PRESENÇA(S) DE SALVADOR ESPRIU NO SISTEMA CULTURAL … · 2018. 10. 3. · FELISA RODRÍGUEZ M....

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PRESENÇA(S) DE SALVADOR ESPRIU NO SISTEMA CULTURAL GALEGUISTA' Maria Felisa Rodriez Prado Grupo GALABRA - Univeidade de Santiago de Compostela No fim dos anos sessenta e na década de setenta detecta-se a existência de transferências, apelos solidários e de apoio mútuo CClll- duzentes a umha certa articulaço de entre-ajuda impulsionada por alguns sectores das nacionalidades periféricas. A comum preferência do repertório da poesia social-realista, de compromisso e inlervençom, nas chamadas «línguas veáculas» e o êxito cançó catalá favorece a difusom de Salvador Espriu, figura de destaque na cultura cat' llá, que passa a ser (rc)conhecido, nom apenas na Catalunha ou entre os intelectuais galegos estabelecidos nela, mas também na Galiza e nos seus enclaves e, ainda, no conjunto do Estado Espanhol, nom em poucas ocasions fazendo parte da tríade completa- da palo basco Gabriel Aresti e o galego Celso Emilio Ferreiro. Este trabao tem por objectivo dar a conhecer e interpretar as transferências de Salvador Espriu e da sua obra para um sistema ga- lego cm construçom que encontra na Catalunha, com frequência, o seu referente de analogia ou de emulaçom. Nesla comunicaçom, eslando longe da nossa inknçom e possibi- lidades fazer um levantamento exaustivo da presença e referências a Salvador Espriu na Galiza e/ou em galego, tentaremos dar um mo- desto contributo para esse trabalho, que é (apenas) umha das mani- festaçons do diálogo intercultural das periferias peninsulares. 1. A nom' ortográfica utilizada na apresentaçom deste trabalho ajusta-se à pro- posta da Associaçom Galega da Língua (AGAL).

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438 A. QUINTANA I

profetic, clam en[ront de la persecució dei poble i de la llengua nzento mori- no hi he trobat cap resso, mês o menys directe

'

poesia d'Espriu, i el mateix passa amb eIs restant es�riptors �'vel!�,l/ abans nota 3- ací considerats. ,

De tola manera, si Salvador Espriu observava el 1965 que a �� nya no hi sentia parlar basc,22 Chusé lnazio Nabarro eSCliurà el que a San Chuan de Plan, a la Vali de Gistau, on s'hmrien reunit calla d'escriplors aragonesas, «Ascuitemos caD pena cómo a m:airlá�'�/,� da y 1'aguazil fablaban en castellano»,23

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PRESENÇA(S) DE SALVADOR ESPRIU NO SISTEMA CULTURAL GALEGUISTA'

Maria Felisa Rodriguez Prado Grupo GALABRA - Univen;idade de Santiago de Compostela

No fim dos anos sessenta e na década de setenta detecta-se a existência de transferências, apelos solidários e de apoio mútuo CClll­duzentes a umha certa articulaçorn de entre-ajuda impulsionada por alguns sectores das nacionalidades periféricas.

A comum preferência do repertório da poesia social-realista, de compromisso e inlervençom, nas chamadas «línguas vernáculas» e o êxito da cançó catalá favorece a difusom de Salvador Espriu, figura de destaque na cultura cat.:.'llá, que passa a ser (rc)conhecido, nom apenas na Catalunha ou entre os intelectuais galegos estabelecidos nela, mas também na Galiza e nos seus enclaves e, ainda, no conjunto do Estado Espanhol, nom em poucas ocasions fazendo parte da tríade completa­da palo basco Gabriel Aresti e o galego Celso Emilio Ferreiro.

Este trabalho tem por objectivo dar a conhecer e interpretar as transferências de Salvador Espriu e da sua obra para um sistema ga­lego cm construçom que encontra na Catalunha, com frequência, o seu referente de analogia ou de emulaçom.

Nesla comunicaçom, eslando longe da nossa inknçom e possibi­lidades fazer um levantamento exaustivo da presença e referências a Salvador Espriu na Galiza e/ou em galego, tentaremos dar um mo­desto contributo para esse trabalho, que é (apenas) umha das mani­festaçons do diálogo intercultural das periferias peninsulares.

1. A nom'<l ortográfica utilizada na apresentaçom deste trabalho ajusta-se à pro­posta da Associaçom Galega da Língua (AGAL).

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FELISA RODRÍGUEZ M. PRADO. Presença(s) de Salvador Espriu no sistema cultural galeguista. [Actas do] Simpósio Internacional Salvador Espriu. Barcelona: Universitat de Barcelona. (Oct 2003). Universitat de Barcelona, pp. 439-61
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No fim dos anos sessenta e inícios dos setenta, Dom podendo fa� lar-se para a Galiza da existência de um sistema literário dotado de suficiência sistémica, acha-se um protossistema2 necessitado tanto de se afirmar no espaço galego como de projectar a sua existência na Península Ibérica. Urnha das estratégias que os agentes galegllistas activam para isso é o recurso ao intersistema cultural, por duas vias:

- retomando o intersistema que hoje é habitualmente conhecido como lusófono, construído à volta da língua (galego-)portllgueSa, e - participando na (co-)construçom do intersistema espanhop com outros agentes, sobretodo dos sistemas peliféricos, com os quais se compartiJham nonnas sistémicas, repertórios dominantes ou, até, circunstâncias sócio-políticas semelhantes e referente de oposiçom comum.

Nesses sistelnas com os quais o galego está em contacto, encon­tram-se elementos ou materiais susceptíveis de serem transferidos tendo como objectivo reforçar, legitinlar ou contribuir para a auto� suficiência sistémica do projecto galeguista. Do sistema catalám toma-se, entre outros, Salvador Espriu e a sua obra, que ocupam umha posiçom central.

Aqui, pondo de parte as transferê1Zcias de Espriu para o sistema galego feitas por via da traduçom da sua obra literária para a nossa língua -suspeito que praticamente limitadas à produçom poética e quase sempre da responsabilidade de galegos-catalans- e sem apro­fundar na mediaçom da intelectualidade galeg(uist)a na Catalunha'

2. Eutende-se por protossistema a «rede fonnada por um conjunto de pcrsoas vin­culadas por umha interrelaçom de (macro)factores -mercado, iustituiçons, emisores, receptore?'. repertórios, produtos cllltllraLs- que presentam carências importantes na sna establhdade e, pOI' vezes, na sua definiçom sistémica, e qne pretendem substituir nmha parte ou a totalidade dum outro sistema que nonnalmente se constitui no sen re­ferente de oposiçonH (Torres Feijó).

3. Umha das materializaço� deste intersistema é, na época contemporânea, a pla­tafoITIla Galcnzca, várias vezes retornada.

