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CARLOS AUGUSTO DE MEDEIROSHILBERNON FERNANDES COELHO
(COLABORADORA)
CURSO DE METODOLOGIACIENTÍFICA:
contexto, fundamentos, organização dotrabalho acadêmico e iniciação à pesquisa
científica(v. 2)
Guará, Distrito Federal2006
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CARLOS AUGUSTO DE MEDEIROSHILBERNON FERNANDES COELHO
(COLABORADORA)
CURSO DE METODOLOGIACIENTÍFICA:
contexto, fundamentos, organização dotrabalho acadêmico e iniciação à pesquisa
científica
(v. 2)Curso de Metodologia Científicadesenvolvido com o objetivo deimplementar o seu desenvolvimentovirtual para os cursos de graduação,licenciatura e tecnologia do InstitutoCientífico de Ensino e Pesquisa – UnICESP.
Guará, Distrito Federal2006
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DEDICO este breve estudo àprofessora MSc. Ana AngélicaGonçalves Paiva, Pró-ReitoraAcadêmica do UnICESP, emreconhecimento por sua inabalávelconfiança em meu trabalhodepositada, a quem desejo um
FORTE ABRAÇO!
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Agradecimentos
à Andréia, ao Lucas e à AnaCarolina,
AGRADEÇO também, a todos oscolegas que acreditaram em mim.
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[...] a vocação técnica e instrumental doconhecimento científico tornou possível asobrevivência do homem a um nível nuncaantes atingido (apesar de a promessasocial ter ficado muito aquém da promessatécnica), mas, porque concretizada sem acontribuição de outros saberes,aprendemos a sobreviver no mesmoprocesso e medida em que deixamos desaber viver. Um conhecimento anônimo
reduziu a práxis à técnica.
(Boaventura de Sousa Santos, 1989)
Hoje, no teatro desmedidamente extensodas representações de nosso mundo
oferecidas a todos pelos textos e pelasimagens, a ciência certamente aparececomo uma personagem essencial.Misteriosa, porque o pormenor de suafigura não está ao alcance dos próprioscientistas; tutelar, porque dela dependemas maravilhosas máquinas que povoam oslugares em que vivemos; inquietante,porque estamos conscientes dos poderesantinaturais e aparentemente ilimitadosque um tal saber foi e será capaz dedesencadear.
(Gilles-Gaston Granger, 1994).
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Resumo
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Résumé
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Lista de Figuras
FIGURA 1 – As dimensões da ciência............................................................... 266
FIGURA 2 – Problematização: Estrutura............................................................ 254
FIGURA 3 – Objetivos da Pesquisa................................................................... 255
FIGURA 4 – Objetivos da Pesquisa................................................................... 256
FIGURA 5 – Cronograma: Exemplo................................................................... 280
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Lista de Esquemas
ESQUEMA 1 – Especificando a área de interesse: exemplos........................... 278
ESQUEMA 2 – Perguntas de partida: processo................................................. 280
ESQUEMA 3 – Perguntas de Partida: Critérios de Qualidade........................... 251
ESQUEMA 4 – Fontes de Informações.............................................................. 268
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Lista de Quadros
QUADRO 1 – Interesse de Pesquisa................................................................. 274
QUADRO 2 – Interesse de Pesquisa: Preenchimento....................................... 276
QUADRO 3 – Especificando a área de interesse............................................... 277
QUADRO 4 – Interesse de Pesquisa: especificação e perguntas de partida..... 279
QUADRO 5 – Atividade: Formulação de Perguntas de Partida......................... 246
QUADRO 6 – Perguntas de Partida: Tratamento............................................... 251
QUADRO 7 – Atividade: Perguntas de Partida: Tratamento.............................. 246
QUADRO 8 – Problema de Pesquisa................................................................. 249
QUADRO 9 – Atividade: Problema de Pesquisa................................................ 250
QUADRO 10 – Desenvolvimento Positivista...................................................... 261
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Lista de Tabelas
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Lista de abreviaturas e siglas
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Lista de símbolos
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Sumário
1 Apresentação ..................................................... Erro! Indicador não definido.
1.1 Atividade: Memorial. .................................................... Erro! Indicador não definido.
1.1.1 Definição de Memorial .........................................Erro! Indicador não definido.
1.1.2 A Atividade ..........................................................Erro! Indicador não definido.
2 Unidade I: Boas-Vindas! ................................... Erro! Indicador não definido.
2.1 Considerações Iniciais ...................................................Erro! Indicador não definido.
2.2 Lição 1: Impactos da mundialização/globalização na vida das pessoas .Erro! Indicadornão definido.
2.2.1 Efeitos da mundialização sobre a educação........... Erro! Indicador não definido.
2.2.2 Efeitos da mundialização sobre o emprego: o resgate da qualificação ...........Erro!Indicador não definido. 2.2.3 Atividade: crítica. .................................................Erro! Indicador não definido.
2.3 Lição 2: A organização do tempo de estudos ................. Erro! Indicador não definido.
2.3.1 Atividade: o meu tempo. ...................................... Erro! Indicador não definido.
2.3.2 Encontrando tempo .............................................. Erro! Indicador não definido.
2.3.3 A disciplina do estudo .......................................... Erro! Indicador não definido.
2.4 Lição 3: Os instrumentos de trabalho.............................Erro! Indicador não definido.
2.4.1 Atividade: Livros a adquirir. .................................Erro! Indicador não definido.
2.5 Leituras recomendadas .................................................. Erro! Indicador não definido.
2.6 Endereços eletrônicos interessantes ............................... Erro! Indicador não definido.
3 Unidade II: Epistemologia do Conhecimento: Reflexões acerca da razão edo conhecimento científico............ Erro! Indicador não definido.
3.1 Considerações iniciais ................................................... Erro! Indicador não definido. 3.2 Lição 4: A lógica clássica: primeiras aproximações ....... Erro! Indicador não definido.
3.2.1 A Razão ...............................................................Erro! Indicador não definido.
3.3 Atividades .....................................................................Erro! Indicador não definido.
3.3.1 Atividade: Teste rápido. .................................................................................. 268
3.3.2 Atividade: Fórum. ........................................................................................... 268
3.4 Lição 5: A lógica clássica e a ciência .............................Erro! Indicador não definido.
3.4.1 Introdução ............................................................Erro! Indicador não definido.
3.4.2 Nosso ponto de partida (“démarche”
) .................. Erro! Indicador não definido. 3.4.3 O Paradigma Emergente .......................................Erro! Indicador não definido.
3.5 Atividades .....................................................................Erro! Indicador não definido.
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3.5.1 Atividade: Teste rápido. ....................................... Erro! Indicador não definido.
3.5.2 Atividade: Participação em chat. .......................... Erro! Indicador não definido.
4 Unidade III: A organização do trabalho acadêmico....... Erro! Indicador não
definido. 4.1 Considerações Iniciais ...................................................Erro! Indicador não definido.
4.2 Lição 6: A importância das técnicas de estudo: uma breve aproximação ................Erro!Indicador não definido.
4.2.1 Aprendendo a aprender .........................................Erro! Indicador não definido.
4.2.2 Organização e planejamento .................................Erro! Indicador não definido.
4.2.3 Atenção e concentração: como alcançá-las? .......... Erro! Indicador não definido.
4.2.4 O que é uma leitura compreensiva? ...................... Erro! Indicador não definido.
4.2.5 Atividade: Aprendendo a aprender. ...................... Erro! Indicador não definido.
4.3 Lição 7: A prática da leitura .......................................... Erro! Indicador não definido.
4.3.1 Tipos de leitura..................................................... Erro! Indicador não definido.
4.3.2 Técnicas para a compreensão do texto .................. Erro! Indicador não definido.
4.3.3 Atividade: Resumo usando sublinha ..................... Erro! Indicador não definido.
4.3.4 Atividade: Anotações ........................................... Erro! Indicador não definido.
4.4 Lição 8: Referências Bibliográficas e Citações .............. Erro! Indicador não definido.
4.4.1 Elaboração de referências bibliográficas: Regras Gerais de Apresentação .....Erro!Indicador não definido.
4.4.2 Referências bibliográficas de monografias (livros, separatas, dissertações) ...Erro!Indicador não definido. 4.4.3 Referências bibliográficas de artigos de periódicos (jornais e revistas) .........Erro!Indicador não definido.
4.4.4 Trabalhos apresentados em eventos ...................... Erro! Indicador não definido.
4.4.5 Legislação ............................................................Erro! Indicador não definido.
4.4.6 O uso de citações: regras gerais de apresentação ... Erro! Indicador não definido.
4.4.7 Citações diretas .................................................... Erro! Indicador não definido.
4.4.8 Citação da citação: uso das expressões latinas ...... Erro! Indicador não definido.
4.4.9 Leituras Recomendadas ........................................Erro! Indicador não definido. 4.4.10 Atividade............................................................ Erro! Indicador não definido.
4.5 Lição 9: O Resumo ........................................................Erro! Indicador não definido.
4.5.1 Como elaborar um resumo, segundo a ABNT 6028 (nov. 2003)? Erro! Indicadornão definido.
4.5.2 Leituras Recomendadas ........................................Erro! Indicador não definido.
4.5.3 Atividade: ............................................................ Erro! Indicador não definido.
4.6 Lição 10: A Resenha ..................................................... Erro! Indicador não definido.
4.6.1 Considerações iniciais .......................................... Erro! Indicador não definido.
4.6.2 Estrutura de uma resenha ......................................Erro! Indicador não definido. 4.6.3 Leituras Recomendadas ........................................Erro! Indicador não definido.
