os que a frequentavamem 1974 (60 mil).No ensino secundário a população estu-dantil duplicou e despesa público com aeducação, em geral, evidenciou um au-mento extraordinário.De 6,095 milhões de contos em 1974 (cer-ca de 144 milhões de contos a preços ac-tuais), passou-se para 1 065 milhões decontos hoje.Os números ilustram o fim do paradigmaeducacional do Estado Novo segundo oqual, depois do ensino primário, aos dezanos, o filho do «senhor doutor» ia para oliceu e a universidade, o filho da porteirapara a escola técnica, comercial ou indus-trial e o filho do operário ou agricultor iatrabalhar.Para trás ficou também o analfabetismoem massa. Há 25 anos, 32,2 por cento da

E

arriscam dizer que segregação de facto«talvez só se notasse na diferença do ves-tuário» e para com os alunos do «anexo»,uma extensão do estabelecimento de en-sino localizada nas proximidades da Es-trela e conhecida por «Texas».Só no final da década de 60 é que, com areforma da educação de Veiga Simão, severificou em Portugal um aumento do nú-mero das suas escolas, indiciando a ine-vitável massificação e/ou democratizaçãodo ensino, cujos tempos áureos só che-gariam com o 25 de Abril de 1974.Hoje a Casa Pia e o Liceu Pedro Nunes jánão são o que eram há um quarto de sé-culo atrás. O panorama educacional tam-bém sofreu profundas alterações com oflorescimento que alguns qualificam dedescontrolado e desqualificado da oferta

população portuguesa não sabia ler nemescrever. Nos nossos dias, a situação dograu zero de instrução abrange 13 porcento das mulheres e oito por cento doshomens com mais de 15 anos.Todavia, a evolução que levou à actualdemocratização da educação teve osseus custos. Cumprindo-se a quantida-de descurou-se a qualidade.Neste sentido, a política para o ensino doGoverno socialista tem-se evidenciadopela aposta total na qualidade formaçãoministradas nas nossas escolas, pelo com-bate frontal ao insucesso escolar e pelaapresentação de alternativas de futuro ecurriculares para as diferentes aspiraçõesda juventude do Portugal moderno, de umpaís cujo saber, há um quarto de século,desconhece cada vez mais os «anexos».

certo esfriamento na escaldante euforia por-tuguesa em intervir na política e na socie-dade que data do Estado Novo.Os estudiosos explicam este fenómeno pelamudança significativa da conjuntura político-social que teve os seus efeitos inegáveis nosusos e costumes da população. É que aspessoas passaram a viver mais em casa,deixaram de atender à necessidade de de-bater a vida social, tornando-se mais passi-vas, permissivas, apáticas e desencantadas.A geração que protagonizou Abril recordacom saudade o espírito intervencionista quepairava em atmosferas de debate públicocomo as salas de espectáculos e os cafés.É verdade que a cultura deixou de ser umbem racionado do qual só as elites podiamdesfrutar abundantemente, salvaguardan-do os interesses do pensamento único quese queria instituído na sociedade, mas, emcontrapartida, descuidou-se o culto da lín-gua e da identidade nacionais, arriscandouma colonização atrevida por parte da in-dústria dos conteúdos anglosaxónicos.E se a oferta aumentou em quantidade equalidade e a procura estagnou ou mesmodiminuiu em certos sectores do lazer a dacultura portuguesas, a ideia de que a novamentalidade do pós 25 de Abril - caracteri-zada por empreendimentos como aExpo�98 ou logros como a atribuição doPrémio Nobel da Literatura a JoséSaramago �, espelha um Portugal maissaudável culturalmente falando, tem mere-cido amplo consenso.Na década de 90, os portugueses podemarejar o intelecto nos novos e imponentesespaços culturais que já não se resumemà solitária Fundação Calouste Gulbenkiando período salazarista.Os cidadãos do Portugal moderno e demo-

táculos da censura prévia, uma poderosae castrante máquina que se lançava sobrealegadas «ideias perigosas» para o povo.Hoje, fruto do espírito de Abril, há seis ve-zes mais bibliotecas, a liberdade de expres-são é um direito intocável, verificou-se umaaumento das edições de livros revistas ejornais, os espectáculos públicos diversifi-caram-se e multiplicaram-se bem como osteatros e cinemas, os apoios oficiaisavolumaram-se progressivamente, mas fo-ram os museus o grande fenómeno de cres-cimento paralelo entre a oferta e a procura.De 114, em 1974, passou a 309, em 1996 onúmero de espaços museológicos do País,com um crescimento de visitantes de 2,5milhões para mais de oito milhões, nesseperíodo de 22 anos.Tudo isto foi conseguido com uma políticacultural desinibida e investidora. De acordocom os dados do Instituto Nacional de Es-tatística, a despesa pública com a culturaaumentou de dois milhões, em 1981 (12,76milhões de contos a preços actuais) para22 milhões em 1993 (26,18 milhões de con-tos a preços actuais).A nova mentalidade cultural dos portugue-ses e da classe política nacional cristalizou-se em decisões como a que foi tomada peloExecutivo do PS a favor da preservação dasgravuras rupestres de Foz Côa e em detri-mento da construção de uma barragem daEDP.O País aplaudiu esta corajosa atitude soci-alista que não só reflectiu a prioridade dopatrimónio da humanidade face ao desen-volvimento económico, como também me-receu os elogios de notáveis figuras inter-nacionais e marcou o início de uma cami-nhada decidida da pré-história para amodernidade cultural de Portugal.

Page 3: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

SUPLEMENTO 22 ABRIL 1999 ACÇÃO SOCIALISTA3

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

FamíliaDemocracia no feminino

Revolução dos Cravos marcouprofundas alterações no perfilda família portuguesa. A revisãoda Concordata permitiu aos ca-

tólicos divorciarem-se, regularizando-se mi-lhares de separações de facto entre 75 e 76.A partir de então, os casamentos tornaram-se progressivamente mais escassos e tardi-os, o número de divórcios subiu em flecha eos casais passaram a ter menos filhos.«Famílias monoparentais» e «recompostas»são apenas novas designações para situa-ções antigas, que com Abril saíram da obs-curidade, alterando-se, simultaneamente afamília tradicional o rosto da sociedade por-tuguesas.Segundo estudos sociológicos debruçadossobre a realidade da Grande Lisboa e do Sul,os indicadores estatísticos revelam, indirec-tamente, a proliferação de modos alternati-vos de viver em comum.União de facto, sucessão de relações tem-porárias com coabitação, vida a dois semcoabitação, casamento, são algumas dasalternativas a partir das quais os cidadãosdo Portugal pós-revolucionário podem op-tar em liberdade.Ao que tudo indica, não parece ter havidouma desvalorização da instituição matrimo-nial, mas sim uma sobrevalorização da mes-ma, considerando-se um estádio muito avan-çado da relação a dois, onde cada vez maisos casais podem dialogar e serem exigen-

mocrático: a entrada maciça da mulher nomercado de trabalho. Mas o fenómeno nãoé recente.A emigração e a guerra colonial foram o pon-tapé de saída das mulheres para for a decasa. A mão-de-obra feminina foi solicitadae empregue para colmatar o défice de tra-balhadores do sexo masculino, sobretudonas actividades menos qualificadas.Os primeiros passos da luta pela afirmaçãoda identidade feminina foram dados quan-do as raparigas começaram a «invadir» asescolas e a conquistarem outros meios eferramentas, através de uma melhor forma-ção, para ascender na escala laboral.Neste contexto, começa a esboçar-se o quehoje é considerado como uma alteração ra-dical no estatuto social da mulher na comu-nidade democrática, bem como dos seupapel.Passando de uma ignorada fada do lar paraa trabalhadora qualificada que contribuipara o sustento económico do agregadofamiliar, a mulher do pós-25 de Abril foi con-quistando vagarosamente um universo pró-prio em que os filhos, o marido e o espaçodoméstico nem sempre ocupam um lugarprioritário, numa luta constante com valo-res legítimos de realização pessoal e pro-fissional.Fala-se cada vez com mais frequência napartilha das tarefas domésticas pelo casal.Contudo, o espírito de equipa ainda não che-

SaúdeSNS: o novo médico do povo

enhor doutor, estou doente enão posso pagar, nem tenhodinheiro para os remédios.»Esta era uma frase ouvida

com frequência nos ineficientes estabeleci-mentos de saúde que o Estado Novo man-tinha em Portugal.Há 25 anos, a população rural, dedicadaquase em regime de exclusividade à agri-cultura, à pecuária e outros ofícios tradicio-nais, via o seu já por si parco rendimentominguar ainda mais com os descontos paraas Casas do Povo, entidades encarreguesde prestar assistência médica.Na generalidade, os portugueses que pre-

criou o SNS, entrado em vigor com a lei n.º56/79, de 15 de Setembro, visou envolver«todos os cuidados integrados de saúde,compreendendo a promoção e vigilância desaúde, a prevenção de doença, o diagnósti-co e tratamento dos doentes e a reabilitaçãomédica e social».Se o objectivo do Serviço Nacional de Saú-de era indiscutivelmente nobre, a suaconcretização foi, também, inegavelmentecomplexa. As novidades eram muitas, ba-seadas numa nova forma de entender amedicina, nomeadamente a criação de Cen-tros de Saúde: «unidades orgânicas e funci-onais básicas da prestação cuidados primá-

A «S

tes.E, enquanto a nupcialidade diminui e adivorcialidade dispara, a fecundidade estag-na. A queda dos índices de natalidade temvindo a acentuar-se com a generalização doplaneamento familiar e a contracepção numasociedade portuguesa de mentalidade rela-tivamente mais aberta.As novas formas de encarar as relações con-jugais afectou também a maneira de lidarcom os filhos.Por um lado, viver em casal não implica obri-gatoriamente assegurar descendência,mesmo se uma proporção elevada de por-tugueses (65 por cento) considera, nos diasde hoje, que «ter filhos» é muito importante.Embora todas as mudanças citadas tenhamna sua origem diversos factores, há um emespecial que tem sido apontado comodeterminante para a alteração dos contor-nos das relações familiares do Portugal de-

gou a todos os campos dos afazeres casei-ros na maioria dos lares portugueses nem atodas as esferas da sociedade.Abril continua por cumprir no que toca à ple-na igualdade de oportunidades entre ho-mens e mulheres, mas muito foi já conse-guido, nomeadamente no plano jurídico.Longe vai o tempo, exactamente 25 anos,em que, nos termos legais, «o marido é ochefe de família, competindo-lhe nessa qua-lidade representá-la em todos os actos davida conjugal comum», enquanto o governodoméstico era exclusiva tarefa feminina.Com a Revolução da Liberdade extingue-sea obsoleta figura do chefe de família e, pas-me-se, a mulher passa a poder viajar parafora do País sem autorização do marido eaté a poder levar os filhos sem o consenti-mento do pai, ousadias que no tempo do«Deus, Pátria e Família» seria, no mínimo,impensável.

cisassem de cuidados de saúde deviam di-rigir-se às Caixas de Previdência, que malchegavam para cobrir 20 por cento da po-pulação total.Para os que nada tinha restavam as Miseri-córdias ou a caridade de alguns «médicosdo povo» que chegavam a pagar do própriobolso os medicamentos para os doentes emestado crítico.Existiam ainda os hospitais e a medicina li-vre, sendo esta última acessível somente àspessoas com algumas facilidades financei-ras.O sistema de saúde, conforme testemunhamcontemporâneos do regime salazarista, es-tava completamente degradado e deficitá-rio. Os índices sanitários de um País «orgu-lhosamente só» eram dos mais baixos daEuropa. Havia ao todo 1,2 médicos paracada mil habitantes, a mortalidade infantil eraelevadíssima (37,9 por mil habitantes em1974), a esperança de vida e a qualidade damesma era inferior aos níveis actuais.O terreno dos cuidados de saúde e higieneera, pois propício à mudança. Passadosquatro anos sobre os acontecimentos quedespertaram a democracia em Portugal, foicriado o Serviço Nacional de Saúde (SNS)por iniciativa do socialista António Arnaut,então ministro da Saúde do II Governo Cons-titucional, presidido por Mário Soares.Tratava-se, conforme foi apresentado na al-tura, de «uma das maiores esperanças dopovo português», pois preconizava que to-dos os cidadãos, independentemente do seupatrimónio e capitais, tinham direito à assis-tência médico-sanitária gratuita.O «grande projecto nacional», conforme eradefinido na nota introdutória do diploma que

rios de saúde, com responsabilidade quan-to às «necessidades essenciais de saúde deuma comunidade definida».Assim, uma das conquistas mais importan-tes do 25 de Abril deu-se no sector da assis-tência médico-sanitária, embora o SNS nãotenha sido, ao longo deste quarto de séculode liberdade, isento de críticas e insuficiên-cias.Hoje, os índices sanitários em Portugal sãocomparáveis aos dos restantes países eu-ropeus, o número de médicos e enfermei-ros por mil habitantes triplicou, a mortalida-de infantil desceu, em 1994, para 7,9 crian-ças em cada mil, a despesa pública para osector disparou, os equipamentos e as tera-pêuticas foram actualizadas.A democratização da saúde, fruto da Revo-lução dos Cravos, trouxe diferentes expec-tativas de longevidade em Portugal. De 64anos em 1975, a esperança média de vidados homens cresceu para 71 em 1994, en-quanto as mulheres «saltam» dos 71 paraos 78 anos.Haverá quem denuncie que nem tudo estábem no actual sistema de saúde português,lembrando o problema, por sinal real, daslistas de espera: Porém, é preciso não es-quecer que se o Estado Novo não as tinha,isso devia-se à falta de tratamento hospita-lar das pessoas que não o podiam pagar eque nem sempre recorriam aos hospitais.A realidade dos nossos dias é, por tudo isto,bem diferente de há 25 anos atrás. Hoje aqui-lo que as pessoas esperam de um hospitalpúblico está, em grande medida, garantido.Antes do 25 de Abril de 1974 apenas estavagarantida a solidariedade e a misericórdiade alguns «médicos do povo».

