Resenha de Filosofia Da Literatura. de Peter Lamarque

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O que é exactamente encarar a literatura como arte? É amplamente reconhecido que pelo menos alguns poemas, romances e peças de teatro são genuinamente obras de arte, mas está longe de ser claro o que quer isto realmente dizer.

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Filosofia da literaturaPeter LamarqueUniversidade de YorkO que exactamente encarar a literatura como arte? amplamente reconhecido que pelo menos alguns poemas, romances e peas de teatro so genuinamente obras de arte, mas est longe de ser claro o que quer isto realmente dizer. Por que razo exclui rimas sentimentais ou cartes de aniversrio ou versos cmicos apimentados ou romances de gnero como livros de detectives e de fico cientfica? Ser isto meramente um juzo de gosto sem fundamentos ou ser tambm um juzo categorial? H fundamentos objectivos para fazer estas distines? Para comear, o que conta como "literatura"? E uma vez reconhecido que algo literatura no sentido relevante, que implicaes tem isso no modo como lida, o que se procura nela, que tipos de benefcios tem e que lugar ocupa entre outras coisas que os seres humanos valorizam?O que se segue uma explorao filosfica destas questes e de outras anlogas. Porqu "filosfica"? esta investigao diferente da dos prprios crticos literrios? Na verdade, no diferente no sentido de pertencer a uma categoria diferente; os crticos literrios podem ser filosficos, e so-no muitas vezes. Mas pode mesmo assim parecer uma perspectiva incomum. O filsofo examina princpios fundamentais, conexes conceptuais, consequncias despercebidas de certas linhas de pensamento, significncia e insignificncia, fronteiras onde estas so possveis e desejveis. E na construo de teorias, o filsofo ou a filsofa pode ento ter a esperana de desenvolver uma teoria abrangente dos fenmenos que ajude a unificar, explicar e clarificar elementos difusos. A investigao filosfica da literatura uma sondagem de prticas e procedimentos, mas no oferece uma histria dessas prticas nem uma anlise sociolgica delas. Examina as convenes e os pressupostos subjacentes que do s prticas a identidade distintiva que tm e tenta encontrar uma perspectiva coerente que lhes d sentido. Contudo, a investigao de pouco vale se for demasiado abstracta, se perder contacto com as prprias obras seja as prprias obras de arte seja as obras de crtica que as comentam que se prope abranger. Ao longo desta investigao, estas obras estaro em primeiro plano. Quaisquer princpios identificados ou conceitos clarificados ou teorias construdas s tero justificao nas prticas comuns dos leitores e dos apreciadores de literatura.Este livro tem por pblico no apenas os filsofos mas tambm aquelas pessoas tanto crticos como "leitores comuns" que tm interesse na literatura e que gostam de explorar questes para l dos lugares-comuns irreflectidos. O mtodo em grande parte "analtico" e tende a enfrentar os problemas filosficos de frente, ao invs de o fazer atravs da histria dos problemas. Mas no deseja confrontaes com outras metodologias. Os estilos de filosofia so em grande parte uma questo de temperamento e formao. No final de contas, o que importante quo iluminante se consegue ser. Espera-se que quem se sente perplexo com certos aspectos da criao e apreciao literrias ganhe alguma claridade, e at algum insight, do tratamento oferecido.No Captulo 1, a natureza da investigao apresentada, os seus mtodos e aspiraes. O que implica "filosofia da literatura"? Como se relaciona com a teoria literria ou crtica? O que est envolvido quando concebemos a literatura como "arte"? Pode a literatura ser acomodada no seio da esttica ou ser que isso pressupe uma concepo irrevogavelmente ultrapassada das belles lettres? H algum espao para falar da experincia esttica ou das qualidades estticas ou do prazer esttico em relao literatura? De facto, faz-se soar o alarme desde o incio contra perspectivas reducionistas da literatura, perspectivas, por exemplo, que tomam um modo literrio como paradigmtico (o poema, o romance) ou encaram os prazeres da literatura em termos puramente sensuais ou do prioridade s respostas "naturais" ou iletradas.No Captulo 2, oferece-se um exame pormenorizado e crtico de tentativas de definir a literatura. O que h exactamente de distintivo