4.6.4 Atividade: ............................................................ Erro! Indicador não definido.
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4.7 Lição 11: O Seminário................................................... Erro! Indicador não definido.
4.7.1 O que é? ...............................................................Erro! Indicador não definido.
4.7.2 Estrutura e Funcionamento ................................... Erro! Indicador não definido.
4.7.3 Como acontece um seminário? ............................. Erro! Indicador não definido. 4.7.4 Sugestão de avaliação de seminário ...................... Erro! Indicador não definido.
4.8 Lição 12: Os trabalhos Científicos .................................Erro! Indicador não definido.
4.8.1 O que são?............................................................ Erro! Indicador não definido.
4.8.2 Tipos de Publicações Científicas .......................... Erro! Indicador não definido.
4.8.3 Regras Gerais de Apresentação de Trabalhos Acadêmicos ....Erro! Indicador nãodefinido.
4.8.4 Atividade: teste rápido ..........................................Erro! Indicador não definido.
5 Unidade IV: Iniciação à Pesquisa Científica ............................................ 246
5.1 Considerações Iniciais .................................................................................................. 246
5.2 Lição 13: Breve estudo sobre o conhecimento .............................................................. 247
5.2.1 Sobre o conhecimento e a ciência: um ponto de partida ................................... 247
5.2.3 Conhecimento e ciência: breve aproximação contemporânea ........................... 261
5.2.4 Atividades ....................................................................................................... 2675.2.4.1 Atividade: Teste rápido. .............................................................................. 268
5.2.4.2 Atividade: Fórum. ....................................................................................... 268
5.3 Lições 14 e 15: O Projeto de Pesquisa .......................................................................... 269
5.3.1 Pressupostos assumidos ................................................................................... 270
5.3.2 Etapas do Projeto de Pesquisa.......................................................................... 2725.3.2.1 Do interesse à pergunta de partida ............................................................... 273
5.3.2.1.1 Atividade ............................................................................................. 2805.3.2.2 Os critérios de qualidade da pergunta de partida .......................................... 246
5.3.2.2.1 Atividade ............................................................................................. 2525.3.2.3 Da pergunta de partida ao problema de pesquisa ......................................... 246
5.3.2.3.1 Atividade ............................................................................................. 2505.3.2.4 Problematização (ou Explicação do Tema ou Justificativa) ......................... 250
5.3.2.4.1 Atividade ............................................................................................. 2545.3.2.5 Descrição de Objetivos ............................................................................... 254
5.3.2.5.1 Atividade ............................................................................................. 2575.3.2.6 Aspectos Metodológicos ............................................................................. 257
5.3.2.6.1 Atividade ............................................................................................. 2765.3.2.7 Referencial Teórico ..................................................................................... 277
5.3.2.7.1 Atividade ............................................................................................. 2795.3.2.8 Cronograma ................................................................................................ 280
5.3.2.8.1 Atividade ............................................................................................. 282
5.3.2.9 Tema e delimitação ..................................................................................... 2825.3.2.9.1 Atividade ............................................................................................. 284
5.4 Lições 16: O Desenvolvimento da Pesquisa: coleta e análise dos dados e relatório ....... 285
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5.4.1 Considerações Iniciais ..................................................................................... 285
5.4.2 Coleta de Dados .............................................................................................. 285
5.4.3 Análise dos Dados ........................................................................................... 285
5.4.4 Relatório de Pesquisa ...................................................................................... 2855.4.6 À guisa de conclusão ....................................................................................... 285
Referências.................................................................................................... 287
ANEXOS ....................................................................................................... 292
ANEXO A – Exemplo de Problematização ........................................................................ 292
ANEXO B – Lista de verbos em Norman Grounlund (1975) .............................................. 297
Verbos ilustrativos para formulação de objetivos instrucionais gerais ....................... 297
Verbos ilustrativos para formulação de resultados específicos de aprendizagem ....... 297Comportamentos criativos ...................................................................................... 297Comportamentos complexos lógicos e de julgamentos ............................................ 297Comportamentos discriminativos gerais ................................................................. 297Comportamentos sociais ......................................................................................... 298Comportamentos de linguagem .............................................................................. 298Comportamentos de estudo ..................................................................................... 298Comportamentos físicos ......................................................................................... 298Comportamentos artísticos ..................................................................................... 299Comportamentos dramáticos .................................................................................. 299Comportamentos matemáticos ................................................................................ 299
Comportamentos relacionados à aparência geral, higiene e segurança ..................... 299Variedades ............................................................................................................. 300
ANEXO C – Revisão Teórica: exemplo ............................................................................. 301
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5 Unidade IV: Iniciação à Pesquisa Científica
O real demonstra-se,
não se mostra.(Gaston Bachelard)
Existem alguns métodos científicos,mas um espírito e um só tipo de visão propriamente científica.
(Gilles-Gaston Granger)
5.1 Considerações Iniciais
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5.2 Lição 13: Breve estudo sobre o conhecimento
5.2.1 Sobre o conhecimento e a ciência: um ponto de partida
Ver citações
Colocando-se um basta às explicações religiosas sobre o homem, a
vida e o mundo, o Renascimento Científico1, do século XV, constitui-se
em um movimento e momento de transição fundamental para a Idade
Moderna. Marcado pelas letras e pelas artes (JAPIASSU, 1991;
WOORTMANN, 1997) foi um período de pouco espírito crítico e repleto de
superstições, magias, bruxarias, demônios:
a época do Renascimento foi uma das épocas menos dotadas deespírito crítico que o mundo conheceu. Trata-se da época da maisgrosseira e mais profunda superstição, da época em que a crençana magia e na feitiçaria se expandiu de modo prodigioso,infinitamente mais do que na Idade Média. Sabemos que, nessa
época, a astrologia desempenha um papel muito mais importantedo que a astronomia – parente pobre, como disse Kepler – e queos astrólogos desfrutam de posições oficiais nas cidades e juntoaos potentados. E se examinarmos a produção literária dessaépoca, é evidente que não são os belos volumes das tradições dosclássicos produzidos nas tipografias venezianas que fazem osgrandes sucessos de livraria: são as demonologias e os livros demagia. (KOYRÉ apud JAPIASSU, 1991, p. 20-21).
Há, contudo, a partir do Renascimento, a reformulação da história e
com ela do homem: o teocentrismo (Deus no centro do universo) é
superado pelo antropocentrismo (o homem no centro do universo). E, coma reavaliação do passado, há uma reavaliação da verdade: “existe uma
pluralidade de verdades – e, por conseguinte, de escolhas”
(WOORTMANN, 1997, p. 25). Nesse período, de considerável tolerância
com as produções intelectuais da época, o “sagrado” sofre um processo de
1 O período do chamado Renascimento, que se inicia em algum momento do século XV até se dissolver na
modernidade, no século XVII – situado, portanto, entre a Idade Média e a Idade Moderna – , marca o início deuma profunda transformação na cosmologia ocidental. Nesse período, surgiram, no interior do campo teológico,novas formulações, que fundarão a modernidade, e com ela novas ciência e concepção do homem.(WOORTMANN, 1997).
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desmistificação: “a verdade cristã não pode estar separada da verdade
humana” (JAPIASSU, 1991, p. 39).
Além disso, o Renascimento não é apenas Científico: carrega
consigo os ideais de uma nova ordem que começa a se impor a partir de
uma nova classe comerciante emergente – a burguesia. Os antigos servos
que, com seu trabalho, desobrigam-se da obediência aos senhores
feudais, impõem o valor do trabalho, da moeda, dos metais preciosos, da
produção manufatureira em crescimento, da procura de outras terras e
mercados. A partir daqui,
o renascimento científico deve ser compreendido, portanto, como aexpressão da nova ordem burguesa. Os inventos e descobertassão inseparáveis da nova ciência, já que, para o desenvolvimentoda indústria, a burguesia necessitava de uma ciência queinvestigasse as forças da natureza para, dominando-as, usá-lasem seu benefício. A ciência deixa de ser serva da teologia, nãomais um saber contemplativo, formal e finalista, para que,indissoluvelmente ligada à técnica, possa servir à nova classe.(ARANHA; MARTINS, 1986, p. 141).
Fazer ciência, portanto, deveria atender às necessidades de
dominação e subjugação da natureza às vontades humanas. Aqui seseparam, pela primeira vez, o sujeito (que quer conhecer) e o objeto
(que é conhecido). Em outras palavras, com o antropocentrismo nascente,
o homem irá se colocar a si próprio no centro dos interesses e das
decisões, o que mais tarde, na Idade Moderna, deslocará a ênfase na
irrefutável existência do objeto para a capacidade do homem de conhecer.
Nesse sentido,
[...] o homem moderno descobre sua subjetividade. Enquanto opensamento antigo e medieval parte da realidade inquestionada doobjeto e da capacidade do homem de conhecer, surge na IdadeModerna a preocupação com a “consciência da consciência”. Oproblema central é o problema do sujeito que conhece, não maisdo objeto. Antes se perguntava: “Existe alguma coisa?”, “Isto queexiste, o que é?”. Agora o problema não é saber se as coisassão, mas se nós podemos eventualmente conhecer algumacoisa. (ARANHA; MARTINS, 1986, p. 142, grifo nosso).
Ora, entre o sujeito que conhece e o objeto conhecido estabelece-se
uma relação. A esta relação é que se dá o nome de conhecimento.
Quem se preocupa com essa relação é a ciência, que significa,
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etimologicamente, conhecimento. Pesquisar é, pois, produzir um tipo de
conhecimento denominado científico.