Page 4: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

ACÇÃO SOCIALISTA 4 22 ABRIL 1999 SUPLEMENTO

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

EmpregoTrabalho precário e semdireitos continua a proliferarno Portugal de Abril

o Portugal de Abril, 25 anos de-pois do derrube da ditadura, onúmero de trabalhadores comvínculos laborais precários, logo

sem direitos e sujeitos a todas as arbitrarie-dades patronais, atinge proporções verda-deiramente chocantes.Mas, para além de grande número de traba-lhadores terem vínculos precários, há aindauma outra situação verdadeiramente escan-dalosa e à margem da lei que é o facto demilhares de trabalhadores por conta de ou-trem serem remunerados através de recibosverdes, chegando-se ao cúmulo de, duran-te os governos de Cavaco, ser o próprio Es-tado a incentivar esta prática, nomeadamentena Função Pública.São situações impensáveis para todos aque-les que há 25 anos, depois da derrube doEstado corporativo que negava aos traba-lhadores os mais elementares direitos, so-nharam não ser mais possível situaçõescomo as que hoje ainda se vivem.A baixa escolaridade dos trabalhadores por-tugueses é, por outro lado, um problema quepersiste, apesar de se terem registado sig-nificativos avanços em relação à situaçãoexistente na ditadura.

atura) é privilégio de apenas 8,7 por centodos empregados, destacando-se a Regiãode Lisboa e Vale do Tejo, em que um emcada oito trabalhadores tinha curso superi-or, segundo o INE.Em 1974, a taxa de desemprego situava-senos 1,7 por cento, em 1997 atingia os 6,7por cento, após um pico de 8,6 por centoem 1985, quando da crise económica emPortugal, que motivou a intervenção do FMI.Há 25 anos, a taxa de desemprego dos ho-mens era de 1,3 por cento, passando em1997 para 6,1 por cento, com máximos de6,5 por cento em 1986 e 1996.O desemprego feminino passou de 2,4 porcento em 1974 para 7,6 por cento em 1997,com um máximo de 13,6 por cento em 1981.O peso do sector primário no emprego totalbaixou de 28,9 por cento em 74 para 13,6por cento em 97, um peso ainda superior àmédia europeia.A população empregada na indústria baixoude 34,1 por cento para 31,6 por cento entre1974 e 1997, tendo o peso do emprego naindústria transformadora diminuído de 25,1por cento para 21,5 por cento no mesmoperíodo.A construção representava 8 por cento do

N

Segurança SocialPapel do Estadoé insubstituível

mbora incipiente, a Revoluçãode Abril trouxe aos portugueseso Estado-Providência, que já éobjecto de uma campanha da

direita com vista à sua destruição, ao mes-mo tempo que os interesses privados es-preitam a oportunidade de fazerem daspensões mais um negócio, agitando diver-sos fantasmas.Fruto do notável trabalho desenvolvidopelo ministro Ferro Rodrigues, já conside-rado unanimemente como o homem certono lugar certo, a Segurança Social portu-guesa é hoje gerida de uma forma credívele correcta e os reformados têm a garantiade que o sistema é sustentável e as suaspensões são sagradas, actualizadas se-gundo critérios de justiça dando mais aquem mais precisa.Os apoios da Segurança Social são reco-nhecidamente baixos, em muitos casos,mas a comparação com a situação anteri-or ao 25 de Abril mostra que quase tudo oque há representa uma evolução enorme.Os números são elucidativos. Em 1973 oabono de família era a prestação socialmais generalizada, tendo em conta quer onúmero de beneficiários (808 mil), quer odos seus descendentes (2,15 milhões).A despesa com este subsídio representa-va qualquer coisa como quatro milhões decontos.Vinte e cinco anos depois, em 1998, o nú-mero de beneficiários era muito superior(1,17 milhões), mas o de descendentes,resultado da quebra da taxa de natalida-de, era substancialmente mais reduzido(1,78 milhões). Mesmo assim, a despesamultiplicava-se por 18, passando para 82,9milhões de contos.Por alturas do 25 de Abril, o abono de fa-mília era de 160 escudos mensais para oprimeiro filho e subia até aos 240 a partirdo terceiro. Havia também subsídios de casamento,nascimento e aleitação.Em 1997 o subsídio de casamento aca-bou e os restantes deram lugar a uma�prestação familiar� única que, para osagregados com rendimentos mais baixos(até 1,5 vezes o valor do salário mínimonacional) é hoje, para o primeiro filho, de14 mil escudos (87 vezes mais) no primei-ro ano e, nos seguintes, de 4200.Evolução igualmente significativa é a dosubsídio de doença.Em 1973 esta prestação foi paga a 775 milbeneficiários, que no conjunto receberam1,2 milhões de contos (correspondentes aum subsídio diário médio de 42,8 escudos).Em 1998, fruto do combate às falsas bai-xas empreendido pelo Governo do PS,houve menos subsidiados (753 mil), masa despesa multiplicou-se 72 vezes, pas-sando para 90,5 milhões de contos (1744,3escudos/dia).Com as prestações de desemprego ne-nhuma comparação é possível.Em 1998 a Segurança Social pagou 91,5milhões de contos em subsídios de de-

semprego (de que beneficiaram 87,5 milpessoas), mais 41,5 milhões em subsídi-os sociais de desemprego (79,3 mil pes-soas).

Desempregadosmorriam à fome no salazarismo

Há 25 anos a despesa com os desempre-gados foi igual a zero, pela simples razãode que ninguém tinha direito ao que querque fosse quando perdia o emprego, mes-mo descontando para a então designada«Previdência Social».O crescimento mais espectacular dos nú-meros, porém, dá-se nas pensões.O número de pensionistas multiplicou-sepor cinco, passando de 530 mil em 1973para 2,5 milhões, mas a despesa cresceu

E

281 vezes, aumentando de 4,1 para 1174milhões de contos.No último ano do Estado Novo havia 145mil pensionistas de invalidez e 335 mil pen-sionista por velhice. Em Dezembro últimoeram, respectivamente, 409 mil e 1,5 mi-lhões. O número de pensionistas de so-brevivência cresceu de 49 mil para 596 mil.As pensões de invalidez e velhice custa-vam, em conjunto, 3,8 milhões de contos,agora custam mil milhões por ano. As desobrevivência custavam 322 mil contos,hoje custam 173 milhões, quase 540 ve-zes mais.O valor médio mensal duma pensão develhice passou de 958,3 escudos em 1973para 37.331,4 (38,9 vezes mais), enquan-to que o da pensão de sobrevivência evo-lui de 540 para pouco mais de 20 mil es-cudos.O aumento do número de pensionistas éconsequência, principalmente, de deci-sões de solidariedade e de esquerda, jáque muitos deles nunca contribuíram, oucontribuíram pouco, para a SegurançaSocial.Por isso mesmo, o Estado, que em 1973não deu um tostão para pagar reformas,transferiu para a Segurança Social, no anopassado, só para suportar encargos compensões, 354,75 milhões de contos.

emprego em 1974 e 9 por cento em 1997.O grande acréscimo deu-se no sector dosserviços que, no período em análise, regis-tou um aumento de 70,8 por cento na popu-lação empregada, passando de um peso de36,9 por cento no emprego total para 54,8por cento em 1997.Em 1998, os dados apontam para uma taxade desemprego de 5 por cento, mas não sãoimediatamente comparáveis com os do anoanterior por ter havido mudançasmetodológicas e de amostra no inquérito aoemprego do INE, que representaram umaquebra de série.Em 1998, a taxa de desemprego atingiu 4por cento para os homens e 6,2 por centopara as mulheres.De salientar que antes do 25 de Abril, osdesempregados não tinham qualquer tipode apoio ou protecção do Estado, restando-lhes o recurso, para não morrerem de fome,à solidariedade dos mais próximos ou àsinstituições de caridade, onde pontificavamumas senhoras ligadas ao regime fascista.

Assim, é necessário recordar, Portugal viviaem 1974 uma situação de quase pleno em-prego, devido sobretudo à forte emigraçãoe a grande parte dos jovens estarem na Guer-ra Colonial, os trabalhadores possuíam umnível muito baixo de qualificação e o sectorprimário (agricultura) tinha ainda um pesosignificativo na população activa.Vinte e cinco anos depois, apesar do gran-de aumento da frequência do ensino superi-or e da elevação da escolaridade obrigató-ria para nove anos, Portugal continua a serum dos países da OCDE com a mais baixaescolarização da mão-de-obra.Mais de quatro em cada cinco trabalhado-res portugueses não têm mais do que a ac-tual escolaridade obrigatória e quase um emcada dez (9,6 por cento ) não completouqualquer nível de instrução, segundo dadosdo INE referentes ao 4º trimestre de 1998.Os que não têm mais do que o 1º ciclo doensino básico (antiga 4ª classe) são ainda46 por cento do total.Formação superior (bacharelato ou licenci-

Page 5: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

SUPLEMENTO 22 ABRIL 1999 ACÇÃO SOCIALISTA5

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

EconomiaGrande crescimentomas falta redistribuir a riqueza

Produto Interno Bruto (PIB) «percapita» português passou de52/53 por cento da média daUnião Europeia, em 1974, para

mais de 70 por cento em 1996, um núme-ro impensável há 25 anos.E os resultados económicos dos 25 anosde democracia ainda poderiam ter sidomelhores se não se tivessem registadodois choques petrolíferos e diversos perí-odos de estagnaçãoMas, apesar destes números, Portugal éainda um país onde os benefícios do cres-cimento económico não chegam a todos,

dos os anos e mais que a média dos paí-ses da União Europeia.O pós-25 de Abril foi um período de acele-ração da inflação. Em parte por efeito doaumento de salários que deixaram de serde miséria e da sabotagem de alguns em-presários saudosos da velha ordemsalazarenta, mas principalmente emconsequência do primeiro choque petrolí-fero.O pico inflacionista foi atingido com 29,3por cento em 1984. Mas só a partir de 1990se assistiu a uma verdadeira política dedesinflação, baseada na fixação da taxa de

Forças ArmadasJovens já não morremnem são estropiadosna Guerra Colonial

s gigantescas Forças Armadas(FA) que em 1974 puseramponto final ao Estado Novo,depois de o terem suportado

durante 48 anos, estão reduzidas a umquinto dos seus efectivos passados 25anos.As Forças Armadas perderam mais queefectivos. O seu peso na economia e napolítica encolheu. Os seus ministérios de-sapareceram, concentrados num departa-mento de Defesa Nacional de cariz civilista.A presença territorial da tropa rarefez-se.Em troca, modernizaram-se, seguindo oconceito de «menores e melhores forças».Os 217 mil efectivos de 1974 estão hojereduzidos a 46 mil- em resultado do fimdas guerras coloniais (largas centenas demilhar de jovens morreram e ficaram gra-vemente feridos) num cenáriocrescentemente orientado para as novasmissões de paz na Europa ou em África.Por ramos, o Exército foi o que sofreu mai-ores cortes, passando de 179 mil efecti-vos em 1974 para 27 952 (Janeiro de 99).A Armada passou de 19 500 para os 11474 e a Força Aérea de 18 500 para 6 837.Os oficiais do quadro permanente no acti-vo passaram apenas de 3 693 para 2 861(mais 208 reservistas no activo), sinal daimportância que os milicianos tinham em1974 no enquadramento das tropas emguerra.Em contrapartida, os novos tempos impu-seram a presença das mulheres nas filei-ras, que passaram das escassas 12 en-fermeiras pára-quedistas de 1974 para2 573 no conjunto dos três ramos das FA.Ao Serviço Militar Obrigatório de dois anosno Exército, três na Força Aérea e quatro

na Armada, em 1974, contrapõem-se hojeos quatro meses dos conscritos, partici-pantes num sistema misto com voluntári-os, enquanto se aguarda a regulamenta-ção do fim do dever constitucional de ser-vir as FA.O Orçamento das FA em 1974, de 23,5milhões de contos (540,5 milhões de con-tos a preços de 98), correspondia a 6,85por cento do PIB e 31,71 por cento do OE.As verbas da Defesa em 1998, 251,5 mi-lhões de contos, representaram apenas 1,3por cento do PIB e 2,5 por cento do OE.Nestes 25 anos, as Forças Armadas ad-quiriram a capacidade de operar em dife-rentes teatros de operações, incluindo osclimas frios.Duas unidades de elite da guerra colonialextinguiram-se: o Regimento de Coman-dos e o Corpo de Tropas Pára-quedistas.Em seu lugar criou-se a BrigadaAerotransportada Independente.A Brigada Mista Independente do Exército- a 1ª grande unidade terrestre a integrar-se nos dispositivos da NATO - passou aMecanizada.Em paralelo iniciou-se o desmantelamentodo «abrangente» dispositivo de coberturaterritorial com a extinção de numerosasunidades e a redução das regiões milita-res de cinco para duas.A presença militar estrangeira cingiu-se àdos EUA nas Lajes com o abandono dasFlores pela França e da Base de Beja pelaAlemanha.Mais significativo, o facto de as FA daremassistência e formarem nas suas escolasmilitares de vários dos exércitos nacionaisdos PALOP - por acaso os sucessores dosseus antigos inimigos.