4. �m t�nnos de cnltnra, a CataJu.nha é em boa parte identificada -por ter aí o seU

centro llTadlador- com Barcelona, cldade contemplada nom apenas como referência da vida enltural e editorial catalá ou espanhola, mas também incluída no número dos enclaves galegos. Desempenha um importante papel desde o início dos anos sessenta; qnando, simul1aneamente ao que acontecia na Galiza, af começa a organizaçom de jo­vens galegos em fonna de grupo cultnral. O nível de acçom dest.a colónia galega é em parte definido polo próprio ambiente catalám em qne está instalada, que lhe pennite confront.ar a sltuaçom de ambas comnnidades históricas, a nativa e a de radicaçom

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na divulgaçom da figura e da produçom deste catalám, tenciona-se dar conta das referências espriuanas (e do sentido delas) encontra­das num levantamento exaustivo feito nas publicaçons periódicas ga­legas (perto de cem), bem como em todas as obras-livro (mais de quinhentas) editadas, quer as aparecidas na Galiza, quer nos nume­rosos enclaves galegos na emigraçom, de 1969 a 1975.5 A partir das pistas encontradas nessa procura, revelou-se como sendo de interes­se avançar até que ponto as posteriores transferências espriuanas coincidem ou nom com estas, já sem qualquer preocupaçom de exaustividade.

1 . ANTES DE MAIS ...

Convénl situar a presença de Espriu no sistema cultural galego num quadro mais amplo: o das nacionalidades históricas, de um modo global, e o da Catalunha, mais concretamente.

As referências a isso que pode ser chamado de «entre-ajuda» das periferias, abundantes nas publicaçons galegas do tardotranquis­mo, privilegiam, de modo geral, a contemporaneidade, ainda que esta seja abandonada com algumha frequência para ir buscar no passado de luta pola consecuçom dos Estatutos nos anOS trinta o fio dumha entente (Catalunha, Euskadi, Galiza) que pretende ser ins­trumento de construçom de futuro. De facto, destacam as chamadas de responsabilidade das várias nacionalidades com respeito à even­tual reforma da Espanha, que se sente próxima.

Nom se pode esquecer que neste momento se produz a abertura de expectativas relativamente à alteraçom do quadro po1itico-jurídi­co, que, determinando a evoluçom política e social, está hgada a -e marca- as emergências dos sistemas nacionalistas. O contexto in-

temporal an pennancnte, com resultado desfavorável para a Galiza.. Isto favorece as tentativas de diminuir a distáucia através da mediaçom e explica qne amiúde se apre­sente a Catalunha como possuidora de um mercado, revist.as e especialistas de alto ní­vel, publicitando-se os snccssos ou apl'eciaçons positivas qne os prodntos da Galiza me­receram nas pnbJicayons em qne estes galegos agem corno mediadores nas dnas direcçons.

5. Esse levantamento foi realizado dentro do projecto POLULIGA, qne está a ser desenvolvido por alguns elos investigadores qne fazemos parte do grupo GALABRA, de estndos nos sistemas culturais galego-lnso-afro-brasileiro, da use.

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ternacional é favorável para a multíplicaçom do espaço e da atençom dedicados às realidades nacionais minonzadas e vam sendo tomadas medidas para a protecçom das suas línguas e culturas esmagadas ou nom reconhecidas. Por exemplo, no Estado Espanho!, a Ley de Edu­cación de 1970 possibilita a introduçom destas línguas na escola e o reconhecimento do COllsejo de Ministros que em 1975 autoriza a uti­lizaçOlll delas ern todos os níveis é rnais un1ha via para desenvolver e alargar urnha produçom cultural cujas primeiras manifestaçons para consumo de massas surgem no terreno musical.

Para além da constmida polos grupos políticos efou de acçom sindical, a solidariedade das periferias é desenvolvida como estraté­gia no terreno cultural e encontra para os galegos o seu maior ponto de apoio e motor principal na Catalunha desenvolvida e cOm umha sítuaçom mais normalizada. Quase sempre dentro da contem­poraneidade/ som os ecos catalansj sem dúvida, os que mais se trans­mitem na Galiza, relativamente ao campo económico, de poder ou social, e mesmo literário:6

a Catalunha é colocada em destaque a nível político poja sua capacidade de iniciativaj evidenciada tanto pola sua projecçom inter­nacional como polo nível que atinge o seu de.'"ienvolvimento de cons­ciência nacional e acçom conscíentizadora à vista do jogo político a ser aberlO polo novo regime.7 Do mesmo modo que antes da ditadu­ra, a pos içom catalá dentro das nacionalidades históricas é apresen-. ta da como privilegiada, de novo graças à induslrializaçom e à sua burguesia;

perante umha Catalunha que, enquadrada dentro de um es­paço peninsular no qual a literatura e a cultura espanholas funcio­nam comunnlente corno referente de oposiçom, vai avançando no seu processo de afirmaçofn identitária) cultural e literário" manifesta­se o desejo galego de emuJaçom, pois também a Galiza conta com agentes e grupos nacionaJistas que pretendem conslruir um sistema independente;

na procum de diferenciaçom que detlne todo sistema literário

6, Relativamente, a Ç'$tes aspectos, pode consultar-se ri comuniC<'1çom apresentada por Rodríguez Prado no congresso da AIEG, celebrado em BaTcelOlla €IH Maio de 2003,

7, igual que acontecera no passado, a buq?,uesia catalá e os. (S€lLS) interesses eco­nómicos -como em Euskadi ETA e as armas- som os elementos motores do nacio­nalismo naqnele espaço, ("�ntrastando com umha G.,hza lnoperan1e nestes termos.

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emergente, o protossistema galego vê no catalám, num estádio mais avançado dessa emergência, utn sistema acessível pola sua proxinli­dade: partilha o contexto espanhol e conta com umha língua roman­ce que facilita a inteligibilidad;e e o acesso aos seus produtos literários -face, por exemplo, à barreira amiúde intransponível que é o euske­ru. É, portanto, susceptível de ser usado como reforço do projecto galeguista, funcionando na altura como referente de analogla.

2. INDO A ESPRlU ...

No tardofranquismo Salvador Espriu ocupa umha posiçom cen­trai nO sistema literário catalátn. reconhecida nas publicaçons ga­legas tanto pala intelectualidade da Galiza como pala (de língua) ca­talá cuja voz comprometida se ouve nelas, e tnais evidenciada publicamente após o falecimento de Caries Riba, em 1959. Ele\""do à categoria de poeta nacional da Catalunha por excelência, atinge mes .. mo dimensons de mito' num período em que a política centralista e negadora da diferença que se fai na Espanha nom contempla de modo adequado uns direitos linguísticos que os diferentes grupos nacionalistas passam a reclamar, tanto por umha questorn de identi­dade como por a imposiçom da língua ser entendida como manifes­taçom de submissam política efou colonizaçom. Está cm marcha, portanto, umha luta comum à procura dumha ínterlocuçom con­junta com o Estado ESpanhol para o reconhecimento das entoill cha­madas «línguas vernáculas\), desígnaçom politicamente correcta a que Espriu se refere, de modo breve mas crítico, com um «esa tan odiosa expresión» numha carta de 1975 ao galeguista Isaac Díaz Par­do (1995: 33) vinda a lume vinte anos mais tarde.

Assi. umha defesa e umha militância no uso da língua própria como as que Espriu pratica vam indissoluvelmente ligadas à afir­maçom de nacionalidade diferenciada e representam umha activida­de cultural resistenciaL Esse aspecto de resistência vê-se clanunente

8. Esta dimensom mítica alargou-se fora do espaço catalám, conforme dCJ110nstra o fal.:to de, em 1971, Mada Aurelia Capmany tcr assinado o monOgráfico dedicado a Sal­vador Espriu na co!ecçom .. Nuestros comemporâneos» cujo programa, destac-,4ldo na contracapa da obra, era «preseutur quineenalmenre nu número monográfico dedk"ado a los espanoles que han accedido a la popularidad, alcanzando la categoria dI:' míto ....