O marco inicial dessa produção de conhecimento científico é, sem
dúvida, Copérnico2. No contexto das navegações portuguesas e do
descobrimento da América que provocaram profundo impacto na
cosmovisão européia, Copérnico se situa entre o Renascimento (pré)
Científico e Galileu que irá fundar as bases do método científico, sem o
qual não há conhecimento científico. Assim,
[...] as idéias copernicanas, mais do que uma revolução, podemser melhor consideradas como um passo na direção da revoluçãoque tomaria lugar mais tarde, a partir de Galileu, e dele atéNewton. (WOORTMANN, 1997, p. 27).
Antes mesmo de existirem evidências empíricas, segundo
Woortmann (1997), Copérnico apresentou um elegante modelo
matemático, simples e harmonioso, no qual os fenômenos celestes eram
representados por meio de círculos concêntricos em torno do Sol –
heliocentrismo. Inicia, assim, a desorganização do mundo centrado no
homem e criado para ele. Contudo,
Copérnico não foi um copernicano. Se o centro do mundo mudara,por razões puramente matemáticas, ele continuava sendo umponto fixo. Seu argumento continha, ademais, componentesteológico-estéticos: o Sol deveria estar no centro porque tinha umgrau superior de perfeição, já que era a fonte da luz. O mundotinha que ser esférico porque a forma esférica era a mais perfeita.A perfeição do mundo expressava-se também pela imobilidade dasestrelas fixas, em contraste com o movimento do mundo inferior,corruptível. (WOORTMANN, 1997, p. 46).
De toda forma, as transformações produzidas pelo sistema
heliocêntrico, segundo Aranha e Martins (1986), são fundamentais e
caracterizam-se por: (1) secularização da consciência, isto é,
abandono da dimensão religiosa; (2) descentralização do cosmos, ou
seja, com a descoberta de outros mundos, nem o Sol é o centro, o que
passa a ser questionado não é apenas o lugar do mundo, mas o lugar do
2 Nicolau Copérnico (1473-1543), doutor em direito canônico, clérigo num bispado medieval altamenteenvolvido em questões políticas, foi durante muito tempo secretário e médico, administrador dos bens doCapítulo a que pertencia. Além de praticar a medicina, escreveu um tratado sobre a moeda. Lentamente, em meioa suas outras atividades, foi desenvolvendo cálculos e sua teoria astronômica. (WOORTMANN, 1997).
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homem no mundo; (3) geometrização do espaço, isto é, o espaço
passa a ser quantitativo, mensurável. O espaço se acha dessacralizado;
(4) mecanicismo, onde a natureza e o próprio homem serão comparados
a uma máquina, um conjunto de mecanismos cujas leis precisam ser
descobertas.
A adoção da teoria heliocêntrica copernicana por Galileu3 custou-
lhe a abjuração (negação pública), em 1633 (aos sessenta e nove anos de
idade), de aparentemente tudo para não sacrificar a vida. Um forte fator
de sua “condenação” consistiu no fato de que enquanto Copérnico foi lido
por uns poucos (escritos em latim, só acessível a um pequeno grupo
letrado), Galileu foi lido por muita gente (escritos em italiano, língua
conhecida pelo grande público). Além disso, Galileu veio trazer provas
físicas às teses metafísicas de Copérnico o que leva seus ensinamentos a
entrarem em contradição com a ordem estabelecida (JAPIASSU, 1991).
O argumento de Galileu consistia no seguinte:
[...] a terra se movia efetivamente e o Sol apresentava manchas,
nenhum corpo era divino e também ele não escapava à lei damutação. O telescópio destrói, assim, a dicotomia aristotélica docosmos em matéria celeste (superior, eterna e divina) e matériaterrestre (inferior e corruptível). (JAPIASSU, 1991, p. 60).
O que Galileu promove é a ruptura entre a razão da Igreja e a razão
da ciência. A explicação científica se dessacraliza. Ao assinalar que o Sol é
o centro do mundo e imóvel, e a Terra não é o centro do mundo e se
move, impõe uma nova ordem onde, segundo Khun (apud JAPIASSU,
1991, p. 62-63): (1) se a terra, deixando de ser o centro de toda verdade,torna-se um planeta entre outros, torna-se difícil nela situar a história da
Queda e da Redenção; não constitui mais o lugar privilegiado da
Encarnação; (2) se os outros planetas possuem o mesmo estatuto que a
Terra, certamente a Providência Divina não os deixaria desabitados; mas
3 Galileu Galilei (1564-1642), italiano que lecionou nas Universidades de Pisa e de Pádua, foi responsável pelasuperação do aristotelismo e precursor da moderna concepção de ciência. Sua vida foi marcada pela perseguição
política e religiosa, por defender a substituição do modelo ptolomaico (geocentrismo) pelo copernicano(heliocentrismo). Escreveu O Ensaiador , Diálogo sobre os dois máximos sistemas do mundo e Discurso sobreduas novas ciências. Condenado pela Inquisição, foi obrigado a abjurar publicamente suas idéias, sendo assimmesmo confinado em prisão domiciliar, a partir de 1633. (ARANHA; MARTINS, 1986).
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seus habitantes não descenderiam de Adão e Eva, e não teriam o pecado
original; (3) como se poderia falar da vida eterna, se o Cristo se encarnou
num lugar geográfico preciso?; (4) num mundo onde havia uma
relatividade generalizada dos valores espirituais, num mundo infinito, não
podemos mais discernir o lugar de Deus nem tampouco do homem.
A principal audácia de Galileu, contudo, segundo Woortmann (1997,
p. 84), não foi a retomada do heliocentrismo4, mas da teoria corpuscular
dos fenômenos, isto é, do atomismo, pois,
a teologia afirmava que na Eucaristia, ainda que a substância dopão e do vinho desapareçam, suas qualidades sensíveis, como acor, o sabor, o calor e o frio, permanecem, miraculosamente, pelagraça da palavra todo-poderosa. Galileu, pelo contrário, afirmavaque o calor, a cor, o sabor são, externamente a quem os sente,puros nomes. Portanto, desaparecendo a substância do pão e dovinho. (WOORTMANN, 1997, p. 84).
Para Woortmann (1997), é assim que no pensamento ocidental
passam a existir duas ordens distintas: a verdade literal da realidade
visível e a verdade simbólica da mente, que se separam acompanhando a
separação entre fato e valor, conhecimento e fé. Assim, Galileu demarca aIdade Moderna, onde se separam definitivamente os três modos de
conhecimento: “revelação, de um lado; razão e observação, de outro,
dando origem ao positivismo moderno” (WOORTMANN, 1997, p. 92,
grifo nosso).
Galileu é o fundador da ciência quantitativa moderna: “todas as
suas observações levam-no a destruir definitivamente o esquema
astrobiológico ainda reinante” (JAPIASSU, 1991, p. 94). A explicação domundo, livre dos atributos sobrenaturais, irá se converter no objeto de
uma ciência rigorosa, inequívoca, cuja linguagem capaz de atender às
exigências das novas estruturas mentais é a matemática. Está-se diante
de um novo modelo epistemológico correspondendo à interpretação
4 “[...] a verdadeira acusação contra Galileu, motivo real de sua condenação, urdida pelo poderoso e influenteColégio Romano dos Jesuítas, não dizia respeito às suas idéias astronômicas, mas às suas teses sobre a matéria,matéria esta composta de „átomos substanciais‟” (REDONDI apud JAPIASSU, 1991, p. 69).
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mecanicista5 da realidade: “o aparecimento do mecanicismo consagra o
nascimento da nova ciência e fornece os meios de todo conhecimento com
pretensões à positividade” (JAPIASSU, 1991, p. 95).
Mas é Descartes6, contemporâneo de Galileu, quem “leva a fama
de fundador da filosofia mecanicista: um erro de interpretação histórica
torna-se uma verdadeira história” (JAPIASSU, 1991, p. 95). Para
Descartes, quem pensa é o sujeito, o espírito humano, a razão. Daí a
máxima: cogito, ergo sum! Penso, logo existo! Que significa: “tenho
absoluta certeza de que existo, pelo menos enquanto uma coisa pensante”
(SEVERINO, 1994, p. 100). Sua originalidade não se encontra na definição
do ideal mecanicista do saber, nem tampouco na aplicação desse esquema
epistemológico ao mundo material ou ao organismo vivo. Reside, pois
[...] na síntese que realiza entre uma física abrindo caminho parauma exigência materialista e determinista, e uma metafísica salvaguardando inteiramente os direitos de uma ontologiaespiritualista [...] Descartes fala ao mesmo tempo duaslinguagens, dando satisfação tanto aos defensores da fé tradicionalquanto aos partidários da nova ciência. (JAPIASSU, 1991, p. 98;grifo no original).
Inaugurando um novo modo de filosofar, Descartes admitia que a
razão era um patrimônio de todo ser humano, contudo nem sempre bem
utilizado. Por isso, a necessidade de um novo método de pensar o mundo,
fundamentado na razão, único caminho capaz de levar os homens a um
conhecimento verdadeiro e seguro (LUCKESI; PASSOS, 2002, p. 188). O
eixo central do método cartesiano de pensar foi a dúvida: “ele a tomou
como método, pois acreditava ser preciso duvidar de todas as certezasexistentes até encontrar uma que fosse indubitável” (LUCKESI; PASSOS,
2002, p. 189).