OA

havendo chocantes desigualdades, sen-do por isso imprescindível, ao contrário doque defendem os adeptos doneoliberalismo ou alguns teóricos pós-modernistas convertidos às delícias domercado, uma maior intervenção do Esta-do.Depois de uma década em que os valoresdominantes foram o endeusamento domercado e o ataque ao papel do Estadona economia, continua a ser imprescindí-vel um ainda maior aprofundamento daactual política económica, pondo-a aindamais ao serviço das pessoas, assumindoo Estado um maior papel interventor, no-meadamente e principalmente naredistribuição da riqueza, através de umaprofunda reforma fiscal.No ano da revolução, o PIB cresceu 1,1por cento, e no seguinte foi negativo em4,3 por cento, devido ao choque petrolífe-ro do último trimestre de 73, em que ospreços do crude mais do que triplicaram.Praticamente um quarto de século depois,o PIB português aumentou 3,8 por centoem 1998, culminando cinco anos conse-cutivos de crescimento económico e apro-ximando o país da média da UniãoEuropeia.Para 1999, prevê-se que o PIB cresça en-tre 3,3 e 3,5 por cento. Ou seja, nunca éde mais recordar, desde que o Governodo PS a nossa economia tem crescido to-

câmbio.A política de desvalorização deslizante doescudo foi então abandonada pelas auto-ridades monetárias.Em 1992, em Maastricht, um tratado ondese nota a componente monetarista dos go-vernos de centro-direita que então domi-navam a Europa, foram lançadas as ba-ses da convergência nominal para o euro- redução das taxas de juro, da inflação,da dívida pública/PIB e do déficeorçamental/PIB.Ao Governo PS coube alcançar a meta dainflação (2,7 por cento em 1998 e previsãode 2 por cento para 2000).O desemprego, em Portugal, passou de2,9 por cento em 1974 para 3,5 por centoem 1982, depois de ter sido de 5,3 e 5,1por cento em 77/78.Mas em 1985, em plena crise, atingia o seupico de 8,5 por cento. O desemprego bai-xaria depois para se situar em 5 por centoem 1998.Durante este longo período, verificaram-setambém duas graves situações de déficeda balança de pagamentos: em 1976/77 eem 1981/83, tendo o FMI imposto umapolítica de austeridade, com os inevitáveisapertos de cinto.Fundamental foi a adesão à CEE em 1986,com Mário Soares, um marco fundamen-tal para o desenvolvimento económico re-gistado.

Page 6: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

ACÇÃO SOCIALISTA 6 22 ABRIL 1999 SUPLEMENTO

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

Poder LocalA grande vitóriada Democracia

s actuais 305 câmaras munici-pais, apenas mais quatro quenas primeiras eleições autár-quicas de 1976 � Amadora,

Odivelas, Vizela e Trofa -, têm incompara-velmente, hoje, muito mais competências,dinheiro e funcionários. Até ao 25 de Abrilde 1974, pouco mais faziam do que arran-jar estradas.

mento do quadro do pessoal. Segundo osúltimos dados, em 1996, havia 85680 fun-cionários autárquicos. Também o númerode vereadores municipais aumentou des-de Abril de 1974. Dos 1906 eleitos, no anode 1976, passou-se em 1997 para 2021,isto é, 305 presidentes de câmara e 1716vereadores.Se excluirmos o CDS/PP que desde 1976

A

ParlamentoDe monocórdicoa plural e democrático

ntes do 25 de Abril, o Parlamen-to tinha o nome de AssembleiaNacional, e nele tinham assen-to os deputados afectos ao Es-

tado Novo, não eleitos ou «eleitos» nas elei-ções fantoches de então, que não passa-vam de serventuários do regime e de «yesman» tão ao gosto do ditador de SantaComba.Antes do 25 de Abril, a Assembleia Nacio-nal só mereceu alguma atenção devido àpresença durante a breve primaveramarcelista dos deputados da ala liberalque procuraram democratizar o regime pordentro, contando desde o primeiro minutocom a oposição cerrada dos duros do re-gime.Depois do 25 de Abril, o Parlamento voltoua ser um órgão prestigiado, tendo nele as-sento homens livres eleitos democratica-mente e verdadeiramente representativosdo povo português.Entretanto, o Parlamento, a nível de insta-lações, está a sofrer profundas mudanças.A nova ala de sete andares, dois dos quaissubterrâneos, a estrear depois daslegislativas (Outubro), vai aliviar a falta deespaço com que luta o Parlamento desdeque a sua actividade e competências ex-plodiram a seguir ao 25 de Abril.

como o cerco à Constituinte, em 1975, oParlamento, além do plenário, passou aincluir os gabinetes dos partidos, as nu-merosas comissões permanentes e even-tuais, organismos autónomos e a ter umintenso relacionamento internacional.Nos últimos 25 anos os seus serviços au-mentaram muitas vezes pelo que teve dearranjar (dentro e fora do Palácio) novasinstalações.Na vizinha praça de S. Bento, o Parlamen-to construiu agora um parque de estacio-namento subterrâneo que terá uma capa-cidade total para 460 automóveis.A nova ala terá cerca de 120 gabinetes paradeputados, um restaurante no terraço e umauditório.O espaço interior do Palácio do Parlamen-to aumentou também com a construçãode dois corredores para as comissõesparlamentares e de um novo piso intermé-dio para gabinetes e serviços.Também em estudo está o projecto de ins-talar no espaço deixado vago pela saídada Torre do Tombo - utilizando o antigo re-feitório dos frades (notável pelos painéisde azulejos) - o Museu e o Arquivo do Par-lamento (onde se conservam os cadernoseleitorais de todas as eleições desde1834).

A

Antes, no tempo em que o cadáver deCarmona esteve depositado no salão no-bre, funcionava apenas três ou quatromeses por ano e grande parte da sua áreaera ocupada pela Presidência do Conse-lho e pelo Conselho de Ministros.Depois de alguns acidentes de percurso

Construído em 1615, o antigo Mosteiro deS. Bento serviu varias vezes para reuniõesdas Cortes, antes de, após o terramoto, deque foi um dos edifícios a escapar, ter sidoprisão (de Bocage), Academia Militar, Pa-triarcal, Torre do Tombo e (desde 1834) Par-lamento.

Mas se as competências não pararam deaumentar, as despesas também não. Em1975 as autarquias gastaram 7,5 milhõesde contos e em 1998 ultrapassaram os 842milhões de contos. Porém, as receitas nãocresceram da mesma forma: dos 7,8 mi-lhões de contos em 1975, passou-se paraos 839 milhões em 1997.Longe vão os tempos em que os autarcaseram directamente nomeados pelos pa-trões do anterior regime e que, sem qual-quer tipo de capacidade reivindicativa �devido à ausência de associaçõesintermunicipais �, e com uma autonomiafinanceira quase nula, limitavam-se a men-digar individualmente comparticipações daadministração central. Quase sem recei-tas próprias os municípios, antes da Re-volução de Abril, limitavam-se a gerir asprioridades definidas pelo poder central,já que as obras dependiam em grandeparte da comparticipação do Estado.Hoje, os municípios actuam em áreas quese estendem desde os equipamentos ru-rais e urbanos, aos transportes, ao sanea-mento básico, à educação, à saúde, àenergia, passando pelos tempos livres,pela cultura e pelo desporto.Mas o aumento de atribuições e o cresci-mento populacional obrigaram ao alarga-

tem vindo a perder municípios � passoude 36 para oito em 1997 -, em todos osoutros partidos não foram grandes a vari-ações no total de municípios presididos.Nas primeiras eleições autárquicas o PS eo PPD/PSD conquistaram, cada um, 115câmaras, enquanto a APU/CDU conquis-tava 37 e o PPM, uma. Em 1997, o PartidoSocialista conquistou 128 municípios, oPSD 127, a CDU 41 e o PPM, um.Se em 1974 o governador civil era uma fi-gura emergente da sociedade dado quetinha um papel central ao nível da nomea-ção dos presidentes de câmara, hoje o seupapel está muito mais diluído. Emcontrapartida, a figura do presidente decâmara emergiu nestes 25 anos de PoderLocal. Se alguns municípios conheceramvários presidentes, outros houve que semantêm desde as primeiras eleições, hámais de 20 anos. São os chamados«dinossauros autárquicos».O mais antigo é Álvaro Pedro, à frente daCâmara Municipal de Alenquer desde1975. Abílio Fernandes (Évora), MesquitaMachado (Braga), Fernando Caeiros (Cas-tro Verde), Victor Martelo (Reguengos deMonsaraz) e Jaime Soares (Vila Nova dePoiares), constituem a lista dos principais«dinossauros».

Page 7: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

SUPLEMENTO 22 ABRIL 1999 ACÇÃO SOCIALISTA7

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

Três geraçõesum 25 de Abril

ARNALDO GONÇALVES

oncluem-se 25 anos sobre o 25de Abril de 1974. O momentodeve favorecer uma reflexãoprofunda, um balanço sereno

das enormes realizações, mas também dealgumas sempre adiadas expectativas, ge-radas pelos Movimento de Capitães, emcada um de nós.Balanço necessário, quer do ponto de vis-ta das forças políticas e sociais existen-tes na sociedade portuguesa quer dosque em termos individuais o viveramcomo um momento único, imenso, mere-cedor de ser vivido, em toda a sua pleni-tude, em todas as suas contradições, namágica dos seus sonhos, na imagísticadas suas mensagens e projectos.Inscrevo-me nos que partilham dos acon-tecimentos de há 25 anos uma memóriamuito significativa e calorosa. Digo-o semhesitação: não trocaria a brevidade des-sa experiência por nada nesta vida.Muito se tem dito do significado do 25 deAbril, em termos do lançamento das fun-dações da II República, mas gostaria desalientar que o aspecto mais marcantepara mim foi o confluir das visões, dasexpectativas de três gerações suas con-temporâneas e que se encontrammarcadas por estes acontecimentos deuma forma distinta - não necessariamen-te conflituante, mas diferente, própria.A geração dos 40-50 anos depositou naRevolução de Abril o concretizar dos seussonhos de clandestinidade ou resistência,de um Portugal Democrático e Livre, quereabilitasse o país no concerto europeu,de que se encontrava apartado pela obs-tinação de Salazar e pela fraqueza de Cae-tano, na perpetuação da visão de um Por-tugal sozinho, serôdio, rural, atrasado,aparentemente orgulhoso da sua peque-nez e da sua catolicidade.No fluir dos acontecimentos que se se-guiram ao golpe militar, confrontaram-seduas perspectivas dessa geraçãomarcada pelo exílio interno ou externo oupela passividade e resignação: a visãodos que defendiam a adequação ao mo-delo liberal, ocidental, da democracia re-presentativa - com mais ou menos colo-rações social-democratas e socialistas;os que no cumprimento dos sonhos daresistência pretendiam substituir o apare-lho da ditadura pelo apparatus de umaautocracia de sentido contrário alinhadaa Leste e à União Soviética, partisan deum socialismo real, puro e duro, em rup-tura com a zona de influência geo-estra-tégica a que Portugal sempre seacantonara: a americana.A geração dos 20-25 anos viu, por suavez, na Revolução do 25 de Abril a oca-sião e o ensejo para o teatralizar do seuMaio de 68 à Portuguesa, reproduzindo

seis anos depois, os arquétipos da lutaideológica e de militância política que, deuma forma policromática, haviam marca-do o grande movimento de massas fran-cês: dos guevaristas aos trotsquistas,passando pelos pró-albaneses, maoístase socialistas radicais, os jovens de entãodesfraldaram a urgência de realizaçãodos ideais em que acreditavam, sobre ascedências dos arranjos políticos, e o adi-ar dos projectos igualitários mais radicais,que a esquerda mais reformista, desdecedo, foi obrigada a contemporizar.A revolução portuguesa foi vivida por estajuventude, maioritariamente estudantil eurbana, como uma revolução permanen-te e o seu contr ibuto para oaprofundamento do processo democráti-co, em termos de abertura pluripartidária,da participação cívica, da demolição dasestruturas do regime do Estado Novo, éhoje indissociável da história do próprioprocesso democrático.Destacados líderes políticos dos princi-pais partidos portugueses vão buscar aessas raízes da juventude a sua capaci-dade de combate e de liderança, numtempo em que a luta política se fazia comconvicção, mas sobretudo com decisivacoragem física.A geração dos que nasceram com o 25de Abril ou pouco antes do seu eclodir,não tem dele particular memória, que nãoseja as dificuldades e contradições de umtempo presente. Identificada com as duasgerações anteriores na necessidade demodificar a sociedade, de lutar pelos seusdireitos, esta geração não tem, contudo,a vivência da privação da liberdade, darepressão política, do envolvimento dopaís na guerra em África. A imagem quefaz da Revolução vem dos documentáriosa preto e branco da Televisão portugue-sa, do que lhe é ensinado pelos profes-sores de história, do que lhe é relatadopelos pais.É por isso uma imagem, em segundamão, sem particular rigor histórico ou cir-cunstancial, que não seja o que da Revo-lução ficou por fazer ou cumprir: a refor-ma da educação e da escola; o combateà pobreza; a luta por melhores oportuni-dades profissionais; a abertura do mer-cado de trabalho aos jovens; a aproxi-mação efectiva do país à Europa e aomundo; a luta contra a injustiça e o racis-mo; a defesa do ambiente são algumasdas reivindicações que esgrimam, comnatural irreverência e irrequietude contraos que hoje exercem o poder.Neles se cumpre o que de melhor teve o25 de Abril: a necessidade de mudarcomportamentos e atitudes, de ousar so-nhar e contestar. Seria dramático se nãoo soubéssemos compreender.