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testemunhado polo facto de que escrever ou editar nas línguas es­panholas diferentes do castelhano era urnha tarefa fortemente mar­cada polo voluntarismo politico e a vocaçom cultural. O labor apre_ senta, no entanto, condiçons especiais na Catalunha, relativamente aos casos galego e basco, no terreno editorial, na medida em que a capital da ediçom em catalárn, Barcelona, é, ao lllesrno tempo, capi­tal da ediçom em castelhano (VILA-SAN]UAN, 2003: 255).

Com urnha obra enraizada na língua catalá -à qual ele nunca re­nunciou como instIumento válido- de que se destaca o facto de es­tar construída longe do folclorismo, do tipismo e do localisrllO, cos­tunla colocar-se Espriu como prova da capacidade de se atingir validade universal e reconhecimento no ámbito internacional pola valia, apesar da Hmitaçom que supom a aposta pala escrita numha língua minoritária. A reivindicaçom/reafinnaçom linguística cata­lá espriuana, para além de se manitestar na própria prática da escri­ta literária, patenteia-se também de modo explícito na obra dele através da mensage que passa, por exemplo, em «Perà hem viscut per salvar-vos eIs mots (per retornar-vos el nom de cada cosa}). Estes versos encontram-se entre os dez traduzidos para galego que Manuel María Fernández Teixeiro cita no artigo «Raimon, poeta do noso tempo)} -aparecido na publicaçom de referência obrigada como meio de expressom da elite cultural galeguista tanto no panorama peninsular como nos enclaves galegos, Criai (18, Vigo [OuL-Dez.

1967J: p. 463-478)-, quando aborda o trabalho dele como intérpre­te de Espriu -relativamente ao qual afirma ser autor de umha das obras poéticas I11ais interessantes na escrita europeia do momento. Manuel María interpreta a coneXOln do poeta conl o cantor como continuidade cultural, ligaçom entre a velha e a nova geraçom e identificaçom entre a poesia culta e a arte «nobremente popular>) que leva aquela até o povo.

A fidelidade ao povo e a conseIVaçom da (sua) palavra manifestas nesses versos que fazem parte de «Inici de càntic en el temple)), tam

divulgado pola cançó na voz de Raimon, servirom (e ainda servem) com frequência aos homólogos galegos, em situaçom semelhante, para definir a sua funçom. Assi, Dosinda Areses, para referir clara­mente o papel da geraçom de 36, escreve em artigo jornalístico com rnotivo da mOlTe de Luís Seoane, em 1979: «Ficou dito e ben dito por Salvador Espriu que a función da nosa xeración (os nacidos entre

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1910 e 1920) foi a de salvar as palabras e devolverlle aos xovens o nome de cada cousa}}. Ao mesmo tempo, manifesta a consciência de cumprir umha missom que é «encomendada escuramente polos xe­nios que mantefien a coherencia da nación galega a traveso dos sé­culos, da opresión e da agresión interrninábeh (El pueblo gal/ego [7.4.1979J: p. 12).'

Achanl-se, também, algumhas referências ao papel que Espriu tem no processo de fixaçom e e elaboraçom da língua. Em «Salvà­rem els mots ( de la nostra lIengua ( e1 meu poble i jo», do poerna in­titulado com este último verso e significativamente dedicado a Pom­peu Fabra -ao qual se refere como mestre de todos-, lê-se umha identificaçom e unidade do poeta e o seu povo que, sendo muito cara à poesia social-realista, acrescenta nas nacionalidades periféricas a luta reivindicativa em e polas línguas próprias, visando a sua sobre­vivência. Mas no caso galego, para além de por essa afirmaçom lin­guistica, combatia-se polemizando sobre a fixaçom da língua escrita, que continuava bem viva nos anos 70. Face a certos sectores do gale­guismo cuja tomada de posiçom postulava umha orientaçom popu­larista, susceptível de ser facilmente abonada com esse texto es­priuano, encontravam-se os defensores da opçom de signo contrário, que apostava na autenticidade idiomática como correctora da desfi­guraçom linguística e nlodo de evüar a dialectalizaçom. Estes reco­rreram a Espriu para apontar os perigos de umha escrita que se li­mita a decalcar a língua do povo e, partindo do que parece ser um conhecimento mais alargado nom só da produçom dele corno ainda da língua catalá, assinalaram como a prá6ca espriuana da inovaçonl linguística tinha sido um dos mecanismos capazes de produzir um alargamento expressivo que se sentia ser preciso no cataláI11 literá­rio.IO É isto que se encontra, por exemplo, na «Carta sobre a unifica-

9. O al1:igo é recolhido por Alltón Capelán n<ls Prosas completas (Vigo: Galaxia, 1998, ps. 23-26) d<l autora, em LOja introduçom ele afirma que, como elemento da Ge­raçom de 36 fOnDada antes da Guerra Civil, «estimaha qne a súa función intelectual consistía en dar testemufio do compromiso coa nación en marcha, formulado de fonna maxístral por Sa Ivador' Espriu num célebre poema de "Inici de cito tic en el temple")" do qual cita, na língua original os quatro versos que falam da devoluçom da língua como caminho de acesso ao pleno domínio da terra.

10. Aínda receutemente, Xavier COSTA CLAVELL, no artigo «Esprin e Cid,. a propó­sito da publicaçom da cOlTespondência entre ambos, refere a coosideraçom de Felip Cid segundo a qual Espriu seria o autêntico renovador da língua catalá (O Correo Gale­go [17.2.2003]).

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ción linguística)) de Xavier Rodríguez Baixeras, conhecedor do âm­bito catalám, aparecida em Criai. Depois de referir Pompeu Fahra como unificador do calalám - sublinhando que o trabalho dele flOm tinha sido pacifica nem imediatamente aceiLe por todos, nom apos­tando, como nom apostou, na evoluçom da língua por si só - fala no purisrno e no cultismo, em geral rejeitados ou atacados na Galiza, afirmando «estóu plenamente convencido de que case a mitade do vocabulario de Carner (sobre todo déste), de Riba ou de Espriu non pertence á fala ordinaria» (GriaI26, Vigo [Out.-Dez. 1969]: p. 496).11

Também se noticia nos meios galeguistas a actuaçom espriuana relativamente à dignificaçom da língua. De facto, informa-se de que, estando a Catalunha integrada na Associaçom Internacional de Defesa das Línguas e Culturas Ameaçadas, Salvador Espriu foi no­meado em 1971 presidente12 dessa agrupaçom (<<Notas») in Gr-ial 32,

Vigo [Abr.-Jun. 1971]: p. 254). O relevo da notícia e do seu eco di­mensiona-se tendo em conta que a sobrevivência e o reconhecimen­to nom apenas das línguas consideradas em perigo passam tanto polo seu uso -quer popular, quer culto- como pola sua defesa con­tra as condiçons que a convertem em língua minorizada e que se isso supom, sobre todo, um trabalho a realizar no tenitório próprio, ten­do como objectivo ultrapassar a situaçom de inferiorizaçom e de nom norrnalizaçom em que se encontra, também implica, ademais, como um factor essencial, a projecçom exterior dos seus produtos culturais, nomeadamente os literários. Dentro da periferia do Estado Espanhol é a Catalunha, como já foi assinalado, que conta com maiores e melhores condiçons para consegui-lo. A funcionalidade disto, longe de se limitar a esse espaço, é vista como susceptível de ser aproveitada paro o (re)conhecimento da pluralidade espanhola: abre as portas às ouu'as áreas periféricas de identidade diferenciada, tanlo dentro como fora do Estado.