5 A ciência moderna compara a natureza e o próprio homem a uma máquina, um conjunto de mecanismos cujasleis precisam ser descobertas. As explicações passam a ser baseadas em um esquema mecânico cujo modelo preferido é o relógio. (ARANHA; MARTINS, 1986).6 René Descartes (1596-1650), pensador francês do século XVII, fez seus estudos no Colégio Jesuíta de LaFleche. Cursou Direito em Poitiers, mas, espírito curioso e aguçado, pôs-se à procura de novos conhecimentos,viajando muito e acompanhando, com interesse, as experiências que os cientistas estavam começando a fazer
fora dos ambientes universitários. Estuda a física copernicana, matemática e filosofia por conta própria.Escreveu: Discurso do Método (1637); Meditações Metafísicas (1641); Os princípios da filosofia (1644); As paixões da alma (1649); O tratado do homem (1662); O tratado do mundo (1644) e Regras para a direção doespírito (1701). (SEVERINO, 1994).
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O método cartesiano se orientava por quatro regras: (1) a
evidência; (2) a análise; (3) a síntese; e, (4) o desmembramento:
a primeira indica que não se deve aceitar nada como verdadeiro,caso não se apresente como evidência, ou seja, claro por simesmo; a segunda orienta que as dificuldades devem serdivididas, ou seja, um problema complexo deve ser dividido empartes; a terceira ensina a ordenar o pensamento, de forma acomeçar pelos problemas mais simples até chegar aos maiscomplexos; a quarta orienta para a necessidade de enumeraçãodas partes, a fim de evitar qualquer tipo de esquecimento.(LUCKESI; PASSOS, 2002, p. 189).
Esse empenho com o método, lembram Luckesi e Passos (2002, p.
190), visava a conduzir a razão humana a encontrar a verdade, ou seja, “a atingir idéias claras e distintas”. Descartes é considerado o pai do
racionalismo7 que, como doutrina filosófica, foi formalizado a partir de
sua teoria das idéias inatas8. Desenvolvido no século XVII, o racionalismo
colocou as questões básicas para a superação das concepções medievais9.
A filosofia mecânica triunfa:
[...] com o mecanicismo, um limiar foi transposto; um primeiro
positivismo foi criado; certo determinismo, condicionando anatureza humana à natureza das coisas, foi inventado; uma novalinguagem foi instaurada, considerando o homem como um objetoe subtraindo-o de sua especificidade própria; em suma, foiconstruída toda uma inteligibilidade inteiramente mecânica esusceptível de exorcizar toda transcendência. (JAPIASSU, 1991, p.116, grifo nosso).
Considerado o protótipo do sábio moderno por outro erro de
interpretação, Isaac Newton10 entra para a história como o “baluarte do
7 “Racionalismo vem do latim ratio, que quer dizer razão, entendimento. A concepção racionalista coloca narazão a fonte de todo o conhecimento. Só ela seria capaz de nos levar a conhecimentos universalmente válidos,uma vez que os sentidos e a experiência nos proporcionariam apenas idéias confusas e contingentes [...] Oconhecimento oriundo da experiência não pode ser definido como verdadeiro, pois sofre as variações dosfenômenos e se modifica com as alterações desses. Ciente disso, o racionalismo procura trabalhar com verdades provenientes dos processos racionais e não somente da experiência [...]” (LUCKESI; PASSOS, 2002, p. 186). 8 “A tese central dos inatistas é a seguinte: se não possuirmos em nosso espírito a razão e a verdade, nuncateremos como saber se um conhecimento é verdadeiro ou falso, isto é, nunca saberemos se uma idéiacorresponde ou não à realidade a que ela se refere. Não teremos um critério seguro para avaliar nossosconhecimentos.” (CHAUÍ, 1995, p. 71). 9 O francês Descartes, o holandês Spinoza (1632-1677) e o alemão Leibniz (1646-1716) sustentavam que a principal fonte e prova decisiva do Conhecimento eram os raciocínios dedutivos apoiados em princípios inatos
evidentes por si mesmos e sustentados pela exatidão dos modelos matemáticos. (CORTELLA, 2000).10 Isaac Newton (1642-1727) não foi propriamente um filósofo. Entretanto, sua física e mecânica celeste irãoinfluenciar toda a reflexão filosófica do século XVIII. Nasceu na Inglaterra, no natal do ano em que Galileufaleceu. Ingressou em Cambridge, aos 18 anos, onde permaneceu durante toda a vida. Doutorou-se aos 26 anos
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método científico experimental, como um puro cientista, como um
estrito racionalista e como um rigoroso positivista” (JAPIASSU, 1991, p.
124-125, grifo do autor). Mito fundante da ciência moderna, a “fascinação
newtoniana” permeou tanto as ciências físicas como as morais. Tal
fascinação traduz-se em seu epitáfio, escrito pelo poeta Alexander Pope
(WOORTMANN, 1997; JAPIASSU, 1991):
A natureza e suas leis escondiam-se na noite;Deus disse: “faça-se Newton”, e tudo se fez luz.
Mas, não é bem assim. A instauração de uma nova filosofia natural,
livre das qualidades ocultas, fixa nas quantidades inteligíveis (forteargumento positivista), leva o século XVIII a acreditar que
[...] Newton é o cientista que conseguiu passar a teoria física doestádio cartesiano da metafísica dos princípios ao estádio positivoda legalidade rigorosa em que se constata o encadeamento dosfatos sem necessidade de interpretá-los em virtude de entidadesextra-experimentais (JAPIASSU, 1991, p. 124).
Na verdade, sua teoria física se constitui em função de uma
metafísica e de uma teologia subjacentes, segundo Japiassu (1991, p.125): “trata-se uma física de crente que utiliza a experiência e o cálculo
para decifrar a presença de Deus no mundo: é o poder divino que
assegura a coesão e a permanência do universo”. Nesse sentido, Newton
jamais viu a contradição entre a ciência e a Revelação, cuja dissociação se
dará no positivismo do século das Luzes.
A tentativa da construção de uma história da ciência de Copérnico a
Newton como uma progressão contínua em direção às “Luzes”,favorecendo o progresso do reino da Razão, obscurece suas oposições. O
próprio Newton não escapa das investigações em terrenos considerados
“menos científicos” 11. Por isso, embora insista constantemente nos
de idade. Dirigiu a Casa da moeda, em 1695, e foi presidente da Royal Society, de 1703 até sua morte. Escreveu:(1687) Princípios Matemáticos da Filosofia Natural ; (1704) Óptica e (1733) Observações Sobre as Profecias de Daniel e do Apocalipse de São João. (GALILEO; NEWTON, 1991).11 “[...] geralmente Newton se conforma com essa imagem dos pu ristas da ciência. No entanto, histórica eepistemologicamente, essa imagem é insustentável. Diversos estudos mostram que, para compreendermos agênese e a significação do pensamento newtoniano, precisamos levar em conta suas especulações alquimistas eherméticas. Assim, hoje não temos mais dúvidas de que Newton, em segredo, praticava a alquimia. Escreveu
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procedimentos do estrito método experimental, foi marcado por uma
“tríplice tradição”: (1) a organicista, formulando suas explicações em
termos biológicos; (2) a mecanicista, formulando suas explicações por
analogias com as máquinas; e, (3) a mágica, suas explicações sendo
dominadas pelas tendências místicas. (JAPIASSU, 1991, p. 128).
Todo o século XVII permaneceu impregnado de forte sensibilidade
religiosa: “o racionalismo de Newton não o impede de construir um
sistema do mundo inseparável da intuição da onipresença divina”
(JAPIASSU, 1991, p. 132).
Em oposição ao racionalismo, o empirismo12 se desenvolveu, a
partir da Inglaterra, entre os séculos XVI, XVII e XVIII, centrado nos
dados da experiência. Para o empirismo era impossível haver uma
verdade única, mas sim verdades em contínuo processo de reformulação.
Os principais representantes desta concepção são Francis Bacon, Thomas
Hobbes, John Locke, Georges Berkeley e David Hume.
Para Francis Bacon13 o método dedutivo não dava conta das novas
exigências de domínio e subjugação das forças da natureza, uma vez quenão levaria a novas verdades, à formulação de novos conhecimentos e
sim, à demonstração do conhecido. Por isso, desenvolve o método
indutivo estruturado em dois momentos: o negativo e o positivo. Segundo
Luckesi e Passos (2002, p. 195):
[...] o primeiro consistia em submeter a própria razão a umacrítica, a partir da qual os indivíduos tomariam consciência dosseus erros e teriam condições de superar os seus preconceitos.Somente depois desse processo teriam condições de conhecer ascoisas. Seria uma forma de purificar o intelecto dos preconceitos,noções falsas ou ídolos (como denominou), adquiridos ao longo do
numerosas obras sobre o livro da Revelação [...] vivendo imerso em especulações metafísicas e místicas, dedicoumuito tempo aos estudos da teologia e da Bíblia” (JAPIASSU, 1991, p. 128). 12 Despreocupados das verdades absolutas da fé ou da razão, os empiristas concentraram-se na realidadeconcreta, no conhecimento humano advindo dos dados da experiência, de modo que não seria possível pensar emverdade e muito menos em conhecimento absoluto. “O empirismo partia do princípio aristotélico de que „nadaestava no intelecto sem que antes não tivesse estado nos sentidos‟. Assim, negava qualquer idéia inata e afirmavaque todo conhecimento tem sua origem na experiên cia sensível de percepções do mundo externo.” (LUCKESI;
PASSOS, 2002, p. 194).13 “Francis Bacon (1561-1626) nasceu em Londres e morreu na mesma cidade. Dedicou-se à vida política, tendoalcançado posições elevadas, como os cargos de procurador-geral e grande chanceler. Em 1621, foi acusado decorrupção e condenado a pagar pesada multa e proibido de exercer cargos públicos.” (CHAUÍ, 1995, p. 115).