A Revoluçãoda Liberdade

AMÍLCAR AUGUSTO

epois de 34 anos de vida sobum regime fascista, onde impe-rava o medo de ser acusado decomunista e preso pela PIDE,

as aspirações eram limitadas pela falta deoportunidades e pela estratificação da so-ciedade, a revolução do 25 de Abril de1974 representou para mim uma esperan-ça e um deslumbramento que penso mui-tos de nós sentimos na altura e encaramosquase que em estado de choque.Na altura era simpatizante do MDP/CDE evizinho de um dirigente deste movimento.Nas últimas eleições tinha pela primeiravez votado na minha vida e neste partido.Cheio de ilusões, vãs, de que iríamos ga-nhar, de que a minha vida e a de todos seiria modificar para melhor.Uma vida mais livre onde houvesse liber-dade de expressão e igualdade de opor-tunidades e não houvesse o medo que ti-nha de me verem tirar da caixa do correioo jornal «Avante» que alguém fazia sem-pre o favor de lá colocar. Lembro-me queapesar das recomendações da minha fa-mília e dos vizinhos, alarmados com asnotícias na rádio, nesse dia, consciente dasminhas responsabilidades, fui trabalhar.Lembro-me também do estado de euforiaque todos nós vivemos nessa época nomeu local de trabalho, onde alguns traba-lhadores ousaram desarmar a GNR e guar-dar as suas armas em local seguro. Feliz-mente tudo correu sem incidentes a lasti-mar, apesar desses actos quase «suicidas»terem sido praticados em resposta à inter-pretação, talvez excessiva e abusiva, deordens dos movimentos da Revolução.Vinte e cinco anos de liberdade de expres-são é uma efeméride digna de se come-morar. Calar a boca àqueles que, talvez

ainda hoje vivos, usufruíram das regaliasproporcionadas pelo regime opressor ediziam para se justificar e ao regime que ademocracia não era para os portugueses,nós não estávamos preparados para tal.O comunismo tomaria logo conta do po-der.É evidente que nem tudo tem sido rosas.Estas também têm sempre espinhos. Mui-tos abusos são cometidos pelo uso da li-berdade de expressão. A igualdade deoportunidades existe mas não é para to-dos, só para alguns. Mais para os esper-tos do que para os inteligentes. Hoje diz-se que para os que têm o «QI» mais eleva-do. O QI é que indica. Alguns políticos têmcontribuído para uma certa descrença ecepticismo que se têm vindo a apoderarprincipalmente dos estratos sociais maisdesfavorecidos, com as suas frequentes,radicais e súbitas mudanças de opinião.Nas bases do nosso partido esse cepti-cismo tem também vindo a ganhar pode-rosamente terreno. Para implementar polí-ticas de solidariedade, de pôr as pessoasem primeiro lugar, seguindo o lema quenos orienta, não basta ter o cartão, ou pior,nem sequer o ter, é preciso senti-las nocoração.Mas camaradas não é hora para cepticis-mo. É hora de congratulação, de homena-gem aos heróis da Revolução dos Cravos.Comemoremos a efeméride das bodas deprata do 25 de Abril com a alegria que oevento merece e esperança no futuro. Es-perança numa sociedade mais equilibra-da e justa, com melhores oportunidadespara todos, onde os nossos filhos e osnossos netos continuem a ter orgulho dedizer «eu sou português».Viva o 25 de Abril. Viva o PS e viva Portugal!

D C

Page 8: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

ACÇÃO SOCIALISTA 8 22 ABRIL 1999 SUPLEMENTO

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

O meu25 de Abril de 1974

CARLOS CARRANCA

pá, parece que houve um gol-pe de Estado!- Quando? � perguntei baixinhopara que o perfeito não nos ou-

visse!- Hoje, de madrugada!- Deve ter sido o Spínola! - acrescenteipor ter ouvido lá em casa algumas con-versas do meu pai com amigos do«reviralho» e todos depositarem no gene-ral do monócolo algumas esperanças.O livro «Portugal e o Futuro», tempos an-tes, abria uma brecha na muralha coloniale a suspeita de que algo estava para acon-tecer no sentido da história, era voz cor-rente entre os que se interessavam porpolítica.No dia 3 de Outubro do ano de 1973, meupai obrigou-me a abandonar Coimbra, orâguebi e a Académica, onde eu perdera o5º ano. Um chumbo do tamanho da pai-xão.Tondela com o moço! E lá fui eu, coimbrãodegredado em plena idade doenamoramento, estudar para um colégiocujo patrono era o poeta Tomás Ribeiro.Aí, entre muros e saudades de Coimbra,dos amigos e da Académica que, quatroanos antes, havia desafiado o poder e setornara o símbolo � mais que nunca -, li-bertador, na manhã de 25 de Abril, um co-

lega do quarto ao lado, pelas sete horas,acordou-me dizendo «ó pá, parece quehouve um golpe de Estado hoje, de ma-drugada!»Nem o exemplo de Norton de Matos nem ode Humberto Delgado impediram um re-publicano, socialista e laico, como o meupai, de me desterrar num colégio salazaristade «Deus, Pátria e Família» onde as visitasà capela eram obrigatórias ao levantar e aodeitar mas, e há sempre um mas, onde acerteza de que ali se estudava, calava fun-do no seu coração agnóstico e doente.Ao almoço, o filho do director (há já algumtempo a substituir o progenitor) falou noaltifalante colocado na sala e disse do gol-pe de Estado em Lisboa e que desconhe-cia o lado político. Talvez, acrescentou,Kaúlza de Arraga tenha decidido colocar,de novo, Portugal nos carris. E concluiu:«Por isso não se vão manifestar para a ruaa favor da revolução de que ainda não sesabe nada. Se tal acontecer serão imedia-tamente expulsos!»A meio da tarde, nós, os que já havíamossentido a brisa fresca da liberdade, des-cemos as escadas do portão lateral do co-légio e, misturados com os que saudavamo derrube da ditadura, gritámos pela pri-meira vez nas nossas vidas, o povo unidojamais será vencido!

Profetasda desgraça

DIETER DELLINGER

inte 25 anos após o 25 de Abril!«Vou às comemorações a pé,milhões de portugueses vãocomo eu, quase todos desem-

pregados e na miséria tremenda, com sa-lários e pensões em atraso. A indústria na-cional parou há muito por falta de energiafóssil. E, neste aspecto, Portugal, comotoda a Europa, mergulhou na crise com acriminalidade à solta por toda a parte e ospobres e desempregados a acamparemnas praças e jardins das cidades.»Se as profecias do «Clube de Roma» dehá 26 anos atrás fossem verdadeiras, omundo não teria mais petróleo. Os ilumi-nados de então garantiam que na passa-gem para o ano 2000 todas as reservaspetrolíferas estariam esgotadas e a civili-zação industrial e mercantil acabado devez. Afinal, foi mais uma das profecias fa-

construção pública está a arrancar em for-ça com novos projectos e com muitasobras de menor dimensão.A globalização é hoje apontada como fon-te de todas as desgraças futuras. Dadonão conhecermos o futuro, tudo pode serdito. Contudo, o futuro resulta daquilo quese faz hoje, e o que tem sido feito a nívelmundial não permite vaticinar uma des-graça global, antes pelo contrário, ape-sar de que o processo criativo é semprecrítico em si mesmo. Saliente-se aqui aInternet, o desenvolvimento espectaculardas ciências e das técnicas, mesmo asmais teóricas.Assim, no campo do ambiente, paulatina-mente se tem avançado na sua conserva-ção e na introdução de técnicas menospoluentes. Em breve, as viaturas automó-veis funcionarão com sistemas energéticos

Ó V

lhadas.Mais tarde, inspirados no fenómeno daconcorrência, os profetas da desgraça nãose cansaram de prever o fim da agricultu-ra como o da indústria, do comércio, daspescas, da construção civil, etc., etc.Mas, quem não trabalha numa actividadeprodutiva pode julgar que está tudo no fim.Nada menos verdadeiro.Na agricultura, por exemplo, a revoluçãodos viveiristas está aí, nos túneis de plásti-co, nas estufas irrigações gota-a-gota, nasnovas sementes, na adubação verde, noaparecimento de novos cult ivaresforrageiros que tanto têm contribuído parao aumento da produção de carne.Na indústria, desapareceram muitas uni-dades obsoletas, mas surgiram outras eas sobreviventes estão hoje mais fortes,apesar de que aqui como em tudo, impe-ra a dinâmica da transformação crítica sobuma concorrência extremamente dura.Na construção civil, não se concretizou aprevisão recente de que terminado o ciclo«Expo» voltaria o desemprego em massa,as construtoras todas em falência. Está asuceder o contrário, a baixa dos juros,possibilitada pelo menor endividamento doEstado, veio permitir um autêntico «boom»da construção para os particulares e a

menos poluentes. Sucederá nas cidadespejadas de automóveis a mesma revolu-ção que se verificou em Londres e tantasoutras cidades da Europa do Norte quan-do surgiu uma nova atmosfera mais limpaapós o desaparecimento das lareiras e fo-gões a lenha ou briquete.Mesmo quanto ao euro, muitos especia-listas diziam que seria uma moeda forte àimagem do marco alemão, baseada nacotação alta com taxas de juro sempre asubir e, como tal, incapaz de servir um ci-clo de expansão das exportaçõeseuropeias e contenção das importações.As recentes descidas do juro europeu equeda da cotação do euro mostrou queesta moeda serve também como instru-mento contra o ciclo recessivo.Alguns profetas vaticinaram o regresso deGuterres a Berlim com as mãos a abanar.Na verdade, a UE acabou por dar quasetudo o que Portugal queria. Agora, come-çaram a vaticinar o fim dos apoios a partirde 2006.Não estamos num Maravilhoso MundoNovo e Portugal não é um oásis. Mas tam-bém é verdade que todas as profeciasnegativas falharam e o contínuo crescimen-to da economia mostra que não estamosem crise.

Page 9: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

SUPLEMENTO 22 ABRIL 1999 ACÇÃO SOCIALISTA9

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

A autonomiaideológica do PSe o curso democrático de Abril

EDMUNDO PEDRO

a passagem do 25º aniversárioda Revolução de Abril parece-me importante sublinhar o papelfulcral desempenhado pelo Par-

tido Socialista, antes e depois da Revolu-ção de Abril, primeiro na luta pelo seu ad-vento e, em seguida, pela sua consolida-ção - processo que se desenvolveu noquadro de uma luta político-ideológica ex-tremamente dura e, em certos momentos,mesmo, dramática. Essa tarefa só pôde serconduzida até ao fim com êxito porque ossocialistas tiveram o rasgo de compreen-der, antes da Revolução, que não podiamcontinuar a ser um simples apêndice daestratégia «unitária» do PCP � estratégiaque visava a conquista do poder com aajuda das forças da oposição democráti-ca.Com efeito, os comunistas vinham tentan-do, ao longo de dezenas de anos, colocarao serviço da sua estratégia de conquistado poder (em nome da eficácia da luta con-tra o regime salazarista) todas as forçasda oposição. Essa estratégia tinha passa-do por várias «frentes unitárias», controla-das essencialmente pelo PCP, entre asquais é de citar, nomeadamente, as tenta-tivas para criar a «Frente Popular» (duran-te a guerra civil de Espanha) - e a organi-zação do MUNAF e do MUD, no fim da IIGuerra Mundial.No último decénio que precedeu a Revo-lução de Abril, o PCP retomou essa estra-tégia e avançou com uma nova iniciativade pretensões «unitárias»: o MDP/CDE.Dessa vez, porém, os socialistas não sedeixaram atemorizar pelo habitual anáte-ma de «divisionistas» com que os comu-nistas procuraram sempre paralisar a ac-ção de todos os que não aceitavam a suahegemonia no seio da oposição. A essainiciativa dos comunistas respondeu Má-rio Soares, Salgado Zenha e todos aque-les que os acompanharam, agrupados naASP, com a formação da CEUD. Essa or-ganização destinava-se, tal como o MDP/CDE, a disputar autonomamente, em 1969,as prometidas «eleições livres» - ou, pelomenos, a divulgar os pontos de vista dossocialistas durante o efémero período dacampanha eleitoral.Mas o aspecto mais significativo dessadecisão histórica (aspecto que se reveloupremonitório para o futuro, especialmenteno decurso do período que se seguiu ao25 de Abril) foi, justamente, a coragem deromper com a tradição de fidelidade à «lutaunitária» alimentada pelo movimento co-munista, visto que tinham compreendidoque essas propostas se destinavam uni-camente, como referi, a paralisar a acçãopolítica e a independência ideológica dossocialistas - e a subordina-los, portanto,aos objectivos estratégicos do PCP.

É hoje indubitável que essa iniciativa, a quese juntou a de fundar o Partido Socialistaantes do 25 de Abril, teve uma importân-cia decisiva no decurso do complexo pro-cesso político que se desenvolveu ao lon-go dos anos de 1974/75 - e que culminouno 25 de Novembro de 1975.No caso português, a táctica comunistaque Vaclav Havel definiu como o «princí-pio da eliminação» foi inviabilizada pelalucidez dos socialistas liderados por Má-rio Soares. Ao contrário do que aconteceunos países do Leste europeu (onde oscomunistas utilizaram, com êxito, esse«princípio» - e fizeram desaparecer, emnome da «unidade da classe operária», osrespectivos partidos socialistas nacionais),em Portugal, graças à clarividência dossocialistas, essa táctica não resultou.O mérito de Mário Soares e dos que oacompanharam foi, pois, o de ter tido a vi-são e a coragem de, em devido tempo,separar as águas.O corte radical entre uma concepção de-mocrática do socialismo e a sua perver-são totalitária, consumada naqueles inici-ativas fundamentais, consagrou a autono-mia ideológica e, consequentemente, es-tratégica, que permitiu ao Partido Socialis-ta liderar a luta pela Liberdade no pós 25de Abril. E foi essa autonomia (que o PCP,recorrendo aos mais diversos expedientes- que, passaram, inclusivamente, pela ten-tativa de satelizar o PS do decurso do seu1º. Congresso na legalidade, de modo asubmetê-lo, posteriormente, ao «princípioda eliminação») que permitiu ao PartidoSocialista liderar a luta pelo respeito davontade popular durante o PREC. Foi essaautonomia que lhe permitiu assumir, comêxito, a direcção da luta do povo portugu-ês pela consagração do rumo democráti-co da Revolução de Abril. Foi essa auto-nomia, enfim, que permitiu salvar a Revo-lução de Abril da sua perversão totalitáriaO «princípio da eliminação», que tantosêxitos proporcionara aos comunistas (eque estes se preparavam para utilizar nonosso País), não resultou entre nós gra-ças à clarividência e coragem política dosdirigentes do PS - e, antes de mais (é justoreconhecer), de Mário Soares e de Salga-do Zenha.Na passagem do 25º aniversário do 25 deAbril parece-me importante sublinhar a in-fluência determinante que a autonomia ide-ológica e política do Partido Socialista tevena clarificação políto-militar que levou àconsolidação do regime democrático. OPartido Socialista foi, indiscutivelmente, oprincipal agente político dessa clarificação.Cabe-lhe, sem contestação, esse mérito.Por isso ele está, e estará, no coração detodos os portugueses que amam a liber-dade!