Na Espanha assiste-se à apariçom progressiva, sobretodo em re­vistas, de panoramas das letras espanholas onde se contempla a in-

11. Xosé NÚNEZ BÚA usa umha citaçom de Riba, identificado como umha das grandes figuras criadora.'> do catalám modenlO, para apoiaI' a necessidade de liberdade de criaçom verbal do escdtor, quando tmta o galego como língua literária em Revoeira. Homes, feitos, verbas. Montevideo: Patl'Onato da Cultura Galega, 1971, p. 46.

12. Bastantes anos mais tarde, é praticamente com este dado que se fecha a sem� blança de Espriu na uotícia do seu falecimento, no jornal Faro de Vigo [23.2.1985]: p. 7.

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clusom de trabalhos sobre ou com a produçom nas outTas línguas es­parmolas, dessas 'regions'. É o que acontece, por exemplo, em Cua­demos para el diálogo, relativamente à qual Pedro Altares ( 1999: 11), direclor da colecçom dos suplementos, afirma ter sido um dos ob­jectivos da revista a ({operación rescate» dos criadores fieis à Segun­da República e das suas ideias, «entre elas a do recofiecemento da pluralidade cultural e idiomática dos diversos pobos de Espafia». No número extraordinário de Maio de 1969, dedicado a 30 afias de li­teratura. Narrativay paesía espaiiala 1939-1969, acha-se um inquéri­to aos produtores considerados mais representativos da literatura es­panola do pós-guerra, figurando entre os poetas alguns que escrevem em catalám e o galego Manuel Maria Fernández Teixeiro, represen­laçom activa da Galiza.13 Este, à hora de apontar as três obras pri­mas de poesia desse período, cita Blas de Otero, Longa noite de pedra de Celso Emilio Ferreiro, que, em afirmaçom de Alonso Montero ( 1989: 11117), é livro homólogo, «non moi desemellante, nos seus simbolismos» a La pell de brau ( 1 960) para a poesia catalá, e esta obra de Espriu em primeiro lugar. É, significativamente, o único que escolhe produçom em três das línguas espanholas, as contempladas na «Introducción) ao inquérito, e um dos quatro que apontam Es­priu, cuja gratidom se manifestou imediatamente, nurnha carta de 7 de Junho que foi tornada pública uns meses mais tarde na Galiza ex­terior, no enclave bonaerense (Carreo de Galicia 94, Buenos Aires [30.9.1969]).

Nessa altura, o interesse pola figura e a obra de Salvador Espriu, bem como a mediaçom dos galegos-calalans, pode ser ilustrado com a madrilena «revista de los gallegos»), que lhe dedica a secçom «Poe­tas do Chan», em princípio destinada apenas a produtores da Galiza mas aí hospedeira do vate catalánl, que com esse gesto é tam home­nageado, polo menos, como a língua para a qual se vertem oito poe­mas espriuanos, o último dos quais é «Comezo de cantiga no tem­plo)}. As composiçom seleccionadas som acompanhados por um texto de apresentaçom onde Espriu é referido como «escritor da pe­riferia», «un dos poetas peninsulares de meirande personalidá»

13. Segundo consta das informaçons que se juntaram às respostas ao inquérito, Celso Emílio Ferreiro e Xosé Luís Méndez FeITin nom responderom (Cuadernos para el diálogo 14 Extraordinário, Madrid [MaL 1969]: p. 64).

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-mesmo candidato ao Nobel. Por outro lado, a noticia biohibliográ':' fica que é comum colocar-se, sem esquecer avaliar a importância da obra narrativa e teatral do autor, conclui revelando as ligaçons es­priuanas com a Galiza: ({CHAN prácese de poder ofrecer ista mostra poética de Salvador Espriu, profundo cofiecedor da cultura galega i autor de algunhos poemas adicados a Galicia (a CUITOS, a Rosaua, etc.), ao mesmo tempo que agradece a Manuel Casado Nieto a ver� sión galega que hoxe presentamos» (Chan 10, Madrid [Iul. 1969]: p. 23). A existência de umha certa dívida galega relativamente ao pro­dulor catalám parece estar ou, polo menos, sentir-se aqui em certo modo compensada por meio d(a ajuda para)o reconhecimento dele nos meios galegos, com a traduçom cama forma de honlenage. Nes­se sentido vam claramente as seguintes palavras de Manuel Maria, com motivo do décimo aniversário do falecimento de Espriu: «Sería convinte -e xa vai sendo hora de poner nlaus á obra- editar en ga­lego unha abondosa antoloxia da poesia de Espriu. É o mellor ho­menaxe dos galegos -el que tina tanta simpatía por nós, grande de­voto lector de Rosalía- neste décimo cabodano do seu pasamento» (O COrTeo galego, Composlela [12.8.1995]).

A circularidade do mútuo (re )conhecimento galego-catalam -portanto, afirmaçom-, apontada acima, acha-se, voltando de novo a Chan, quando a secçom de poesia contempla a produçom de Casado Nieto (Chan 16, Madrid [Out. 1969]: p. 23), fiscal galego ins­talado na cidade condal, conhecido director do Centro Galego de Barcelona durante moitas anos e autor da versam galega de textos bíblicos. Ao lado de alguns poemas de Canta de {onu o corazón do tempo, aparecido no mesmo 1969, hai umhas breves notas fechadas com a seguinte apreciaçom positiva: «Diles 1en dito o gran poeta dos nosos días Salvador Espriu, que "pra comentar os seus acertos par­ciales debería citar cada poema, cecáis cada verso e cada palabra"». A citaçom, que poderia ter sido tirada de algumha carta de Espriu ao autor -ao qual Basilio Losada caracteriza como fiscal 'atípico' que incluía nos seus informes citaçons literárias, entre outros, de Espriu «seu amigo e fonda devoción literaria» (Crial 83, Vigo [Jan.­Mar. 1984]: p. 100)- nom será a única intcrvençom -púbHca ou privada publicitada- do catalám ou das Suas palavras sobre a lite­ratura gal cga.

1974 e 1975 som dous monlentos altamente significativos na ac�

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tuaçom pública ligada à Galiza, já que Espriu realiza duas inter­vençons projectadas no enclave barcelonês, com o apelo à solidarie­dade, à comunidade de luta e interesses do(s) nacionalismo(s) e mes­mo às relaçons pessoais. Nelas, este produtor canonizado no sistema catalám homenageia as duas figuras mais canonizadas da cultura galega, Rosalia de Castro e Alfonso Daniel Castelao, elementos basi­lares para os agentes galeguistas no seu projecto de reconstruçom do passado e de consolidaçom de símbolos identitários de grupo. Num­ha altura em que se mulLiplicrun as publicaçons de/sobre Rosalía e Castelao e se projectam e realizam inúmeros actos com motivo do aniversário da morte deles, tanto na Galiza interior e na exterior, os depoimentos de Espriu recebem umha significativa difusom.