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processo histórico, pelas mais variadas fontes e que dificultam oacesso da razão humana à verdade.
Bacon, segundo Chauí (1995, p. 115?), elaborou uma teoria
conhecida como a crítica dos ídolos14, na qual existiam quatro tipos deídolos ou de imagens que formam opiniões cristalizadas e preconceitos
que impedem o conhecimento da verdade: (1) ídolos da caverna: as
opiniões que se formam em nós por erros e defeitos de nossos órgãos dos
sentidos. São os mais fáceis de corrigir por nosso intelecto; (2) ídolos do
fórum: são as opiniões que se formam em nós como conseqüência da
linguagem e de nossas relações com os outros. São difíceis de vencer,
mas o intelecto tem poder sobre eles; (3) ídolos do teatro: são as
opiniões formadas em nós em decorrência dos poderes das autoridades
que nos impõem seus pontos de vista e os transformam em decretos e
leis inquestionáveis. Só podem ser refeitos se houver uma mudança social
e política; por fim, (4) ídolos da tribo: são as opiniões que se formam
em nós em decorrência de nossa natureza humana; esses ídolos são
próprios da espécie humana e só podem ser vencidos se houver uma
reforma da própria natureza humana.
Essas preocupações de Bacon expressaram bem as aspirações da
sociedade emergente na qual vivia: “uma sociedade que não se
contentava com o saber adquirido, que investia em novas descobertas e
que, portanto, ressentia-se da necessidade de um novo modo de produzir
conhecimento” (LUCKESI; PASSOS, 2002, p. 196).
Diferentemente de Bacon que privilegiou as questões doconhecimento, Thomas Hobbes15 enfatizou as questões políticas. Para
ele, o conhecimento inicia-se no exterior e atinge o interior, mediatizado
pelo cérebro (indo de encontro, portanto, ao racionalismo das idéias
inatas). Considerou ter encontrado um adequado intercâmbio entre as
concepções racionalista e empirista, ao equilibrar a razão e a experiência:
14 “a palavra ídolo vem do grego eidolon e significa imagem” (CHAUÍ, 1995, p. 115). 15 Thomas Hobbes (1588-1679) estudou em Oxford, foi preceptor de uma família nobre. “Com ele, o empirismotornou-se um sistema, tendo como pontos centrais as questões do conhecimento e da política” (LUCKESI;PASSOS, 2002). Escreveu: (1640) Elementos de lei natural e política; (1651) Leviatã; (1665) De corpore;dentre outros.
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[...] o seu racionalismo empirista partia da natureza e a elaretornava. Aceitou, do empirismo, a tese de que as idéias eramproduzidas sensorialmente e, do racionalismo, o princípio dadedução que recompunha os elementos da realidade concreta,independentemente da experiência. (LUCKESI; PASSOS, 2002, p.198).
John Locke16, amigo pessoal de Newton, propõe-se a analisar cada
uma das formas de conhecimento que possuímos, a origem de nossas
idéias e nossos discursos, a finalidade das teorias e as capacidades do
sujeito cognoscente relacionadas com os objetos que ele pode conhecer
(CHAUÍ, 1995).
Assim como Aristóteles17, Locke considera que o conhecimento se
realiza por graus até chegar às idéias, começando pelas sensações até
chegar ao pensamento. Desenvolveu uma séria crítica à teoria das idéias
inatas, pois, se as possuíssemos, teríamos consciência delas: “[...] o que
existia de inato era poder do intelecto, limpo, livre de qualquer idéia,
como um tabula rasa” (LUCKESI; PASSOS, 2002, p. 199).
Segundo Luckesi e Passos (2005, p. 200), para Locke, o espírito
humano era incapaz de conhecer imediatamente as coisas; mas podiaconcebê-las mediante as idéias que possuía delas. Existiam duas
categorias de idéias: (1) simples: adquiridas por meio de experiências
concretas; e (2) compostas: formadas por um processo de associação
das primeiras. Assim sendo, “o conhecimento se constituía ou pela
percepção simples ou pela associação das percepções, formando idéias
complexas.”
Para que fique claro, para Locke “as fontes de todo conhecimentosão a experiência sensível e a reflexão” (LOCKE, 1991, p. XI-XII).
16 John Locke (1632-1704), filósofo inglês, descendia de uma família de burgueses comerciantes. Esteverefugiado por um tempo na Holanda, por ter-se envolvido com pessoas acusadas de fazer movimentos contra orei Carlos II. Teve importante papel sobre a teoria do conhecimento, mas também se destacou em política.Escreveu Ensaio sobre o entendimento humano e Dois tratados sobre o governo civil . Tornou-se o teórico darevolução liberal inglesa, cujas idéias irão fecundar todo o século XVIII. (ARANHA; MARTINS, 1986).17 As duas orientações da teoria do conhecimento – a racionalista e a empirista – fundam-se em duas perspectivas: de um lado, Platão e Descartes que afastam a experiência sensível ou o conhecimento sensível doconhecimento verdadeiro, que é puramente intelectual; e, de outro lado, Aristóteles e Locke consideram que oconhecimento se realiza por graus contínuos, partindo da sensação até chegar às idéias. (CHAUÍ, 1995).
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No século XVIII, conhecido como Iluminismo – século das luzes –,
assiste-se à tentativa de síntese entre o racionalismo e o empirismo18 com
o criticismo19. Kant 20criticou essas duas formas de entendimento:
Diante da questão “Qual é o verdadeiro valor dos nossosconhecimentos e o que é o conhecimento?”, Kant coloca a razãonum tribunal para julgar o que pode ser conhecido legitimamentee que tipo de conhecimento não tem fundamento. Com issopretende superar a dicotomia racionalismo-empirismo (ARANHA;MARTINS, 1986, p. 177).
Chauí (1991, p. IX) afirma que ao analisar a faculdade de conhecer,
na Crítica da Razão Pura, Kant distingue duas formas de conhecimento: o
empírico (ou a posteriori ) e o puro (ou a priori ). Kant promove umarevolução: “a revolução consiste em, ao invés de admitir que a faculdade
de conhecer se regula pelo objeto, mostrar que o objeto se regula pela
faculdade de conhecer” (CHAUÍ, 1991, p. X). Nesse sentido, Cortella
(2000, p. 97) afirmará que “[...] o impasse ficou mais forte ainda, porque
oscilou entre um ceticismo (nada pode ser verdadeiramente sabido) e um
racionalismo baseado na intuição improvável”.
Luckesi e Passos (2002, p. 204) irão apresentar uma síntese do
processo do conhecimento em Kant:
Vejamos, sinteticamente, esse processo. Os sentidos recebem asimpressões do mundo exterior, porém estas não constituem umconhecimento do objeto. Elas são parciais e fragmentárias. Essesdados (que são variados e, por isso, caóticos) são ordenados pelosujeito do conhecimento, dando origem às percepções do objeto.Para tanto, o sujeito utiliza-se das formas de espaço e tempo.Porém, essas percepções ainda não atingiram o nível do
entendimento; permanecem na esfera da sensibilidade. Ordenandoessas percepções, o entendimento procede à síntese, que são os juízos. Por exemplo, na expressão “Pedro é homem” há um juízo,que é síntese de percepções, que, por sua vez, é síntese de
18 “Descartes justifica o poder da razão de perceber o mundo através de idéias claras e distintas; Locke valorizaos sentidos e a experiência” (ARANHA; MARTINS, 1986, p. 175).19 “[...] o criticismo em geral é aquela atitude mental, que torna dependente de uma prévia investigação dacapacidade e limites do nosso conhecimento o destino da filosofia especulativa, e principalmente a metafísica[...]” (BRUGGER, 1962, p. 142). 20 Immanuel Kant (1724-1804), filho de um artesão humilde, tornou-se o ponto de convergência cuja obra éfonte da maior parte das reflexões dos séculos XIX e XX. Sob o signo da análise crítica, duas grandes questões
ocuparam sua atenção: o conhecimento (analisado na Crítica da Razão Pura, 1781) e a moral (Crítica da Razão Prática, 1788). Escreveu: (1755) História Geral da Natureza e Teoria do Céu; (1763) O Único Argumento possível para uma Demonstração da Existência de Deus; (1766) Sonhos de um Visionário, Interpretados Mediante os Sonhos da Metafísica; dentre muitos outros. (CHAUÍ, 1991).
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sensações produzidas pelo mundo exterior. Porém, os juízos(afirmativos, negativos, universais, particulares etc.) só sãopossíveis em razão dos modos universais a priori de operar dointelecto. São as categorias a priori que garantem os juízos, quesão conceitos necessários e, por isso, devem ser verdadeiros.
Por fim, sobre Kant, Luckesi e Passos (2002, p. 207) afirmam que
ele mudou os rumos da teoria do conhecimento “[...] ao mostrar que,
apesar de o mundo exterior nos ser dado apenas como sensação, a mente
humana, por ser ativa, seleciona e coordena toda a experiência”. Isso
significa dizer, que a partir dele o sujeito ganha um papel significativo no
processo do conhecimento.
Na trilha de Luckesi e Passos (2002), pós-Kant21, o maisproeminente pensador foi Hegel22. Tendo vivido o movimento da
Revolução Francesa na qual assistiu ao desmoronamento do feudalismo e
a ascensão da burguesia Hegel rompe, em certa medida, com Aristóteles:
[...] o processo de contradição vivido em seu tempo fez com queele substituísse os princípios da lógica aristotélica, baseada noprincípio da identidade, pela lógica dialética, inspirada nacontradição e no movimento. A dialética, segundo ele, a única
forma de compreender os movimentos e as contradições darealidade23 (LUCKESI; PASSOS, 2002, p. 207-208).