FERNANDO PEREIRA MARQUES

O 25 de Abrilà beira do Sena

ão era só em Portugal que seacompanhava com ansiedadee emoção os acontecimentosdo 25 de Abril. Em Paris, então

a segunda maior cidade portuguesa, emcuja região viviam milhares de emigrantes,de jovens fugidos à guerra e muitos refu-giados políticos, logo de manhã as rádiosprincipiaram a emitir os primeiros ecos deque algo se passava, e jornais vespertinos,

ticipar na primeira manifestação da suavida, me entoar em altos berros eritmadamente: «O Povo Unido Jamais SeráVencido.»No dia seguinte de manhã, apesar da noitemal dormida, não tanto por hóspedes aterem perturbado - havia poucos -, mas porcausa da agitaçãoem que ficara mergulhado, encontrei-mecom o Carlos. Descemos o boulevard Saint

NN

como o «Le Monde», já dedicariam toda aprimeira página e outras no interior aomovimento militar: «Entre as Aclamaçõesda Multidão - Um Movimento das ForçasArmadas toma o Poder em Portugal - Umgoverno provisório dirigirá o país até à or-ganização de eleições livres.» Seria mes-mo desta? Havia os cépticos, os cautelo-sos, os que não confiavam em militares e,sobretudo, em generais como Spínola. Euera um deles.Mas Adolfo Ayala, velho resistenteantifascista, homem de múltiploscombates, antigo fiel colaborador deHumberto Delgado, assegurou-me quedesta vez era a sério quando, ao fim dessedia de 25, lhe telefonei do Hotel ondetrabalhava como recepcionista expondo-lhe as minhas dúvidas. O seu optimismoera inabalável. Depois de tantasesperanças frustradas durante quarenta eoito anos, de tantas derrotas e momentosem que era preciso ser forte para continuara acreditar, tinha chegado o dia.Liguei o transistor que normalmente meacompanhava durante as horas nocturnasque era preciso preencher e procureisintonizar uma rádio portuguesa. Captei oRádio Clube que, por qualquer razãotécnica que não sei explicar, chegava comuma nitidez e força pouco habituais. Esti-ve horas a ouvir a leitura de comunicados,músicas marciais e canções do Zeca e deoutros até então considerados subversivos.Comecei a render-me à evidência,reforçada por um telefonema no qual aminha mãe que acabara de, nas ruas, par-

Michel comprando nos quiosques todaimprensa que, emdiversas línguas, noticiava o acontecimentonas primeiras páginas: tinha caído a maisvelha ditadura da Europa.Na Livraria Portuguesa, onde Ayalapontificava como «livreiro» sui generis,situada num primeiro andar da rua GayLussac - em pleno BairroLatino -, os parisienses viram, não semespanto, ser hasteada uma bandeira verde-rubra. Mais do que nunca a livraria se tor-nara um ponto de encontro onde se ia embusca de notícias, e naquele dia tambémfestejar o que se passava «lá em baixo»,bebendo cerveja e champagne que Ayala,de olhos brilhantes de alegria no rosto nor-malmente severo, oferecia assumindo,generosamente, o seu papel de anfitrião.Multiplicar-se-iam os telefonemas, inclusi-ve de e para Portugal, ouvindo-se, por ve-zes, os ruídos de fundo da festa, as pala-vras gritadas da alegria, e já não se mediao que se dizia com receio das escutas daPIDE. Acompanhámos ansiosamente acontrovérsia que decorria em torno dalibertação dos presos políticos, dado aJunta de Salvação Nacional inicialmentenão querer libertar todos. Quando astelevisões, mais tarde,principiaram a mostrar imagens, e vi algunsamigos e camaradas, como o PalmaInácio, rejubilando com a liberdade reen-contrada, percebi que o exílio tinha aca-bado, que novos desafios ia ser precisoenfrentar e que outros combates se anun-ciavam.

Page 10: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

ACÇÃO SOCIALISTA 10 22 ABRIL 1999 SUPLEMENTO

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

25 anosde (r)evoluçãofugidia

IGLÉSIAS COSTAL

stava em África, mais concre-tamente na Guiné-Bissau, e foipela BBC que ouvi, pela primei-ra vez, o som significativo do

código inicial para o 25 de Abril «GrândolaVila Morena». A seguir o desenrolar da Re-volução. Foi com emoção e muita alegriaque tomei conhecimento do fim de umaditadura que excluía o que é mais impor-tante, ou deve ser, na vida de um ser hu-mano: a Liberdade.Este movimento que já se esperava, pelomenos, em esperança, que um dia viessea acontecer. Desde os meus tempos deestudante no ISEL, vínhamos a chamar aatenção para a política que na altura erautilizada contra o povo português.Em África li o livro «O Portugal e o Futuro» epor aí já se percebia que o regimedecadente estava em ruptura iminente.Passaram 25 anos e é com alegria querevivo mais uma vez este dia, mas tambémcom preocupação, pelo facto de ao pas-sarem 25 anos do novo Abril continuar a

ver injustiças, pobreza, exclusão e em al-gumas situações pouco ou nenhuma de-mocracia. A democracia desejável é ade todos para todos.O 25 de Abril não foi ainda cumprido. En-quanto houver desemprego, exclusão, bar-racas, pensões miseráveis, salários de mi-séria, trabalho infantil, desprezo pelos defi-cientes, gestores incompetentes, políticosoportunistas, partidos políticos sem desíg-nios, prisões cheias, justiça sem justiça,hospitais com listas de espera, educaçãosem sentido profissional, falta de visão es-tratégica para o futuro, despesismo, des-perdício, desorganização, mordomias emmilhões de contos ano para alguns, secta-rismo fiscal etc., etc. Enquanto tudo istocontinuar, após 25 anos do Abril, a demo-cracia está doente e o 25 de Abril não estáa ser a esperança que os portugueses neleapostaram e depositaram.Enquanto houver um só português que nãoviva com dignidade o 25 de Abril estará porcumprir Cumpra-se Portugal�

O 25 de Abril25 vezes

JOEL HASSE FERREIRA

s bodas de prata do movimentomilitar do 25 de Abril, que desen-cadeou a Revolução dos Cravos,merecem uma comemoração con-

digna e uma adequada reflexão.A virtude original do 25 de Abril radica no der-rube de um regime ditatorial enfraquecido edesgastado pelo que tinha sido um dos seusinstrumentos privilegiados de dominação =o conjunto das Forças Armadas.Estas, decapitadas e depuradas dos seussectores democráticos entre 1926 e 1936,anulados aqueles que no pós-guerra e de 58a 62 procuraram derrubar a ditadura, reto-maram uma tradição secular de intervençãona vida pública. Em Abril de 74, os sectoresmais activos e democráticos das Forças Ar-madas cansados de um regime gasto e cor-rompido, desencadearam - através dos seuscapitães e subalternos, com o apoio de al-guns majores e coronéis, de poucos oficiaisgenerais mas com a intervenção de muitosmilicianos e o entusiasmo dos soldados - umprocesso de derrube do regime que simulta-neamente abriu caminho para a instauraçãoda democracia e para o abandono das fren-tes africanas de luta militar, implicando a que-da do poder colonial.Interessará, entretanto, relembrar que, du-rante o processo revolucionário, diversas ten-tações se atravessaram no caminho para ainstitucionalização da vida democrática. Nãoesquecemos que modelos totalitários de ins-piração social ou esquemas populistas maisou menos utópicos ou dogmáticos poderiamter pervertido o rumo da revolução. Temosainda em conta que, entretanto, a direita maisconservadora espreitava, procurando opor-tunidades para restabelecer privilégios e cer-cear liberdades.É justo afirmar que os capitães de Abril nãosó conduziram o movimento militar que crioua Revolução de Abril como os seus sectoresmais lúcidos e generosos bloquearam orestauracionismo estadonovista e as tenta-ções de deriva totalitária. Mas foi o PS que,constituindo a espinha dorsal do novo siste-ma político, liderou e pilotou o combate polí-tico pela liberdade e pela institucionalizaçãodemocrática.A visão de Mário Soares, que após trinta anosde luta democrática, criou o PS um ano an-tes da revolução, a partir da ASP, foi funda-mental durante o processo revolucionário.Hoje, fosse qual fosse a posição que cadaum dos intervenientes políticos e dos princi-pais actores sociais tenha tido durante osprocessos revolucionários e deinstitucionalização democrática, é justo reco-nhecer que o PS foi o instrumento político-partidário essencial no combate por essamesma institucionalização democrática. Eulteriormente, conseguiu alargar progressiva-mente o seu espaço político, promovendosucessivamente a eleição de Presidentes daRepública apoiados pelo PS, apresentandoo pedido de adesão ao que é hoje a UniãoEuropeia, assinando (pela mão de Mário So-ares e Jaime Gama) o Tratado de Adesão econduzindo Portugal à participação no euro- a moeda europeia (sob a liderança deAntónio Guterres e com Sousa Franco nas

Finanças).O balanço dos 25 anos do 25 de Abril é mui-to positivo na generalidade dos aspectos.No plano internacional, reforçámos a nossaparticipação na NATO, passámos a integrara Comunidade/União Europeia, de tal formaque neste ano surgiu a perspectiva deGuterres ser presidente da Comissão (o querecusou) e de Mário Soares vir a presidir aoPE (o que também dependerá da votaçãoobtida no plano nacional).Na área económica, a revolução de Abril e opapel dos socialistas, convergindo no PS quede herdeiro das tradições republicanas e so-cialistas se foi transformando cada vez maisnum grande partido nacional da esquerdamoderna e do centro esquerda, permitiram aadesão à União Europeia e o consequenteafluxo de fundos, renovado agora com aAgenda 2000 negociada de forma brilhante.Com o governo socialista de Mário Soaresconseguiu-se estabilizar a democracia, como governo socialista de Guterres conseguiu-se um novo impulso desenvolvimentista, comuma taxa de crescimento claramente superi-or à média europeia.No plano social, devemos lembrar que em25 anos se fez um longo percurso. A criaçãodo salário mínimo (ainda durante o períododos governos provisórios) e do rendimentomínimo (já no governo de Guterres), o reco-nhecimento e apoio legal a estruturas sindi-cais democráticas são marcos relevantes dasconquistas de Abril no plano social. Comohoje, a concertação estratégica idealizadapelos políticos e pelos sindicalistas socialis-tas assume o seu papel relevante de elemen-to decisivo da estabi l idade social e,consequentemente da estabilidade políticademocrática.No plano institucional, sucessivas revisõesconstitucionais procuraram aperfeiçoar o fun-cionamento do sistema democrático, compredominância da vertente parlamentar masmantendo uma importante função presiden-cial.Essencialmente, os 25 anos do 25 de Abrilpermitem-nos reflectir sobre as alterações navida quotidiana dos portugueses. Escolas esindicatos livres, imprensa, rádio e televisãolivres, associações livres foram elementos es-senciais na construção participada de umademocracia cívica e socialmente vivida. Par-tidos políticos democráticos e poder local de-mocrático, obviamente Parlamento eleito ePresidente da República eleito, Tribunais in-dependentes foram instrumentos e órgãosindispensáveis no funcionamento de umademocracia participada e institucionalizada.O 25 de Abril veio a permitir que o último quar-to deste século fosse o da democracia. O pri-meiro quartel do século XX tinha sido domi-nado pela monarquia declinante e pela primei-ra República. O segundo e terceiro quartel domesmo século foram o tempo da ditadura mi-litar, do Estado Novo e do chamado EstadoSocial, em suma, do atípico fascismo portu-guês. O último quartel, graças ao 25 de Abril,foi o da democracia vivida e participada.Assim, o século XXI consolide essa demo-cracia, e a revivifique, num quadro nacionale europeu aberto ao mundo.