Em 1975, coincidindo com o vigésimo quinto aniversário do fale­cimento de Castelao, marcaram-se festejos em todo o mundo galego para dar a conhecer a obra e a personalidade deste político e intelec­tual polifacetado. Insiste-se, sobretodo, na vigência dos postulados dele, numha altura que Díaz Pardo (1995: 33) qualifica de «tempos difíciles pra falar de Castelao, no que o réxime via unha bandeira da oposición que pretendía recuperar as libertades democráticas e a personalidade polftica de Galiza», Dos inúmeros actos organizados em honra de Castelao, o de Barcelona, acontecido na Galeria Sarga­delos, cobra relevo em termos informativos, menos pala exposiçom dos desenhos do album Nós de Castelao e pola publicaçom de um ca­tálogo da mostra do que pola participaçom em ambos de Espriu. As referências que a homenage nlerece no Correo de Gallcia de Buenos Aires, na Galiza exterior e, mais amplamente, no interior, em Criai, patenteiam isto. Assi, a secçom «O rego da cultura» desta última re­vista alberga "Salvador Espriu fala de Castelao» (GriaI47, Vigo [Ian.­Mar. 1975]: p. 148), limitando-se a reproduzir as «espresivas» pala­vras do \\gran poeta catalán», que, para além de dar a conhecer as circunstâncias da sua primeira ida à Galiza e do contacto com a obra de Castelao, falam deste como símbolo da Galiza que nOll pode mo­n'er e destacam o seu valor universal. A indicaçom de que os amigos galegos quiseram que acompanhasse Díaz Pardo na apresentaçom da exposiçom, a que acrescenta um \<-ben innecessàriarnent, al meu entendre-», revela menos a modéstia ou humildade de Espriu do que o carácter simbólico da sua presença, em parte sublinhada na sua afirmaçom de que {(Castelao és un valor universal. No hi ha cap

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dubte, perà, que un català port intentar de veure'l i de comprendre1 amb una emoció i una simpatia particulars, per la relativa afinitat dels nostres problemes amb eIs específics de Galícia», ]<I

Essa simpatia particular por Castelao e a relativa familiaridade deste catalám com a língua galega, que lê e mesmo deve ter chegado a estudar, poderiam explicar -junto com o estreito contacto com Salvai, home de teatro e estudioso com ligaçons galegas- o projecto de traduçom de Os vellas nan deben de namararse (a ser) feita por Es­priu, referido em diversas ocasions por Salvat e citado por muitos outros, mas do qual nada se pode afirmar ou garantir, alénl do mito em que se converteu.

Rosalía de Castro já tinha sido objecto de umha homerzage poé­tica na ((Cançó topica de les dones gallegues a Rosalia», onde o pro­dutor catalám retoma as rosalianas «(viúvas de vivos e de mortos que ninguén consolará»} da poesia mais social dela. Este poema aparece publicado sob o rótulo «Homenaje de Espriu a Rosalía», no periódico de Buenos Aires Unión Gallega, 15 em traduçoru para castelhano de autoria nom indicada; colocado na sequência de (Mujeres con dere­chos» é, de algum nlodo, usado para ilustrar esse artigo procedente da página anterior, de autoria femirrina e conteúdo feminista, onde nom falta a referência às ((Agmpaciones Democráticas pro Centro Ga­llego», especialmente Unión Gallega ((que tanto bregó por conseguir esta realidad que es hoy el voto femerrino». A conlposiçom espriua­na, que será incluída em Les cançorzs d'Ariadna (1973), é um dos tex­tos que figura -com data de 1967- na Obra galega completa de Ro­salía publicada por Akal em 1977, em cuja parte inicial Xesús Alonso

Montero afiITIla usar a modo de prólogo, como «coroa poética}), tre­ze poemas assinados por nomes da literatura galega, espanhola, por-

14. Afirmaçom idêntica a esta ue Esprin podemos achá-la tanto em palavras de Ba­silio Losada como de Ricard Salvat (RODRfGUEZ LÓPEZ, 1985: t8 e 186), que reivindi­cam a dimcnsom Llniver�al dc Caslclao ao mesmo tcmpo que consideram o [nnciona� mento dele como umha pontc cultural na península -papel, de resto, também desempenhado polos próprios Losada e Salvat.

15. Resulta difíeil datá-lo, já qne sc trata de um snplemento de GaUda, portavoz da Federación de Sociedades Gaflegas, que deixou de ser numerado em 1970, no número 1371. O texto aparece na sexta página do segundo dos nom numerados. É, de algum modo, usado para ilnstral' o artigo procedente da página anterior, dc autoria feminina e conLeúdo feminista, onde nom falta a referência às «Agrupaciones Democráticas pro Centro Gallego .. , espedalmenle Urrión Gallega «que tanto bregó por conseguir esta rea­lidad que es hoy el voto femcnino.»

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tuguesa e catalá onde se acham pista(s) sobre a produç.om da autora. Ainda com anterioridade, o verso rosaliano ({Quero quedar

ond'os meus dôres foron» adquire umha dimensom nacional que nom tinha (QUlNTANA, 1999: 113 1 ) como paratexto da primeira das três partes em que organiza El carninant i el rnur (1954). Resulta sig­nificativo que o segundo e terceiro bloco se iniciem com paratexto castelhano e catalám, respectivamente, pois de tal modo desenha no conjunto um certo alcance iberista16 em teITIlOS linguístico-literários -apenas com ausência do euskera. Essa mesma preocupaçom de abrangência espanhola, destacada na nota com a qual se noticiou a sua morte em Grial (88 [Abr.-Jun. 1985]: p. 261) com um significati­vo «Representou un expresivo exemplo de esforzo por abranguer as diferentes cuJturas peninsulares desde a súa propia língua }), é tam­bém assinalável quando, numha entrevista de 1974, inicia a sua res­posta sobre o que conhece da cultura galega dizendo «(Mi admiración máxima, y no es un lugar común, es Rosalía de Castro que, junto COIl Bécquer y Verdaguer en la dimensión lírica, es la gran poetisa espa­fiola deI siglo XIX)}.

José María Costa, filho do activo galeguista enl Barcelona Xavier Costa Clavell, publica em 1974, num jornal corunhês, em espanhol e com indicaçom (Barcelona (Especial para El ideal gallego)>>, umha entrevista, com fotografia, sob o título de «Hablando con Salvador Espriu de poesia: (Mi admiración máxima es Rosalía de Castro») (Domingo de El ideal gallego, Corunha [7.7 .1974J: p. 6). Esta decla­raçom vem apenas reforçar a presença de Espriu dentro do número de intelectuais catalans que reconhecerom a valia da obra rosaliana, justificada sobretodo através dos aspectos mais unidos à identidade diferenciada e ao retrato do povo, ao qual Rosalia empresta a voz po­éticaY O texto será objecto de atençom e difusom imediata nas pá-

16. Sobre o iberismo e a.<; possíveis contra(in)di(ca)çons da aposta por ele nesta al­tura, veja-se Gouçalo CORDEIRO RUA, "O iberismo como projecto no campo cultural ga­leguista dos primeims setenta" inActas do VII Congreso Intemacional de Estudios Ga­legos. Barcelona: Universitat de Barcelona, 2003 (no prelo).

17. Isto é percebido e valorizado por galeguistas corno Valentín Fernández, que, num discurso bonaerense em honra de Rosalía de Castro, afirma que «na decadente proxerrie poética hespaflola do sécnlo XIX inumpe Rosalía con forza que soio os cata­láns souperon comprender», opondo essa «sensibilidade» da Catalunya à ca.<;telhana, que nom vê a chama qne se ergue em defesa dos direitos galegos (Correo de Calicia 86, Buenos Aires [30.5.1969]: p. 7).