Por outro lado, suas reflexões sobre as relações Estado e Sociedade,
na contramão do pensamento vigente, retomam o modelo de aristotélico
ao atribuir à família, tal qual Aristóteles, o primeiro momento da formação
do Estado.
Segundo Arantes (1991, p. XIII), Hegel, desde cedo, apresentou
suas idéias de filosofia enquanto teoria do conhecimento:
21 Aranha e Martins (1986, p. 179) assinalam que pós-Kant surgiram duas linhas divergentes. De um lado,materialistas (Feuerbach) e positivistas (Comte) e, de outro, idealistas (Fichte, Schelling e Hegel).22 Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831) iniciou seus estudos no seminário de teologia protestante deTübingen, ao lado de Schelling (1775-1854) com quem manteve estreito laço de amizade que só se romperiaanos mais tarde, anunciado em a Fenomenologia do Espírito (1807). Recomendado por Goethe (1749-1832) foinomeado “professor extraordinário” da Universidade de Jena, em 1805. Onze anos depois, é nomeado para acátedra de filosofia da Universidade de Heidelberg. Com a indicação para a cadeira de filosofia da Universidadede Berlim, em 1818, atingiu o ápice de sua carreira universitária. Esse cargo coincide com o fim de seudesenvolvimento político, tendo ainda publicado os Princípios da Filosofia do Direito (1821). Foi eleito reitor da
Universidade em 1829. (ARANTES, 1991).23 Para maior compreensão da importância desse rompimento lógico de interpretação da realidade, ver UnidadeII: Epistemologia do Conhecimento: Reflexões acerca da razão e do conhecimento científico, Curso deMetodologia Científica, v. 1.
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[...] Hegel redefine filosofia diante do problema das relações entreo pensamento e a objetividade, analisando três posições que, paraele, representam atitudes alternativas contemporâneas e possuemencadeamento sistemático e histórico [...]
A primeira posição é a da experiência imediata. Nela, há a crença de
que “a consciência pode representar, verdadeiramente, o que são as
coisas”. Hegel criticava o dogmatismo de então que frente a antíteses não
resolvidas de “[...] duas afirmações opostas [...] uma tem que ser
verdadeira, e a outra, falsa”. (ARANTES, 1991, p. XIII).
Na segunda posição, ainda com Arantes (1991, p. XIV), Hegel
analisa o empirismo e o idealismo crítico kantiano. O empirismo é elogiado
por ele, pois, “o que é verdade deve estar na realidade e conhecer-se por
meio da percepção”. Por outro lado, o empirismo “pecaria por negar o
supra-sensível ou, pelo menos, a possibilidade de se conhecê-lo,
reduzindo todo pensamento à abstração e à generalidade e identidade
formais”. Segundo Hegel,
a ilusão fundamental do empirismo consiste em que sempre fazuso das categorias metafísicas da matéria, força, unidade,multiplicidade, universal etc., e com ditas categorias raciocina, edesse modo pressupõe e aplica formas do raciocínio, sem saberque admite um conhecimento metafísico; o que equivale aempregar e ligar essas categorias sem discernimento crítico e demodo inconsciente. (HEGEL apud ARANTES, 1991, p. XIV).
A filosofia crítica de Kant, sempre com Arantes (1991, p. XIV), é
elogiada por Hegel, “que reconhece o fato de ela submeter a uma
investigação prévia o valor dos conceitos intelectuais empregados na
metafísica”. Mas também é reprovada “por não ter penetrado no conteúdoe na relação que aquelas determinações têm em si [...]”. Segundo Hegel,
Essa oposição [entre subjetividade e objetividade], como é tomadaaqui, refere-se à diferença dos elementos dentro do círculo daexperiência. Chama-se objetividade, nessa doutrina, ao elementode universalidade e necessidade, ou seja, o elemento dasdeterminações que integram o pensamento, o chamado a priori .Mas a filosofia crítica aumenta a oposição, de tal modo que reúnena subjetividade o conjunto da experiência; isto é, os doiselementos mencionados, e diante deles não permanece senão a
coisa em si. (HEGEL apud ARANTES, 1991, p. XIV).
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A terceira posição, por fim, refere-se ao saber imediato. Contrário à
tese do saber imediato24, Hegel desenvolve seu contra-argumento em
duas linhas: na primeira, reflete sobre a união entre o saber imediato e a
mediação que o precedeu25; na segunda, reflete sobre a conexão entre a
existência imediata e sua mediação26 (ARANTES, 1991, p. XIV-XV).
Sobre as três posições relativas à relação entre o pensamento e seu
objeto,
[...] Hegel conclui que a idéia, como mero pensamento subjetivoou como um mero ser por si (um ser que não é idéia), não seconstitui como verdade: “Só a idéia por meio do ser e, ao
contrário, só o ser por meio da idéia, é a verdade”. Isso significaque Hegel construiu uma filosofia que pretende se apresentarcomo a própria expressão da realidade, eliminando a distinçãotradicional entre a idéia e o real. Ambos seriam facetas de umamesma coisa: o que é real é racional e o que é racional é real.(ARANTES, 1991, p. XV).
Nessa linha, Chauí (1995, p. 81) afirma que para Hegel,
a razão [...] não é nem exclusivamente razão objetiva (a verdadeestá nos objetos) nem exclusivamente subjetiva (a verdade estáno sujeito), mas ela é a unidade necessária do objetivo e do
subjetivo. Ela é o conhecimento da harmonia entre as coisas e asidéias, entre o mundo exterior e a consciência, entre o objeto e osujeito, entre a verdade objetiva e a verdade subjetiva [...]
Com Hegel, encerramos a modesta reflexão sobre o conhecimento
na Idade Moderna. Agora, façamos uma breve aproximação das relações
entre conhecimento e ciência, na Idade Contemporânea.
5.2.3 Conhecimento e ciência: breve aproximação contemporânea
24 Tese de que: “se o objeto do conhecimento é Deus ou a verdade, o infinito ou o incondicionado; e, se o pensamento só compreende um objeto, quando este é colocado sob a forma de conceitos os quais convertem oreferido objeto em algo condicionado e mediatizado; então o conhecimento dos ditos objetos só se dá graças aum saber imediato” (ARANTES, 1991, p. XIV).25 “Como ilustração do primeiro argumento, Hegel toma a matemática, na qual as solu ções, embora possam seapresentar de maneira imediata, na verdade seriam obtidas através de considerações complicadas e grandementemediatizadas; essas soluções, segundo o filósofo, só surgem imediatamente àqueles que estão familiarizados com
elas.” (ARANTES, 1991, p. XV).26 “Exemplo para elucidar o segundo nível da argumentação é encontrado por Hegel no fato de que, embora possam constituir uma existência imediata em relação aos filhos, os pais „são imediatos‟, apesar da mediaçãoanterior que está ligada à própria existência imediata.” (ARANTES, 1991, p. XV).
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Como conhecemos o mundo? Com essa questão Kerlinger (1980)
inicia uma reflexão que indicará que o conhecimento pode derivar da
autoridade27 ou da observação. Ambas, contudo, afirma o autor, não são
dignas de toda confiança. Nesse contexto,
a ciência se desenvolveu, em parte, pela necessidade de ummétodo de conhecimento e compreensão mais seguro e digno deconfiança do que os métodos relativamente desprovidos decontrole geralmente usados. Foi preciso inventar uma abordagemdo conhecimento, apta a permitir informação válida e fidedignasobre fenômenos complexos [...] (KERLINGER, 1980, p. 1-2).
A ciência, ainda com Kerlinger (1980, p. 3), é um empreendimentovoltado para o conhecimento e para a compreensão: “[...] os cientistas
desejam conhecer e compreender as coisas [...]”
Morin (2003) assinala que a ciência é elucidativa, enriquecedora,
conquistadora e triunfante e, ao mesmo tempo,
[...] essa ciência libertadora traz [...] possibilidades terríveis desubjugação. Esse conhecimento vivo é o mesmo que produziu a
ameaça do aniquilamento da humanidade. Para conceber ecompreender esse problema, há que acabar com a tola alternativada ciência “boa”, que só traz benefícios, ou da ciência “má”, que sótraz prejuízos. Pelo contrário, há que, desde a partida, dispor depensamento capaz de conceber e de compreender a ambivalência,isto é, a complexidade intrínseca que se encontra no cerne daciência. (MORIN, 2003, p. 16).
Parte da preocupação de Morin (2003, p. 21) reside no fato de que
“o espírito científico é incapaz de se pensar de tanto crer que o
conhecimento científico é o reflexo do real [...]”. Com efeito, caso o
fizéssemos, veríamos que o progresso das certezas científicas produz o
progresso da incerteza28.
Nesse sentido, acompanhando ainda Morin (2003, p. 24), “a ciência
não é somente a acumulação de verdades verdadeiras [...]”, isto é, trata-
27 “[…] alguma fonte que aceitamos como digna de crédito nos dá esse conhecimento.” (KERLINGER, 1980, p.1).28 “Podemos até dizer que, de Galileu a Einstein, de Laplace a Hubble, de Newton a Bohr, perdemos o trono de
segurança que colocava nosso espírito no centro do universo: aprendemos que somos, nós cidadãos do planetaTerra, os suburbanos de um Sol periférico, ele próprio exilado no entorno de um galáxia também periférica deum universo mil vezes mais misterioso do que se teria podido imaginar há um século [...]” (MORIN, 2003, p.24).