EA

Page 11: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

SUPLEMENTO 22 ABRIL 1999 ACÇÃO SOCIALISTA11

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

Cada um de nóssonhou comuma revolução

MANUEL ALEGRE

Programa do MFA tinha três«D»: descolonizar, democratizare desenvolver. Nessa perspec-tiva, a revolução portuguesa é

uma revolução vitoriosa. Mas há um proble-ma não resolvido com o 25 de Abril. À direitae à esquerda. À direita, porque parte delanão se reconhece na matriz fundadora dademocracia. Não gosta dos cravos verme-lhos, detesta os capitães, pronuncia a custoa palavra Abril. O seu imaginário é outro. Àesquerda, porque cada uma das suas com-ponentes tem o seu Abril. Há um 25 de Abrildo PCP, outro da extrema-esquerda, outroainda do PS. E há um Abril que é um con-fronto entre os diferentes projectos das vári-as esquerdas, um confronto da esquerdacom a esquerda. Ou, com mais rigor: entreo modelo de tipo soviético, chinês ou albanêse o modelo democrático.É neste contexto que tem de ser apreciada afrase de Saramago, sobre a qual já MárioMesquita e Eduardo Prado Coelho disseramo essencial. Este é um tempo de

tentação que estava a comprometer o pró-prio 25 de Abril. Novembro mata uma certarevolução, mata inclusivamente a utopia dosocialismo com liberdade. Mas consolida ademocracia. A democracia como substanti-vo, como princípio e fim, não como momen-to táctico de novos assaltos aos míticos pa-lácios de Inverno.Esta é uma questão por resolver nas rela-ções da esquerda com a esquerda. E decada uma das partes da esquerda com oseu próprio imaginário. E é esta questão queexplica talvez a frase do meu amigo JoséSaramago.A verdade é que Portugal não seria o mes-mo sem o 25 de Abril. E o mundo tambémnão. Abril foi uma revolução democráticavitoriosa. E, nesse sentido, precursora. Mos-trou que era possível passar de uma dita-dura para a democracia sem cair numanova ditadura. Sem Abril Portugal não seriao que é. Mas a Espanha também não, nema Grécia, nem talvez o Brasil. Portugal nãoseria o mesmo. Nem cada um de nós. Ape-

O 25 de Abrile o PS

MANUEL COSTA E MELO

or estranho que possa parecer,só connosco o PCP pode orgu-lhar-se de já «ser gente» quan-do, na madrugada gloriosa de

Abril, a Liberdade foi restituída ao povoportuguês, depois de 48 anos de asfixiapidesca.Era tudo açaimos para a Liberdade e sóassim Salazar e os seus caudatáriosconseguiam calar o povo, salvo naquelasfugazes ocasiões em que, a pretexto daseleições camufladas pelo disfarce decadernos eleitorais de mentira, oucomemorações cuja proibição «pareceriamal», era concebida a «Liberdadesuficiente» para uns discursos decircunstância ou almoços e jantares deconveniência.Por isso causou estranheza com o seu quêde pânico, em 12 de Junho de 1974,escassas semanas após a Semana Santade 15 do Abril ao 1º de Maio, fosseanunciado o primeiro comício do PartidoComunista, após a clandestinidade a queo 25 de Abril pôs cobro.Era no Teatro Aveirense, esse cenário detantas reivindicações históricas,designadamente o 1º e o 2º CongressoRepublicano de Aveiro, de 1957 e 1969!O 25 de Abril tinha sido uma revoluçãocontra a guerra e contra o fascismo e,portanto, com as velas da sua nau bemenfunadas pelos bons ventos de esquerda,aqueles que visavam ajudar na construçãodo tal «Mundo Melhor» de que tanto e tãobem falou Mário Sacramento.E é agora, 25 anos depois e peranteaquelas acusações directas ou disfarçadasque têm sido dirigidas ao PS, só pelo factode ter sido vitorioso em eleições legítimase, em consequência, ser Governo destePortugal, que com tanta e salutarabrangência se prepara para festejar essadata grande da sua História, não só darecente, mas da de sempre, já que não háDescoberta, nem Restauração, nemConquista que valha a da Liberdade.Por isso ousei trazer para aqui, emcontributo para o «foguetório» da alegria detodos, as palavras que, em representaçãodo PS, proferi nessa memorável sessão doTeatro Aveirense.Disse eu, então, e ainda o diria, hoje, comigual sinceridade:«Coube-me a honra, como militante que soudo Partido Socialista, de vir aqui, em nomedo meu partido, saudar o Partido Comunis-ta Português, o partido irmão na lutaantifascista, o partido irmão na tarefa comumda consolidação da Democracia em Portu-gal, o partido irmão na missão da defesa in-transigente das classes trabalhadoras.

Tudo nos une no presente momento histó-rico.Nada nos deverá separar na luta pelaconquista dos objectivos comuns que são,particularmente, todos os do povoportuguês,Que quer ser livre;Que quer escolher o seu caminho;Que quer segui-lo sem condicionalismosde natureza económica e social;Que saberá, no momento de julgaroportuno, impor a sua vontade na defesados seus interesses sagrados.Os nossos partidos não são partidos do26 de Abril.Os nossos partidos não são � nunca oserão � partidos que se imponham pelaforça às massas trabalhadoras de Portugal.E não o são porque foram cimentados naclandestinidade imposta pela tiraniafascista.E não o são porque derivam,necessariamente, do povo trabalhador queos integra e lhes impõe a disciplinanecessária à força intransigente dos seusobjectivos mais elevados.Somos, talvez, diferentes, na forma comopretendemos atingir os objectivos finais.Mas agora, nesta página da História que opovo português soube escrever com o seusangue e o Movimento das ForçasArmadas quis voltar, por mercê da acçãopatriótica dos seus jovens oficiais esoldados, temos uma tarefa a cumprir, ladoa lado.Essa tarefa é tanto mais importante edecisiva de vigilância das manobrastraiçoeiras e de denúncia dos crimes atéagora impunes.Essa é, de momento, a tarefa dos nossosdois partidos, aquela que as massastrabalhadoras esperam ver levada a cabopor aqueles que consideram seusrepresentantes na luta antifascista.É por isso que em nome do PartidoSocialista, eu vos saúdo, militantes doPartido Comunista Português, nesta etapade luta comum contra a guerra e contra ofascismo por mais disfarçadas que sejamas máscaras sob as quais se apresentamessas formas de crime.»A Esquerda tem-se muitas vezes mutiladocom tiros que dá nos próprios pés, quandose esquece de uma das mais elementaresregras da Democracia: o Pluralismo.E é porque ainda considera, as palavrasque então disse, como verdadeiras, que astrago para aqui com a ideia de quecarregando embora alguma culpas noalforge, não deixarão de ajudar os ombrosde quem o carrega, tanto a caminho doCapitólio como da Rocha Tarpeia.

OP

comunicabilidade antidiscurso, antidebate,antipensamento. Tempo de «mestres daspequenas frases» ou das pequenas frasesque podem trair os mestres. Foi provavel-mente o que aconteceu. Eduardo PradoCoelho lembrou como Eduardo Lourenço foitraído pela ironia de um título � O FascismoNunca Existiu. Quem não leu o livro interpre-ta à letra. Sucederá o mesmo com quem nãoouviu Saramago e só leu a frase. Ou talveznão. Talvez Saramago tenha dito o que pen-sa e sente. Sou amigo de Saramago. Estou-lhe grato pelo Nobel. Mas em Abril de 1975o seu projecto não era o meu. O seu 25 deAbril não é exactamente o meu. Não é a fes-ta, nem é o luto. A festa, para mim, é absolu-ta, porque o 25 de Abril significou o regres-so a Portugal de um exílio imposto e semremédio. O luto é relativo. Cada um de nóssonhou com uma revolução que não se con-cretizou. Mas a festa da vitória da democra-cia política sobreleva em mim o luto da re-volução inacabada. Para Saramago, o 25 deAbril acaba talvez em 25 de Novembro. Paramim, o que acaba em 25 de Novembro é a

sar da restauração capitalista, das tentati-vas de branqueamento de Salazar e dasvárias distorções ao próprio funcionamen-to da democracia. Mesmo que por vezesse consiga falsificar a História, mesmo quea direita não consiga engolir o Nobel de umescritor de esquerda, mesmo quando pa-rece que está a perder, é o 25 de Abril quecontinua a ganhar. Porque todos os que di-zem mal dele estão, sem querer, a render-lhe homenagem. Porque foi o 25 de Abrilque restituiu aos portugueses, mesmo aosque são contra ele, o direito de viver semmedo, de falar sem medo e, sobretudo, dediscordar sem medo. Essa é a diferença, avitória e a superioridade moral do 25 deAbril. E é por isso que, sem ele, Portugalnão seria o mesmo. E Saramago tambémnão. Uma coisa é a evolução, outra umarevolução, «ruptura de progressividade»,dizia Plekhanov. Fica na vida, no imaginá-rio, na afectividade. E também nos livros.Vencedora ainda que vencida. 25 de Abril,sempre.In «Expresso»

Page 12: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

ACÇÃO SOCIALISTA 12 22 ABRIL 1999 SUPLEMENTO

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

A luta sindicalno 25 de Abril

MARCELO CURTO

ara fazer a História do 25 deAbril é necessário saber o pa-pel dos sindicatos democráti-cos nessa caminhada.

A acção dos serventuários «sindicais» doregime corporativo começou a ser minadaalguns anos depois do início da guerracolonial. Esses agentes da colaboraçãoentre patrões e trabalhadores viam aimpossibilidade de continuar a ficção dapaz social do fascismo. A própria guerra, aemigração e o desenvolvimento económicoeuropeu reflectiam-se na mentalidade e naacção dos trabalhadores. Odesaparecimento de Salazar e a reformalegislativa que se seguiu permitiu elegerdirecções sindicais de críticos e opositoresao regime corporativo-fascista que, nocampo sindical teve consequênciasinelutáveis: os novos dirigentes sindicaispassaram a exigir condições de trabalho eníveis salariais justos e justificados porestudos económicos bem elaborados epela acção de juristas determinados adefender os direitos dos trabalhadores.A vaga reivindicativa começada em 1969traduziu-se na preparação defundamentações legais de um Direito deTrabalho até então inexistente e na criaçãode formas organizativas para impornegociação das condições de trabalho querapidamente geraram novas leis deconvenções colectivas de trabalho, a quesó faltava o recurso à greve, a qual noentanto foi utilizada quando se chegava aoimpasse negocial.Em toda esta evolução agiam resistentese opositores ao fascismo cuja experiênciafora adquirida na luta política mas não selimitava aos comunistas: católicosprogressistas, socialistas e republicanosdemocráticos ressurgiam como se aresistência ao salazarismo tivesse umatransmissão de gerações que a repressãopolicial e o cansaço não conseguiramextirpar do ânimo das reivindicaçõesdemocráticas centradas na liberdade deorganizações e na exigência do respeitopelos direitos do homem.A Intersindical resulta dessa vontade e danecessidade de os sindicatos se reunireme traçarem a acção nos interesses comuns.Desde Outubro de 1970, a Intersindicalcresce com a exigência de direitos vitaispara os sindicatos: o direito de reunião, odireitos a horários justos e humanos, odireitos de representação intersindical naOrganização Intersindical do Trabalho (OIT),entre outros.Quando em Maio de 197,1 a Intersindicalelege representantes dos trabalhadores àOIT, Marcelo Caetano considera que setinha ido longe de mais. A repressãopolicial, que já tinha mostrado os dentes aalguns sindicatos (Metalúrgicos, Lanifícios,Caixeiros), abate-se com brutalidade sobreas reuniões intersindicais. As reformas

legislativas recuam a e as reuniões daIntersindical passam a semiclandestinas.Entretanto, vários dirigentes sindicais vãoparar à prisão, onde são torturados paraconfessarem a sua ligação com o PartidoComunista. A direcção do Sindicato dosMetalúrgicos é destituída por umaComissão Administrativa nomeada peloministro das Corporações. O Sindicato dosBancários do Sul e Ilhas é encerradotemporariamente, várias reuniões sindicaissão proibidas e os Caixeiros sãoespancados enfrente da AssembleiaNacional.Mas a Intersindical não se desfaz nem secala. Várias reformas legislativas sãoreclamadas e a luta dos sindicatosendurece, o conflito laboral da TAP leva abrutal repressão sobre os trabalhadores dacompanhia aérea. A luta pelos delegadossindicais eleitos não esmorece. Aorganização da Intersindical e dossindicatos democráticos torna-se mais fortee determinada e chega ao 25 de Abril comuma capacidade de luta que se vai revelardecisiva para o movimento popular depoisdo 25 de Abril.É certo que, rapidamente, os comunistasdominam e conduzem a Intersindical. Masnão todos os sindicatos.Para quem conhece a organização políticada oposição ao fascismo, no 25 de Abrilnão estranha o domínio sindical do PartidoComunista. Porém, a evolução do pós-25de Abril torna clara a oposição de váriossectores laborais à moderação do PCP deque é um exemplo marcante a lei da grevede Agosto de 1974 que é recusada pelostrabalhadores e pelos PS, então em fasede organização do movimento sindicaldemocrático. Exemplo claro da oposiçãoao PCP é a luta dos trabalhadores dos CTTpor melhores salários e pela criação do seusindicato contra as reservas do PCP.Entretanto, novos sindicatos surgem,libertos da tutela do PCP e a luta contra aunicidade sindical, como unidade imposta,conduz à vitória de l istas sindicaisdemocráticas em vários sindicatos. A lutapela unidade sindical em l iberdadecontinua, mas a insistência da Intersindicalpelo domínio dos sindicatos produz oinevitável pluralismo sindical em que aindahoje vivemos. Do que ninguém podeduvidar é da importância da luta sindicalantes do 25 de Abril, ao lado da luta políticae do Movimento dos Capitães na eclosãodo 25 de Abril e, sobretudo, na preparaçãodos trabalhadores para a dinamização domovimento popular de apoio aos Capitãesde Abril e à acção partidária.Independente dos partidos políticos, massolidário na luta pela l iberdade, omovimento sindical constitui um factordecisivo na Revolução dos Cravos e naconsolidação do regime democrático emPortugal.