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ginas da revista incontornável do galeguismo cultural(isla), Grial vertido para galego, ainda que s6 se apresente de modo parcial, te: correndo à terceira das partes -no jornal sob o epigrafe «Rosalfa y Sanliago»- em que se divide (tipo)graficamente a entrevista, de for­ma a plivilegiar do depoimento a afirmaçom da «funda devoçom. por Rosalía e o juízo crítico de nOIll se terem ultrapassado os melho­res momentos poéticos dela (Criai 45, Vigo [Jul.-Set. 1974]: p. 384). Três anos mais tarde, o mesmo Costa assina na revista do grupo Ga­laxia umha «Conversa con Salvador Espriu» (CriaI 58 [Out.-Dez. 1977]: p. 485-489) mais ampla e tocando temas como a catalanidade, a sítuaçom cultural e política. a escrita e a crítica Hterária eatalá, Ambas somente coincidem na apresentaçom inicial e, mais parcial� mente, no fim, quando responde sobre o conhecimento que tem da cultura galega e, longe de ficar polo tópico e na produçom decimo­nónica. estende a sua opiniom relativa à literatura galega afinnando apreciar a poesia dos cancioneiros, respeitar os homes da geraçom Nós, adrllÍrar Cunqueiro e Manuel Maria ou interessar-se de modo especial por Celso Emilio e Dario Xohan Cabana.

Depreende-se. assi, um conhecimento razoável do conjunto des­sa produçom, cujo rasto de actualizaçom pode ser procurado na correspondência de intercámbio com intelectuais da Galiza. Entre os galegos nom sedíados em Barcelona com os quais se co­n�espondÍa encontram-se Díaz Pardo, Alonso Montero e Manuel Maria. Este último chega a evocar como «servidor íballe enviando os libros de poesía galega que iban aparecendo, Espriu, correspon­sal ínfatigabel. nas cartas de resposta, iba verquendo os xuicíos que Ue merecían os poemas de Pirnentel, Antonio Tovar Bobillo, Salva­dor García-Bodafío, Bernardino Grana ou os volumifios que este barbas foi pubricando na súa Coleuci6n Vai de Lentos. Laiouse de que Barco stn luces, de PÍmentel non estivera escrito en galego. O Romanceiro da Terra Chá, de Dario Xohán Cabana mercc",u unha longa carta de Espriu» (HORTAS V1LANOVA t 985: 21). Manuel María, como autor galego mas também corno editor da Galiza do tardo" franquismo, parece ter fornecido ao catalám com algumha regula­ridade as novidades já impressas em galego, mesmo adiantando pa. receres sobre nomes ainda por chegar a um público mais alargado -como 1\1argarita Ledo--I confonne testemunham 110m só vários depoimentos dele (p. ex. CANO, 1990: 106) mas também algumhas

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cartas vindas à luz (p. ex. Correo de Ca/icía 93 e 94, Buenos Aires [15 e 30 Set. 1969]: p. 12).

ReveJa-se, pois, na passage de mao a mao, um modo de contornar

as dificuldades provocadas pola escasseza de canais de circl1laçom

comercial dos produtos galegos -num nlercado mui limitado·-··, di­

ficuldades ainda intensificadas por causa do regime político, com a

censura e a repressom imperantes. Por acaso, ou nom, em Janeiro de

1969 Manuel Maria preside um recital de poesia galega em Madrid

onde, a consequência da alteraçom da ordt'Jn, recebe urnha avulta­

díssirna sançOIIl que (,:onsegue pagar com a ajuda e a solidariedade,

entre outros, de Espriu, de Aresti, de Raimon, de Celso Emilio (Gó·

MEZ TORRES, 2001: 131); em Maio de 1971 era o catalám que devia enfrentar umha sançom igualrnente elevada por participar numha reuniam estudantil (episódio evocado quando se cumpriam os 2S

anos, em La Voz de CaUela, Ourense [12.5.1996]: p. 42). Ao mesmo tempo, detecta-se um alto grau de cumplicidade inter

pares, convertidos em leítores, divulgadores e comentadore.-:; da obra dos homólogos nos seus respectivos círculos, Relativarnente a Espriu na Galiza, de novo At:anuel At:arÍa aparece como elo IIlais visível da corrente. Em 1969, aA11tología poética bilingue do poeta, editada pa­las madrilenas Edicíones Rialp na colecçom (.rAdonais», corn organi­zaçom e traduçom de Basilio Losada Castro -que aponta no prólo­go a importância do contacto do galego com a cultura catalá numha estadia barcelonesa com motivo da gravaçom do disco Manuel Ma­rta: poen-tas ditos coa sua voz, no ano anterior- está presidida polos conhecidíssimos versos de sobrevivência do passado convertida em resgate presente, messiánico, de Hlníci de càntic en el temple". Nes­sa antologia já se anunciava a futura reunionl de poernas que) sob o título deRemol, viriam a lume, finalmente, no ano seguinte em Bue­nos Aires e seriam lllais tarde considerados um momento importan­te na recuperaçom dos sinais de identidade colectivos do povo gale­go. Entre eles, a testenlunhar a experiência e a conexom catalá, estam o «Galida»), com dedicatória para Salvador Espriu e contendo todos os tópicos sobre a terra e as gentes galegas, e a (,Mensaxe a Rai� mou» com que se fecha a obra, em tom rebelde e combativo.

A colecCs-orn {(VaI de Lemos», edit2-da em Monforte sob a respon­sabílidade dele, acolhe a publicaçom tanto de Home e terra (1970) do jove Dario Xohan Cabana, como de Borralleira pra sementar unha

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verba (1 974) de Xosé Lois García Fernández, galego radicado em Barcelona. Se nesta obra se inclui um poema, «Lembranza», que dá conta da visita à cidade condal de Manuel Maria, junto com a mul­her, Saleta, e das suas actividades, entre as quais figura a conversa em casa do poeta catalám (<<Sentámonos nas cadeiras do coarto/ de Salvador Espriu / para escoitar verbas de profundos / misterios e la­titudes»), naquela, depois de o editor e a esposa merecerem a dedi­catória e a seguir ao prólogo de Lois Diéguez que afirma a apariçom de urnha nova voz na poesia galega -na linha de fidelidade «<1 sua te­n'a, á sua xente i á sua língoa» que ecoa a de Espriu, ainda que esta seja apresentada como urnha voz camponesa-, encontram-se como paratextos iniciais umhas palavras do evangelho de S. Joam, uns ver­sos de Manuel Maria que falam do home como voz da terra e, final­mente, uns versos espriuanos:18 « Quan Ia Hum pujada des dd funs deI mar/ a Hevant comença just a tremolar,! he mirat aquesta terra,! he mirat aquesta terra» do Llibre de Sinera ( 1 963), obra caracterizada pala reuniam de atitude cívica e lírica e que o próplio Espriu apon­tará em estreita relaçom com La pell de brau.