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se de um combate entre teorias e princípios de explicação; entre visões de
mundo e postulados metafísicos. De outra forma, seria ingênuo supor que
o fato de a ciência advogar para si o status de tradutora da realidade,
como conhecimento superior às demais formas de conhecimento, é
condição suficiente para a verdade.
Em outro trabalho, Morin (1999) assinala que a noção de
conhecimento parece-nos uma e evidente, mas desde que a
questionamos, ela, antes segura, pulveriza-se em muitas interrogações:
Os conhecimentos? O saber? Os saberes? A informação? Asinformações?A percepção? A representação? O reconhecimento? Aconceituação? O julgamento? O raciocínio?A observação? A experiência? A indução? A dedução?O inato? O adquirido? O aprendido? O adivinhado? O verificado?A investigação? A descoberta? Inculcar? O arquivamento?O cálculo? A computação? A cogitação?O cérebro? O espírito? A escola? A cultura?As representações coletivas? As opiniões? As crenças?A consciência? A lucidez? A clarividência? A inteligência?A idéia? A teoria? O pensamento?A evidência? A certeza? A convicção? A prova?A verdade? O erro?
A crença? A fé? A dúvida?A razão? A desrazão? A intuição?A ciência? A filosofia? Os mitos? A poesia? (MORIN, 1999, p. 19).
Para o autor, “ignorância, desconhecido, sombra, eis o que
encontramos na idéia de conhecimento [...]” (MORIN, 1999, p. 20). Ou
seja, quando desejamos conhecer, o conhecimento torna-se “estrangeiro
e estranho”. Com isso, parece evidente supor, com o autor, que não é
possível reduzir o conhecimento a uma única noção.
Essa pulverização do conhecimento levou a um grau crescente de
especializações que, agora, cada um desses fragmentos “ignora a vista
global da qual faz parte” (MORIN, 1999, p. 21), provocando a “patologia
do saber”:
Percebe-se ainda com muita dificuldade que a disjunção e oesfacelamento dos conhecimentos afetam não somente apossibilidade de um conhecimento do conhecimento, mas também
as possibilidades de conhecimentos sobre nós mesmos e sobre omundo [...] (MORIN, 1999, p. 22).
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Ainda com Morin (1999, p. 23-24), a fragmentação do conhecimento
vem acompanhada de uma “vertiginosa crise dos fundamentos do
conhecimento”. O argumento do autor consiste em apontar que a ciência,
em seu esforço para se transformar no único e indivisível instrumento
capaz representar toda a verdade, ao longo dos séculos, falhou:
Ora, a purificação do pensamento pela eliminação de todas asescórias, impurezas e impertinências revelou-se um expurgo quelevou junto tripas e intestinos: o sonho de encontrar fundamentosabsolutos desabou com a descoberta, em meio à aventura, daausência de tais fundamentos. (MORIN, 1999, p. 24).
Relativizado o conhecimento científico, cabe agora precisar seu
conceito e estreitar sua relação com a ciência, a fim de pôr fim a essa
breve reflexão. Nesse sentido, o conhecimento científico será um saber
aprendido por meio de metodologias apropriadas. Essas metodologias são
tão variadas quanto os sujeitos da investigação, bem como seus objetos
investigados. Por isso, é preciso fazer uma escolha. Nesse sentido,
chamaremos de conhecimento científico aquele conhecimento proveniente
do processo de investigação que o sujeito empreende sobre o objetoinvestigado, por meio do método científico.
Afirmaremos com Bachelard (19--, p. 11) que “[...] seja qual for o
ponto de partida da actividade científica, tal actividade só pode convencer
plenamente abandonando o domínio de base: se ela experimenta, terá de
raciocinar; se raciocina, terá de experimentar [...]”. Com isso,
reconhecemos que na investigação considerada científica transitam
livremente e inseparavelmente de um lado, empiria e de outro, teoria; istoé, entre o real e o racional29. É pois, na encruzilhada dos caminhos que
devemos nos colocar assumindo um conhecimento que é “[...] conquista
da fusão do racional com o empírico [...]” (SALOMON, 2000, p. 146).
29 Reforçando esse argumento da falsa dualidade que ocupou o pensamento científico opondo-se de um lado,racionalistas e de outro, empiristas, Bachelard (19--, p. 14) assinala que “[...] estamos perante uma razão denovidade metodológica que teremos de clarificar; as relações entre a teoria e a experiência são tão estreitas quenenhum método, quer experimental, quer racional, tem a garantia de conservar seu valor [...]”
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Construiremos nosso conceito de ciência com base em dois
epistemólogos30. O primeiro, Granger (1994, p. 45-46), assinala três
aspectos característicos da atitude científica:
1. a ciência é uma visão de uma realidade. Para o autor, a
realidade é um “metaconceito” que se aplica às
representações da experiência. Segundo Granger, “a ciência é
uma representação abstrata, mas se apresenta, com razão,
como representação do real”;
2. a ciência visa a descrever e a explicar , não diretamente para
agir. Opondo-se, portanto, à técnica: “o primeiro resultado da
visão é a satisfação de compreender, e de modo algum agir”;
3. por fim, a ciência tem preocupação constante com critérios de
validação, isto é, as condições de sua realização devem ser
anunciados de tal forma que possam ser reproduzidas: “o
conhecimento científico é necessariamente público, ou seja,
exposto ao controle – competente – de quem quer que seja”.
Prosseguindo com a construção do conceito de ciência, faremos uso,
por fim, dos ensinamentos de Salomon (2000, p. 146). Segundo o
mesmo, é necessário que se faça uma distinção entre ciência como
processo e ciência como produto e, em seguida (e concomitantemente)
entre ciência como instituição social e ciência como conhecimento (ver
figura 1, abaixo).
30 “[...] a diferença entre o historiador das ciências e o epistemólogo consiste em que o primeiro toma as idéias como fatos, ao passo que o segundo toma os fatos como idéias, inserindo-os num contexto de pensamentos. Em
outras palavras, o primeiro procede das origens para o presente, de sorte que a ciência atual já está sempreanunciada no passado, ao passo que o segundo precede do presente para o passado, de sorte que somente uma parte daquilo que ontem era considerado como ciência pode hoje ser fundado e justificado cientificamente.” (JAPIASSU, 1992, p. 33).
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FIGURA 1 – As dimensões da ciência.Fonte: SALOMON, 2000, p. 146.
Acompanhando a figura 1, acima, processo e conhecimento se
referem à interioridade da ciência, ao passo que produto e instituiçãosocial se referem à exterioridade da ciência.
A ciência quanto à dimensão processo identifica-se com a própria
pesquisa, com o fazer ciência:
compreende todas as atividades vivas dos pesquisadores ecientistas enquanto envolvidos em seus projetos e programas deestudo com o objetivo de descobrir e fazer avançar oconhecimento científico, especializado ou não [...] (SALOMON,
2000, p. 147).
Processo
InstituiçãoSocial
Produto
Conhecimento
Interior da ciência
Exterior da ciência
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A dimensão produto, por sua vez, refere-se ao resultado do
processo acima descrito:
São as comunicações das descobertas e das invenções científicas,os relatórios de pesquisa, os informes científicos e técnicos.Encontram-se nos banco de dados, nos arquivos, nos anuários,nos periódicos científicos, nas bibliotecas, enfim constituem o quemodernamente se consagrou chamar de documentação científica.Seu conjunto é sistematizado e tem servido para alimentar oestudo dos próprios cientistas e fornecer o objeto de estudo daschamadas disciplinas científicas ensinadas nos centrosuniversitários, nas academias e nos institutos de pesquisa e deformação de futuros cientistas ou de profissionais de nívelsuperior. (SALOMON, 2000, p. 147).
A instituição social se refere ao “peso” da academia. Para Salomon(2000), nesse caso, a ciência se relaciona a disciplinas científicas
particulares que regulam e se (pre)ocupam com a máxima avançar
controladamente e sistematicamente o conhecimento:
Esta sim exige formação específica, pois é uma pesquisa tambéminstitucionalizada, sob o compromisso de contribuir originalmente,de fazer novos enriquecimentos ao patrimônio universal daquelaespécie de saber. (SALOMON, 2000, p. 147-148).
Por fim, como conhecimento, refere-se ao resultado que pesquisa
promove no sujeito, isto é,
[...] a pesquisa científica é algo que se propõe ao homem dotadodo mínimo de recursos intelectuais, como meio de alcançar o seuconhecimento, de nível científico, independentemente de ser estaobtenção significativa para a ciência como instituição. (SALOMON,2000, p. 148).
Diante do exposto, consideramos ciência um conceito demasiado
vago e abrangente o suficiente para não ser definido com uma simples
sentença. É pois, por isso, que alertamos para seus aspectos
estruturantes (histórico, social, político, econômico, psicológico, lógico ...),
antes do fazer ciência.
5.2.4 Atividades
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Essa lição 3 conta com duas atividades. A primeira consiste na
realização de um teste rápido e a segunda, em uma participação em
Fórum, abaixo especificadas.
5.2.4.1 Atividade: Teste rápido.
Um teste rápido consiste em um conjunto de perguntas cujasrespostas são de tipo objetivas. Sua finalidade principal é verificar o nível
de apreensão da leitura realizada. Não se busca, aqui, ver quem
efetivamente compreendeu tudo e à contento, mas antes, trata-se de
identificar quem realizou a leitura. Por isso, freqüentemente, são
formulações simples e objetivas que requerem pouco esforço intelectual.