MARQUES JÚNIOR

Mensagem de Abrilo comemorar-se mais um aniver-sário do 25 de Abril de 1974 é nor-mal recordar o que ele foi e repre-sentou para todos os portugueses

e ao mesmo tempo perspectivar o futuro.E se hoje é relativamente fácil falar do tempoda ditadura, das motivações que estiveramna origem da revolução e dos tempos daconsolidação da democracia, é bastante maisdifícil imaginar o que será o nosso futurocolectivo.O regime que se vivia em Portugal era violadordos mais elementares direitos humanos ondenão cabiam expressões como Democracia eLiberdade. Havia a censura. Não havialiberdade de reunião, de manifestação, deexpressão. As pessoas podiam ser presas,torturadas e assassinadas só por pensaremde maneira diferente. Havia a guerra coloniale havia a polícia política que vigiava até aconsciência dos portugueses. Portugalestava isolado internacionalmente e haviaainda uma forte emigração, quer por razõeseconómicas quer para fugir à guerra. Portugalera um país subdesenvolvido e isolado dacomunidade internacional. Este era o quadroque determinava a pressão que era exercidasobre nós, oficiais dos quadros permanentes,principalmente sobre os mais novos porqueeramos nós que tínhamos o contacto maisdirecto com os soldados e mil itaresmilicianos.Este quadro foi determinante para aorganização do MFA que conduziu àRevolução.Descrever esse período não é fácil, mas haviaem todos nós, mesmo sem o racionalizarmos,a ideia de que nos estávamos a meter numaaventura de consequências imprevisíveis.A carreira militar e mesmo o risco da nossaprópria vida não estavam nas nossasprimeiras preocupações.Tudo era secundarizado perante o grandeproblema de consciência que resultava dofacto de, ao menos por omissão, podermosser responsabilizados pela manutenção doregime uma vez que éramos nós quedispúnhamos da principal força.No desenvolver de todo este processoviveram-se momentos de grande tensão mastambém de grande empenhamento. Acamaradagem assumiu-se em toda aplenitude. A vontade tornou-se acção eaconteceu Abril!Ao som da «Grândola Vila Morena» iniciou-sea queda do regime e a palavra Liberdadeassumiu a magia que tudo transformava. Deimediato os sonhos tornaram-se realidade ea vontade «movia montanhas». «Querer époder» deixava de ser uma utopia.Comungávamos todos de uma alegria imensae não podia nunca imaginar (na altura, comoagora) recompensa maior. Ao contrário, soueu que estou em dívida para com o povoportuguês pela forma como manifestou a suaalegria pela Revolução. Nunca maisesquecerei. Recompensa? Já imaginaram oque é ter participado numa acção quedevolveu a soberania ao povo português eque lhe permite viver hoje em Liberdade eDemocracia? Já imaginaram o que éparticipar numa revolução sem dar um tiro,que ficou conhecida como a Revolução dosCravos? Já imaginaram o que é, terparticipado num acto, reconhecido em todoo mundo como a mais bela Revolução dahistória da humanidade e que influenciou deforma decisiva, o aparecimento de outrasdemocracias no mundo?

Que maior recompensa que a de ter contribu-ído para a Liberdade de um povo? Sincera-mente não consigo imaginar recompensamaior.Não foi um percurso fácil estes 25 anos daDemocracia e Liberdade. A sua consolidaçãopassou por períodos de grande e generosoentusiasmo popular que através da suadinâmica e espirito criativo criou as bases daafirmação popular e democrática, mastambém passou por períodos de grandetensão que criaram divergências eperturbaram a nossa sociedade.Foram, no entanto, períodos ricos deexperiência, em que os cidadãos tomaramnas suas mãos o seu destino e afirmaramPortugal no mundo, influenciandoexperiências democráticas em muitos outrospaíses como é geralmente reconhecido.Ninguém de boa fé questiona hoje aimportância do 25 de Abril, quer no que dizrespeito à nossa vivência democrática, querno que diz respeito ao nosso desenvolvimentoe à nossa completa integração nacomunidade internacional onde somosrespeitados e considerados. Passado 25anos do 25 de Abril podemos pois afirmar queestão, no essencial, cumpridos os objectivosa que nos propusemos e que estão criadasas condições políticas que vão permitir, nofuturo, aperfeiçoar a nossa democracia e«afinar» o nosso desenvolvimento.Vivemos na sociedade da informação em quetudo se tornou rapidamente passado, tal avelocidade com que os acontecimentos sesucedem, fruto principalmente de umadinâmica da vida moderna que torna obsoletoo que ontem era novidade.Há mesmo sintomas preocupantes dessasalterações relativamente a valores e princípiosestruturantes da nossa sociedade, cominfluência directa ao nível de estabilidadepsicológica e com consequências várias nanossa organização social.Estruturalmente a sociedade está diferente emelhor mas o futuro que começou ontem paraos jovens apresenta um quadro de grandesdificuldades, em que a incerteza é a únicacerteza que hoje têm.A minha geração tem óbviamenteresponsabilidades na construção destasociedade, permanecendo a esperança deque o futuro, considerando o sentido daHistória, será de mais progresso e de maiorjustiça social. E somos nós, todos nós, queo vamos construir.Se me permitem, eu gostaria de deixar aosjovens uma mensagem: a luta pelademocracia e pela liberdade custou muitasvidas e sacrifícios. São valores que não sepodem considerar irreversíveis, antes pelocontrário, temos de todos os dias na família,na escola e no trabalho defendê-los,aperfeiçoando a nossa acção cívica efortalecendo a nossa exigência como homenslivres que somos e que queremos continuara ser.A mensagem de Abril é recordar a grandedeterminação e entusiasmo que o povoportuguês mostrou na defesa dos ideais daLiberdade e da Democracia.A mensagem de Abril é ter presente queapesar dos erros e excessos cometidos,nunca houve uma revolução tão bela, tãogenerosa e tão fraterna.A mensagem de Abri l é assumir aresponsabilidade de manter viva a esperançados ideais da Revolução e lutar pela suaconcretização.

AP

Page 13: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

SUPLEMENTO 22 ABRIL 1999 ACÇÃO SOCIALISTA13

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

25 Anosdo 25 de Abril

MEDEIROS FERREIRA

ara quem como eu era exiladopolítico, a notícia do 25 de Abrilsabida cedo em Genebra, foi oanúncio do passaporte para a

liberdade e para o regresso ao Portugaldemocrático. Não tive dúvidas quanto ànatureza das modificações operadas nonosso país, pois as havia de certa manei-ra previsto na tese que enviara há maisde um ano para o Congresso de Aveiro eem que dizia:«Neste último quarto de século o País as-

siste, desorientado, à justaposição de pro-blemas que se lhe põem, os quais isola-dos uns dos outros já seriam graves e jun-tos seriam insolúveis. O regime é respon-sável por essa acumulação e a naturezado Estado Novo leva a que o actual Go-verno se remeta a um pacato empirismo,preferindo a rotina da crise às medidascapazes de resolverem os problemas por-tugueses. Todavia aproximam-se paraPortugal prazos inadiáveis para a resolu-ção das suas dificuldades. Estas podem-lhe alterar a alma e a fisionomia. A Naçãoencontra-se em jogo e com ela o destinodas classes sociais que a habitam e a in-formam.Na realidade, no preciso momento emque o processo de integração europeiase acelera e nos abrange, com riscos amédio prazo, mas com enormes vanta-gens a longo, no caso de estarmos pre-parados, encontra-se o País a contas comuma guerra colonial longa de mais de dezanos. O que foi falta de previsão nos anos50, revelada na ausência de um proces-so original de descolonização da Áfricaportuguesa, tornou-se, com o apareci-mento em Angola, Moçambique e Guinéde movimentos de independência dispos-tos à luta armada para a conseguir, faltapolítica grave do regime perante a Nação.E hoje, decorridos mais de dez anos so-bre o começo da guerra colonial, o Esta-

do Novo está paralisado perante o pro-blema. Mais do que determinação de con-tinuar a guerra colonial, o discurso deJaneiro do Presidente do Conselho reve-la tal paralisia. O regime não encontraoutra saída do que a guerra e esta nãoconstitui uma.Está pois paralisado o regime e os inte-resses que lhe animam a existência pe-rante o problema colonial, mas não o po-der estar o País. Este tem de impor ur-gentemente uma pol í t ica de

descolonização.»Nessa mesma comunicação intitulada«Da necessidade de um Plano para aNação», chamava a atenção para o papeldas Forças Armadas e apontava, nas con-clusões, os objectivos que convinha atin-gir simultaneamente. Tratava-se de«descolonizar, socializar e desenvolver...através de uma profunda democratizaçãoda sociedade portuguesa».Armado dessas certezas regressei a Por-tugal e tive a oportunidade de participaractivamente na luta política que então seprocessou e que permitiu o estabeleci-mento de um regime de democracia polí-tica pluralista, graças em grande parte àacção do Partido Socialista e à sua vitórianas primeiras eleições livres em Portugalpara a Assembleia Constituinte.Quero aliás recordar os deputados consti-tuintes que conseguiram levar ao fim asseus trabalhos e dotar o país da Constitui-ção que permitiu o pedido de adesão dePortugal à Comunidade Europeia nos pri-meiros meses de vigência do I GovernoConstitucional presidido por Mário Soares.Convém não esquecer que sem o acto li-bertador do 25 de Abril, Portugal não te-ria entrado no momento certo na Europae hoje estaria certamente na cauda dospaíses em lista de espera nas negocia-ções para o alargamento da UniãoEuropeia.

Viver Abriltodos os dias

NATALINA DE MOURA

ertenço a uma geração alta-mente penalizada pela ausên-cia de liberdade.Em 1961 entrei na Universida-

de Clássica de Lisboa, Faculdade de Ci-ências. Aí, me dei conta, do sentido exac-to da palavra liberdade, ou melhor, do sig-nificado de liberdade de pensamento e dapossibilidade de exprimi-lo ou não.Na qualidade de dirigente da maior Asso-ciação de Estudantes Universitária de Lis-boa, estive à frente de inúmeras contesta-ções, contestações de ordem pedagógi-ca que eram tidas, de imediato, pelo go-verno do anterior regime, comopotenciadoras de conflitos políticos, logofortemente reprimidas.O espaço associativo foi muitas vezes in-vadido pela PIDE/DGS, invasões que setraduziam na destruição de todo o materi-

al cultural, livros e discos eram destruídosa eito sem nenhuma lógica de escolha,nem selectividade.Destruição pela destruição do patrimónioque nos era tão caro em termos afectivosDecorridos 25 anos de conquista da liber-dade de ser e estar, e porque só Se é e seestá com a liberdade e em liberdade depensamento e acção, há que assegurarque ninguém mais invadirá o nosso espa-ço público ou privado com a intenção dedestruir gratuitamente e ao arrepio da Leia essência da nossa vida.Aos jovens que não conheceram o 25 deAbril e que aqui quero saudar, se exigehoje, a força, a determinação e uma pos-tura vigilante.Viver Abril todos os dias é estar vigilante,atento aos sinais, sinais que pretendammacular a Democracia.

P P

Page 14: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

ACÇÃO SOCIALISTA 14 22 ABRIL 1999 SUPLEMENTO

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

Memóriade Abril

PEDRO COELHO

s momentos intensamente vivi-dos perduram na memóriacomo factos recentes e fazem-nos esquecer como o tempo

passa veloz.Vinte cinco anos depois. Quantas esperan-ças frustradas, quantas oportunidades per-didas, quantas ingenuidades generosas,mas igualmente quantas conquistas,quantos progressos, quantas alegrias, pelavivência em Liberdade.O vigésimo quinto aniversário da Revolu-ção dos Cravos ocorre no nosso País nummomento de grande prosperidade e esta-bilidade, contrastando com algumas pe-sadas nuvens negras, carregadas de so-frimento e de desgraça, que dão pelosnomes de Timor, Kosovo, Sérvia, Angola,Indonésia, e tantos outros, onde os povossofrem a intolerância de ambiçõesincontroladas e de jogos de geo-estraté-gia.Pensámos que a queda do Muro de Berlimtraria alguma paz ao Mundo, fazendo di-minuir a corrida aos armamentos edisponibilizando recursos financeiros eenergias produtivas para melhorar a situa-ção dos deserdados da Terra. Afinal, veri-fica-se que a desregulação provocada pelaqueda do bloco soviético - sem substitutoà altura para contrabalançar o poderioestadunidense -, se tem transformadonuma apocalíptica tragédia composta depequenas grandes tragédias locais e regi-onais, traduzidas em guerras civis,genocídios, êxodos forçados, actos debanditismo organizado ou tolerado, terro-rismo de Estado e destruição massiva depessoas e bens.Ao poder autoritário e ditatorial soviéticocaído, a Europa democrática não soubeainda construir uma alternativa eficaz, quefaça de contraponto às aventuras belicistasdos falcões americanos e tempere as in-congruências estratégicas dos EstadosUnidos.O facto de reconhecermos os méritos dagrande Democracia do outro lado do Atlân-tico e o papel que desempenhou no auxí-lio à Europa e no apoio à sua autonomia eindependência em relação ao seu vizinhoeurasiático, não significa que aceitemos,sem discussão, toda e qualquer iniciativaque possa pôr em risco a paz da Europa.Não está em causa a condenação do re-gime sérvio e dos seus próceres, prova-velmente a via do diálogo teria sido infrutí-fera, mas a defesa dos princípios e da le-gitimidade futura obrigava a tentar umaintervenção mandatada pela ONU, esgo-tada a capacidade de negociação.

A prática acabou por demonstrar que asperdas em vidas, a devastação e o sofri-mento não são seguramente menores queos malefícios que os sérvios continuariama causar no Kosovo durante mais algunsdias em que se esgotasse a hipótese dumasolução pacífica do conflito e se obtivesseo mandato da ONU para intervir.A Europa da OTAN alinhou sem reservasna estratégia americana, ou terá mesmoempurrado os americanos para esta situ-ação. Portugal, como membro da Aliança,não podia ficar de fora e a sua participa-ção, embora de uma forma quase simbó-lica, é justificável.A questão é que os dirigentes europeustem a obrigação de conhecer a História, esaber que os Balcãs são zonas de altacomplexidade política, étnica, social e reli-giosa, em que conflitos regionais se têmtransformado em guerras generalizadas.Se hoje a hipótese duma guerra mundial éremota, já as consequências desta aven-tura balcânica, para uma paz duradoura euma concertação entre povos, sãoimprevisíveis. Os sérvios nunca esquece-rão esta amarga, ainda que justa, lição; osrussos dificilmente engolirão a humilhaçãopor que passaram; o resto do Mundo fica-rá sempre psicologicamente à mercêduma qualquer decisão dum poderhegemónico.Como acabará toda esta tragédia é difícilde prever. Perder já todos perderam, oseuropeus mais que todos. Agora como sevai daqui sair sem perder a face já é maiscomplicado.Apelos ao bom senso de Milosevic não fa-zem sentido. Se alguma vez o teve já nadalhe resta. Esperemos que o seu instinto desobrevivência política o leve a uma saídaque permita aos Aliados parar com osbombardeamentos e aos capacetes azuisentrarem no Kosovo, e salvar o que aindaresta de kosovares de origem albanesa.Para tal, a intermediação dos russos é vi-tal e, sendo bem sucedida, permitirá recu-perar parte do protagonismo que lhes foiinicialmente negado.As hipóteses alternativas são más de maispara serem encaradas.Voltando ao nosso 25º aniversário, ele tam-bém ensombrado pelos trágicos aconte-cimentos em Timor, façamos votos e lute-mos para que a Paz e o Progresso quePortugal tem desfrutado após a revoluçãode Abril, sejam extensivos a todos os paí-ses do Mundo, particularmente aqueles emque nós temos responsabilidades históri-cas e com os quais usufruímos uma Lín-gua e uma Cultura comuns.