Eln 1 969, um livro de narrativas curtas de Manuel Maria foi pre­miado no concurso literário do Centro Galego de Buenos Aires, que o editou dous anos mais tarde. De O xornaleiro e sete testimU11as nwis faz parte «Carta a un amigo que vive no estranxeiro», um desabafo­pedido de um galego do interior para outro do exterior, emigrante ou exilado, em cuja página 88 se lê: ((E nós eiquí, cruzados de brazos, fodidos como selnpre, rodeados de criticas incompetentes e de maIa leite. E tí ahí, pensando en nós. E nós pensando en tí. Pensando que todos somos homes. Que non hai dereito. E lembramos, para conso­larnos, os versos de Celso Elnilio Ferreiro, que está fodido en Cara­cas. E lembramos tmnén os versos de Salvador Espriu que tmnén está moi fodido en Barcelona. E quixéramos, pra descansar un ana­co, o xardín das cinco aIbres que canta Espriu. Espriu e Celso Emí­lio Ferreiro, ou o revés, i un poeta vasco de que che faIarei noutra carta, e que se chama Gabriel Aresti, san moi bós. Dín as cousas que hai que decir. Dín as cousas tal e como san.»

18. O poema "Acusacióu ós homes sin raigames», que encen'a a obra, conta com outro paratexto catalám, de J. V. FOIX (Tenint eIs uTls sense gregals 1"1; arbres .. . ). Trata-se, curiosamente, dos dous poetas catalans pIUpostos para o Nobel de literatura em 1980 (Faro de Vigo [10. 1 . 1 980]: p. 7).

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Este autodenominado leitor «devoto e atento» de Espriu (HORTAS VlI.ANOVA, 1985: 21), para além de ter ampliado o número de elemen­tos referidos dessa poética com eZ jardí deZs cinc arbres -um cenfuio real da casinha de Arenys dei Mar, símbolo da paz doméstica-, colo­ca aí a tríade composta palas «máis importantes poetas das nosas tres nazóns no século xx» que, em 1988, som protagonistas da antologia trilingue e conjunta que as associaçons de escritores da Galiza, Eus­kadi e Catalunha que fonnam o GaZeusca publicaram como {(algo máis que un símbolo», isto é, como «un deber de hOlnenaxe e un pri­meiro paso para a posta ó día das nosas relazóns» . Já no interior, Álvarez Cáccamo refere-se a eles, no início da introduçom à poesia de Celso Emilio Ferreiro, de 1 998, como « tres voces fundamentais dos tres idiomas minorizados do Estado espanol. Tres poetas que faIaron frecuentemente desde a tensión do seu comprolniso político e tras­cenderon, nos seus mellores versos, o pedagoxismo elementaI da lite­ratura social-realista, que foi coetânea ou descendente deles» .

Ele próprio poeta de corte social-realista e u m dos principais transferidores do produtor catalám para o sistema galego, Manuel María afinnara, na recensom sobre a vinda a lume na colecçom «El Bardo» do Viaxe ao pafs dos a/1anos de Celso Elnilio, que « Celso Emi­lia e Salvador Espriu -ou ó revés- san os dous meirandes poetas vi­vos da Península Ibérica contando, craro está, a Portugal» (Correo de CaUcia, Buenos Aires [28.2.1 969]: p. 6). Apontado-os como os dous poetas maiores e mais lidos na Espanha, quer nas suas línguas, quer nas numerosas traduçons disponíveis, procura umha homologia no campo cultural ca taIám que pennite reforçar o produtor galego den­tro do seu protossistema.

Essa homologia estende-se com a incorporaçom de um produtor basco, de tal modo que com o ourensam Celso Emilio Ferreiro, Sal­vador Espriu e Gabriel Aresti fica constituída a trilogia de gTandes poetas peninsulares, a que Alonso Montero, no ano 1992-93, dedi­cou um curso de Doutoramento na Universidade de Santiago.

Eles som, como produtores e como homes, as influências e refe­rentes marcantes de Fernández Teixiero na época em que (se) prio­rizou a poesia civil: «Posiblemente o que máis lera nesa época fora ós poetas da resistencia antifranquista espafiola. A Celso Iíao, igual que a Aresti, a Paol Keineg ou a Espríu» (CANO, 1990: 1 1 5). Mas, tol como o próprio Manuel Maria o apresenta em depoimentos vários e

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como o referem os que seguiram a pista destes relacionamentos, o seu contacto com os nom galegos flom se limita à letra escrita (e me­nos ainda à escrita poética), troca com eles correspondência, livros e notas críticas ou recensons que} publicadas na Espanha ou no en­clave bonaerenseJ testemunham a conexom em forma de relaçons pessoais. tendo sido o percurso seguido com Espriu em certo modo semelhante ao seguido com o euskera Gabriel Aresti, mas que se pode talvez supor de menor profundidade ou maior inexactidom. O primeiro encontro pessoal com o catalám parece datar de 1 968, mo­mento em que Se desloca a Barcelona para gravar o disco de poemas recitados) e ainda que Manuel Maria fale num relacionamento pró� ximo com o escritor catalám, o facto de ter afirmado que Espriu tin­ha estado na Galiza umha única vezj Ui em 1 936 e visitando apenas Compostela, revela várias ímprecisons: o contacto inicial do cata­lám com a Galiza datava de 1 934, antes dos acontecimentos de Ou­tubro;" nas entrevistas a Costa declara gostar de Lugo e Pontevedra -embora tenha Compostela como a cidade mais bonita da Espan­ha- (Domingo de EI ideal gal/ego, Corunha [7.7.1974]: p. 6), e indi­ca que tinha estado na Galiza muitas vezes (Grial 5 8 [Out.-Dez. 1 977J: p, 489),

Mais tarde evoca isso eU1 conferências, artigos e homenages por meio dos quais ele próprio, já no tardofranquismo nome de referên­cia -se nom de mestre� da poesia social-realista da Galiza, dentro e fora dela,2J reforça a sua posiçom no protossistema galego. BastaJl� te mais novo do que Celso Emílio. em certa medida passou a substi­tuí-lo, depois da morte deste, como paradigma de homem e escritor cornproTIletido -nom apenas no terreno cultural, mas também no político-, e ainda como produtor de HUlha obra extensa e diversifi­cada, tanto polos géneros, incluindo o teatro e a literatura infantil, cOlno polos temas que toca.

As informaçons procedentes da critica catalá relativas a Espriu

1 9. Isto lê.-sl':'., por e,;templo, em «Lembranzas de S. FrSpriu» (HORTAS VlLANOVA, 1 985: 2J): «Sempre fulana de voltar a Compostela e viaxar por Galicia, A súa fTáxil sa:rí� de nunc� Ue perrnitlu realizar os seus deM!xo�."

20. O mesmo dado aparece repetido em QUINTANA. (1999: 1131) e repl'Oduzido em DlAZ. PARDO (1995: 34).

21. Umha prOVa disto acha-se na observaçom das antnlogias· singulares de antorv.s galegos com cirÇ.ul�çorn peninsular, para a qual chama a atençom Sara Pino Ramos. no seu tmnalho sobre as editoras e o produto cultural galego no periodo focado,

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concentram-se praticamente na revista CriaI, que tinha entre as suas directrizes a incorporaçom dos valores das restantes culturas ..-entre as quais� obviamente, a da Catalunha-, e incídem na sua produçom teatral. Do inquérito da revista Serra d'Or para assinalar os melhores títulos do seu ámbito linguístico de 1 964 a 1970 (33, Vigo, [1 9711) Espriu resulta votado entre os autores de destaque, Cu­riosamente nom pala sua produçom poética, mas no capítuJo do te­atro, graças a Ronda de rrwrt a Sinera -na publidtaçorn da qual Ri­card Salvat jogará um papel importante, do mesmo modo que ele terá a ver com a difusom. aind� que tardia, na Galiza desta vertente espriuana. Bastantes anos mais tarde, de novo em Gn"al (76, Vigo [Abr.-Jun, 1 982J: p, 252), informam sobre o parecer de quarenta crí­ticos cataJans relativamente às obras mais importantes da literatura cataJá do pós-guen'a e nom falta urnha de Espriu, a teatral Pdrnera história d'Eslher.