na arte literria? H alguma essncia do literrio, o seu uso da linguagem, talvez, ou a sua "imitao" do mundo, ou os seus poderes de expresso? Se nada h de intrnseco nas obras literrias propriedades comuns a todas essas obras que seja um sinal do seu carcter literrio, podero haver factores "institucionais" que as distinguem? Esta ideia cuidadosamente explorada e avaliam-se diferentes tipos de anlises institucionais. A ideia do "modo de existncia" da obra literria tambm levada a cabo. Poderiam as obras literrias ser meras sequncias de frases?O Captulo 3 examina a ideia do autor. Na crtica literria do sculo XX o autor foi muito denegrido com a rejeio da crtica baseada na biografia, a promoo do "impessoal", a nfase na "autonomia", at se chegar "morte do autor". Que razes podero haver para despromover o autor desta maneira? No ser paradoxal que obras que foram ostensivamente criadas por autores sejam encaradas como se tivessem vida prpria, independente dos seus autores? Os argumentos sobre o papel da inteno na crtica, e sobre se h ou no uma "falcia intencional", so tambm examinados.O Captulo 4 central porque examina princpios fundamentais da leitura que aparentemente tm de subjazer a qualquer concepo da literatura como arte. Longe de ser prescritivo, contudo, o captulo procura pura e simplesmente identificar interesses profundos e comuns que os leitores tm quando abordam obras literrias de arte como arte. Presta-se ateno "interpretao", ao seu objectivo, ao seu fundamento e questo de saber que relao tem com a "apreciao" da literatura.No Captulo 5, exploram-se as muitas facetas da ficcionalidade: por exemplo, saber se h ou no uma linha clara de demarcao entre o que e o que no fico, o que dizer uma histria ou inventar uma personagem, como podemos falar com sentido sobre acontecimentos ficcionais. Que tipo de realidade tem as personagens ficcionais, se que tm alguma? O que um mundo ficcional e como construmos uma imagem dele? Quo similares so as personagens ficcionais e as pessoas reais? Como podem os leitores envolver-se emocionalmente a personagens sabendo que so meramente "inventados"?O Captulo 6 sobre a verdade no que diz respeito literatura. a verdade uma aspirao da literatura, em poesia, talvez, ou obras de fico? O que poderia querer dizer que uma obra de fico exprime uma verdade profunda sobre a vida humana? Est a verdade proposicional longe da literatura? So as verdades literrias sui generis? Podemos aprender com a fico tanto factos como modos de ver o mundo? Podem as grandes obras de literatura dar-nos uma melhor compreenso de ns mesmos e da vida humana? Sugere-se aqui alguma cautela. Nem sempre claro como sustentar algumas das mais grandiosas teses dos teorizadores da "verdade".Finalmente, o Captulo 7 examina directamente outros valores hipotticos da literatura. O que distingue uma grande obra de literatura? Podem tais juzos ser objectivamente feitos? O que se quer dizer com "cnone" literrio? As obras tornam-se cannicas devido aos seus mritos literrios intrnsecos, ou h factores polticos em jogo? Como se relaciona o valor literrio com a interpretao? A tica ter alguma coisa a ver com o valor literrio? Poderia uma obra imoral ser valiosa de um ponto de vista literrio?Estas so, ento, apenas algumas das questes que surgem na filosofia da literatura. Este livro procura explor-las em pormenor, no caracterizando apenas os argumentos principais das diferentes perspectivas apesar de tentar tambm fazer isso mas tambm contribuir para os debates e avaliando os argumentos. A postura do livro no inteiramente neutra, desenvolvendo antes uma linha de pensamento que conecta as questes entre si, formando uma perspectiva que se espera que o leitor considere persuasiva e adequada. Mas, em ltima anlise, ver quais so os problemas e pensar sobre eles exaustivamente pode ser to importante como estabelecer umas quaisquer concluses finais. O domnio literrio algo no qual todos participamos em certa medida; reflectir sobre qual exactamente o lugar que a literatura tem de facto nas nossas vidas pode aumentar a nossa apreciao da literatura e tornar-nos mais cientes do gnio que subjaz s suas maiores produes.Peter LamarqueTraduo de Desidrio MurchoRetirado do livro The Philosophy of Literature, de Peter Lamarque (Oxford: WileyBlackwell, 2008)Termos de utilizao No reproduza sem citar a fonte