Abrilem Portugal

RODOLFO CRESPO

ma manhã como as outras emParis. Um despertar como osoutros. Liguei o rádio para asprimeiras notícias. «Abril em

Portugal» - começou o locutor - «um gru-po de capitães derrubou o regime ditatori-al de Lisboa»� Corro para o telefone e ligoao Mário Soares que já sabia. Mais unsquantos telefonemas para Londres, Bruxe-las, Amesterdão, Frankfurt, Luxemburgo:os camaradas alguns já sabiam, outrosnem queriam acreditar. E depois o telefo-ne não pára. Alguém do consolado a di-zer-me que sempre tinha estado contra oregime, jornalistas amigos a perguntarem-me onde podiam encontrar o Mário Soa-res, amigos muitos, outros que eu nem co-nhecia. Afinal nem o Partido Socialista nemeu próprio éramos tão clandestinos comoisso! Reunidos algum tempo depois emcasa do Mário Soares o telefone não páracada vez que o Mário desliga depois defalar com o Zenha, o Rego ou o MagalhãesGodinho. O Mário quer regressar a Portu-gal. Alguns camaradas desaconselham, háque esperar algum tempo dizem � saberexactamente o rumo que as coisas vãotomar. É não conhecer o personagem e asua longa espera. Não há aviões - o aero-porto da Portela está fechado. Mas hácomboios. O Mário, o Tito e o Ramos daCosta apanham o primeiro para Lisboa.O 25 de Abril tinha sido uma longa esperade 48 anos à qual o generoso gesto doscapitães tinha posto fim. Durante essa lon-ga espera houve quem nunca tivesse bai-xado os braços mantendo acesa a luz daesperança e os ideais de justiça e de liber-dade. Desde os velhos republicanos comJaime Cortesão e António Sérgio, passan-do pela Acção Socialista Portuguesa como Mário Soares, Tito de Morais e Ramosda Costa, ao Partido Socialista herdeiro daluta e dos mesmos ideais.O 25 de Abril teria sido diferente sem essaluta perseverante ao longo de décadas. Enão só dos socialistas. Os comunistasnunca esmoreceram e foram, reconheça-

se, os mais castigados. E há que não es-quecer os liberais que com Sá Carneiroquiseram mudar o regime por dentro e quefalharam. Foram estes grupos que agar-raram o 25 de Abril, lhe deram conteúdo econstituem hoje o esteio da democraciaportuguesa � o PS, o PCP e o PSD.Foi uma luta a que o 25 de Abril deu a ver-dadeira dimensão. Os contactos no seioInternacional Socialista, as ligações aosmovimentos de libertação e de resistência,a nossa presença constante em todos osgrandes movimentos internacionais, vie-ram credibilizar o 25 de Abril quando ele-mentos do Partido Socialista integraram osGovernos provisórios. E quando os socia-listas saíram do V governo provisório pordesacordo com o rumo totalitário que es-tava a tomar a revolução, o governo e oConselho da Revolução ficaram desacre-ditados internacionalmente. Os resistentes,uns fora do país, outros dentro, moldaramo 25 de Abril e obrigaram ao rumo demo-crático da revolução dos cravos. É a His-tória.Mas se é certo que foram os resistentesao velho regime de Salazar que agarraramo 25 de Abril, que fizeram a democracia,não é menos certo que todos temos umadívida de gratidão para com aqueles quetornaram isso possível e que encurtarama já longa espera: os capitães de Abril. Épor isso doloroso, é sinal de ingratidão queos capitães de Abril sejam preteridos pelademocracia que tornaram possível. É cer-to que a revolução teve altos e baixos eque foi diferente o posicionamento doscapitães, mas a diversidade revolucioná-ria dos militares traduziu-se finalmente nadiversidade do próprio regime e sem essadiversidade não haveria liberdade.Saibamos reconhecer que a revolução do25 de Abril foi diferente porque os militan-tes tomaram o poder para o devolverem àsociedade civil. Homenageemos os capi-tães de Abril e a melhor homenagem emdemocracia é fazer-lhes justiça, porquejustiça também é liberdade.

O U

Page 15: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

SUPLEMENTO 22 ABRIL 1999 ACÇÃO SOCIALISTA15

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO

VASCO LOURENÇO VÍTOR ALVES

RecordarAbril

ecordar o 25 de Abril de 1974,mesmo passados 25 anos,continua a provocar-me umsentimento de muita honra e

muito orgulho, mas acima de tudo, tam-bém, um sentimento de profunda realiza-ção pessoal.Com efeito, apesar de muitas tristezas,umas mais longínquas outras bem próxi-mas, provocadas por igual número de de-silusões e desgostos, não consigo deixarde me sentir orgulhoso e feliz de, comocidadão português e do mundo, poder terparticipado activamente num processo li-bertador como foi a «Revolução dos Cra-vos».Ao olhar para o Portugal de hoje, ao assis-tir às muitas imperfeições da nossa socie-dade, ao constatar as injustiças e desigual-dades que se verificam, poderíamos serlevados a pensar que «afinal, nada melho-rou, tudo está na mesma, não valeu apena». Sentimento que poderia acentuar-se ao recordarmos as muitas oportunida-des perdidas, ao longo destes 24 anos, serememorarmos os muitos sonhos acalen-tados e não realizados. E que poderia ain-da ser fortemente reforçado ao verificar-mos que, mesmo «sem saber ler nem es-crever», acordámos um dia envolvidosnuma guerra, que não percebemos, nãoaceitamos e urge terminar rapidamente.Nada mais errado!Para podermos analisar o 25 de Abril, te-remos que comparar a actual situaçãocom a que se viva antes dessa maravilho-sa madrugada.E, ao fazê-lo, rapidamente concluiremosque estamos hoje muito melhor que há 25anos. É muito preferível vivermos em liber-dade, sem repressão, sem medo, semcensura, sem guerra, sem isolamento in-ternacional, com capacidade de escolher-mos livremente as várias opções políticasque se nos oferecem, com liberdade paraexprimirmos as nossas opiniões e as nos-sas convicções, sem receio de quem nospossa ouvir e denunciar, com paz, sem aobrigatoriedade de partir para uma guerraque nos impunham e nada nos dizia, comorgulho da nossa condição de portugue-ses.Como em anos anteriores, vimos assistin-do a tentativas de banqueamento do regi-me totalitário, do regime fascista ecolonialista, que nos oprimiu durante qua-se 50 anos. Os tiranos, os ditadores, osfascistas, os fascínoras, são apontados oucomo «bem-intencionados», ou como uns«pobres coitados», que só fizeram o quefizeram porque a conjuntura, a época, aisso os terá obrigado. O despudor é tantoque chegam a apresentar o ditador fascistacomo um autêntico antifascista e o 25 deAbril como qualquer coisa que veio inter-romper as «excelentes intenções» do dita-dor Caetano, que «pretendia democratizaro país e aceitar a independência das coló-

nias»� Por este andar, qualquer dia aindase conclui que os militares de Abril se pre-cipitaram e só vieram atrapalhar�A memória pode ser curta, mas é precisonão exagerar. E denunciar a hipocrisia dosque hoje, passados 25 anos, julgam já tercondições para manipular as novas gera-ções e para lançarem a confusão nos queviveram a repressão, sentiram a opressãohá já 25 anos.Pode-se ser tolerante, como se foi, não terprocedido a represálias e à aplicação dajusta punição, não se pode é dar a volta atudo o que aconteceu e aceitar que se tentecamuflar as situações e justificar os crimescometidos.Para que as novas gerações, já nascidasem liberdade, não caiam na ratoeira e se-jam levadas, ou à prática de novas tirani-as, ou ao descuido que ponha em causaas liberdades existentes, torna-se neces-sário, é imperioso mesmo, que os queconheceram o regime fascista e sofreramas consequências do mesmo, lhes trans-mitam a sua experiência, o seu conheci-mento, e os alertem para a verdade e arealidade.É preciso recordar, denunciar a situaçãoque se viva: repressão, a falta de liberda-de, a guerra, enfim, tudo a que o 25 deAbril pôs termo.Hoje temos problemas. A sociedade ne-cessita de ser melhorada. Temos de com-bater o desemprego, a falta de habitaçãocondigna, as más condições do serviço desaúde, as deficiências na educação, apobreza, a marginalização e até a exclu-são social de muitos, a droga, os atenta-dos à natureza.Estamos confrontados com sistemas polí-ticos que proporcionam as condições paraque o capitalismo assuma, cada vez mais,formas extremadas de actuação e explo-ração. Assistimos à consagração doneoliberalismo, sob a capa daglobalização, onde o mercado é novoDeus, provocando cada vez mais desigual-dades, mais injustiças, mais miséria, maisguerra.É um facto. Como já referi, até nos mete-ram numa guerra sem sentido, a que im-porta pôr cobro. Tudo isto é verdade. Noentanto, a luta contra toda essa situação,contra as novas tiranias, a luta pelos ideaisque em Abril de 1974 floresceram e nos fi-zeram sonhar, pode hoje, com liberdade edemocracia, ser desenvolvida e praticada.Sem receio de sermos banidos, apenasporque lutamos pelos nossos ideais, pe-los nossos valores. Porque defendemos asnossas ideias, aquilo em que acreditamos.E por isso, porque o 25 de Abril nos pro-porcionou a liberdade e a democracia, quenos permite lutar abertamente por uma vidamelhor, que nos permite assumir semmedo a nossa condição humana, continuoa sentir-me orgulhoso e honrado na pelede um «capitão de Abril».

Prolongaro 25 de Abrilno futuro

ucederam-se velozes estes 25anos que transformaram a so-ciedade portuguesa depois darevolução de Abril.

Só passaram 25 anos e contudo já passa-ram 25 anos. Um pouco mais do que nadaem tempo histórico, e todavia um ciclogeracional em tempo de vida humana.Vivemos em democracia, conquista do povoportuguês, tornada possível pelo «Movimen-to dos Capitães».Sendo a democracia, por definição, crítica eexigente, não nos cansamos de repetir tudoo que lhe falta, tudo o que está mal. Posição

correcta, posição necessária, mas nem porisso mesmo totalmente justa. Não esqueça-mos que a democracia não é um fim, massim um meio.Sem dúvida que muito falta fazer, mas naverdade muito foi feito, e só o poderia ter sidocom o 25 de Abril.Tenha-se ou não consciência disso, estes 25anos foram anos de mudança. Somo umpaís que já mudou.Nesta evolução também as gerações se vãorendendo. É hoje adulta a juventude de on-tem e a juventude de agora ainda não tinhanascido. Em termos de sistema de ensino,muitos dos actuais professores tinham en-tão um e dois anos de idade .As novas gerações vivem, na realidade dehoje, sem totalmente se aperceberem da re-alidade de Abril.É da filosofia do conhecimento que a per-cepção valorativa de uma realidade depen-de da consciência do seu contrário. Ora, osquadros de referncia em que a juventudecresceu, a memória que não tem do passa-do recente, limitam a compreensão dos ab-surdos condicionamentos em que viveramas gerações anteriores.O colonialismo e a guerra, a repressão estu-dantil e sindical, a marginalização cívica,obscurantismo cultural, isolamento interna-cional, configuram um passado sombrio,cuja proximidade a juventude não sente ecuja inovação pouco a sensibiliza.

Para ela, os valores que estiveram na génesedo 25 de Abril são dados adquiridos, cujarepetição no discurso de cada dia soa a re-dundância.A afirmação do 25 de Abril tem de passarpor aquilo que, nele implícito, está ainda porcumprir.Sem desprezar a pedagogia inteligente, ali-ciante, inovadora, dos valores conquistadose do que significaria a sua liquidação, há quedar resposta aos anseios da juventude, com-preender o seu inconformismo, alimentar asua generosidade.Anseios que, a partir das liberdades adquiri-

das, se identificam com segurança no em-prego e no salário, com a paz, com uma vidadigna para todos.Inconformismo que saudavelmente persisti-rá, enquanto não se encontrarem soluçõespara problemas que ameaçam o futuro, re-lacionados com a escola, a habitação, a saú-de, os transportes, a burocracia.Generosidade que está disponível para cau-sas como a conservação da natureza, ocombate à discriminação sexual, a culturaliberta de tabus, o aproveitamento dos tem-pos livres, o convívio aberto e sem frontei-ras.A transformação da sociedade passa essen-cialmente por aí.Orgulhamo-nos do 25 de Abril mas, parafra-seando Garrett, diríamos que ele não podeser só o que foi, nem pode cristalizar no queé, sob risco, até, de negar o que foi. Tem dese prolongar no futuro.Aproprie-se a juventude do 25 de Abril, cul-tive os seus valores fundamentais e que es-tes constituam as referências dominantesna solução dos seus problemas concretos.Compete-nos a todos, tudo fazer para quedo integral aproveitamento das excepcio-nais condições presentes na actual conjun-tura, resulte o Portugal justo, próspero e fe-liz, pelo qual todos ansiamos, e que esteveafinal na origem, tão simples e tão sincera,da criação do Movimento das Forças Ar-madas.

RS

Page 16: 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO · 25 DE ABRIL 25” ANIVERS`RIO 23 de Abril, Sexta-feira NetArtFax Œ início 11.00 Œ Porto/Pav. Rosa Mota Colaboraçªo IPJ Festa - «25 de Abril

ACÇÃO SOCIALISTA 16 22 ABRIL 1999 SUPLEMENTO

25 DE ABRIL 25º ANIVERSÁRIO