Enquanto isso, som os jornais ou as publicaçons destínadas a um público mais anlplo e menos selectos as que se fazem eco da candi� datura ao prémio Nobel de Espriu, a primeira das quais feita em 1 968, tendo em Pedro Altares um dos apoiantes (Chan. 10, Madrid [Jul. 1 969]: p. 23). Esta parece apoiar-se sobretodo no conhecímento da obra de compromisso civil, que goza de UIU relativo sucesso em sectores alargados do público, tanto estatal como inter'nacional, por cansa da sua componente de denúncia durnha situaçom social opres­siva. No entanto, no caminho iniciado nom faltarám entraves, nem nessa altura, nem mais tarde, daí que se proceda a denunciar a ba­rreira ql1e supomo por um lado, a ausência de promoçom proceden­te do centro político e de decisom espanhol, atribuída à diferença lin­gllística e, por outro lado, O facto de o galardom nunca ter sido atribuído a um produtor cuja língua nom fosse a de um estado. Aín­da em 1 980, COrIl motivo de urnha nova candidatura apresentada polo Pen Club catalám, insiste-se no matiz de protesto (Faro de Vigo [10, 1 .1 980]: p. 7) e destaca-se o valor de «unha das figuras das letras europeas contemporâneas, a quen fai dous anos lle foi concedido o Premio Carlomagnon (Suplemento cultural de Faro de Vigo [1 1 .7 . 1980): p. 24).

Percebido o interesse da projecçom internacional, explica-se fa­cilmente que na Galiza se ecoe, neste caso por meio de Crial, a atri­buiçom a Espriu, referido como «grande poeta catalán», do prémio

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Montaigne da Universidade de Tubinga21 em 1971. Nom é por aC.:'15.o que aí se faJa enl «presLixiosa figura literaria». que se revela o julga� mento positivo no terreno da Literatura Universal «pola irnportancia e orixinalidade da súa obra creadora» e que se destaca o facto de ter existido Ulll júri internacional a tomar a decisorn (Gtial 32, Vigo [Abr.-Jun. 1971]: p. 254). Todos eles som elementos que concorrem para o engrandecimento do mérito (e) da obra, confirmando as opçons linguísticas nacionalistas num contexto que non1 é favorável.

3. CONCLUSONS

No tardofranquismo o sistema (culturaí) galego emergente en­frenta graves problenlas para a suficiêncÍa sistémica por causa da in­terferência espanhola. Neste contexto, os agentes galeguistas encon­tram na Catalunha umha cultura fonte vista como modelo a imitar por causa do desenvolvimento e do prestígio alcançados, nom conl� paráveis com o da galega, em níveis inferiores mesmo com circuns­tâncias selnelhantes. No entanto, o acesso à cultura cataM norn é imediato: apresenta limitaçons de disponibílídade que explicam a existência de intermediários -é por isso que Even Zohar fala em contacto indirecto, face ao directo, com umha acessibilidade que dis­pensa os agentes de mediaçom- que realizarám a importaçonl) ha­bitualmente um pequeno gru.po de agentes.

Trata-se de indivíduos -frequentemente críticos elou produto­res- qualificados com conhecimento Bnguístico e/ou radicados no espaço catalám ou com experiência ou contactos pessoais nele/dele -som, ao mesmo tempo, fazedores de repertório e agentes da trans­ferência- que, longe de ignorar a contemporaneidade da cultura ca­talá, recorrem ao centro dela e aos seus elementos mais significati� vos, Espriu entre eles, para levá-los para a cultura Illeta, a galega,

Salvador Espriu, convertido na Catalunha numha (das) figura(s) mitíca(s), quer do ponto de vista literário, quer do ponto de vista d-

22. Dez anOs mais tarde, ainda surge fi nome de Espriu corno o primeiro dos es­panh6is merecedor desta distinçom (Faro de VigD [9, 12.19811: p. 8), concedida desde 1968 a personalidades de países eumpeus de língua rOmance pola Funda.çom Toepfer, entidade benéfica privada alemá criada em 1931 para promover a cultura e a unidade europeia.

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vico, pola sua defesa da língua em anos difíceis e pala envergadura de umha obra construída nessas condiçons adversas, é transferido para o sistema cultural galego exactamente nestas dimensons. Ê o mais citado de todos os produtores catalans, sem dúvida na qualida­de de urn dos poetas mais importantes do momento -nom por aca­so tinha sido proposto para o prémio Nobel, recebe o Prémio de Honra das Letras Catalás (I 972), é objecto de preferência na escolha poética de Raimon e outros intérpretes da Nova Cançó- mas tam­bénl corno amigo de galegos, leitor de literatura galega, crítico e home de cultura comprometido. Apesar de se detectarem algumhas referências à produçom teatral dele, COm destacada qualificaçom roas procedente da CriticOl catalá, e pondo de parte a narrativa, des­taca-se o Espriu POETA

que conserva e transmite a língua, como legado de vida e de cultura e manifestando fidelidade à identidade,

ligado à terra -vista, contemplada, compreendida-, recusan­do a evasom e/ou a emigraçom;

CIDADÃO - comprometido, solídárío,

preocupado com o povo, entendido como depositáôo da cul­twa garante da identidade, nOm proletariado;

CONHECEDOR DA CULTURA GALEGA leitor de abundantes textos literários na língua original admirador de figuras destacadas da intelectualidade galega correspondente activo e atencioso (em castelhano) com os ho-

mólogos da Galiza, Na(s) tranferência(s) observa-se urnha marcadíssima coincidên­

cia em textos e declaraçons que, por um lado, som um mlnlero mui reduzido e, por outru lado, continuanl repetindo-se insistentemente ao longo do tempo. Detecta-se, pois, nas transferências galegas de Espriu a incidência nos mesmos aspectos, relativos, de Ulll modo ge­rat ao seu perfil humano, ao seu compromisso civil e artistico, à di­mensom internacional alcançada poja sua obra apesar das Jimi­taçons (numerosas traduçons, candidatura ao Nobel de Literatura, prémios), e, com respeito à Galiza, que demonstram a solidariedade Com ° povo galego, a aInizade ou contactos pessoais com figuras ga­legas e a leitura e apreciaçom positiva da escrita literária (sobre todo poética) galega.

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Afinal, no contacto indirecto entre o sistema galego e o catalám, que tem na transferência de Espriu apenas urnha das suas materiali_ zaçons, tece-se a quase conspiraçom que Castellet (VILA-SANJUAN, 2003: 257) via nos meios catalanistas no tipo de relacionamento au­tor-editor, quando a profissionalizaçom era inviável. A(s) cultura(s) nacionalista(s) das periferias do Estado Espanhol comunga(m) e conspira(m) atendendo às necessidades do momento, em [unçom da acessibilidade e das necessidades. Estas últimas eram no tardofran_ quisIDo e ainda continuam a ser agora a criaçom ou manutençon de umha consciência nacional e a afirmaçom da língua; quanto ao com­bate à ditadura . . .

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