Encaminhe o teste respondido ao seu tutor. Atenção: não perca o prazo
de realização.
5.2.4.2 Atividade: Fórum.
Definir fórum e a participação
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5.3 Lições 14 e 15: O Projeto de Pesquisa
Essas duas lições são ambiciosas. Procurarão acompanhá-lo por um
labirinto denominado “projeto de pesquisa”. Esse projeto, como qualquer
outro, refere-se a um “lançar-se para o futuro” . Mas possui a
particularidade de se constituir em um instrumento de leitura da
realidade, amplamente difundido e cegamente aceito, chamado “pesquisa”.
Desenvolver uma pesquisa é uma tarefa complexa. Não há
unanimidade entre os cientistas sobre o que se constitui a atividade
científica. Há, sim, acordos e convenções registrados em meios formais
para conhecimento de todos. São por esses meios e por nossa modesta
experiência que nos apoiaremos para construir nossa proposta.
O projeto de pesquisa assume dupla responsabilidade: por um lado,
aquela função de projeção; por outro, a tradução das concepções do
investigador. Não raras vezes, deparamo-nos com pesquisadores por
cujas produções nada indicam quanto à forma de investigar. É essa forma
de investigar a realidade, de construir conceitos, de definir condutas por
meio da pesquisa científica que denunciam pressupostos assumidos.
Sendo assim, deixemos claro desde o início que nos colocamos
ombro a ombro com aqueles que
???
Cabe ressaltar que se trata, portanto, de um estudo qualitativo
que embora não se furte a investigar em extensão o fenômeno de
crescimento da pós-graduação Lato sensu, situa-se ao lado daquela
concepção de ciência cuja finalidade é a compreensão interpretativa darealidade. Significa dizer, que a amostra mínima aceita pelo paradigma
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dominante do fazer ciência, 25%, como única capaz de formular leis
gerais, bem como seus instrumentos que pretendem por meio da
matematização e estatistização atingir a realidade social não nortearão a
presente pesquisa. Reconheço que o falso conflito travado na “guerra das
ciências” (SANTOS, 2003) está superado. Trata-se, hoje, pois, de
retormar a questão pertinente ao nascimento da Idade Moderna: Para quê
serve a ciência?
“[...] a verdadeira política, a verdadeira pedagogia, a verdadeira
medicina, na medida em que algum dia existiram, pertencem à praxis”
(CASTORIADIS, 1982, p. 94).
5.3.1 Pressupostos assumidos
Para Booth, Colomb e Williams (2000, p. 7), pesquisar é
“simplesmente reunir informações necessárias para encontrar resposta
para uma pergunta e assim chegar à solução de um problema”. Nessa
linha, acreditamos que um projeto de pesquisa tem início um pouco antes
do problema de pesquisa: no interesse do investigador. Mas que em seu
percurso assume o problema de pesquisa (fruto do interesse do
pesquisador) como ponto de partida concreto da investigação.
Estamos convencidos, com Salomon (2000, p. 13, grifo nosso), de
que não há pesquisa sem problema, pois,
[...] só existe conhecimento científico, ciência, através dapesquisa vista como processo; esta só se realiza através dométodo e este só existe quando estamos diante de um problema assumido como tal pelo pesquisador e por ele corretamenteformulado. É a natureza do problema que dita o método a serempregado.
Dessa forma, o autor assinala que conhecimento científico e
método, meio de garantir o conhecimento científico, só existem a partir de
um problema de pesquisa. Portanto, também para nós, categoriasanalíticas eleitas a priori , só têm razão de ser se combinadas às a
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posteriori . Nesse sentido, o conhecimento como o concebemos, como
processo que busca compreender interpretativamente a realidade, não
foge ao fato de que
[...] nenhum conhecimento é totalmente dado a priori ou a posteriori ; ele resulta de um diálogo entre o a priori e o a posteriori : nada de categorias mentais que nada deviam àexperiência, mas também nada de intuição empírica que não sejainformada pelo espírito. (FOULQUIÉ, 1978, p. 93).
Aliado a isso, reconhecemos com Santos (2003) que a construção
da distância dicotômica entre sujeito e objeto nas ciências físicas deve ser
abandonada em favor de uma nova construção, pois,
[...] a ciência não descobre, cria, e o acto criativo protagonizadopor cada cientista e pela comunidade científica no seu conjuntotem de se conhecer intimamente antes que conheça o que com elese conhece do real [...] (SANTOS, 2003, p. 83).
Nessa nova construção assumiremos que a ciência moderna não é a
única explicação possível da realidade, mas antes, apenas, uma das
possíveis explicações31. Reconhecida sua limitação como instrumento de
construção da realidade, a ciência e a pesquisa, veículo da ciência, têmpor missão investigar o mundo em que o homem vive e, decorrente disso,
o próprio homem.
Tendo isso em mente, o projeto de pesquisa busca traduzir o rico
processo de investigação. Assim, pertence à esfera do fazer não destituído
do saber , mas antes, procura associar saber e fazer nessa ordem. Em
outras palavras, não há projeto de pesquisa (fazer ) que não corresponda
a uma concepção de homem, sociedade e das relações nela existente
(saber ).
Bom Trabalho!
31 “[...] A ciência moderna não é a única explicação possível da realidade e não há sequer qualquer razãocientífica para a considerar melhor que as explicações alternativas da metafísica, da astrologia, da religião, daarte ou da poesia [...]” (SANTOS, 2003, p. 84).
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5.3.2 Etapas do Projeto de Pesquisa
Um projeto de pesquisa é um produto. Esse produto busca
representar o meio caminho de um processo de pesquisa, onde na ponta
haverá outro produto (monografia, artigo, ensaio, relatório etc.). Nessa
linha, o que se deve privilegiar é o processo e, por isso, nele iremos nos
concentrar.
Um projeto de pesquisa, independentemente da linha teórico-
metodológica adotada, possui tema, delimitação do tema,
problematização, objetivos, aspectos teórico-metodológicos, referencial
teórico e cronograma. Esses pontos são suficientes para se garantir um
projeto de pesquisa.
Em nossa linha de investigação, sempre privilegiando o processo,
assumimos como ponto de partida o interesse do pesquisador. É com
ele que iremos trabalhar nas seções iniciais, desde dicas para a
aproximação pesquisador-interesse até a definição de boas perguntas de
partida.
A seguir, daremos tratamento às perguntas de partida a fim de
selecionarmos um problema de pesquisa condizente, pois, com a
vontade do pesquisador. Depois, colocaremos o problema de pesquisa em
um conjunto de elementos que se relacionam mutuamente e põem em
relevo a importância de se buscar a resposta ao problema apresentado:
essa é a problematização.Colocada a pergunta na forma de problema de pesquisa, o passo
seguinte consiste em determinar o mais minuciosamente possível os
procedimentos que se intentam implementar a fim de respondê-lo.
Primeiramente, estabelecem-se os objetivos geral e específicos.
Depois, os aspectos metodológicos, isto é, os caminhos da pesquisa. A
seguir, realiza-se uma primeira aproximação com a produção escrita e
tornada pública que auxiliam para a resposta pretendida: a isso
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chamamos referencial teórico. Finalmente, fazemos uma projeção do
uso do tempo, isto é, construímos o cronograma da pesquisa.
Feito tudo isso, identificaremos (e não elaboraremos) o tema e sua
delimitação. Pronto, o projeto está pronto! Tudo isso passo-a-passo.
Bom trabalho!
5.3.2.1 Do interesse à pergunta de partida
Nosso ponto de partida é a identificação do interesse do
pesquisador. É muito comum, infelizmente, os pesquisadores iniciantes
terem seus projetos “moldados” a partir dos interesses do seu orientador.
Isso se justifica em parte, pois, o paradoxo do avanço da ciência reside no
fato de que para se conhecer é preciso recortar, entretanto, recortando
perde-se a referência total. Assim, pesquisadores mais experientes são
especializados em “campos do saber” muito bem delimitados e, com isso,
possuem maior facilidade e condições mais efetivas de orientação bem
sucedida.
Mas quem pesquisa precisa garantir seu interesse porque, afinal,
terá que levar a cabo todo um esforço, durante um período razoável
(tempo em que durar seu TCC, normalmente em torno de 2 semestres
letivos), que poderá se transformar em grande castigo, ao invés de fonte
de prazer pela realização. Assim, essa seção apresenta técnicas de
levantamento desses interesses.
Booth, Colomb e Williams (2000, p. 46) assinalam que um interesse
é “simplesmente uma área geral de investigação que gostaríamos de
explorar”. Naturalmente, essa área geral está confinada a subáreas de seu
curso32. Mas isso não deve desanimá-lo, pois mesmo assim sua liberdade
32 Por exemplo, no Curso de Pedagogia, a partir da possibilidade de orientação de seus professores (leia-se: emfunção dos interesses dos professores e não dos alunos), tem-se a área de Planejamento e Política; Gestão daEducação; Organização do Trabalho Pedagógico e outras. Assim, como o curso é de Pedagogia, um aluno não
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de escolha ainda é muito grande. Como sugestão para descoberta de seu
interesse, o primeiro passo é preencher um quadro como o quadro 1,
abaixo.
INTERESSE DE PESQUISA
Fontes reasBibliografia especializadaPlanos de CursoLivro
QUADRO 1 – Interesse de Pesquisa.
Detalhando o quadro 1, acima, em primeiro lugar, identificamos as
possíveis fontes de informação. No nosso exemplo, a primeira é um